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Erradicação da pobreza por lei ?

O Parlamento aprovou hoje, por unanimidade, um projecto de resolução que


recomenda a definição de um «limiar de pobreza» que «sirva de referência
obrigatória à definição e à avaliação das políticas públicas» para combater o
fenómeno. (Diário Digital, 4/7/2008)

1 – Uma lei pândega característica da “silly season”

Decididamente andam a brincar com os pobres. O PS propôs no parlatório


uma lei que torna os responsáveis por situações de pobreza violadores de
direitos humanos. Logo à noite, os incansáveis representantes do povo, deitar-
se-ão felizes como escuteiros depois de concretizarem a boa acção do dia,
sabendo para mais, que encontrarão respeito e compreensão do Van Zeller e
amigos,

Entretanto, ali perto a mesma besta peéssica acata obediente o aumento dos
juros e o engordar dos bancos; o aumento do preço dos bens alimentares e
dos combustíveis; aprofunda o código do trabalho; e prepara despedimentos
na administração pública... gerando pobreza. Sem um mugido.

Trata-se, uma vez mais, de um caso do pioneirismo português, que visa


ensombrar o protagonismo do Sarko(na)zy como pai dos povos europeus. Nem
Hitler se lembraria de celebrar missa pelas vítimas dos campos de
concentração. “ Porreiro, pá!” foi o conteúdo de um mail enviado ao Sócrates,
pelo Cherne, lá de Bruxelas.

Ao que parece eles não pretendem penalizar ninguém, somente vigiar,


anunciou ontem um deputadeco socratóide para sossegar algum ministro ou
empresário mais distraído. E para vigiar, naturalmente, é preciso nomear uma
comissão, um observatório dirigido por um mandarim bem pago, com
assessores, secretárias, motoristas, instalações munidas de simplexes e carros
topo de gama. Bandos de juristas do partido irão legislar sobre o assunto e
preparar decretos, regulamentos, despachos em mais uma reedição de Kafka,
autor muito seguido cá na paróquia. Os pobres, esses têm garantida uma
definição científica e legal de pobreza que os fará arrotar ao jantar.

A propósito, recordamo-nos da Constituição que previa a construção de uma


sociedade sem classes até que apagaram essa referência, dado o ridículo do
seu cotejo com a realidade. E as imensas (??) repercussões que as quotas
para a participação feminina no parlatório têm sobre a vida real, reduzindo o
desemprego feminino, igualando salários para idênticas funções, para homens
e mulheres, democratizando a pancadaria doméstica e outros avanços com
que tropeçamos ao sair da porta.

Na república do faz-de-conta também existe um SNS no papel e um sistema


educativo que cria bons resultados escolares para a estatística do Eurostat, na
base de um facilitismo imbecil que incentiva os jovens ao não-esforço,
cavando a sua futura impreparação para a vida activa, enquanto sonham com
Cristianos Ronaldos.

Os trabalhadores, como os 250 despedidos esta semana da Secla nas Caldas


da Rainha, não vão beneficiar em nada dessa lei, pois o “empregador” não irá
sofrer sanções apesar de ser um gerador de pobreza. Os bancos pelas
dificuldades que irão causar aos mutuários de crédito à habitação, tornando
muitos, utentes habituais do Banco Alimentar, encolherão, impassíveis os
ombros. O mesmo sucederá aos causadores dos aumentos dos preços dos
bens alimentares.

O carácter consensual da leizeca parida em S. Bento não se irá aplicar aqueles


que congeminam a assinam acções geradoras de pobreza. O plasmódio Vieira
da Silva, pela redução das condiçoes de acesso ao subsídio de desemprego ou
de doença vai responder por isso? O execrável Correia de Campos pelas
dificuldades criadas à multidão com a sua “visão” do sistema público de saúde
que o Observatório da Saúde considerou ter menos qualidade devido ao
financiamento público dos estabelecimentos privados, vai para a cadeia?. E o
“maestro” Pinto de Sousa, vulgarmente conhecido por Sócrates fica impune a
fazer jogging por aí, rodeado de pides?

