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As Origens Gregas do Direito Ocidental
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As Origens Gregas do Direito Ocidental

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Este é um livro para todos aqueles a quem interessa pensar o conceito de justiça, suas nuances, seus imperativos e desafios sociais. Nele, tanto os estudiosos do Direito quanto os demais interessados sobre o tema da justiça encontrarão boas vias de estudo sobre as origens míticas e históricas do Direito ocidental, em sua matriz grega. Nesta (re)visitação à cultura "jurídica" da Grécia Antiga, os leitores poderão retornar a uma fonte primaz da racionalidade e das problemáticas que subjazem a tradição de reflexões que o Ocidente fez e faz sobre a justiça, em suas perspectivas teórica e prática. Cada um que se permitir a tal retorno adentrará no universo sociocultural greco-antigo e conhecerá as maneiras pelas quais essa civilização (que também é a nossa) foi forjando seu(s) conceito(s) de justiça, desde o nascedouro de seu imaginário cultural (com as primeiras narrativas míticas sobre as origens dos deuses e dos homens) até o período clássico de sua história, quando em Atenas o mundo viu nascer a filosofia humanística, a democracia e as bases do Direito moderno (com a inauguração do Tribunal do Areópago). Aos que caminharem nesta viagem de volta ao passado, ao menos uma certeza pode ser antecipada enquanto prêmio: esta obra nos prova que um retorno aos antigos gregos tem muito a nos ensinar.
LanguagePortuguês
Release dateApr 26, 2018
ISBN9788547314323
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    As Origens Gregas do Direito Ocidental - Eduardo de Almeida Rufino

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2018 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO SOCIOLOGIA DO DIREITO

    À vó Bindô, in memoriam!

    θνῄσκειν μὴ λέγε τοὺς ἀγαθους 

    Não diga que morrem os bons.

    (Calímaco, 9 Pf.)

    Agradecimentos

    Aos nossos pais,

    Maria Elizete e Manoel Rufino Neto,

    doutores do saber meta-acadêmico

    de formar o humano pelas vias do amor.

    Apresentação

    Como um convite de leitura, toda introdução antecipa – em suas palavras prefaciais – o destino da obra e os destinatários a quem ela se remete. Antes, pois, de falarmos do destino formal da obra, seus comos e seus porquês, falemos dos/para seus destinatários, dos/para seus leitores.

    O tema da justiça é obviamente caro aos que fazem do Direito sua área de profissão. Todavia os não profissionais do Direito não são – ou não deveriam se perceber – menos envolvidos por essa temática. De vários modos se manifestam os clamores de justiça entre os que vivem em sociedade, especialmente quando certos comportamentos destoam do que julgamos ideal/adequado em relação à natureza das coisas ou às convenções positivadas socialmente. De várias maneiras o tema da justiça nos seduz, já que o ato/fato mesmo de viver nos ajusta ou desajusta quanto a determinadas motivações existenciais individuais e coletivas: eis um conceito que acompanha nossa existência mais embrionária. Assim, por mais que sua abordagem principal seja mais receptiva aos que trafegam pelo campo do Direito e de outras áreas humanísticas, a amplitude discursiva deste livro transpõe os limites dessa ciência humana, porque trata do humano, de seus dilemas existenciais, de suas necessidades/dificuldades práticas para uma convivência social possível.

    Conforme a ressalva supracitada, este livro – inserido na coleção Sociologia do Direito, da editora Appris – não se dirige estritamente aos que estão em formação inicial e continuada no Direito; todavia é inequívoco afirmar que encontra neles um público propício. Nesse sentido, uma curiosidade distinta – na formação desses acadêmicos – prefacia nossos créditos quanto à pertinência do acolhimento desta obra entre tal seleto grupo: apesar de a cultura ocidental que nos é contemporânea (em todas as suas nuances) ter na racionalidade mítica e filosófica da Grécia Antiga um de seu mais importantes pontos de partida (ao lado do logos mítico-filosófico da tradição judaico-cristã) e, junto a isso, apesar de o Direito ocidental ter suas raízes nesse mesmo horizonte sociocultural, não é comum encontrarmos cursos de Direito cujos currículos contemplem discussões a esse respeito, tanto quanto professores familiarizados com essa perspectiva temática. Em contrapartida, o Direito Romano é muito mais conhecido e trabalhado nessa área de formação acadêmica.

