A Máquina da Insanidade
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About this ebook
A Máquina da Insanidade é um livro introspetivo quanto à vida com esquizofrenia paranóica. Faz uma análise clínica e observacional aos desafios apresentados pela condição.
Kenna discute a definição de esquizofrenia paranóica, tratamentos, viver com a doença, e muitos outros tópicos à volta da esquizofrenia. A Máquina da Insanidade é uma história não ficcional sobre a nossa jornada com esquizofrenia, que também é bem estudada e apropriada a terapeutas ou membros de família como livro de referência.
O livro inclui os tratamentos mais recentes e estudos, assim como vinhetas pessoas e sugestões que um cliente ou prestador de cuidados podem achar extremamente importantes. O livro foca-se na esperança e resultados positivos.
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A Máquina da Insanidade - Kenna McKinnon
Introdução
Acordado! Para a Manhã no Rolar da Noite
Arremessou a Pedra que coloca as Estrelas em voo:
E Lo! O Caçador do Oriente apanhou
A Torre do Sultão num Laço de Luz.*
*The Rubaiyat of Omar Khayyam, Verso 1, tradução por Edward Fitzgerald
O livro é designado por A máquina da Insanidade, porque, em 1978, Kenna McKinnon falava com outra companheira no antigo corredor de psiquiatria forense 5C, no Hospital Edmonton de Alberta, e ficou determinada em escrevê-lo um dia.
Hoje, o livro está escrito como planeado em 1978. Teve muitas viravoltas e pelo menos dois profissionais prometeram escrevê-lo com Kenna, mas rejeitaram antes que qualquer outro compromisso tomasse lugar. Hoje, Austin Mardon e Kenna Mary Mckinnon partilham memórias e talentos para trazer de volta uma doença mental que estava enterrada num asilo negro, há uma geração, e por vezes também nos nossos dias. Essa doença chama-se esquizofrenia. Tanto Kenna como Austin possuem um tipo de doença chamada esquizofrenia paranóica, caraterizada por delírios, alucinações e rejeição da realidade. Foram tratados com sucesso e vivem ambos realizados e numa vida com sentido.
O propósito da nossa história é oferecer esperança àqueles que lerem este livro, e elucidar os ignorantes acerca dos problemas da doença mental; para os empregadores, amigos e família que não nos percebiam e os nossos companheiros de viagem. Para conseguir a compreensão daqueles que diziam a Kenna que ela era má
e fraca
, aqueles que não percebiam as consequências de um problema mental sério que transformava uma pilha de roupa em cobras e que perseguia o subconsciente de Kenna aos labirintos do Inferno e imagens do Diabo durante 20 anos durante a primeira fase da sua doença; aqueles que aconselhavam Austin a prosseguir com a esterilização nos três meses do seu diagnóstico, e que interferiram na sua decisão de casar em 2006 quando presumivelmente pensavam que não tinha capacidades para tomar a decisão.
Kenna tem três filhos, adultos inteligentes, prestáveis, que contribuem para a sociedade de forma fantástica. Cuidou dos dois mais novos, com a ajuda de membros da sua família depois de ter ficado doente. A gratidão é especial pelo seu irmão Byron, e à sua mulher Diane, que se despediu para tomar conta das duas crianças quando Kenna ficou esporádica e magnificentemente psicótica. As crianças podem ter ficado com marcas hoje, mas não as mostram, por causa da força dos seus genes e, talvez, o amor que estava disponível, mas escondido, a sua própria honestidade e boa-vontade, talvez ainda por causa das dificuldades precoces, que levaram à compaixão, coragem e força. São adultos bons e saudáveis.
O filho mais velho, criado por pais adotivos amorosos, também é um prazer. Vivendo por vezes com os seus próprios demónios com uma fé que é estranha à família de Kenna, nasceu quando Kenna tinha 17 anos e não estava pronta para assumir o seu novo filho; foi colocado no exército da Salvação numa família adotiva amorosa. A sua fé, educação, e os genes também fizeram dele alguém forte, gentil e compassivo.
Este livro não foi sempre fácil de se escrever. Não iremos aborrecê-lo, ao leitor, com detalhes inúteis, mas iremos diretos às nossas histórias, e a história da esquizofrenia no nosso país hoje e ontem, nas nossas cidades e nas nossas próprias casas – mesmo as ruas, hospitais e cadeias.
