Dinâmicas Geográficas no Sul de Minas Gerais
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Dinâmicas Geográficas no Sul de Minas Gerais - Marta Marujo Ferreira
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
APRESENTAÇÃO
O lançamento do livro Dinâmicas Geográficas no Sul de Minas Gerais se constitui em um marco de comemoração dos 10 anos do curso de graduação em Geografia da Universidade Federal de Alfenas, Unifal-MG. O curso iniciou-se em fevereiro de 2007, nas modalidades bacharelado e licenciatura, com a expectativa de suprir uma carência regional. Naquela época, não havia cursos presenciais de Geografia em instituições públicas, em um raio de aproximadamente 200 km a partir de Alfenas. Assim, o curso surge para atender a demanda das escolas públicas e particulares no Sul/Sudoeste de Minas. Desde então, além da formação de geógrafos, o corpo docente do curso vem produzindo pesquisas e criando uma base de dados sobre a região.
Este livro é, portanto, a primeira tentativa de mostrar, coletivamente, os resultados dos diversos trabalhos desenvolvidos pelos docentes e orientandos em projetos de iniciação científica, trabalhos de conclusão de curso e estágios. Os resultados dessa diversidade de trabalhos foram produzidos no âmbito dos grupos de pesquisa Geres (Grupo de Estudos Regionais e Socioespaciais) e Gaeda (Grupo de Pesquisa em Análise Espacial e Dinâmica Ambiental), tendo como objeto de investigação a mesorregião Sul de Minas.
Estudos geográficos sobre o Sul de Minas eram muito pouco expressivos, antes da criação do curso de Geografia. Destaca-se também que, como os docentes do curso vieram de outros estados do Brasil, a maioria desconhecia a realidade do Sul de Minas, passando a realizar com seus discentes projetos de pesquisa e de extensão sobre a região. A partir de então, esses trabalhos tornaram-se referência para pesquisadores sobre a região, nos mais variados assuntos inerentes à ciência geográfica, sobretudo, relacionados a estudos de caso sobre os municípios de Alfenas (principalmente), Areado, Campo do Meio, Santa Rita do Sapucaí, Pouso Alegre, dentre outros. Muitos desses trabalhos já foram apresentados em eventos científicos nacionais e internacionais.
O Geres visa analisar as dinâmicas regionais e socioespaciais procurando entender as relações sociais, econômicas, políticas e culturais que constituem a organização regional. Considerando as diferentes formas de produção do espaço regional seja no campo ou na cidade, o grupo parte de um enfoque geográfico para uma visão interdisciplinar. Também é objetivo discutir os elementos teóricos e metodológicos das pesquisas em geografia humana e regional, analisando os conceitos e categorias geográficas sobre as temáticas que envolvem a sociedade.
O Gaeda reúne docentes e discentes que desenvolvem pesquisas integradas nas áreas de Cartografia, Análise Espacial e Geografia Física. O grupo emerge motivado pela necessidade da realização de estudos com envolvimento na questão ambiental. Foi criado para atender uma demanda local e regional, permitindo discussões no âmbito socioambiental e no avanço do conhecimento sobre Alfenas e a região do Sul de Minas Gerais. Desse modo, possibilita aos docentes e discentes compreenderem as relações entre sociedade e natureza a partir da perspectiva sistêmica da realidade.
Por conta da diversidade de temas que compõem este livro, ele foi dividido em duas partes: 1) dinâmica dos espaços rurais e urbanos e 2) dinâmica da paisagem. Na primeira parte, os capítulos abordam o espaço rural, marcado pela predominância da cafeicultura, onde ocorre o embate entre agricultura familiar e o agronegócio; o espaço urbano, destacando Alfenas como uma cidade média que vem se reestruturando internamente e sua articulação com a rede urbana do Sul de Minas; a geografia da saúde, por meio de uma análise descritiva do perfil epidemiológico e sociodemográfico do estado e do Sul de Minas Gerais; a distribuição espacial da atividade comercial em Alfenas e seus desdobramentos, bem como a organização das feiras livres na cidade e a inserção das mesmas no Circuito Inferior (CI) da economia urbana; a crise educacional na Região Sul mineira e os problemas advindos da precarização do trabalho do professor, analisando a formação inicial docente dos graduandos do curso de Geografia Licenciatura, da Unifal-MG, no contexto da organização do Sistema Mineiro de Educação; e a análise das pequenas cidades da microrregião de Alfenas, marcadas pela forte presença da ruralidade e pela intensa relação campo-cidade.