Por seu turno a múmia Ferreira Leite - que surge agora como justiceira – gerou
empobrecimento como ministra do Barroso e mãezinha dos aumentos do IMI
que têm criado muitos casos de não pagamento, ao ponto de o falso
engenheiro quer modificar o seu funcionamento. Será por ignorância que, ao
defender a privatização da saúde e da educação, não vê o empobrecimento
que daí resulta para grande parte da população?

Se existisse uma lei séria para sancionar os causadores da pobreza em


Portugal nesta década, ministros e directórios do PS/PSD/CDS estariam presos
e os seus bens apreendidos, pelos danos causados.

2 – Quem são os pobres, as vítimas do PS/PSD?

De acordo com dados da DGCI pode observar-se a situação da distribuição dos


rendimentos em Portugal, que revela a enorme clivagem entre pobres e ricos:

Escalões de Declarações de IRS (%) Rendimento anual declarado (%)


rendimento
bruto (€) 2003 2006 2003 2006

< 13500 63,1 59,3 27,6 24,6


13500-50000 32,2 35,3 48,1 48,9
>50000 4,7 5,4 24,3 26,5

Do quadro acima resultam várias conclusões. Uma, é a redução relativa do


rendimento dos mais pobres, cujo volume se mantém quase constante, em
cerca de 2,6 milhões de declarações. Outra, é a estagnação do peso do
rendimento anual bruto dos escalões intermédios, apesar do número de
declarações crescer 200 mil em 2006 face a 2003. A terceira, é o crescimento
do peso do rendimento declarado pelos escalões superiores, cujo número se
cifra apenas em 238 mil em 2006, contra 194 mil três anos antes.
A partir da mesma fonte sabe-se que o rendimento médio dos que declaram
mais de 250 mil euros anuais estagna (??) durante o periodo considerado. Isso
sucede porque parte importante do rendimento efectivo de que dispõem está
incluido na contabilidade das empresas – carros, viagens, seguros, cartões de
crédito, almoços, em muitos casos, utilizados também por familiares. E, como
para a esmagadora maioria dos trabalhadores essas benesses não são
acessíveis, não é difícil concluir que a desigualdade social real, em Portugal é
mais acentuada do que o observado no quadro acima.

Outro aspecto interessante é que não deve confundir-se escalões intermédios


com classe média. Tendo em conta o nível de vida a que uma família com
13500 a 50000 euros anuais pode aspirar, sobretudo com o aumento dos
encargos com a casa, com os idosos cujas necessidades Sócrates entendeu
deverem ser suportados pelos filhos, com as dificuldades de acesso a
cuidados de saúde, o desemprego, a falta de emprego para os jovens, o
aumento da carga fiscal, esses escalões de rendimento não são uma classe
média mas os menos pobres de um país periférico controlado por um
empresariato com tanto de ignorante como de cúpido e saloio e pelos seus
mandatários políticos, cleptomaníacos compulsivos. Em suma, o conceito de
classe média num Portugal que se pretende afirmar como país europeu é um
conceito virtual, abstrato, desajustado, de importação.

A caridade tem milhares de anos e nunca resolveu o problema da pobreza em


lado algum. Assenta na individualização e segmentação dos pobres entre com
ou sem direito a apoios; na discricionaridade de quem os fornece; na ausência
do reconhecimento da direito à dignidade por parte das vítimas dos
desmandos do capitalismo.

Em suma, a erradicação da pobreza não se faz com votos piedosos de apelo à


solidariedade enquanto a riqueza se concentra nuns poucos; nem se consegue
mantendo em mãos de alguns o direito de propriedade dos bens de produção,
da organização dos recursos e da aplicação dos seus resultados. Tudo isso
capeado por um Estado voraz e anti-social. Democracia significa morte do
capitalismo.

www-esquerda_desalinhada.blogs.sapo.pt

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