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Virtú: Conjuntura, Contos e Conjecturas
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Virtú: Conjuntura, Contos e Conjecturas

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O contexto religioso na atual sociedade neoliberal dá-se num processo de profundas transformações, que se convencionou chamar de crise. Mediante tal situação, propomos uma análise dos movimentos que, na ânsia por salvação, buscam qualquer referencial ético-religioso, seja através de uma fé estilo ‘self-service’ ou mesmo a partir do resgate do conservadorismo que pode, por sua vez, engessar a espiritualidade. Em virtude disso, constata-se que o cristianismo se viu acusado de ser o causador, a longo prazo, dessa crise, visto que, para alguns estudiosos, fora ele o maior responsável pela racionalização da fé. Segue-se, então, a pergunta: como se deu tal processo? Através de um sério estudo fenomenológico, será apresentada resposta para tal questão, apontando os novos rumos do cristianismo, bem como contos que visam elucidar que a vida, em todos os seus aspectos, é o único valor realmente universal e inalienável e, por isso, tudo deve estar em equilíbrio constante para que o cosmos ou a natureza mantenha-se plena, livre e feliz.
LanguagePortuguês
PublisherPragma Livros
Release dateDec 18, 2022
ISBN9781798102411
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    Book preview

    Virtú - Leandro Leandro Alves Soares

    Apresentação

    Há pouco tempo estava assistindo ‘O Livro de Eli’ com meus alunos e ocorreu-me que, assim como no filme, algumas religiões, de forma análoga, têm, embora o discurso veementemente contrário, contribuído para a disseminação do preconceito e da intolerância. Obviamente, o problema não são as religiões em si, visto serem seus respectivos fundadores homens e mulheres de bem, ditos iluminados, justos ou santos, como geralmente são chamados, e sim seus seguidores que, em sua maioria, se acham detentores da verdade e do bem maior, justificando, por isso, todas as suas atitudes cruéis.

    Tal fato nos tem feito refletir como, apesar da suposta evolução tecnológica e racional, o ser humano ainda permanece na idade da pedra no tocante a relação com seu próximo. A questão é, em que momento da história o gênero humano deixou a sua humanidade para trás? Quando se tornou religioso ou mais racional?

    Não se sabe ao certo se uma coisa ou outra, ou até mesmo as duas. O que se sabe é que, foi quando perdeu a noção do sagrado na vida é que começou a tratar o diferente como indesejado. A vida nasceu sagrada, ou seja, cheia de sentido; mas, num dado momento, o homem perdeu seu próprio sentido. O que será elucidado na primeira parte do presente trabalho, visando apontar algumas pistas para tais situações.

    Finalmente, a segunda parte deste trabalho, apresenta uma coletânea de textos que, por sua vez, visam contribuir para o aprofundamento ético de discentes, dando suporte aos docentes em suas respectivas aulas. Segundo esta parte, a vida, em todos os seus aspectos, é o único valor realmente universal e inalienável e, por isso, tudo deve estar em equilíbrio constante para que o cosmos ou a natureza mantenha-se plena, livre e feliz. Sua ética é globalizante, pois visa à realização plena das coisas, harmonia entre os opostos.

    Por fim vale dizer que, tais textos buscam provocar suas respectivas éticas a partir da experiência do Sagrado, que, embora se apresentando, inúmeras vezes, numa roupagem distinta e cultural, provoca um apelo à valorização da vida em todas as suas dimensões, a ponto de falarmos da mesma como ética Holística: a Virtú!

    Parte I: VIRTÚ - Conjuntura.

    "Todo ser humano é um valor em si e por si...¹" assim começa o texto da UNESCO, representando bem o pensamento contemporâneo, fruto de uma grande transformação valorativa que teve sua origem na modernidade de raiz antropocêntrica (ou melhor, eurocêntrica²!).

    Quando falamos de ‘valor’ tendemos a pensar a partir de uma realidade capitalista, nas noções de valores e normas que, por sua vez, retratam o utilitarismo, o imediatismo e o consumismo. Mas de fato, valor é tudo aquilo que retrata o ‘modus vivendi’ do ser humano, ou seja, o jeito de viver, pensar e agir do homem que, participando de toda e qualquer conduta, constrói valores morais a partir de sua vida, partilhada com o seu semelhante. É a isto que chamamos Ética³! No entanto, o mundo tem experimentado uma época de crise. Uma crise sobremaneira humana que se alastra por todos os setores da vida: político, econômico, social, ideológico e religioso. Vale ressaltar que esta crise sempre fez parte da experiência humana.

