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A internet no olhar da comunicação brasileira
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A internet no olhar da comunicação brasileira

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A autora nos brinda com um vasto e muito útil panorama das problemáticas concernentes à Internet, resgatado da literatura internacional e da área de comunicação brasileira e cuidadosamente analisado à luz de suas contribuições sobre o fenômeno para a área de conhecimento.

O leitor também encontrará uma boa discussão sobre a epistemologia da Comunicação que, simultaneamente, constitui o pano de fundo e a figura central desses debates.

É um trabalho importante que resgata o testemunho de uma época de grande carência e necessidade de se entender o novo, de lidar com algo que se impõe e que se apresenta como um fato incontornável para todos nós, usuários ou não, direta ou indiretamente afetados por uma onda avassaladora de comunicação intensiva. Também àqueles que querem entender o que hoje se naturalizou e se cristalizou como compreensão sobre a Internet, seus mitos e realidades.

Luiz C. Martino
LanguagePortuguês
Release dateJan 1, 2016
ISBN9788547318109
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    A internet no olhar da comunicação brasileira - Denise Mafra Gonçalves

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição – Copyright© 2016 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

    Dedico esta obra à Sabedoria Divina que cria os homens curiosos para que se inquietem com o desconforto do desconhecido.

    AGRADECIMENTOS

    A todos os que dedicarem algum tempo à leitura deste livro.

    Agradeço por querer compreender melhor o mundo onde estamos e no qual precisamos resolver problemas cada vez mais complexos.

    Agradeço, ainda, por fazer parte dos que foram escolhidos para também instigar outros a pensar e a perguntar.

    Agradeço aos meus filhos, Vanessa e Gustavo, aos meus irmãos, parentes e amigos que sempre torcem por mim e me apoiam em todos os momentos das minhas inquietações intelectuais.

    Agradeço, por último, ao meu neto, Eduardo, que me faz olhar, sorridente e esperançosa, para o futuro!

    Apresentação

    É necessário começar explicando que a Internet é o assunto central deste livro. Porém, é o assunto, não o objeto central da análise que me propus a fazer quando comecei a buscar teorias sobre a Internet do ponto de vista da comunicação. A produção acadêmica da área de comunicação internacional e brasileira sobre a Internet é esse objeto. Meu olhar, portanto, é voltado para a Internet como objeto de estudos da comunicação.¹

    Vale explicar que o que eu sabia sobre comunicação e Internet, aprendi em abordagens diversas. Estudei comunicação na literatura, na linguística, na educação, na psicologia, na antropologia, na saúde e apresentei o velho esquema de emissor-canal-receptor-mensagem-referente, no esquema de Roman Jakobson (2005), pelas salas de aula de língua portuguesa, redação e literatura, por onde passei. Também aprendi comunicação em diálogos, monólogos, romances, contos, poesias, documentários, artigos, novelas, filmes, fóruns virtuais e presenciais, debates, músicas e em todos os demais gêneros, em todos os meios de comunicação existentes, incluindo a televisão, o rádio, as cartas, e os chamados espaços conversacionais da Internet. Ou seja, estive em comunicação, física e virtualmente, síncrona ou assincronamente, em diversos lugares e tempos, no razoável percurso de humana aprendizagem diária que fiz e que continuo a fazer.

    Por onde andei, nas ciências humanas e sociais, apreendi modos de conhecer e de explicar o humano, as relações, o social, mediado pela comunicação escrita ou verbal. Li, escrevi, ouvi falas e falei e repercuti o que aprendi. Todos os aprendizados que tive, enfim, pode-se dizer, estiveram e estão no contexto da comunicação entre pessoas e nos espaços, tempos e ideias. Fazendo agora uma reflexão sobre esse percurso, vejo que os meios de comunicação nesse percurso foram vários e singulares e os utilizei, sem sequer perceber sua presença ou complexidade, assim como foi previsto por alguns teóricos na primeira década dos anos 90. Posso dizer que esse foi o meu caminho suave.

