Relação entre a universidade pública e a rede municipal de educação
By DEBORA MAZZA
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O Cege, segundo o plano de trabalho acordado entre as partes, objetivou:
1- Fortalecer o compromisso dos gestores para a construção de um projeto de gestão democrática que tenha como foco o aprendizado dos alunos da Educação Básica e o bem-estar do coletivo escolar, buscando superar toda e qualquer forma de discriminação e/ou exclusão social; 2- ampliar os conhecimentos dos gestores de unidades escolares no que se refere aos múltiplos aspectos envolvidos no planejamento e na gestão como processo de construção coletiva, estimulando a realização e o aprofundamento de estudos na perspectiva de uma formação continuada; 3- valorizar a prática profissional concreta dos gestores de unidades escolares e incrementar o intercâmbio de experiências sobre a gestão de projetos sociais, no currículo e no Projeto Político Pedagógico.
Os diversos conteúdos e as práticas do curso pautaram-se pelos princípios: 1- da formação do profissional voltada: a) para a reflexão sobre a sociedade em que se inserem os processos educativos; b) para a gestão democrática e a construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico; 2- do currículo como um dos eixos centrais da reflexão sobre a escola, a educação e a sociedade; 3- da escola como espaço de construção da cidadania e de resistência a toda forma de discriminação e exclusão social.
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Relação entre a universidade pública e a rede municipal de educação - DEBORA MAZZA
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2016 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.
Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
Curso de especialização em gestão escolar- CEGE (Pós- Graduação Modalidade Lato Senso)
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO, TECNOLOGIAS E TRANSDISCIPLINARIDADE
APRESENTAÇÃO
O objetivo último da educação escolarizada [...]
está em inventar e reinventar dia após dia
a civilização sem barbárie.
(FERNANDES, 1989)
Apresentar a quarta versão do Curso de Especialização em Gestão Educacional (Cege) exige um olhar histórico e a construção de um texto narrativo.
O narrador, segundo Benjamin (1997), é aquele que fala com pertencimento porque sua fala vem misturada com o vivido. Então ele fala da experiência vivida.
A experiência, segundo Larrosa (2002), não é algo que aconteceu, algo que passou, mas algo que aconteceu, passou e me tocou.
Foram 2 anos, de agosto de 2013 a julho de 2015, que estivemos três sábados consecutivos em atividades presencias na Faculdade de Educação da Unicamp e um sábado de folga
para iniciar um novo módulo e entrar em contato com as atividades de Educação a Distância (EaD).
Alguns desistiram, outros pensaram em desistir, muitos resistiram e comparecem como autores de livros que organizamos a partir dos memoriais de conclusão de curso, celebrando o que aconteceu, o que se passou e o que nos tocou nesse processo de formação.
Contamos com professores, monitores de EaD, estudantes e funcionários que dedicaram muitos sábados de trabalho na Faculdade de Educação da Unicamp e viabilizaram o Cege. Esforçamo-nos para equilibrar as atividades presenciais com as atividades de EaD, entendendo-as como ambientes de aprendizagens diferentes e combinados que poderiam ser explorados de formas variadas, tais como: preparação das atividades presenciais, fixação de conteúdos, fórum de discussão inter/intragrupos, repositório de textos, livros, artigos, trabalhos, organização de grupos, postagem de fotos e vídeos. Exploramos, principalmente, as ferramentas: Agenda, Atividades, Material de Apoio, Portfólio, Correio e Leituras.
Várias situações foram desafiantes: o enfrentamento do conjunto de leituras indicadas; as atividades de fixação e avaliação; o controle do calendário das atividades presenciais e à distância; o contato com os docentes e monitores dos diferentes módulos; as propostas de trabalho; o aprendizado do acesso ao sistema Teleduc; a administração das senhas; a concomitância das dinâmicas de trabalho da escola, os movimentos de greve etc.
Foram anos em que aprofundamos a reflexão sobre a Educação como um bem público e subjetivo,
[...] direito de todos e dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL. 1988, Art. 205).
