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Gramsci e a Pesquisa Histórica
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Gramsci e a Pesquisa Histórica

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O Núcleo de Pesquisa sobre Estado e Poder no Brasil (Nupeb) reúne nesta obra um conjunto de estudos produzidos a partir do referencial teórico formulado por Antonio Gramsci, intelectual e militante sardo, tendo no conceito Estado Ampliado uma ferramenta metodológica. O objetivo deste esforço intelectual coletivo é contribuir para o conhecimento crítico acerca das relações entre Estado e Poder no decorrer dos séculos XIX, XX e XXI, a partir de pesquisas desenvolvidas nas áreas das ciências humanas, mas destacadamente a partir de um ponto de vista materialista e histórico.
LanguagePortuguês
Release dateSep 27, 2018
ISBN9788547315627
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    Gramsci e a Pesquisa Histórica - Sônia Regina Mendonça

    SUMÁRIO

    CAPÍTULO I

    Pesquisando com Gramsci: sugestões metodológicas

    Sônia Regina de Mendonça

    CAPÍTULO II

    Gramsci, o Império do Brasil e o liberalismo de classe,

    c. 1815-1879

    Ricardo Salles

    CAPÍTULO III

    ESTADO, CLASSE SOCIAL E POLÍTICA PÚBLICA NO BRASIL NA TRANSIçÃO

    DO SéCULO XIX PARA O XX

    Nívea Silva Vieira

    CAPÍTULO IV

    A CRIAÇÃO DO NÚCLEO AGROINDUSTRIAL NO RIO SÃO FRANCISCO:

    AGENTES E INTERESSES DURANTE O ESTADO NOVO

    Dilma Andrade de Paula

    CAPÍTULO V

    AMAZÔNIA E A POLÍTICA MINERAL BRASILEIRA NO SÉCULO XX

    Antonio Cláudio Rabello

    CAPÍTULO VI

    Empresários, Estado ampliado e política externa:

    as empreiteiras e as relações internacionais brasileiras

    no período da ditadura civil-militar

    Pedro Henrique Pedreira Campos

    CAPÍTULO VII

    A Construção da Democracia Consentida no Brasil (1995-2006):

    uma Abordagem de Cunho Gramsciano

    Maria Teresa Cavalcanti de Oliveira

    CAPÍTULO VIII

    ESTADO AMPLIADO NO BRASIL RECENTE: os intelectuais orgânicos

    do capital no CDES (2003-2010)

    André Pereira Guiot

    CAPÍTULO IX

    AS ESCOLAS PÚBLICAS, OS INTELECTUAIS ORGÂNICOS E A HEGEMONIA

    DO PARTIDO DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL

    Rodrigo de Azevedo Cruz Lamosa

    SOBRE OS AUTORES

    CAPÍTULO I

    Pesquisando com Gramsci: sugestões metodológicas

    Sônia Regina de Mendonça¹

    Considerações Preliminares

    É difícil falar do pensamento de Antonio Gramsci sem remeter à existência de certa interpretação, hoje hegemônica, de sua obra. Trata-se daquela que, tomando como ponto de partida as contribuições de Norberto Bobbio (1955), define o pensador sardo como um teórico das superestruturas ou um arauto da sociedade civil idilicamente organizada. Com base nessa premissa, um fio tênue passa a separar a efetiva visão de Gramsci dessa reapropriação que o toma como um defensor do aliancismo entre classes, postura essa, aliás, bastante presente na historiografia brasileira. A leitura bobbiana da obra de Gramsci – e vulgarizada junto ao senso comum – consegue traduzir seus principais pares conceituais – estrutura /superestrutura; sociedade política/ sociedade civil; ditadura/ hegemonia etc. – como exemplares de uma cisão que, de fato, jamais existiu nas reflexões do filósofo italiano.

