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O Novo Testamento em seu ambiente social
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O Novo Testamento em seu ambiente social

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Para o estudo do Novo Testamento é determinante conhecer os aspectos político, religioso, econômico e social da Palestina e das cidades do império romano. Este livro sintetiza a recente pesquisa acadêmica nessa área, com o objetivo de ajudar a entender o relacionamento entre os cristãos mais antigos e o mundo que os cercava.
LanguagePortuguês
Release dateSep 5, 2014
ISBN9788534940146
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    O Novo Testamento em seu ambiente social - David L. Balch

    Prefácio

    A mensagem cristã, pregada primeiro nas aldeias da Galiléia e Judéia e depois na cidade do templo, Jerusalém, espalhou-se por todo o mundo greco-romano na época em que se compunham os livros do Novo Testamento. Estudamos neste livro os aspectos político, religioso, econômico e social da Palestina e das cidades do império romano, sintetizando os resultados da recente pesquisa acadêmica para ajudar o leitor a entender o relacionamento entre os cristãos mais antigos e o mundo que os cercava. Viveram neste mundo romano e partilharam de muitas de suas percepções. Se falamos de rejeição de algumas de suas tradições, trata-se de rejeição consciente de apenas alguns aspectos do mundo em que tinham sido educados.

    O capítulo 1 revisa o fundo histórico do Oriente Próximo desde o séc. III a.C. até o reinado de Adriano, quando o judaísmo perdeu sua identidade específica na Terra Santa e quando se completou o cânon do Novo Testamento. Faz também o levantamento das organizações políticas e jurídicas do império romano à medida que afetavam a Palestina e o império em seu con-junto.

    O capítulo 2 trata do contexto do crescimento do cristianismo por todo o império romano, considerando os meios de comunicação e a maneira como facilitavam a difusão, geográfica e espiritual, de seitas religiosas e filosóficas, do judaísmo e do cristianismo. Esse contexto fornece o fundo para um levantamento preliminar da atividade missionária da Igreja do Novo Testamento.

    O capítulo 3 trata dos modelos de atividade econômica no mundo antigo, visando a ilustrar as suposições comuns nos meios pagãos e cristãos acerca do dinheiro e de seus usos.

    O capítulo 4 focaliza o mundo palestinense do movimento de Jesus. Seu objeto é a urbanização da Galiléia, processo que estimulou a tensão com os camponeses judeus. Estuda a questão do contexto social da pregação de Jesus e de suas controvérsias com os fariseus.

    No capítulo 5, muda-se o foco, considerando-se as cidades gregas e romanas do império nas quais viveram as primeiras gerações cristãs. Proporciona um levantamento do ambiente físico, da população e das áreas de interação social: trabalho, lazer, família, grupos voluntários e cultos religiosos.

    O capítulo 6 ajunta os vários fatores do ambiente social do Novo Testamento, comparando a organização das comunidades cristãs primitivas com fenômenos análogos do mundo pagão. Depois faz um levantamento dos centros urbanos específicos da atividade cristã que são importantes no Novo Testamento.

    Os capítulos 1, 2 e 3 foram escritos por John Stambaugh; o capítulo 4, por David Balch. Os capítulos 5 e 6 abarcam contribuições de ambos. John Stambaugh gostaria de reconhecer a ajuda dos comentários de Paula Carew, Meredith Hoppin, Maureen Dietze, Norman Petersen e Victor Hill. David Balch deseja expressar sua gratidão à Universidade Cristã do Texas e à Brite Divinity School pelas bolsas de pesquisa e datilografia que ajudaram a preparar os seus capítulos. Ambos devemos agradecimentos cordiais a Wayne Meeks, não só pelo convite inicial a colaborar neste livro, pela ajuda generosa, sensível e específica durante a sua elaboração e editoração, mas também por suscitar o nosso interesse pelo mundo social do cristianismo primitivo em primeiro lugar.

    J. E. S. e D. L. B.

    1.

    Contexto histórico

    Quando nasceu em Belém da Judéia nos dias do rei Herodes (Mt 2,1), Jesus entrou num reino judaico governado por um rei idumeu de nome grego, instituído e protegido pelos romanos. Jesus cresceu na Galiléia, perto de cidades gregas, onde a língua grega era tão geral como o seu arameu nativo. E, depois de sua morte em Jerusalém, seus discípulos, ao narrar sua história a outros, falavam e escreviam sobretudo em grego no sentido de levar sua mensagem a todo um mundo cosmopolita governado pelos romanos. Consideraremos neste capítulo as razões para a predominância da cultura grega e das instituições romanas no ambiente social do Novo Testamento.

