O círculo polar ártico: Questão geopolítica ou objeto de cooperação internacional?
By Laura Luzzi
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Estruturado em quatro capítulos, o livro apresenta os aspectos fisiográficos, ambientais e humanos que caracterizam o Círculo Polar Ártico contemporâneo e os interesses geopolíticos frente às mudanças ambientais, discutindo a aplicabilidade do direito internacional marítimo e a cooperação internacional nessa região.
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O círculo polar ártico - Laura Luzzi
INTRODUÇÃO
O objeto de estudo deste livro é a região do Círculo Polar Ártico, observado pelas vias da cooperação internacional e também das disputas geopolíticas que podem impactar sobre a região. Nesta perspectiva o foco é a área e não apenas um tema específico, no qual será abordado as variáveis internacionais que envolvem as mudanças ambientais e disputas territoriais que afetam o Círculo Polar Ártico contemporâneo, as quais podem ser concebidas como resultantes do aumento da importância deste espaço geográfico para as nações. Deste modo, observa-se o princípio do direito internacional marítimo, a questão/gestão ambiental, os interesses geopolíticos dos Estados, e as possibilidades de cooperação internacional na região.
A área de estudos de Relações Internacionais admite uma multidisciplinaridade de questões que, a critério da mente que as investiga, se constituem em fenômenos internacionais, os quais contribuem para moldar as teorias do campo de estudo e, consequentemente, estas influenciam como as pessoas encaram e lidam com a realidade. Este desafio possibilita aos estudiosos da área compreender e até influenciar os filtros utilizados para interpretar o mundo. Aplica-se, deste modo, o mesmo princípio para buscar entender as principais variáveis que afetam a região do Círculo Polar Ártico.
As mudanças em curso no planeta e o potencial do Círculo Polar Ártico afetam a agenda internacional, dado que questões ambientais, acesso aos recursos e às rotas de trânsito marítimas na região estão cada vez em maior evidência. Estes aspectos, principalmente se confirmadas as previsões quanto às mudanças climáticas, afetam principalmente os países lindeiros à região: Canadá, Estados Unidos, Islândia, Rússia, Noruega, Dinamarca, Suécia e Finlândia, e as seis organizações internacionais que representam indígenas da região¹ (Arctic Council, 2015). Em sentido geral, estas questões têm potencial de alterar a dinâmica das relações internacionais uma vez que os polos são as duas áreas restantes do planeta sem soberania, e o mar público
tem se tornado cada vez mais restrito devido à busca por mais recursos.
A partir de diferentes abordagens, pode-se notar efeitos diversos. Por este motivo, é importante explorar algumas das principais facetas que estão mudando as relações internacionais no espaço compreendido pelo Círculo Polar Ártico. No aspecto ambiental, a região é muito dependente do degelo e dos congelamentos anuais. Por isso, se houver maior aquecimento do clima, a área pode ser alvo de maiores níveis de exploração pelos países que a cercam. Consequentemente, novas possibilidades de acesso à área intensificam os interesses econômicos e políticos em obter direitos de navegação e de acesso a recursos ainda inexplorados. Logo, estes aspectos tornam-se pontos de possíveis conflitos.
As oportunidades econômicas como exclusividade de pesca e extração de petróleo, de minerais e outros recursos produzem novas implicações para os países da região. Ainda, questões de segurança também devem ser levadas em consideração, dado que o Oceano Ártico interliga três continentes: a América do Norte, a Europa e Ásia.
A soberania sobre esta área, e com isso a permissão de acessar os recursos nela contidos, é uma questão disputada não só por países lindeiros, mas, também, de outros países com interesses econômicos na região (Arctic Council, 2015). Esta perspectiva afeta outra questão, a do direito dos mares. Isto implica em trabalhar a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982 (CNUSDM) para delimitar as ações dos países desta região em relação a manifestações de reivindicações nacionais de ampliação da zona econômica exclusiva sobre a plataforma continental dos países lindeiros à região que complicam a delimitação de fronteiras consentidas entre os Estados da região (Rosenthal, 2012).
