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Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários  aos professores independentes e/ou itinerantes  de filosofia natural e experimental  na Inglaterra do século XVIII
Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários  aos professores independentes e/ou itinerantes  de filosofia natural e experimental  na Inglaterra do século XVIII
Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários  aos professores independentes e/ou itinerantes  de filosofia natural e experimental  na Inglaterra do século XVIII
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Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários aos professores independentes e/ou itinerantes de filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII

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About this ebook

A visão de uma Filosofia Natural e Experimental triunfante (também Empirista e Mecanicista), baseada nos Principia e na Opticks de Isaac Newton, apontava para a existência de um novo tipo de conhecimento que poderia ser "aplicado" às necessidades da população, principalmente no âmbito da produção material. Passou-se a cultivar amplamente a ideia de que as forças da natureza, objetiva, mecânica e matematizada, poderiam ser colocadas a serviço da Humanidade, proporcionando-lhe bem-estar e reduzindo-lhe o fardo do trabalho.

A ideia de um "Conhecimento Útil e Aplicado", relacionado às necessidades das atividades industriais e ao bem-estar da população do país, constituiu-se num dos mais importantes aspectos da Ilustração na Inglaterra do século XVIII (sobretudo, na segunda metade deste século) e numa poderosa alavanca intelectual que contribuiu para a emergência da Revolução Industrial, a partir dos anos 1780.

O interesse pelo conhecimento filosófico-científico aplicado e experimental transcendeu à esfera dos pequenos grupos de formação universitária e altamente letrados e passou a ser cultivado pelos segmentos sociais mais diferenciados, desde cavalheiros e damas cujo único interesse era um aprendizado para seu refinamento social até proprietários manufatureiros, engenheiros e mecânicos que procuravam aplicar esse novo conhecimento às necessidades cotidianas das indústrias e da produção e ao aperfeiçoamento do maquinismo utilizado. Mas, foram, principalmente, os industriais, engenheiros e mecânicos, através da sua prática cotidiana, que puderam assimilar os princípios da Filosofia Natural e Experimental Newtoniana e empregá-los em suas atividades de desenvolvimento de máquinas e na formulação de uma nova organização técnico-industrial.

Em Londres, Westminster e nas principais cidades do interior, professores independentes e/ou itinerantes (viajantes) começaram a ministrar cursos de Filosofia Natural e Experimental para uma audiência bastante diversificada, que, além de pagar pelas lições recebidas, era estimulada a adquirir os programas de cursos ou roteiros de aulas (syllabuses), os manuais (textbooks) ou eventuais compêndios elaborados por estes professores. Eles não apenas foram representantes de uma vertente mais popular, pragmática e andarilha da Ilustração inglesa e britânica, como também foram responsáveis pela preparação intelectual de diversas gerações de homens e mulheres das "classes médias", que conceberam a possibilidade de uma nova realidade econômica, política e social que levou à constituição de uma sociedade capitalista-industrial plena, no século seguinte. Os professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental foram homens que ajudaram a criar este novo mundo.
LanguagePortuguês
Publisher7Letras
Release dateMay 19, 2022
ISBN9786559052257
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    Newtonianos no mercado - Luiz Carlos Soares

    newtonianos_capa_epub.jpg

    Sumário

    Apresentação e agradecimentos.

    introdução

    Considerações prévias sobre a Filosofia Natural e Experimental, sua fundamentação Newtoniana, o contexto histórico de sua difusão e os professores independentes e/ou itinerantes.

    capítulo 1

    Os primeiros professores universitários de Filosofia Natural e Experimental Newtoniana.

    Introdução

    1) David Gregory: um anglicano conservador escocês em Oxford e o Ensino do Newtonianismo.

    2) John Keill: seu método de demonstração experimental dos princípios Newtonianos em Oxford e sua agressiva participação na polêmica com Leibniz.

    3) William Whiston: sucessor de Newton em Cambridge e sua teologia herética.

    4) Roger Cotes: revisor e editor da segunda edição dos Principia e sua breve carreira em Cambridge – seu primo e executor literário Robert Smith.

    Conclusão.

    capítulo 2

    Os primeiros professores independentes de Filosofia Natural e Experimental e a formação do círculo metropolitano nas primeiras décadas do século XVIII.

    Introdução

    1) John Harris: o primeiro enciclopedista do século xviii.

    2) Francis Hauksbee, O Velho: fabricante de instrumentos filosófico-científicos e curador da Royal Society de Londres.

    3) Humphry Ditton: sua atuação como professor independente e na Royal Mathematical School.

    4) James Hodgson: da sua atuação independente a professor da Royal Mathematical School.