    Além de deturpadora, tal ideia é bastante equivocada, posto nunca ter Gramsci abdicado da estrutura como ponto de partida de seu edifício teórico, ainda que a ela tenha dedicado menos espaço do que à política e ao Estado. Todavia a premissa de que o Estado atua para manter as condições de dominação da burguesia sobre a classe trabalhadora no mundo capitalista encontra-se em sua obra e não pode – nem deve – ser minimizada.

    A questão é que, preocupado com as mudanças ocorridas no capitalismo mundial na virada do século XIX para o XX, em especial a afirmação do imperialismo, sua atenção voltou-se para a análise do Estado e das modalidades de dominação de classe, já que, com o novo patamar do desenvolvimento capitalista, complexificaram-se não apenas a estrutura produtiva, mas também as superestruturas asseguradoras da reprodução da ordem social.

    Os cuidados do filósofo para com o tema derivam da própria condição da Itália de seu tempo, onde a renovação do Estado verificou-se sem qualquer alteração profunda da estrutura social, demonstrando, assim, que, em muitos casos, as relações entre Estado capitalista e Economia não podem ser determinadas mecânica ou esquematicamente, existindo o que Álvaro Bianchi aponta como um desencontro dos tempos das superestruturas e das estruturas (BIANCHI, 2008, p.175). Tal desencontro fez com que Gramsci divergisse e criticasse, profundamente, quer o economicismo, quer visões instrumentais acerca do Estado, que o tomam como mero reflexo da economia.

    Ainda segundo Bianchi, o marxista sardo partiu da análise da correlação de forças derivada da estrutura objetiva, donde emergiam os grupos sociais (classes e frações de classe), bem como o grau do desenvolvimento das forças materiais de produção, cada qual ocupando uma dada posição na divisão social do trabalho. E, para ele, nesse nível, a classe existe objetivamente (BIANCHI, 2008, p. 165). Isso implica afirmar que o desenvolvimento da economia e da política, intimamente vinculados por processos e relações recíprocas, não significa admitir que as transformações ocorridas no mundo econômico repercutam, de pronto, sobre as superestruturas e vice-versa. Tal descompasso, aliás, é inerente às próprias condições de produção e reprodução das relações sociais sob o capitalismo, por meio da unidade econômica e política da classe dominante, processada/difundida pelo Estado.

    Mesmo assim, o Estado em Gramsci não pode ser concebido como um fantoche de um grupo ou fração de classe, tal como o sugerem outras vertentes marxistas. Ele deve representar a expressão universal de toda a sociedade incorporando, até mesmo, demandas e interesses dos grupos subalternos, ainda que deles depurando sua lógica própria. Para Fontes,

    Gramsci abordou as condições sociopolíticas - culturais - ideológicas de expansão do capitalismo e concedeu especial atenção para suas condições internas de sustentação, políticas e culturais, num contexto contraditório onde, de um lado, havia crescentes reivindicações populares em prol de uma socialização da política e, de outro, tais reivindicações sofriam processos de modificação, de mutilação e mesmo de manipulação, de maneira a serem convertidas em sustentáculo da própria dominação que procuravam denunciar. (FONTES, 2010, p. 122).

    Todas essas considerações nos auxiliam a começar a perceber os contornos do conceito gramsciano de Estado, o qual, diversamente do de Lenin, por exemplo, é entendido em sua acepção mais ampla e orgânica, como a totalidade dialética formada pela sociedade civil e a sociedade política, resultando no que Gramsci denomina de Estado Integral, ou Estado Ampliado, segundo alguns estudiosos de sua obra, especialmente Cristine Buci-Gluksmann (1980). Ainda assim, muitos temem os desdobramentos da noção de Estado Ampliado e, para tanto, o esquema simplificado/simplificador que sinaliza o Estado como pura coerção e a sociedade civil como pura hegemonia, consegue reduzir, em muito, a complexidade da análise gramsciana (LIGUORI, 2006), pautada pela inexistência de uma rigorosa divisão entre ambas as esferas, exceto para fins didáticos.