    O mundo grego de Alexandre a Adriano

    A conquista do Oriente por Alexandre

    Na época do nascimento de Jesus, fazia cerca de oito séculos que os gregos estavam em contato ininterrupto com os povos do Oriente Próximo, fundando grandes cidades na costa da Ásia Menor, estabelecendo postos avançados de comércio na costa da Síria, comerciando com os fenícios e adaptando seu sistema de escrita, e viajando ao Egito para comércio, turismo e serviço como soldados mercenários. Mas foi Alexandre, rei da Macedônia, que conduziu um exército de gregos e macedônios, numa série de campanhas entre 332 e 323 a. C., que levaram à conquista do império persa, da Ásia Menor e do Egito rumo ao Oriente até as fronteiras da Índia. Em termos de extensão e complexidade das terras que Alexandre sujeitou a seu governo, suas conquistas não tiveram precedentes na história grega e lhe valeram o epíteto de Magno. Se bem que Alexandre Magno tenha morrido muito cedo sem ter tempo para elaborar sistema administrativo satisfatório para o seu reino imenso, todavia duas de suas políticas tiveram profundas conseqüências na história da região. A primeira foi a fundação de cidades gregas em pontos estratégicos para servir de centros administrativos e constituir focos e pólos de cultura grega nas terras estrangeiras do Oriente. A segunda foi a abertura e tolerância para com as culturas nativas. O resultado foi que a cultura grega exerceu influência muito ampla nas culturas do Oriente — sendo ao mesmo tempo por elas influenciada —, a ponto de tratá-las com o adjetivo bárbaro como termo pejorativo que se mantém até hoje tanto no grego como em várias línguas modernas.

    Os reinos helenísticos

    Depois da morte de Alexandre em 323 a. C., seus generais foram incapazes de seguir uma política unitária, resultando suas querelas e batalhas no desmembramento do império. Quando a poeira de suas guerras se depositou, cerca de 301 a. C., Antígono controlava a velha terra natal da Macedônia, exercendo hegemonia geral sobre os estados gregos do continente e das ilhas do mar Egeu. Ptolomeu sentia-se seguro no Egito, onde fundou uma dinastia que durou até a morte da famosa Cleópatra VII em 31 a. C. Seleuco emergiu como rei da Síria e da parte oriental do império, embora se tenham separado suas áreas mais distantes na Báctria e na Pérsia. Durante o século III a. C., emergiu outro reino importante, o dos Atalidas, tendo como capital Pérgamo no oeste da Ásia Menor.

    Nesses reinos, uma dinastia grega governava uma população mista de gregos e nativos. Todos eles estimularam a solidez da cultura grega, construindo cidades nos velhos parâmetros, da mesma forma que Alexandre. O tipo característico de cidade grega era a polis, comunidade de tamanho relativamente pequeno com templos dedicados aos deuses gregos tradicionais e uma agora a céu aberto para negócios públicos. A polis era administrada com certo grau de autonomia por magistrados e um conselho, ambos recrutados da elite holigárquica hereditária ou escolhidos por eleição democrática pelos cidadãos detentores de propriedade. A polis às vezes substituía um centro nativo de comércio ou culto, e às vezes era nova fundação coexistente com aldeias nativas de porte menor. Gente nativa vivia fora pelos arredores e às vezes dentro dessas cidades gregas e sobre essas exercia certo impacto cultural, mas os que nelas falavam grego estavam mais conscientes da herança comum de que partilhavam entre si e com as velhas cidades da Grécia continental. Uma língua comum, a koine (comum) sobrepôs-se, com o passar do tempo, aos velhos dialetos regionais. Tratava-se de uma forma levemente simplificada do ático, o dialeto de Atenas, que foi a pátria da maioria dos clássicos da literatura grega e o padrão mais brilhante da cultura da Grécia. Esse dialeto comum proporcionava o veículo para a comunicação através do vasto mundo habitado por gregos, que eles chamavam de a ge oikoumene (mundo habitado), ou simplesmente oikoumene, que veio para o português no adjetivo ecumênico.

