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Impactos da Iniciativa Chinesa Cinturão e Rota no Brasil: estará o país preparado para as oportunidades e desafios da Nova Rota da Seda?
Impactos da Iniciativa Chinesa Cinturão e Rota no Brasil: estará o país preparado para as oportunidades e desafios da Nova Rota da Seda?
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Impactos da Iniciativa Chinesa Cinturão e Rota no Brasil: estará o país preparado para as oportunidades e desafios da Nova Rota da Seda?

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Atravessando o rio sem saber o caminho das pedras, como diria um dos seus "mandatários do céu", Deng Xiaoping, hoje é certo que a partir da chegada da "dinastia" dos comunistas ao poder, esses foram responsáveis pelo rito de passagem de mais de 850 milhões da miséria e atraso para o que fora proposto nos anos 1990, uma sociedade chinesa na sua maioria moderadamente próspera. Para tanto, foram vários pontos de inflexão: a Revolução Comunista em 1949; o processo de implantação do Socialismo de características chinesas a partir de 1978; a entrada na OMC no início do século XXI. Desses processos nasce a Fábrica do Mundo, inserida na globalização mundial e uma enorme acumulação de reservas internacionais transformando o "país do meio" recebedor de Investimentos Diretos a exportador de capitais. Condição materializada na Iniciativa Cinturão e Rota anunciada em 2013 pelo atual líder chinês Xi Jinping. Muito crédito e capacidade produtiva excedente faz com que a China não meça esforços para investimentos em qualquer nação com quase nenhuma restrição para implantação de projetos principalmente voltados para infraestrutura e geração de energia, que possa sustentar seu crescimento das últimas décadas. Mesmo o longínquo Brasil, como grande país e com enorme potencial, pode, primeiro, estudar o processo de desenvolvimento chinês e segundo, se planejar e propor projetos que possam ser açambarcados pela Iniciativa Cinturão e Rota no intuito de encontrar soluções para os seus problemas.
LanguagePortuguês
Release dateFeb 10, 2022
ISBN9786525221472
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    Impactos da Iniciativa Chinesa Cinturão e Rota no Brasil - Edimar da Rocha Pinto

    1. INTRODUÇÃO

    Defendendo que a China não estaria em decadência, em 1816, na ilha de Santa Helena, ao ouvir do Lorde Amherst sobre a fracassada tentativa da Inglaterra em estabelecer relações diplomáticas com os chineses, Napoleão profetizou: Deixem a China dormir, porque, quando ela acordar, o mundo inteiro tremerá!¹. Se ainda não tremera, no despertar de uma China que cresce economicamente bem acima da média mundial nas últimas décadas, em uma das suas obras mais icônicas, já fizera a velocidade de rotação da terra alterar quando acionou sua monumental hidrelétrica de Três Gargantas², construída no rio Yang-tsé, o maior rio da China.

    A economia chinesa é hoje não só responsável por fatos como o relatado, mas tem importância fundamental para o crescimento da economia mundial.

    Sobre o retorno da China ao xadrez geopolítico e econômico internacional:

    A simples existência da China cria um problema para os registros ocidentais sobre a história mundial. A Bíblia não dizia nada sobre a China. Hegel via a história mundial como tendo começado na China e terminado em uma crescente perfeição com a civilização alemã. A tese do fim da história de Fukuyama³ simplesmente substitui a Alemanha pelos Estados Unidos. Mas, de repente, o Ocidente descobriu que no Oriente existe essa tal de China: um grande império, com uma longa história e um passado glorioso. Um completo novo mundo acaba de surgir (YANG, 2006 apud LEONARD, 2008, p. 17).

    Karl Marx (1979) em uma das suas previsões, vislumbrou um extremo oriente dinâmico e concorrente diante de um capitalismo amadurecido, porém acossado pelas lutas de classe. À sua época, a China era uma colônia vítima do imperialismo cujos símbolos eram a famigerada importação de ópio e consequentes guerras relacionadas a esse comércio.

    Parece estarmos voltando ao período anterior às grandes navegações, o eixo do poder parece retornar ao Oriente tendo como a China a líder de um grupo de países emergentes desafiando o mundo ocidental e a hegemonia norte-americana.

    Para Naibitts (2011), enquanto o Ocidente se planeja, no máximo, em décadas, a sociedade chinesa traz no seu inconsciente coletivo as experiências dinásticas. Percebe-se nitidamente que o socialismo chinês é o início de uma grande caminhada e há um longo caminho a percorrer em busca de um desenvolvimento sustentável e se o povo chinês continuar a sentir as pedras à medida que atravessa o rio, permanecerá paciente nessa trajetória.

