O Pequeno livro dos buracos negros: O que são, por que existem e sua importância para o futuro do universo
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Os buracos negros, previstos pela teoria geral da relatividade de Albert Einstein faz mais de um século, há muito intrigam os cientistas e o público com suas propriedades fantásticas. Embora Einstein entendesse que os buracos negros eram soluções matemáticas para suas equações, ele nunca aceitou sua realidade física; um ponto de vista que muitos compartilhavam.
Tudo isso mudou nas décadas de 1960 e 1970. Nessa época, estudos revelaram a existência de quasares e sistemas estelares binários de raios X, cujas particularidades misteriosas poderiam ser explicadas pela presença de buracos negros. Desde então, uma compreensão mais profunda sobre os buracos negros se desenvolveu. Eles têm sido objeto de intensa pesquisa; e a física que rege como eles afetam o ambiente é mais alucinante do que qualquer ficção.
Steven Gubser e Frans Pretorius usam experimentos mentais criativos para tornar acessível esse universo de conceitos. Eles levam os leitores ao misterioso cerne dos buracos negros, manifestações simples, porém destrutivas do destino geométrico.
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O Pequeno livro dos buracos negros - Steven Scott Gubser
Copyright © Steven Gubser,2017
Copyright © Frans Pretorius, 2017
Copyright © Editora Planeta do Brasil, 2022
Copyright da tradução © Rosaura Maria Cirne Lima Eichenberg
Todos os direitos reservados.
Título original: The Little Book of Black Hole
PREPARAÇÃO: Fernanda Guerriero Antunes
REVISÃO: Karina Barbosa Santos e Carla Sacrato
DIAGRAMAÇÃO: Nine Editorial
CAPA: Luciana Facchini
ADAPTAÇÃO PARA EBOOK: Hondana
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Angélica Ilacqua CRB-8/7057
Gubser, Steven S.
O pequeno livro dos buracos negros [livro eletrônico] / Steven S. Gubser, Frans Pretorius; tradução de Rosaura Maria Cirne Lima Eichenberg. – São Paulo: Planeta, 2021.
ePUB
ISBN 978-65-5535-592-5 (e-book)
Título original: The Little Book of Black Hole
1. Buracos negros (Astronomia) - Literatura
infantojuvenil I. Título II. Pretorius, Frans III.
Eichenberg, Rosaura Maria Cirne Lima
Índice para catálogo sistemático:
1. Buracos negros (Astronomia) - Literatura infantojuvenil
2022
Todos os direitos desta edição reservados à
Editora Planeta do Brasil Ltda.
Rua Bela Cintra, 986, 4o andar – Consolação
São Paulo – SP – 01415-002
www.planetadelivros.com.br
faleconosco@editoraplaneta.com.br
SUMÁRIO
PREFÁCIO
1 A relatividade especial
2 A relatividade geral
3 O buraco negro de Schwarzschild
4 Os buracos negros com rotação
5 Buracos negros no universo
6 Colisões de buracos negros
7 A termodinâmica dos buracos negros
EPÍLOGO
PREFÁCIO
Foi em 14 de setembro de 2015, quase exatamente cem anos depois que Albert Einstein formulou a teoria da relatividade geral. Dois detectores massivos, um em Louisiana e outro em Washington, estavam passando pelos preparativos finais para uma missão científica destinada a detectar ondas gravitacionais. Repentina e inesperadamente, a instrumentação dos detectores registrou um pio peculiar. Se tornássemos esse pio audível, ele soaria como um baque grave e tênue.
Cinco meses mais tarde, depois de um escrutínio cuidadoso dos dados registrados por esses detectores, o Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO) anunciou publicamente seus resultados. Aquele pio era exatamente a espécie de sinal que esperavam detectar. Era o eco distante de um par de buracos negros flagrados no ato de se fundirem para formar um único buraco negro maior. A comunidade da física ficou eletrizada. Era como se tivéssemos passado a vida inteira cegos para a cor vermelha e, no momento em que se dissipou o véu, vislumbrássemos uma rosa pela primeira vez.
E que rosa! As melhores estimativas do LIGO indicavam que o baque tênue registrado era o resultado da coalescência de dois buracos negros há mais de um bilhão de anos, cada um tendo aproximadamente 30 vezes a massa do Sol. Durante a colisão, a energia proveniente dos buracos negros, correspondente a cerca de três massas solares, foi vaporizada na radiação gravitacional.
