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Golias se Levanta
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Golias se Levanta

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Eleito como um dos dois finalistas cinco estrelas para a premiação Indie Reader Discovery Awards de 2012 na categoria Humor, Golias se Levanta será um dos livros mais engraçados que você já leu. Descrito pelo Indie Reader como uma leitura hilária "em que você vai torcer descaradamente e alegremente pelo bando de desajustados mais escandalosos que já teve um sonho", Golias se Levanta é a história de "amigos por acaso que decidem que devem fazer algo importante para mudar suas vidas". Golias é um conto enérgico sobre uma tentativa de trazer a
cerimônia do Oscar para Rochester, Nova Iorque, e salvar a cidade com isso.

LanguagePortuguês
Release dateJul 15, 2019
ISBN9781393026501
Golias se Levanta

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    Golias se Levanta - Starbuck O'Dwyer

    Outras obras de Starbuck O’Dwyer

    Red Meat Cures Cancer

    Como Criar um Bom Filho

    Nos Bailes da Escola

    Starbuck O’Dwyer nasceu em Rochester, Nova Iorque, graduou-se pelas universidades de Princeton, Oxford e Cornell e já escreveu romances, ensaios, contos, roteiros e canções. Seu primeiro livro, Red Meat Cures Cancer (Random House/Vintage), foi aclamado pela crítica, conquistou dois prêmios literários nacionais na categoria humor (IPPY, Foreword Reviews), fez parte de várias listas de best-sellers e foi destaque no programa de leitura One Book One Vancouver de 2007, escolhido pela Biblioteca Pública de Vancouver. Seus escritos, descritos como genialmente cômicos pela revista Kirkus Reviews, já apareceram em diversas publicações, como Entertainment Weekly, Flaunt, Toro, Japanophile, Journal News, PW Daily e Boston Globe, e O’Dwyer já esteve presente em mais de 350 programas de rádio e televisão, incluindo participações como convidado na ESPN, WGN, Voice of America e PBS. Sua coleção de contos, Como Criar um Bom Filho, foi finalista nos prêmios Indie Reader Discovery Awards de 2012 (categoria Família) e Forewords Review Book of the Year Awards de 2011 (categorias Ensaio e Humor), e é um best-seller permanente na China. A coleção já foi traduzida para africâner, alemão, chinês, norueguês, holandês, italiano e português, e atualmente está sendo traduzida para o espanhol. Seu segundo livro, Golias se Levanta, finalista do Indie Reader Discovery Awards de 2012 (categoria Humor), também já foi traduzido para o chinês e para o português. Sua coleção de contos mais recente, Nos Bailes da Escola, medalhista de ouro do prêmio Global Ebook Awards de 2016 (categoria Humor Não-ficcional/Comédia) e finalista do prêmio Foreword Reviews INDIES Book of the Year (Humor Não-ficcional), chegou ao primeiro lugar na lista de best-sellers da Amazon nas categorias Humor & Entretenimento e Família & Relacionamentos, e já foi traduzido para o espanhol, italiano e português. Além disso, músicas compostas por O’Dwyer foram licenciadas pelos canais de televisão Telemundo e Country Music Television e já apareceram em vários de seus programas. 

    Dedico este livro aos cidadãos de Rochester, Nova Iorque, e a cada pessoa que tem um sonho e a coragem de persegui-lo. Eu lhes desejo muita sorte e sucesso.

    1

    Eu só vou dizer isso uma vez, então escuta. Mark Twain tava certo. Não há nenhum Deus, nenhum Universo, nenhuma raça humana, nenhuma vida terrena, nenhum Paraíso, nenhum Inferno. É tudo um sonho, um sonho grotesco e tolo. Nada existe a não ser você. E você nada mais é que um pensamento. Um pensamento andarilho, um pensamento inútil, um pensamento sem lar, peregrinando desesperado pelas vazias eternidades."

    Quando ensinamos tênis para crianças de dez anos, normalmente começamos com a pegada forehand, mas noite passada fui demitido do Eggroll Ranch, onde trabalhava meio período como assistente de cortador de repolho, então estou distraído e com raiva.