    James Kynge (2007) diz não precisar quando a China se tornou uma questão de importância internacional diária. Talvez tenha sido no final de 2003, pouco provável que exista um momento preciso, entretanto:

    […] talvez tenha havido um ponto crítico. E ele ocorreu durante várias semanas a partir de meados de fevereiro de 2004, quando, primeiro aos poucos, e depois em velocidade cada vez maior, as tampas dos bueiros começaram a desaparecer de estradas e pavimentos do mundo todo. Como a demanda chinesa levou o preço de sucata a níveis recordes, em quase todos os lugares do mundo os ladrões tiveram a mesma ideia. […] Não foi a primeira vez que uma grande potência anunciou sua chegada de um jeito incomum. O primeiro indício que os ingleses tiveram da invasão da Europa pelos mongóis, no século XIII, por exemplo, foi quando o preço do peixe em Harwich, um porto no mar do Norte, subiu acentuadamente. A explicação para isso, como o povo ficou sabendo depois, foi que as esquadras de transporte dos peixes nos Bálticos, subitamente privadas dos marinheiros necessários para lutar contra o inimigo que se aproximava a cavalo do Oriente, tinham permanecido ancoradas. Isso reduzira o suprimento de bacalhau e arenque para Harwich, e por conseguinte os preços subiram (KYNGE, 2007, p. 20, 21).

    "O mundo hoje é made in China (feito na China). Da mais simples e banal a mais complexa materialidade da nossa vida cotidiana, de um lápis a um smartphone, da infinidade de objetos de plástico que enchem as lojas de R$ 1,99 a objetos de consumo de luxo, passando por toda classe de eletrônicos, ferramentas, louças, têxteis, roupas, sapatos, brinquedos, até materiais de construção, produtos químicos, agrotóxicos etc., grande parte do mundo que nos rodeia é fabricado na China. (…) Da mercadoria ‘verdadeira’ à infinidade de cópias, falsificações e réplicas, a China tornou possível, em preço e escala de produção, viabilizar o consumo de massa tal como conhecemos hoje. Não é exagero dizer que o padrão de consumo profundamente entranhado nos imaginários culturais e sociais do que é ‘desenvolvimento’, que dá corpo e materialidade ao modo de vida que associamos à globalização⁴, só se tornou possível graças à China" (MORENO, 2015, p. 11).

    Para se chegar a esse ponto a China traz consigo uma história milenar de muito sofrimento. Guerras internas de unificação, guerras civis pelo poder no início do século e várias guerras com subjugação por inimigos externos que sempre estiveram de olho na pujança e riqueza do seu território. No modo de produção capitalista se torna vítima contumaz dos países centrais. Com o imperialismo⁵, não obstante o grande lucro auferido nas suas trocas desiguais com as nações colonizadas, a China se vê vítima de uma história cruel, um doping coletivo fomentado pelo uso indiscriminado do ópio, no intuito que essa droga fosse utilizada nas transações comerciais.

    A China atualmente tem a maior economia do mundo, quando medida em poder de paridade de compra⁶ sendo responsável por 22% da população global⁷ com um aspecto diferenciado, um hiato entre o número de homens e mulheres⁸. Dos últimos 20 séculos a China só não foi a maior nação do mundo em dois deles, sendo líder em avanços científicos e tecnológicos, incluindo desenvolvimento em diversas áreas como ciências naturais, engenharia, medicina, tecnologia militar, matemática, geologia e astronomia e sendo responsável pelas quatro grandes invenções: a bússola, a pólvora, o papel e a tipografia, tendo como símbolo desse poder de empreender e mobilizar grandes recursos naturais e humanos a Grande Muralha da China. Muito antes dos povos ibéricos, no século XV, resultante de inovações na técnica de navegação e construção naval, a China tinha a maior frota do mundo com mais de 200 navios e cerca de 27.800 marinheiros e soldados (ALVES, 2018, n.p.).

    O PIB chinês registrou em 2018 uma taxa de crescimento de 6,60% com Taxa de desemprego a 3,61%, inflação a 2,80% e taxa de juros de 4,35% e dívida pública de 50,50% do PIB. Dos 1,395 bilhão de habitantes, 775 milhões se encontram empregados com o salário-mínimo estipulado em 2.480 yuans (aproximadamente US$ 350,00 com a cotação do dólar a 7,09) e o salário médio chegando a 82.461 yuans/ano (aproximadamente US$ 11.630,00 ao ano, ou US$ 970,00 por mês, com a cotação do dólar a 7,09)⁹.

    A China é o terceiro maior país do mundo em extensão com 9,6 milhões de km². O ponto extremo Norte (Heilongjiang) está a 5.500 km do extremo Sul (ilhas Nansha) enquanto seus extremos Leste-Oeste (Wusulijiang-planalto do Pamir) distam 5.000 km entre si. Visto do alto, o relevo do território chinês parece uma escada de três degraus que desce do Oeste para o Leste. A fronteira com Afeganistão, Paquistão, Índia, Nepal, Sikhin e Butão no degrau mais alto a Oeste e Sudoeste conhecido como o planalto de Qinghai-Tibet, o Teto do Mundo, com altitude média de 4.500 metros despontando os maciços montanhosos e picos mais altos do mundo com destaque para o Himalaia (Terra Natal do Gelo e da Neve, em tibetano) ultrapassando os 6 mil metros, onde se encontram 40 montes de mais de 7 mil metros e 11 com mais de 8 mil metros onde se destaca o Everest¹⁰ com 8.848 metros, o mais alto do mundo. Esses montes que se distribuem pelos 2.400 km do planalto tibetano, cobertos de neve, formam um reservatório natural alimentando no verão os rios que descem os degraus do Leste em direção ao Oceano Pacífico e as encostas do sul em direção ao Índico. O Changjiang (Yang-tsé), o Huanghe (Amarelo) e outros grandes rios chineses possuem suas fontes no Qinghai-Tibet. Descendo as bordas do planalto do Tibet, a altitude cai rapidamente para 2 mil a mil metros dando origem a três grandes bacias, a Junggar, a Tarim e a Sichuan e os planaltos da Mongólia Interior, de Loess a de Yunnan-Guizhou, coberto de numerosas pastagens naturais, estiram-se as estepes de Hulun-Boír e de Xilian Gol, as mais importantes zonas de pastoreiro da China (POMAR, 1987, p. 22-24).