A pauta da educação esteve presente nos munícipios, nos estados e na união mobilizada, dentre outros agenciamentos, pelas conferências municipais, intermunicipais, estaduais e federais da educação, as Conferências Nacionais de Educação (Conaes). Os desafios da escola de tempo integral; o fluxo dos alunos na relação idade/série; as condições de acesso-permanência e vivência escolar significativa; a educação especial, projetos e infraestrutura adequados; o financiamento e o percentual dos recursos vinculados à educação; a compreensão da educação inclusiva; a valorização do magistério com formação, carreira, contrato, condições de trabalho e salário; a centralidade do trabalho pedagógico na escola; a necessidade do diálogo com outros profissionais, bens, equipamentos e serviços públicos e privados existentes no entorno da escola, tendo em vista a construção de territórios educativos; a garantia do desenvolvimento das muitas formas de expressão, incluindo o brincar, a cultura dos coletivos, as artes, a literatura; o desafio de alargar a visão estreita e estrita de alfabetização e letramento; os movimentos sociais nas ruas que impactaram a escola com as demandas de sexo/gênero, raça/cor, classe; os limites e as possibilidades de realização do trabalho coletivo na escola por meio de gestão democrática. Essas e muitas outras foram as agendas que compareceram no trabalho cotidiano dos gestores e nos módulos desenvolvidos no Cege.
Foram anos em que, contraditoriamente, os governos em diferentes instâncias dos entes federados construíram parcerias público-privado que embaçaram a escola como um direito público subjetivo e produziram inflexões perigosas entre o público e o privado, o privado e o público, o público não gratuito. O Ministério e as Secretarias de Educação se aproximaram de fundações, empresas, organizações de prestação de serviços, assessoria privada de diagnóstico, formação e divulgação. Produziu-se uma retórica hostil sobre a escola pública, um desprezo pelos alunos, uma crítica à profissão docente, um descrédito sobre a gestão dos recursos que contou com o apoio da mídia- os think tanks, formadores de opinião pública que, segundo Normand (2008), exploram o blame e o shame, ou seja, a culpa e a vergonha.
Espelhos invertidos que apontavam a incompetência e ineficiência dos serviços e servidores públicos e a defesa da competência e eficiência dos serviços e funcionários privados. Na prática, sabemos que essa imagem construída não resiste ao teste do real, basta acionarmos um plano de saúde privado, um seguro de carro, um serviço de atendimento ao direito do consumidor para adentrarmos num longo processo de esperas, negativas sucessivas, interdições, desrespeito e muita perseverança para conseguirmos alcançar algo muito distante do prometido no momento da compra do produto, ou seja, descobrimos que a esfera privada não é eficiente e competente e nem alcança em qualidade e quantidade a cobertura da esfera pública.
Foram anos difíceis no município, no Estado, no País e no cenário internacional, pois a globalização do modo de produção, circulação e consumo capitalista provocou desequilíbrios sociais, políticos econômicos e ambientais, produzindo crises no centro e na periferia do sistema, acarretando deflação e crescimento negativo em muitos setores e aprofundamento da diferença e da desigualdade em escala planetária.
Esses desafios selaram os encontros semanais do Cege como um fórum de empoderamento na construção de princípios que apontavam para a importância da escola e da participação do diretor, do professor, do coordenador, do supervisor, dos funcionários, das crianças e das famílias, como instâncias e sujeitos imprescindíveis na construção da ordem social democrática (MAZZA & ZAMBONI, 2015).
A escola sozinha não muda a realidade, mas ela é um partícipe sem a qual os coletivos sequer tomam consciência de que têm direitos a ter direitos. Educar não é produzir mercadorias com valores de uso e de troca. Educar é constituir-se como bebê, criança, jovem, adulto, idoso; com raça/cor/etnia, sexo/gênero, religião, classe social, relações de pertencimento e marcadores de natureza e cultura. É comprometer-se com a construção de uma ordem social que garanta condições efetivas, e não apenas jurídico-legais, de acesso aos bens materiais e imateriais socialmente produzidos; condições que se expressam na cesta básica das políticas sociais que possibilitam a construção de sociedades que respeitam as diferenças, mas se indignam diante das desigualdades e, assim, constroem ambientes sociais e naturais mais igualitários e justos (HESSEL, 2010).
É importante declarar:
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1988, Art. 6o. Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015).
A primeira versão do Cege ocorreu nos anos de 2005 a 2006 mediante um acordo firmado entre a Universidade Estadual de Campinas e a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. O curso destinava-se a 6.000 gestores que atuavam na rede de educação pública do Estado e desde então as demais versões do curso seguiram uma estrutura e um funcionamento parecidos organizando-se em módulos, cada um deles correspondendo a uma disciplina do curso e, ficando sob a responsabilidade do coordenador da disciplina, a seleção e organização da dinâmica formativa (BITTENCOURT, 2005).