    Conclusão

    capítulo 3

    A segunda geração de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental e a consolidação do círculo metropolitano: um primeiro grupo desta geração.

    Introdução

    1) William Whiston: encontrando uma forma de sobrevivência como professor independente na região metropolitana.

    2) Francis Hauksbee, O Jovem: de fabricante de instrumentos filosófico-científicos a escriturário e caseiro da Royal Society de Londres.

    3) Peter Shaw: de professor independente de Química à pratica da Medicina.

    4) James Jurin: um pioneiro professor de Filosofia Natural e Experimental em Newcastle-Upon-Tyne, no Nordeste da Inglaterra.

    5) John Horsley: também um pioneiro professor de Filosofia Natural e Experimental em Morpeth e Newcastle-Upon-Tyne, no Nordeste da Inglaterra.

    Conclusão

    capítulo 4

    Ainda a segunda geração de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental: os professores da Academia de Little Tower Street, em Londres.

    Introdução

    1) Thomas Watts: sua atuação na Academia de ensino por ele fundada e no mundo empresarial londrino.

    2) Benjamin Worster: professor independente e da Academia de Little Tower Street – sua breve carreira.

    3) James Stirling: um escocês jacobita e sua atuação como professor independente e da Academia de Little Tower Street.

    Conclusão

    capítulo 5

    John Theophilus Desaguliers: o curador da Royal Society de Londres entre a patronagem e o mercado e a constituição de um modelo para os cursos de Filosofia Natural e Experimental.

    Introdução

    1) A trajetória de vida de John Theophilus Desaguliers.

    2) Os cursos de Filosofia Natural e Experimental ministrados por John Theophilus Desaguliers e suas publicações.

    Conclusão: Desaguliers entre a patronagem e o mercado.

    capítulo 6

    A terceira geração de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental e os primeiros professores itinerantes: dois discípulos de John Theophilus Desaguliers (Erasmus King e Stephen Demainbray).

    Introdução: um panorama geral sobre a terceira geração de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental

    1) Erasmus King: de assistente de Desaguliers a um reconhecido experimentador e professor independente na região metropolitana.

    2) Stephen Demainbray: o discípulo de Desaguliers que se tornou professor independente e itinerante e, posteriormente, superintendente do Observatório Real de Kew.

    Conclusão

    capítulo 7

    Benjamin Martin: professor itinerante, fabricante de instrumentos filosófico-científicos e o maior divulgador da Filosofia Natural e Experimental Newtoniana na Inglaterra do século xviii.

    Introdução

    1) Aspectos da trajetória pessoal e profissional de Benjamin Martin.

    2) Benjamin Martin e a divulgação da Filosofia Natural e Experimental Newtoniana: suas principais obras.

    Conclusão

    capítulo 8

    James Ferguson: o menino pastor escocês que se transformou num dos mais reconhecidos professores independentes e itinerantes de Filosofia Natural e Experimental Newtoniana na Inglaterra setecentista.

    Introdução

    1) A trajetória pessoal e profissional de James Ferguson: do menino pastor ao reconhecido astrônomo e professor independente e itinerante.

    2) As principais obras de James Ferguson e a divulgação da Astronomia e da Filosofia Natural e Experimental Newtonianas.

    Conclusão.

    capítulo 9

    Os demais professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental integrantes da terceira geração.

    Introdução.

    1) William Lewis: professor independente e a consolidação da Química como campo autônomo de conhecimento.

    2) Caleb Rotheram: da sua Academia Dissidente em Kendal às atividades como professor itinerante.

    3) William Griffiss: um professor independente e itinerante de longa carreira.

    4) Isaac Thompson: impressor, editor e professor independente em Newcastle-Upon-Tyne, no Nordeste da Inglaterra.

    5) Thomas Peat: topógrafo, contador, editor e professor independente na cidade de Nottingham, nas East Midlands.

    6) Benjamin Rackstrow: seus experimentos elétricos e seu Museu de Curiosidades em Londres.

    7) Mais alguns professores independentes e/ou itinerantes da terceira geração.

    Conclusão.

    capítulo 10

    A quarta geração de professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental.

    Introdução

    1) John Arden: das aulas na sua Escola de Derby à vida de professor itinerante.

    2) Adam Walker: das aulas na sua Academia de Ensino, em Manchester, à vida de professor itinerante e sua mudança para Londres.

    3) John Warltire: o professor itinerante mais próximo do círculo da Lunar Society de Birmingham.

    4) Outros professores independentes e/ou itinerantes da quarta geração.

    4.1) Thomas Newberry.

    4.2) Robert Gibson.

    4.3) Charles Hutton.

    4.4) Henry Clarke.

