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Conferência

Memórias com Alma nos


Cantares da Quaresma e
Semana Santa em Loriga

por:
Joaquim Pinto Gonçalves
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Tendo em conta que o culto dos mortos se tem


revestido de ritualizações de diversa ordem,
convém referir aqui o que os Antropólogos pensam
acerca do assunto. Trata-se, sem dúvida, de
explicar como é que desde os primórdios, o Homem
lidou com o “Mito” da morte e foi ritualizando o seu
comportamento em função daquilo em que, a cada
momento, acreditava.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 É um facto, mais que provado que, sempre que o


homem não encontra explicação para um
determinado fenómeno refugia-se no mito, isto é,
cria uma abstracção que possa dar resposta às
suas limitações. Os Deuses, numa primeira análise
e os mitos, duma forma geral, são respostas para
as ansiedades e limitações do homem.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Do Mito ao Rito tudo se passa numa relação


estreita de causa e efeito. Um dá origem ao outro.
Os ritos existem porque existem mitos. No entanto,
a existência de mitos também se pode explicar pela
necessidade que o homem tem de ritualizar certos
comportamentos.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 O mundo dos Mitos não é o dos seres sem corpo


que são os deuses? Aquele em que as leis da
matéria e da vida são abolidas? Aquele em que o
pensamento parece liberto de todo o
constrangimento e se mostra capaz de criar
mundos, monstros e histórias desprovidas de
raízes?
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Mas poder-se-ia dizer o mesmo dos sonhos. Sabe-


se, com efeito, hoje que o sono desprovido de
sonhos não é reparador. Sonhar é pois necessário
tanto como dormir, para sobreviver. Ora, certos
caracteres dos mitos, caracteres que os assemelham
aos sonhos, permitem-nos interrogarmo-nos se eles
não são uma condição também indispensável ao bom
funcionamento do pensamento acordado, como os
sonhos o são em relação ao sono.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Em todas as partes do mundo, as sociedades


parecem ter pressentido que os mitos e os sonhos
são muito daquilo que há de mais significativo no
destino humano e a ligação entre a interpretação dos
sonhos e a referência aos mitos está presente, antes
mesmo do nascimento da psicanálise, naquilo que
pode ser considerado como a pri­meira teoria
propriamente etnológica do mito, a teoria animista
proposta ao longo da segunda metade do século XIX
por E. B. Taylor especialmente.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Para ele são as ilusões do sonho que engendraram a


crença nas almas e nos espíritos de que tudo para os
«primitivos» estava povoado. Os mitos são, desde
então, concebidos como o fruto de crenças,
resultando estas de uma análise confusa da
realidade.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

O Culto dos Mortos no


Contexto Cultural
Português
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Era na crença na imortalidade da alma e dos


sofrimentos a que estava sujeita na outra vida, que
assentava a piedosa prática da “encomendação dos
mortos”. Trata-se de costumes preservados pela
tradição, que lembram aos vivos, a transitoriedade
da passagem e acendem o terror da morte e o
respeito pelo Juízo Final
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Apenas uma minoria, estou em crer, podiam ou


podem enfrentar a morte como a transformação
providencial que conduz a uma vida futura, condição
impreterível e necessária para que a mesma vida se
produza. E mesmo quando os crentes encaram esse
momento doloroso como um descanso eterno, o
cumprimento da promessa salvífica de Deus aos
homens, a generalidade das pessoas não pode deixar
de olhar com dor e rejeição a perda dos entes mais
queridos.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Na nossa cultura, o animismo, como crença na


existência de uma alma, encontrava-se também
presente.