    Por outro lado, também caminhei, durante algum tempo e em lugares diferentes, pelas especificidades estritas da pesquisa cientifica das ciências médicas². Vi recortarem suas questões-problema, desenharem propostas de investigação, estabelecerem métodos e técnicas de pesquisa e analisarem, criteriosamente, os seus objetos de estudo. É interessante pontuar que essas mesmas ciências, consideradas duras e, por vezes, frias, em confronto com as ciências sociais e humanas, também dão voz a narrativas e buscam resultados não mensuráveis. Os aspectos comunicacionais também são fundamentais para a compreensão dos processos que envolvem o humano e o social nas ciências da área médica e biomédica.

    Originada nesses espaços de experimentar e conhecer, ver a comunicação de dentro da área tornou-se para mim, simultaneamente, curiosidade e estranhamento. Pensava que questões de interesse específico da área de comunicação seriam, talvez, as que estudassem os meios de comunicação. Seriam? Essa era a minha dúvida inicial. Se os meios de comunicação eram do interesse de outras ciências que eu conhecia, como objetos da comunicação, certamente, o seriam também e, de forma mais aprofundada, pela área de comunicação. Nessa dúvida, incomodava-me a seguinte questão epistemológica: por que eu buscava ver a comunicação como um conhecimento disciplinar, recortado, se o meu percurso de aprendizagem foi construído de forma interdisciplinar? Por que eu poderia ver o campo estrito, se a comunicação sempre esteve em todas as demais ciências com as quais construí meu saber? Resolver essa questão, inicialmente, não foi fácil. Porém, por mais que eu me debatesse entre a disciplinaridade e a interdisciplinaridade, sabia que, para dar andamento a qualquer pesquisa que me levasse a compreender o ponto de vista da comunicação, eu precisava fazer as indagações certas. Perguntei, enfim: como compreender a Internet como objeto de estudo da área de comunicação? O que há de diferente, próprio, típico da comunicação, que explique a Internet? Minha expectativa era a de encontrar, naturalmente, na área de comunicação, as explicações próprias para o quê, em essência, faz intermediação para a comunicação ocorrer, ou seja, é meio de comunicação.

    A análise de autores que trataram da Internet na área de comunicação foi, então, o caminho que escolhi para compreender a Internet na comunicação. Essa trilha é a que compartilho agora com você. Peço-lhe que faça essa leitura, buscando acompanhar a tentativa que fiz de compreender o pensamento de alguns dos estudiosos que representam algumas das referências teóricas sobre a Internet no Brasil e no mundo.

    Prefácio

    Embora recente, a internet não é mais novidade. A rápida disseminação e o uso intensivo fazem dela a mais importante fonte de informação ao alcance do público em geral. Aliás, não é fácil dizer exatamente o que ela é, já que suas faculdades interativas a colocam para além da simples consulta da informação. Fazer amigos, participar de debates públicos, acompanhar cursos à distância, realizar transações bancárias, compras, sondar e desfrutar do universo cultural... são muitas as possibilidades de usos, inclusive a de absorver outros meios de comunicação, como o rádio e a TV, que podem ser veiculados através dela.

    Claro, nada disso é desconhecido. O livro aqui em questão, o qual tenho o prazer de apresentar, não se envereda por estes caminhos mais corriqueiros, de tentar dizer aquilo que ainda não sabemos sobre a Internet de todos os dias. Também não cede à tentação da futurologia, que assombra os escritos e a reflexão sobre as tecnologias da comunicação; tampouco recorre aos exercício retóricos, das fórmulas linguísticas esmeradas, verdadeiros slogans que tentam capturar a reflexão em uma frase, um bordão. Longe desses lugares comuns, Denise Mafra Gonçalves nos fornece um panorama da literatura que forma as opiniões sobre esta era da comunicação digital encabeçada pela Internet. De maneira metódica, ela seleciona e passa em revista os autores que mais influenciaram a percepção desse novo fenômeno.

    É um trabalho importante que resgata o testemunho de uma época na qual, justamente, há uma grande carência e necessidade de se entender o novo, de lidar com algo que se impõe e que se apresenta como um fato incontornável para todos nós, usuários ou não, direta ou indiretamente afetados por uma onda avassaladora de comunicação intensiva. Mas também para aqueles que querem entender o que hoje se naturalizou e se cristalizou como compreensão sobre a internet, seus mitos e realidades.

