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Pedro Sérgio Fadini e Almerinda Antonia Barbosa Fadini

Os resíduos gerados por aglomerações urbanas, processos produtivos e mesmo em estações de tratamento de
esgoto são um grande problema, tanto pela quantidade quanto pela toxicidade de tais rejeitos. A solução para tal
questão não depende apenas de atitudes governamentais ou decisões de empresas; deve ser fruto também do empenho
de cada cidadão, que tem o poder de recusar produtos potencialmente impactantes, participar de organizações não-
governamentais ou simplesmente segregar resíduos dentro de casa, facilitando assim processos de reciclagem. O
conhecimento da questão do lixo é a única maneira de se iniciar um ciclo de decisões e atitudes que possam resultar em
uma efetiva melhoria de nossa qualidade ambiental e de vida.

lixo, sociedade, resíduos urbanos, tratamento de lixo, programa R3

C
hamamos ‘lixo’ a uma grande de pessoas (Branco, 1983). A partir da devido a formas inadequadas de elimi-
diversidade de resíduos sólidos Revolução Industrial iniciou-se o pro- nação (IPT/CEMPRE, 1995). Para
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de diferentes procedências, cesso de urbanização, provocando um Bidone (1999), em um passado não
dentre eles o resíduo sólido urbano êxodo do homem do campo para as muito distante a produção de resíduos
gerado em nossas residências. A taxa cidades. Observou-se assim um verti- era de algumas dezenas de quilos por
de geração de resíduos sólidos urba- ginoso crescimento populacional, favo- habitante/ano; no entanto, hoje, países
nos está relacionada aos hábitos de recido também pelo avanço da medi- altamente industrializados como os
consumo de cada cultura, onde se nota cina e conseqüente aumento da expec- Estados Unidos produzem mais de
uma correlação estreita entre a tativa de vida. A partir de então, os 700 kg/hab/ano. No Brasil, o valor mé-
produção de lixo e o poder econômico impactos ambientais passaram a ter dio verificado nas cidades mais popu-
de uma dada população. O lixo faz um grau de magnitude alto, devido aos losas é da ordem de 180 kg/hab/ano.
parte da história do homem, já que a mais diversos tipos de poluição, dentre A produção elevada de lixo norte-
sua produção é inevitável. Para Teixeira eles a poluição gerada pelo lixo. O fato americano deve-se ao alto grau de in-
e Bidone (1999), o lixo é definido de é que o lixo passou a ser encarado co- dustrialização e aos bens de consumo
acordo com a conveniência e pre- mo um problema, o qual deveria ser descartáveis produzidos e ampla-
ferência de cada um. O IPT/CEMPRE combatido e escondido da população. mente utilizados pela maioria da popu-
(1995), define-o como restos das A solução para o lixo naquele momento lação. No caso do Brasil, a geração do
atividades humanas, consideradas não foi encarada como algo complexo, lixo ainda é, em sua maioria, de pro-
pelos geradores como inúteis, indese- pois bastava simples- cedência orgânica;
jáveis ou descartáveis. Normalmente mente afastá-lo, des- Países altamente indus- contudo, nos últimos
apresentam-se em estado sólido, cartando-o em áreas trializados como os Estados anos vem se incorpo-
semi-sólido ou semilíquido (com mais distantes dos Unidos produzem mais de rando o modo de con-
quantidade de líquido insuficiente para centros urbanos, de- 700 kg/hab/ano. No Brasil, sumo de países ricos,
que possa fluir livremente). São tam- nominados ‘lixões’. as cidades mais populosas o que tem levado a
bém classificados como resíduos sóli- Nos dias atuais, produzem algo como uma intensificação do
dos vários resíduos industriais, com a maioria das 180 kg/hab/ano uso de produtos des-
resíduos nucleares e lodo de esgoto pessoas vivendo nas cartáveis.
desidratado, conforme aponta Mata- cidades e com o avanço mundial da Sem dúvida, a associação do cres-
Alvarez et al. (2000). indústria provocando mudanças nos cimento populacional à intensa urba-
O lixo sempre acompanhou a hábitos de consumo da população, nização e às mudanças de consumo
história do homem. Na Idade Média vem-se gerando um lixo diferente em estão mudando o perfil do lixo brasilei-
acumulava-se pelas ruas e imediações quantidade e diversidade. Até mesmo ro. Porém, essa ‘modernidade’ não es-
das cidades, provocando sérias epide- nas zonas rurais encontram-se frascos tá sendo acompanhada das medidas
mias e causando a morte de milhões e sacos plásticos acumulando-se necessárias para dar ao lixo gerado um

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destino adequado. Segundo a
Pesquisa Nacional de Saneamento
Básico (PNSB), realizada em 1989 pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) e editada em 1991
(IPT/CEMPRE, 1995), “o brasileiro con-
vive com a maioria do lixo que produz.
São 241.614 toneladas de lixo produ-
zidas diariamente no país. Fica a céu
aberto (lixão) 76% de todo esse lixo.
Apenas 24% recebe tratamento mais
adequado”.

Destinação final do lixo (%)

Disposição a céu aberto 76


Aterro controlado 13
Aterro sanitário 10
Figura 1: Vista do lixão de Indaiatuba-SP, em 1990. Foto: Acervo da Associação Ecológica
Usina de compostagem 0,9 Chico Mendes de Indaiatuba (AECHIN)
Incineração 0,1

Fonte: IBGE, 1991(in: IPT/CEMPRE, 1995).