 A sobrevivência de uma parte espiritual do ser,


mesmo após a morte, vem provavelmente de um
período arcaico da evolução cultural do homem,
provavelmente do Neolítico.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Segundo a concepção popular, essa alma, que se


separava do corpo com a morte, errava durante
algum tempo, revelando-se aos vivos, geralmente
para dar a conhecer a necessidade em que se
encontravam de fazer cumprir algumas promessas
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Esta tradição do aparecimento das almas era muito


antiga no nosso país e encontra-se amplamente
documentada. Regra geral, segundo a crença, as
almas devem ser requeridas três vezes. Esta
interacção dilata o período entre a pergunta e a
resposta, dando quer ao emissor quer ao receptor
oportunidade para se recomporem.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Realmente, a momentânea interacção dos dois


mundos opostos, o dos vivos e o dos mortos,
provocava em cada um dos intervenientes um
traumatismo profundo, de que só o tempo poderia
ajudar a recompor. Um aspecto da prática, cristã na
sua essência, mas a que se encontravam associados
vestígios pagãos, dizia respeito às almas do
purgatório.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 A "encomendação das almas" era uma exteriorização


desse culto, muito viva entre os séculos XVII e XIX,
mas que tem vindo a desaparecer. Para essa
degradação contribuiu certamente a defesa da
ortodoxia por parte da Igreja Católica, afastando da
vivência dos crentes alguns costumes que se
encontram eivados de simbologia mágico-pagã.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 À tradição piedosa relacionada com o culto dos


mortos, juntava-se igualmente o medo devido à
possível possessão de um corpo vivo pelo espírito do
falecido.

 Segundo a crença, tal ocorrência era frequente,


escolhendo os espíritos para sua morada transitória
na terra, o corpo de algum parente ou amigo.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Hoje, como no passado, considera-se que estas


almas estão ligadas à escuridão e à noite. Procuram
com frequência apropriar-se dos corpos vivos,
especialmente dos daqueles que consideram
causadores do seu posicionamento no limbo, espaço
vago entre o purgatório e o inferno, esquecido por
Deus, onde aguardam em sofrimento o seu
“despacho”. Para estas almas, a cerimónia da
“encomendação” actua como um refrigério".
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 É um ritual de luto e dor. Pratica-se pela Quaresma,


quando a morte e o sofrimento de Jesus está
presente, quando a Igreja e os fiéis trajam de negro.
O sem sentido trágico da vida alonga-se na escuridão
da noite, quando vozes inidentificadas dão voz aos
nossos sofrimentos íntimos.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Lembram-se os nomes dos defuntos, pergunta-se-


lhes porque morreram, lamenta-se com lágrimas a
sua descida ao sepulcro. E, convocam-se os vivos a
orar pelos que partiram. Sentados à lareira, enquanto
as chamas brincam traçando cruzes no escuro, ou
preparando-se para dormir, os ainda vivos recordam
os seus mortos e rezam as orações solicitadas:
“Padre-nosso...”
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Às vozes soturnas, ecoando por montes e vales,


respondia a toada triste das orações dos que em
suas casas, cumpriam o preceito de rezar pelos
mortos: “Ave-Maria......”

ARAÚJO, Maria Benedita, Superstições Populares Portuguesas, Ed. Colibri, Lisboa,1997 e


LEÇA, Armando, Música Popular Portuguesa, Ed. Domingos Barreira, Porto 1945.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular

 Às vozes soturnas, ecoando por montes e vales,


respondia a toada triste das orações dos que em
suas casas, cumpriam o preceito de rezar pelos
mortos: “Ave-Maria......”

ARAÚJO, Maria Benedita, Superstições Populares Portuguesas, Ed. Colibri, Lisboa,1997 e


LEÇA, Armando, Música Popular Portuguesa, Ed. Domingos Barreira, Porto 1945.
O Contexto do Culto dos Mortos
na Tradição Popular
 Também a Igreja Católica explica este
Ritual ligado às Exéquias…

 Ouçamos o Pe. António Rego.


O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

Contexto e Forma
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Em Loriga, desde crianças, habituámo-nos a ouvir
falar da «Ementa das Almas», no entanto, o termo
actualmente mais usado, segundo Sousa Viterbo, é
«amentar», que quer dizer: “Quando os pastores
da Igreja rezam pelos defuntos”. Estes Cânticos
que fazem parte da “Ementa das Almas”
(Encomendação das Almas, na sua designação mais
corrente) existem em Loriga, pelo menos desde o
Séc. XVIII.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Entoados nos primeiros tempos por vozes, juntou-
se-lhes o instrumental, a partir do momento em
que surgiu na vila uma banda de música – 1906.

