Contos dos meninos índios
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Contos dos meninos índios - Hernâni Donato
Ao redor
da fogueira
À noite, na selva, em torno das fogueiras, as crianças da tribo ouvem os velhos narradores contar lendas que elas mesmas, bem mais tarde, haverão de repetir aos seus filhos e netos.
Essas narrativas encantam, divertem. Mas não foram criadas apenas para divertir. Elas constituem o modo pelo qual os indígenas explicam às crianças a existência de coisas indispensáveis à vida: a chuva, o vento, o céu, os astros, o rio, o fogo, os animais, as plantas, os sentimentos.
Como inventores
de lendas, os indígenas brasileiros não ficam atrás dos escritores ditos civilizados. Por exemplo: comparem a tristeza dos sete irmãozinhos órfãos com a da menina europeia vendedora de fósforos; a malícia dos bichos que procuram enganar a moça com a do lobo que iludiu Chapeuzinho Vermelho. E assim por diante.
Os contos reunidos neste livro, preparados para o leitor das cidades, vão acompanhados de um muito obrigado
a missionários, viajantes e cientistas, como os generais Couto de Magalhães e Rondon, os estudiosos Stradelli, Baldus, Schaden, Albisetti, Wirth, Colbachini, Vilas Boas – além de muitos outros igualmente merecedores –, que conheceram, recolheram e guardaram para nós essas criações da inteligência indígena brasileira.
Aventuras
de um menino
perdido
Havia no mato um menino sem família. Não sabia dizer por que não tinha pai, mãe, avós, irmãos. Mas não tinha mesmo. Estava perdido da sua gente. Andava de lá para cá, sem casa para onde voltar ao fim do dia.
Comia frutos e pescava. Um dia, na barranca do rio, esperava peixe em um cercado. Aquele lugar era o pesqueiro da feiticeira Ceinci. Ela gostava por igual de carne de caça e de peixe. Pescava pouco porque enxergava mal, porém era muito ciumenta do seu cercado. Viu o menino e pensou ver um macaco. Decidiu:
– O que faz um macaco no meu pesqueiro? Se o pesqueiro é meu, o macaco também é. Bem bom, pois já apanhei peixe suficiente na minha rede e agora posso ter também um macaco. Assim, terei boa comida para muitos dias.
Com todo o cuidado de que era capaz, Ceinci tratou de se aproximar do menino. E atirou sobre ele a sua rede.
Mas a velha não tinha boa a vista, e o menino, que não era bobo nem nada, tirou o corpo, e a rede caiu no rio.
O menino, depressinha, subiu para o alto da árvore próxima.
A feiticeira notou a rapidez com que ele fizera tudo aquilo e ficou ainda mais convencida de que se tratava de um macaco. E ainda mais decidida a apanhá-lo.
Tentou agradar:
– Desça daí, meu neto. Vamos para casa. Vou preparar uma festa.
O menino riu e por resposta fez uma careta.
A velha, furiosa, ameaçou:
– Ou desce ou mando um enxame de marimbondos derrubar você daí.
Mandou mesmo. Uma nuvem de marimbondos. O menino, porém, sabido em tudo o que é preciso saber para viver bem na floresta, cortou um ramo de árvore folhudo e defendeu-se com ele. Luta brava. Muitos marimbondos morreram. O chefe deles foi dizer à feiticeira:
– Perdão, avó, mas aquilo não é um macaco. De tão teimoso parece ser um homem.
Ceinci espumou de raiva, despediu os marimbondos e gritou para o menino:
– Ô, meu neto! Conhece as formigas tocandiras? Sabe do que elas são capazes? São formigas de fogo. Por onde passam, queimam. Se não descer já e já para ir à minha festa, mando as tocandiras derrubarem você da árvore.
Mandou mesmo. Milhares de formigas de fogo subiram e foram queimando o tronco da árvore, depois o galho em que o menino se refugiara, depois os ramos. Quando não havia mais para onde retirar-se, o menino pulou para o rio.
A feiticeira esperava mesmo por isso. Atirou a rede e apanhou a caça. Por mais que gritasse e se debatesse, o menino acabou envolvido pela rede. E levado para a casa da velha Ceinci.