    CONCLUSÃO

    capítulo 11

    Benjamin Donn: um professor de Matemática e Filosofia Natural e Experimental no Sudoeste da Inglaterra.

    Introdução

    1) A trajetória de Benjamin Donn e suas atividades profissionais.

    2) As principais publicações de Benjamin Donn relativas ao Ensino da Filosofia Natural e Experimental.

    Conclusão

    capítulo 12

    A quinta geração de professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental

    Introdução

    1) John Banks: professor itinerante natural de Kendal, no Noroeste da Inglaterra, sua atuação a partir de Manchester e seu conhecimento sobre máquinas e motores.

    2) Henry Moyes: o professor itinerante escocês cego.

    3) James Dinwiddie: o professor itinerante escocês que viajou para o Extremo Oriente.

    4) I. Atkinson: outro professor itinerante originário da cidade de Kendal, no Noroeste da Inglaterra.

    5) Gustavus Katterfelto: o professor itinerante alemão.

    6) Professores independentes com outras ocupações prioritárias: Peter Clare e John Dalton.

    Conclusão.

    capítulo 13

    George Adams Junior: fabricante de instrumentos filosófico-científicos e autor – Um caso muito especial.

    Introdução

    1) Alguns aspectos da trajetória pessoal e profissional de George Adams Junior.

    2) As publicações de George Adams Juniors e as suas Lectures On Natural And Experimental Philosophy.

    Conclusão.

    capítulo 14

    Os subscritores dos livros de John Harris, John Theophilus Desaguliers, Benjamin Martin, John Banks e Benjamin Donn: uma tentativa de identificação das audiências dos professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental.

    Introdução.

    1) Os subscritores do livro Lexicon Technicum: or, an universal dictionary of arts and sciences, de John Harris.

    2) Os subscritores do livro A course of experimental philosophy, de John Theophilus Desaguliers.

    3) Os subscritores do livro Bibliotheca Technologica: or, a philological library of literary arts and sciences, de Benjamin Martin.

    4) Os subscritores do livro A treatise on mills, in four parts, de John Banks.

    5) Os subscritores do livro An essay on mechanical geometry, chiefly explanatory of a set of schemes and models, de Benjamin Donn.

    Conclusão.

    Considerações finais

    Bibliografia

    1) Fontes primárias consultadas e/ou citadas.

    1.1) Publicações dos primeiros professores universitários de filosofia natural e experimental em Oxford e Cambridge.

    1.2) Publicações dos professores independentes e/ou itinerantes de filosofia natural e experimental

    1.3) Publicações de outros autores contemporâneos.

    2) Fontes secundárias consultadas e/ou citadas.

    2.1) Impressas.

    2.2) Eletrônicas.

    Sobre o autor

    Para Natália e Alice, minhas netas queridas que representam um sopro de vida, esperança e mudança nestes tempos tão difíceis que enfrentamos no Brasil.

    It was said of Socrates, that he brought Philosophy down from Heaven, to inhabit among Men; and I shall be ambitious to have it said of me, that I have brought Philosophy out of Closets and Libraries, Schools and Colleges, to dwell in Clubs and Assemblies, at Tea-Tables and in Coffee-Houses.

    Foi dito que Sócrates trouxe a Filosofia do Céu para viver entre os Homens; e Eu terei a Ambição de que seja dito de mim, que tirei a Filosofia de Gabinetes e Bibliotecas, Escolas e Faculdades, para residir em Clubes e Reuniões, em Mesas de Chá e em Casas de Café.

    – Joseph ADDISON e Richard STEELE – The Spectator (Número 10, 12 de março de 1711, Segunda-Feira). The British Classics, Volume 5 ("Containing the First Volume of The Spectator"). Londres, C. Whittingham, 1803, p. 49.

    Apresentação e agradecimentos.

    O presente livro, Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários aos professores independentes e/ou itinerantes de filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII, é resultado de um longo período de pesquisas mais sistemáticas que se estende por cerca de 10 anos. Na realidade, eu já tinha adiantado algumas preocupações, em relação ao tema agora tratado, no segundo capítulo do livro, que publiquei em 2007, com o título A Albion revisitada: ciência, religião, ilustração e comercialização do lazer na Inglaterra do século XVIII (Rio de Janeiro, FAPERJ/7Letras). Este segundo capítulo, intitulado O Mecanicismo Newtoniano e a ideia de ciência aplicada na Inglaterra do século XVIII, apresentava um item específico (Um inventário dos manuais e programas de cursos dos professores independentes e/ou itinerantes), no qual eu já procurava associar as atividades destes professores de Filosofia Natural e Experimental aos processos de ampla divulgação do Newtonianismo e constituição de um ideal de Conhecimento Útil e Aplicado na sociedade inglesa ao longo daquele século.