    De uma forma ou de outra, consideramos o Estado ampliado a principal contribuição de Gramsci à renovação do marxismo em inícios do século XX, "superando as dicotomias vontade versus imposição, sujeito versus sociedade e base versus superestrutura, através de uma análise cuja ênfase é histórica" (FONTES; MENDONÇA, 2012, p. 62).

    O conceito de Estado ampliado permite verificar a estreita correlação existente entre as formas de organização das vontades (singulares e, sobretudo, coletivas), a ação e a formação da própria consciência – processos ocorridos no plano da sociedade civil e sempre enraizados na vida socioeconômica – e as instituições específicas do Estado em sua acepção restrita (sociedade política). Gramsci supera o dualismo das análises que segmentavam e contrapunham a base à superestrutura, integrando sociedade civil e sociedade política numa só totalidade, em constante interação, no bojo do que ele considerou como superestruturas (FONTES; MENDONÇA, 2012, pp. 62-63).

    É grande a preocupação do marxista italiano em evitar a postura reducionista segundo a qual o Estado se limitaria, meramente, à pura função coercitiva. Para ele, nesse Estado caberia, igualmente, a construção/generalização do consenso. Dessa forma, somente a partir desses dois conceitos-chave – sociedade política e sociedade civil – podemos entender o Estado ampliado. O primeiro termo é bastante claro na obra de Gramsci, remetendo ao Estado em seu sentido estrito – isto é, os organismos governamentais incumbidos da administração, da organização dos grupos em confronto, bem como do exercício da coerção sobre aqueles que não consentem, sendo por ele também denominado de Estado político ou estado-governo.

    A despeito de menos clara e mais complexa no decorrer dos Cadernos do Cárcere, a noção de sociedade civil implica o conjunto dos organismos chamados privados ou aparelhos privados de hegemonia (APHs), implicando a adesão voluntária de seus integrantes. Dentre esses aparelhos, Gramsci destaca igrejas, associações privadas, sindicatos, escolas, partidos e imprensa, encarregados de organizar as vontades coletivas, quer dos grupos dominantes, quer dos subalternos.

    Por enquanto, podem-se fixar dois grandes planos superestruturais: o que pode ser chamado de sociedade civil (isto é, o conjunto dos organismos designados vulgarmente como privados) e o da sociedade política ou Estado, planos que correspondem, respectivamente, à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de domínio direto ou de comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico. Os intelectuais são os prepostos do grupo dominante parta o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político, isto é: 1) do consenso espontâneo dado palas grandes massas da população à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante à vida social [...]; 2) do aparelho de coerção estatal que assegura legalmente a disciplina dos grupos que não consentem. (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 20-21).

    Como se percebe, é essencial no pensamento gramsciano a figura do intelectual, o efetivo organizador das vontades e da ação coletiva. Assim, o pleno desenvolvimento de uma classe – ou fração dela – ancora-se em sua capacidade de gerar seu próprio quadro de intelectuais, aptos a lhe conferirem homogeneidade, organicidade e mesmo consciência de seu papel social, seja no âmbito econômico, político ou cultural-ideológico. A partir dessa capacidade organizativa por excelência, os intelectuais respondem não apenas pela organização de um dado aparelho de hegemonia, mas também pela tarefa de fomentar a organização da sociedade em geral, construindo, dessa forma, a plena hegemonia da fração de classe por eles representada.

