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Trabalho, partido e mercado na crise neoliberal: Novo projeto social-democrata
Trabalho, partido e mercado na crise neoliberal: Novo projeto social-democrata
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Trabalho, partido e mercado na crise neoliberal: Novo projeto social-democrata

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Este livro reúne textos, reflexões e trabalho aplicado sobre a crise neoliberal, o novo projeto social-democrata, o papel do mercado e as novas
faces do trabalho nesse contexto. Por isso se relaciona com esse sentido de crença no jogo e de se estar envolvido nele. Para que, afinal, pensamos, refletimos, buscamos lentes teóricas, empreendemos interpretar e antever um mundo em processo de desmanche, em flerte com a barbárie? Com textos de Jorge Branco, Marcelo Danéris, Rogerio Viola Coelho e Tarso Genro, oferecem uma trajetória histórica da regressão que sofremos, provocam com a ideia de novos paradigmas e um velho dilema que desafia a esquerda e coloca em perspectiva a social-democracia atual e a originária do socialismo.
LanguagePortuguês
Release dateAug 18, 2021
ISBN9788593813467
Trabalho, partido e mercado na crise neoliberal: Novo projeto social-democrata

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    Trabalho, partido e mercado na crise neoliberal - Jorge Branco

    capa_ebook.pngrostoficha catalográfica e créditos

    Sumário

    Apresentação

    por Sandra Bitencourt

    A grande regressão:

    introdução para argumentos pós-neoliberais

    Jorge Branco

    Ainda a democracia:

    a esquerda diante de novos paradigmas

    e um velho dilema

    Marcelo Danéris

    A ofensiva estratégica

    do partido orgânico do mercado e a resistência do

    partido emancipatório da sociedade

    Rogerio Viola Coelho

    A social-democracia atual

    e a originária no debate socialista

    Tarso Genro

    APÊNDICES

    Apêndice 1

    Primeira Renda

    Programa de promoção do direito fundamental ao trabalho digno

    Marcelo Danéris, Rogerio Coelho, Tarso Genro

    Apêndice 2

    Segunda Renda

    Marcelo Danéris, Rogerio Coelho, Tarso Genro

    Apêndice 3

    A ideologia social-democrata

    e as novas bases tecnológicas na dominação do trabalho

    Tarso Genro

    Sobre os autores

    Apresentação

    A illusio, no sentido proposto por Pierre Bourdieu, é uma noção configurada como motivação inerente a todo agente de um determinado campo. É uma crença na importância intrínseca daquilo que estamos fazendo. Por definição, illusio é admitir que o jogo merece ser jogado e que os alvos engendrados no e pelo fato de jogar merecem ser perseguidos. É assim, reconhecer o jogo e o alvo.

    Este livro reúne textos, reflexões e estudos aplicados sobre a crise neoliberal, o novo projeto social-democrata, o papel do mercado e as novas faces do trabalho nesse contexto. Por isso, se relaciona com esse sentido de crença no jogo e de se estar envolvido nele. Para que, afinal, pensamos, refletimos, buscamos lentes teóricas, aprendemos a interpretar e antever um mundo em processo de desmanche, em flerte com a barbárie?

    Investir e atuar nessas disputas travadas em torno de capitais e recursos simbólicos são elementos fundamentais. Reafirmar nossa existência significa ter em comum sistemas de princípios, de disposições, de expectativas, de esperanças, de classificação e de avaliação. Nestes textos reunidos, são vários os objetos investigados e apreendidos, mas uma única disposição e um mesmo norte: prosseguir na luta e colaborar para construir as possibilidades de igualdade, equidade e humanismo.

    As ideias em jogo interagem entre si e alinham propostas para uma abordagem sempre em movimento:

    Jorge Branco oferece uma trajetória histórica da regressão que sofremos, mostrando que a profunda crise global de acumulação de capital vivida neste século XXI foi fermentada na década de 80 do século passado, e se soma a uma crescente hegemonia política neoliberal, criando as condições para essa ofensiva de valores, premissas e atores reacionários em vários países pelo globo.