 A “Ementa das Almas” é, no fundo, uma versão


popular da “Liturgia dos Mortos” da Igreja Católica,
como pudemos constatar pela explicação do Pe
Rego.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Todos os anos, nas madrugadas de Sábado para
Domingo, durante a Quaresma, o silêncio da noite
é quebrado pelo ecoar dos Cânticos da “Ementa
das Almas”, graças à boa vontade de uns tantos
(não muitos) Loriguenses, que teimam em manter
viva esta tradição.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Durante cerca de 2 horas, entre as quatro e as seis,
desenrola-se este diálogo cantado, por vários
homens que subindo aos pontos mais altos da vila,
despertam o povo que dorme, para a recordação
dos que já morreram. Aqui e ali, o diálogo é
interrompido por uma badalada do sino da torre da
Igreja, onde se encontra um dos participantes
neste ritual, seguido de um período de silêncio – o
necessário para que se reze um Pai nosso... uma
Avé Maria...
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Para além desta melodia, salientamos na tradição


de Loriga “Os Martírios”, cantados Sexta-Feira
Santa e cuja construção se nos afigura como
modal. Sendo tonal a música que estamos
habituados a ouvir, esta soa-nos aos ouvidos como
algo estranho. Como se não fizesse parte (como
não faz) do nosso quotidiano.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 No final deste diálogo, o grupo junta-se no adro da
Igreja e inicia-se uma outra fase deste Rito. a
“arruada”.

 Esta é uma espécie de “Via Sacra” realizada pelo


grupo de homens que canta a “Ementa” e mais
alguns que se lhes juntam, posteriormente, para
aumentar o número de vozes e assim, melhor se
fazerem ouvir pelos que não acordaram.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Na arruada, cantam-se os “Passos” dando conta
das várias etapas do caminho de Cristo até ao
Calvário. Trata-se, como já dissemos de uma
espécie de “Via Sacra”, cantada pelo grupo, no final
da “Ementa”.

 Sexta Feira Santa, durante a arruada canta-se a


“Mãe Dolorosa”, cântico que lembra as dores que
Maria sentiu pela paixão e morte do seu Filho.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Esta tradição mantém-se, independentemente das


condições climatéricas. O período quaresmal,
normalmente em Fevereiro e Março, é tempo de
grandes nevões na região da Serra da Estrela. Mas,
nem mesmo os nevões impedem que se cumpra a
tradição.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Michel Giacometti, etnomusicólogo francês, nascido
na Córsega, desenvolveu em Portugal onde se
radicou, um importante trabalho ao nível da
recolha, sistemática da música popular. Trabalhou
de perto com Fernando Lopes Graça, um dos
nomes mais significativos da música portuguesa do
Século XX. Giacometti, esteve em Loriga em 1988,
precisamente para ouvir e recolher, (para uma
Antologia da Música Religiosa Popular, que não
chegou a editar, devido ao seu falecimento) as
músicas da “Ementa das Almas” de Loriga.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Posteriormente ao agradecer a António Ascensão a
sua ajuda nesta recolha, dizia que os “espécimens”-
assim lhes chamava - recolhidos em Loriga eram
dos mais interessantes com que tinha tido
contacto.

