Radicalização e Crise: O Protagonismo das Frentes Parlamentares no Governo João Goulart (1961-1964)
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"Fazer uma contribuição original é tarefa difícil. Porém é justamente o que nos oferece Guilherme Ribeiro neste livro" (Octavio Amorim Neto – Ebape/FGV).
"Uma visão inédita e inovadora das Frentes e da crise do regime de 1946" (Maria Celina D'Araujo – PUC-RIO).
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Radicalização e Crise - Guilherme Leite Ribeiro
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
AGRADECIMENTOS
A Deus, por todas as bênçãos recebidas desde sempre. Aos meus pais, pelos ensinamentos que me fizeram e fazem crescer. Ao meu irmão, sempre amigo e companheiro. A toda minha família pela confiança depositada em mim.
Agradeço também aos meus amigos do colégio, da graduação e do mestrado, pelos incentivos que não me deixaram esmorecer. A Daniel Augusto, um agradecimento especial pelas palavras de incentivo e por todo o auxílio nesse processo, sem o qual este livro não aconteceria.
A Denize Ramos, grande responsável pela minha paixão por História, e aos professores da PUC-RIO, que tanto me ajudaram no amadurecimento acadêmico. Aos docentes que estiveram na banca de qualificação e defesa do mestrado, Eduardo Raposo e Octavio Amorim Neto, pelas contribuições irretocáveis que deram um novo sentido ao texto final. A Maria Celina D’Araujo, que se mostrou mais do que uma orientadora e sempre buscou o meu melhor, nunca me deixando desanimar.
A Saulo Said e Jaqueline Zulini, cientistas políticos que ainda resistem no estudo da República de 1946 e que, com nossas trocas intelectuais, ajudaram-me a seguir em frente. A Thiago Nogueira de Souza, por seu trabalho e por sua solicitude, fundamentais para a consecução da obra. Aos entrevistados do livro, Almino Affonso, Armado Monteiro e Saturnino Braga, pelo carinho e atenção com que reviveram suas memórias e aceitaram contá-las.
Também agradeço a alguns familiares que já não estão mais presentes nesse plano: Adelaide, tia Helena, tio Anacleto e, em especial, a minha avó Maria (todos in memoriam), um muito obrigado por tudo o que sempre fizeram por mim.
APRESENTAÇÃO
Estudar os anos anteriores ao golpe civil-militar de 1964 não é uma tarefa simples. Ao lidar com um dos períodos mais tensos de toda a história do Brasil – permeado por convulsões sociais, gravíssimos problemas econômicos e uma radicalização no campo político jamais vista – envolvem-se as paixões daqueles que insistem em dar um tratamento maniqueísta à História, seja ao vitimizar integralmente um lado ou simplesmente culpabilizá-lo, ainda que se tenham passado algumas décadas.
Quando decidi analisar o período 1961-1964, enfrentei o desafio de buscar contribuições que pudessem acrescentar à farta literatura existente. No entanto, ao constatar o que os personagens políticos daquele momento falavam, seja nas notas taquigráficas da Câmara ou em livros, discursos e entrevistas posteriores, algo me intrigou: por que tanta insistência em falar das frentes parlamentares? A vasta bibliografia sobre os grandes partidos políticos da época pouco dizia sobre esses blocos suprapartidários, o que aumentava minha inquietação.
Por isso, ao escolher as frentes parlamentares como objeto de estudo, a desconfiança era grande. A dúvida era saber se estudar dois grupos que não eram oficiais e que, por isso mesmo, não foram observados com rigor pela literatura e que, ademais, possuíam poucas fontes disponíveis a priori, poderia resultar em um bom trabalho. Aos poucos, tal dúvida foi sendo sanada. A vontade de que algo interessante fosse acrescentado à bibliografia já existente me fez olhar para vários aspectos do Legislativo a partir de dois novos
atores: a Frente Parlamentar Nacionalista (FPN) e a Ação Democrática Parlamentar (ADP).
