Afetividade no esporte escolar: o caso do basquetebol
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Afetividade no esporte escolar - Dulciléia Maria Evangelista Gobbo Secco
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2017 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.
Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
Dedico este livro à minha família:
aos meus pais, por todo amor e cuidados a mim dispensados,
e em especial a meu esposo, Renato Ângelo Secco,
e a meus filhos, Cassius Marcellus Gobbo Secco e Caio Gobbo Secco.
(Dulciléia)
Dedico este livro a minha família:
em especial a minha esposa, Gislaine Cristina Vagetti,
e a meus filhos, Caio Vagetti de Oliveira e Giovana Vagetti de Oliveira.
(Valdomiro)
APRESENTAÇÃO
Hoje não se pode pensar no desenvolvimento humano de maneira dicotômica. É preciso pensar os indivíduos na sua totalidade, considerando todos os aspectos motores, afetivos, cognitivos e sociais. Entendemos, nos valendo de Paes¹, que o esporte é um fenômeno social e pode ser um propulsor para o desenvolvimento integral do indivíduo. O esporte faz parte, de alguma forma, da vida das pessoas. Desde a antiguidade, constituiu-se como elemento importante na formação do homem. A prática esportiva constitui um dos meios efetivos na educação dos jovens, e esse pensamento se fortalece se observarmos sua disseminação nas escolas e/ou fora delas. Nas escolas, consta como conteúdo curricular básico da disciplina de Educação Física, e são muitas as atividades extracurriculares que o ofertam.
Somos seres humanos e, por isso, estamos em constante desenvolvimento. Dentre os estudiosos do desenvolvimento humano, podemos destacar Vygotsky e Wallon, que nos alertam para a importância e a relevância de valorizar os aspectos que são responsáveis diretos no desenvolvimento dos seres humanos: os motores, cognitivos, afetivos e sociais. Em suas teorias, observamos o enfoque dado a cada aspecto, mas um nos chama especial atenção: o afetivo – e particularmente a atribuição que cada um aponta à afetividade e à sua indissociabilidade no processo de cognição, aprendizagem e desenvolvimento humano.
É real a observância de estudos e pesquisas que enfatizam o desenvolvimento dos indivíduos, aliado à prática de esportes, a seus aspectos cognitivos e motores e à sua indissociabilidade entre tais aspectos e a afetividade. Evidenciamos, porém, que há uma centralização nos cognitivos, motores, técnicos e táticos, deixando aos afetivos uma parcela menor que a necessária.
Foi dessa forma, inquietando-nos com a iniciação esportiva na escola, em particular do esporte basquetebol, que iniciamos uma pesquisa, na área da educação, no campo da cognição, aprendizagem e desenvolvimento humano, cujo fruto resultou neste livro.
Considerando a importância da afetividade e das emoções e sentimentos para o desenvolvimento integral dos indivíduos, bem como o papel atribuído ao esporte e sua prática, nos propomos a investigar a afetividade no ambiente de treinamento do basquetebol em técnicos e atletas de 13 a 15 anos, no contexto escolar. Nesta obra, partimos do pensamento de que, caso se conheçam as emoções e os sentimentos que permeiam o ambiente de treinamento desportivo, poder-se-á contribuir com informações importantes para o desenvolvimento de uma prática pedagógica melhor nesse esporte no âmbito escolar.
Dito isso, agrademos, ao publicar este livro, a todos que direta ou indiretamente contribuíram para sua produção.
PREFÁCIO
Trabalhos bem feitos e profissionais empenhados e comprometidos com a defesa da melhor compreensão do desenvolvimento humano merecem ser reconhecidos. Precisamos muitíssimo de pessoas realmente envolvidas nessa causa! Tanto para aprimorarmos a qualidade dos procedimentos educacionais como para obter o melhor desempenho profissional possível em cada área de atuação, e mesmo para balizarmos os avanços científicos em busca do entendimento do que é, de fato, ser um ser humano.
Mas, por que na tentativa de decifrar o que o ser humano é, tem e pode fazer de melhor, necessitamos também do melhor que cada pessoa possa dar de si? Porque, em última instância, desejamos ser felizes e satisfeitos conosco mesmos e com as pessoas com as quais interagimos; desejamos que nossas produções (as produções humanas) se harmonizem com o ambiente imediato e com o planeta que habitamos; e desejamos que o universo, que contém dimensões maiores que nosso entendimento pode agora descrever e explicar, possa absorver nossa existência como algo que faz parte da realidade cósmica mais ampla.