    O senhor disse que o céu não existe?

    Eu memorizei a amarga declaração de Twain no fim da sua vida para uma aula de oratória no ensino médio e, ao contrário da maioria das coisas, essa ficou na minha cabeça.

    É isso aí. Esse negócio de céu é uma baita mentira.

    Com as palavras do Sr. Wang — corta MAIS RÁPIDO — ainda zumbindo nos meus ouvidos, fiquei cara a cara com sete garotos mimados do quinto ano prontos para partir meu coração como o resto do mundo e seus habitantes gananciosos e aproveitadores. Eu normalmente nem pensaria em deixar meus alunos pisarem na quadra antes de memorizarem os três primeiros capítulos d'O Jogo Interior de Tênis, mas perdi o ânimo e só de olhar para esses molengas dá para perceber que eles não têm determinação para jogar o esporte dos reis. Eles são uns bolinhos frescos, condenados; miseravelmente fracos e moles, e totalmente despreparados para a batalha mano-a-mano física e mental.

    Mas se o céu não existe, pra onde foi o meu cachorro quando ele morreu?

    Quem sabe? Não tem mesmo como saber.

    Então de onde é que veio essa maldade grande e pulsante? Não foi só o meu fim como assistente de cortador de repolho, embora isso tenha sido um choque dadas as minhas contribuições para a organização, incluindo uma expansão extraordinária do menu para além de rolinhos primavera. Não, como a maioria das pessoas, eu tinha uma árvore de hostilidades com muitas raízes, algumas mais profundas que outras.

    Depois da demissão de ontem, ainda por cima no meu aniversário, o desespero me acompanhou durante todo o caminho até o apartamento de Miranda, minha namorada, onde eu buscava lábios compreensivos e talvez um bolo de sorvete, mas em vez disso encontrei uma cueca de zebrinha nas escadas que levavam até o quarto. Depois de ter arriscado a minha vida para chegar até a minha amada a 100 km/h em zona escolar, fiquei horrorizado ao encontrá-la enrolada que nem um animal de balão em volta do seu guru de ioga, gemendo ao ritmo de um medley de cítara de Ravi Shakar. A desculpa de que eles estavam apenas tentando curvar as costas na posição de oração de Bhagavan Rajneesh rapidamente deu lugar a uma tentativa de agressão (tentei atingir o Casanova com um castiçal) e à saída repentina do encantador de serpentes de Miranda e seu colchonete de exercícios fedorento.

    Eu fiquei devastado. No meu bolso havia um anel de diamantes de dezoito quilates que eu tinha comprado a prazo. Eu tinha finalmente decidido fazer o pedido e começar minha vida como metade de uma instituição legalmente reconhecida, honrada, com todos os seus direitos, responsabilidades e bundinha mais ou menos. Infelizmente, eu não esperava que a bunda de outra pessoa entrasse no meu caminho. Pior ainda, Miranda era a sexta mulher seguida a me deixar por outro.

    Como você pôde fazer isso?, eu perguntei.

    O que importa, David? Nosso relacionamento acabou, Miranda disse. Já acabou faz um tempo.

    Que jeito de me avisar. Eu acho que ia preferir receber um e-mail ou uma mensagem de texto.

    "Eu levei um tempo pra me tocar, David, mas eu finalmente entendi. Eu finalmente entendi. Você é incapaz de tomar jeito na vida."

    Isso não é verdade.

    Você não consegue ficar em um emprego só.

    Eu ainda não achei a carreira certa, eu disse.

    "Você ainda não achou carreira nenhuma. Você só fala, nunca leva nada adiante."

    E então você começa a transar com esse guru? Ótimo.

    Eu quero ficar com alguém que vá longe. E o Guru Ganges, pra sua informação, está planejando abrir franquias dos estúdios de ioga dele no país todo. Você, pelo contrário, não tem ambição.

    Eu não acredito que você tá me dizendo isso. Você trabalha meio período como especialista em chuteiras no Lady Foot Locker. Isso não te faz um Donald Trump, caso você esteja confusa. Uma pessoa sem ambição compraria as fitas do Tony Robbins?