    Longe de facilitar alguma coisa, a banalização acaba sendo mais um obstáculo a ser somado à grande complexidade desse meio tão pouco ortodoxo. O que hoje sabemos carece de sistematização, como bem aponta a autora, ao afirmar que esta é necessária e oportuna. O que também chama a atenção nesta massa de pensamentos que rapidamente prolifera, com e através da Internet, são certas continuidades: a eterna retomada do debate sobre o determinismo tecnológico, a rápida ideologização das posições, a massificação das afirmações sem justificativas.

    Contudo, o aparecimento das tecnologias digitais é, antes de mais nada, uma excelente oportunidade que se abre para discutir nossa compreensão acerca dos meios de comunicação, nos permite comparar sistemas diferentes, formados por tecnologias de base distintas (analógico e digital), com novas potencialidades. O desafio aqui é poder realmente aproveitar esta grande oportunidade oferecida pelo laboratório da história, para fazer avançar o conhecimento e superar o déficit das décadas anteriores, período em que a noção de meio de comunicação foi largamente negligenciada.

    Este talvez seja um dos principais méritos da presente obra, que se levanta contra a inércia de boa parte da teoria da comunicação, que segue seu rumo indiferente à necessidade de conceitualizar seu objeto central. A autora faz uma análise dos conceitos de meios de comunicação encontrados na literatura especializada, deixando exposta a insuficiência das definições correntes. Isso lhe permite evitar as limitações das análises centradas na experiência do dia-a-dia e se desembaraçar das pautas correntes, para avançar em questões menos exploradas, como a análise da internet enquanto meio de comunicação ou na questão da atualidade mediática, ou seja, a ação das tecnologias da comunicação na formação e instituição do tempo presente como matriz social.

    O leitor também encontrará uma boa análise e discussão sobre a epistemologia da Comunicação que, simultaneamente, constitui o pano de fundo e a figura central desses debates. A autora se coloca de maneira franca e sustentada em relação aos fundamentos da área de conhecimento, em defesa da Comunicação como área específica, com sua autonomia frente a outros domínios. A hipótese de trabalho assumida é de que, em função do aparecimento da internet, a área deve enfrentar, seriamente, o dilema de rever seus fundamentos, a fim de se constituir como um conhecimento mais específico, ou, passivamente, submeter-se ao risco de ser absorvida e descaracterizada por outras perspectivas disciplinares e interdisciplinares. Considera que a abordagem da internet como meio de comunicação, em sua relação com a sociedade e com a cultura, caracteriza o ponto de vista comunicacional, de onde a importância da análise da autonomia da Comunicação como área de conhecimento. Longe de um preciosismo teórico, trata-se da liberação e defesa de uma importante via de compreensão desse fenômeno tão singular.

    Enfim, a autora nos brinda com um vasto e muito útil panorama das problemáticas e problemas concernentes à internet, resgatados da literatura da área de comunicação brasileira e cuidadosamente analisados à luz de suas contribuições sobre o fenômeno e para a área de conhecimento.

    Luiz C. Martino

    sumário

    Capítulo 1

    Por Que Pensar a Internet como Objeto dos Estudos da Comunicação?

    1.1 Breve discussão epistemológica: de que modo se pode conhecer e reconhecer o que interessa à comunicação?

    1.2 Os primeiros olhares sobre a Internet: o âmbito internacional

    1.2.1 Pierre Lévy: a pregação da utopia da sociedade democrática e da linguagem universal

    1.2.2 Manuel Castells e o olhar socioeconômico sobre a sociedade em rede

    1.2.3 Nicholas Negroponte: uma voz extrema a favor da tecnologia digital da comunicação

    1.2.4 Howard Rheingold e a criação do conceito de comunidade virtual

    1.2.5 Derrick de Kerckhove: a renovação de McLuhan e as extensões eletrônicas da consciência

    1.2.6 Dominique Wolton: preocupação com o futuro após a internet

    1.2.7 Jean Baudrillard e Lucien Sfez: o simulacro e o tautismo como fim da comunicação na era da virtualidade

    1.2.8 Joel de Rosnay, a abordagem sistêmica, o conceito do pronetariado e do homem simbiótico

    1.2.9 Armand Mattelart, Philippe Breton e Paul Virilio: a internet como controle e a contrautopia: um esquema operatório de remodelamento da ordem mundial?

