E o deserto vai florir e se alegrar: Leitura orante da palavra de Deus no tempo do advento e do natal
()
Sobre este e-book
O método que se utiliza aqui é o da "lectio divina", que outra coisa não é que o vagoroso trabalho de escavação cada vez mais aprofundada no terreno da Palavra de Deus, que se torna tanto mais brando quanto mais se adentra na terra. As diferentes etapas de aprofundamento na Palavra – leitura, meditação, oração e contemplação – são, com efeito, uma penetração cada vez mais íntima na "alma" de um texto bíblico, o que serve de espelho para a nossa própria alma. Penetrar na alma de um texto bíblico é sempre um penetrar na própria alma.
Leia mais títulos de Walterson José Vargas
Encarnação do Verbo: cume da criação: uma chave de leitura para entender o "Curso Fundamental da Fé", de Karl Rahner Nota: 0 de 5 estrelas0 notasAporias do conceito de vontade em Santo Agostinho Nota: 0 de 5 estrelas0 notas
Relacionado a E o deserto vai florir e se alegrar
Ebooks relacionados
Bíblia, palavra que transforma a vida dos catequistas Nota: 0 de 5 estrelas0 notasPresbíteros: Comunhão e Missão Nota: 0 de 5 estrelas0 notasCorações sedentos: Jesus: Fonte inesgotável de cura Nota: 0 de 5 estrelas0 notasEm busca de um caminho interior: Os diversos modos de se encontrar com Deus e consigo mesmo Nota: 0 de 5 estrelas0 notasA minha alma tem sede de Deus: Teologia da espiritualidade bíblica Nota: 0 de 5 estrelas0 notasOrar e meditar e com a vida: A mística contemplativa do cotidiano Nota: 0 de 5 estrelas0 notasSede misericordiosos como o Pai: Meditações da Palavra para o Jubileu da Misericórdia Nota: 0 de 5 estrelas0 notasSinodalidade e Pastoralidade: Olhares diversos Nota: 0 de 5 estrelas0 notasEspiritualidade Laical: a Santidade no cotidiano Nota: 0 de 5 estrelas0 notasDiálogo e Escuta II: Edição Atualizada Nota: 0 de 5 estrelas0 notasA Confissão: Sacramento da Misericórdia: Jubileu da Misericórdia - 2015 | 2016 Nota: 0 de 5 estrelas0 notasA paternidade de São José Nota: 0 de 5 estrelas0 notasPadre diocesano: a alegria de amar servindo e servir amando Nota: 0 de 5 estrelas0 notasAquela que acreditou: A vida oculta de Maria de Nazaré Nota: 0 de 5 estrelas0 notasO que é sacramento? - Ordem: Ungidos para ensinar, santificar e servir Nota: 0 de 5 estrelas0 notasEsperançar: A missão do agente da Pastoral da Comunicação Nota: 0 de 5 estrelas0 notasParóquia missionária: Projeto de evangelização e missão paroquial na cidade Nota: 0 de 5 estrelas0 notasComunidade unida faz a diferença: São Gabriel da Virgem Dolorosa Nota: 0 de 5 estrelas0 notasEspiritualidade da secretária e do secretário paroquial Nota: 0 de 5 estrelas0 notasUma Vocação de Louvor e Santidade Nota: 0 de 5 estrelas0 notasCinco minutos com Deus e Tiago Alberione Nota: 0 de 5 estrelas0 notasJorge Mario Bergoglio: As Raízes do Pensamento do Papa Francisco Nota: 0 de 5 estrelas0 notasCúria Diocesana: Gestão Organizacional Nota: 0 de 5 estrelas0 notasOs Papas e a Misericórdia: Jubileu da Misericórdia - 2015 | 2016 Nota: 0 de 5 estrelas0 notasFunções e Ministérios na Missa Nota: 0 de 5 estrelas0 notasLiturgia e Eclesiologia: Fragilidade e força da igreja que celebra Nota: 0 de 5 estrelas0 notasEle é o Senhor e dá a vida Nota: 0 de 5 estrelas0 notasA Eclesiologia do Povo de Deus da Lumen Gentium à Evangelii Gaudium: uma hermenêutica Latino-americana Nota: 0 de 5 estrelas0 notasPensamentos sobre Sacerdócio Nota: 0 de 5 estrelas0 notas
Avaliações de E o deserto vai florir e se alegrar
0 avaliação0 avaliação
Pré-visualização do livro