    Isso foi um ano atrás e você nunca ouviu as fitas.

    Despertar o gigante interior leva tempo. Você tem que confiar em mim. Eu tenho um plano de longo prazo pra melhorar todos os aspectos da minha vida.

    Ah, é? Seis meses atrás você me arrastou praquele seminário do Carlton Sheets sobre imóveis sem entrada no Dome Arena e gastou quinhentos dólares em DVDs no meu cartão de crédito. Você já deu um lance em um imóvel sequer desde então?

    O mercado não está bom.

    "Assim como o seu cérebro. Você deixou ele atrofiar. Olha o livro que você deixou na minha cabeceira. Quem mexeu no meu queijo? Você quer saber quem mexeu no seu queijo? Ninguém. Você não tem queijo nenhum."

    "Talvez não, mas eu tenho cinco dos sete hábitos das pessoas altamente eficazes. Mais dois e eu vou estar pronto. Nós vamos."

    Eu não acredito mais nisso, David. Se toca, você é um perdedor e sempre vai ser um perdedor.

    Por mais que eu tentasse ensinar essas crianças horríveis que estão na minha frente agora, eu não podia esquecer as últimas palavras de Miranda. Na opinião dela, eu tinha vários complexos freudianos profundos relacionados a ESPN. Quando me atacou, ela usou adjetivos dolorosos, como insensível, preguiçoso, emocionalmente distante e malvestido, e disse que já tinha me superado com as técnicas de respiração consciente e respiração cerebral do Chacra que aprendeu com o professor. Ela ainda teve coragem de me dizer que eu estava espiritualmente falido enquanto tropeçava por aí procurando pelo sutiã.

    Não consegui entender isso na hora, mas Miranda não tem nada de especial. Ela é meio simples e gordinha; não é muito brilhante ou charmosa ou bem-sucedida. Não é uma mulher de elegância incomparável ou paciência sem fim e, numa escala de um a dez, eu daria três para a sua compaixão por bichinhos e idosos. Ela acabou de fazer trinta anos, a idade em que algumas mulheres entram em pânico por não terem se casado e começam a caçar uma alma gêmea com uma crueldade determinada. E, ainda assim, aqui estava eu, prestes a fazer algo que incontáveis homens e mulheres fazem todo ano – casar com a pessoa errada. Por que isso acontece? É complicado, não é? Para mim, a resposta estava no meu subconsciente. Eu não achava que um incompetente com a testosterona baixa, sem perspectiva de emprego e com trinta e quatro dólares na conta merecesse mais. Meu descaso comigo mesmo, meu medo crescente de ficar sozinho e morrer estavam me empurrando em direção ao precipício como um conversível velho sendo dirigido por Thelma e Louise.

    No meu maior momento de fraqueza, listei os pontos positivos e negativos de Miranda num pedaço de papel; tentei desesperadamente quantificá-la, esperando encontrar alguma equação que me convencesse das coisas que eu não sentia no meu coração. Se esse é o seu método preferido para decidir entre sim ou não para um possível parceiro, a resposta é sempre não. Deixar a escolha do seu matrimônio se tornar uma aceitação gradual devido à pressão, à fatiga e ao passar do tempo em vez de uma ação movida por inspiração ilógica é um erro.

    Por meses, Miranda falou incessantemente sobre anéis, conjuntos de porcelana e amigas que estavam se casando, arrumando uma casa, tendo filhos e seguindo suas vidas. Toda essa conversa, no entanto, era menos sobre mim do que sobre esses feitos; sobre a necessidade de riscar todos esses itens de alguma lista que a faria ser completa nos olhos dos outros. O que mudou foi que ela achou uma possibilidade melhor.

    Em retrospectiva, eu admito que bater no Nissan Altima usado dela com o meu Ford Mustang ’75 (cor de abóbora, com um velocímetro travado em 592.740 quilômetros) foi um pouco precipitado, mas depois de me explicar que o Gigi era um louco sabor curry que a satisfazia sexualmente de modos que eu nunca poderia, Miranda me botou para fora da casa dela. Compreensivelmente, isso me jogou no tipo de espiral de vingança da qual eu já tinha sido avisado pelo juiz Stander, um mediador e negociador de reféns, por ocasião de um incidente infeliz envolvendo minha camisa favorita e uma lavanderia das redondezas.

