Da Fotografia, Seus Espaços [Articulações, Dinâmicas e Experiências]
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De cada teórico apresentado, propostas sobre os espaços são destacadas por meio de três olhares distintos e sobrepostos nas narrativas fotográficas da contemporaneidade: o da complexidade, o dos afetos e o da poética. Com um esboço inicial de cada teórico, suas ideias são aplicadas isoladamente a diferentes trabalhos fotográficos. A seguir, articulações entre as propostas teóricas dos diferentes autores são compostas para elaborar diversas possibilidades simbólicas dos espaços em diferentes projetos fotográficos produzidos em diversos países. Ao todo são analisadas dezenove propostas, de quinze fotógrafos. Acredita-se que nesse processo questões ainda não tão claras sobre os espaços da fotografia, e da própria fotografia como elemento expressivo e simbólico, possam passa r para um primeiro plano.
Descrição longa
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Da Fotografia, Seus Espaços [Articulações, Dinâmicas e Experiências] - Anuschka Reichmann Lemos
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO - SEÇÃO GESTÃO
Para Brunilda, Antonio e Alexa.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em especial, aos professores e queridos:
Boris Kossoy, pela orientação sensível e original em todas as etapas desta pesquisa, por valorizar o mistério da fotografia, como fotógrafo e teórico; Cremilda Medina, pelo pensamento amplo, preciso e inovador; Maria Luiza Tucci, pela infinita gentileza e energia no caminho da orientação; Ronaldo Entler e Daniela Palma, pelas leituras atentas e pontos sugeridos; Kati Caetano, pelas primeiras conversas sobre os espaços da fotografia.
Brunilda, pelos lindos trajetos reais e imaginários desde menina; Antonio, pelo carinho e pela torcida constantes por todas as minhas escolhas; Andreas e Guenia, por estarem sempre tão perto; Alexa, pelas risadas descontroladas, sempre; amigos e colegas, pelas conversas inspiradoras; Ivan, por me colocar na foto.
PREFÁCIO
O livro de Anuschka Reichmann Lemos surge como um desafio provocador no clima rarefeito que predomina no âmbito do pensamento e da reflexão sobre a fotografia no Brasil.
A autora busca nas entranhas do fenômeno fotográfico a inspiração para um mergulho teórico e poético à procura da compreensão de um dos aspectos fundamentais da constituição da imagem fotográfica: o espaço. É o espaço seu personagem fugidio, desafio de uma carreira.
Propõe-se nesta obra um exercício de interpretação de imagens a partir de uma rede de conceitos e pensamentos marcantes na obra de seis teóricos, não necessariamente especialistas das imagens, porém pensadores reconhecidos nas proposições que fazem sobre os espaços do mundo. Mundos imersos num universo de variáveis, espaços interiores e exteriores, naturais e construídos, concretos e imaginários, mundos dos fatos visíveis, mundos da fantasia.
Pela combinação dos conceitos estabelece/constrói um arcabouço intelectual e estético que tem por objetivo a proposição de um mapa do espaço que contém inúmeros espaços, reais e imaginários, onde as teias da rede se articulam entre si: topografia de afetos e intenções, memórias e recordações, realidades e ficções.
Essas construções fazem-se a partir do pensamento dos autores de cujas ideias Anuschka empresta para seu constructo. As possibilidades de armação de novos constructos são infindáveis como infindáveis são os espaços que vemos, que ocupamos e que nos rodeiam. Vemos e convivemos com essas imagens-espaços continuamente, ao longo da vida. É o destino dos criadores de espaços aparentemente reais, porém imaginários, posto que transferidos para a segunda realidade, que é a que transporta as aparências do passado.
Espaços de pensamentos e sentimentos em que a vida dos seres e das coisas do mundo já se esvaiu, corpos e volumes foram reduzidos a planos sufocantes. Tudo isso mediante a perspectiva, a maquina de ver, eterna condição da representação.
Berger já falava que entre o momento da tomada da foto e o presente momento em que vemos a fotografia existe um abismo
(BERGER apud DUBOIS, 1994, p. 90.). É nesse abismo que se insinua a autora com o instrumental interpretativo de que dispõe, formulado pelos conceitos dos vários pensadores com os quais trabalha. É certo que, enquanto fotógrafa, ela também associa sua experiência visual à proposta. Esse é um dado interessante porque sua apreciação teórica sobre o objeto denota a compreensão e saberes próprios daqueles que também criam o mundo imagético.
Teoria e poética direcionam Anuschka por uma topografia de cumes e vales que estabelecem o traçado do seu mapa imaginário: espaço codificado de descobertas e sensações. Mapa que é essência pura para compreendermos o nosso lugar no mundo e o lugar da fotografia, de seus suportes e temas, em seus espaços transitórios e pantanosos e em seus becos misteriosos. Espaços do mundo, vagos e definidos, espaços da representação, ilusórios e iconográficos, destinados ao eterno retângulo. São os dois espaços de realidades fotográficas, palcos do efêmero e do perpétuo, do vivido e do inerte, do fato (dito) real e do fantasma das aparências.
A autora demonstra, por meio de imagens representativas, do ponto de vista temático, extraídos de diferentes geografias e contextos, em que medida seu mapa montado por camadas sugere incursões interpretativas instigantes; incursões que abrem amplo caminho para a crítica fotográfica, assim como sugerem pistas para a interpretação. E essa me parece ser a contribuição maior de seu livro, que nasce da imersão que faz a autora para o interior de um mundo do não palpável, espaço de incógnitas, espaço entre-realidades a determinar. Um modelo consistente que oferece amplas possibilidades de abordagens interdisciplinares.
