General Arquimedes
By Marcelo Reis
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Em meados dos anos 80, quando o Brasil estava prestes a encerrar o ciclo do regime militar e entrar em seu processo de redemocratização, um general, cheio de contradições e dilemas de ordem social e psicológica, não aceita esta nova condição e inicia uma verdadeira cruzada pela perpetuação da ditadura.
Uma guerra pelo sistema ou anti-sistema?
Quem realmente controla o poder?
Somos senhores das nossas vidas ou vivemos manipulados em um mundo de ilusões?
Estas e outras questões aparecem neste conto, onde teorias secretas e fatos históricos se misturam à ficção.
Um olhar sobre a nossa história e nossos valores controversos.
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Book preview
General Arquimedes - Marcelo Reis
PARTE I
Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 1984.
Amaury Arquimedes Teixeira, general do Exército Brasileiro altamente condecorado, chegava na porta do seu prédio: o edifício Vira Morro
, na rua Sá Ferreira, em Copacabana. Um Opala Diplomata de chapa branca conduzido pelo seu chofer - o soldado Jacob Marques – o deixava em casa.
Bateu a porta traseira do veículo com força e não se despediu do motorista. Entrou no prédio pelos fundos sem responder ao porteiro, que lhe deu um boa tarde
.
Abriu a porta da frente do apartamento 601, caminhou pelo amplo corredor de entrada e foi direto à sala de estar. Jogou sua pasta de trabalho e o terno em cima de uma das poltronas, tirou os sapatos impecavelmente engraxados e se atirou no grande e confortável sofá vermelho. Gritou:
- Maria Pia! Estou em casa! Hein?
A esposa apareceu na sala.
- Chegou cedo hoje! – disse ela.
- Tá! Tá! Faz uma coisa de útil pra mim! Chama essa neguinha nova, lá na cozinha! Esqueci a porra do nome dela! Pede pra pegar a minha garrafa de Buchanan’s
, um copo e um balde com gelo.
Maria Pia, sem dizer uma palavra, foi até a cozinha. Repassou o pedido à empregada Lurdes e voltou à sala de estar. Sentou-se em um sofá amarelo que ficava em frente à uma mesa de centro com tampo de mármore, repleta de pequenos objetos. Falou ao general:
- O que está acontecendo?
- Nada, Maria Pia! Nada! Só quero relaxar um pouco! – respondeu o homem.
- Eu te conheço, Amaury! Tem alguma coisa te importunando! – insistiu a esposa.
- Merdas do trabalho! Você sabe!
- O que houve desta vez? Não vai me dizer que aconteceu outra trapalhada com uma bomba? – disse referindo-se ao episódio ocorrido há alguns anos no Riocentro.
- Não! Isso aí já foi! O Golbery se fodeu e pronto! Esquece esta história!
- Então do que se trata?
- Os putos do Comando Delta. Me tiraram de lá! Acham que eu tô mão de ferro
demais, que fiquei antiquado. Querem me passar pra reserva e o pior...
- O quê?
- Querem continuar com esta bosta de abertura. Falam agora em regime democrático. Maria: eles vão entregar o país pros civis.
- Não acredito! Isso vai acontecer mesmo? – perguntou, estupefata, a mulher.
- Pode acreditar! É o que querem. Imagine! Me passar pra reserva, me afastar do Comando depois de tudo que fiz pelo Brasil. Entregar a nossa pátria na mão desta escória comunista! O que vai ser dos cidadãos de bem? Me diga!
- Pois é. Esta nação te deve muito, Amaury!
- Eu não vou deixar isso barato! Não vou mesmo! Quer saber?
Enquanto o general fazia a pergunta, a jovem empregada Lurdes adentrou a sala trazendo em uma bandeja a garrafa de whisky, o balde de gelo e um copo.
Maria Pia disse:
- Quero sim. O que você vai fazer?
- Eu vou acabar com esta putaria! Se precisar eu explodo Copacabana, explodo o Rio de Janeiro, o Brasil, mas democracia é o caralho! Democracia é o caralho! – berrou ao ponto de ficar com o rosto vermelho.
Assustada, Lurdes começou a tremer e deixou a bandeja cair, espatifando a garrafa, o copo e espalhando gelo por todo o chão.
__________________________###__________________________
Arquimedes estava sentado na cabeceira da mesa de jantar e Maria Pia ao seu lado direito. Lurdes trouxe a sopeira e uma cesta com pães cortados. O caldo verde fumegava e o cheiro da linguiça e do toucinho abria o apetite do general, que se dirigiu à empregada:
- Vê se não vai derrubar nada desta vez, menina. Hein?
- Não, senhor! Pode deixar que vou tomar bastante cuidado – respondeu Lurdes, com certo temor na voz.
Quando iniciaram a refeição o interfone tocou.
- Dona Maria! Dona Maria! – chamou Lurdes.
- Calma, menina! Já vou!
Maria se levantou da mesa, foi até a cozinha e voltou com uma cara assustada.
- O que foi, mulher? Anda! Desembucha logo! – disse sem paciência, Arquimedes.
- Era o Seu Augusto do 902.
- Tá! O que ele quer na hora da porcaria do meu jantar?
- Tá assustado! Tem um pessoal lá no décimo andar fazendo uma balbúrdia! Ele sentiu um cheiro! Amaury: são maconheiros!
- O que você disse?
- Maconheiros! Foi o que eu disse! Tão cheirando, fumando... Sei lá! Ai, eu tenho medo dessa gente!
O general largou a colher no prato e falou para a esposa:
- Interfona pro Mateus. Manda ele me encontrar na escada de serviço, que eu vou lá no décimo andar. Nenhum cretino comunista vai bagunçar o prédio que eu sou síndico e incomodar os meus bons vizinhos! O que está acontecendo? Esse pessoal perdeu o juízo e o respeito?
Ele levantou da mesa, andou até o quarto do casal, abriu seu armário e pegou um coldre e sua arma. Verificou se a mesma estava carregada e colocou-a na cintura.
Em seguida abriu uma gaveta e tirou um 38
. Pegou as balas, carregou o tambor e trouxe o