Agente Charlotte
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Agente Charlotte - Helena Grillo Miranda
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Um tiro no telhado
A minha Glock G17 estava começando a coçar no meio daquela batida. Lavagem de dinheiro não era um crime que me incomodava, mas a lavagem era de dinheiro obtido em prostituição e tráfico sexual. Todos estavam rendidos, mas vi o gerente do lugar correndo pelos fundos do que era um restaurante japonês de fachada. A coceira na mão tinha que esperar, o momento exigia das minhas pernas. Ao chegar aos fundos da loja e olhar para os lados, vi que ele subiu pela escada de incêndio do prédio ao lado. Péssima escolha.
Eu fiz ginástica olímpica por um ano e meio. Pode parecer pouco, mas foi o suficiente para me dar capacidade de pular e escalar as partes planas da escada, sem ter de subir pelos degraus. Foi cansativo e exigiu muita força nas mãos. Quando cheguei ao terraço, ele estava confuso. Tinha cerca de um metro e setenta, era asiático e carregava uma Nambu tipo 14. Era quase uma relíquia de arma. Uma escolha insensata.
Confuso e com as mãos trêmulas, não tive tempo para dizer que se acalmasse. Ele atirou em mim. A precisão daquela arma é boa, mas a do atirador não era. Rolei para o lado e me escondi em uma antena, na qual a bala bateu e caiu em cima de mim. Por baixo da antena, meu braço direito estava livre e pude ver as pernas do suspeito. Respirei fundo e atirei na perna esquerda.
Aquele foi o final de mais um caso no meu trabalho como policial federal. Tive o fim de semana livre e fui para casa. Tenho dois irmãos. Layla, que é dois anos mais nova do que eu, e Mateus, que é três anos mais novo. Por ser a irmã mais velha, lembro-me de quando meus pais morreram em um acidente de carro em Salvador, em nossa cidade natal. Eu também vi a força de minha avó Francisca, que nos trouxe para a casa dela, no Rio de Janeiro, e nos criou.
Depois de dois anos após eu ter me formado em Comunicação Social na faculdade e não encontrado emprego em minha área, decidi me tornar policial militar. Layla fez o mesmo e minha avó quase morreu de preocupação. Felizmente para ela, não teve que se preocupar com o neto caçula, que fez Ciências Contábeis e hoje em dia é contador e muito bem casado.
Para o alívio de minha avó, depois de cinco anos vivendo com medo de subir a comunidade e não descer mais, decidi prestar concurso e me tornar policial federal. Mas minha irmã tomou um rumo diferente, abandonou a farda e abriu um stand de tiro.
Chegar em casa no fim de semana foi um alívio, a verdade é que só se percebe que se está cansado depois que se senta. Mas a fome é diferente, pois foi só sentir o cheiro do bobó de camarão que minha avó estava fazendo que meu estômago começou uma sinfonia.
Ela já me viu pela janela da pensão, abriu aquele grande sorriso. Sou suspeita para dizer, mas qualquer um se apaixonaria por aquela idosa alta, rechonchuda e com a pela negra como o mogno que era coberta por um belo vestido amarelo florido. Ela tirou o avental azul e correu para me receber na porta.
— Charlotte! Minha princesa! Não sabia que receberia folga nesse fim de semana. — ela disse me abraçando e me enchendo de beijos. — Do jeito que trabalha, quando terá tempo para arrumar um marido, hein?
Eu ri. Já tinha trinta anos e quase não namorava. Eu só trabalho e não posso falar sobre o que eu faço fora de serviço por ser confidencial, então já se pode imaginar como são os meus encontros.
Layla é diferente, despojada e conversa fácil. Está sempre namorando e tirando minha avó do sério. Mas somos uma família bem unida.
— Charlotte! Layla! Vamos comer, meninas! Vocês parecem dois palitos de dente. Ficam trabalhando e não comem a comida da vovó. Esse camarãozinho vai encher o bucho de vocês, e depois tem um bolinho de fubá para completar a tarde.
Eu comi com a minha avó a mesa, enquanto Layla comeu de frente para a TV.
A praia da morte
Interromperam minha folga porque um deputado foi encontrado morto na praia usando um terno. Ele estava na areia rodeado pelos peritos criminais da área 5 e da área 10, que me informaram que já estava morto há cerca de 23 ou 24 horas, e que fora jogado ao mar depois disso.
Ele tinha um corpo grande e flácido, e mesmo molhado dava para ver que vestia um terno bem caro e os sapatos também. Não tinha nada nos bolsos. Isso me saltou aos olhos, porque normalmente se um político sai sozinho, leva ao menos algumas canetas e uma carteira no paletó. Depois de tantas prisões e apreensões, comecei a observar isso.
Depois de tudo fotografado e catalogado pelos papiloscopistas, fui para o laboratório. O corpo foi para o IML e encontraram chumbo no intestino. Foi envenenamento.
Descobrir o motivo já era o meu trabalho, e sendo a vítima um deputado, poderia ter havido um crime político. Teria ele se envolvido com pessoas erradas, propina, corrupção? Já aprendi que esses são motivos bem comuns para assassinato. E então ele e algum desses investidores escusos
tiveram uma discussão, e ficou claro quem perdeu.
Mas essa era uma das hipóteses. Não havia provas, testemunhas ou qualquer outro fato que me confirmasse ou descartasse essa minha suspeita. Então fui atrás de provas. Eu já tinha interrogado a filha da vítima, que estava com o pai na praia duas horas antes dele desaparecer.
O deputado tinha dito que passaria em casa para buscar algo que havia esquecido e logo desceria novamente à praia. Eles moravam à beira-mar. A esposa contou que estava em casa preparando o almoço quando o marido chegou dizendo que precisava ir ao Congresso, porque havia esquecido que haveria uma reunião naquela tarde e já estava atrasado. Ela contou que ele colocou o terno e saiu.
A assessora dele explicou que não havia nenhuma reunião no Congresso naquele dia. Aquilo só confirmou minha suspeita de que ele teria uma reunião não-oficial e possivelmente ilegal. Só que a forma como morreu me deixou confusa e não seguia a linha de raciocínio.
Eu precisava de uma segunda opinião, e por isso conversei com David, que também estava