Prof. Dr. Boris Kossoy
Professor Titular
Escola de Comunicações e Artes
Universidade de São Paulo
Apresentação
Por uma e todas as imagens
Figura 1 – Dmz, De Atta Kim.
Fonte: Kim, 2006, p. 64.
Há alguns anos, ao passar os olhos por alguns livros de fotografias, deparei-me com essa imagem do Atta Kim. Ela era parte de um ensaio que apresentava diversos ângulos de uma paisagem natural, de espaços quietos e bucólicos, por vezes afetados pelo vento ou cortados por cercas de arame. Suas cores e seu enquadramento levavam a uma tranquilidade e paz que pedem as imagens contemplativas. No entanto, ao buscar mais informações sobre o ensaio, a contextualização geográfica e política transformaram meu encantamento inicial. Eram fotografias do DMZ (Demilitarized Zone), área entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte considerada, então, a fronteira mais armada do mundo. É uma área de conflitos e hostilidades entre os dois países, marcada pela ameaça permanente do outro. Ou seja, as fotografias do ensaio apresentavam contradições e ambiguidades entre o que era evidente, aparente, e seu contexto. Como leitora, as imagens me fizeram andar pelos diferentes espaços propostos por elas – espaços da situação e da imagem, do natural e do cultural, do passado e do presente, da evidência e do mistério –, todos eles espaços que, combinados, esboçam possíveis trajetórias marcadas por contradições e verdades. Esse jogo entre espaços trouxe à tona questões que me acompanhavam há tempo, de forma discreta.
Comecei a pesquisar outros trabalhos a partir de um mesmo questionamento, entender o potencial simbólico e expressivo dos espaços da fotografia, tanto pela experiência do fotógrafo quanto pela experiência do leitor. Iniciei um estudo mais aprofundado em projetos fotográficos de diversos autores que lidavam com questões de fronteiras, de territórios, com relações de pertencimento ou abandono, com espaços naturais, construídos e artificiais, com deslocamentos e fusões de espaços e subjetividades. Imagens de fotógrafos como Sze Tsung Leong (China), Alex Webb (fronteira entre México e EUA), Alec Soth (Bogotá), Juan Travnik (Argentina), An-My Lê (Vietnã e EUA) e Beate Gütschow (não espaço) foram, aos poucos, construindo um cenário complexo que esboçava diversas questões sobre as relações humanas com os espaços possíveis e as relações subjetivas com os espaços fotográficos. Outras fontes, do cinema e da literatura, também foram determinantes nesse processo. Obras como as de Tomáz Eloy Martínez, Haruki Murakami e Bernardo Carvalho, com seus personagens navegantes entre diversos espaços e realidades, traziam pontos que ajudavam na compreensão dos espaços fotográficos. Filmes como Do outro lado (Fatih Akin), Não por acaso (Philippe Barcinski), O conto chinês (Sebastián Borensztein), com personagens em constante adaptação, criação e transformação, apresentavam relações espaciais e culturais muito presentes nas fotografias.
Figura 2 – Composição com as imagens: S#10, Beate Gütschow / Claromecó #2, Juan Travnik / Boquillas, Coahuila, Alex Webb / Causeway Bay, Sze Tsung Leong / Sem Título, Alex Soth / Ho Chi Minh City, An-My Lê.
Fonte: Gütschow, 2007, p. 63 / Travnik, 2006, p. 47 / Webb, 2003, p. 102 / Leong, 2006, p. 127 / Soth, 2007, Capa / Lê, 2005, p. 27.
Se mergulhei como leitora, também busquei elaborar a experiência como fotógrafa. Realizei alguns ensaios fotográficos sobre diferentes questões envolvendo espaços – Entre-espaços, Noites surdas e Fora do lugar. O primeiro, sobre os espaços formados a partir do deslocamento de pessoas em cenários urbanos. O segundo, sobre os possíveis trajetos e encontros do caminhante noturno. O terceiro, ainda em desenvolvimento, sobre os espaços que habitam as pessoas, mesmo que elas estejam presentes em outros lugares. Todos trazem questões sobre a relação das pessoas com seus espaços construídos, vivenciados, articulados, reais e imaginários.
Esse conjunto de narrativas e experiências como fotógrafa e leitora acabou por interessar-me como pesquisadora, despertando diversas questões ligadas aos espaços fotográficos: as relações ambíguas e instáveis entre a imagem e o que ela representa, entre a experiência de ver o assunto (fotógrafo) e de ver a imagem (leitor), entre o tempo do passado e o tempo do presente, entre a imagem, o imaginário e a memória, entre o aparente e o oculto, entre o enquadrado e o extraquadro. E é no encontro entre esses espaços, trajetos e experiências que esta pesquisa aconteceu.
A autora
Sumário
Parte I
Por uma topografia dos espaços da fotografia
1 Os espaços das realidades
Os espaços das realidades [Boris Kossoy]
Os espaços das realidades em Los Restos
2 Os espaços complexos
Os espaços complexos [Edgar Morin]
Os espaços complexos em DMZ
3 Os espaços praticados
Os espaços praticados [Michel de Certeau]
Os espaços praticados em The Crossings, Under The Grudging Sun e Istanbul
4 Os espaços apresentados
Os espaços apresentados [Michel Maffesoli]
Os espaços apresentados em Small Wars
5 Os espaços do fora
Os espaços do fora [Tatiana Levy]
Os espaços do fora em S
6 Os espaços mediados
Os