    Marcelo Danéris provoca com a ideia de novos paradigmas e um velho dilema que desafia a esquerda. O velho dilema em questão é a atualidade de seus próprios pressupostos teóricos frente à realidade, em que o neoconservadorismo associado ao rentismo, poderá sucumbir diante de uma revolta ainda indeterminada ou subsistir pelo medo e o desespero.

    O olhar de Tarso Genro coloca em perspectiva a social-democracia atual e a originária do socialismo. O autor pontua que o surgimento de novas classes trabalhadoras e de novas formas de aquisição pelo capital — da força de trabalho e das novas tecnologias — acabou por impulsionar uma tendência não convergente ao previsto pelo Manifesto Comunista, sem a concentração do proletariado em grandes fábricas, dispersado vertical e horizontalmente, reduzindo o seu potencial de confronto contra o sistema do capital.

    A narrativa de Karl Polanyi — sobre a evolução da sociedade moderna a partir do surgimento da economia de mercado — é o caminho escolhido por Rogerio Coelho para mostrar a ofensiva estratégica do partido orgânico do mercado e a resistência do partido emancipatório da sociedade. Polanyi rejeita a ideia de que o processo social seja determinado pela ação política da sociedade dividida em classes, movidas estritamente por seus interesses objetivos, buscando apoio de indivíduos ou grupos próximos que assumam os seus interesses como gerais. Ele considera que no protagonismo político das instituições, dos grupos e das pessoas individualmente, a influência da cultura e das crenças que habitam o imaginário social supera com frequência interesses de classes ou frações da classe em que eles se inserem.

    Este livro é composto ainda por materiais organizados em um apêndice, com dois programas — Primeira Renda e Segunda Renda — resultantes de duas pesquisas realizadas entre os anos de 2017 e 2021, contratadas pelo escritório Coelho, Schneider, Pereira, Monteiro e Advogados Associados (CSPM), e o Instituto Novos Paradigmas (INP), direcionadas ao direito ao trabalho, à geração de emprego e à garantia de renda mínima às trabalhadoras e aos trabalhadores — formais ou informais, ocupados ou subocupados.

    Compõe, ainda, esse apêndice o texto A ideologia social democrata e as novas bases tecnológicas na dominação do trabalho, complementando a reflexão proposta por Tarso Genro.

    Tudo converge, nesse período histórico, para um conflito radical entre civilização (democracia e república) e barbárie (fascismo e ditadura). Estes textos têm a pretensão de contribuir com as ideias jurídicas e políticas que defendem a hipótese civilizatória, pois — para que as regras do jogo bloqueiem a barbárie identificada com o fascismo — elas não podem estar disponíveis às violações do mito, cuja voz necrófila criminaliza a razão e a inteligência.

    Sandra Bitencourt

    A grande regressão:

    introdução para argumentos pós neoliberais

    Jorge Branco

    A crescente rejeição às democracias liberais, a destruição sistemática das políticas protetivas do Estado social, a expansão da ideologia tradicionalista e do conservadorismo, a emergência do reacionarismo e a progressiva alforria dos valores e premissas autoritárias levaram autores como Heinrich Geiselberger (2019) a se referir a tal processo de redução de direitos e corrosão da democracia como a grande regressão. Uma volta atrás, uma reação da direita e do capitalismo no difícil, tortuoso e dialético caminhar da civilização em busca da igualdade e da liberdade.

    Essa volta atrás toma dimensão conceitual no sentido de que falamos de uma desconstituição, e da intenção de desconstituir, de um conjunto muito forte de valores e premissas que se tornaram norma por força da dinâmica das lutas sociais, da luta ideológica, da alternância dos ciclos de expansão do capitalismo e do confronto entre sistemas econômicos concorrentes. Essa grande regressão global se relaciona com os ciclos sucessivos de crise de acumulação e com as respostas — econômicas e políticas — apresentadas pelas classes dominantes e pelas classes dominadas.