 E efectuou recolhas com a colaboração de


Fernando Lopes Graça, um pouco por todo o país.
O Cancioneiro que publicaram incluiu alguns
exemplos de “Encomendações das Almas” dos
quais falamos no nosso trabalho de investigação.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

A Construção Musical e a
Forma Modal
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Para situarmos a origem desta tradição dos


loriguenses, teremos, forçosamente, que recuar até
à origem do canto litúrgico ou mesmo antes, se
atendermos que Loriga já existia no contexto da
Lusitânia.
 Vamos quedar-nos pela época da origem do canto
litúrgico, pois, pela forma que assumem os cânticos
que hoje se cantam, pode ter começado nessa
época.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Para situarmos a origem desta tradição dos


loriguenses, teremos, forçosamente, que recuar até
à origem do canto litúrgico ou mesmo antes, se
atendermos que Loriga já existia no contexto da
Lusitânia.
 Vamos quedar-nos pela época da origem do canto
litúrgico, pois, pela forma que assumem os cânticos
que hoje se cantam, pode ter começado nessa
época.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
A melodia que aqui apresentamos dos
Martírios de Nosso Senhor Jesus
Cristo, tem uma construção Modal,
sendo construída no Modo III (Frígio
ou Deuterus) – Modo de Mi
(Autêntico). A Finalis (correspondente
à actual Tónica ) no modo III – é o
Mi (A na figura.) e a Repercussa B
(correspondente à actual Dominante)
é o Si (B na figura). Se utilizarmos o
critério do âmbito da melodia
continuamos a chegar à mesma
conclusão. Isto é , o Modo III
constrói a sua oitava entre Mi e Mi. A
Para além deste facto acresce a
forma responsorial, típica do canto
religioso da época, como referem,
quer Benet, quer Lopes Graça.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Esta Melodia dos Martírios parece-
nos ser a que manteve mais pureza
relativamente ao que pensamos ser
a forma original e, portanto, sempre
anterior ao Século XII.

 Poderão, no entanto, fazer-se outras


leituras ou propostas, como a que
aqui apresentamos de António
Ascensão.

 Mesmo assim, mantemos a defesa


da construção modal. Neste caso, no
Modo de Mi, transposto para Sol,
com a finalis em Sol e a repercussa
em Ré.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Se repararmos na melodia principal
Ementa das Almas - Loriga
deste ritual da Ementa das Almas,
verificamos que a construção é
muito semelhante. O que muda é o
Fá que passa a ser sustenido.

 No entanto este facto pode ter


surgido por volta de 1906 quando
foi fundada a Sociedade Recreativa
e Filarmónica Loriguense e a sua
Banda. Para que os instrumentos
melhor pudessem acompanhar os
cânticos deste ritual, estes foram
tornados tonais, através da
introdução dos meios tons.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Podemos, no entanto, também Ementa das Almas - Loriga
aqui, defender a construção modal,
uma vez que esta melodia, com
esta proposta está construida no
modo de Ré, transposto para Mi. O
âmbito mantém-se, apenas
mudando a nota mais baixa que,
neste caso, é a finalis, o Mi.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Vejamos o que diz Roy Bennet,da Universidade de
Cambridge, sobre a música antiga e o Cantochão:

“A música mais antiga que conhecemos, tanto sacra como profana, consiste
em uma única melodia, com uma textura do tipo que chamamos
monofónica. Em sua primeira fase, a música religiosa conhecida como
cantochão não tinha acompanhamento. Consistia em melodias que fluíam
livremente, quase sempre se mantendo dentro de uma oitava e se
desenvolvendo, de preferência com suavidade, através de intervalos de um
tom. Os ritmos são irregulares, fazendo-se de forma livre, de acordo com as
acentuações das palavras e o ritmo natural da língua latina, base do canto
dessa música. Alguns cantos eram expressos de modo antifónico, isto é, os
coros cantavam alternadamente. Outros eram cantados no estilo de
responsório, que se faz com as vozes do coro respondendo a um ou mais
solistas. Ainda hoje, em muitas igrejas e abadias, o cantochão é usado
normalmente.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Se compararmos a partitura apresentada por Bennet