    A China é dividida atualmente em quatro grandes macrorregiões com a região costeira (Eastern Coastal Region) e a região central (Central Region) concentrando as principais atividades econômicas. Essa concentração se dá principalmente por conta do alto índice populacional, melhores condições climáticas e geográficas e a posição das duas principais cidades que constituem os marcos políticos e polos econômicos do país (Beijing e Shangai). Em contrapartida, boa parte da região Oeste da China apresenta-se imprópria para a agricultura com boa parte desértica demandando alta soma de investimento e a região Norte e extremo Nordeste constituem-se zonas restritas de baixa condição econômica, baixo potencial em recursos naturais com clima e geografia desfavoráveis com zonas proibidas por serem áreas legais de proteção de reservas naturais. Entretanto, existe um esforço de planejamento para o desenvolvimento dessas últimas regiões onde em linhas gerais busca-se direcionar ações com o objetivo de implantar e desenvolver setores da indústria que possa utilizar a mão de obra existente e os recursos naturais existentes na região propondo o uso racional do espaço voltado para a produção agrícola realizando um processo de industrialização e modernização desse setor. Outra medida importante é a criação de uma infraestrutura básica de transporte (ferrovias e rodovias) interligando à malha já existente no restante do país. Busca-se também elaboração de uma política de cuidado do solo de forma a evitar o aumento da desertificação criando projetos pilotos de transformação estrutural da base produtiva integrada ao setor agrícola. Ações também são implementadas no sentido de estimular a produção de veículos e maquinário voltados para a produção local e a posteriori exportação e por fim, o governo central quer aumentar a prestação de serviços básicos a população local como educação, saúde e treinamento técnico. A despeito do crescimento econômico expressivo das últimas décadas com a renda das famílias crescendo em média 7,0% a.a. retirando 853 milhões de habitantes da linha da pobreza, observa-se uma desigualdade muito grande entre as regiões chinesas, principalmente entre as regiões rural e urbana, uma preocupação latente do governo chinês que teme que mantidas essas disparidades possa acontecer um aumento das tensões sociais principalmente nas 56 minorias étnicas espalhadas pelas regiões mais pobres (LEITE, 2018, p. 263–266).

    Reduzir a distância entre ricos e pobres com eventual compensação aos talentos individuais tem sido uma equação difícil de resolver. A China de agora, desenvolve um modelo próprio na tentativa de equacionar liberdade e justiça. Os chineses têm como meta eliminar a pobreza abjeta e o desenvolvimento de uma sociedade igualitária na sua maioria até 2020. Em 2007, o presidente Hu Jintao conclamou: precisamos aprofundar a reforma do sistema de distribuição de renda e aumentar a renda tanto dos residentes urbanos como dos rurais (NAISBITT, 2011, p. 204-205).

    Com objetivo de reduzir diferenças de desenvolvimento econômico entre as regiões Leste e Oeste da China, em 2000, o governo central lançou uma campanha denominada Desenvolver o Oeste. Essas regiões que fazem fronteira com mais de 10 nações e rica em recursos naturais e minerais com potencial para ser a próxima região de ouro replicando o sucesso econômico da região costeira, recebera investimentos até o fim de 2007 de mais de 3 mil empresas estabelecidas na região em segmentos distintos como logística, tecnologia de informação, comércio, finanças, segurança e exportação (ibidem, p. 218).

    Na China, o partido comunista¹¹ conquistou o poder na vaga de uma épica luta de libertação nacional em que os projetos de profunda transformação social se entrelaçaram estreitamente com o objetivo da recuperação da dignidade da nação chinesa, protagonista de uma civilização milenar, mas que, a partir da guerra do ópio, fora reduzida à condição semicolonial (e semifeudal) e o desafio estaria em como conduzir o imenso país asiático em direção, ao mesmo tempo, à modernidade e ao socialismo, superando a dilaceração e a humilhação nacionais impostas pelo imperialismo (LOSURDO, 2004, p. 63).