Dos 24% de tratamento considera-
do mais adequado, 13% é através de
aterro controlado, o que ainda possi-
10 bilita a contaminação do lençol freático.
Mesmo os 10% de aterro sanitário não
são eficiência e qualidade devido à
necessidade constante de controle e
manutenção, o que nem sempre
acontece, mesmo porque são raros os

Lixão, aterros sanitários e aterros


controlados
O lixão é uma mera disposição do
lixo a céu aberto, sem nenhum critério Figura 2: Vista do antigo lixão de Indaiatuba, hoje transformado em aterro sanitário. Foto:
sanitário de proteção ao ambiente, Acervo da Associação Ecológica Chico Mendes de Indaiatuba (AECHIN).
que possibilita o pleno acesso de
vetores de doenças como moscas,
aterros que operam convenientemente tros urbanos. A questão do lixo remete-
mosquitos, baratas e ratos ao lixo.
do ponto de vista ambiental (Figuei- nos a uma discussão sobre o modelo
Segundo a ABNT/NBR-8849/85, um
redo, 1995). de desenvolvimento escolhido pelo
aterro controlado caracteriza-se pela
Para a maioria dos administradores país, cuja política se traduz na neces-
disposição do lixo em local con-
o lixo é encarado como um problema sidade do aumento do consumo,
trolado, onde os resíduos sólidos
e uma preocupação meramente higiê- favorecendo alguns e excluindo mui-
recebem uma cobertura de solos ao
nica. Porém, o problema maior são as tos. A opção por um crescimento
final de cada jornada. Ao contrário
medidas paliativas e impactantes ado- meramente econômico, que nos colo-
dos aterros sanitários, os aterros
tadas, como a de afastar dos olhos e ca entre os países com os maiores
controlados geralmente não pos-
das narinas esse incômodo e apresen- PIBs mundiais, destoa do conceito de
suem impermeabilização dos solos
tar uma falsa solução à população. desenvolvimento, que deve ser acom-
nem sistema de dispersão de choru-
Enquanto isso, na região receptora do panhado de melhorias sociais. O dis-
me e gases, sendo comum nestes lo-
lixo está o homem, no posto de sepa- curso adotado é que esse modelo in-
cais a contaminação de águas subter-
rador de lixo, à espera da matéria- dustrial nos levará ao bloco dos países
râneas. (IPT/CEMPRE, 1995). As
prima que possibilite a sua sobrevivên- denominados ricos, e que para isso
Figuras 1 e 2 apresentam imagens de
cia, convivendo com urubus, insetos, tem-se que investir em infra-estrutura,
um lixão e de um aterro sanitário, res-
ratos e suscetível a doenças que atra- aumentando a oferta de combustíveis,
pectivamente.
vés dele voltarão depois para os cen- de matérias-primas, de insumos pro-

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dutivos e de eletricidade. uma alta demanda de recursos, esti- nejadas, de forma racional e integra-
Sevá-Filho (1995) apresenta o mulando a criação de uma sociedade da, leva ao gerenciamento adequado
questionamento pertinente ao fato: se altamente consumista e cujos resul- do lixo, assegurando saúde, bem-estar
com o aumento da demanda os recur- tados são a escassez e o esgotamento e economia de recursos públicos, além
sos vão se tornando escassos, os dos recursos naturais, a poluição do de ir ao encontro de um desejo maior
investimentos vão se tornando maiores meio ambiente e um empobrecimento que é a melhoria da qualidade de vida
e a produção passa a provocar mais da população devido à falsa necessi- das gerações atuais e futuras.
problemas ambientais. O certo não dade de produtos cada vez mais indus- Para o gerenciamento do lixo, é ne-
seria gastar menos, aproveitar melhor trializados, além da continuidade da cessária a existência de um programa
o que se produz, obter bens mais durá- péssima distribuição da renda no país. de educação ambiental que contem-
veis e então aproveitar cada vez mais ple a recusa de consumo de produtos
o lixo assim produzido, e, enfim, alcan- Lixo: uma questão de gerenciamento com alta capacidade de geração de
çar-se uma geração cada vez menor Para o Manual de Gerenciamento resíduos, redução do consumo, reuso
de lixo, de poluição e de miséria? Integrado (IPT/CEMPRE,1995), geren- e reciclagem (conforme será discutido
Necessita-se repensar o tipo de de- ciar o lixo é adotar um conjunto articu- no item “O Programa R3 – Redução de
senvolvimento adotado no Brasil, no lado de ações normativas, operacio- Consumo, Reutilização e Reciclagem
qual se valorizam os altos investi- nais, financeiras e de planejamento, do Lixo”).
mentos em produção sem acompa- com base em critérios sanitários, am- A Tabela 1 apresenta a identificação
nhamento e efetivação de planeja- bientais e econômicos para coletar, das fontes e dos resíduos gerados e
mentos ambientais. A opção por esse tratar e dispor o resíduo sólido munici- os responsáveis pela destinação final
tipo de desenvolvimento vem exigindo pal urbano. A execução de ações pla- sanitariamente adequada.

Tabela 1: Geração e destino de resíduos.


