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Metamorfoses do mundo contemporâneo
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Metamorfoses do mundo contemporâneo

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About this ebook

O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose (Nepim) tem estabelecido interlocuções visando adensar os conhecimentos produzidos e abrir possibilidades de ampliações teórico-metodológicas. Afinal, "onde existe um ser humano, existe um problema de identidade" (Antônio da Costa Ciampa). Iluminados por estes pressupostos, a proposição da presente coletânea enfatiza a reflexão sobre os fenômenos vividos na realidade brasileira de modo interdisciplinar, por meio da interlocução com diferentes pesquisadores, cujas reflexões são fundamentais para as pesquisas sobre identidade, sobretudo no momento pandêmico. Espera-se que o leitor encontre nesta obra inúmeras contribuições para seus estudos e/ou reflexões, alimentando a vontade de pesquisar e/ou debater os assuntos tratados.
LanguagePortuguês
Release dateFeb 7, 2022
ISBN9786587387710
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    Metamorfoses do mundo contemporâneo - Cecília Pescatore Alves

    Capa do livro

    PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

    Reitora: Maria Amalia Pie Abib Andery

    Editora da PUC-SP

    Direção:

    Thiago Pacheco Ferreira

    Conselho Editorial

    Maria Amalia Pie Abib Andery (Presidente)

    Carla Teresa Martins Romar

    Ivo Assad Ibri

    José Agnaldo Gomes

    José Rodolpho Perazzolo

    Lucia Maria Machado Bógus

    Maria Elizabeth Bianconcini Trindade Morato Pinto de Almeida

    Rosa Maria Marques

    Saddo Ag Almouloud

    Thiago Pacheco Ferreira (Diretor da Educ)

    Frontispício

    © 2021 Cecília Pescatore Alves, et al. Foi feito o depósito legal.

    Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Reitora Nadir Gouvêa Kfouri / PUC-SP

    Metamorfoses do mundo contemporâneo / Cecília Pescatore Alves... et al. (orgs) - São Paulo : EDUC : PIPEq, 2021.

        Bibliografia

        1. Recurso on-line: ePub

        ISBN 978-65-87387-71-0

    Disponível para ler em: todas as mídias eletrônicas.

    Acesso restrito: http://pucsp.br/educ

    Disponível no formato impresso: Metamorfoses do mundo contemporâneo / Cecília Pescatore Alves... et al. (orgs) - São Paulo : EDUC : PIPEq, 2021. ISBN 978-65-87387-66-6

    1. Identidade (Psicologia). 2. Psicologia social. 3. Política e educação. 4. Gênero e raça/etnia. I. Alves, Cecília Pescatore. II. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfoses.

    CDD 155.2

    302

    305.8

    306.76

    Bibliotecária: Carmen Prates Valls – CRB 8A./556

    EDUC – Editora da PUC-SP

    Direção

    Thiago Pacheco Ferreira

    Produção Editorial

    Sonia Montone

    Revisão

    Simone Cere

    Editoração Eletrônica

    Gabriel Moraes

    Waldir Alves

    Capa

    Gabriel Moraes

    Imagem: Pixabay

    Administração e Vendas

    Ronaldo Decicino

    Produção do e-book

    Waldir Alves

    Revisão técnica do e-book

    Gabriel Moraes

    Rua Monte Alegre, 984 – sala S16

    CEP 05014-901 – São Paulo – SP

    Tel./Fax: (11) 3670-8085 e 3670-8558

    E-mail: educ@pucsp.br – Site: www.pucsp.br/educ

    Prefácio:

    Metamorfoses e identidades

    O livro Metamorfoses do mundo contemporâneo é uma coletânea organizada por Cecília Pescatore Alves, Diane Portugueis, Suélen Cristina de Miranda e Clara Scaldelai do Nascimento, reunindo trabalhos de pesquisa relacionados ao Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose (Nepim) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). A coletânea representa uma interlocução de pesquisadores vinculados a diferentes grupos de pesquisa focados no estudo da identidade e sua transformação. Nesse sentido, a obra reúne contribuições de especialistas da PUC-SP, da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS) e da Universidade Federal do Ceará (UFC).