    Um conselho: nunca dê um cartão presente de 24 sessões no Indo-Aryan Yoga Shack para a mulher que você ama. Agora, além do meu bico de professor de tênis duas vezes por semana, tudo que eu tinha vida era um emprego de meio período vendendo tapetes de oração tibetanos ligeiramente usados no Who’s Your Llama?, uma boutique de luxo que atende perdedores que dizem coisas como vou levar meu iPad pro campo pra poder blogar. Sem amor nem trabalho que me valha, busquei um pouco de conforto alertando meus alunos sobre os predadores da vida.

    Não deixem pra depois. Comecem a lista de inimigos de vocês hoje, eu disse.

    O que é uma lista de inimigos?

    Danny Cohen, um aluno de um metro e trinta com um quipá preso na cabeça e uma raquete Prince enorme na mão direita, ficou intrigado por um momento. Paranoia nixoniana pode ser imprópria, mas, depois da noite passada, eu percebi que deveria ter começado a rabiscar os nomes de pessoas horríveis que queriam me fazer mal há muito, muito mais tempo.

    É um registro de todo sub-humano cretino que suga o tutano dos seus ossos. Comecem com o instrutor de ioga da sua namorada, então adicionem todos os chefes que já lhe demitiram, especialmente aqueles que têm fetiches com repolho de restaurantes de rolinhos primavera com tema de caubói que ficam em shoppings.

    Não entendi.

    Danny e os outros alunos pareciam confusos.

    Deixa eu tentar de novo. É uma lista de cada sanguessuga que planeja a sua derrota.

    Ninguém nunca foi tão direto assim com Danny. Nem mesmo no templo. Ele considerou minhas palavras por um momento antes de perder o interesse. Ele só tinha dez anos, afinal.

    Você é um pirata?, Danny perguntou.

    Não, eu não sou um pirata. Tem algum papagaio no meu ombro?

    Por que você usa esse tapa-olho?

    Cuida da sua vida, ok?

    Por que o seu calção é tão curto? Parece gay.

    Essa pergunta insensível veio de Willa Nash, a única aluna de 75kg do quinto ano que eu conhecia que tinha uma garrafa d’água com um monograma, invariavelmente cheia de Pimp Juice, um energético para crianças problemáticas e seus instrutores de snowboard. Quando falharam em exigir que a moleca falasse com mais respeito, o pai de Willa, Kit, e sua mãe ausente, Missy, uma veterinária/cirurgiã plástica especializada em extreme makeovers de pets e seus donos, soltaram mais um monstro na sociedade.

    "Não tem nada de gay nesse calção. Ele é atemporal, em forma e estilo", eu disse.

    Atemporal é minha bunda.

    Sossega aí, Willa, ou eu vou ter que ir aí!

    Se essa menina de bermuda largada, blusa escrita Skate or Die, com essa atitude enlouquecedora continuasse nessa linha de perguntas, seu nome iria parar na minha lista de pessoas que eu arruinaria. Meu calção, que cobria a parte de cima das minhas coxas quando sentado e muito menos quando de pé, de fato desafiava a maioria das leis de decência pública, preso no meu rabo como papel filme enrolado num balão. Mas existe um bom motivo pelo qual eu não abandonaria ele ou as minhas camisas, relíquias da coleção Ivan Lendl, completas com golas esfarrapadas e sovacos amarelados: eu não tinha dinheiro o suficiente para comprar um sorvete no Dairy Queen, que dirá um conjunto novo de tênis.

    Na maioria dos dias, minhas tristezas monetárias bastavam como justificativa válida para minha condição mental atual e me libertavam para considerar preocupações mais urgentes, como em quem votar no American Idol ou qual pasta de dente embranquecedora eu precisava. Infelizmente, as decepções da noite passada (ou seja, o Eggroll Ranch e Miranda) junto com a tagarelice incessante de Willa, a garota propaganda da obesidade infantil, me forçaram a confrontar um segundo, menos prático, mas mais honesto motivo pelo qual eu vestia minhas roupas esportivas antigas.