    Na realidade, o capítulo e o item supramencionados de A Albion revisitada acabaram se constituindo na base de um projeto de pesquisa que desenvolvi desde a publicação daquele livro, que nem sempre pude adiantar com a rapidez originalmente desejada devido às urgências da minha vida pessoal e profissional que, em alguns momentos, obrigaram a me afastar das pesquisas documentais e das leituras de obras secundárias por algum tempo. Mas, apesar de algumas paralisações, sempre mantive o foco no desenvolvimento deste projeto de pesquisa, realizando consultas na Seção de Livros Raros e na Sala de Leituras (Reading Room) da British Library (Biblioteca Britânica), em Saint Pancras, Londres, quando as condições financeiras e disponibilidade de tempo me permitiam, procurando também me atualizar acerca das obras secundárias lançadas que abordavam meu tema de investigação direta ou indiretamente. Mais recentemente, o desenvolvimento do projeto foi facilitado através do fornecimento de obras raras digitalizadas por algumas universidades e instituições científicas nas suas páginas na internet.

    O processo de redação de Newtonianos no mercado se realizou em diversos momentos ao longo dos últimos dez anos, inclusive com a publicação de artigos em periódicos e textos em anais de congressos que tratavam das trajetórias profissionais e intelectuais de alguns destes professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental. Todavia, este material anteriormente publicado foi revisto e ampliado quando iniciei o processo de redação mais definitiva dos capítulos do presente livro, nos últimos três anos, período este que, em parte, coincidiu com as minhas atividades como Professor Visitante Sênior do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências (PPGEFHC) da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Estadual de Feira de Santana (entre agosto de 2018 e agosto de 2020), residindo parcialmente em Salvador.

    Paradoxalmente, o confinamento ao qual me submeto desde março de 2020, devido à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), contribuiu para que eu pudesse me concentrar nesta reta final do processo de redação de Newtonianos no mercado. Mas, como imprevistos sempre acontecem (e no meu caso pessoal, positivamente), este processo de redação acabou possibilitando a publicação de um outro livro em novembro de 2020, A filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII: um diálogo com a historiografia acerca da ideia de Ciência na Era das Luzes (Rio de Janeiro, 7Letras), voltado para uma discussão historiográfica relacionada ao meu objeto geral de pesquisa, o que será melhor explicado na introdução do presente livro.

    Assim, ainda submetido ao confinamento, pude concluir a redação de Newtonianos no mercado praticamente no mesmo momento em que tomei as duas doses da vacina para imunização contra a Covid-19, em abril de 2021. Certamente, esta é uma coincidência bastante feliz para a minha vida pessoal e profissional. Espero que um processo de vacinação em massa seja logo estabelecido no Brasil, e em todo o mundo, para que possamos voltar a rever nossos familiares e amigos, a trabalhar presencialmente, a nos deslocar pelo mundo sem medo de sermos contaminados pelo novo coronavírus e neutralizar a ação dos negacionistas que dificultam o enfrentamento sério a esta pandemia.

    Para a elaboração de Newtonianos no mercado, durante o longo período mencionado, muitas pessoas me deram apoio direto ou indireto no desenvolvimento das atividades necessárias para a pesquisa. Primeiramente, gostaria de agradecer aos amigos Roberto Cardoso de Almeida e Peter Johansen, que, por muitas vezes, me receberam generosamente como hóspede especial em sua casa, em Seven Sisters, praticamente transformando-a em minha base de operação londrina para realização de pesquisas na British Library e outras bibliotecas da Universidade de Londres. Mais recentemente, esta generosidade tem sido compartilhada pela amiga Gisleine Maitland, recebendo-me em sua casa, em Greenford (Middlesex), que tem se tornado a minha outra base de operação na região londrina.

    À minha esposa Marília, ao meu filho Marcelo e às minhas netas Natália e Alice, gostaria de lhes agradecer pelo apoio constante e pela compreensão em relação aos momentos de minha ausência doméstica, devido às diversas viagens e às necessidades do trabalho presencial em Salvador, nos dois anos em que residi parcialmente nesta cidade.

    Nesta temporada soteropolitana, contei também com o apoio direto e a amizade de Teresa Sacchet, Magali Gouveia Engel, Márcia Paraquett, Estela Aquino, Maurício Barreto e Olival Freire Junior, com os quais dividi momentos de lazer e discussões inquietantes sobre o difícil momento político e social que estamos vivendo no Brasil.