com a dos Martírios de Loriga, verificamos que
existem algumas semelhanças, nomeadamente em
relação á forma como a melodia se desenvolve.
 Tal como ele refere a melodia mantém-se no âmbito
da oitava, desenvolvendo-se em intervalos de
segunda (de 1 tom). Por outro lado, os melismas, tão
típicos do canto litúrgico, estão presentes em todas
as melodias utilizadas na Ementa das Almas.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Citemos novamente Bennet:
 “A música antiga (mais precisamente, aquela que vai até o século XII)
empregou um sistema especial de escalas às quais se dá o nome de modos.
Você, por exemplo, pode tocar um modo no piano. Para tanto, basta que
comece uma escala por uma nota branca, digamos o ré, e vá subindo nota por
nota, tocando somente nas teclas brancas. Se tentar fazer a mesma coisa
começando por outra nota, verá que os modos nunca têm a mesma sequência
de tons e semitons. O modo em que a melodia está escrita é identificado pela
sua final, isto é, pela nota em que ela começa e termina, ou então pelo âmbito
da melodia, dado por suas notas mais alta e mais baixa.
Cada modo medieval apresentava duas formas: uma "autêntica" (como o modo
dórico, que vai de ré a ré) e outra "plagal" - a que tem o mesmo modo e o
mesmo final, diferenciando-se apenas pelo fato de a série começar uma quarta
abaixo. Nesse caso, o prefixo "hipo" é acrescentado ao nome do modo (por
exemplo, uma série que vá de lá a lá, cuja nota final seja ré, passa a ser o modo
hipodórico):
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 As melodias da Mãe Dolorosa e dos Passos de Nosso


Senhor, que apresentamos de seguida, em leitura
proposta por António Ascenção, embora assumindo
já uma execução polifónica, não deixam de ter uma
construção modal. A primeira, no modo de Lá
transposto para Mi, com a finalis em Mi e a segunda,
no modo de Dó transposto para Sol, com a finalis em
Sol.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Poderão os mais cépticos opinar contrariamente e


dizer que não tem fundamento teórico a nossa
hipótese de atribuir a construção modal aos
“espécimens” (como lhes chamava Giacometti),
recolhidos em Loriga. Poderão, até, dizer que em vez
de um modo, aquilo é uma escala diatónica. Nós
próprios apresentamos as partituras propostas
segundo a leitura que hoje se faz da música e que é
essencialmente tonal.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 É perfeitamente possível pensar desta maneira e, à


luz da visão do século XX, onde toda a música é
tonal, têm toda a razão de pensar assim.
 Não podemos é esquecer que toda a História, a da
Música incluída, deve ser vista sob um prisma
diacrónico, à luz da visão da época que analisamos.
Neste caso concreto estamos a falar de cultos
arreigados nas populações desde a génese da
Humanidade. Vejam-se as teorias animistas e
evolucionistas citadas na primeira parte.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Por outro lado, há referências a rituais deste
género anteriores ao Século XVII, como o
testemunha esta citação de Teófilo Braga,
afirmando que, em 1515, em Coimbra “... no
silêncio da noite, ao som de uma campainha,
despertavam os cidadãos com terríveis vozes,
pelas ruas, que moviam ao terror da morte e
do dia do juízo”.
BRAGA, Teófilo, História,P.P.P.,2º Vol, cit. por, LEÇA, Armando, op. cit. p. 144 .
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga

 Não podemos, ainda e, principalmente,


ignorar um pormenor tão simples como este:
antes de ser tonal, a musica era modal e a
tonalidade surge numa evolução lógica que
vem dos modos gregos (autênticos), passa
pelos eclesiásticos (plagais) e,
posteriormente, o jónico e o eólio que dão
origem aos actuais modos maior e menor
da música tonal.
O Ritual da Ementa das
Almas em Loriga
 Assim sendo, em jeito de conclusão, pensamos que,
de acordo com os dados disponíveis, podemos dar a
hipótese que defendemos como provada,
considerando que se trata de uma tradição secular e
que remonta aos primórdios da cristandade na
Península Ibérica.

 No entanto, esta, como qualquer outra, não é uma


verdade absoluta. È a verdade possível, à luz da
informação que recolhemos e trabalhámos.

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