    A verdade é que essas roupas velhas de tênis me lembravam de quem eu tinha sido em um momento da minha vida quando tudo parecia possível e, costurado à manga de cada uma das minhas camisas e em cada calção, estava um símbolo de força decorado pela minha mãe.

    O que é esse lagarto estúpido no seu calção?, Willa perguntou.

    Não é um lagarto estúpido. É um dragão, eu disse.

    Bem, ele parece gay. A gente vai jogar tênis ou não?

    Olha como você fala, Calamity Jane. E deixa o Pimp Juice pra outra hora.

    Eu nunca soube que gay era uma palavra tão popular com crianças de dez anos, mas Willa a usava com mais frequência do que um acadêmico de Oscar Wilde falando sobre sua coleção de Keith Haring.

    Por que tem um dragão no seu calção?, Danny Cohen perguntou, com o interesse renovado de repente.

    É uma longa história, então deixa pra lá. Todo mundo segura bem a sua raquete, eu disse.

    Eu segurei minha Wilson T-2000 perpendicular ao chão e demonstrei a pegada forehand oriental. Hoje nós vamos aprender como bater uma forehand.

    David, eu tô fazendo certo?

    "Deixa eu ver, Becky.

    Afastei minha menor aluna, Becky Pardi, vestida em um avental e usando maria-chiquinhas, para longe da procissão de Violet Beauregardes e Augustus Gloops fazendo fila para ter a sua vez no canhão de bolas. Becky segurou a raquete para me mostrar a pegada.

    Vira a mão um pouco para a direita, eu disse.

    Assim?, Becky perguntou.

    Isso. Você conseguiu. Agora tenta de novo.

    Tentar de novo. Controlar a pegada. Ações que são mais fáceis de dizer do que fazer e cada vez mais improváveis na minha mente à medida que eu avaliava minha vida a menos de doze meses do meu quadragésimo aniversário. Alguém disse uma vez que quarenta é quando sua vida começa a dar certo e seu corpo começa a cair aos pedaços, mas, no meu caso, ambos estão caindo aos pedaços. Dez anos atrás, eu ainda não tinha vivido as alegrias da dor na lombar, da bursite aguda no ombro ou dos pelos compridos demais no nariz. Hoje elas são distrações bem-vindas da minha fascite plantar e dor no tendão de Aquiles que fazem com que ficar em pé por horas em uma quadra de tênis seja uma maldição.

    Vamos no juntar, grupo. Estamos quase sem tempo... Escutem, eu devo desculpas a vocês.

    Para esses diabinhos e para o resto do mundo, eu sou David Horvath, professor de meio período, cortador de repolho à noite, e visto atrocidades impronunciáveis. Mas anos atrás, quando tive aulas de tudo, de tênis a xadrez a tae kwon do, e competia em campeonatos de soletração, corridas de carrinhos de rolimã e de esqui, eu era conhecido como Dragon, um apelido que minha mãe me deu por motivos que permanecem incertos. Pode ter sido só um jeito inteligente que ela achou de mudar minha visão de mim mesmo depois que eu fui diagnosticado, aos dois anos, com uma condição degenerativa na córnea que causava sensibilidade intensa à luz e exigia que eu mantivesse meu olho direito coberto o tempo todo. É mais provável que ela soubesse que a ausência do meu pai e minha crescente consciência da sua importância criaram um vazio na minha vida e que eu precisava de garantia de que não estava apenas bem, mas sim que era indomável.