    Gostaria de manifestar também meu agradecimento aos colegas Átila Augusto Vilar de Almeida, professor de História Antiga e Medieval da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e Maurício Pamplona, arquiteto e geógrafo, professor da Universidade do Extremo Sul Catarinense – Criciúma (UNESC). Átila Augusto prestou-me um precioso auxílio na tradução de textos em latim, enquanto Maurício Pamplona foi responsável pela elaboração do mapa com os condados históricos dos Reinos da Grã-Bretanha e da Irlanda, com a indicação de suas principais cidades, apresentado na Ilustração 1 do presente livro.

    No plano institucional, gostaria de agradecer primeiramente aos meus colegas professores e aos alunos do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense, minha Alma Mater, pelo apoio que me ofereceram durante a minha longa carreira nesta instituição. Apesar de ter me aposentado da UFF em 2012, continuo vinculado como Professor Permanente ao Programa de Pós-Graduação em História e à Companhia das Índias – Núcleo de História Ibérica e Colonial na Época Moderna, onde atuo mais diretamente. Aqui, vai o meu agradecimento coletivo a todos os colegas professores e amigos que fazem ou fizeram parte da Companhia das Índias – Célia Tavares, Daniela Calainho, Elisa Frühauf Garcia, Maria Fernanda Bicalho, Georgina Silva dos Santos, Guilherme Pereira das Neves, Luciano Figueiredo, Marcelo Wanderley, Márcia Motta, Renato Franco, Rodrigo Bentes Monteiro, Ronald Raminelli, Rogério Ribas (in memoriam), Ronaldo Vainfas, Sheila de Castro Farias e Silvia Patuzzi –, pelo apoio e por terem recebido em seus quadros este estranho no ninho, vinculado à História das Ciências e à História da Inglaterra Moderna.

    Gostaria de agradecer também aos meus colegas professores e aos alunos do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (HCTE-UFRJ), ao qual estive vinculado como Professor Visitante Sênior e Colaborador, entre 2012 e 2017, que me propiciou um espaço de debate estimulante em que algumas ideias do presente livro puderam ser discutidas, como também diversas questões de natureza teórica e epistemológica. No HCTE-UFRJ, gostaria de agradecer especialmente aos Professores Saul Fuks (in memoriam), Ricardo Silva Kubrusly, Regina Maria Macedo Costa Dantas, Nadja Paraense dos Santos, Ivan da Costa Marques, Henrique Luiz Cukierman, José Carlos de Oliveira e Carlos Bevenuto Guisard Koehler, que me ajudaram bastante, tanto institucional quanto academicamente, na minha adaptação a um novo ambiente de trabalho, logo depois da minha aposentadoria da Universidade Federal Fluminense.

    No âmbito institucional, o meu agradecimento vai ainda para os colegas professores e os alunos do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Estadual de Feira de Santana (PPGEFHC), onde, como já mencionado anteriormente, atuei como Professor Visitante Sênior entre 2018 e 2020. O PPGEFHC também se constitui num espaço estimulante de debate, ao qual ainda estou vinculado, agora na condição de Professor Colaborador, no qual pude discutir diversos temas vinculados ao presente livro e ao âmbito geral da História das Ciências. Ainda relacionado ao PPGEFHC, gostaria de destacar o apoio pessoal e institucional recebido dos colegas e amigos Olival Freire Junior, Andreia Maria Pereira de Oliveira, Indianara Lima Silva e Claudia de Alencar Serra e Sepúlveda, apoio este que foi fundamental para o bom resultado do trabalho que desenvolvi mais diretamente em Salvador, nos dois anos mencionados.

    Gostaria de destinar um primeiro agradecimento especial aos funcionários da Seção de Obras Raras e da Sala de Leitura da British Library, em Saint Pancras, Londres, que foram extremamente atenciosos e compreensivos em relação às minhas urgências para reprodução de material e acesso aos livros requisitados, em função do tempo limitado em que eu podia permanecer na cidade.

    Um agradecimento especial também às administrações da National Gallery de Londres, da National Portrait Gallery de Londres, do Salford Museum & Art Gallery do Grande Manchester, da Coleção Joseph Wright do Museum and Art Gallery de Derby, da Coleção Paul Mellon do Yale Center for British Art (Universidade de Yale), da Coleção da Capela do Trinity College da Universidade de Cambridge, da Coleção do Harris Manchester College da Universidade de Oxford, das Coleções Digitais das Smithsonian Institute Libraries de Washington (DC) e da Coleção do Science Museum Group de Londres que me concederam autorização para a reprodução de pinturas e imagens do seu acervo. Devo enfatizar que a National Portrait Gallery de Londres, o Museum and Art Gallery de Derby, o Yale Center for British Art, o Trinity College de Cambridge, o Harris Manchester College de Oxford e as Smithsonian Institute Libraries de Washington (DC) me forneceram imagens em alta resolução, sem qualquer custo.