Classificação por origem do lixo (Manual de Gerenciamento Integrado, IPT-CEMPRE, 1995) Responsável pela destinação final
Domiciliar: Aquele originado da vida diária das residências, constituído por restos de alimentos (tais como cascas de Prefeitura
frutas, verduras etc) produtos deteriorados, jornais e revistas, garrafas, embalagens em geral, papel higiênico, fraldas 11
descartáveis e uma grande diversidade de outros itens. Contém, ainda, alguns resíduos que podem ser tóxicos.
Comercial: Aquele originado dos diversos estabelecimentos comerciais e de serviços, tais como supermercados, Prefeitura *
estabelecimentos bancários, lojas, bares, restaurantes etc. O lixo desses estabelecimentos e serviços tem um forte
componente de papel, plásticos, embalagens diversas e resíduos de asseio dos funcionários, tais como papel
toalha, papel higiênico etc.
Público: São aqueles originados dos serviços:
• de limpeza pública urbana, incluindo todos os resíduos de varrição das vias públicas, limpeza de praias, de Prefeitura
galerias, de córregos e de terrenos, restos de podas de árvores etc.;
• de limpeza de áreas de feiras livres, constituídos por restos vegetais diversos, embalagens etc.
Serviços de saúde e hospitalar: Constituem resíduos sépticos, ou seja, que contêm ou potencialmente podem Gerador
conter germes patogênicos. São produzidos em serviços de saúde tais como hospitais, clínicas, laboratórios,
farmácias, clínicas veterinárias, postos de saúde etc. São eles: agulhas, seringas, gaze, bandagens, algodão,
órgãos e tecidos removidos, meios de cultura e animais usados em testes, sangue coagulado, luvas descartáveis,
remédios com prazo de validade vencido, instrumentos de resina sintética, filmes fotográficos e raios X etc. Resíduos
assépticos desses locais, constituídos por papéis, restos da preparação de alimentos, resíduos de limpeza geral
(pó, cinza etc.) e outros materiais que não entram em contato direto com pacientes ou com os resíduos sépticos
anteriormente descritos, são considerados domiciliares.
Portos, aeroportos, terminais rodoviários e ferroviários: Constituem resíduos sépticos, ou seja, aqueles que contêm Gerador
ou potencialmente podem conter germes patogênicos trazidos aos portos, terminais rodoviários e aeroportos.
Basicamente, originam-se de material de higiene, asseio pessoal e restos de alimentação que podem veicular
doenças provenientes de outras cidades, estados e países.
Industrial: Aquele originado nas atividades dos diversos ramos da indústria metalúrgica, química, petroquímica, Gerador
papeleira, alimentícia etc.
O lixo industrial é bastante variado, podendo ser representado por cinza, lodo, óleo, resíduos alcalinos ou ácidos,
plástico, papel, madeira, fibras, borracha, metais, escórias, vidro e cerâmica etc. Nessa categoria inclui-se a grande
maioria do lixo considerado tóxico. Gerador
Agrícola: Resíduos sólidos das atividades agrícolas e da pecuária, como embalagens de adubos, defensivos agrícolas,
ração, restos de colheita etc. Em várias regiões do mundo, esses resíduos já constituem uma preocupação crescente,
destacando-se as enormes quantidades de esterco animal geradas nas fazendas de pecuária intensiva. Também as
embalagens de agroquímicos** diversos, em geral altamente tóxicos, têm sido alvo de legislação específica, definindo
os cuidados na sua destinação final e, por vezes, co-responsabilizando a própria indústria fabricante desses produtos.
Entulho: Resíduos da construção civil, como demolições e restos de obras, solos de escavações etc. O entulho é Gerador
geralmente um material inerte, passível de reaproveitamento.

(*) A prefeitura é co-responsável por pequenas quantidades de resíduos comerciais e entulhos (geralmente menos que 50 kg), e de acordo com a
legislação municipal específica.
(**) Agroquímicos são produtos desenvolvidos pela industria química com a finalidade de matar insetos, microorganismos e espécies de plantas que
possam atrapalhar o desenvolvimento da cultura na qual se tem interesse. Nessa categoria enquadram-se os acaricidas, fungicidas, formicidas, mata-
matos e outros, cujos resíduos podem ser extremamente danosos ao consumidor dos alimentos cultivados nessas condições.

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Tabela 2: Vantagens e desvantagens de diferentes destinações de resíduos.
Discriminação Lixão Aterro sanitário Incinerador Usina de compostagem
Definição Local onde o lixo urbano ou Processo utilizado para a Local onde é feita a queima Local onde a matéria orgâ-
industrial é acumulado de disposição de resíduos sóli- controlada do lixo inerte nica é segregada e subme-
forma rústica, a céu aberto, dos – doméstico e industrial tida a um tratamento que
sem qualquer tratamento. – no solo impermeabilizado, visa a obtenção do compos-
Em sua maioria são clandes- com sistema de drenagem to
tinos para o chorume
Vantagem No curto prazo, é o meio Solução mais econômica, Propicia uma redução no vo- O composto originado pode
mais barato de todos, pois pode ocupar áreas já de- lume de lixo; destrói a maio- vir a ser usado como adubo
não implica em custos de gradadas, como antigas ria do material orgânico e do na agricultura ou em ração
tratamento nem controle minerações material perigoso, que no para animais, e poderá ser
aterro causa problemas; não comercializado. Reduz a
necessita de áreas muito quantidade de resíduos a ser
grandes; pode gerar energia dispostos no aterro sanitário
através do calor
Desvantagem Contamina a água, o ar e o Tem vida útil curta; se não É um sistema caro que ne- Quando implantado com
solo, pois a decomposição houver controle pode rece- cessita de manutenção rigo- técnicas incorretas pode
do lixo sem tratamento pro- ber resíduos perigosos co- rosa e constante. Pode lan- causar transtornos às áreas
duz chorume, gases e favo- mo lixo hospitalar e nuclear. çar diversos gases polu- vizinhas, como mau cheiro e
rece a proliferação de inse- Se não for feito com critérios entes e fuligem na atmosfera proliferação de insetos e
tos (baratas, moscas), ratos de engenharia, pode causar (dioxinas, furanos). Suas roedores, produzindo com-
e germes patológicos, que os mesmos problemas do cinzas concentram substân- postos de baixa qualidade e
são vetores de doença lixão; os materiais recicláveis cias tóxicas com potencial contaminados com metais
não são aproveitados de contaminação do ambi- pesados, se houver falhas
ente na separação
Adaptado de Gonçalves, 1997.