Tanto os buracos negros como as ondas gravitacionais são consequências da teoria da relatividade geral de Einstein. A relatividade geral prediz o tipo de ondas gravitacionais que o detector do LIGO deve perceber no caso de uma colisão de buracos negros, e o pio registrado em 14 de setembro chegava maravilhosamente perto das expectativas. É não só uma confirmação de ideias teóricas há muito acalentadas; este primeiro evento de detecção também pressagia uma nova era da astronomia de onda gravitacional. Os detectores do LIGO viram um tipo de evento com que temos sonhado por décadas. Agora, queremos explorar todo um novo jardim de surpresas gravitacionais.
A ciência raramente envolve certezas matemáticas, por isso devemos perguntar: Até que ponto estamos seguros de que o LIGO interpretou corretamente que o pequeno pio é o eco distante de uma fusão de buracos negros ocorrida há um bilhão de anos?
. Em poucas palavras, a resposta é: Bastante seguros
. Tudo parece se encaixar. Nada mais parecia estar acontecendo por perto que explicasse o sinal. Este era forte o suficiente para se ver com os dispositivos atuais, mas fraco demais para ser observado pela tecnologia anterior. A hipótese de uma fusão de buracos negros há um bilhão de anos não entra em conflito com nossa compreensão geral da astrofísica e da cosmologia. O ponto-chave é que temos boas expectativas de ver mais eventos desse tipo. Na verdade, o LIGO anunciou um segundo evento confirmado que ocorreu no dia de Natal de 2015, e um terceiro em 4 de janeiro de 2017, os quais são comparáveis de maneira geral à primeira descoberta, e devem nos dar uma confiança significativamente maior de que o LIGO está, na verdade, observando fusões de buracos negros. No geral, acreditamos estar no amanhecer de uma nova era na astrofísica observacional – uma era em que os buracos negros vão desempenhar um papel fundamental.
Neste livro, descrevemos os buracos negros não só como objetos astrofísicos cuja existência já está quase fora de dúvida, mas também como laboratórios teóricos que nos permitem aprimorar a compreensão da gravidade bem como da mecânica quântica e da física térmica. As explicações da relatividade especial e relatividade geral montam o palco, nos capítulos 1 e 2. Depois, em capítulos subsequentes, passamos a discutir os buracos negros de Schwarzschild, os buracos negros em rotação, as colisões de buracos negros, a radiação gravitacional, a radiação Hawking e a perda de informação.
Bem, o que é exatamente um buraco negro? Essencialmente, é uma região do espaço-tempo para a qual a matéria é atraída e da qual é impossível escapar. Vamos focar a discussão nos buracos negros mais simples, conhecidos como buracos negros de Schwarzschild (em homenagem a seu descobridor, Karl Schwarzschild). Há um velho ditado: O que sobe tem de descer
. Dentro de um buraco negro de Schwarzschild, uma afirmação mais forte é verdadeira: Nada pode subir
; apenas descer
. No entanto, não sabemos ao certo para onde é que descer
acaba nos levando. A hipótese mais simples, dada a matemática por trás dos buracos negros de Schwarzschild, é que um miolo terrível e infinitamente comprimido de matéria se esconde no seu núcleo. Colidir com esse núcleo é o fim de tudo. É até o fim do tempo. A hipótese é difícil de testar porque nenhum observador que entra num buraco negro pode retransmitir o relato do que observa.
Antes de passarmos a explorar os buracos negros de Schwarzschild em detalhe, vamos primeiro dar um passo para trás e considerar a gravidade em algumas de suas formas mais amenas. Na superfície da Terra, se dermos a um objeto uma velocidade suficientemente grande para o alto, ele continuará a se mover nessa direção para sempre. A velocidade mínima para que isso seja verdade é a velocidade de escape. Sem levar em conta o atrito do ar, a velocidade de escape é de aproximadamente 11,2 quilômetros por segundo. Como comparação, é difícil que um humano atire uma bola com uma velocidade maior que 45 metros por segundo – abaixo de 0,5% da velocidade de escape. A velocidade inicial de um rifle de alta potência é de aproximadamente 1,2 quilômetro por segundo – um pouquinho mais que 10% da velocidade de escape. O que queremos dizer, portanto, com o ditado O que sobe tem de descer
é que a gravidade da Terra é forte comparada à intensidade da força com que podemos lançar objetos para cima usando meios comuns.