O âmbito afetivo-emocional faz parte dessa miríade de aspectos desenvolvimentais humanos que necessitam urgentemente ser mais bem compreendidos. Em muitas áreas da vida há muito difunde-se a crença de que esse tão importante aspecto da vida deve ser mantido sob o mais rigoroso controle, de forma que não ponha tudo a perder
. No esporte frequentemente se pode ouvir, da parte de comentaristas ou narradores esportivos, que quando um ótimo desempenho é alcançado – um belo gol é realizado em uma partida de futebol, um ponto difícil é ganho no tênis, por exemplo – a conquista deve-se à frieza
que o referido jogador teve naquele momento crucial. Pode-se perguntar então: que sangue-frio
é capaz de sustentar a chama tanto da intensidade física que um atleta necessita para impulsionar a bola como de outro movimento relevante em um momento decisivo? Que sangue-frio
dá amparo à intensidade psicológica necessária para escolher a técnica e o direcionamento corretos que culminam em uma bela realização?
Ao mesmo tempo ouve-se dos mesmos comentaristas que a emoção é o que dá beleza ao esporte. E de fato o faz! Mas não só no momento em que rostos sorridentes e maravilhados podem ser vistos mordendo
uma medalha ou quando as lágrimas escorrem por rostos comovidos com o hino nacional tocando ao fundo. Ou, ainda, quando jogadores comemoram mais três pontos a serem somados na tabela classificatória e colocam o time à frente dos adversários. Essa mesma emocionalidade tem lugar categórico em todo o percurso, possuindo um papel extremamente importante e aquecendo, sim, o sangue, os músculos e a psique para tornar possível uma importante realização! Desde a opção por certo esporte, passando por todos os percalços experienciados em treinamentos e em dias em que tudo parecia dar errado, até a autorregulação necessária para manter o sangue na temperatura correta
e fazer o que tem de ser feito. Sem esquecer que o sangue (a emocionalidade) ainda precisa circular suficientemente quente (mas sem ferver
em demasia) para conceder a força necessária para se erguer a cabeça perante uma derrota e para, humilde e ao mesmo tempo corajosamente, parabenizar o adversário quando ele se saiu melhor. Ah, e é claro, guiar o atleta a agradecer (não somente da boca para fora
) a todos aqueles que lhe possibilitaram chegar a qualquer nível comparativamente mais alto que aquele do qual partiu. Ou seja, reconhecer a afetividade existente nas interações que impulsionaram sua vida naquele contexto.
Complexo parece ser esse âmbito afetivo-emocional, não é mesmo?! Informações e usos contraditórios do tal sangue frio
e sangue quente
, em meio ao que parece ser mesmo uma terra de ninguém
. E isso não se restringe ao que se costuma chamar de senso comum
. Na esfera científica dedicada à compreensão dos fenômenos de cunho afetivo-emocional também não é ainda tão diferente. Grandes incompreensões e contradições se fazem presentes, e a conveniência parece, em grande parte, direcionar a medida desejável
da participação da afetividade e da emocionalidade nas ações humanas – uma vez que se costuma usar como parâmetro o auxílio
que podem fornecer na conquista de certo alvo almejado no momento, sendo dessa forma desejáveis; do contrário não.
Dulciléia Maria Evangelista Gobbo Secco mostra sensibilidade suficiente para perceber a necessidade urgente de investimento nessa área. Em uma pesquisa realizada com muita seriedade e esmero resolveu aliar o esporte e o estudo de aspectos afetivo-emocionais, decisão que tive o prazer de presenciar, bem como de acompanhar e contribuir, enquanto trabalho científico. Valdomiro de Oliveira igualmente demonstrou interesse e abertura para uma temática tão necessária para explorar. E assim se fez! O resultado é uma obra instigante, em que emoções e sentimentos vivenciados por atletas adolescentes e técnicos no contexto de treinamento de basquetebol foram revalorizados, resgatados em sua imensa importância, sendo que o ambiente de treinamento foi visualizado pelos participantes do estudo enquanto um ambiente carregado de afetividade. E quanta emocionalidade considerada positiva
mostrou-se importante para que o trabalho esportivo se torne eficaz! Agradabilidade, bem-estar, alegria, amizade, dedicação – e um pouco de sofrimento também – são o combustível para que o esporte se torne o palco tão atrativo que é e tão propulsionador do desenvolvimento humano que pode vir a ser.
