Mais uma chance
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Mais uma chance - Sérgio Seixas
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Parte 1
Cabisbaixo, Júnior chegou em casa, após mais um dia de aula. Abriu a porta, e logo sentiu um vazio apertando seu peito. Uma angústia se alastrava pelo seu corpo, reforçada pelo silêncio daquele ambiente. Quem poderia escutá-lo num momento difícil como aquele?
O imenso apartamento, onde morava com seus pais, estava com as cortinas fechadas. As camas ainda por fazer, e, na cozinha, uma pilha de louça suja, ainda do dia anterior. A mesa do café da manhã ainda estava posta.
Colado na geladeira, um bilhete: "Júnior, tive que sair cedo. Tenho coisas importantes a tratar. Tem enlatados no armário e congelados no freezer. Hoje volto tarde. Beijos, mamãe.’’
Irene, a mãe, não trabalhava. Gastava parte do seu tempo na academia, fazendo crossfit; em salões de beleza; ou no banco, onde pagava as contas da família e, na saída, tomava um cafezinho. Também era compulsiva em comprar. Alegava que "ir às compras é um antidepressivo natural’’.
Gonzaga, o pai, era fiscal da Receita Federal. Passava dias e, às vezes, meses, viajando. Visitava empresas em todo o território nacional. Por várias vezes, foi ameaçado de morte pelos empresários sonegadores impostos, mas honesto que era, cumpria com zelo seu ofício, desviando-se dos "presentinhos’’. Assim, como Irene, passava pouco tempo com Júnior. Nos raros momentos em que a família estava reunida, Irene e Gonzaga agarravam-se em seus celulares: ela postando fotos na rede social, ele acessando as planilhas da Receita Federal.
Pobre Júnior! O chão ruía sob seus pés. "Onde estão todos?’’ Neste momento, veio-lhe à mente a lembrança do tio Carlos. Ele sempre tratava o garoto com afeto. Foi na casa do tio, enquanto ouvia Raul Seixas no vinil, que Júnior apaixonou-se pela música. Carlos tocou numa conhecida banda de rock da cidade. A banda terminou, e ele passou a dar aulas de bateria.
Mas Júnior não contava mais com o tio Carlos. Fácil seria passar mais uma agradável tarde na casa do tio. Infelizmente Carlos havia falecido recentemente. "Por que pessoas boas se vão tão cedo?’’
Por impulso, sacou seu smartphone, buscando alento na rede social. Ao conectar-se, logo deu de cara com uma foto da sua mãe, sorridente, numa mesa de bar, com várias pessoas, segurando um copo de cerveja. Júnior sentiu o impacto de um soco.
Precisava pôr para fora a dor que lhe afligia, e, nessas horas, tudo que uma criança precisa é de um porto seguro, onde possa chorar, desabafar, e escutar ternas palavras de conforto. Mas não havia ninguém por perto.
Aos prantos, naquele apartamento silencioso e vazio, o garoto dirigiu-se à cozinha. Uma mistura de revolta e tristeza pela ausência dos pais apoderou-se de seus pensamentos. Num rompante, abriu a gaveta e retirou uma caixa de sapatos cheia de medicamentos "tarja preta’’, aqueles usados rotineiramente pela sua mãe. Pegou a primeira