A segunda parte é fruto de estudos sobre a geografia física, enfocando a dinâmica da paisagem sul mineira. Os capítulos que compõem essa parte abrangem estudos envolvendo a geomorfologia na região de Pouso Alegre, evidenciando que as características morfológicas associadas à atividade tectônica podem ser identificadas por meio dos índices morfométricos do relevo e da drenagem; os níveis de antropização e degradação ambiental no município de Alfenas são destacados por meio de pesquisa envolvendo a necessidade de preservação e conservação de fragmentos remanescentes da vegetação; a sub-bacia do córrego do Pântano em Alfenas é alvo de estudos morfométricos visando a identificar a fragilidade e tendência da área no desenvolvimento dos processos de enchentes; e estudos sobre a dinâmica histórica e as alterações do uso e cobertura do solo entre os anos de 1977 a 2016, retratados no município de Alfenas.
Dessa forma, esta obra tem o intuito de ser uma contribuição da Unifal-MG, não apenas para o público acadêmico, como também para os moradores dessas áreas estudadas na região – muitos deles como participantes das pesquisas – e, acima de tudo, mostrar a importância da Geografia realizada nessa instituição e a bem-sucedida criação do curso, que agora caminha em direção à implantação do mestrado nessa área.
As organizadoras
PREFÁCIO
O curso de Geografia da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), nos seus 10 anos de existência, vem realizando ensino, pesquisa e extensão de excelência na mesorregião Sul/Sudoeste de Minas, por meio de um corpo docente jovem, qualificado e extremamente comprometido, formado, em sua maioria, por professores egressos dos cursos de Geografia – graduação e pós-graduação – da USP, Unesp, UFMG, Unicamp.
Tive a honra e o prazer de conhecer a estrutura e o corpo docente deste curso durante a 3.ª Jornada Científica da Geografia, em setembro de 2012, e como consultor do projeto de mestrado, em maio de 2015. Em uma dessas atividades, caminhando pelos corredores do departamento, deparei-me com uma aula de fotointerpretação, raríssima nos dias atuais, técnica abandonada pela Geografia em favor da digital, cujo ensino nos dias de hoje torna-se essencial para se entender os fundamentos do geoprocessamento.
O livro Dinâmicas Geográficas no Sul de Minas Gerais, organizado pelas professoras Marta Felícia Marujo Ferreira e Ana Rute do Vale, do curso de Geografia da Unifal-MG, foi dividido em dois módulos: Dinâmica dos Espaços Rurais e Urbanos; Dinâmica da Paisagem, e contém capítulos com pesquisas realizadas pelos professores e alunos durante os últimos 10 anos. Trata-se de resultados de projeto de extensão e de pesquisas orientadas nas modalidades de estágio, iniciação científica e trabalho de conclusão de curso.
Assim, nos capítulos que se sucedem, os autores sintetizam aspectos ligados ao agronegócio do café, predominante na mesorregião Sul/Sudoeste de Minas, sobretudo pós-década de 1970; aos impactos urbanos causados pela duplicação da rodovia Fernão Dias, em 1995, momento em que a região passou a atrair empresas, com alguns municípios apresentando altos índices de crescimento urbano; às relações rurais-urbanas e das redes urbanas compostas por cidades pequenas e médias; ao significado do comércio de Alfenas no processo histórico de ocupação regional; às questões educacionais da região, especialmente na formação de professores pelo curso de Geografia Licenciatura da UNIFAL; à análise morfométrica em bacias hidrográficas; à análise da evolução do uso e cobertura do solo e à identificação de fragmentos de vegetação nativa no município de Alfenas. São resultados de parte das pesquisas realizadas pelo corpo docente e discente nesses 10 anos. Essas pesquisas podem contribuir para o desenvolvimento local e regional, no processo de planejamento e tomada de decisões políticas, e exercer sua função primordial de inserção social da universidade na região.
Não poderia terminar este prefácio, que faço com imensa satisfação, sem antes tecer breves comentários sobre as pesquisas desenvolvidas pelas organizadoras do livro.