Haverão algumas estatísticas e algumas anedotas em particular, provenientes de conhecidos de Austin e os seus amigos durante mais de 19 anos. Tem sido defensor de outras pessoas que nem sempre tiveram o sucesso de que desfrutamos e, dessa forma, ouviu as suas histórias. Kenna fez essa jornada por conta própria desde que ficou doente em 1975. O contacto com outras pessoas como ela ou mesmo com outras que a poderia entender era limitado até agora.
Estamos gratos por vivermos no Canadá onde o tratamento médico é fornecido gratuitamente ao consumidor. Somos gratos por aqueles que nos entendem. Estamos gratos por aqueles com doença bipolar, distúrbios de ansiedade, depressão, distúrbios obsessivo-compulsivos, demência, autismo e outras formas de doença mental atribuídas pelos profissionais de saúde mental. Agradeço a Deus por todos vocês e pelos profissionais que nos tratam com sucesso e compaixão. Abençoe os sem-abrigo que dormem na beira, graças a Deus pelas nossas camas quentes e a boa comida, e um teto à noite.
Estamos também gratos pela saúde. Há muitas pessoas que não mencionamos. Ficamos com raiva. Fomos abusados e mal compreendidos. A ignorância e o medo dominaram a mente deles com demasiada frequência durante a vida adulta. Vimos de passados disfuncionais. Somos filhos de Deus, mas fomos desrespeitados e, por vezes, tratados como lixo, pelas mesmas pessoas e instituições que dizem querer tratar aqueles que não sabem tratar de si próprios. Fomos também mantidos e protegidos, tivemos oportunidades que outras pessoas não tiveram. Os empregadores têm percebido. Geralmente, amigos e familiares oferecem apoio. Encontramos a fé religiosa e caminhamos com Deus. Estamos gratos por isso. Apesar das desilusões e raiva ocasionais, este livro foi escrito com amor e paixão. Entre e veja por si mesmo. Sinta a luz em si. É a história de 1% da população mundial e a nossa caminhada com a esquizofrenia.
Agradecimentos
Judith Hansen é uma amiga e editora que, de forma inteligente e bem pensada, editou este livro. Agradecemos-lhe pela sua seriedade e paciência; no entanto, Austin e Kenna tomam responsabilidade por quaisquer omissões ou erros no manuscrito. Sem o profissionalismo e amizade de Judi, o livro não estaria acabado como agora está.
Agradecemos também aos nossos amigos, parceiros de trabalho, doutores, enfermeiros, o sistema legal, terapeutas e a Sociedade de Esquizofrenia de Alberta pelas ideias, amor, suporte e paciência ao longo dos anos, sem os quais não seriamos as pessoas que somos hoje.
Capítulo 1: As Nossas Histórias
"Ah, mas o alcance do homem deve exceder os limites do mesmo, ou para que serve o céu?" - Robert Browning
(ou de uma mulher – uma nota nossa)
Ilusões religiosas são sintomas comuns de esquizofrenia. A doença de Kenna McKinnon era, de certa forma, típica neste aspeto. O ano era o de 1975; o ano dos demónios quando a sua esquizofrenia começou a tornar-se evidente.
Kenna Wild (Kenna) encolheu-se no canto da sua casa arrendada, folheando as páginas de uma Bíblia antiga, que gritava obscenidades para ela. Tinha a certeza que o diabo estava na sala. Nada fazia sentido. Uma pilha de roupa na cozinha contorcia-se e transformava-se em cobras. A música provinda de uma fita em modo estéreo gozava com ela com rimas vulgares. Lembrou-se de um livro aos quadradinhos lamacento e rasgado que tinha encontrado na rua em outubro. Falava de um grupo de jovens que investigavam uma igreja demoníaca, e tinha instruções para essa investigação.
Kenna olhou para a Bíblia nas suas mãos. Abriu-a aleatoriamente, tendo calhado nas Revelações, 3:20. Eis que estou à porta e bato, se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo...
. A frase tinha sido sublinhada a vermelho pelo professor que tinha dado o livro a Kenna quando em criança, e as palavras brilhavam agora nela como um sinal de néon. Foi o único verso que fez sentido. A jovem experienciou uma sensação de alegria repentina. Talvez houvesse uma saída do Polo, da presença do Diabo dentro dela? Jesus Cristo, salve a minha alma,
Kenna disse em voz alta.
A Bíblia, aberta nas suas mãos. Ela sentiu-se calma. Hesitante no início, folheou o livro, lendo primeiro um verso, depois outro. As palavras foram fazendo sentido, todas com uma garantia de força e poder que Kenna sabia superarem as forças do mal dentro de si.