    Aos que reconhecem a importância de um retorno à Roma Antiga para compreender a configuração do seu Direito e, portanto, para poder ter mais clareza sobre as perspectivas conceituais que constituem o seu legado de influências ao Ocidente, lembramos que a cultura romana que gestou o referido Direito tem a cultura grega como seu referencial fundante, especialmente por ocasião da chegada do Império Romano à Grécia. Desse modo, um convite imperioso floresce aos estudiosos do Direito e demais interessados: uma visita à cultura jurídica da Grécia antiga é um retorno a uma fonte primaz da racionalidade e das problemáticas que subjazem a tradição de reflexões que o Ocidente fez e faz sobre a justiça, em suas perspectivas teórica e prática. Nesta obra resgatamos, portanto, uma tradição que se nos antecipa e que se revela uma referência ímpar às configurações que o Direito vai assumindo no Ocidente desde então.

    Em seu processo analítico, este livro se propõe a uma espécie de arqueologia – um discurso sobre as origens – do Direito ocidental. Referenciados por uma perspectiva sociológica, literária e filosófica de análise das configurações socioculturais da Grécia antiga, buscamos apresentar as maneiras pelas quais os gregos foram forjando seu(s) conceito(s) de justiça, desde o nascedouro de seu imaginário cultural (com as primeiras narrativas míticas sobre as origens dos deuses e dos homens), até o período clássico de sua história antiga, culminando no nascimento do Tribunal do Areópago, em Atenas. Nesse processo arqueológico, nossa investigação assume especialmente duas obras-guia forjadas no seio da Antiguidade grega: a Teogonia, do poeta Hesíodo, e a Oresteia, trilogia de peças teatrais do tragediógrafo Ésquilo.

    Escrita no século VIII a.C., a Teogonia canta o universo mítico das origens, revelando o ordenamento desse universo a partir dos feitos primordiais dos deuses titânicos e olímpicos. Como um autêntico poema didático de cunho religioso, essa obra narra o processo de instituição da ordem no mundo dos deuses, reverenciando Zeus e os demais deuses olímpicos como os modelos da civilidade humana e, portanto, as referências da justiça, do bom costume, das boas leis (eunomia). Essa obra traduz o espírito de uma época em que a Grécia era ainda rural e aristocrática, educada pelos mitos, governada por reis (basileis) cujo poder era chancelado pela vontade (boulé) dos deuses. Nessa sociedade, cada rei era também o juiz da cultura, porque investido religiosamente para resolver as demandas sociais por meio das sagradas leis dos deuses (thêmis). O paradigma religioso vigente referenciava o comportamento humano e viabilizava um tipo específico de coesão social. Contudo os leitores verão que com o advento da cidade-Estado (pólis), todo esse cenário cultural enfrentará tensionamentos, tão logo surjam questões embaraçosas como a que move a narrativa da Oresteia, de Ésquilo, cujo protagonista – Orestes – se vê condenado pela lei dos deuses (thêmis) justamente por realizar uma ação que cumpria fidedignamente o que a mesma lei exigia.

    Cidadão de Atenas no clássico século V. a.C., século da democracia e do Direito nascentes, Ésquilo leva ao teatro uma provocação a respeito da viabilidade social de um Direito fundado em princípios religiosos e não escritos de justiça. Aliás, como o(a) leitor(a) poderá ver no decorrer destas páginas, o desenlace dessa e de outras problemáticas será um convite persistente para que empreenda(mos) uma re-flexão (um dobrar-se repetidas vezes) sobre a pertinência de práticas/concepções antigas de justiça que por ventura abandonamos ou talvez ainda persistam entre nós.

    De Hesíodo a Ésquilo, faremos um passeio por um universo cultural basilar àquilo que somos enquanto indivíduos e sociedades que se organizam em torno do ideal de justiça. Revisitaremos, pois, a nós mesmos, enquanto sujeitos ocidentais. Por si só, esse já parece ser um motivo mais do que justo para cada um de nós, escritores-leitores dos rumos de nossa vida privada e social.

    Os autores

    Prefácio

    Embora se apresente como breve ensaio introdutório, o livro ora prefaciado dos jovens pesquisadores Eduardo de Almeida Rufino e Emmanoel de Almeida Rufino reflete maturação acadêmica suficiente ao jungir habilidade literária e significativa reflexão filosófica. Não é pequena a iniciativa de transitar nos horizontes míticos da justiça, como anunciaram os autores logo no título do texto. No entanto, ao menos para minha singela percepção, realizaram tal tarefa com galhardia e competência.

    Os guias de que se serviram nessa trilha quase labiríntica são dignitários do imaginário que representam. Hesíodo e Ésquilo, para as finalidades eleitas e declaradas pelos autores, erigem-se tal qual vozes imemoriais dos cenários arcaico e clássico respectivamente. Cenários esses, em consonância com a visão de Eduardo e Emmanoel, que não se dissociam completamente.