12 Todas as alternativas de tratamento Mesmo na ausência de oxigênio, elétrons como o Mn(IV), nitrato (NO3–),
de lixo apresentam vantagens e des- bactérias do tipo facultativas, que Fe(III) e sulfato (SO42–). Finalmente, na
vantagens, o que por si só já é uma podem viver tanto em condições aeró- escassez destes, uma fração da
boa justificativa para considerar a não bias (presença de oxigênio), quanto em matéria orgânica se reduz produzindo
geração como a melhor opção. Uma condições anaeróbias (ausência de metano (CH4), onde o carbono apre-
avaliação crítica das alternativas de oxigênio), assim como as bactérias estri- senta o seu menor número de oxida-
destinação final de lixo é apresentada tamente anaeróbias, promovem a de- ção possível (-4), enquanto parte da
na Tabela 2. gradação da matéria orgânica, usando matéria orgânica, que transferiu elé-
para isso espécies receptoras de trons para a formação do metano, é
A química e a biologia no aterro
Dentro do aterro sanitário, o resíduo Chorume: impacto ambiental associado à disposição inadequada de lixo
sólido municipal sofre uma decom-
posição promovida por bactérias que Chorume é o líquido que escoa de locais de disposição final de lixo. É resul-
metabolizam a matéria orgânica, pro- tado da umidade presente nos resíduos, da água gerada durante a decom-
duzindo dióxido de carbono e usando posição dos mesmos e também das chuvas que percolam através da massa
para isso alguma espécie química do material descartado. É um líquido com alto teor de matéria orgânica e que
como receptor de elétrons. Tal proces- pode apresentar metais pesados provenientes da decomposição de emba-
so pode ser classificado como um pro- lagens metálicas e pilhas. A composição final do chorume é fruto do tipo de
cesso de respiração, no qual o agente lixo depositado e do seu estado de degradação. Historicamente, os lixões têm
oxidante que comumente atua como sido construídos em vales, nas proximidades ou dentro de leitos de cursos
receptor de elétrons é o oxigênio d’água, o que torna o chorume um agente de comprometimento de recursos
atmosférico (O2). hídricos. Os lixões, por serem na verdade uma mera disposição de resíduos a
Como os aterros sanitários sãs céu aberto, são construídos sobre terrenos que permitem não apenas o escoa-
cobertos com solo e são compactados mento do chorume, mas também a sua infiltração no solo, levando à conta-
com tratores, de modo a minimizar o minação das águas subterrâneas. Ao contrário dos lixões, os aterros sanitá-
acesso de vetores de doenças ao rios, que recebem resíduo sólido municipal urbano (o lixo gerado em nossas
resíduo, o oxigênio atmosférico tam- casas), e os aterros industriais, que recebem resíduo sólido industrial, têm as
bém encontra dificuldade em entrar em suas construções pautadas em normas da Associação Brasileira de Normas
contato com o lixo e a sua concen- Técnicas (ABNT), que prevê impermeabilização do terreno e o tratamento do
tração diminui até valores não signifi- chorume gerado. Poços de monitoração abertos nas proximidades do aterro
cativos, à medida que a matéria orgâ- permitem a avaliação constante da qualidade das águas subterrâneas e a
nica é oxidada. tomada de decisões em caso de eventuais infiltrações.

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A capacidade de oxidação de dife-
Dioxinas e furanos: um risco em processos de incineração rentes espécies receptoras de elétrons
Vários materiais, quando queimados, podem levar à formação de dioxinas. está associada ao ganho energético
Mesmo quando realizados em incineradores liberam no meio ambiente várias proveniente de cada reação, onde o
substâncias congêneres da dioxina. Tais compostos são produzidos em baixas oxigênio participa como a espécie
concentrações, como resíduos da queima de matéria orgânica em presença química que pode propiciar a maior
de produtos que contenham cloro. A produção de dioxinas pode ser evitada variação de energia livre associada,
ou minimizada se forem empregadas altas temperaturas na incineração, visando que é dada, numericamente, pela
assegurar a combustão completa dos resíduos. Como conseqüência de seu subtração do valor energético contido
amplo espalhamento no meio ambiente, bem como de seu comportamento nos produtos do valor contido nos rea-
lipofílico (tendência em se dissolver em gorduras e não em meio aquoso), as gentes. Se esse resultado é negativo,
dioxinas são biomagnificadas ao longo da cadeia alimentar, ou seja, como a é porque houve liberação de energia
eliminação de materiais lipossolúveis é mais lenta do que a dos hidrossolúveis, para o ambiente exterior, ou seja, os
ocorre uma bioacumulação de dioxinas em cada organismo. Como os orga- produtos encerram um conteúdo ener-
nismos do início da cadeia alimentar são presas dos organismos do topo (dentre gético menor do que o dos reagentes.
eles o homem), tem-se um aumento da concentração do contaminante nos Essa energia liberada é utilizada pelos
organismos predadores, que representam o topo da cadeia alimentar. Mais de microorganismos que promovem a
90% da exposição humana às dioxinas é atribuída aos alimentos que ingerimos, reação de modo a mantê-los vivos.
particularmente carne, peixe e produtos lácteos. Dioxinas e furanos (um grupo Quanto maior a quantidade de ener-
de compostos que lembra a dioxina em termos de estrutura) estão presentes gia liberada, no caso de reações inter-
em peixes e carnes, exibindo concentrações da ordem de dezenas a centenas mediadas por microorganismos,
de picogramas (1 pg = 10-12 grama) por grama de alimento. Em outras pala- melhor é o processo do ponto de vista
vras, ocorrem em concentrações de parte por trilhão; ou seja, seria necessário bioquímico, pois maior será a relação
consumir um milhão de toneladas de alimentos para ingerir alguns gramas de entre a energia obtida para a manuten-
dioxinas ou furanos. No entanto, quantidades bem menores do que 1 grama e ção dos processos vitais e a quanti-
a exposição crônica a tais contaminantes podem causar sérios efeitos deletérios. dade de substrato metabolizado. 13
Em estudos envolvendo animais, uma dose diária de 1 nanograma de 2,3,7,8- Uma vez dentro do aterro, a matéria
TCDD por quilograma de massa corpórea por dia tem sido suficiente para orgânica não está imediatamente
ocasionar o surgimento de câncer. Com base nesses estudos, o governo pronta para transformar-se em metano
canadense fixou como limite máximo de exposição às dioxinas e furanos o e dióxido de carbono. Condições
valor de 0,010 ng/kg/dia, estabelecendo assim um fator de segurança de 100 ambientais adequadas de pH e tempe-
vezes em relação ao estudo realizado. Embora os furanos não sejam compos- ratura têm um importante efeito sobre
tos tão estudados quanto as dioxinas, acredita-se que ambas as classes exibam a sobrevivência e o crescimento dos
os mesmos padrões de toxicidade. Estruturas típicas de uma dioxina e de um microorganismos. Geralmente a otimi-
furano são apresentadas a seguir: zação do crescimento ocorre dentro de
uma estreita faixa de valores de pH e
Cl Cl temperatura. Geralmente o pH ótimo
para o crescimento de microorganis-
Cl O Cl mos situa-se entre 6,5 e 7,5, embora
danos às suas estruturas celulares só
sejam observados em valores de pH
O superiores a 9,0 e inferiores a 4,5. De
Cl O Cl
2, ,7, -te ra lor di en o- -di xina Cl acordo com a temperatura em que as
(2, ,7, -TCDD) 1,4,9-triclorodibenzofurano bactérias atuam de modo mais eficien-
te na degradação da matéria orgânica,
Tais estruturas podem apresentar-se de diferentes formas, com maior ou elas são classificadas como criofílicas
menor número de átomos de cloro ligados aos anéis aromáticos. A molécula (-10-30 °C), mesofílicas (20-50 °C) e
do 2,3,7,8 - TCDD é popularmente conhecida pelo nome ‘dioxina’ sendo a termofílicas (45-75 °C).
mais tóxica dos 75 isômeros de compostos clorados de dibenzo-p-dioxina Na decomposição anaeróbia de
existentes (Baird, 1995). resíduos, muitos microorganismos tra-
balham em conjunto para converter a
porção orgânica de tais resíduos em
transformada em CO2, caracterizando mas vezes percebidos pelo cheiro produtos estáveis. Em uma primeira
a digestão anaeróbia do resíduo. desagradável que emanam, uma vez fase, denominada hidrólise, um grupo
Na natureza os processos anae- que a respiração que utiliza o SO2-4 de microorganismos é responsável por
róbios ocorrem comumente em am- como receptor de elétrons produz H2S, hidrolisar material orgânico polimérico,
bientes onde a entrada de oxigênio é com seu característico cheiro de ovo lipídios e outras moléculas de alto pe-
dificultada. Tais processos são algu- podre. so molecular, transformando-os em