Levando em consideração esses fatores, novos desafios emergem. Com esta perspectiva, o livro explora quatro questões principais acerca da região ártica: a) qual é a importância do Círculo Polar Ártico para o ambiente planetário?; b) de que forma as mudanças físicas atuais sobre o Ártico refletem nos interesses geopolíticos, considerando a atuação dos Estados lindeiros à região do Círculo Polar Ártico?; c) como o direito internacional marítimo e a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982 vêm sendo observados na região do Círculo Polar Ártico?; e d) quais os principais fatores que interferem nos processos de cooperação internacional, considerando-se a relação de governança regional e os interesses dos Estados envolvidos?
Partindo dessas questões, o objetivo geral do livro envolve caracterizar a importância do Círculo Polar Ártico terrestre em termos dos aspectos ambientais e fisiográficos, dos interesses geopolíticos, das disputas territoriais no âmbito do direito internacional marítimo, e da possibilidade de cooperação regional. A metodologia usada envolveu pesquisas bibliográficas exploratórias sobre a região do Círculo Polar Ártico para estabelecer um conjunto de autores que possibilitam detalhar as principais características do objeto de estudo. A partir de fontes primárias e secundárias, a coleta de dados relativos a cada etapa do estudo foi realizada pelo método qualitativo, com auxílio da coleta de dados pela internet.
Dado o exposto, o tema destrincha-se em quatro capítulos, cada um tratando de um aspecto da região Ártica. A primeira seção detalha os aspectos fisiográficos, ambientais e humanos que caracterizam o Círculo Polar Ártico contemporâneo para apresentar a área de estudo, de modo a compreender como os países estão posicionados na área em função destes aspectos. Com essa perspectiva, são apresentadas as principais características deste espaço com o auxílio de mapas confeccionados com base em projeção azimutal, e relatórios descritivos da região Ártica.
A segunda seção aborda os interesses geopolíticos frente as mudanças ambientais. Aqui aborda-se as principais teorias clássicas geopolíticas de poder marítimo, terrestre e aéreo, para apresentar os diferentes interesses que se configuram na região em sentido de confronto ou convergência de interesses na região.
A terceira seção discute a aplicabilidade do direito internacional marítimo sobre a região do Círculo Polar Ártico, tendo como referências a CNUSDM de 1982 para buscar entender como os princípios são abordados pelas atuais disputas da região.
Por fim, a quarta e última seção discute a cooperação internacional no Círculo Polar Ártico considerando-se a governança regional, suas limitações e os interesses dos Estados. Nesta, busca-se trabalhar a possibilidade do aprofundamento da cooperação na área e apresentar as limitações à formação de uma governança ou regime internacional, tendo-se como base de comparação os interesses manifestados pelos Estados lindeiros.
Nota
1. Aleut International Association, Arctic Athabaskan Council, Gwich’in Council International, Inuit Circumpolar Council, Russian Association of Indigenous Peoples of the North, e Saami Council (Arctic Council, 2015).
1. A REGIÃO DO CÍRCULO POLAR ÁRTICO
A etapa inicial desta pesquisa busca delimitar a região estudada e detalhar os aspectos fisiográficos, climáticos e humanos do Círculo Polar Ártico contemporâneo. O estudo envolve o uso de mapas confeccionados com base em projeção azimutal, os quais servirão para examinar detidamente a configuração geográfica e ambiental da área do Círculo Polar Ártico (CPA).
O usual mapa mundial que utiliza a Projeção² de Mercator e/ou a de Peters, entre outras mais, para caracterizar a distribuição dos países, distorce as formas das áreas geográficas das regiões polares. Por isso, os mapas estudados neste capítulo são aqueles confeccionados com base em projeção azimutal, estratégia de mapeamento que permite elaborar uma imagem equidistante, mas quase que idêntica à forma da área representada. Todavia, esta imagem ainda sofre distorções conforme se afasta do centro, mas ainda é a melhor forma de projeção cartográfica para representar áreas próximas aos polos do planeta (Azevedo de Vasconcello, 2016).
Além disso, o levantamento inclui dados estatísticos para abordar o clima e as principais características das populações aí presentes. O importante é entender como as características ambientais, fisiográficas e humanas afetam a atuação dos atores nesta região,