    Os romanos no Oriente

    O mundo helenístico entrou em contato direto com o império romano no fim do século III a. C., quando Filipe V da dinastia dos Antigônidas na Macedônia fez aliança com a república comercial de Cartago, inimiga de Roma. Esse fato aguçou nos romanos o interesse direto pelas políticas da Grécia continental, e logo usaram e foram usados nas manobras políticas de cidades e príncipes por todo o Oriente: Pérgamo e Rodes persuadiram o Senado romano a intervir contra Filipe V em 201 a. C., Pérgamo recorreu à sua ajuda contra Antíoco III da Síria em 196 a. C., Ptolomeu VI teve seu apoio na expulsão de Antíoco IV do Egito em 168 a. C., Ptolomeu VI e seu irmão Ptolomeu VII relataram ao Senado suas pretensões rivais ao trono do Egito, e o rei judeu hasmoneu Judas Macabeu concluiu um tratado com os romanos em 161 a. C. como parte de sua campanha contra Demétrio I da Síria. Pelos meados do século II, a monarquia selêucida da Síria achava-se em declínio tão sério que os romanos não viram nela nenhuma ameaça, mas seu declínio encorajou vários príncipes em suas fronteiras a se expandir e ameaçar a estabilidade do extremo oriental da esfera romana de influência.

    O resultado foi o envolvimento romano cada vez mais profundo. Guerras contra o rei Mitrídates do Ponto e o rei Tigrano da Armênia continuaram de 96 a 63 a. C. Havia constantes distúrbios por causa de piratas, que embaraçavam as rotas dos navios e punham em perigo os investimentos dos homens de negócio romanos. O mais bem-sucedido dos generais romanos foi Pompeu, que derrotou os piratas e ganhou credibilidade para as vitórias sobre Mitrídates e Tigrano. Ele depois se voltou para o oeste e o sul, onde as querelas de reis e príncipes, ainda que não ameaçassem diretamente a Roma, incomodavam o equilíbrio geral da região. Para tratar dessa situação instável, Pompeu ocupou em 64 a. C. o território selêucida, aboliu a monarquia, estabelecendo uma nova província na Síria sob governador romano. Para proteger os flancos leste e sul desta província, nos poucos anos seguintes ele impôs ou negociou acordos com uma série de reinos clientes: no sul, ele deu a Judéia a Antípater, um príncipe dos edomitas ou idumeus, uma tribo árabe; a leste do Jordão, ele negociou a adesão dos árabes nabateus; e ao nordeste da Síria, para guardar as fronteiras rumo ao Eufrates, fez acordos semelhantes com os reis clientes de Comagene e da Armênia. Esses acordos mudaram as realidades políticas na região: Os pequenos principados não mais seguiam políticas independentes visando a ter vantagens sobre outros pequenos principados. Agora eles eram os postos avançados orientais da esfera romana de influência, aos quais se atribuía papel de pára-choques contra o grande reino dos partos, que herdaram o território do império persa no Irã e na Mesopotâmia.

    Como parte do mundo romano, os povos do Oriente helenístico logo se viram envolvidos nas lutas partidárias de importantes figuras políticas romanas. Várias batalhas importantes entre Pompeu e seu rival, Júlio César, foram feitas no Oriente, e César assegurou-se da lealdade dos judeus concedendo-lhes imunidade de taxas; ao ser assassinado em 44 a. C., inúmeros judeus que o apoiavam vieram prestar-lhe honras em seu funeral. Nos anos seguintes, os vingadores de Júlio César — conduzidos por Otaviano, seu herdeiro oficial, e por Marco Antônio, o executor de sua vontade — caçaram os que favoreciam as velhas formas republicanas que César desafiara. Otaviano e Marco Antônio tornaram-se, depois, rivais: Antônio pretendeu o Oriente como seu campo de ação e tentou administrá-lo como monarquia oriental, apoiado por Cleópatra VII.

    Quando derrotou Antônio e Cleópatra em 31 a. C., Otaviano voltou-se para a consolidação de seu poder por todo o império. Logo eliminou todo o resto de resistência e assumiu o controle da administração do mundo romano, mas fê-lo com escrupuloso respeito pelas formas tradicionais da prática republicana romana. Herdara o nome de César ao ser adotado por Júlio César; em 27 a. C., também recebeu o título honorífico de Augustus. Historiadores modernos em geral referem-se a ele como o primeiro dos imperadores romanos, mas o título que deu a si próprio foi o mais modesto: princeps (primeiro homem). Com ele, a história romana passa do período da República ao período do Principado, o governo de uma série desses primeiros homens.