Em vários momentos, Kenna abençoava um copo de água da torneira da cozinha e deitava-o no peito de um Diabo invisível a espreitar no quarto mais perto dela. Ela viu as gotas de água a fazerem ricochete no peito do diabo. Noutras alturas, andava descalça em sem casaco na neve do lado de fora de sua casa, vendo o rosto do diabo nas nuvens acima e hordas de demónios seguindo pelo céu. O Diabo usava barbicha e cornos, mas com a boca mais sensual que Kenna jamais tinha visto. Sabia que a boca lhe tinha tocado muitas noites quando estava semi-deitada na sua cama, atacada pelos demónios e o Diabo em si mesmo.
E assim começou. O pesadelo da doença mental. Um conhecido carinhoso chamou um psicólogo dos Serviços de Aconselhamento Estudantil da Universidade de Alberta, em 1975, onde Kenna era estudante de graduação naquele ano. Kenna recebia aconselhamento uma vez por semana por dois a três anos, mas ficou sem medicação durante esse período de tempo, assustado, por vezes violento, e cada vez mais doente.
Em 1978, Kenna teve problemas legais por dirigir ameaças e invasões. Foi enviada para a Unidade Forense do Hospital Alberta Hospital Edmonton, uma instituição psiquiátrica forense, onde foi diagnosticada pela primeira vez com esquizofrenia paranóica. Os medicamentos psicotrópicos na altura estavam na sua infância. Recebeu um antidepressivo e um tranquilizante e a clorpromazina, outro tranquilizante importante, com efeitos colaterais tão graves que ela não conseguia colocar um garfo ou chávena na boca sem derramar, devido ao tremor das mãos. Não podia subir escadas devido a tonturas e fadiga resultantes das doses pesadas de medicamentos que lhe foram administrados.
Após ter sido libertada, os vizinhos levavam-na a piqueniques e Kenna adormecia na mesa de piquenique, incapaz de ficar acordada por mais de meia hora de cada vez. Ela continuou a conduzir o seu carro (um Dodge verde neon que se chamava demónio, assustadoramente). Um dia, ia a conduzir a alta velocidade com a intenção de bater num penhasco. Depois de ouvir um DP simpático e mais música no rádio, acalmou e voltou a casa sem incidentes. Estava em risco frequente de suicídio naquele momento, noutra ocasião, tomando pílulas e garrafas de vinho com intenção letal, resgatada por um amigo com quem tinha intenção de falar.
O marido morreu em 1971. Foi deixada com duas crianças, que foram forçadas a mudar-se com frequência durante a sua infância, devido à instabilidade da mãe. Cuidou dos filhos como podia, mas com dificuldade, e foram continuamente acompanhados tanto por amigos como a família.
Kenna começou a abusar do álcool e a fumar em 1978. Parou de fumar no verão de 1985. Parou de beber álcool em junho de 1993. Sem estas intervenções, estaria morta por agora.
Ela também tem a certeza que os seus filhos sentem as marcas de viver esses anos com a doença mental da mãe. Não abusou deles fisicamente, mas sente as suas marcas psicológicas deixadas por ela nessa altura.
Um casamento infeliz surgiu de seguida em 1982, culminando em divórcio em 1987. Kenna e os seus filhos viveram num apartamento arrendado posteriormente, e ela trabalhou tanto quanto possível durante esses anos difíceis. A sua filha saiu de casa depois de acabar o ensino secundário, aos 17 anos, e foi para a Universidade com distinção. O filho entrou na NAIT e recebeu o diploma em Telecomunicações enquanto trabalhava também em full-time. O seu filho viveu em casa com Kenna durante essa altura.
Numa noite, ele chegou a casa e encontrou Kenna a deitar fora os seus registos e bens. Tinham vindo do Diabo, dizia ela. O seu filho, pacientemente, explicou a Kenna que podia deitar fora livremente as suas posses, caso quisesse, mas que não o fizesse com as suas coisas. Desta forma, recuperou o que conseguiu do lixo nessa noite.
Os seus filhos, amigos e vizinhos, além de frequentes marcações com um psiquiatra e outros profissionais, foram as maiores fontes para apoio emocional. Um ministro e conselheiros disseram a Kenna que nunca mais ia trabalhar, e que não ia sair das instituições psiquiátricas para o resto da vida. O seu psiquiatra disse-lhe que lidar
era tudo o ela poderia esperar. Kenna lutou, e era uma