    Por último, mas não menos importante, o meu agradecimento também especial à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Minha gratidão à FAPERJ se deve ao fato de que de 2002 a 2011 fui agraciado com a prestigiosa Bolsa de Cientista do Nosso Estado e, de 2012 a 2018, com a Bolsa relativa ao desempenho do cargo de Coordenador da Área de História dessa agência, auxílios estes que foram fundamentais para o desenvolvimento de meus estudos e aquisição de material. Já o CNPq tem me fornecido o precioso auxílio financeiro relativo à também prestigiosa Bolsa de Produtividade em Pesquisa Nível 1-A, que vem possibilitando o desenvolvimento de meus estudos, compra de livros, reprodução de material e viagens nacionais e internacionais para pesquisas e participações em congressos e eventos científicos.

    Que o nosso CNPq possa superar o momento de dificuldades institucionais, políticas e financeiras que atravessa e ampliar a sua missão de fomento ao desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro, sempre incorporando novos quadros de pesquisadores, que são a espinha dorsal deste desenvolvimento. Longa vida também para a FAPERJ e o fortalecimento da sua missão de apoiar o desenvolvimento científico e tecnológico do Estado do Rio de Janeiro, através dos diversos tipos de auxílio a pesquisadores, professores e estudantes das universidades sediadas neste estado.

    Rio de Janeiro, maio de 2021.

    introdução

    Considerações prévias sobre a Filosofia Natural e Experimental, sua fundamentação Newtoniana, o contexto histórico de sua difusão e os professores independentes e/ou itinerantes.

    O plano inicial de elaboração do presente livro, Newtonianos no mercado: dos primeiros professores universitários aos professores independentes e/ou itinerantes de filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII, pressupunha o desenvolvimento de um primeiro capítulo que iria focalizar o debate historiográfico multifacetado sobre a ideia de Ciência na Inglaterra, e por extensão na Grã-Bretanha, do século XVIII. Na realidade, este seria o último capítulo do livro a ser escrito e, no início de 2020, começamos a elaborá-lo e finalizamos este processo em meados do referido ano. Todavia, como o texto resultante ficou por demais extenso para o capítulo planejado, visualizamos a oportunidade de publicá-lo como um livro independente, principalmente em função do grande detalhamento dos argumentos dos historiadores consultados, que apresentavam uma grande variedade de posições historiográficas, a partir das quais pudemos estabelecer uma síntese fundamentadora da nossa perspectiva de caracterização do campo da Ciência físico-natural inglesa e britânica como uma Filosofia Natural e Experimental.

    O livro supramencionado foi publicado no final de 2020 com o título de A filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII: um diálogo com a historiografia acerca da ideia de Ciência na Era das Luzes e, no seu oitavo e último capítulo, A ideia de ‘ciência’ na Inglaterra do século XVIII, apresentamos a nossa argumentação sobre a propriedade de caracterizarmos o conhecimento físico-natural produzido neste país, nos setecentos, como uma Filosofia Natural e Experimental.¹ Nos capítulos anteriores, são apresentadas as considerações dos diversos historiadores estudados acerca da natureza da Ciência inglesa setecentista, desde as primeiras reflexões inovadoras dos historiadores Albert E. Musson e Eric Robinson, em seu livro Science and technology in the Industrial Revolution, de 1969, em que, pela primeira vez, eram enfatizadas, de forma mais aprofundada, as relações da Ciência e da Tecnologia setecentistas com o processo de emergência da Revolução Industrial.² A posição destes dois historiadores era bastante distinta daquela defendida por consagrados historiadores como, por exemplo, John D. Bernal (historiador da Ciência), e Eric J. Hobsbawm (historiador econômico-social), que procuravam mostrar a inexistência de uma relação mais direta entre o desenvolvimento filosófico-científico do século XVIII e as grandes transformações econômicas que se verificaram na Inglaterra a partir das décadas finais daquele século.³