    A Identidade é uma temática central ao campo de Psicologia Social, estando presente em todas as correntes teóricas. O estudo da Identidade tem uma longa história de pesquisa e teorização. Começando com a primeira obra de Erik Erikson em 1950, Childhood and Society, a problemática da Identidade se tornou um elemento central da psicologia social e de alguns enfoques da sociologia. É nessa primeira obra que Erikson introduz as noções de crise de identidade e processo de desenvolvimento da identidade no ciclo de vida, problemáticas que são debatidas e estudadas até nossos tempos.

    A presente coletânea traz ao público leitor um conjunto de trabalhos que analisam a identidade de uma perspectiva nova e criativa nos campos dos estudos da identidade, iniciada por Antônio da Costa Ciampa, que entende o papel da identidade como elemento-chave no desenvolvimento (metamorfose) de uma identidade emancipadora. Nesse sentido, a concepção vai além da discussão da identidade como apenas um processo sociopsicológico de pertencimento, entendendo a Identidade como elemento-chave no próprio processo de libertação do sujeito das dominações impostas pela sociedade.

    Seguindo a perspectiva de identidade-metamorfose, a coletânea abrange três temáticas com estudos que ilustram o enfoque dessa vertente dos estudos da identidade. A primeira parte consiste em dois trabalhos, um sobre as identidades da dominação e outro sobre identidade e violação de direitos. A segunda parte da coletânea traz estudos sobre as metamorfoses da identidade de gênero e questões étnico-raciais. Nela, o leitor encontrará três textos: a respeito da vulnerabilidade social da pessoa LGBTQIA+; apontamentos sobre corpos, identidades e sexualidades; e os dilemas da luta antirracista no Brasil. Finalmente, a terceira parte apresenta dois textos relacionados com a problemática de identidade e mudanças nos processos educacionais.

    Diante de novas circunstâncias que exigem novos olhares científicos, os textos que compõem esta obra ilustram bem o foco de estudo representado pela corrente teórica de Identidade e Metamorfose desenvolvida pelo Nepim, assim como a atualidade dos temas pesquisados. O conjunto da coletânea oferece ao leitor análises qualificadas de diferentes aspectos da vida da população nacional nesta conjuntura dominada pela pandemia de Covid-19, bem como articula os objetivos do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social (PPGPS) da PUC-SP de estabelecer diálogos interdisciplinares, consolidar a pluralidade teórica e contextualizar a produção do conhecimento na realidade brasileira.

    Salvador A. M. Sandoval

    Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social

    FACHS – PUC-SP

    Apresentação

    Caro leitor, este livro reúne as palestras apresentadas no Simpósio Metamorfoses do Mundo Contemporâneo, entre os dias 22 e 24 de outubro de 2020. Organizado pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose (Nepim), vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o Simpósio contou com a participação de pesquisadores ligados a diferentes tópicos de interesse, todos eles relacionados com pesquisas e estudos desenvolvidos pelo núcleo.

    Ao longo dos trabalhos, fomos agraciados com as contribuições de Aluísio Ferreira de Lima (UFC), Alípio Casali (PUC-SP), Carla Cristina Garcia (PUC-SP), Dennis de Oliveira (USP), Luís Galeão (USP), Marilce Ivama de Freitas (PUC-SP), Maura Âmbar (USCS) e Mitsuko Aparecida Makino Antunes (PUC-SP). Suas apresentações estiveram ligadas aos quatro eixos definidos para o Simpósio: Metamorfoses Políticas no Mundo Contemporâneo, Metamorfoses e Questões Étnico-Raciais, Metamorfoses do Gênero e Processos Educacionais e Possibilidades de Emancipação. Como elemento teórico orientador desses eixos foi adotada a noção de Identidade-Metamorfose desenvolvida pelo dr. Antonio da Costa Ciampa, pesquisador fundador e, por longos anos, coordenador do Nepim.