    No legado hesiódico, seguindo os passos dos autores, vislumbra-se o partejar da justiça por dentro do novo tempo, ainda em construção, a desvelar seu poder que já não se resume à força, porque então adquiriu astúcia, mais adiante compreendida como sabedoria compartilhada e respeitada como lei entre os deuses. Na interpretação dos autores, é a concepção de Direito na imagem de Thêmis.

    Ao avançar nos argumentos colhidos pelos autores, percebemos que a substância do pensamento dos gregos sobre eticidade consistia, inicialmente, na ideia de que a vida boa não se fundamentava apenas na observância das leis, mas sobremaneira na aquisição e no exercício inteligente das virtudes, ou seja, daquelas disposições para agir que merecem elogio e realizam nossas melhores capacidades¹.

    De maneira geral, a ética é considerada uma decisão sobre a conduta do cidadão politicamente inserido. Essa posição autonômica apoia-se em duas fontes de valor: a lei e a natureza. A questão é de relevância singular e decisiva na reflexão do mundo antigo, porquanto isso também implica a inseparabilidade entre o estudo da natureza e a análise dos costumes, das usanças sociais².

    As noções de virtude, cidade, lei, alma, destino, paixão e felicidade, de que o pensamento ético se alimentou, nascem em um domínio extrafilosófico, no terreno da experiência religiosa, política e social, e encontram suas primeiras expressões culturais nas linguagens da poesia, da tragédia, da comédia e da historiografia.

    Pensar em uma reflexão histórica da ética antiga, que não ignore essas dificuldades e que, por outro lado, não resulte superior aos limites do trabalho almejado por Eduardo e Emmanoel, significa pensar antes de tudo em seleções e preferências. Trata-se, pois, de apresentar os momentos e cenários de encontro dos problemas morais e da reflexão ética, cujo significado parece decisivo tanto para a tradição arcaica quanto para a tradição clássica, com rebatimentos na contemporaneidade³.

    Com o que compreendemos do texto desses autores, a moral dos gregos, como qualquer outra, é tão antiga como sua sociedade e, portanto, como seu primeiro documento poético⁴. De outra banda, se a questão dos inícios pode resolver-se em termos cronológicos razoavelmente precisos, existem aspectos de larga duração na reflexão moral e na ética antiga que não variam substancialmente no curso de sua história através dos séculos, e que formam um marco estável para a compreensão dessa história. Isso contribui para a compreensão do problema da justiça enquanto Dikē a partir da oposição nomos/phýsis⁵.

    O primeiro desses aspectos consiste no papel central que os valores e as normas morais desempenham tanto no governo da vida individual como nas dinâmicas de integração e consenso social. A sociedade grega não dispunha de fortes aparatos coercitivos de tipo político como o Estado e a magistratura, e menos ainda de aparatos de condicionamento ideológico e educativo, como uma escola dirigida pelo Estado ou uma Igreja unificada⁶.

    Tomando por base as reflexões que os autores dividem conosco, recordamos que nem sequer existiam textos dotados de um valor normativo universal, como um corpo legislativo unificado ou um livro sagrado que pudesse ser interpretado como uma escritura impositiva, embora a historiografia registre algumas leis esparsas⁷. Havia uma série de prescrições para o que fazer e o que não fazer em vários contextos, mas essas prescrições nem sempre eram compatíveis entre si e não eram deriváveis de alguns princípios ou ideais básicos, carecendo, portanto, de sistematização⁸.

    Essa carência era preenchida continuamente pela ação de agentes morais, de alguma forma espontânea, como as dinâmicas de autoformação do corpo social, as correntes de pensamento religioso, as mensagens sapienciais e, mais tarde, o trabalho das escolas filosóficas e o intercâmbio político, os festivais, concursos, exibições e teatro⁹.

    A espontaneidade social e cultural dos processos de formação e subjetivação moral do homem antigo deixa abertos espaços de incerteza, conflitos de eleição e liberdade desconhecidos em outros sistemas sociais. Precisamente porque suprem essa ausência de regras coercitivas, a moral e a ética antiga assumem um papel central baseado na pressão que exercem dentro do âmbito da política, do governo da vida e da integração social, exigindo um pensamento mais discursivo, mais argumentativamente articulado, mais exposto à refutação¹⁰.

    Apesar da necessidade de normas e valores interiorizados e socialmente compartidos, nas culturas antigas o sujeito da ação moral, o destinatário do discurso ético, nunca foi o homem em um sentido universal. Sempre fora selecionado a partir de procedimentos de exclusão baseados

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