Ceinci acomodou a rede e foi ao mato buscar lenha para a fogueira. Projetava assar imediatamente aquela caça tão apetitosa.
Mas, enquanto recolhia os gravetos, chegou ao terreiro a moça que morava com ela para aprender feitiçaria e tecer esteiras e cestos de folhas de palmeira. Chegou, percebeu movimentos violentos na rede e não viu Ceinci. Pensou:
– Sempre que essa gulosa volta da caça, exibe com orgulho o que trouxe, seja veado, paca ou caititu. Hoje, não fez assim. Aqui, há mistério. Vamos ver isso de perto.
Abriu a rede. Viu o menino e gostou dele. Decidiu: Não posso permitir que a velha faça um assado de coisinha tão linda!
.
No instante, o menino pediu:
– Não deixe a feiticeira me assar. Preciso fugir.
Os dois – moça e menino – queriam a mesma coisa: enganar a velha Ceinci. Então a moça tirou o menino da rede e colocou ali um pilão recoberto com cera. Fechou a rede e foi terminar de tecer um cesto.
Ceinci voltou do mato carregando lenha. Acendeu fogo debaixo da trempe e assentou a rede por cima. Depois do que, satisfeita, sentou-se no chão, junto das chamas. Gostava de aspirar o aroma da carne de caça assando na sua fogueira.
Mas o cheiro que sentiu foi ruim. Esbravejou:
– Não é cheiro de carne de macaco. Isso é cera queimando.
De fato, o fogo queimou a rede, derreteu a cera e o pilão caiu, rolou até ela. Foi o bastante para a feiticeira entender que haviam tentado enganá-la. Quem? Só havia por ali a moça tecedora de cestos e aprendiz de feitiçaria.
Saiu a correr atrás da moça:
– Ahá! Quis me enganar? Agora, farei um assado de vocês dois.
A moça, que já sabia o suficiente de feitiçaria para se transformar em inseto, virou uma borboleta e, antes de bater asas e sumir, recomendou ao menino:
– Entre para o cesto que acabei de fazer. Dê uma ordem e ele sairá voando.
Já se metendo no cesto, o menino perguntou:
– E se a velha me perseguir?
A moça-borboleta ensinou:
– As folhas de palmeira que deixei dentro do cesto estão enfeitiçadas. Basta você dizer o nome de um bicho e atirar a palma ao chão que ela se transforma no animal nomeado.
Agitando as palmas para fora do cesto, o menino ainda precisou saber:
– Aí vem ela! Diga depressa quais os bichos que ela gosta mais de comer.
Batendo as asas, pois Ceinci se aproximava, a borboleta-moça revelou:
– Porco-do-mato, paca, veado, capivara. E...
O resto da lição o menino não conseguiu ouvir porque a borboleta ia longe. Mas entendeu.
Era tempo. Deu uma ordem. O cesto levantou-se e quase, quase foi alcançado pelas mãos erguidas da feiticeira. Ela podia transformar-se em gavião, em águia, coisas assim. Se isso acontecesse, pobre do menino.
Então, ele atirou quatro folhas de palmeira para fora do cesto. Assim que tocaram o chão, não eram mais folhas de palmeira e sim porco-do-mato, paca, veado e capivara. Cada bicho correndo para um lado.
A feiticeira, gulosa que era, vendo logo no seu terceiro as caças de que mais gostava, esqueceu o menino e a moça e foi cercar o porco-do-mato, a capivara, o veado, a paca.
Eram bichos ariscos e enfeitiçados. Ela demorou-se nisso. Encantada da vida. Mas deu tempo a que o cesto com o menino chegasse ao rio.
O menino desceu, aproveitou as palmas, ergueu um cercado dentro da água. Sem demora, muitos peixes, dos maiores, ficaram presos.
Isso foi bom, porque logo Ceinci apareceu. Recomeçava a perseguição.
A borboleta-moça achegou-se ao menino e aconselhou:
– Se ouvir um pássaro cantando assim: can-can-can, fuja, porque Ceinci está a ponto de pegar você.
E o menino ouviu um pássaro