Cuide dos pais antes que seja tarde
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Cuide dos pais antes que seja tarde - Fabrício Carpinejar
Minha mãe vai encolhendo. Cada vez mais baixo a cabeça para receber sua benção. Ela levanta o braço direito com esforço para alcançar minha testa, indecisa entre buscar uma escada e pisar na ponta dos pés.
Sempre que me despeço dela, recebo sua proteção. Sou sua prateleira de água benta. Não existe tchau sem o sinal da cruz e a reverência à maternidade.
Eu disse que minha mãe vai encolhendo, mas sua generosidade só vem alargando. Preocupa-se como o filho escritor se vira. Telefona nas manhãs, com a voz calma de feriado em dias úteis. Entrega semanalmente sorvete de pistache em meu apartamento, o nosso contrabando de doce.
Os pais diminuem de tamanho, arqueiam as costas, para serem os nossos bebês.
Eu já posso dar colo para a mãe, ela já cabe em meu peito, ela já entra no berço dos braços, ela já pode morar em meu ventre, ela não tem idade porque se misturou à minha vida.
Tão pequenina, tão amada. Seu corpo se apequena porque a alma não para de crescer.
É uma criança sábia, anda em linha reta pela calçada, devagar, nunca se desviando da rota traçada, um passarinho que poderia voar e não usa as asas para não esnobar os humanos, um passarinho no fio elétrico invisível de Deus.
Minha mãezinha, mãezinha mesmo. O diminutivo é imensidão.
Quando eu me separei aos 30 anos e voltei para a residência materna, não me senti derrotado, não me senti fracassado, não me senti humilhado. Eu me veria assim se não tivesse sua retaguarda. Sair de casa não é sair da família.
Foi um período que finalmente pude aproveitá-la desprovido do ranço adolescente. Experimentei uma sortuda repescagem daquelas tardes trancado no quarto.
Antes, jovem cabeludo e rebelde, eu apenas discutia, brigava e me interessava em sumir de perto. Naquele tempo de luto do amor, uma vez adulto, fazia questão de escutar suas teorias sobre poesia e desfrutava do silêncio da cumplicidade para cicatrizar as feridas e as palavras. Tomávamos chimarrão e brincávamos de recitar versos um para o outro.
— Alguns são autores, mas todas as pessoas são poetas — esclarecia ela.
O entardecer e o amanhecer têm hoje os cabelos brancos da minha mãezinha.
Derrota é perder quem amamos antes do fim, pelo fracasso de nossa comunicação. O resto é agradecimento.
Pagamos caro por objetos retrô. Não economizamos para ter uma geladeira Steigleder branca igualzinha à que existia na casa da avó. Ou um aparelho três em um idêntico ao que reinava na estante da sala. Somos colecionadores de nossos hábitos.
E aceitamos até os defeitos de volta. Queremos uma geladeira barulhenta como a de outrora, onde secávamos as meias nas grades traseiras durante o inverno. E queremos um vinil que traga ruídos de cigarras e que pare em algumas canções mesmo.
Nossa vontade é pelo retorno da afetividade das coisas, somos capazes de girar o mundo à cata de relíquias, somos capazes de imersão digital em sites de busca, somos capazes de lances absurdos e irreais no pregão da infância. Não nos assustamos com os valores abusivos e agimos com ansiedade pelos negócios fechados e pelo martelo das