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Receptores de elétrons em processos respiratórios
São apresentadas a seguir algumas reações de processos respiratórios onde se assume como matéria orgânica
(M.O.) a fórmula geral [(CH2O)106(NH3)16(H3PO4)] e que todas as reações ocorrem à mesma temperatura. Diferentes
receptores de elétrons propiciam diferentes rendimentos energéticos. Observa-se o maior ganho quando o O2 é reduzido
(Froelich et al., 1979).
M.O. + 138O2 → 106CO2 + 16HNO3 + H3PO4 + 122H2O (1)
∆Gº = - 3.190 kJ/mol
M.O. + 236MnO2 + 472H+ → 236Mn 2+ + 106CO2 + 8N2+ H3PO4 + 366H2O (2)
∆Gº = - 3.090; - 3.050; - 2.920 kJ/mol (dependendo da forma alotrópica do MnO2)
M.O. + 94,4HNO3 → 106CO2 + 55,2N2 + H3PO4 + 177,2H2O (3a)
∆Gº = - 3.030 kJ/mol
M.O. + 84,8HNO3 → 106CO2 + 42,4N2 + 16NH3 + H3PO4 + 148,4H2O (3b)
∆Gº = - 2.750 kJ/mol
M.O. + 212Fe2O3 + 848H + → 424Fe 2+ + 106CO2 + 16 NH3 + H3PO4 + 530H2O (4)
∆Gº = - 1.410 kJ/mol
M.O. + 53SO42– → 106 CO2 + 16NH3 + 53S2– + H3PO4 + 106H2O (5)
∆Gº = - 380 kJ/mol
M.O. → 53CO2 + 53CH4 + 16NH3 + H3PO4 (6)
∆Gº = - 350 kJ/mol
14
Neste sistema ilustrativo, supõe-se a matéria orgânica como o único doador de elétrons e O2, NO3 –, Fe2O3, MnO2 e
SO42– como únicos receptores. A energia livre de Gibbs para cada reação foi calculada para as condições normais de
temperatura e assumiu-se o valor do pH como constante e igual a 7,0. A ordem de liberação de energia apresentada não
implica, necessariamente, que o receptor de elétrons que propicia maior liberação de energia tenha que ser exaurido para
que outro receptor de elétrons, envolvido em uma reação com menor variação de energia livre, participe da oxidação da
matéria orgânica. O valor da variação de energia livre indica apenas a ordem de preferência termodinâmica, onde alguns
processos podem ocorrer de modo simultâneo. Um dos produtos de redução ocasionados pela matéria orgânica na
respiração de sulfato, o sulfeto (reação 5), apresenta a capacidade de imobilizar metais na forma de sulfetos metálicos,
sendo este um fator determinante da biodisponibilidade e toxicidade de metais (Morse et al., 1987).