A engenharia dos foguetes é o meio moderno de vencer completamente a gravidade da Terra e enviar objetos ao espaço. Para escapar da gravidade da Terra, não é estritamente necessário que um foguete se mova com uma velocidade superior a 11,2 quilômetros por segundo (embora alguns foguetes o façam). O que pode acontecer é que um foguete viaje a uma velocidade mais lenta, mas tendo combustível suficiente para manter o impulso ascendente até chegar a altitudes em que o campo gravitacional da Terra é, de maneira significativa, mais fraco. A velocidade de escape dessas altitudes é correspondentemente menor. Em outras palavras, um foguete projetado para levar uma sonda espacial bem além do campo gravitacional da Terra deve estar se movendo acima da velocidade de escape no ponto em que o foguete para de disparar.
Agora poderíamos perguntar: E se a Terra fosse muito mais densa?
. A velocidade de escape da superfície seria maior, porque o campo gravitacional seria mais intenso. A forma estável mais densa da matéria comum no universo conhecido ocorre nas estrelas de nêutrons. Elas contêm aproximadamente 1,5 vez a massa do Sol numa esfera com um raio de apenas 12 quilômetros, embora esse raio não seja medido com muita precisão. A matéria comum é esmagada na superfície pelas tremendas forças gravitacionais, em torno de cem bilhões de vezes mais intensas que o campo gravitacional da Terra. Pressupondo-se um raio de 12 quilômetros, a velocidade de escape é de aproximadamente 60% da velocidade da luz.
FIGURA 0.1. Corte transversal de uma representação esquemática da geometria de um buraco negro. Bem fora do horizonte, o espaço-tempo é plano. Movendo-se em direção ao horizonte, ele se torna cada vez mais curvo, mas ainda é independente do tempo, ou estático. Ao cruzar o horizonte, entretanto, o espaço-tempo se torna dinâmico: à medida que o tempo flui, duas das dimensões espaciais (tendo a geometria de uma esfera) se comprimem, enquanto a terceira (não mostrada) se encomprida, até que todo o espaço é esticado e espremido numa singularidade infinitamente longa e fina.
Mas por que parar nesse ponto? Como um experimento mental, poderíamos imaginar uma compressão ainda maior das estrelas de nêutrons. Se comprimimos uma estrela de nêutrons a um raio de aproximadamente 4,5 quilômetros, então sua velocidade de escape atinge a velocidade da luz. Se passamos desse ponto, a gravidade muda de caráter por completo. Já não é possível que alguma forma de matéria possa resistir ao puxão da gravidade. Mover-se para a frente no tempo significa mover-se para dentro no raio. Escapar é impossível. Isso é um buraco negro.
O objetivo central dos primeiros capítulos deste livro é tornar a ideia de buraco negro mais precisa. Um conceito-chave que vamos explorar é a ideia de horizonte de eventos, isto é, a superfície
de um buraco negro. É uma superfície no sentido geométrico de ser um locus bidimensional no espaço tridimensional. Por exemplo, no caso mais simples de um buraco negro de Schwarzschild, o horizonte é uma esfera perfeita cujo raio é chamado raio de Schwarzschild. A estranheza sobre o horizonte de um buraco negro consiste em que (ao menos segundo a compreensão convencional) ele não é a superfície de nada em particular. Ao se cair por ele, não se nota nada de especial. O único problema surge na tentativa de se dar meia-volta e retornar para sair. Por mais que se tente – usando um foguete, um canhão de laser, ou qualquer outro meio – e por mais ajuda que se possa obter de fora, é impossível voltar e sair do horizonte, ou até mesmo enviar um sinal SOS para dizer que se está preso. Poeticamente, poderíamos pensar no horizonte de um buraco negro como a borda de uma queda-d’água, além da qual o espaço-tempo cascateia inelutavelmente para dentro de uma singularidade que destrói todas as coisas.
Os buracos negros são mais do que um experimento mental. Acredita-se que ocorram no universo em pelo menos duas situações. A primeira está na linha da discussão anterior sobre estrelas de nêutrons. Quando estrelas grandes ficam sem combustível nuclear, elas colapsam sobre si mesmas. Esse colapso é um processo bagunçado em que uma grande quantidade de matéria é despejada no universo circundante numa explosão chamada supernova. (De fato, considera-se em geral que as supernovas desempenham um papel crucial em distribuir metais e outros elementos moderadamente pesados por todo o universo.) É possível remanescer uma quantidade de massa que não seja suficiente para que se forme uma estrela de nêutrons e também permaneça estável. Em vez disso, essa massa restante colapsa para formar um buraco negro, cuja massa é pelo menos algumas vezes a massa do Sol. Os buracos negros cujas fusões foram observadas pelo LIGO são um tanto mais massivos, mas ainda, de forma plausível, produzidos pelo colapso estelar.