    A profunda crise global de acumulação de capital vivida neste século XXI — fermentada, contudo, desde a década de 80 do século XX — e a crescente hegemonia política neoliberal formaram as condições para essa ofensiva de valores, premissas e atores reacionários em vários países pelo globo, como Indonésia, Polônia, Israel, Ucrânia, Índia e, particularmente, no Brasil. Em alguns casos, como a Bolívia, o reacionarismo foi derrotado por uma rápida reação das forças progressistas e pelos movimento sociais. Em outros, contudo, consolidou-se, tornando esses países em centros difusores da regressão civilizatória, a exemplo de Hungria e Turquia. Em todos, entretanto, a base que estrutura essa hegemonia política é a implantação de medidas de destruição do Estado social, baseadas na regressão conservadora e na objetivação da democracia e da esquerda como responsáveis por essa grande crise e inimigos a serem eliminados.

    No Brasil, esse processo regressivo se aguçou e demonstrou em toda sua capacidade destrutiva a partir da década de 2010. Entre estarrecidos e acuados, o campo progressista e a esquerda vivenciaram um processo de expansão política do reacionarismo e da grande onda de desconstituição no que diz respeito às difíceis conquistas de direitos fundamentais e de alguma dimensão de um Estado social conquistados no país. Essa expansão se deu por meio de um movimento político verdadeiramente de direita frentista, liderado por setores reacionários e aglutinando toda a direita brasileira. Ao invés de uma frente de esquerda, emergiu uma frente de direita, reunindo neofascistas, fundamentalistas religiosos, negacionistas, moralistas e conservadores tradicionalistas, aristocratas, além de uma pequena e lúmpen burguesia em uma forte convergência com o pensamento e com as frações de classe dirigentes do campo político neoliberal. Esta frente reacionária se unificou em torno dos postulados conservadores, autoritários e neoliberais, marcados pela austeridade, proteção ao lucro e à propriedade, militarismo, punitivismo e inflexibilidade penal e policial; anticomunismo e antipetismo; alinhamento internacional com os países líderes desse bloco, como Estados Unidos e Israel; adesão ao cristianismo conservador e aos valores morais da família tradicional, combate à uma suposta ideologia de gênero; nacionalismo de direita; uma forte rejeição ao iluminismo, ao conhecimento e ao racionalismo científico, ao liberalismo político e à modernidade, portanto e paradoxalmente, às próprias premissas da democracia representativa.

    A força dessa emergência reacionária aglutinou, também, aquela direita que, por razões de seus vínculos com a grande burguesia interna, nos termos de Nicos Poulantzas (1977), se mantinha no campo dos acordos desenvolvimentistas com a esquerda e com a classe trabalhadora. Acordos os quais ensejaram, não sem revezes e contradições, as experiências desenvolvimentistas, social-democratas e protetivas do que houve e há de Estado social no Brasil. Essa direita migrou rapidamente para o interior desse emergente campo reacionário.

    Essa expansão reacionária criou as condições para a formação de um novo bloco no poder no Brasil, materializado a partir do golpe político do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016. A operação golpista serviu como organizadora dos postulados que deram base a essa coalizão reacionária e ao bloco no poder estabelecido desde o Governo Temer e mantido no Governo Bolsonaro. Foi esse golpe que permitiu a essa frente reacionária chegar ao governo, quando se transforma em um bloco no poder sob hegemonia e direção da fração rentista da burguesia a partir do alinhamento com as premissas do neoliberalismo e da efetiva priorização das políticas de desregulamentação do trabalho, das reformas do sistema de proteção social, privatizações e concessões de empresas e serviços estatais, controle do déficit orçamentário, maior associação comercial à política dos Estados Unidos, autonomia do Banco Central e liberalidade normativa ao fluxo de capitais.

    O programa desse bloco no poder se caracteriza pelo que Nancy Fraser (2018) chama de neoliberalismo ultrarreacionário. Tal bloco mostrou capacidade de reorganizar as várias frações da burguesia por meio do aprofundamento das políticas rentistas e atrai algumas parcelas dos trabalhadores através de elementos e ideias anti-iluministas conservadores no que diz respeito aos costumes, fundamentalismo religioso e autoritarismo.