    No Oriente, a ameaça dos partos continuou por vários séculos a preocupar os cálculos estratégicos romanos. Depois de uma série de derrotas desastrosas, Augusto negociou um acordo diplomático em 20 a. C. Durante o séc. I do Principado, a fronteira oriental foi, se não calma, pelo menos relativamente estável. Na verdade, podemos fazer essa afirmação sobre a maior parte do império. Um dos poucos lugares de distúrbios reais foi a Palestina, que em 6 a. C. cessara de ser reino cliente tornando-se a província romana da Judéia (capítulo 4). O sentimento nacionalista estourou em revolta que só terminou com a destruição do Templo de Jerusalém em 70 d. C. e com a abolição do sacerdócio judaico. Como conseqüência, o imperador Vespasiano reorganizou a fronteira oriental do império, abolindo os reinos da Armênia e Comagene e fundindo-os na província da Galácia; a diplomacia continuou a tratar com sucesso com os partos, ao passo que se assegurou a fronteira do Eufrates com novas fortificações e com uma nova estrada que passava pela Síria.

    O imperador Trajano (98-117 d. C.) empreendeu extensa atividade militar no Oriente. Para assegurar a fronteira oriental, anexou em 106 o reino dos nabateus como a província da Arábia. Depois se aproveitou da fraqueza dos partos para estender o império até o Golfo Pérsico, criando as novas províncias da Armênia, da Assíria e da Mesopotâmia. Essas novas conquistas veio a se tornar um ralo nos recursos do império, e o imperador Adriano, logo que sucedeu a Trajano em 117, abandonou essas três províncias mais novas e consolidou as fronteiras mais perto do Mediterrâneo.

    Para a maior parte do império romano, o reino de Adriano foi tempo de paz, segurança e prosperidade, bem governado por uma burocracia experimentada e por um imperador consciencioso e dotado de cultura e sensibilidade. Adriano gastou enormes somas, sobretudo no leste da Grécia, construindo novos edifícios e renovando velhas cidades, instilando senso de altivez na civilização grega tradicional. Levado em parte por sua apreciação da cultura grega, em parte pelo desejo de enfatizar a unidade e a universalidade do império, e em parte por considerações de segurança (moradores judeus da África, do Egito e do Chipre tinham-se levantado, amotinando-se contra seus vizinhos gentios e as autoridades entre 115 e 117), Adriano tentou forçar os habitantes semitas do Oriente a se deixar assimilar pela cultura dominante. Ampliou uma lei que proibia a castração para incluir a prática da circuncisão como crime capital. Esse fato afetou egípcios, nabateus e judeus, mas foram os judeus palestinenses que se levantaram em revolta entre 131 e 134; esmagada essa revolta, o poder romano no Oriente ficou sem desafios por mais outro século.

    Organização provincial

    A administração sob a República romana

    Os acordos de Pompeu no Oriente acrescentaram sete novas províncias ao império romano nos anos que seguiram a 64 a. C. Uma nova província, ao ser estabelecida, costumava organizar-se com base nas cidades já existentes na região; algumas já podiam ter algum tratado com os romanos, e em geral esse era honrado, isentando-as das obrigações do estatuto provincial. Em províncias carentes de forte tradição urbana, a administração local confiava-se amiúde a unidades tribais. As disposições normais e específicas eram codificadas numa constituição provincial que permanecia o documento constitucional básico para o futuro.

    Cada província era ocupada permanentemente por legiões sob o comando de um governador, um proconsul, que supervisionava a ordem pública. Pelo séc. I a. C., os governadores eram escolhidos por sorte dentre os senadores logo depois de cumprirem em Roma o ofício de cônsul ou pretor, magistrados anuais situados no pico da escala administrativa e que detinham imperium, o poder oficial para conduzir exércitos romanos. É claro que esses governadores estavam envolvidos profundamente na política da cidade de Roma — o bem-estar dos povos que viviam nas províncias raramente estava no topo de suas prioridades — e eram muitas vezes tentados por oportunidades fáceis de enriquecer a si mesmos e aos homens de negócios romanos, politicamente influentes, que pululavam por todas as províncias.

    O governador comandava todas as tropas legionárias estacionadas na província, tendo um legatus subordinado no comando de cada legião adicional. O grupo de assistentes do governador abrangia também um quaestor, responsável pelas finanças e coletas de taxas e tributos, e vários praefecti (prefeitos); um prefeito comandava uma unidade não-romana das tropas auxiliares assim como as milícias recrutadas no local.