O objetivo da obra é mostrar que as frentes parlamentares tiveram um grande impacto na polarização política e ideológica do Congresso Nacional entre os anos 1961-1964. Elas materializavam uma dualidade que acentuou o radicalismo característico do início da década de 1960, ao contrapor projetos em defesa de um nacionalismo anti-imperialista
, no caso da FPN, ou de um exacerbado anticomunismo
, como se vê na ADP.
Uma grande pesquisa empírica foi empreendida para atingir os objetivos do livro. Na obra, além de olhar para os discursos e notas taquigráficas da Câmara Federal, analiso fontes como as comissões permanentes, a composição da Mesa Diretora, a produção legislativa, as principais Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) e, principalmente, o imenso arcabouço trazido pelas votações nominais.
Na consecução do trabalho, foram observados órgãos da imprensa próximos às frentes parlamentares, como a revista Ação Democrática (ligada à ADP) e o jornal O Semanário (ligado à FPN). Não menos importante foi observar a organização dos dois blocos, que se mostraram hierarquizados em suas divisões de tarefas. Embora escassas, as fontes permitiram reconstituir os principais cargos de comando das frentes parlamentares. Ademais, devo citar as informações recebidas da Coordenação de Relacionamento, Pesquisa e Informação (Corpi) da Câmara Federal, que ajudaram na reconstituição dos nomes das frentes parlamentares. Essenciais também foram os verbetes do Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro (DHBB).
Outras fontes que ajudaram este livro foram as entrevistas feitas com políticos da época. Conversas foram realizadas com importantes políticos da Frente Parlamentar Nacionalista: Almino Affonso, Armando Monteiro e Saturnino Braga (esta feita em conjunto com Maria Celina D’Araujo). Embora em pequeno número, essas entrevistas foram essenciais para verificar a importância dos blocos suprapartidários naquele contexto.
Por fim, devo dizer que o livro não pretende diminuir a importância dos partidos políticos para o período que antecedeu o golpe civil-militar de 1964. Especialmente os três maiores, PSD, PTB e UDN, foram essenciais para o jogo político e, como se verá ao longo do livro, eles estarão presentes na maioria das páginas. No entanto, o que quero mostrar é que não se pode mais pensar na radicalização do Congresso Nacional nos anos 1960 sem olhar para as frentes parlamentares, que não só foram a consequência, mas intensificaram a polarização política e ideológica, contribuindo sobremaneira para a crise que se instalou naquele início de década.
PREFÁCIO
Frentes parlamentares e blocos partidários são, entre outros, formas legais de ação dos partidos políticos no Legislativo e se prestam ainda a ter papel relevante e mobilizador na sociedade durante as eleições. Na década de 1960 no Brasil, as mais famosas dessas frentes foram a Frente Parlamentar Nacionalista (FPN) e a Ação Democrática Parlamentar (ADP), estudadas neste livro, com brilhantismo, por Guilherme Leite Ribeiro.
A FPN tornou-se um ícone no pensamento das esquerdas no Brasil especialmente em função do momento em que foi criada e por sua curta, mas intensa, atuação em anos dramáticos de nossa história política, ou seja, no governo João Goulart. Criada em 1956, no auge do desenvolvimentismo de Juscelino Kubitschek, surgia como uma crítica ao capital estrangeiro, ao imperialismo
, e reunia adeptos de recorte liberal, conservadores, socialistas, trabalhistas e comunistas. Seu destino encerra-se com o golpe de 1964, cujos mentores a viam como um dos principais representantes da ameaça comunista no Brasil. Na memória política, ela foi uma perdedora, derrotada pelas forças conservadoras. Ficou mais conhecida como vítima daquelas forças inexoráveis que levaram o país à sua mais duradoura experiência autoritária. Comum também é estudá-la por oposição à Ação Parlamentar Democrática (ADP), criada em 1961 para, entre outros motivos, coordenar a distribuição de recursos financeiros entre candidatos às eleições parlamentares de 1962 que se posicionassem contra a agenda de reformas econômicas e sociais do governo João Goulart. O livro deixa claro que, para além das óbvias diferenças ideológicas, tratavam-se de organizações distintas nas estratégias de ação e no recrutamento.
