O ator impuro: Quatro ensaios breves sobre teatro
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Neste livro, o autor reflete sobre algumas das questões mais urgentes para as artes cênicas no país, como a ascensão da censura, capacidade e possibilidades de difusão das artes em cidades periféricas, novas configurações e interesses das plateias contemporâneas, bem como uma reflexão sobre criatividade e limitações técnicas na formação de atrizes e atores.
O ensaio que dá nome à coletânea, O ator impuro, foi o vencedor, em 2015, do Prêmio Iberoamericano de Ensaios sobre Teatro, promovido pelo CELCIT - Centro Latinoamericano de Creación e Investigación Teatral, uma das mais representativas instituições de formação e difusão das artes cênicas na América Latina.
A edição conta também com o prefácio da crítica e pesquisadora teatral Beth Néspoli, que salienta que a "escrita fluente e um autor que não se exime de confrontar, com honestidade intelectual, as questões de seu tempo" constituem algumas das razões para a repercussão dos textos.
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Book preview
O ator impuro - Afonso Nilson
impuro
PREFÁCIO
Beth Néspoli
Meu primeiro contato com Afonso Nilson se deu por meio da leitura de seus textos. O ano era 2015 e ambos escrevíamos para o site Teatrojornal - Leituras de Cena, onde alguns dos ensaios que compõem este livro foram publicados. Éramos, à época, mais de uma dezena de colaboradores, de diversos pontos do país, iguais no comprometimento com a análise da arte teatral e saudavelmente diferentes nos modos de abordar as criações artísticas em foco.
Amplitude de perspectiva era então, e ainda é, um dos traços distintivos da escrita de Afonso Nilson. Parafraseando um conselho do cineasta Alberto Cavalcanti aos documentaristas, e invertendo os polos, é possível dizer que ele se debruça sobre cartas, mas o foco de seu interesse invariavelmente se estende para o funcionamento dos Correios. Tal opção, pelo mais complexo, exige poder de síntese e clareza na expressão do pensamento, quesitos fundamentais para propiciar fluência ao ato de leitura. Atributos esses não apenas presentes em seus textos como também diretamente articulados a outro aspecto peculiar de seu estilo que é o de lançar indagações ao leitor.
Desde o título do ensaio de abertura – O que quer o público do teatro? –, as interrogações contribuem para a fruição quase lúdica das investigações desse observador rigoroso da cena brasileira. São alicerces de sua escrita, como o leitor constatará. Muitas delas são perguntas retóricas, assim chamadas porque formuladas não exatamente para obter resposta, mas para provocar a reflexão, instrumento para o exercício dialético.
Até que ponto as artes cênicas ainda são uma necessidade na vida das pessoas
é a primeira delas, já no parágrafo inicial. Demonstrando expertise no uso do recurso escolhido, ele não se precipita a buscar possíveis respostas e, ao contrário, inicia por reforçar a defesa do sentido de superação implícito no questionamento. Para tanto, traz para o diálogo argumentos que podem ser considerados lugares-comuns como a concorrência do cinema, uma arte igualmente capaz de trabalhar com imaginação poética e tocar a sensibilidade, e ainda o conforto propiciado pela novas tecnologias que permitem o contato com um vasto campo artístico sem que o receptor tenha ao menos de sair de casa.
Fosse só um ardil para desconstruir o pensamento de senso comum, o que efetivamente se dá, seria um artigo de interesse limitado. Porém, outro patamar é atingido quando, no extremo oposto, ideias caras às artes cênicas são igualmente postas em dúvida, como na inquirição sobre se a presença viva do artista em cena é ainda um espetáculo atraente ao público. Voltando à analogia dos Correios, a atenção por ele dada às cartas é o fator diferencial, pois o ponto de verticalização do argumento está no estudo das criações cênicas e terá como chave a relevante alteração do papel do espectador na cena contemporânea.
Afonso encerra a investigação conjecturando sobre a possibilidade das novas tecnologias da informação exercerem um papel de aliadas das artes teatrais, pelo espaço aberto ao diálogo direto entre criadores e público. Como seria de se esperar, o tema das redes sociais será explorado em diferentes facetas e ganhará centralidade no ensaio Quem tem medo de teatro?, o segundo do volume. Nele, o uso dos canais de internet como ferramenta de interferência no espaço público é analisado em seu aspecto mais sombrio – a ação de censura.
Desta vez, a potência crítica está no silêncio interno provocado por interpelações difíceis de responder, como as que remetem à possibilidade de debater com pretensos avaliadores que nem chegaram a ver as obras por eles recusadas e, para agravar, têm restrita experiência de fruição artística. Mais uma vez as cartas não são negligenciadas e, assim, a abordagem se dá por meio de fatos recentes envolvendo a interrupção de temporadas que vão desde uma peça juvenil que seria apresentada em escola no interior do