E o deserto vai florir e se alegrar - Walterson José Vargas
INTRODUÇÃO
Uma palavra é necessário ser dita, a modo de introdução, para que se possa entender as diferenças de tonalidade das meditações aqui apresentadas. Boa parte delas – as que estão situadas entre o fim do Tempo do Advento e a quase totalidade do Tempo do Natal – procede do silêncio do mosteiro trapista de Nossa Senhora do Novo Mundo, no sul do Brasil. São meditações mais livres, escritas sem nenhuma pretensão de serem um dia publicadas; não estão bem ordenadas nem sistematizadas. Guardam, no entanto, o frescor de uma alma que canta a alegria do encontro com o Cristo vivo. Uma outra parte – sobretudo as situadas na maior parte do Tempo do Advento ou espalhadas em dias isolados ao longo de toda a obra – procede da correria da vida numa casa de formação em Belo Horizonte. Essas já contavam com a imaginação de que as meditações da Trapa poderiam ter algum interesse para outras pessoas, e então, surgiram à luz com a pretensão de um dia serem publicadas. São meditações mais organizadas, sistematizadas, mas não têm aquela riqueza de uma alma que canta alegremente a profundidade do encontro com o Senhor.
Todas elas, no entanto, não são mais que comentários às belas palavras que procedem da boca de Deus
(cf. Mt 4,4). Não há quase nenhuma originalidade nelas, são apenas breves comentários. Certa vez, o professor que orientava os meus estudos sobre Santo Agostinho, Moacyr Novaes, me disse, a propósito da afirmação aceita com bastante unanimidade pelos estudiosos deste filósofo – a de que não há nele um pensamento sistemático – que não há em Agostinho uma doutrina, um sistema de pensamento, porque ele concebia o seu pensamento apenas como um comentário a uma doutrina já dada, a doutrina cristã. O pensamento cristão seria assim, segundo Agostinho, sempre uma explicação, uma elucidação, uma iluminação de algo que já está dado na Revelação. Não é por acaso, portanto, que boa parte de sua obra consiste em comentários a textos bíblicos, como, principalmente, ao livro do Gênesis, aos Evangelhos, especialmente o de João, e às Cartas de Paulo. Entender o pensamento cristão apenas como um comentário foi algo que me atraiu muito. Pensar como elucidar, como tornar lúcido, compreensível, algo que já está de alguma maneira dado, ainda que não tão claramente; pensar como iluminar, como projetar luz sobre uma realidade que está já aí, mas obscura; pensar como escavar, aprofundar numa terra já dada. Tudo isso me atraiu muito. Percebi que a meditação cristã dos textos bíblicos não é mais que isso: tudo já está ali, e, no entanto, precisa ser iluminado, esclarecido, aprofundado. Deter-se em uma palavra, e tentar explorar ao máximo o que ela pode significar; contemplar demoradamente uma cena, as palavras, os gestos, as atitudes, e tentar ir além do evidente, compreender pessoas e situações em maior profundidade e amplitude de horizontes.
A "lectio divina não é outra coisa que isso. Trata-se de um trabalho de escavação em um terreno que se torna cada vez mais brando quanto mais é aprofundado. As diferentes etapas de aprofundamento na Palavra – leitura, meditação, oração e contemplação – não são mais que penetração cada vez mais íntima na
alma de um texto bíblico, o que nos serve de espelho para a nossa própria alma. Penetrar na alma de um texto bíblico é sempre um penetrar na própria alma. É por esta razão que achei oportuno introduzir esta obra com uma palavra simples sobre a
Lectio Divina, reproduzindo o texto clássico do cartuxo Guigo II:
A escada dos monges".
