Tem certeza?
This action might not be possible to undo. Are you sure you want to continue?
"Cantando para Dançar" é um livro de contos concisos, também chamados contos curtos. Contém 184 histórias para divertir, espantar e emocionar. Com personagens inventados na imaginação do autor. Tem gente, leões, gnus, zebras e onças pintadas. Tem fantasmas, vampiros e agentes secretos. Tem amor, afeição, bondade e generosidade. Sem armas e tiros, só um pouquinho de luta do bem contra o mal. Os malvados, quando aparecem, não são assim tão maus.
1ª edição – São Paulo – 2018
Capa do autor – Fotos da capa de Bruno Carneiro
Copyright © 2018 by Benedito Carneiro
Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha Catalográfica produzida pelo autor
C289o Carneiro, Benedito
Cantando para Dançar / Benedito Carneiro. - São Paulo, SP: Edição de Benedito Carneiro, 2018.
ISBN (digital) 978-85-923301-8-7
1. Contos brasileiros. I. Título.
CDD B869.3
CDU 821.134.3(81)-3
BISAC FIC029000
Índice
A mulher dos sonhos
A caminho das estrelas
Viagens
Estratégias
Fantasmas
Um tiro no escuro
Leões
O fim do mundo
Circos
Migrações
Medos
Crianças
Navios
Conversando na esquina
Animais
Gente como a gente
~ : ~ : ~ : ~ : ~
Ela ia. Ele ia. Combinaram. Ela foi. Chegou antes da hora marcada. Esperou por ele. Ele demorou. Ela ficou ansiosa. Ele demorou mais. Ela se aborreceu. Ele chegou. Na hora concordada. Ela esperou. Ela estava aborrecida. Ela ficara ansiosa. Ela brigou com ele. Ele não sabia que ela chegara antes da hora pactuada. Achava que chegaram ao mesmo tempo. Não entendeu a zanga dela. Ela insistiu em reclamar. Ele ficou quieto. Eram dela os seus direitos. Ele aceitava os direitos dela. Ela se acalmou. Eles ficaram contentes. Juntos.
Depois ele foi. Ela foi. Os amigos foram. Ficaram algum tempo. Cumprimentaram-na. Despediram-se dele. Abraçaram-na. Voltaram para casa. Ela ficou mais algum tempo. Ela quis se despedir. Ela chorou. Ela foi para casa. Triste. Ele ficou. Feito em cinzas pelo forno crematório.
~ : ~ : ~ : ~ : ~
Onde estará ela se escondendo? Vi-a agorinha. Sumiu. É sempre assim. Vejo a mulher dos meus sonhos, a futura mãe dos nossos filhos, a nora desejada por minha mãe. Daí ela desaparece. Decerto está na multidão do outro lado deste lugar tomado por gente. Jamais a encontrarei outra vez. Eis outra oportunidade perdida! Que pena! Culpa minha de ser insuficiente decidido e arrojado.
Tenho um motivo. Ela estava com um grupo. Várias pessoas juntas. Talvez não gostassem, se um estranho ao grupo falasse com ela. Mesmo assim, eu poderia tentar atrair a atenção dela. Um sorriso, um aceno de mão, um bilhetinho com o meu número de telefone. Tenho outra razão. Ambos estávamos em filas diferentes. Também é certo que nossas filas andavam para frente, não para trás nem aos lados. Quem está em fila que anda para frente, segue a fila.
Quem sabe se estivéssemos na mesma fila. Quem sabe se estivéssemos vestidos com camisas diferentes destas. Mas não. A mulher dos meus sonhos estaria vestida com a camisa do Palmeiras e eu com a do Corinthians. Agora estamos em lados diferentes da torcida em lados opostos do estádio. Mesmo com um binóculo, não a conseguiria ver. Além disso, agora não mais adiantaria. O jogo começou.