Imagina-se que existam buracos negros muito maiores no centro das galáxias. Exatamente como esses buracos negros se formaram é mais misterioso, e o fenômeno pode estar relacionado à matéria escura, à física do universo muito primitivo, ou a ambas as hipóteses. Os buracos negros no centro das galáxias são tremendamente massivos, contendo milhares a milhões de vezes mais massa que o Sol. Imagina-se que exista um buraco negro no centro da Via Láctea, contendo uns 4 milhões de massas solares. É possível perguntar: Como podemos estar seguros da presença de um buraco negro, se nenhum sinal consegue escapar do horizonte de um buraco negro?
. A resposta é que objetos vizinhos reagem à atração gravitacional do buraco negro. Ao acompanhar o movimento de estrelas perto do centro da Via Láctea, podemos estar certos de que um objeto muito massivo, muito denso está ali presente. Não podemos provar dessa maneira que se trata de um buraco negro, mas é possível dizer que, se não for um buraco negro, será algo muito mais estranho. Em suma, os buracos negros são a possibilidade mais simples, e o consenso moderno é que eles realmente existem no centro de muitas, se não na maioria das galáxias.
Os buracos negros são um laboratório teórico muito útil, porque eles são matematicamente simples em comparação à maioria dos objetos astrofísicos. As estrelas, por exemplo, são muito complicadas. As reações nucleares no núcleo das estrelas fornecem sua energia, e a matéria dentro delas experimenta pressões e movimentos dinâmicos fluidos que podemos simular numericamente, mas que, sem dúvida, não compreendemos por inteiro. Ademais, as estrelas têm uma dinâmica de superfície decerto tão complicada quanto os padrões climáticos da Terra. Um buraco negro, em comparação, é maravilhosamente simples. Na ausência de outra matéria, os buracos negros devem se estruturar numa dentre poucas formas definidas, todas as quais compreendidas, de maneira explícita, como geometrias curvas que resolvem as equações da relatividade geral de Einstein. Sem dúvida, a matéria que cai dentro de um buraco negro complica o quadro, mas há uma compreensão tolerável de como a matéria comum se comporta ao cair em buracos negros. Hoje em dia existe até uma boa compreensão numérica do que acontece quando um buraco negro colide com outro, e um objetivo central do capítulo seis deste livro é explicar como essa compreensão é alcançada e o que significa para experimentos como o LIGO.
O ponto em que as coisas se tornam estranhas é que os buracos negros não são realmente negros. Usando a mecânica quântica, Stephen Hawking mostrou que os buracos negros têm uma temperatura definida, relacionada com a gravidade de sua superfície. De fato, existe todo um campo de estudo conhecido como termodinâmica do buraco negro, em que as propriedades geométricas das soluções do buraco negro são colocadas numa correspondência precisa com as propriedades familiares do estudo do calor: temperatura, energia e entropia. Há até uma proposição de que buracos negros em partes distantes do universo talvez tenham interiores superpostos, e que esses interiores superpostos ajudam a codificar um efeito quântico conhecido como emaranhamento. Daremos uma introdução a esses temas no capítulo 7.
Os buracos negros continuam a prender a imaginação dos cientistas até os dias de hoje. Os astrônomos buscam evidências cada vez mais precisas das propriedades de buracos negros em rotação, e agora eles esperam ansiosamente a colaboração com observatórios de ondas gravitacionais para compreender os eventos cataclísmicos que circundam as fusões de buracos negros. E esse é apenas o começo da astronomia de ondas gravitacionais, com um empenho mundial em andamento para construir uma rede de detectores nos Estados Unidos (os dois detectores do LIGO em Hanford, Washington e Livingston, Louisiana), na Europa (Virgo e GEO600), no Japão (KAGRA) e na Índia (LIGO India). Enquanto isso, os teóricos das cordas estudam os buracos negros em dimensões mais elevadas, não só como um meio de sondar os efeitos quânticos na gravidade, mas também como análogos da física tão diversos, como colisões de íons pesados, fluidos viscosos e supercondutores. E os buracos negros inspiram a todos nós a refletir sobre as questões mais estranhas: Os buracos negros poderiam nos ser úteis algum dia? O que realmente existe dentro deles? Como seria cair dentro de um