açúcares, aminoácidos, peptídios e co. Finalmente, um quarto grupo de à formação de metano (Tchobanoglous
compostos relacionados, em um bactérias, denominadas metanogê- et al., 1993).
processo no qual a atuação de enzi- nicas, converte os produtos da tercei- De uma forma simplificada, as eta-
mas é de fundamental importância. A ra etapa em metano (Tchobanoglous pas da digestão anaeróbia de resíduos
segunda fase contempla a transforma- et al., 1993; Vazoller, 1999). podem ser vistas conforme mostrado
ção dos produtos da primeira etapa em A descrição do processo em quatro na Figura 3.
ácidos graxos de cadeia longa, ácidos etapas é uma simplificação dos com-
propiônico e butírico, além de uma plexos mecanismos envolvidos no
parcela de ácidos fórmico e acético. metabolismo anaeróbio. Acredita-se Formação de metano a partir de
Nessa etapa, a razão entre as formas que mais de 130 espécies de diferen- diferentes substratos
protonada e desprotonada dos ácidos tes microorganismos podem coexistir 4H2 + CO2 → CH4 + 2H2O
será fruto da constante de ionização dentro de um mesmo reator (Soubes,
4HCOOH → CH4 + 3CO2 + 2H2O
de cada ácido envolvido e do pH do 1994), dentre eles espécies de bacté-
meio, sendo comum a referência na rias, fungos, leveduras e actinomicetos CH3COOH → CH4 + CO2
literatura, por exemplo, tanto ao ácido (Tchobanoglous et al., 1993). Os pro-
4CH3OH → 3CH4 + CO2 + 2H2O
acético quanto ao seu ânion acetato. dutos apontados em cada etapa são
A terceira etapa, denominada comu- predominantes, porém não os únicos 4(CH3)3N + 6H2O → 9CH4 +
mente de acidogênese, envolve a a serem obtidos. Uma ilustração dessa 3CO2 + 4NH3
transformação dos ácidos de cadeias complexidade é demonstrada pelo fato
4CO + 4H2O → CH4 + 3CO2 +
que contêm mais do que três átomos de que não são apenas os ácidos fór-
2H2O
de carbono em ácidos acético e fórmi- mico e acético os substratos que levam

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Polímeros complexos e outros inóculo pode ser resíduo de outras fon-
materiais orgânicos de alto tes ou de lodo de esgoto.
Compostos obtidos a partir de resí-
(proteí ídeos, etc.) duos de diferentes origens podem ser
misturados de modo a se obterem
Hidrólise razões C/N ótimas, que permitam sua
incorporação ao solo, como fertili-
Monô ômeros zantes. Contudo, o uso de compostos
(açú á ídeos) como fertilizantes exige um cuidadoso
estudo das características microbioló-
Acidogênese gicas e ecotoxicológicas, bem como a
escolha da cultura que será desenvol-
Ácidos propiônico e butírico etc. vida, antes da tomada da decisão de
(á aplicação em solos.

Acetogênese A relação carbono/nitrogênio


Um fator crítico para a compos-
Ácido fórmico Ácido acético
tagem de resíduos é a relação C/N,
cuja faixa ótima é de 20-25 para 1.
Metanogênese
Espécies químicas que contêm nitro-
Metano, dióxido de carbono gênio atuam como nutrientes nos
e água processos de degradação da matéria
orgânica. Resíduos pobres em nitro-
gênio, como jornais, que apresentam
Figura 3: Etapas da digestão anaeróbia (Adaptada de Vazoller, 1999).
relação C/N de aproximadamente 980,
devem ser misturados a outros resí- 15
duos mais ricos em nitrogênio. Em
Uma das características da diges- Compostagem de resíduos processos de compostagem, a relação
tão anaeróbia é a obtenção de um pro-
O processo aeróbio pode ser em- C/N comumente diminui ao longo do
duto, o gás metano, que encerra um
pregado no tratamento de resíduos só- tempo, pois o carbono é eliminado
conteúdo energético relativamente al- lidos municipais urbanos de origem para a atmosfera na forma de CO2 e/
to, que pode ser utilizado para movi- orgânica e também no tratamento de ou CH4. O aumento da quantidade
mentar veículos, gerar eletricidade ou tais resíduos dispostos conjuntamente relativa de nitrogênio, um importante
propiciar aquecimento. Tal conteúdo com lodo gerado em estações de tra- nutriente para culturas agrícolas, torna
energético é fruto da baixa liberação tamento de esgotos domésticos. Tais o composto potencialmente utilizável
de energia observada durante a meta- processos envolvem a preparação de como fertilizante agrícola, desde que
nogênese, energia conservada no pro- pilhas na forma de leiras, nas quais se observados outros parâmetros sanitá-
duto, conforme pode ser inferido a par- injeta ar por meio de tubos perfurados rios de interesse, como presença de
tir da comparação entre as reações 1 introduzidos no resíduo, ou então por organismos patogênicos, metais pesa-
e 6. meio do constante revolvimento do ma- dos e substâncias orgânicas tóxicas.
A viabilidade econômica do uso do terial submetido à compostagem.
metano como fonte de energia é ainda Durante o processo aeróbio da O Programa R3 – redução de consumo,
questionável devido à presença no gás compostagem, atua uma sucessão de reutilização e reciclagem do lixo
de impurezas como o H2S, que pode microorganismos facultativos e aeró- A Agenda 21 trata, em seu capítulo
ocasionar corrosão em motores de bios estritos. Na fase inicial, bactérias 21, do ‘manejo ambientalmente sau-
combustão interna. Em aterros sani- mesofílicas são observadas em maior dável dos resíduos sólidos e questões
tários, os gases de compostos redu- proporção e à medida que a tempe- relacionadas com os esgotos’ e
zidos são queimados, minimizando-se ratura vai aumentando, as termofílicas propõe, no item 21.4, a utilização de
assim o mau cheiro do H2S e o efeito começam a predominar. Fungos ter- um manejo integrado nas questões
estufa relacionado à emissão de me- mofílicos aparecem depois de 5 a 10 relacionadas aos resíduos, conforme
tano, que apresenta um potencial de dias e, no estágio final do processo, segue:
absorção de radiação infravermelha e conhecido como período de cura, acti- • O manejo ambientalmente sau-
aquecimento da atmosfera muito maior nomicetos e fungos filamentosos co- dável dos resíduos deve ir além do sim-
do que o observado para o CO2. Como meçam a surgir. Como nem todo resí- ples depósito ou aproveitamento por
efeito dessa queima ocorre também a duo é rico em microorganismos, alguns métodos seguros dos resíduos gera-
emissão de SO2, o que representa um tipos de materiais, como papéis, dos, buscando resolver a causa funda-
incremento na incidência de chuvas exigem a adição de um inóculo apro- mental do problema e procurando mu-
ácidas. priado para iniciar-se o processo. Tal dar os padrões não sustentáveis de