    1.3 Uma Tentativa de Interpretação das Tendências Internacionais de Problemas sobre a Internet

    Capítulo 2

    A Internet: Necessidade de Novas Abordagens

    2.1 O Conceito de Meio de Comunicação

    2.2 O Conceito de Presenteísmo X Atualidade Midiática: Diferentes Perspectivas

    2.3 Um Modelo Americano para Análise da Internet como Meio de Comunicação

    2.4 Novos Olhares sobre a Internet

    Capítulo 3

    O Saber Comunicacional e a Pertinência do Estudo da Internet como Meio de Comunicação da Atualidade Midiática

    3.1 A Trajetória da Formação do Campo Comunicacional

    3.2 Algumas Abordagens da Internet pela Área de Comunicação

    Capítulo 4

    Panorama das Problemáticas e Problemas sobre a Internet na Literatura da Área de Comunicação Brasileira

    4.1 Os Mapas de Alex Primo

    4.2 Conceito, Características e Efeitos do Ciberespaço

    4.2.1 Como a área de comunicação brasileira explica o ciberespaço?

    4.3 Conceito, Características e Efeitos da Cibercultura

    4.3.1 A Problemática sobre a cibercultura e seus efeitos do ponto de vista da comunicação brasileira

    4.4 Arte Eletrônica e Comunicação na Internet

    4.4.1 A Arte na internet: comunicação e produção cultural no ciberespaço

    4.5 Comunidades, Redes Sociais, Redes Colaborativas de Aprendizagem e Inteligência na Internet

    4.5.1 Comunidades em redes sociais colaborativas: respostas para a comunicação da atualidade midiática?

    4.6 Linguagem Digital: Navegação, Leitura e Escrita na Internet como Hipertexto 

    4.6.1 A Linguagem da internet: Labirintos do Hipertexto

    4.7 Imaginário Tecnológico: o Pensamento sobre a Cibercultura

    4.7.1 As Tecnologias do imaginário: um olhar transversal sobre as questões comunicacionais da internet

    4.8 Conceito, Características e Efeitos da Interação na Internet

    4.8.1 O Olhar sobre a interação: o que é mesmo que se compreende?

    4.9 Conceito, Características e Efeitos da Internet como Meio(s) de Comunicação

    4.9.1 Internet como meio de comunicação: como são os olhares específicos e o que eles estão prometendo explicar?

    4.10 Síntese das Contribuições Teóricas dos Estudos da Área de Comunicação Brasileira para Entender a Internet como Meio de Comunicação na Atualidade Midiática

    Algumas Ideias Finais

    Referências

    Capítulo 1

    Por Que Pensar a Internet como Objeto dos Estudos da Comunicação?

    Da perspectiva das demais ciências, as explicações sobre a Internet e sobre qualquer tecnologia da comunicação recaem sobre elucubrações teóricas a respeito das relações entre indivíduos ou grupos, usuários e as tecnologias de comunicação. Raramente, o próprio objeto técnico onde se sustenta a comunicação – o meio da comunicação – mostra-se, per si, interessante para a literatura, a educação, a psicologia, a sociologia, a antropologia, a filosofia ou qualquer outra abordagem que tome o humano e a sua produção de sentidos como objeto de estudo.

    Movida por essa lacuna, para identificar e compreender problemáticas e problemas que refletem a situação da produção científica sobre o tema em determinado período de tempo, em uma determinada área, passei a estudar o pensamento dos produtores de conhecimento da área de comunicação. Eu esperava reconhecer o saber específico da Comunicação, e repito porque quero ser bastante clara quanto a isso. Esse me pareceu ser um bom caminho para compreender a Internet do ponto de vista da Comunicação, como conhecimento disciplinar específico.

    Para começar, estudei os antecedentes internacionais, mas aviso: não fiz uma revisão bibliográfica extenuante, nem um levantamento completo do estado da arte da literatura estrangeira e brasileira sobre a Internet. A análise foi feita com o propósito de investigar, criticamente. O objetivo foi o de verificar como a produção acadêmico-científica internacional, inicialmente, e a brasileira, depois, vinculada à área de comunicação, costuma elaborar teoricamente a relação entre a comunicação e a Internet e como procura explicá-la no universo da própria Comunicação.