    Vive-se, atualmente, uma experiência religiosa diluída entre o subjetivismo e a ética utilitarista. O homem pós-moderno, embora não aceitando mais a proposta iluminista da irreligiosidade, perdeu seu referencial ético-existencial. Por sua vez, as instituições religiosas veem-se confusas diante de uma busca egoísta e desenfreada por uma salvação horizontalista e imediatista. Crescem, a cada dia, as ‘lojas de salvação’, com promessas de ‘mundos e fundos’ a todos aqueles e aquelas que podem pagar pela sua redenção. Nesse ínterim, surgem novos grupos religiosos que, temendo as mudanças que se sucedem, se fecham em seu conservadorismo e produzem um novo desafio para a ética religiosa, em especial, para a ética cristã.

    Como entender esse processo? O cristianismo foi, em parte, causador desse momento histórico? Ou foi mais um de seus herdeiros, e, portanto, vítima? O presente trabalho buscará apresentar vertentes para tais questões, bem como apontar para os novos caminhos empreendidos pelo cristianismo na atualidade.

    Neste intento, observaremos que, antes de falar das novas estruturas que foram se formando a partir do século XX, se faz necessário refletir sobre o problema da Ética Cristã no Contexto Neoliberal. Para tanto, abordaremos no primeiro capítulo Breves considerações sobre a Ética Cristã a importância histórico-filosófica da visão cristã para a nossa sociedade, analisando sua evolução histórica. Seguindo este percurso, destacaremos no segundo capitulo o estudo da Crise Moral e o Desencanto Antropológico, onde contemplaremos a mudança de valores em nossa sociedade e suas consequências para nossos dias.

    Diante destas duas perspectivas históricas e filosóficas sobre a ética, identificaremos a relação intrínseca entre o homem e o transcendente, e, por isso, no terceiro capitulo, sob o título A Contribuição da Ética Cristã na Pós-modernidade – Novos Acentos relacionar-se-á o homem com o universo do sagrado. No contexto da Fenomenologia da Religião, exporemos uma análise da teologia da prosperidade. E neste cenário antropológico, analisaremos, ainda, o influxo neopentecostal nos novos movimentos religiosos, tanto no meio evangélico, como dando maior ênfase ao meio católico.

    I - Aspectos Centrais Da Ética Cristã

    A Ética tenciona observar a conduta humana, com sua finalidade e diferentes motivações, seus valores e suas diferentes compreensões do bem, com suas respectivas consequências. Visto que propõe questões universais, como por exemplo: o que devo fazer? O que é o Bem? O que seria ser justo? Como devemos viver? Vale ainda ressaltar que a ética é uma arte, ou seja, uma expressão do pensamento, composta de conhecimento e ação. Segundo o professor Antonio Marchionni (2008), ela é a arte do bom. Em outras palavras, é a maneira de enxergar a vida a partir da dimensão do belo e do bom que, para Platão⁴, é como o sol, que faz germinar atos luminosos na vida privada e pública (Ibidem).

    Dessa forma a ética, enquanto resultante da convivência, é o caminho de formação do bom senso (que) está na coragem de viver as tribulações da vida (BUZZI, 2002), ou seja, é um comedimento prático (ibidem) que orienta e determina a atitude humana e que precisa de tempo e de ritmo (ibidem) para a construção de um bom convívio entre as pessoas. Tais valores éticos e morais variam de acordo com o ponto de vista histórico (adotado!) e dependem de determinadas circunstancias. Disto percebe-se que o que é considerado ético em um dado contexto não o é em outro. É o caso do concubinato e da poligamia, condenáveis em nossa cultura, mas aceitos em outras sociedades e instituições religiosas.

    Este capítulo tenciona apresentar os principais aspectos da ética cristã, bem como um panorama geral da ética em seu contexto histórico.

    1.1 - A Ética e sua Evolução Histórica

    Hoje em dia, tem-se certa dificuldade na compreensão da ética religiosa, em parte, devido à própria caracterização da atualidade em uma moral individualista, por um lado; e pela grande variedade de religiões que, por sua vez, apresentam códigos de conduta relacionados exclusivamente ao agir religioso⁵. Por conseguinte, existem tantas morais quanto são as religiões; visto que, cada religião possui um conjunto de regras e dogmas que, embora não visem exclusivamente à orientação moral de seus membros, termina por fazê-lo, pois a medida que o fiel se esforça por cumprir suas obrigações para com o sagrado⁶, estas desembocam na criação de regras e normas de conduta para uma melhor vivência comunitária. Tomam-se como exemplo, as religiões tidas por históricas.