    Como se sabe, Ciampa elaborou a Teoria da Identidade a partir de sua obra seminal A estória do Severino e história de Severina: um ensaio de psicologia social (1987), na qual, pensando os processos de vida e morte de seus personagens, propôs que a Identidade é sempre Metamorfose que se dá em um determinado contexto social e histórico. Posteriormente, Ciampa (1997) avançou em sua proposta, apresentando o sintagma identidade-metamorfose-emancipação, evidenciando que a identidade deve ser compreendida como metamorfose humana, a qual se expressa como luta pela humanização, pelo reconhecimento frente ao sistema capitalista (Lima e Ciampa, 2012, p. 24). Para Ciampa (1997, p. 3), a adoção do sintagma decorre do fato de se deparar com uma variedade de formas de ‘metamorfose humana’ [...] em que uma utopia emancipatória sempre surge, seja como meta visada, seja como falta sentida.

    Esta é a base teórica seguida pelos pesquisadores do Nepim em sua produção de estudos e pesquisas sobre a nossa realidade. A partir dela são elaborados artigos, dissertações e teses que tratam de situações pessoais/sociais as mais diversas, destacando-se atualmente os seguintes temas: questões raciais, feminismo e questões de gênero, educação indígena, formas de inclusão educacional, atuação do psicólogo, empreendedorismo feminino, cinema e identidade, o significado do aprender a ler, reconhecimento e política. Do mesmo modo, a proposição da identidade humana enquanto metamorfose permanente em busca da emancipação fundamentou a reflexão sobre o momento atual, em que a sociedade contemporânea vive uma crise sanitária e a intensificação da crise econômica iniciada no século passado (Alves, 2020, p. 3).

    Comprometido com a produção de conhecimentos sobre nossa realidade e com o desenvolvimento de uma Psicologia Social Crítica, o Nepim, agora sob a coordenação da profa. dra. Cecília Pescatore Alves, segue em frente, lutando pela superação das desigualdades sociais, pelo reconhecimento social de todo e qualquer indivíduo, de uma vida digna para todos, pela emancipação humana, adotando uma perspectiva interdisciplinar em seus trabalhos. Tal foi o propósito da realização do Simpósio Metamorfoses do Mundo Contemporâneo. Esperamos que o leitor encontre neste volume inúmeras contribuições para seus estudos e/ou reflexões, alimentando a vontade de pesquisar ou debater os assuntos tratados com o mesmo interesse que tiveram aqueles que se inscreveram para o evento.

    Gostaríamos de agradecer sobremaneira a colaboração e participação dos pesquisadores convidados, que prontamente se dispuseram a expor suas ideias e preocupações e debatê-las publicamente. Eles conseguiram cativar todos os participantes. A eles o nosso muito obrigado pela seriedade, competência e simpatia com que conduziram suas apresentações e responderam às várias questões formuladas, e um até breve. Finalmente, cabe agradecer à dra. Cecília Pescatore Alves pela maneira como coordenou toda a organização do Simpósio. Sem sua capacidade de articulação, incentivo e dedicação, dificilmente teríamos condições de realizar esse evento. Aos colegas integrantes do Nepim, o agradecimento sincero pela criatividade, união, esforço e espírito de equipe, fundamentais para a resolução de problemas e atenção aos inúmeros detalhes envolvidos na realização do Simpósio.

    Juracy A. M. de Almeida

    Sociólogo. Pós-doutor em Psicologia Social pela PUC-SP e pesquisador no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose (Nepim)

    Referências

    ALVES, C. P. (2020). Sintagma Identidade-Metamorfose-Emancipação. Boletim NEPIM na pandemia: identidade, metamorfose e emancipação diante da Covid-19, v. 4, n. 2. Disponível em: www.nepim.com.br. Acesso em: 5 fev. 2021.

    CIAMPA, A. C. (1987). A estória de Severino e a história de Severina: um ensaio de psicologia social. São Paulo, Brasiliense.