    Entretanto, tão logo comecei a reconhecer a literatura da área e a conviver com o conhecimento produzido pela comunicação, verifiquei que havia problemas teórico-epistemológicos gerados nas próprias entranhas da área. A priori, havia necessidade de sistematização dos estudos da comunicação com uma visão metateórica. Constatei que não era um problema meu, mas da própria área. Portanto, uma pesquisa dessa natureza seria bem-vinda. Aliás, esse estudo vinha sendo indicado pelos teóricos da área de comunicação há algum tempo. Sugeriam que a trajetória do pensamento e o avanço das proposições de suas teorias fossem estudados; em outras palavras, sugeriam, e ainda sugerem, que os estudos da área de comunicação se debrucem sobre si mesmos. Porém, ao recomendar esse tipo de estudo, quase todos apontam a dificuldade de tal sistematização: em razão da diversidade das contribuições da área de comunicação, naturalmente interdisciplinar, sem objeto específico, etc. Muitos afirmam que seria mesmo impossível sistematizar e outros diziam que seria inútil fazê-lo!³ Ao contrário, uns poucos consideram que a necessidade dessa sistematização é maior que sua dificuldade. Eu mesma me coloco neste grupo. Aqui se insere a minha colaboração. Espero que não seja inútil, e tenho certeza de que superei a impossibilidade que me amedrontou, confesso, algumas vezes.

    Como explicado desde o início, a Internet é o assunto central deste livro, mas fiz a opção de não discutir o percurso histórico da Internet ou suas características como tecnologia de informação e comunicação. Também não procurei quais são seus efeitos diretos sobre pessoas, cidades ou coisas que interessam. Todavia, o leitor poderá comparar análises de diversos estudos que sondam a Internet, como objeto de interesse, ou em que a Internet representa o lugar de comunicação. Logo, indiretamente, ao estudar o que outros estudaram, aprendi muito sobre e da Internet, com certeza e também será esse algum legado desse livro. Mesmo que as questões específicas da comunicação ainda necessitem de melhor delineamento, a Internet é um fenômeno de muitas facetas e várias delas estão tratadas neste livro. Penso que essa sistematização pode, de algum modo, apontar para algumas das respostas que se buscam na área.

    1.1 Breve discussão epistemológica: de que modo se pode conhecer e reconhecer o que interessa à comunicação?

    Por mais que alguns estudiosos ainda insistam na discussão sobre a dicotomia positivista entre sujeito e objeto de pesquisa, parece-me necessário lembrar: não se pode deixar de dizer que procedimentos teórico-metodológicos nas investigações constroem um tipo especial de conhecimento sobre o mundo. Há os que pensam que não faz sentido sistematizar⁴ em pesquisas que envolvem questões humanas, pois há subjetividade na percepção da realidade. Outros defendem, como eu, a abordagem sistematizada para qualquer pesquisa, para que seja ordenada e replicável, no mínimo. Estudos universitários ou produzidos em centros de pesquisa; ou análises da realidade, em locais onde algo existe e está sendo praticado, devem levar a ideias e questões, que, se sistematizadas, transformam-se em teorias, usam métodos e aplicam técnicas... Tudo isso é fundamental para a ciência como construção do conhecimento organizado da civilização humana. Atrevo-me a dizer que o conhecimento produzido em determinado local não existe e não é visível até que seus problemas sejam levantados, investigados, sistematizados e registrados para possíveis soluções e superações. Ou seja, há áreas que existem apenas em suas práticas, no empirismo. Pelo fato de produzirem sentido cotidiano, ou seja, em suas práticas e para seus pares consideram-se suficientemente ordenadas. Entretanto, tem de admitir que não existem como ciência, epistemologicamente construída, que reflete sobre seu saber organizado, sistematizado, registrado e compartilhado publicamente. Sem isso, continua a existir apenas como prática. É conhecimento que se perde no tempo e que diverge nos focos. Por isso, é imprescindível para qualquer área de investigação e, especialmente, para aquelas que ainda se debatem em encontrar seu próprio espaço disciplinar de conhecimento, como é o caso da área de comunicação, que busque aquilo que caracteriza este saber, de modo a ser reproduzido, replicado, ampliado, confrontado e, se for o caso, superado, ultrapassado e atualizado. Para isso, os que produzem conhecimento diário em suas práticas, necessitam promover ordenamento e produzir sistematização, registro e divulgação de suas ideias, processos, métodos e técnicas. Esse processo cria conhecimento próprio às temáticas de interesse da área.