A mística das frentes parlamentares é muito superior à quantidade de estudos sobre elas realizados. Assim mesmo, apesar da precária bibliografia específica, a narrativa acadêmica tem enfatizado ângulos de vitimização e culpabilização, mas pouco diz sobre seus papéis institucionais, suas formas organizativas e seus aspectos propositivos no Legislativo e no debate político em geral. Esse é o grande diferencial deste livro, que vai muito além da visão descritiva e maniqueísta que se faz sobre esse experimento político.
Neste trabalho, o autor narra com cuidados impressionantes a composição das frentes em suas raízes partidárias, regionais e políticas e em suas posições mais incisivas sobre alguns projetos políticos debatidos no Congresso. Mas vai muito além disso. Estuda as frentes parlamentares como instituições políticas específicas, com autonomia organizativa e estruturas de decisão. Embora reunissem elementos de vários partidos, elas se portaram como instituições com campos de ação, lideranças e estratégias estabelecidas. Estiveram presentes nas principais posições e cargos da Câmara dos Deputados, ocupando todos os espaços de decisão ali previstos. Não se tratava, portanto, apenas de movimentos políticos. As frentes funcionaram, de fato, como agentes políticos dentro do Congresso, em alguns momentos com forte poder de veto.
No caso da FPN, o livro mostra que a característica organizativa não significava a existência de um projeto alternativo de poder que privilegiasse a democracia. A tônica era a luta
nacionalista, opção que, aliás, não era cativa à esquerda. Os militares que tomaram o poder em 1964 eram, em sua maior parte, explicitamente nacionalistas. O nacionalismo da frente supunha reformas, entre elas a agrária, a que mais assustou o status quo. Supunha, além disso, a mobilização social, o que, por sua vez, era fator de instabilidade e de imprevisibilidade: produzia o grande medo
da mudança.
O autor recorre a modelos de análise da ciência política para mostrar a coesão das frentes no momento das votações na Câmara. Essa é outra parte inédita de sua pesquisa, pois mostra a forte coesão partidária de seus membros nas votações, principalmente em três temáticas selecionadas: parlamentarismo, capital estrangeiro e reforma agrária.
Ao fim do livro, temos uma visão inédita e inovadora das frentes e da crise do regime de 1946. Ficamos, contudo, com a sensação amarga de reconhecer que, apesar de suas capacidades organizativa e discursiva, não tenham sido capazes de se sobrepor à radicalização ideológica da Guerra Fria.
Entender melhor os contornos e os desafios das frentes e de sua época é crucial para entendermos a incapacidade de projetos políticos de formularem ideias que consigam reunir desenvolvimento com liberdade e democracia.
Maria Celina D’Araujo
Departamento de Ciências Sociais
PUC-RIO
LISTA DE ABREVIATURAS
Sumário
INTRODUÇÃO
capítulo 1
CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE POLÍTICA DOS ANOS 1960
1.1 Três anos, três governos e dois presidentes: de Jânio a Jango
1.2 O papel das frentes parlamentares no sistema político-partidário brasileiro
1.3 O sistema partidário-eleitoral: um processo em afirmação
capítulo 2
PARTIDOS POLÍTICOS E FRENTES PARLAMENTARES NA DÉCADA DE 1960: UMA DISCUSSÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 Considerações preliminares sobre o Legislativo na República de 1946
2.2 PSD, PTB e UDN
2.3 As frentes parlamentares
capítulo 3
AS FRENTES PARLAMENTARES EM AÇÃO NO CONGRESSO NACIONAL
3.1 Cargos de liderança
3.1.1 Nas frentes parlamentares
3.1.2 Na Mesa Diretora da Câmara e nos partidos políticos
3.1.3 Nas Comissões permanentes da Câmara Federal
3.2 Produção legislativa
3.3 Votações nominais
3.4 Comissões parlamentares de inquérito
CONSIDERAÇÕES FINAIS
FONTES
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
Estas duas frentes parlamentares em muito concorreram para a balbúrdia que se instalou no Congresso, principalmente na Câmara, durante todo o governo Goulart. Quase que os partidos desapareceram e as lideranças, de governo e de oposição, passaram a ter existência apenas