    CIAMPA, A. C. (1997). As metamorfoses da Metamorfose Humana: uma utopia emancipatória ainda é possível hoje? In: CONGRESSO INTERAMERICANO DE PSICOLOGIA, XXVI, set. 1997. Texto de Conferência [...]. São Paulo: Sociedade Interamericana de Psicologia. (mimeo) p. 1-4.

    LIMA, A. F.; CIAMPA, A. C. (2012). Metamorfose humana em busca da emancipação: a identidade na perspectiva da Psicologia Social Crítica. In: LIMA, A. F. (org.). Psicologia Social Crítica: paralaxes do contemporâneo. Porto Alegre, Sulina. p. 11-29.

    Sumário


    Capítulo 1

    Sintagma identidade-metamorfose-emancipação

    Cecília Pescatore Alves

    Capítulo 2

    Psicologia Social e metamorfoses da política no mundo contemporâneo

    Luís Guilherme Galeão da Silva

    Capítulo 3

    Sobre a imprescindível articulação entre Psicologia Social, Teoria Crítica, Interseccionalidade e Decolonialidade para a pesquisa da identidade-metamorfose

    Aluísio Ferreira de Lima

    Capítulo 4

    A vulnerabilidade social da pessoa LGBTQIA+ e as metamorfoses de gênero do mundo contemporâneo

    Maura Âmbar

    Capítulo 5

    Metamorfoses do gênero: apontamentos sobre corpos, identidades e sexualidades

    Carla Cristina Garcia

    Capítulo 6

    Racismo no Brasil: necessidade de uma inflexão teórica revolucionária

    Dennis de Oliveira

    Capítulo 7

    Educação para a emancipação num mundo contemporâneo em conflitos de identidade

    Alípio Casali

    Capítulo 8

    Identidade docente: uma experiência de metamorfose emancipatória em tempos de pandemia

    Marilce Ivama de Freitas, Mitsuko Aparecida Makino Antunes

    Sobre os autores

    Capítulo 1


    Sintagma identidade-metamorfose-emancipação

    Cecília Pescatore Alves

    Introdução

    O presente artigo pretende introduzir o leitor nos pressupostos teóricos que fundamentam os estudos de identidade enquanto um processo de metamorfose, desenvolvidos por Antônio da Costa Ciampa (1977, 1987). Desde sua aposentadoria¹, quando o professor me concedeu o privilégio de dar continuidade à liderança do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Identidade-Metamorfose (Nepim), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), temos nos dedicado a prosseguir com o projeto de elaboração coletiva² de uma proposta teórica cuja questão central é a identidade humana expressa a partir do sintagma identidade-metamorfose-emancipação.

    Assim, os propósitos deste texto são: sistematizar os pressupostos, gênese desta concepção de identidade; destacar que Identidade é entendida no processo de formação social, que se dá como metamorfose no movimento histórico em busca da emancipação que constitui o humano concreto em individualidades e coletividades, articulado como história da sociedade e da natureza; bem como apresentar os objetivos que concretizaram a produção da presente coletânea.

    A categoria identidade: gênese na Psicologia Social Crítica

    Os estudos sobre identidade como processo contínuo de metamorfose desenvolvidos por Ciampa (1977 e 1987/2005) ocorreram no contexto de reformulações necessárias nas categorias fundamentais para a análise psicossocial desenvolvidas pela psicologia social no Brasil. Os questionamentos acerca dos conhecimentos desenvolvidos pela psicologia social, fundamentalmente a partir da década de 1950, foram orientados pelas críticas às concepções positivistas, mas somente adquiriram consistência em meados dos anos 1960, em decorrência de avaliações sobre a sua eficiência nas delimitações, compreensão, bem como previsão acerca dos comportamentos sociais: [...] as análises críticas apontavam para uma ‘crise’ do conhecimento psicossocial que não conseguia intervir nem explicar, muito menos prever comportamentos sociais (Lane, 1992, pp. 10-11).