    Nesse sentido, é essencial sinalizar que, para Gramsci, a principal função dos aparelhos de hegemonia no Estado capitalista ocidental de seu tempo seria construir/conduzir o consenso, inclusive – e sobretudo –, junto às grandes massas pouco organizadas, de modo a obter sua adesão aos projetos articulados pelos grupos dominantes. Em suas próprias palavras,

    [...] Por enquanto, podem-se fixar dois grandes planos superestruturais: o que pode ser chamado de sociedade civil (isto é, o conjunto de organismos designados vulgarmente como privados) e o da sociedade política ou Estado, planos que correspondem, respectivamente, à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de domínio direto ou de comando, que se expressa no Estado e no governo jurídico. Essas funções são precisamente organizativas e conectivas. Os intelectuais são prepostos do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político, isto é: 1) do consenso espontâneo dado pelas grandes massas da população à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante à vida social [...]; 2) do aparelho de coerção estatal que assegura legalmente" a disciplina dos grupos que não consentem, nem ativa nem passivamente, mas que é constituído para toda a sociedade na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais desaparece o consenso espontâneo". (GRAMSCI, 2001, v. 1, p. 20-21, grifos meus).

    Não se pense, todavia, que essa correlação, mormente no espaço da sociedade civil, se efetiva sem conflitos, já que as disputas entre os distintos grupos sociais tanto atravessam os próprios aparelhos privados de hegemonia quanto os contrapõem uns aos outros, em luta pela imposição do almejado consenso. Diversamente do que supõem alguns autores, a sociedade civil não é tão somente o conjunto de aparelhos localizados fora da esfera estatal e, justamente por isso, dotada de pura positividade (BOBBIO, 2009). Pelo contrário, perpassada pelos conflitos de classe, a sociedade civil nada tem de idílica, posto ser em seu interior que se elaboram e confrontam projetos distintos e até mesmo antagônicos, ficando claro, no pensamento gramsciano, que ela é a arena da luta de classes e da afirmação de projetos em disputa, derivados de aparelhos de hegemonia distintos, mesmo que, em muitos casos, estes se conectem a uma mesma classe ou fração dela.

    De acordo com Gramsci, alguns APHs podem ser definidos como Partidos, na medida em que funcionam como uma espécie de estado-maior a conduzir o projeto nacional efetivamente hegemônico. Entretanto há que se levar em conta que, se

    [...] todos os membros de um partido político devam ser considerados como intelectuais é uma afirmação que pode se prestar à ironia e à caricatura; contudo, se refletirmos bem, nada é mais exato. Será preciso fazer uma distinção de graus; um partido poderá ter uma maior ou menor composição do grau mais alto ou do mais baixo; mas não é isto que importa: importa a função, que é diretiva e organizativa, isto é, intelectual. (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 25, grifos meus).

    Ou ainda:

    [...] para compreender como um movimento ou tendência de opiniões se torna partido, isto é, força política eficiente do ponto de vista do exercício do poder governamental: precisamente na medida em que possui (elaborou em seu interior) dirigentes de vários graus e na medida em que esses dirigentes adquiriram determinadas capacidades. [...]. Por isso, pode-se dizer que os partidos tem a tarefa de elaborar dirigentes qualificados; eles são a função de massa que seleciona, desenvolve, multiplica os dirigentes necessários para que um grupo social definido [...] se articule e se transforme, de um confuso caos, em exército político organicamente preparado. (GRAMSCI, 2000, p. 84-85, grifos SRM).

    Logo, o conceito de Estado ampliado vai muito além dos limites puramente institucionais que campeiam junto ao senso comum. Ele resulta de diferentes modalidades de organização e conflito presentes na vida social, constituindo-se, ele próprio, numa relação social entre forças desiguais (POULANTZAS, 2000). Por tal razão, Gramsci aponta que a unidade entre Estado restrito (sociedade política) e sociedade civil é sempre orgânica, advertindo, como já sinalizado, que essa distinção tem um cunho tão somente didático.

    O exercício normal da hegemonia [...], caracteriza-se pela combinação da força e do consenso, que se equilibram de modo variado, sem que a força suplante em muito o consenso, mas, ao contrário, tentando fazer com que a força pareça apoiada no consenso da maioria, expresso pelos chamados órgãos da opinião pública – jornais e associações – os quais, por isso, em certas situações são artificialmente multiplicados. (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 95).