    Começando pelo Oriente, percebe-se que o budismo⁷, fundado por Sidharta Gautama⁸, foi uma religião nascida da necessidade de dar respostas à diferença entre as castas hindus. As tradições budistas encaram a visão salvadora de Buda Gautama em sua primeira pregação, como resumida na doutrina, o Dharma, na seguinte fórmula: Tudo o que surge desaparece. Por isso a essência da doutrina consiste em eliminar o surgimento, mediante a supressão das condições que lhe dão origem. A segunda pregação diz respeito à realização do Nirvana⁹. O estado, isento de dor, espontâneo, em que são superados os desejos e a aversão, e, com isso, a contrariedade, o sofrimento da privação, a velhice, a doença e a morte.

    Por isso, a difusão do budismo se resume na seguinte expressão:

    Aquele que segue a Buda no espaço e no tempo, se dominado pela cobiça, pelo ódio e pelo desvairamento, de fato estará longe de Buda. Mas aquele que da cobiça, do ódio e do desvairamento estiver livre, este está perto de Buda, embora dele afastado no tempo e no espaço.

    Como testemunha o pensador oriental Vaswani que, em um de seus contos, através de uma personagem, dava a resposta a um rico que queria fazer, presunçosamente, sua oferta:

    Então não posso receber a sua oferenda – disse o dervixe – Porque um homem rico não deve receber de alguém mais pobre do que ele. Não estou entendendo – disse o homem rico. Mas o dervixe explicou: Muito embora eu nada tenha, nada desejo. Você tem fartura e mesmo assim deseja ainda mais. Seguramente, o homem que ainda deseja é mais pobre do que o homem que está satisfeito com aquilo que tem!" (1995: 42).

    No que se refere à moral chinesa, recordamo-nos primeiramente de Confúcio¹⁰, o grande estadista e idealizador de uma religião onde a moral seria a base para uma sociedade equilibrada e correta. A filosofia de Confúcio oferece-nos uma ética, uma política e uma arte de viver, de simples compreensão: amar os outros; honrar os nossos pais; fazer o que está certo, em vez de agir por interesse; respeitar a reciprocidade, isto é, ‘não faças aos outros aquilo que não queres para ti’; dirigir e comandar através do exemplo moral e não pela violência ou pela força. Desta forma, acredita-se que o pensamento de Confúcio seria uma alternativa (remédio), para a nossa sociedade, como resposta àqueles que procuram mais segurança, mais estabilidade, mais justiça e mais benevolência.

    Vale lembrar ainda que outra das personalidades chinesas mais importantes e intrigantes da história foi Lao Tse¹¹... visto que seu nome (que significava ‘Velho Mestre’) está totalmente ligado ao surgimento da filosofia de vida do taoísmo. Porquanto, a primeira coisa que enfatizara é a necessidade de ter em mente a unidade dos opostos. Essa unidade permitiria conhecer os processos pelos quais as oposições se anulam entre si. A solução proposta por Lao Tse era radical: o governante deve ter a capacidade de conduzir o processo de complementação dos contrários, a ponto de não permitir que eles se apresentem como contrários. E o ‘Wu Wei¹²’ era o princípio que o governante sábio deveria utilizar. Ou seja, dominar através do não agir apresenta-se como arte de viver, válida para todos. Eis o que nos afirma o próprio Lao Tse:

    ... não exaltes os homens eminentes. Para que não surja rivalidade entre o povo. Não exibas os tesouros raros, para que o povo não os ambicione. Não despertes as cobiças, para que as almas não sejam profanadas. O governo do sábio não desperta paixões, mas procura manter o povo na sobriedade, e dar-lhe as coisas necessárias. Não oferece erudição, mas dá-lhe cultura do coração. O sábio governa pelo não-agir. E tudo permanece em ordem (POEMA 3, p. 33).

    Portanto, compete aos homens deixar-se absorver nesse processo e permitir que o caminho da sua vida a ele se adapte. Aquele que se coloca sob a luz do Tao, confia na dinâmica da conversão, que implica o retorno a uma vida simples e descomplicada. Sua ética é globalizante, pois visa à realização plena

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