    Qualquer que fosse o caso, a mudança de nome funcionou por um tempo enquanto minha mãe reforçava minha confiança ao exaltar as virtudes dessas bestas escamosas e, por associação, as minhas. Segundo ela, eu seria importante e os registros da história, assim como os álbuns que ela comprava na Woolworths por 4,99 dólares a unidade, estavam esperando para serem preenchidos com fotos e contos das minhas futuras conquistas. Eu imagino que ela achava que eu escalaria o Everest, ganharia um Oscar, aconselharia presidentes e inspiraria uma dancinha da moda. Eu cantaria no Carnegie Hall, ganharia ouro nas Olimpíadas, casaria com uma princesa e acabaria com a fome no mundo. Nenhuma proeza estava fora do meu alcance, e a marca que eu deixaria no mundo seria grande e duradoura. No entanto, nada disso concordava com o time de especialistas tentando me ensinar a ler na escola, mas era minha mãe que dizia, então quem era eu para discordar? Se eu não morresse de medo de altura, eu teria pego uma capa vermelha e pulado do teto da nossa casa.

    Minha mãe acreditava fortemente em profecias autorrealizáveis e, assim que começou a costurar dragões em todos os meus jeans e camisas Lacoste de segunda mão (substituindo o crocodilo), a ideia de que eu estaria à altura das suas expectativas se tornou menos inverossímil. Os fios amarelos, verdes e vermelhos colocados nas minhas roupas me enchiam de energia; a costura apertada sustentava minha mente frágil. Eu usava meus dragões como um fuzileiro naval usava suas insígnias – Semper Fi. Eu era um exército de um homem só mais um, minha mãe, que, além de usar agulha e linha, brandia um pincel para colocar uma hidra cuspidora de fogo com narinas flamejantes em basicamente tudo que eu tinha, do assento em formato de banana da minha bicicleta ao meu skate à parede do meu quarto, tudo na tentativa de me impulsionar para o topo. A sua técnica teria dado um artigo incrível no tipo de revistas sobre superpais que você vê por aí hoje em dia, espremido em algum lugar entre textos causadores de ansiedade sobre 529 planos de faculdade e síndrome da morte súbita infantil, se não fosse por uma falha fatal: eu era ruim em tudo.

    Agora, antes que você ache que eu estou sendo muito duro comigo mesmo, me deixe esclarecer. Quando o assunto era receber instruções esportivas, eu era um ouvinte acima da média, há quem diga até altamente eficiente, mas minha falta de percepção de profundidade me impedia de converter palavras em atitudes e logo eu tinha uma das maiores coleções privadas de medalhas de honra ao mérito azul claras e certificados de participação da costa leste. Se um olheiro de alguma liga principal estivesse me assistindo, sua crítica seria devagar demais, baixo demais, fraco demais, mas dá trabalho pra caramba. De fato, ninguém se esforçava mais do que eu, mas esforço só te leva até certo ponto quando você vomita no técnico depois de cada série de corrida alternada e transpira pelo tapa-olho.

    O beisebol se revelou particularmente desafiador, embora nenhum esporte fosse fácil. O Sr. Saunders, gerente da minha liga infantil, que tinha um dente, nenhuma consciência e mancava por ter matado um homem em legítima defesa segundo as lendas da região, me instruiu a começar uma briga toda vez que ficássemos para trás, cuspindo um pedaço de tabaco mastigado no banco do time oposto ou chutando o saco do técnico deles. Pelo que me lembro, nós éramos o único time cujo capitão dava a cada jogador solas com ponteiras de metal afiadas e uma lata de tabaco Skoal antes de todos os jogos. Eu lembro principalmente do campo direito no calor do verão e de ficar encarando dentes-de-leão aleatórios sem piscar. Permanecendo firme em posição durante minhas duas rodadas mandatórias pela liga, eu continuei esperando que meu vulcão de heroísmo no beisebol entrasse em erupção a qualquer momento, mas isso nunca aconteceu. Todos os meus sonhos de bater um home run por cima da cerca do campo central no Bob Ford Field permaneceram enterrados no solo de algum cenário de pesadelo de strikeouts do Mudville Nine e de rebatidas simples fracas da liga do Texas lutando para passar da cabeça do primeira-base.    

    Minha mãe, que amava Louis Armstrong, achou que a corneta poderia ser minha vocação e comprou um instrumento de sopro vintage lindo em uma venda de garagem. Minha professora de música, a Srta. Lovell, não estava tão entusiasmada ao

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