~ : ~ : ~ : ~ : ~
Achei. Finalmente, achei. Tanto procurei. Tanto olhei para todas, para todos os lados. Por fim, achei a mulher dos meus sonhos numa foto de uma revista. A futura mãe dos nossos filhos. A foto é de uma pintura que ela posou. O pintor a retratou, o fotógrafo fotografou o quadro, o editor publicou a fotografia na revista, eu vi a foto e me apaixonei por ela. Que cabelos! A malandrinha está nua no quadro. Estou enamorado encantado e apaixonado. Quero me casar com ela. Onde será que vive? Espero que seja solteira, tem de ser solteira, precisa ser solteira! Vou anotar o nome dela e procurar no Google. Eu a encontrarei. Sou persistente. Apaixonado.
Descobri o nome dela: Vênus. É um nome bonito e diferente. O quadro chama-se O Nascimento de Vênus, de autoria de Sandro Botticelli, pintor italiano. Quem sabe, se eu telefonar ao artista, ele me conte o endereço dela. Espero que ela more nesta cidade onde estou. Seria melhor para nos encontrarmos.
~ : ~ : ~ : ~ : ~
Oh, lá está ela. Tanto a procurei e a encontro hoje. Justo hoje? Não podia ser em dia anterior? Não, precisava ser hoje! Agora estamos em filas diferentes e eu sei que não posso trocar de fila. Inscrevi-me para o mesmo destino de todos desta fila. Decerto ela candidatou-se àquela fila onde está à espera do mesmo que eu. E agora, como farei? Queria viver com ela até o meu último dia de vida, que não será possível. Estamos em filas diferentes para destinos diferentes.
Eu poderia sair da minha fila e passar à dela, se alguém de lá quisesse trocar de lugar comigo. Entretanto o prazo de trocas terminou. Hoje é o dia da partida. É o nosso último dia na Terra. Estamos em filas para embarcar em naves que nos levarão para outros planetas da galáxia de Andrômeda. Entre os milhares de naves que sairão em viagem hoje de milhares de lugares de despedida na Terra, cada uma irá para um planeta diferente das demais. Sobreviverão os viajantes que chegarem vivos a planetas habitáveis. A nave na qual entrarei em instantes, irá para um planeta. Ela irá para outro planeta em outra nave. A fila começou a andar. Os primeiros já entraram na nave. Ela está na escada e olha para trás, à Terra que deixamos. Eu olho para ela que já desapareceu. Não deixo apenas a Terra, deixo também a mulher dos meus sonhos!
~ : ~ : ~ : ~ : ~
Ela era a sua mulher dos sonhos. Sua fada, sua rainha da noite, sua Violetta Valéry, sua Cio-Cio San, sua Pamina e sua Papagena. Queria vê-la, ajoelhar-se a seus pés para adorá-la e amá-la. Trabalhando em outra cidade, pediu um dia de licença para dirigir até a casa onde vivia com ela. Não a avisou, seria surpresa para ela e para o amor deles. Vestiu sua melhor roupa e dirigiu. Ao chegar, era o meio da tarde. Ela talvez repousasse para estar até lá mais bela e desejável para ele que chegaria à noite, se não tivesse aquele dia de folga.
Evitando acordá-la, entrou na casa com pés de lã. Oh, surpresa cruel! No sofá da sala estavam descuidadamente as roupas de dois homens, jogadas como se tiradas às pressas. Dois homens!? Um teria de ser policial porque o distintivo estava preso ao paletó. Pegou a arma do policial no coldre jogado sobre a poltrona. Decerto os homens estavam apressados para terem tirado as roupas com tanto descuido.
Foi até o quintal, desenrolou a longa mangueira de água com a qual tantas vezes molhara as plantas que ela amava. Abriu a torneira até o fim, o jato de água molhou o chão por onde ele passava no caminho do quarto. Abriu com todo o cuidado a porta destrancada. Os três dormiam abraçados. Ela no meio dos dois homens. Sem as roupas deixadas na sala. Virou o jato na direção deles. A água fria atingiu-os no sono e na surpresa. Enquanto os molhava,
This action might not be possible to undo. Are you sure you want to continue?