    O Partido Comunista Chinês trabalha a favor do bem-estar da população chinesa. Estiveram à frente de planejamentos estratégicos de longo prazo sem os descontroles e interrupções de eleições típicas do mundo ocidental. A China não se desmantelou por rivalidades políticas, muito menos deixou-se atrasar por decisões repentinas em seu caminho, muito ao contrário, harmonizou-se em objetivos comuns convergentes desde o processo de reformas de reabertura com um apoio participativo das bases da sociedade chinesa. O mundo ocidental enxerga as reformas de abertura com a mentalidade ocidental onde se julgam superiores, entretanto os chineses acreditam na legitimidade do desempenho em detrimento do aspecto ideológico onde se o governo é bem administrado, ele é percebido como legítimo. O panda outrora desajeitado agora está em plena ascensão (NAISBITT, 2011, p. 2–8).

    Não sem se beneficiarem das benesses advindas dos quase 30 anos de uma tentativa de socialização dos meios de produção no modelo socialista, a partir de 1978, a China se propõe a fazer uma reforma de abertura ao mercado e começa a percorrer todas as etapas históricas do modelo capitalista até então, sempre sob a administração forte do Estado e seu Partido Comunista Central que monitora e gerencia as metas criadas de 5 em 5 anos, procurando seguir à risca um planejamento elaborado desde a revolução, para em 2050, retornar ao posto que um dia fora desse país, a maior nação do planeta.

    Um processo estratégico de transformação da China em uma nação desenvolvida, passa por oito duplicações do PIB chinês até 2050, tendo o ano de 1978 como marco, colocado pelo Deng Xiaoping da seguinte forma:

    Nós estamos construindo o socialismo, mas isso não significa que o que nós conquistamos até agora corresponde ao padrão socialista. Não antes da metade do próximo século, quando nós tivermos atingido o nível das nações moderadamente desenvolvidas, poderemos dizer que realmente construímos o socialismo e declarar de forma convincente que o socialismo é superior ao capitalismo. Nós estamos avançando rumo a essa conquista (XIAOPING, 1994 apud JABBOUR, 2012, p. 11).

    Os comunistas enfrentaram dificuldades em suas tentativas de tirar a China do subdesenvolvimento e colocá-la na trilha do desenvolvimento como também souberam tirar lições de seus erros sendo os grandes indutores de todas as mudanças atuais.

    Ressalta-se que enquanto os ocidentais acreditam que todos nascemos iguais, os chineses creem que todos nascem conectados, elos de uma rede, uma teia. Os chineses se enxergam como parte de uma família, clã, vila, província, grupo étnico e por conseguinte, de uma nação ou Estado. A cultura ocidental influenciada pela tradição grega baseia-se em indivíduos que se reúnem para formar um grupo ou um Estado. Na China cultua-se a lealdade ao país, o respeito e a obediência a autoridades, governo, pais, parentes mais idosos e aos professores. Em mandarim, um indivíduo é descrito como xiaowo - pequeno eu e o grupo a que uma pessoa pertence, o dawo – o grande eu. Partindo dessa premissa tem-se uma sociedade onde o grupo, o Estado, deve prover direitos culturais, econômicos e sociais às pessoas bem como direito ao trabalho, acesso à educação, à saúde, à habitação e às artes. Em contrapartida do indivíduo se cobra a lealdade ao dawo, condição não facilmente aceita no ocidente onde a liberdade do indivíduo deixar um grupo e se juntar a outro quando contrariado é primordial (NAISBITT, 2011, p. 271-272).

    Para Guimarães (2009), a transição para uma economia de mercado dependeu de capacidade institucional e regulatória, que demanda certo grau de capacidade estatal melhor ilustrado pela condução da política econômica chinesa que vem combinando uma forte intervenção estatal com a preservação de alguns fundamentos econômicos, especialmente no que diz respeito ao controle da inflação e à manutenção de uma taxa de câmbio favorável às exportações. O Estado chinês promoveu políticas de controle, visando proteger a indústria nacional, moldando a entrada do capital estrangeiro e obtendo condições favoráveis para a transferência de tecnologia. O governo chinês não mede esforços para produzir grupos empresariais com capacidade tecnológica e competitiva, precondição para o poder internacional do país. O Estado chinês promove medidas no intuito de aumentar o poder competitivo das suas empresas no mercado internacional ofertando linhas de crédito a baixo custo, estimulando o desenvolvimento industrial e tecnológico concedendo subsídios para o esforço de pesquisa e desenvolvimento aproximando universidades e instituições de pesquisa às suas empresas colando-se bem à frente de países como Brasil e México.