    Vimos, ao longo do debate historiográfico apresentado em A filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII, os posicionamentos e as contribuições de diversos historiadores para o entendimento da natureza conceitual da Ciência e da relação desta com o contexto econômico, político e cultural da Inglaterra setecentista (Margaret C. Jacob, Larry Stewart, Jan Golinski, Paul A. Elliot, Joel Mokyr, Peter M. Jones, Simon Schaffer, Bernadette Bensaude-Vincent e Christine Blondel, Hsiang-Fu Huang, Al Coppola, Alan Q. Morton e Jane A. Wess, Alice N. Walters, Patricia Fara).⁴ Verificamos, portanto, que diversos termos poderiam ser utilizados para denominar esta Ciência setecentista: Ciência Newtoniana, Ciência Experimental, Ciência Ilustrada, Ciência Útil e Aplicada, Ciência Pública, Ciência-Espetáculo, Ciência Polida etc. Obviamente, estas diversas denominações apresentavam significados diversos para a ideia de Ciência, mas esta diversidade não significava, por sua vez, antagonismos e contradições conceituais. Muito pelo contrário. Esta diversidade representava a existência de formas de significação múltiplas, assim como contextos distintos, para a prática científica físico-natural setecentista, que estavam evidentemente associados e se complementavam. Contudo, alguns historiadores, tais como Alan Q. Morton e Jane A Wess, Patricia Fara e Al Coppola, procuraram alertar e tecer considerações sobre a possibilidade de que muitos participantes estivessem incorrendo em certos anacronismos históricos e conceituais ao procurarem caracterizar a ideia de Ciência predominante na Inglaterra, e em toda a Grã-Bretanha, no século XVIII.

    Desse modo, para evitar repetições e extensões demasiadas em Newtonianos no mercado, decidimos não reproduzir (nem de modo sintético ou compactado) o amplo debate historiográfico que realizamos em A filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII. Certamente, as contribuições dos historiadores abordadas neste debate servirão de referência para nossas diversas considerações e análises nos diversos capítulos do presente livro. Também optamos por não reproduzir integralmente o oitavo e último capítulo do livro anterior, no qual apresentamos a nossa contribuição acerca da ideia de Ciência na Inglaterra do século XVIII. Deste modo, utilizaremos (nesta introdução) apenas algumas passagens importantes que nos ajudam a entender a Ciência físico-natural inglesa setecentista como uma Filosofia Natural e Experimental, na sua fundamentação Newtoniana e na sua dimensão pública, ilustrada, polida, útil (ou aplicada) e teatralizada (ou espetacularizada). Evidentemente, este entendimento será fundamental para a compreensão das atividades dos professores independentes de Filosofia Natural e Experimental que se lançaram no mercado da região metropolitana e, posteriormente, das cidades do interior do país, atuando de forma itinerante.

    Vimos, assim, no oitavo e último capítulo de A filosofia natural e experimental na Inglaterra do século XVIII, que o termo Ciência podia ter um significado bastante amplo nos séculos XVII e XVIII, correspondendo às diversas formas e práticas de conhecimento sistemático e racional e estabelecendo, a princípio, uma relação de complementaridade entre os dois grandes campos que formavam este conhecimento: a Teologia e a Filosofia (fosse ela a Filosofia Natural ou a Filosofia Moral). De certo modo, esta perspectiva de conhecimento foi advogada também por outros nomes importantes que antecederam Newton, como Galileu Galilei, René Descartes e Robert Boyle. Contudo, este significado amplo de Ciência não era exclusivo do triunfo da Revolução Científica do século XVII, e mesmo da Era das Luzes que a sucedeu. Na realidade, esta ideia de Ciência já estava presente no cenário filosófico-cultural europeu desde o século XIII, sendo introduzida através das diversas modalidades da Filosofia Escolástica, na qual a Filosofia Tomística teve um papel hegemônico, pelo menos até o século XVI.

    Contudo, na Inglaterra setecentista, em virtude da influência do método experimental, que foi institucionalizado desde os primórdios da Royal Society, com Robert Boyle, e consagrado por Isaac Newton, a Filosofia Natural também associou a ela a tradição experimental. Não era mera coincidência que nos dicionários, enciclopédias, compêndios e manuais do século XVIII, que consultamos para elaboração do oitavo e último capítulo de nosso livro anterior, a Filosofia Natural e a Filosofia Experimental estivessem intimamente associadas e apresentassem praticamente os mesmos significados. Por isso, no caso da Inglaterra, pensamos que a melhor denominação para a Filosofia Natural nela praticada seria associá-la e fundi-la à Filosofia Experimental, resultando daí o que poderíamos chamar de Filosofia Natural e Experimental. Esta associação foi feita em manuais e compêndios por diversos professores independentes e/ou itinerantes por nós estudados, que fizeram questão de consagrar o termo Filosofia Natural e Experimental em seus títulos. É esta denominação que preferimos e entendemos que melhor reflete à tradição filosófico-científica inglesa, e mesmo britânica, entre a segunda metade do século XVII e meados do século XIX.

    Portanto, a visão de uma Filosofia Natural e Experimental triunfante (também Empirista e Mecanicista), baseada nos Principia e na Opticks de Isaac Newton⁷, apontava para a existência de um novo tipo de conhecimento que poderia ser aplicado às necessidades da população, principalmente no âmbito da produção material. Passou-se a cultivar amplamente a ideia de que as forças da natureza, objetiva (exterior ao Homem), mecânica e matematizada, poderiam ser colocadas a serviço da Humanidade, proporcionando-lhe bem-estar e reduzindo-lhe o fardo do trabalho.