Professora doutora Helga Loos-Sant’Ana
Universidade Federal do Paraná
Sumário
INTRODUÇÃO
Objetivo geral
Objetivos específicos
CAPÍTULO 1
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
1.1 Educação e esporte: caminhos possíveis
1.1.1 O ensino do esporte na escola
1.1.2 Os esportes coletivos
1.1.3 O Desenvolvimento Esportivo: suas possibilidades
1.2 A afetividade
1.2.1 O indivíduo visto na sua totalidade: a influência do meio social
1.2.2 O ser e o sentir: a afetividade no desenvolvimento humano
1.2.3 Emoções e sentimentos
1.3 Afetividade e esporte: estudos
CAPÍTULO 2
CAMINHO PERCORRIDO
2.1 Metodologia da pesquisa
2.2 Contextualizando o ambiente pesquisado
2.3 Conhecendo os participantes da pesquisa
2.4 Instrumentos utilizados na pesquisa
2.4.1 Formulários sociodemográfico e econômico
2.4.2 Mapa afetivo
2.4.2.1 Mapa afetivo: compreendendo sua composição
2.5 Procedimentos de análise dos dados
CAPÍTULO 3
ANALISANDO E DISCUTINDO OS DADOS
3.1 Caracterização da amostra do estudo
3.2 Análise das imagens do ambiente de treinamento esportivo a partir da construção de mapas afetivos
3.2.1 Ambiente de treinamento esportivo: imagens da afetividade
3.2.1.1 Imagem de agradabilidade
3.2.1.2 Qualidades e sentimentos
3.2.1.2.1 Metáforas
3.2.1.2.2 Perguntas adicionais: momento típico do esporte, atributos para o bom desempenho e interferências para sua obtenção no ambiente agradabilidade
3.2.1.3 Imagem de pertencimento
3.2.1.3.1 Qualidades e sentimentos
3.2.1.3.2 Metáforas
3.2.1.3.3 Perguntas adicionais: momento típico do esporte, atributos para o bom desempenho e interferências para sua obtenção na imagem de pertencimento
3.2.1.4 Imagem de atração
3.2.1.5 Qualidades e Sentimentos
3.2.1.5.1 Metáforas
3.2.1.5.2 Perguntas adicionais: momento típico do esporte, a tributos para o bom desempenho e interferências para sua obtenção na imagem de atração
3.2.1.6 Imagem de Contraste
3.2.1.6.1 Qualidades e sentimentos
3.2.1.6.2 Metáforas
3.2.1.6.3 Perguntas adicionais: momento típico do esporte, atributos para o bom desempenho e interferências para sua imagem de obtenção na contraste
3.2.2 Imagens e instituições
3.2.3 Palavra-síntese: sentimentos revelados
3.3 Análise complementar
3.3.1 Análise fatorial
3.3.1.1 Modelo Inicial
3.3.1.2 Modelo final
3.3.1.3 Descrição dos fatores
3.3.2 Análise bivariada
3.4 Cruzamento com as características da amostra
3.4.1 Cruzamento dos fatores com as informações sobre o esporte
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
Nosso olhar para o esporte provém da trajetória que vivenciamos como atletas de basquetebol e, hoje, como professores de Educação Física, na formação de docentes e na educação básica. Durante nossa trajetória como atletas e como docentes, tivemos a oportunidade de circular por vários ambientes esportivos e educacionais, o que nos possibilitou trabalhar com diferentes profissionais da área esportiva. Essa experiência serviu para solidificar nossa determinação profissional e nosso compromisso com a Educação e, em especial, com a disciplina de atuação: a Educação Física.
Nessa trajetória profissional, nosso perfil foi mudando, e juntamente com ele vieram dúvidas, inquietações e angústias. Enfrentamos as limitações de nossa própria formação, que geraram reflexões e nos impulsionaram a mudanças. Assim, fomos ganhando conhecimento e nos fortalecendo profissionalmente. Hoje, voltamos nossos olhares para o ensino do esporte. Embora entendamos a importância do aprendizado dos esportes na escola, indagamos quanto a sua abordagem, principalmente em sua iniciação e treinamento no contexto escolar.