    De acordo com Amsden (2009) conforme citado por Cuco (2016), a China é um dos países que a partir de 2000 fez parte de dois conjuntos distintos de países do "resto¹², que estavam concorrendo entre si por recursos e por participação no mercado global, bem como pela liderança em servir de modelo para industrializados ainda mais tardio. Esses conjuntos distintos são, primeiro os independentes, que integram a China, Índia, Coreia e Taiwan, que são países que priorizaram modelos próprios de crescimento, por um lado e, por outro lado, os integracionistas", que integram a Argentina, o Brasil, Chile, México e a Turquia, que apostaram em vínculos mais fortes com o capital estrangeiro. Para Amsden (2009) conforme citado por Cuco (2016), o segredo de sucesso desses países só pode ser encontrado na recuperação do lugar do Estado e no seu papel-chave no comando de estratégias nacionais de desenvolvimento¹³. Este aspecto acabou sendo importante para China porque mesmo isolada do mundo e ameaçada pelo Ocidente, aprendeu a mudar suas riquezas de forma drástica nas últimas três décadas. Tal como apontam Lee & Bremmer (2012 apud CUCO, 2012, n.p.), a China estourou no cenário mundial um pouco depois do avanço diplomático entre ela e os Estados Unidos em 1972. Particularmente na última década, desde a sua adesão à Organização Mundial do Comércio, a China surpreendeu os observadores ao redor do mundo com a sua velocidade de urbanização, a sua modernização, a redução do número de pessoas em situação de pobreza, e ao grande volume de reservas em moeda estrangeira que detém.

    Segundo Belluzzo (apud ANDERSON, 2018, p. 14), a economia chinesa na década de 1980 equiparava-se ao Brasil com 1% em participação no comércio mundial; em 2010 a China atingiu o percentual de 10,5%, contra 8,4% dos Estados Unidos e 8,3% da Alemanha, com taxa média de crescimento anual na primeira década do século de 10,5% contra 1,7% dos Estados Unidos e 0,9% da Alemanha sendo, ao final dessa mesma época, responsável pela produção mundial de 42% dos televisores a cores, 67% dos produtos de vídeo, 53% dos celulares, 97% dos computadores pessoais e 62% das câmeras digitais tornando-se a fábrica do mundo. Explicação de crescimento dada nas seguintes condições:

    Os chineses usam e abusam de políticas industriais e normas destinadas a favorecer as empresas nacionais em detrimento das estrangeiras. Apoiam abertamente a concentração e fusão, usando as grandes estatais como núcleo desse processo de constituição de conglomerados […]. A estratégia da China combina, até agora com sucesso, a atração do investimento direto estrangeiro para parcerias com empresas locais (privadas e públicas), a absorção de tecnologia e a fixação de metas de exportação e de geração de saldos positivos na balança comercial. Integrar a economia significa conquistar mercados, ampliar o superávit comercial e manter rigoroso controle sobre o movimento de capitais. A determinação da taxa de câmbio não é deixada aos mercados, e sim usada como instrumento de competitividade. Isto, obviamente é motivo de escândalo para os economistas liberais (BELLUZZO, 2018 apud ANDERSON, 2018, p. 14-15).

    Para Li (2018), o surpreendente e irônico de todo o sucesso do crescimento chinês é que ele se transformou na tábua de salvação do sistema capitalista, ainda mais se levarmos em conta a grande crise econômica de 2008¹⁴. Tem estado nas mãos do Partido Comunista Chinês o destino de empresas capitalistas realocadas para China que se fartam de mão de obra barata e bem-comportada, condições fiscais e de crédito ímpar e logística para escoamento da produção de alto padrão a despeito de serem enxergados ainda assim, com sua economia de mercado socialista chinesa, uma ameaça, um desafiante à ordem mundial capitalista.

    Para manter suas altas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), o país do meio, agora conhecido como a fábrica do mundo, tem uma demanda crescente de matérias-primas, alimentos, energia e capital em abundância. Os investimentos crescem na mesma ordem das demandas. De forma global, acontece um movimento cada vez maior de participação do setor privado nacional e estrangeiro em áreas que não estratégicas (setor de serviços, por exemplo) e, por outro o lado, existe o fortalecimento de conglomerados estatais em setores com alto grau de monopólio e capacidade de competir no exterior – como energia, eletrônica, ferro e aço, farmacêutica, construção, transporte e petróleo, oito grupos que trabalham na geração de energia e a indústria química.

    Apesar de grandes investimentos internos, a China se vê obrigada a buscar diversos parceiros internacionais com o objetivo de suprir demandas agora criadas fechando acordos com os vários vizinhos e na medida do necessário percorrendo terras mais distantes. Nesse processo ressalta-se os imigrantes chineses mundo afora, próximos ou não, maiores responsáveis pelos Investimentos Estrangeiros Diretos (IEDs). Parcerias com países da Ásia, África, América Latina e Caribe no que convencionou-se chamar de negócios sul-sul buscam disseminar uma ideia de globalização inclusiva onde todos ganham, com crédito e tecnologia chinesa onde diversos países têm obras, normalmente de infraestrutura, financiadas no objetivo de aquisição de commodities tão importantes para sustentar seu crescimento da China.

    A China escolheu após 100 anos de experiências traumáticas com a subjugação do seu povo ao Imperialismo das potências centrais capitalistas recorrer à alternativa econômica dada à época, o socialismo, e teve no seu vizinho, a URSS, representante maior. A posteriori, essa mesma China, na figura do Mao Tsé-Tung, sabiamente e habilmente aproveitou-se da tensão criada entre URSS e EUA, no que ficara conhecida como Guerra Fria¹⁵, conseguindo benesses comerciais dos Estados Unidos para alavancar sua economia. Aproveitara-se também de um modelo de globalização econômica, de exportação de capitais para criar suas Zonas Econômicas Especiais e seu modelo de economia exportadora. Tudo isso a partir de planos quinquenais discutidos para cumprir um planejamento construído desde 1949 para voltar ao seu lugar de maior nação do mundo.