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Em alguns casos, pode ser viável a
Efeitos causados por alguns metais pesados ao homem
queima em incineradores com rigoroso
Elemento Onde é encontrado Efeitos controle da qualidade dos gases emi-
Mercúrio • equipamentos e aparelhos elétricos • distúrbios renais
tidos e dos resíduos remanescentes,
de medida • distúrbios neurológicos ou ainda a combustão em fornos de
• produtos farmacêuticos • efeitos mutagênicos fabricantes de cimento. Alternativas co-
• lâmpadas de néon, fluorescentes e • alterações no metabolismo mo compostagem aeróbia e disposi-
de arco de mercúrio • deficiências nos órgãos ção em aterros sanitários ou industriais
• interruptores sensoriais também são viáveis. Contudo, inú-
• baterias/pilhas
meros impactos ambientais poderiam
• tintas
• antissépticos ser associados a cada uma das
• fungicidas opções de tratamento citadas ou a
• termômetros qualquer outra que venha a ser criada.
O verdadeiro desafio pertinente à
Cádmio • baterias/pilhas • dores reumáticas e miálgicas questão do lixo, seja ele de que natu-
• plásticos • distúrbios metabólicos
reza for, diz respeito a como não gerar
• ligas metálicas levando à osteoporose
• pigmentos • disfunção renal tal lixo ou, ao menos, minimizar a ge-
• papéis ração. Havendo essa opção, assume-
• resíduos de galvanoplastia se que o melhor seria não gerar lixo,
mas essa é uma alternativa nem sem-
Chumbo • tintas, como as de sinalização de rua • perda de memória pre viável, uma vez que o modelo de
• impermeabilizantes • dor de cabeça
• anticorrosivos • irritabilidade
vida adotado globalmente é pautado
• cerâmica • tremores musculares na produção e no consumo, que têm
• vidro • lentidão de raciocínio como conseqüência a geração de resí-
16 • plásticos • alucinação duos. Contudo, com alguma reflexão
• inseticidas • anemia e auxílio de programas de educação
• embalagens • depressão
ambiental, podemos nos habituar en-
• pilhas • paralisia
quanto consumidores a exercer deter-
(Fonte: IPT-CEMPRE, 1995) minados tipos de escolha de emba-
lagens de produtos, rejeitando por
exemplo aqueles que possuem invólu-
cros múltiplos e às vezes desneces-
produção e consumo. Isso implica na constituir uma estrutura ampla e ambi-
sários e dando preferência a embala-
utilização do conceito de manejo entalmente saudável para o manejo
gens retornáveis em detrimento às des-
integrado do ciclo vital, o qual apre- dos resíduos sólidos municipais. A
cartáveis, bem como minimizando des-
senta oportunidade única de conciliar combinação de atividades e a impor-
o desenvolvimento com a proteção do tância que se dá a cada uma dessas perdícios dentro de casa. A recusa de
meio ambiente. quatro áreas variarão segundo as tais produtos com múltiplas em-
Em seu item 21.5, aponta a neces- condições sócio-econômicas e físicas balagens representa a consolidação
sidade de ações e formulação de obje- locais, as taxas de produção de resí- de um quarto e importante ‘R’ ao pro-
tivos centrando-se em quatro principais duos e a compo- grama, que força a indústria a ter uma
áreas de programas relacionados com sição destes. To- atitude ambientalmente
O verdadeiro desafio responsável por pressão
os resíduos, a saber: dos os setores da pertinente à questão do
a) redução ao mínimo dos resíduos; sociedade devem do mercado consumidor.
lixo, seja ele de que
b) aumento ao máximo da reutili- participar em to- Atitudes como essas, se-
natureza for, diz respeito a
zação e reciclagem ambientalmente das as áreas de gundo um recente estudo
como não gerar tal lixo ou,
saudáveis dos resíduos; programas. realizado por Teixeira
ao menos, minimizar a
c) promoção do depósito e trata- Nesse contex- geração (1999), podem reduzir em
mento ambientalmente saudáveis dos to, serão apresen- até 50% a quantidade de
resíduos; tadas as várias opções para a disposi- resíduos sólidos domés-
d) ampliação do alcance dos ser- ção final e o tratamento de resíduos ticos encaminhados aos aterros. Uma
viços que se ocupam dos resíduos. sólidos, sejam estes de origem domés- vez minimizada a geração, parte-se
E, no item 21.6, alerta para as qua- tica, hospitalar, agrícola ou industrial, para a avaliação do reuso dos resí-
tro áreas de programas estarem corre- envolvendo a aplicação dos 3 Rs – duos, que se nas nossas casas apre-
lacionadas e se apoiando mutuamen- redução do consumo e desperdício, senta um leque de opções relati-
te, devendo estar integradas a fim de reutilização de resíduos e reciclagem. vamente limitado, pode apresentar um