A segunda versão do Cege ocorreu nos anos de 2007 a 2009 por meio de um acordo firmado entre a FE da Unicamp e as Secretarias Municipais de Educação de 12 municípios. A saber: Americana, Arthur Nogueira, Campinas, Hortolândia, Indaiatuba, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Barbara D’Oeste, Santo Antônio da Posse, Sumaré, Várzea Paulista. O curso destinava-se a cerca de 300 gestores que atuavam nas redes de educação pública dos municípios.
A terceira versão ocorreu nos anos de 2009 a 2011 mediante um acordo firmado entre a FE da Unicamp e as Secretarias Municipais de Educação de seis municípios: Amparo, Cosmópolis, Hortolândia, São Jose do Rio Pardo, Sumaré e Várzea Paulista. O curso destinava-se a cerca de 50 gestores que atuavam na rede de educação pública desses municípios.
Em todas as versões a carga horária do curso contou com ambientes presencias (50 a 60%), ambientes virtuais (50 a 40%) e o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na forma de um memorial de percurso profissional. O Memorial de Formação foi utilizado como um importante instrumento formativo e, simultaneamente, avaliativo. Sua construção envolve um processo em que o sujeito descreve e analisa, de forma crítica e reflexiva, a sua formação pessoal, escolar e profissional, em uma dada situação ou período, identificando o papel que as pessoas, os fatos, as instituições e as políticas exerceram ao longo do seu percurso, além de identificar os principais mediadores determinantes das mudanças ocorridas. Nesse sentido, o Memorial de Formação é utilizado como um instrumento formativo, preferencialmente em um espaço coletivo que possibilita o partilhamento de ideias e sentimentos, ações com a participação de grupos reflexivos e de mediadores experientes.
No caso do Cege, em que os estudantes são gestores em exercício, o foco central do processo foi a articulação das experiências vividas durante o curso, buscando identificar como elas afetaram as concepções e as práticas que esses profissionais apresentavam no início do curso, bem como o processo de transformação ocorrido.
Nesse sentido, o Memorial de Formação caracterizou-se como um instrumento que potencializa os processos de aprendizagem, posicionamentos e mudanças, a partir do esforço de descrição, análise e interpretação de realidades educativas por meio do diálogo entre todos os participantes.
Nessa quarta edição do Cege contamos com uma equipe de trabalho composta por docentes responsáveis pelos módulos, monitores de EaD, corretores de TCCs, coordenação, funcionários permanentes que secretariaram o curso e funcionários que se revezaram na manutenção da infraestrutura necessária para que as aulas presenciais ocorressem aos sábados no prédio da Faculdade de Educação da Unicamp.
A equipe permanente contou com:
QUADRO 1.
FONTE: Organograma dos módulos/disciplinas do Cege.
Entendemos que a valorização da educação e dos educadores deve ocorrer a partir de três dimensões: 1- a formação inicial, continuada e em serviço; 2- a carreira, que compreende os salários e os planos de carreira; e 3- as condições de trabalho (PIOLLI, 2015). Assim sendo, um curso de especialização participa do esforço de valorização da educação e dos educadores problematizando a formação recebida e em processo, o impacto das políticas, a situação dos equipamentos, o perfil dos coletivos que participam das escolas, o grau de atratividade da profissão, a falta de professores, o quadro de saúde desses profissionais, a qualidade e a quantidade dos serviços prestados pela rede pública de ensino, a escola e sua relação com o ambiente social e natural.
Desde o princípio o Cege se propôs a buscar a pluralidade, diversidade e liberdade de pensamento
e a resistir à indústria da fotocópia que se alastra indiscriminadamente
e que afeta a forma e ao conteúdo da educação na medida em que torna massificado, fugidio e descartável nossas melhores expressões representando o fim da perenidade
(BITTENCOURT, 2005, p. 10). Nessa perspectiva, o curso apresenta-se como um desafio para os docentes e os grupos de pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Educação, da FE/Unicamp, voltem-se para a produção de conhecimento novo acolhendo também os processos de formação de profissionais da educação que atuam nas redes públicas de ensino. Assim nasceram os módulos que compõem as disciplinas do Cege e promovem interfaces com a pesquisa dos docentes e dos grupos, a formação continuada dos profissionais da educação, a extensão da universidade, as redes de educação e os ambientes sociais e naturais.
Dentro das propostas dessa quarta versão do Cege, reiteramos o convite a todos os envolvidos para o desafio de produção de conhecimento novo a partir desse processo de formação. Assim, estamos em vias de