    A ambiciosa e moderna Iniciativa Cinturão e Rota, que nasce como projeto OBOR (On Belt, On Road – Um Cinturão, Uma Rota) e que a imprensa convencionou-se chamar de Nova Rota da Seda aludindo às antigas rotas comerciais interconectadas feitas em caravanas e embarcações oceânicas e que levavam mercadorias variadas, em especial a seda, do sul da Ásia passando pelo Oriente Médio chegando a Europa, e que atualmente se assenta em um mundo já interligado e de inferências geopolíticas importantes.

    Diante da iniciativa chinesa Cinturão e Rota, que já impacta boa parte do mundo, transformando relações econômicas e sociais mundo afora, como o Brasil está se planejando para esse novo cenário? Que medidas estão sendo tomadas para que possamos, assim como a China historicamente o fez, melhor aproveitarmos dessa nova oportunidade para obtermos melhorias das nossas condições econômicas trazendo desenvolvimento para nosso povo tão sofrido?

    O objetivo da pesquisa é esmiuçar imbricações históricas vivenciadas pelos chineses que os fizeram chegar na condição econômica que se encontram hoje, fazendo com que a China possa propor um projeto tão ousado, a Iniciativa Cinturão e Rota. A proposta é apresentar suas particularidades, projetando os impactos da iniciativa no Brasil.

    Temos que ter em mente que mesmo uma pequena elevação no padrão de vida na China acarreta uma enorme mudança no tamanho total de sua economia. As consequências reais e concretas da Iniciativa Cinturão e Rota, suas imbricações geopolíticas, seu retorno financeiro para a China e para seus parceiros geram discussões onde defensores e detratores têm seus discursos impregnados de interesses. A tese aqui defendida não tem a pretensão de um ponto final, ainda mais para um país, o Brasil, que na aparência estaria fora do alcance da Iniciativa, mas muito pelo contrário, na essência, até mesmo por conta do histórico recente, tem fortes ligações com a China, sendo essa atualmente sua maior parceira comercial.


    1 Não há registro do contexto desse conselho, e a própria citação pode ser inexata ou até apócrifa. Ver em: (KYNGE, 2007, p. 22)

    2 A construção da Usina das Três Gargantas foi iniciada em 1993. Até fins de 2004, 4 turbinas entraram em funcionamento. Em 2009, com 26 turbinas instaladas, a capacidade concebida da barragem passou a ser de 18.200 megawatts, ultrapassando a potência de Itaipu. Ver em: (PRANDI, 2011. n.p).

    3 Francis Fukuyama é Ph.D. em Ciência Política por Harvard. Foi membro do Departamento de Ciência Política da RAND Corporation; em 1989 integrou a equipe de Planejamento Político do Departamento de Estado dos EUA como membro regular especializado em assuntos do Oriente Médio e depois como Diretor Adjunto para assuntos político-militares para a Europa. É membro da Associação Americana de Ciência Política e do Conselho de Relações Exteriores dentre outras atividades. Desde 2001 é professor da Universidade Johns Hopkins – SAIS, em Washington, D.C. Em 1989, publicou um ensaio intitulado O fim da história e três anos mais tarde, em 1992, o livro O fim da história e o último homem, no qual aprofunda as reflexões realizadas no ensaio. Ambos discorrem sobre a derrocada dos regimes socialistas no Leste europeu e em especial na ex-União Soviética e a consequente vitória da economia de mercado e da democracia liberal. Fukuyama afirma, se amparando principalmente no pensamento hegeliano, que a história havia chegado ao seu fim; que a humanidade, no final do século XX, teria atingido o auge de sua evolução com a superação das contradições existentes e personificadas na Guerra Fria. Com a queda dos regimes socialistas do hemisfério Norte, restava apenas uma única ideologia, um único e vitorioso regime, a democracia liberal. Ver em: (FURIGO, 2011, 133)

    4 A globalização é o estágio supremo da internacionalização. O processo de intercâmbio entre países, que marcou o desenvolvimento do capitalismo desde o período mercantil dos séculos 17 e 18, expande-se com a industrialização, ganha novas bases com a grande indústria, nos fins do século 19, e, agora, adquire mais intensidade, mais amplitude e novas feições. O mundo inteiro torna-se envolvido em todo tipo de troca: técnica, comercial, financeira, cultural. Vivemos um novo período na história da humanidade. A base dessa verdadeira revolução é o progresso técnico, obtido em razão do desenvolvimento científico e baseado na importância obtida pela tecnologia, a chamada ciência da produção. Todo o planeta é praticamente coberto por um único sistema técnico, tornado indispensável à produção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas. Graças às novas técnicas, a informação pode se difundir instantaneamente por todo o planeta, e o conhecimento do que se passa em um lugar é possível em todos os pontos da Terra. A produção globalizada e a informação globalizada permitem a emergência de um lucro em escala mundial, buscado pelas firmas globais que constituem o verdadeiro motor da atividade econômica. Tudo isso é movido por uma concorrência superlativa entre os principais agentes econômicos — a competitividade. Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece em qualquer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o acontece em todos os demais. Ver em: (SANTOS, 2002, p.79).