    Não por casualidade, o pensador sardo se apropria da figura mítica do centauro como metáfora ilustrativa da organicidade das relações entre sociedade civil e sociedade política – ou entre consenso e coerção – dialeticamente imbricadas e inseparáveis, não podendo uma existir sem a outra, e vice-versa.

    Outro ponto a ser fixado e desenvolvido é o da dupla perspectiva na ação política e na vida estatal. Vários graus nos quais se pode apresentar a dupla perspectiva, dos mais elementares aos mais complexos, mas que podem ser reduzidos teoricamente a dois graus fundamentais, correspondentes à natureza dúplice do Centauro maquiavélico, ferina e humana, da força e do consenso, da autoridade e da hegemonia, da violência e da civilidade, do momento individual e daquele universal (da Igreja e do Estado), da agitação e da propaganda, da tática e da estratégia, etc. (GRAMSCI, 2000, p. 32).

    Em suma, para o pensador italiano que tanto inovou o campo do marxismo com sua singular definição de Estado Ampliado ou Integral, a peculiaridade do Estado capitalista reside no fato de guardar, simultaneamente, um espaço de consenso e não apenas de violência, sendo o consenso construído tanto pela atuação dos aparelhos de hegemonia ou partidos da sociedade civil quanto pela ação do Estado restrito, que promove e generaliza o projeto da fração de classe em vias de se tornar hegemônica num contexto historicamente dado.

    Ademais, política e Estado são inseparáveis da cultura, já que a hegemonia pressupõe a aceitação não só de um projeto, como também de todo um conjunto de valores e visões de mundo a ele inerentes. E mesmo instituições da sociedade política tipicamente relacionadas à coerção – como o Exército, por exemplo – respondem pela difusão de uma cada cultura-visão de mundo-ideologia.

    Nesse sentido, a pré-condição para a transformação social e do Estado nas sociedades capitalistas ocidentais é, segundo Gramsci, a multiplicação dos aparelhos de hegemonia da sociedade civil – ou seja, das visões de mundo e/ou vontades coletivas organizadas – que disputam entre si, todo o tempo, a manutenção de um projeto hegemônico ou a imposição de outro que lhe seja contrário (contra-hegemônico), em busca de uma nova hegemonia.

    Para tanto, é indispensável que o grupo ou fração de classe organizado junto a este ou aquele APH ou partido atue no sentido de inserir seus representantes – intelectuais – junto ao Estado restrito, de modo a favorecer a implementação do projeto da classe por eles representada, como interesse universal. Vê-se, pois, que o Estado ampliado, além de conceito altamente dinâmico e enriquecedor para a compreensão do papel do Estado na atualidade, é coerente com o jogo de contradições que atravessam, simultaneamente, sociedade civil e sociedade política (o que muitos autores de corte liberal reduzem à mera luta inter-burocrática).

    Conceber o Estado gramscianamente é concebê-lo em duplo registro: o das formas dominantes na produção (classes e frações) que se constituem e consolidam por intermédio de organizações da sociedade civil, e o da presença, nos mais diversos organismos do Estado restrito, de intelectuais vinculados a aparelhos de hegemonia da sociedade civil em busca de afirmação hegemônica. Alguns desses dirigentes das vontades coletivas, por certo, serão preponderantes junto a certo órgão estatal, ainda que outros igualmente lá também se façam presentes, em incessante disputa.

    Por tudo até agora apresentado, considero o Estado Ampliado não apenas um sofisticado e complexo conceito, mas também uma ferramenta metodológica de pesquisa, posto conter, em sua elaboração, os passos de um itinerário destinado à análise da constituição/transformações sofridas pelo Estado Ampliado e de todo tipo de temáticas a ele correlatas, como a dominação política de classe; a representação de interesses – dominantes e dominados – na sociedade capitalista; as mais diversas políticas estatais; as relações entre classe dominante, Estado restrito e classe

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