Nos treinamentos sistemáticos do esporte, percebemos entraves na promoção e aplicação dessa prática. Essa percepção nos conduziu a reflexões que nos impulsionam a buscar novos caminhos, de mais conhecimento, nos quais esse conhecimento possa possibilitar uma prática que respeite as características do esporte e considere os mais diversos aspectos do desenvolvimento dos alunos. Nessa procura, nos deparamos com autores que compartilharam dessa mesma preocupação, dentre eles: Musch e Mertens (1991), Bayer (1994), Gallahue e Osmum (1995), Greco e Brenda (1998), Garganta (1998), Paes (2002), Bompa (2002), Oliveira e Paes (2004; 2012), Santana (2005), Tani, Bento e Petersen (2006) que em seus estudos discutem o ensino do esporte na tentativa de propor e buscar novos procedimentos pedagógicos que facilitem sua aprendizagem e que, conjuntamente, contemplem os diversos aspectos do desenvolvimento humano.
Dessas nossas inquietações e indagações, e de acordo com a literatura, uma em especial desperta nosso interesse: a afetividade e a sua relação no processo de ensino-vivência-aprendizado do esporte em jovens atletas.
Na nossa trajetória como atletas e docentes de Educação Física, pudemos constatar a pluralidade de esportes praticados pelos adolescentes com os quais convivemos e trabalhamos. Durante as aulas de treinamentos de tais esportes, os aspectos motores, as sequências pedagógicas para a aquisição de determinado movimento e a aquisição das técnicas e esquemas táticos sempre foram visíveis e de fácil identificação. Porém, a afetividade, as emoções e os sentimentos, mesmo que não fazendo parte do planejamento de tais treinamentos, afloravam, estavam ali e permeavam todo o trabalho, e dessa observação surgiam questionamentos como: que emoções e sentimentos estão presentes durante os treinamentos?
Durante a procura por material teórico que pudesse esclarecer esses questionamentos acerca da afetividade no esporte, encontramos diferentes estudos voltados para o desporto de alto rendimento, tendo como foco a melhoria de resultados em competições em atletas de alto nível. Contudo, constatamos um número reduzido de estudos preocupados com a relação da afetividade no ensino dos esportes, especificamente na prática docente voltada à iniciação, a fase de início do treinamento desportivo. Essa constatação levou-nos a compreender que, embora a importância da afetividade seja citada e enfatizada por grandes estudiosos do desenvolvimento humano como Piaget, Vygotsky, Wallon, ela ainda carece de ser investigada no âmbito esportivo para além das competições, precisa ser valorizada como essencial no trato com os esportes. Pautada nessa reflexão e retornando à problemática, idealizamos um estudo, culminado nesta obra, que tem como questão central investigar quais emoções e sentimentos permeiam o ambiente de treinamento esportivo de atletas jovens de 13 a 15 anos e seus respectivos técnicos no contexto escolar.
Diante do exposto, como prática educativa de crianças e adolescentes, acreditamos que o esporte possa ser um potencializador quando desenvolvido de maneira a abarcar as dimensões motoras, cognitivas, sociais e afetivas. A prática esportiva, quando orientada adequadamente, abrange todos os aspectos do desenvolvimento² seja social, cognitivo, físico, motor e afetivo – o que é enaltecido neste livro.
Buscamos reforço em Paes e Balbino³ quando discorrem a esse respeito, referindo-se ao esporte como fenômeno sociocultural e de múltiplas possibilidades e apontam para a necessidade de mudança na visão que transcenda atletas e grandes talentos. Indicam a importância de os olhares estarem voltados para o esporte como uma opção, uma possibilidade de desenvolvimento e de portas abertas a todos os cidadãos, o que destaca ainda mais a importância desta pesquisa.
Entendemos que estudos que façam a junção entre educação esportiva e psicologia são importantes. Investigar os sentimentos e as emoções que permeiam o ambiente de treinamento esportivo é passo importante na busca de trilhar caminhos que possibilitem que o esporte e a sua prática auxiliem no desenvolvimento pleno de seus praticantes.
O ambiente é um fator apresentado por Vygotsky como essencial, que exerce influência no desenvolvimento da pessoa e que é repleto de carga emocional. O ambiente exerce sua influência por meio das experiências emocionais
⁴. Verificamos, a partir de tal pensamento, o valor atribuído às emoções e aos sentimentos no processo de desenvolvimento dos indivíduos, o que nos instiga ainda mais a investigar as emoções e sentimentos no ambiente de treinamento esportivo do basquetebol. Segundo Viana⁵, a relação entre o atleta e seu ambiente é o que move sua prática. Esse pensamento ganha extensão quando entendemos que essa relação pode ser construída durante as aulas de treinamentos.
A partir dessas considerações, acreditamos na relevância da presente obra, que tem como questão principal a investigação da afetividade no processo de ensino-vivência-aprendizagem do esporte⁶, não somente para os profissionais que atuam com treinamento desportivo, mas também para todos aqueles