    A administração sob o Principado

    Augusto, ao fundar o Principado, estava preocupado em melhorar a qualidade da administração provincial. Somente as províncias mais seguras, agora chamadas públicas ou senatoriais, deveriam continuar sendo governadas à moda antiga, por um procônsul escolhido dentre os membros do Senado que tivessem desempenhado recentemente uma magistratura maior. O resto do império, juntamente com quase todas as forças legionárias do exército, atribuía-se ao próprio Augusto. A administração dividia-se em províncias imperiais entregues aos legati do imperador, homens da classe senatorial escolhidos pelo imperador por sua lealdade e capacidade administrativa. A cada legado, como representante do imperador, cabia o comando da mais importante legião de sua província. A Síria era uma das províncias imperiais governadas dessa maneira, por um legado, como Quirino em 6 a.C. (Lc 2,2). Uma província menos importante como a Judéia era administrada por um praefectus escolhido da ordem eqüestre, que se situava abaixo dos senadores em prestígio social (veja capítulo 6). Depois de 44 d.C., o título desses prefeitos foi mudado para procurator, mas eles permaneceram emissários pessoais do imperador de grau relativamente inferior.

    O governador — quer procônsul, legado ou prefeito — representava o poder de Roma na província. Estava obrigado pela constituição da província a honrar acordos específicos de isenções de taxas e outras prerrogativas, e os moradores da província podiam fazer queixas dele perante o Senado ou o imperador, mas, de outra forma, esse exercício do imperium era quase absoluto. Ele tratava com as autoridades locais das cidades ou tribos. Exercia poder policial por seu comando das legiões, se essas fossem designadas à província, ou então uma unidade militar menor composta de tropas auxiliares constituídas de cidadãos não-romanos. Dava audiências em casos jurídicos e pronunciava sentenças capitais por virtude de seu imperium, e viajava regularmente pela província, dando audiências nas várias cidades dotadas de tribunais. Normalmente se delegavam às cidades as coletas de taxas.

    A administração local era feita pelas cidades, sujeita à supervisão do governador. Por todo o império havia três tipos principais de comunidades.

    Durante quase todo o tempo do Principado, o tipo mais prestigioso foi a colônia romana. Seus moradores originais eram cidadãos romanos enviados da Itália ou provenientes das legiões romanas, e também os não-romanos que moravam aí ou nas adjacências muitas vezes recebiam concessão de cidadania romana. As colônias, por causa de sua cidadania romana, estavam isentas de tributo e de muitas formas de taxação, e seu governo baseava-se no modelo romano. Como nos diz o autor de Atos (16,12), Filipos era uma colônia deste tipo. Assim também Corinto, onde viviam colonos romanos junto com judeus e gregos não-cidadãos (At 18,4-8).

    Outras cidades eram conhecidas como municipia. Esse título referia-se a cidades livres que gozavam de privilégios especificamente acordados que garantiam pelo menos certo grau de autonomia; durante o Principado veio a significar comunidades que tinham recebido concessão geral de cidadania romana.

    E outras cidades simplesmente continuaram com suas constituições antigas, sobretudo no leste da Grécia, onde sobrevivia uma forma democrática de governo. Essas tinham uma assembléia de cidadãos, um conselho menor e uma mesa de magistrados que muitas vezes conservavam os títulos tidos nos velhos dias da Grécia e muitas vezes eram eleitos pela assembléia. Assistimos à reunião de uma vigorosa assembléia popular deste tipo em Éfeso (At 19,24-40), embora o secretário da assembléia se preocupasse como fato de que comportamento imoderado pudesse levar as autoridades romanas a limitar seu poder. E certa influência romana se fazia sentir; muitas cidades acrescentavam novo magistrado para servir de sacerdote do culto imperial, e a política romana geralmente favorecia um estilo oligárquico de governo. Mesmo quando se conservavam as instituições democráticas, eram reaparelhadas de sorte que o poder real de fazer as políticas residisse no conselho, que cada vez mais se compunha dos que eram suficientemente ricos para deter ofícios como magistrados e suficientemente conservadores para ser partidários leais de Roma. Esses membros de classe alta da aristocracia local estavam satisfeitos e se orgulhavam por pertencer ao império romano. Por todo o Principado as aristocracias locais permaneceram firmes em sua lealdade a Roma. A Judéia, como veremos, foi exceção, mas virtualmente foi a única, e, mesmo assim, parece que os saduceus, que detinham o governo, colaboravam com satisfação com as autoridades romanas.

    Palestina

    Sob os Ptolomeus e os Selêucidas, 320-142 a. C.

    Em virtude de sua posição geográfica, a Palestina estava constantemente envolvida nas políticas partidárias do Oriente Próximo antigo. Na idade do bronze, assistiu a infiltrações e invasões de cananeus, amorreus e israelitas do deserto arábico, de acádios da Mesopotâmia, de egípcios do Egito, de hititas da Ásia Menor, de hicsos e filisteus de partes ignoradas. Um vazio de poder dos grandes em cerca do ano 1000 a. C. possibilitou a Davi e Salomão estabelecer

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