É preciso esclarecer também que o exercício da Lectio divina que está por trás destas meditações se realizou num ano civil que correspondia ao Ano A do ciclo de leituras da Liturgia da Igreja. Infelizmente, portanto, nas leituras de domingo, são comentadas apenas as leituras correspondentes a este ano (excluindo as leituras dos Anos B e C). Para as leituras dominicais, utilizou-se bastante dos comentários bíblicos preparados pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), nas décadas de 1980 a 2010, como subsídio para os presbíteros e dirigentes do culto dominical; é fácil perceber as suas marcas nos comentários dominicais aqui apresentados.
Agradeço a todos os que me ajudaram, ainda que sem o saber, na escrita desta obra. Ao Pe. Bernardo Bonowitz, abade do Mosteiro Trapista de Nossa Senhora do Novo Mundo, e aos irmãos com os quais ali convivi no fim de 2001 e início de 2002. Ao Pe. Hilário, meu amigo, e aos formandos do Postulantado da Congregação dos Sagrados Corações, em Belo Horizonte, onde escrevi parte dessa obra, entre os anos 2009 e 2012. Aos meus amigos Franciscanos de Salvador, com quem vivi por dois anos, nos anos de 2015 e 2016, e partilhei o meu amor pela meditação e estudo da Palavra de Deus.
A ESCADA DOS MONGES
(«SCALA CLAUSTRALIUM»)
Guigo II¹
I
1 Guigo II foi o nono sucessor de São Bruno como prior do deserto da Grande Cartuxa, de 1.174 até 1.180. Faleceu em 1.188. Este texto foi traduzido por D. Timóteo A. Anastásio, O.S.B, antigo Abade do Mosteiro de São Bento, de Salvador – BA, e encontra-se no livro: "Lectio divina, ontem e hoje" - Edições Subiaco.
CARTA DE DOM GUlGO, CARTUXO, AO IR. GERVÁSIO, SOBRE A VIDA CONTEMPLATIVA
Ao seu dileto irmão Gervásio, o Ir. Guigo: o Senhor seja o seu deleite.
Amar-te, irmão, é para mim uma dívida, pois foste tu que, primeiro, começaste a me amar. E sou obrigado a te responder, porque, anterior, tua carta me convida a escrever-te.
Proponho-me, assim, a te transmitir certas coisas que pensei sobre o exercício espiritual dos monges, a fim de que possas julgar e corrigir meus pensamentos a propósito de um assunto que tu melhor conheces por experiência, do que eu pela reflexão.
É justo que eu te ofereça, em primeira mão, as primícias do meu trabalho. Pois convém que colhas os primeiros frutos da recente plantação que, em louvável furto, subtraíste à servidão do Faraó e à mole servidão, e colocaste no exército em ordem de batalha, enxertando sabiamente na oliveira o ramo habilmente cortado da oliveira selvagem (cf. Ex 13,14; Ct 6,3.9 e Rm 11,17.24).
II
OS QUATRO DEGRAUS
Um dia, ocupado no trabalho manual, comecei a pensar no exercício espiritual do homem. E eis que, de repente, enquanto refletia, se apresentaram a meu espírito quatro degraus espirituais: a leitura, a meditação, a oração, a contemplação.
Esta é a escada dos monges, que os eleva da terra ao céu. Embora dividida em poucos degraus, ela é de imenso e incrível comprimento, com a ponta inferior apoiada na terra, enquanto a superior penetra as nuvens e perscruta os segredos do céu (cf. Gn 28,12).
Estes degraus, assim como são diversos em nome e em número, também se distinguem pela ordem e o valor.
Se alguém examina diligentemente suas propriedades e funções, o que produz cada um deles para nós, e como diferem e se hierarquizam entre si, achará pequeno e fácil por sua utilidade e doçura todo o trabalho e esforço que lhes dedicar.
A leitura é o estudo assíduo das Escrituras, feito com aplicação do espírito.
A meditação é uma ação deliberada da mente, a investigar com a ajuda da própria razão o conhecimento duma verdade oculta.
A oração é uma religiosa aplicação do coração a Deus, para afastar os males ou obter o bem.
A contemplação é uma certa elevação da alma em Deus, suspensa acima dela mesma, e degustando as alegrias da eterna doçura.