    Sobretudo, segundo a autora, foi possível compreender que o conhecimento sobre o indivíduo só seria possível mediante a superação da dicotomia indivíduo e sociedade, assim como a relevância da linguagem ser entendida na dinâmica histórica da constituição da humanidade. Se a língua traz em seu código significados, para o indivíduo as palavras terão um sentido pessoal decorrente da relação entre pensamento e ação, mediadas pelos outros significados (Lane, 1992, p. 16).

    Nesse contexto, a referida crise ocasionou uma reformulação de concepções sobre a construção do conhecimento psicossocial. Orientada pelo pensamento do materialismo dialético, passou a compreender que a matéria constitui toda a diversidade infinita do mundo, da qual o humano faz parte, e que esta existe objetivamente fora e independentemente da percepção e da consciência humana. Assim, foi possível conceber que os fenômenos sociais e humanos são históricos, produzidos a partir da vida material, a qual se constitui em um processo de transformação constante, revelador de um movimento que tem por base a contradição (Alves, 2017a, p. 2).

    Na apresentação da coletânea Silvia Lane: uma obra em movimento, Sawaia e Purin (2018) afirmam que Silvia inseriu na psicologia social um referencial que mudou os caminhos trilhados nos moldes da ciência positivista: Ela provocou uma agitação fecunda na psicologia social, introduzindo o método dialético e o materialismo histórico para explicar a relação homem-sociedade, afirmar a ciência como práxis, voltada à transformação da sociedade [...]. (p. 9).

    Cabe destacar a importância da categoria totalidade, considerada neste processo de aquisição do conhecimento, que possibilitou uma compreensão particular da relação todo/parte, das determinações que explicam um fenômeno, da historicidade presente nos objetos de conhecimento, da [...] unidade dos contrários, síntese de múltiplas determinações (Silva, 2005, p. 67). O isolamento de um fenômeno priva-o de sentido, porque o remete apenas às relações exteriores, não permitindo a compreensão das contradições sempre em movimento na realidade concreta. Somente o ponto de vista da totalidade, segundo Lukács, permite à dialética enxergar, por trás da aparência das ‘coisas’, os processos e inter-relações de que se compõe a realidade (Konder, 1988, pp. 67-68).

    A historicidade foi outra categoria fundamental para a psicologia social que se constituiu a partir de uma postura crítica, visto que não naturalizar processos e fenômenos sociais e humanos possibilita uma compreensão da inserção e referência destes a um tempo histórico, a uma totalidade contraditória e, fundamentalmente, impossibilita a produção de um conhecimento parcial que impeça ou dificulte a compreensão de que os fenômenos humanos são produto da ação do homem em sociedade.

    Se a Psicologia apenas descrever o que é observado ou enfocar o Indivíduo como causa e efeito de sua individualidade, ela terá uma ação conservadora, estatizante – ideológica – quaisquer que sejam as práticas decorrentes (Lane, 1992, p. 15). A autora nos diz ainda que o ser humano deve ser considerado, pela psicologia social, como produto e produtor de sua história e da sociedade, a fim de possibilitar condições para que as contradições e as possibilidades de transformações sociais se constituam, isto é, buscar pela produção do conhecimento comprometido com a realidade social e com o sujeito em movimento constante. Assim, os fenômenos do psiquismo passam a ser estudados como processos que delimitam campos de investigação a partir das categorias de análise em vez de conceitos, com o objetivo de não correr o risco de reter os objetos de estudo a concepções estáticas.

    A princípio, segundo Lane (1995), a reformulação proposta pela psicologia social, seguindo as concepções dos soviéticos Vigotski (1990) e Leontiev (1978), elegeu a atividade, a consciência e a personalidade como categorias fundamentais para o estudo do psiquismo humano, as quais se desenvolvem pela mediação da linguagem e do pensamento, portanto, na sua essência, são sociais, já que o ser humano só o é na relação com os outros (Lane, 1995, p. 56).