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maior número de opções em relação economicamente recicláveis. A separa- independentes em cada área onde a
a resíduos industriais e agrícolas. ção de materiais do lixo aumenta a atividade humana afeta o meio ambien-
A terceira etapa da minimização do oferta de materiais recicláveis. Entre- te, visando atingir o chamado de-
descarte envolve a reciclagem, que é tanto, se não houver demanda de pro- senvolvimento sustentável. Segundo a
facilmente explicada pela já difundida dutos reciclados por parte da socie- Comissão Mundial sobre o Meio
teoria de que resíduo nada mais é do dade o processo é interrompido, os Ambiente e o Desenvolvimento, “O de-
que um material não adequadamente materiais abarrotam os depósitos e, senvolvimento sustentável é aquele
localizado no espaço e no tempo. Ou por fim, são aterra- que atende às necessi-
seja, aquilo que é considerado um resí- dos ou incinerados dades do presente sem
A aparente utopia de um
duo hoje pode não sê-lo amanhã, como rejeitos (IPT- comprometer a possi-
meio ambiente que
assim como o que uma determinada CEMPRE, 1995). bilidade de as gera-
concilie desenvolvimento
pessoa ou grupo de pessoas classifica Apenas quando ções futuras satisfa-
associado a sustentatibi-
como resíduo pode ser matéria-prima estiverem esgotadas zerem suas próprias
lidade ambiental, quali-
para outra. O entendimento da neces- as alternativas de dade de vida e igualdade necessidades”
sidade da segregação na fonte, ou redução de consu- social só será alcançada Dentro de tal enfo-
seja, da separação adequada dos ti- mo, reuso e recicla- com muita reflexão, boa que, considera-se que:
pos de resíduos por seus geradores, gem é que se deve vontade e esforços pessoal • as necessidades
é essencial para facilitar o trabalho do fazer a opção pelo e comunitário dos pobres são prio-
reciclador, assim como a colocação do tratamento, levando- ritárias;
material reciclado no mercado, en- se em consideração o ônus ambiental • por desenvolvimento entende-se
quanto matéria-prima ou produto aca- de cada alternativa que possa vir a ser o progresso humano, em todas as
bado. adotada. O mesmo raciocínio vale para suas facetas – cultural, econômica, so-
o setor produtivo, onde a busca por cial e política –, que deve ser possível
Reciclagem tecnologias menos impactantes, cha- em todos os países;
É o resultado de uma série de ativi- madas também ‘limpas’, é essencial • essa sustentabilidade não é rígi- 17
dades através das quais materiais que para a manutenção da qualidade de da; antes, deve admitir a possibilidade
se tornariam lixo ou estão no lixo são vida no planeta. Tais tecnologias devem de mudanças, às quais se reage com
desviados, sendo coletados, sepa- ser avaliadas dentro de uma ótica do adaptações;
rados e processados para uso como ciclo de vida dos produtos, ou seja, • está implícita uma preocupação
matéria-prima na manufatura de bens, levando-se em conta todos os impac- com a igualdade social entre as pes-
feitos anteriormente apenas com ma- tos ambientais envolvidos desde a soas de uma mesma geração e entre
téria-prima virgem. primeira etapa de obtenção da maté- as pessoas de uma geração e de ou-
ria-prima, passando-se pela fabrica- tra.
Benefícios da reciclagem ção, utilização, alternativa de reuso, re- A Agenda 21 é um documento de
• diminui a quantidade de lixo a ser ciclagem e alternativas de disposição 700 páginas que se subdividem em 40
aterrado (conseqüentemente aumenta final do produto quando o mesmo não capítulos. A versão em português do
a vida útil dos aterros sanitários); se prestar mais a fim algum. documento completo foi publicada no
• preserva os recursos naturais; Diário Oficial da União como suple-
• economiza energia; A genda 21 e desenvolvimento mento ao número 146, do dia 2 de
• diminui a poluição do ar e das sustentável agosto de 1994.
águas; A Agenda 21 é um documento que Cooperativas de catadores
• gera empregos, através da cria- surgiu a partir de discussões condu-
A formação de associações e coo-
ção de indústrias recicladoras. zidas durante a Con-
perativas de catadores de lixo repre-
A reciclagem, no ferência das Nações
A reciclagem não pode ser senta a alternativa de saída do homem
entanto, não pode Unidas para o Meio
vista como a principal dos lixões e o resgate da sua condição
ser vista como a prin- Ambiente e Desenvol-
solução para o lixo; ela é de cidadão, com direito a benefícios
cipal solução para o vimento, a ECO-92, sociais, educação para os filhos, auto-
uma atividade econômica
lixo. É uma atividade realizada no Rio de nomia administrativa e possibilidade de
que deve ser encarada
econômica que deve Janeiro entre 3 e 14 de ascensão social. A cooperativa deve
como um elemento dentro
ser encarada como junho de 1992. É um oferecer aos seus membros assistên-
de um conjunto de soluções
um elemento dentro programa de ação cia jurídica, cursos de aperfeiçoamento
de um conjunto de abrangente, a ser im- e acesso ao lazer/esporte, desenvol-
soluções. Estas são integradas no plementado pelos governos, agências vendo no catador criticidade e matu-
gerenciamento do lixo, já que nem de desenvolvimento, organizações das ridade para tomar posição nas deci-
todos os materiais são técnica ou Nações Unidas e grupos setoriais sões dentro da cooperativa e até uma

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visão política sobre o seu país e o com muita reflexão, boa vontade, UFSCar, mestre em engenharia em recursos
esforços pessoal e comunitário, hídricos e saneamento e doutor em química
mundo em que vive.
ambiental, ambos pela UNICAMP, é professor na
A aparente utopia de um meio disposição e ações políticas aliadas
PUC-Campinas. Almerinda Antonia Barbosa
ambiente que concilie desenvol- ao fundamental entendimento de que Fadini, graduada em geografia pela PUC-Cam-
o planeta como um todo é afetado pinas, mestre em geociências e meio ambiente e
vimento associado a sustentati-
por cada atitude isolada. doutoranda em geografia, ambos pela UNESP de
bilidade ambiental, qualidade de vida Rio Claro, é professora na Universidade São Fran-
e igualdade social só será alcançada Pedro Sérgio Fadini, graduado em química pela cisco, em Bragança Paulista.

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