    Esses preceitos sobre os processos de organização do conhecimento, da prática investigativa e de encontrar métodos e técnicas foram chamados, por Thomas Kuhn (2006)⁵, de paradigmas a serem superados. Para ele, o cientista normal é o que contesta o que não conhece, rejeita o novo, mas, quando uma teoria supera outra, quando se estabelecem preceitos que superam outros, novos paradigmas são adotados pelos pares. Isso é inevitável. Assim é que acontece... Nesse contexto, se a formulação de teorias nas ciências sociais e humanas ocorre a partir da observação de fenômenos relacionais, com uma abordagem que pode agregar qualidade ao objeto de análise, é necessário encontrar métodos que a produzam e valorizem, a partir de seus próprios problemas. Por outro lado, Popper (1993) define que os conceitos devem ser falseados, testados e superados. Imre Lakatos (1979) tenta fazer a fusão entre ambos os epistemólogos.

    Barbosa (2014) faz uma análise minuciosa das diferenças entre todas as vertentes das ciências e apresenta uma síntese da proposta de Lakatos, que considero interessantes para a discussão que a Comunicação necessita fazer sobre sua problemática condição teórico-epistemológica. Segundo Lakatos, lembra o autor, há um núcleo duro em um programa de pesquisa que é formado por consenso. Esse núcleo não pode ser refutado e é denominado heurística negativa. Por outro lado, a heurística positiva é composta por hipóteses auxiliares, que derivam do núcleo duro, e que fazem a função de proteger o núcleo duro, mas que devem ser, independentemente, testadas. Assim, toda modificação na teoria consensuada pelo núcleo duro ou qualquer proposta de nova teoria deve prever fenômenos ainda desconhecidos ou não explicados; a teoria em consenso não é excluída, imediatamente, se testada e falseada, pois a observação e o experimento também podem ser falseados. Por fim, para Lakatos, programas de pesquisa que não conseguem prever fatos novos tornam-se programas degenerativos, pois não chegam à verdade. Logo, programas melhores são aqueles que conseguem prever fenômenos novos.

    Ora, observar questões sociais, comunidades de interação, comunicação entre sujeitos, meios de comunicação em sua forma e em funcionamento, sujeitos em ação comunicativa, tendo em vista o sujeito-pesquisador, os objetos de análise e a relação entre tudo isso e a Internet, logicamente, promove conhecimento. Porém, esse conhecimento só existirá (para os pares e para as demais ciências e lacunas epistemológicas) se e somente se forem formuladas teorias que se sustentem.

    Os pensadores que se dedicaram a estudar a epistemologia da ciência podem discordar ou mesmo derrubar a base do que organiza o conhecimento, como propõe Feyerbend⁶. Outros podem discutir a necessidade de falsear ou não as teorias existentes ou podem propor caminhos para superação dos paradigmas e para a busca de consenso nos programas de pesquisa, como faz Lakatos, mas, sem discussão, ao pensar a ciência o que se sustenta é a necessidade de que o conhecimento seja construído de modo a ser sustentado. E o que é um conhecimento construído para se sustentar? Ouso dizer que é aquele que pode ser compreendido, discutido, confrontado, reconhecido, comparado, sedimentado, refutado, validado, superado, reconstruído, em um constante movimento de curiosidade e dúvida, aprendizagem e ensino, construção e desconstrução do conhecido, revisão da realidade, sempre em face de visões e argumentações que se renovam nas ideias e questões técnicas e humanas. Esse é o caminho que produz e atualiza conhecimento entre os homens desde os primeiros sinais de inteligência racional. Esse movimento é espiral e contínuo: o que muda uma visão, transforma a outra; o que muda um sujeito, modifica o outro; o que muda um conhecimento, cria outro... A cada passo dado por ciências próximas, congêneres, ou mesmo distantes, em sua visão particular e específica da realidade observada, conhece-se mais um pouco daquele objeto/sujeito de interesse e amplia-se o conhecimento sobre o mundo. A pergunta muda, o objeto muda, a questão problema passa a ser outra, em perspectiva. Tudo é transformado e se transforma pela problematização da realidade.

    Logo, o resultado da acumulação do conhecimento humano, construído sobre conceitos desnaturalizados, revistos e recolocados diante do óbvio pode levar a superar entendimentos basais, simplistas e banais, provenientes do que se considera senso comum. Para isso, há que confrontá-los com outros, como modos

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