    Contudo, afirma a autora que, diante das pesquisas desenvolvidas pela psicologia social no Brasil, especialmente a tese de doutorado de Ciampa (1986, publicada em 1987), se constata que a Identidade Social se constitui num processo de metamorfose/cristalização do Eu decorrente do conjunto das relações sociais vividas pelo sujeito (Lane, 1995, p. 56). Ademais, segundo Leontiev, a personalidade se constituiria das características decorrentes das interações sociais, sendo, portanto, um processo contínuo (p. 56), dando destaque para se estabelecer semelhanças entre Identidade e personalidade (como definida por Vigostki, 1993). Lane (1995) continua a justificativa acerca da substituição do termo personalidade, acrescentando a necessidade de impedir o significado idealista que a palavra personalidade sustenta historicamente. Desse modo, a receptividade e a abertura ao novo, tão características da Silvia, foram fundamentais para os estudos desenvolvidos por Antônio da Costa Ciampa, dando-lhe autonomia para que estudasse a questão da identidade [...] (Ciampa, Almeida e Miranda, 2018, p. 206).

    Outra mudança nas categorias de análise da constituição do psiquismo, de igual importância, ocorreu nas constatações de pesquisas acerca da relevância das emoções como mediação, juntamente com linguagem e pensamento. E, em decorrência da tese de Sawaia (1987), a afetividade passou a ser considerada como uma quarta categoria. Lane (1995, p. 59) afirma que:

    Nesta reformulação, a identidade seria uma categoria síntese na qual a mediação das outras pessoas seria predominante. Não esquecendo jamais que estas categorias estão em mútua interdependência, umas embricadas nas outras, assim como as mediações se interpenetram.

    Nesse contexto, em que a práxis orientava o movimento da construção de teorias e metodologias, os fenômenos do psiquismo investigados passam a ser os subjetivos e as mediações que os constituem como processos (Alves, 2017a, p. 2), em vez de se buscar a estrutura, os componentes e os fatores determinantes. Os campos de investigação são delimitados pelas categorias atividade, consciência, identidade e afetividade, mediados pela linguagem, pensamento, emoções e afetos.

    As contribuições de Silvia Lane para o desenvolvimento dos estudos da identidade como categoria para a psicologia social foram fundamentais, e sua incessante busca do novo para o desenvolvimento de uma psicologia crítica possibilitou contato com autores, como Habermas e Heller, neomarxistas cujos aportes teóricos se dirigiam à compreensão da dialética na unidade dos contrários, sobretudo na relação objetividade/subjetividade e individualidade/coletividade (Ciampa, Almeida e Miranda, 2018, p. 207).

    Considera-se que o humano está sempre em processo contínuo de movimento e que depende fundamentalmente das relações e das atividades sociais que desempenha na vida cotidiana, e estas, por sua vez, se estabelecem no contexto da sociedade e no período histórico que vivemos, mas são passíveis de constantes transformações de acordo com as necessidades que se configuram no próprio processo de inter-relações.

    Assim, tornar-se membro da sociedade dialética é um processo iniciado pela internalização, a saber, a apreensão ou interpretação imediata de um acontecimento objetivo como dotado de sentido, isto é, como manifestação de processos subjetivos de outrem, que desta maneira torna-se subjetivamente significativo para mim (Berger e Luckmann, 1973, p. 174).

    Portanto, os fenômenos psicológicos, ao serem tratados como resultado de um processo, viabilizam identificar a constituição social do indivíduo na relação objetividade-subjetividade como um movimento em constante mudança. Desse modo, a formulação da concepção de Identidade-Metamorfose tem sua gênese na concepção de que o todo da natureza e cada fenômeno isolado contêm uma contradição interna, que gera transformações qualitativas e quantitativas nas expressões materiais e orienta o pensamento, porque expressa uma característica da própria realidade objetiva: movimento de transformação constante.

    [...] a atividade implica ações encadeadas, junto com os outros indivíduos, para a satisfação de uma necessidade comum. Para haver este encadeamento é necessária a comunicação (linguagem) assim como um plano de ação (pensamento), que por

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