A professora Marta iniciou seus estudos geomorfológicos ao ser orientada pelo saudoso Prof. Dr. Antonio Christofoletti, no seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em 1987, na Unesp de Rio Claro. Uma das fundadoras do curso de Geografia da Unifal, em 2006, vem desenvolvendo inúmeros projetos de pesquisa e de extensão, a maioria financiados pelo CNPq e pela Fapemig, ligados às Geociências, com ênfase em Geomorfologia, especialmente nas áreas de cartografia geomorfológica, morfotectônica, análise geomorfológica de bacias hidrográficas, mapeamento e análise de processos erosivos.
A professora Ana Rute, contemporânea da professora Marta na Unesp de Rio Claro, foi orientada no seu doutorado pela Prof.ª Dr.ª Lúcia Helena de Oliveira Gerardi. Foi, também, uma das fundadoras do curso de Geografia da Unifal e vem desenvolvendo pesquisas, também financiadas pelo CNPq e pela Fapemig, nas áreas de Geografia Agrária e Urbana, especialmente nos temas ligados ao espaço periurbano, às novas relações campo/cidade e rural/urbano, à agricultura familiar, ao agronegócio, à questão de gênero, de educação do campo e da questão agrária.
Este livro torna-se assim referência para pesquisadores, planejadores e tomadores de decisão na região, podendo também ser utilizado como recurso didático-pedagógico no ensino. Recomendo sua leitura para aqueles que se interessam pela região do Sul de Minas, pois os temas apresentados poderão contribuir para solucionar grande parte dos problemas socioeconômicos e ambientais enfrentados pelos municípios da região nas últimas décadas e para se atingir melhores índices de qualidade de vida para a população.
José Flávio Morais Castro
Professor adjunto IV
Programa de Pós-Graduação em Geografia
(Tratamento da Informação Espacial)
PUC Minas
Sumário
PARTE I
DINÂMICA DOS ESPAÇOS RURAIS E URBANOS
A AGRICULTURA FAMILIAR NO CONTEXTO DO AGRONEGÓCIO DO CAFÉ NO SUL/SUDOESTE DE MINAS: VARIAÇÕES SOBRE O MESMO TEMA
Ana Rute do Vale
GEOGRAFIA DA SAÚDE MINEIRA
Daniel Hideki Bando
A REESTRUTURAÇÃO DAS CIDADES MÉDIAS: O CASO DE ALFENAS NO SUL DE MINAS GERAIS
Evânio dos Santos Branquinho e Leticia Silvério da Silva
CIDADES PEQUENAS NO SUL DE MINAS GERAIS: RURALIDADES PRESENTES NO TERRITÓRIO
Flamarion Dutra Alves
ESPAÇO E ECONOMIA: DIMENSÕES DA ATIVIDADE COMERCIAL EM ALFENAS-MG
Gil Carlos Silveira Porto
POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS, FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO SUL DE MINAS GERAIS
Sandra de Castro de Azevedo
PARTE 2
DINÂMICA DA PAISAGEM
EVOLUÇÃO DO USO E COBERTURA DO SOLO DO MUNICÍPIO DE ALFENAS, SUL DE MINAS GERAIS
Joaquim Ernesto Bernardes Ayer, Danilo Francisco Trovo Garófalo, Diogo Olivetti, Marx Leandro Naves Silva e Ronaldo Luiz Mincato
ABORDAGEM GEOMORFOLÓGICA PARA AVALIAÇÃO MORFOTECTÔNICA EM ÁREAS TROPICAIS: EXEMPLOS NA ALTA BACIA DO RIO SAPUCAÍ, SUL DE MINAS GERAIS
Marta Felícia Marujo Ferreira
FRAGMENTOS REMANESCENTES DA VEGETAÇÃO NATIVA NO MUNICÍPIO DE ALFENAS-MG
Paulo Henrique de Souza, Rodrigo Cesário Justino e Filipe Egídio Dias do Prado
CONSIDERAÇÕES SOBRE A MORFOMETRIA E ASPECTOS AMBIENTAIS DA SUB-BACIA DO CÓRREGO DO PÂNTANO, ALFENAS-MG
Rodrigo José Pisanis
SOBRE OS AUTORES
PARTE 1
DINÂMICA DOS ESPAÇOS RURAIS E URBANOS
A AGRICULTURA FAMILIAR NO CONTEXTO DO AGRONEGÓCIO DO CAFÉ NO SUL/SUDOESTE DE MINAS: VARIAÇÕES SOBRE O MESMO TEMA
Ana Rute do Vale
Introdução
Iniciar um curso de graduação em Geografia em Alfenas foi um grande desafio, mas também uma oportunidade de desenvolver pesquisas em geografia agrária em uma região na qual a ruralidade é tão pulsante. Aos poucos foi possível perceber que havia muita coisa a produzir cientificamente, considerando a escassez de trabalhos sobre o espaço rural dos municípios da mesorregião Sul/Sudoeste de Minas, sobretudo nas questões referentes ao agronegócio do café, predominante na região, pós-década de 1970.