Notada, assim, a descrição dos quatro degraus, resta-nos ver a função de cada um em relação a nós.
III
QUAL A FUNÇÃO DE CADA UM DOS CITADOS DEGRAUS
A leitura procura a doçura da vida bem-aventurada, a meditação a encontra, a oração a pede, a contemplação a experimenta.
A leitura, de certo modo, leva à boca o alimento sólido, a meditação o mastiga e tritura, a oração consegue o sabor, a contemplação é a própria doçura que regala e refaz.
A leitura está na casca, a meditação na substância, a oração na petição do desejo, a contemplação no gozo da doçura obtida. Para que se possa ver isto de modo mais expressivo, suponhamos um exemplo entre muitos.
IV
A FUNÇÃO DA LEITURA
À leitura, eu escuto: «bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus» (Mt 5,8).
Eis uma palavra curta, mas cheia de suaves sentidos para o repasto da alma. Ela oferece como que um cacho de uva. A alma, depois de o examinar com cuidado, diz em si mesma: pode haver aqui algum bem, voltarei ao meu coração e tentarei, se possível, entender e encontrar esta pureza. Pois é preciosa e desejável tal coisa, cujos possuidores são ditos bem-aventurados, e à qual se promete a visão de Deus, que é a vida eterna, e que é louvada por tantos testemunhos da Sagrada Escritura.
Desejosa de explicar mais plenamente a si mesma esta coisa, começa a mastigar e a triturar essa uva, e a põe no lagar, enquanto excita a razão a procurar o que é e como pode ser adquirida tão preciosa pureza.
V
A FUNÇÃO DA MEDITAÇÃO
Começa, então, diligente meditação. Ela não se detém no exterior, não pára na superfície, apóia o pé mais profundamente, penetra no interior, perscruta cada aspecto.
Considera, atenta, que não se disse: bem-aventurados os puros de corpo, mas, sim, os puros de coração. Pois não basta ter as mãos inocentes de más obras, se não estivermos, no espírito, purificados de pensamentos depravados. Isto o profeta confirma por sua autoridade, ao dizer: «quem subirá o monte do Senhor? Ou quem estará de pé no seu santuário? Aquele que for inocente nas mãos e de coração puro» (Sl 24,3-4).
Depois ela considera quanto o próprio profeta deseja essa pureza, ao orar: «cria em mim, Ó Deus, um coração puro» (Sl 51,12) e ainda: «se olhei a iniquidade no meu coração, o Senhor não me ouvirá» (Sl 66,18).
A meditação pensa em como era o bem-aventurado Jó solícito por essa guarda, pois dizia: «fiz um pacto com os meus olhos para não pensar em nenhuma virgem» (Jó 31,1). Eis como se dominava o santo homem, que fechava seus olhos para não ver o que é vão, evitando olhar imprudentemente o que depois desejaria contra a sua vontade.
Depois de ter refletido sobre esses pontos e outros semelhantes no que toca à pureza do coração, a meditação começa a pensar no prêmio:
Como seria glorioso e deleitável ver a face desejada do Senhor, mais bela do que a de todos os homens (cf. Sl 45,3), não mais abjeta e vil (cf. Is 53,2), não mais tendo a aparência com que o revestiu sua mãe, mas envergando a estola da imortalidade, e coroado com o diadema que seu Pai lhe deu no dia da ressurreição e da glória, o dia que o Senhor fez (cf. Sl 118,24).
Ela concebe que nesta visão haverá aquela saciedade esperada pelo profeta, ao dizer: «serei saciado quando aparecer a tua glória» (Sl 17,15).
Vês quanto licor emanou daquela pequena uva, quanto fogo nasceu duma centelha, quanto se alargou na bigorna da meditação, este pequeno pedaço de metal: «bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus!» (Mt 5,8).
Mas, quanto mais poderia alargar-se, se alguém experiente viesse ajudar!
Sinto como «é fundo o poço», mas não passo ainda de um noviço rude, que mal cheguei a tirar poucas gotas.
Inflamada por esses fachos, incitada por tais desejos, a alma começa a pressentir, quebrado o alabastro, a suavidade do ungüento. Não é ainda o gosto, mas