    As condições para a emergência de uma direita reacionária com capacidade de influência política foram maturadas durante décadas, no mínimo, em um processo histórico complexo. Contudo, no Brasil é no início da década de 2010 que a direita reacionária se torna relevante e torna-se viável politicamente, encontrando uma consonância maior de seus postulados e interpretações com o senso comum, com os sentimentos em relação ao quadro político e econômico, mais disposto neste período a aceitar explicações e racionalizações políticas e culturais reacionárias.

    A crise política que levou ao impeachment da presidenta tt em agosto de 2016 e à ascensão do reacionarismo; no entanto, não foram raios do céu azul. Se optamos por utilizar metáforas ou hipérboles, é mais perto da realidade utilizarmos a imagem de uma erupção vulcânica, em que o evento cataclísmico, aparente e desnudado, é resultado de um longo processo de acumulação e desenvolvimento das condições necessárias, até que essas se tornem suficientes para a eclosão do fenômeno.

    A erupção se deu. Os acontecimentos políticos e jurídicos, em uma distinção quase impossível de ser feita, ocorridos entre 2011 e 2018, apontam para um processo de emergência política da direita reacionária em aliança com a direita conservadora. As ações dos setores vinculadas ao grande capital rentista internacional que provocaram a forte crise econômica de 2011 e 2012, a reação à política de favorecimento ao setor produtivo, hegemônica nos governos lulistas; a crise mundial da imigração, os conflitos e manifestações de junho de 2013, os protestos durante a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, a renhida disputa eleitoral de 2014, o questionamento sobre a legitimidade da posse de Dilma Rousseff, a forte crise recessiva de 2015, a assunção ao governo de uma frente ampla de direita com o impeachment em 2016, a tensão criada pelas revelações das investigações da Operação Lava Jato em 2017 e — decisivamente para o desdobramento político do período — a condenação judicial de Luiz Inácio Lula da Silva, com a derivada impugnação de sua candidatura a presidente, e a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, transformaram esta década em uma das mais inquietantes da história do Brasil.

    Essa emergência da direita reacionária brasileira modificou o conteúdo doutrinário do que se caracteriza ser de direita. A direita tradicional, de valores autoritários e conservadores, porém vinculada à tradição desenvolvimentista ou liberal, perdeu protagonismo político e viu crescer uma direita mais radicalizada, igualmente autoritária e conservadora, mas que abdica dos conceitos mais nacionalistas e estatistas para se afiliar decididamente às razões do neoliberalismo e fundi-las com alguns dos pressupostos mais clássicos do fascismo, como a luta cultural, a criminalização do adversário e o anti-igualitarismo (CODATO; BOLOGNESI; ROEDER, 2015).

    A partir da transição do regime autoritário para o regime democrático liberal, desde 1985, o pensamento neoliberal passou por um processo de reorganização com base no ativismo de uma aliança entre empresários e intelectuais que começaram a organizar o pensamento neoliberal e outras variantes liberais a partir de organizações não governamentais de difusão de pensamento, favoráveis à economia de mercado em superação ao pensamento que seria conservador e estatista. Simultaneamente, enquanto as organizações populares se ampliavam e o pluripartidarismo se estabelecia e, com ele, os partidos de esquerda nasciam ou se institucionalizavam, o pensamento de caráter neoliberal ganhou espaço e dinamismo para estabelecer um processo de convencimento da população sobre a supremacia dos modelos neoliberais de sociedade, de economia e de governo, em um processo de reconfiguração de sua hegemonia política e cultural (CASIMIRO, 2018).

    Durante grande parte desse período, a ideia de ser conservador, de direita ou defensor do autoritarismo estava contida, cerceada por certa supremacia de valores democráticos, tanto à esquerda quanto à direita. Contida e cerceada, porém não superada. Já neste século XXI, esse quadro se modificou. Foi exatamente durante o auge do período lulista, defrontada com certa vantagem política

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