Considerando que a agricultura familiar se tornou principal produtora e fornecedora desse produto para as cooperativas e, consequente, para o mercado externo, alguns questionamentos surgiram. Como é possível a sobrevivência desse tipo de agricultor no contexto do agronegócio, que, em geral, busca a monocultura em grandes extensões de terras e exige normas e padrões de produção a um custo muito elevado? Será que na cafeicultura seria diferente do que se observou em outras cadeias produtivas com a da laranja e da soja, por exemplo?
Talvez as respostas para essas questões possam ser encontrar em três situações diferentes, mas complementares que serão aqui apresentadas nos municípios de Areado, Alfenas e Campo do Meio. Trata-se de resultados de projeto de extensão e de pesquisas orientadas nas modalidades de estágio, iniciação científica e trabalho de conclusão de curso, orientados pela autora do presente trabalho.
Ressalta-se que os três casos relatados dizem respeito a áreas rurais de municípios da região, que passaram por transformações – socioespaciais, econômicas, culturais e demográficas –, a partir da inundação de suas terras, provocadas pela implantação da usina hidrelétrica de Furnas, no final da década de 1950, que originou um lago que cobriu uma superfície de 1.440 Km² configurando um perímetro de 3.500 km. Sua bacia de drenagem apresenta uma área total de 54.464 Km², atingindo 34 municípios que ali se encontram. O lago é formado por dois braços
, o primeiro é formado pelo Rio Grande e conta com uma extensão de 240 km e situa-se a leste do reservatório, já o segundo, ao sul, é formado pela junção dos rios Verde, Sapucaí e Machado. O reservatório de Furnas ainda hoje é um dos maiores lagos artificiais do mundo (LEMOS JÚNIOR, 2010).
As localidades escolhidas para análise nesse trabalho se encaixam nesse contexto, tendo em comum, além do fato de se caracterizarem pela predominância da agricultura familiar, o fato de que com a inundação de áreas de várzea, a produção, sobretudo do arroz, foi substituída pela cafeicultura que passou a predominar na região pós-década de 1970. São elas: os bairros rurais Cantagalo, em Areado e Mandassaia, em Alfenas e o assentamento de trabalhadores rurais Primeiro do Sul, em Campo do Meio (Figura 1).
FIGURA 1: MAPA DA LOCALIZAÇÃO DOS BAIRROS RURAIS CANTA GALO E MANDASSAIA E ASSENTAMENTO PRIMEIRO DO SUL NA MESORREGIÃO SUL/SUDOESTE DE MINAS.
FONTE: IBGE – Base MG – Setores Censitários (2010). Elaborado por André Luiz Silva Bellini (2016).
No bairro rural Canta Galo, além da cafeicultura, cada vez mais se faz presente outras formas de renda obtidas pela adoção de atividades não agrícolas, com destaque para a pesca artesanal realizada no bairro desde a década de 1960, além de estabelecimentos particulares de lazer e produtivos – segunda residência e chácaras de veraneio. Boa parte das fontes de renda dessas famílias vem dessas atividades que também são exercidas na cidade, uma vez que com a construção da BR-491, pós-Furnas, aumentou-se a mobilidade dos moradores, tanto em direção à sede dos municípios de Areado, 10 km, e de Alfenas, 20 km.
O bairro rural Mandassaia se diferencia do Canta Galo pelo fato de ter ficado completamente isolado geograficamente com a inundação das terras rurais, em Alfenas. Dessa forma, a adequação a uma nova cultura foi mais difícil, inclusive, por conta da desconfiança com relação a essa nova atividade. Apesar de não estarem tão distantes da sede do município – 15 km – a mobilidade desses moradores é dificultada porque não há asfalto e boa parte do trajeto necessita ser feito por balsa. Esse fato torna difícil a adoção de outras fontes de renda fora da cafeicultura.