    5 Imperialismo tem sentidos tão diferentes que seu uso é difícil sem que dele se dê uma explicação como termo antes analítico que polêmico. Defino aqui a variedade especial dele chamada imperialismo capitalista como uma fusão contraditória entre a política do Estado e do império (o imperialismo como projeto distintivamente político da parte de atores cujo poder se baseia no domínio de um território e numa capacidade de mobilizar os recursos naturais e humanos desse território para fins políticos, econômicos e militares) e os processos moleculares de acumulação do capital no espaço e no tempo (o imperialismo como um processo político-econômico difuso no espaço e no tempo no qual o domínio e o uso do capital assumem a primazia). Com a primeira expressão desejo acentuar as estratégias políticas, diplomáticas e militares invocadas e usadas por um Estado (ou por algum conjunto de Estados que funcionam como bloco de poder político) em sua luta para afirmar seus interesses e realizar suas metas no mundo mais amplo. Com esta última expressão, concentro-me nas maneiras pelas quais o fluxo do poder econômico atravessa e percorre um espaço contínuo, na direção de entidades territoriais (tais como Estados ou blocos regionais de poder) ou em afastamento delas mediante as práticas cotidianas da produção, da troca, do comércio, dos fluxos de capitais, das transferências monetárias, da migração do trabalho, da transferência de tecnologia, da especulação com moedas, dos fluxos de informação, dos impulsos culturais e assim por diante. Ver em: (HARVEY, 2005. p. 31, 32).

    6 De acordo com a teoria da paridade do poder de compra (PPP), os níveis de preços nacionais seriam iguais quando mensurados em uma mesma moeda. Isso ocorreria devido à arbitragem internacional de bens, sob as hipóteses de ausência de custos de transação e de barreiras ao comércio internacional, e considerando-se informação perfeita e homogeneidade de bens. Ver em: (FREIXO; BARBOSA, 2004, p. 76).

    7 1.395,38 bilhão de habitantes. Fonte:

    8 Um dos aspectos mais inquietantes da China representa uma guerra contra os bebês do sexo feminino que resulta num aumento da população masculina. O sistema chinês de propriedade contribui para isso. As famílias camponesas recebem um lote de terra e por tradição as moças que se casam vão morar com a família do noivo e as famílias que têm filhos homens possuem melhores chances a longo prazo no sistema de distribuição da terra. Os pais de filhos homens têm maiores possibilidades de que alguém permaneça a seu lado para sustentá-los na velhice com os filhos homens mais capazes de trabalharem a terra. Outro fator é a política chinesa de planejamento familiar. A partir de 1979, o Estado obrigou os casais a terem somente um ou dois filhos. O número depende do lugar da moradia das famílias e da ordem do nascimento dos filhos. Aos casais urbanos somente se permite mais de um filho quando marido e mulher são casados pela segunda vez e desejam ter um descendente. No campo, as famílias podem legalmente ter dois filhos, desde que o primeiro a nascer seja menina. Ver em: (FISHMAN, 2006, p. 113-114).

    9 Fonte: TRADE ECONOMICS. Disponível em: . Acesso em 09 de outubro de 2019. Publicado em 09 de outubro de 2019.

    10 Monte Qomolongma (Terceira Deusa, em tibetano), denominado Sagarmatha pelos nepaleses e, em 1855 rebatizado arbitrariamente de Everest, nome do diretor inglês do Birô de Medicamentos da Índia. Ver em: (POMAR, 1987, p. 21).

    11 De acordo com uma definição, o comunismo é uma estrutura socioeconômica e ideologia política que promove a instituição de uma sociedade sem Estado, igualitária e sem classes baseadas na propriedade comum e no controle dos meios de produção e da propriedade em geral. Porém, numa outra abordagem, às vezes denominado de comunismo puro, diz respeito a uma sociedade sem Estado, sem classes e livre de opressão em que as decisões sobre o que produzir e que políticas seguir são tomadas democraticamente, possibilitando que cada membro da sociedade participe no processo de tomada de decisões nas esferas econômicas e política da vida. Ver em: (NAISBITT, 2011, p. 44)

    12 Países cujo desenvolvimento iniciou ao longo do século XX. Até lá eram considerados do terceiro mundo, resultando daí a designação resto. Ver em: (CUCO, 2016, n.p.).

    13 O Estado em maior parte dos países altamente desenvolvimento desempenhou um papel preponderante na proteção da indústria local antes de atingirem o nível de desenvolvimento que eles têm hoje, algo que é negado aos países em desenvolvimento, mas que acabou sendo importante para catapultar a economia dos países independentes dos quais a China faz parte. Ver em: (CUCO, 2016, n.p.).