Já o assentamento Primeiro do Sul tem esse nome por ter sido o primeiro criado na região, em 1997, após seis meses de ocupação da antiga Fazenda Jatobá, com 888,7 hectares e grande produtora de café e gado, que se encontrava abandonada pelo proprietário endividado. Os novos moradores, embora também cultivem outras culturas e criem animais, mantiveram a produção de café, aproveitando-se das condições climáticas e edáficas da região, bem como da estrutura de beneficiamento e comercialização existente, embora essa não seja a ideologia do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), que coordena o assentamento e que defende que no espaço dos assentamentos, o agronegócio deveria passar bem distante.
Nesse sentido, esse trabalho visa compreender as diferentes situações da agricultura familiar e suas formas de sobrevivência no contexto do agronegócio do café na mesorregião Sul/Sudoeste de Minas. Trata-se de um estudo comparativo, a partir de estudos de caso junto à agricultura familiar cafeicultora tradicional, na qual, geralmente, o acesso a terra foi por meio de herança, ou seja, famílias tradicionais que habitam uma escala espacial específica, o bairro rural e ao assentamento, onde, teoricamente, a prática da cafeicultura teria sido opcional
. Vale destacar que os tipos de dados coletados não são os mesmos nas três localidades pesquisadas porque os questionários e os roteiros de perguntas das entrevistas foram diferentes pelos objetivos de cada projeto desenvolvido em épocas diferentes por Lourenço (2010, 2012), Costa (2016) e Lucas (2010). No entanto, é possível, a partir deles, compreender a dinâmica da agricultura familiar regional no contexto do agronegócio.
O trabalho estrutura-se a partir de uma discussão sobre a caracterização da mesorregião Sul/sudoeste de Minas como território do agronegócio do café, para depois analisarmos a relação entre o agronegócio e a agricultura familiar nas três localidades escolhidas, destacando, o histórico da ocupação espacial, a caracterização da produção e formas de comercialização, bem como as perspectivas dessas famílias com relação ao futuro na cafeicultura.
Mesorregião Sul/Sudoeste de Minas: Território do Agronegócio do Café
O estado de Minas Gerais efetivou-se como líder da produção de café no País, a partir da década de 1970, quando superou os estados do Paraná e de São Paulo, principais produtores até então. O principal incentivo para alcançar esse posto foi a criação de um Plano de Renovação e Revigoramento dos Cafezais, proposto pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC), além da ocorrência de geadas nas principais áreas de produção desses dois estados, bom como a incorporação de extensas áreas de cerrado. Dessa forma, a cafeicultura mineira vem aumentando sua produtividade por meio de pesquisas e transferência de tecnologias aliadas à aptidão natural relacionada às condições de relevo, climas e solo (PEREGRINI; SIMÕES, 2011).
A economia dos municípios produtores do Sul/Sudoeste está inserida no agronegócio do café, sendo que representa 50% da produção total do estado de Minas Gerais. Alguns fatores podem explicar essa evolução do sistema agroindustrial do café na região, de acordo com pesquisadores atuantes no setor do agronegócio cafeeiro:
A existência de financiamento, assistência técnica, introdução de novas tecnologias, aumento das exportações, aumento dos preços internacionais e a renovação a cafeicultura via apoio governamental. (SILVA; SANTOS; LIMA, 2001, p.9)
Antes de tudo, é importante ressaltar que o conceito de agronegócio, segundo Welch e Fernandes (2008, p. 165) foi formulado pela primeira vez por Davis e Goldberg (1957) e significa:
[...] um complexo de sistemas que compreende agricultura, indústria, mercado e finanças. No decorrer do tempo, o movimento desses complexos e suas políticas formaram um modelo de desenvolvimento econômico controlado por corporações transnacionais, que trabalham com uma ou mais commodities e atuam em diversos setores da economia.
Nesse sentido, as transnacionais passam a ter um poder tão grande que lhes permite manipular os processos em todos os sistemas do complexo e utiliza o campesinato no sistema agrícola. Nesse trabalho será utilizado o conceito de agricultura familiar em vez de campesinato. Segundo Gasson e Errington (1993, p. 20 apud ABRAMOVAY, 1997, p. 74), ela possui seis características:
- a gestão é feita pelos proprietários;
- os responsáveis pelo empreendimento estão ligados entre si por laços de parentesco;
- o trabalho é fundamentalmente familiar;
- o capital pertence à família;
- o patrimônio e os ativos são objetos de transferência intergeracional no interior da família