    14 Crise financeira geral que teve início na crise dos subprimes, hipotecas oferecidas a clientes de qualidade de crédito inferior que eram depois agrupadas em títulos complexos e opacos cujo risco associado era de avaliação difícil, se não impossível, para os compradores. Um desiquilíbrio minúsculo que, na integração do sistema financeiro internacional a um esquema de operações financeiras securitizadas essencialmente frágil, uma vez que inovações e a especulação financeiras tornaram o sistema financeiro como um todo arriscado, se transformou numa crise de proporções globais. Ver em: (BRESSER-PEREIRA, 2012, p. 24).

    15 Guerra Fria é um termo utilizado a partir de 1946-1947, pouco depois de terminada a Segunda Guerra Mundial. Seu fim é marcado pelo período que vai da queda do muro de Berlim e o subsequente esfacelamento político dos regimes da Europa do Leste, até o momento em que a União Soviética passou para o capitalismo, entre 1989 e 1991. Apesar de se terem aliado no enfrentamento à Alemanha nazista e no acordo para uma nova ordem mundial, as potências vencedoras guardavam uma profunda desconfiança mútua criando uma tensão mundial por mais de quarenta anos entre o bloco comunista, liderados pela União Soviética, e os capitalistas, liderados pelos Estados Unidos. Ver em: (RIBERA, 2012, p. 88–89).

    2. A ASCENSÃO DO DRAGÃO CHINÊS: AS TRANSFORMAÇÕES PÓS-1949

    Na China estamos na presença de dois comboios que se afastam sintetizados no subdesenvolvimento. Sim, um desses dois comboios é muito rápido, ou outro de velocidade mais reduzida: por causa disso, a distância entre os dois aumenta progressivamente, mas não podemos esquecer que os dois avançam na mesma direção; e também é preciso lembrar que não faltam esforços para acelerar a velocidade do comboio relativamente menos rápido e que, de qualquer modo, dado o processo de urbanização, os passageiros do comboio muito rápido são cada vez mais numerosos. No âmbito do capitalismo, pelo contrário, os dois comboios em questão avançam em direções opostas. A última crise pôs em destaque um processo em ação há várias décadas: o aumento da miséria das massas populares e o desmantelamento do Estado social encontram-se a par da concentração da riqueza nas mãos de uma oligarquia parasitária restrita (LOSURDO, 2011 apud JABBOUR, 2012, p. 45).

    2.1 INTRODUÇÃO

    O presente capítulo tem como objetivo analisar como se deu o processo de transformação e crescimento da economia chinesa. A partir das teses de pensadores e pesquisadores que se propuseram a estudar e observar um fenômeno único na humanidade, dada a celeridade e a escala, tem-se a intenção de descrever as inflexões históricas como a revolução que levou ao poder o Partido Comunista Chinês em 1949, o processo de abertura comercial chinesa a partir de 1978 e demais fatores importantes que fizeram desse país nesse século XXI ser reconhecido como a fábrica do mundo e que acabaram por propiciar uma revolução de costumes e que apresenta uma China moderna e protagonista no mundo.

    Para uma reflexão inicial sobre o crescimento chinês: se em 1949 planejou-se o desenvolvimento pelo socialismo preconizado por Karl Marx, ao final da década de 1970, escancara-se todas as características do capitalismo, principalmente verificadas no Reino Unido, criticadas pelo próprio Marx no século XIX. A principal lei econômica tendencial do movimento do capital, a da queda da taxa de lucro¹⁶ e as medidas contrariantes a essa lei servem como base para entender o que acontece com o país de dois sistemas¹⁷. Boa parte das contra tendências à queda da taxa de lucro¹⁸ chegam a China, maturadas e ávidas de valoração do capital.

    Xuan & Doria (2016) fazem observações importantes sobre o papel desempenhado pela ideologia em regimes comunistas onde ocupa posição central fundamentando teoricamente as justificativas da revolução, das ações políticas, das instituições do Estado explicando as questões teórico-práticas que envolvem a sociedade humana, oferecendo uma perspectiva racional para a construção de uma sociedade ideal:

    Os desafios impostos pela prática revolucionária na China demonstraram a importância da ideologia no estabelecimento, desenvolvimento e manutenção do sistema político comunista. As ideias que fundamentam toda a construção estatal da Nova China estão arraigadas no marxismo que vai desde o próprio Marx, Lênin, Stálin, Mao Tsé-Tung até os desenvolvimentos mais recentes centralizados na liderança coletiva de Xi Jinping (XUAN; DORIA, 2016, p. 118).

    É preciso lembrar que para Marx, se quisermos conhecer uma sociedade, saber como ela de fato é, como funciona, temos de olhar para seu lado material, isto é, temos de investigar de que forma esta sociedade sobrevive e se reproduz materialmente.

    Ao final da década de 1970, a China resolve abrir-se ao mercado usufruindo de uma globalização praticada pelos países capitalistas centrais com claros objetivos de revertimento para esses, daquilo que Marx (2011) colocara como a principal lei econômica tendencial do movimento do capital, a queda da taxa de lucro. A partir de então, na China, sob comando de

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