    A ideia de um Conhecimento Útil e Aplicado, relacionado às necessidades das atividades industriais e ao bem-estar da população do país, constituiu-se num dos mais importantes aspectos da Ilustração na Inglaterra do século XVIII (sobretudo, na segunda metade deste século) e numa poderosa alavanca intelectual que contribuiu para a emergência da Revolução Industrial, a partir dos anos 1780, como já demonstraram os estudos dos historiadores Albert E. Musson e Eric Robinson, Margaret C. Jacob, Larry Stewart, Joel Mokyr e Peter M. Jones.⁸ A partir de meados do século, verificou-se na Inglaterra uma grande onda de fascinação pelo Conhecimento Útil e Aplicado, que, segundo o historiador Paul Langford, chegou a caracterizar o movimento ilustrado naquele país como uma "Ilustração da mentalidade prática". ⁹ Já o historiador Joel Mokyr indica claramente que, no amplo movimento cultural ilustrado, antes mesmo de meados do século, já existia uma dimensão específica relacionada à utilidade e à aplicabilidade do conhecimento, que era a Ilustração Industrial, que deve ser entendida como o elo real entre a herança da Revolução Científica do século XVII e a própria Revolução Industrial, iniciada nas décadas finais do século XVIII.¹⁰

    O interesse pelo conhecimento filosófico-científico aplicado e experimental transcendeu a esfera dos pequenos grupos de formação universitária e altamente letrados e passou a ser cultivado pelos segmentos sociais mais diferenciados, desde cavalheiros e damas cujo único interesse era um aprendizado para seu refinamento social até proprietários manufatureiros, engenheiros e mecânicos que procuravam aplicar esse novo conhecimento às necessidades cotidianas das indústrias e da produção e ao aperfeiçoamento do maquinismo utilizado. Mas foram, principalmente, os industriais, engenheiros e mecânicos, através da sua prática cotidiana, que puderam assimilar os princípios da Ciência Mecânica e Experimental Newtoniana e empregá-los em suas atividades de desenvolvimento de máquinas e na formulação de uma nova organização técnico-industrial.

    Em Londres, Westminster e nas principais cidades do interior, professores independentes e/ou itinerantes (viajantes) – que majoritariamente não tinham vínculo com Universidades, Academias de Ensino ou escolas de ensino fundamental e médio – começaram a ministrar cursos de Filosofia Natural e Experimental para uma audiência bastante diversificada, que, além de pagar pelas lições recebidas, era estimulada a adquirir os programas de cursos ou roteiros de aulas (syllabuses), os manuais (textbooks) ou eventuais compêndios elaborados por estes professores. Eles também indicavam, com frequência, a consulta aos compêndios dos mais renomados professores universitários ou eruditos não-acadêmicos ingleses e estrangeiros.

    Entre estes renomados eruditos acadêmicos e não-acadêmicos, podemos citar primeiramente Henry Pemberton, professor de Filosofia Natural do legendário Gresham College de Londres e também amigo pessoal de Newton, que, em 1728, publicou uma volumosa obra em homenagem ao amigo falecido no ano anterior, intitulada A view of Sir Isaac Newton’s philosophy, apresentando um monumental panorama dos diversos aspectos da Filosofia Natural Newtoniana.¹¹ Outro autor e erudito inglês que contribuiu para a divulgação dos princípios Newtonianos foi Ephraim Chambers, que publicou a sua Cyclopaedia: or, an universal dictionary of arts and sciences, em 2 grandes volumes, também em 1728, em Londres. A Cyclopaedia de Chambers, no seu formato de enciclopédia dicionarizada, trazia diversos verbetes bastante desenvolvidos sobre a Filosofia Natural Newtoniana e seus diversos campos, enfatizando a sua dimensão experimental e suas possibilidades de aplicação, que eram evidenciadas na apresentação de significados para termos tais como máquinas, motores, engenheiro, fábrica e manufatura.¹²

    Entre os professores universitários estrangeiros que tiveram suas obras traduzidas para a língua inglesa, ainda na primeira metade do século XVIII, podemos destacar aqueles que atuaram na Universidade de Leyden, na Holanda. O primeiro deles foi Willem Jakob ’sGravesande, que teve o seu volumoso compêndio Physices elementa mathematica, experimentis confirmata: sive introductio ad Philosophiam Newtonianam traduzido em 2 volumes para o inglês por John Theophilus Desaguliers, e publicado em Londres, em 1720, com o título Mathematical elements of natural philosophy confirmed by experiments; or, an introduction to Sir Isaac Newton’s philosophy.¹³ Neste mesmo ano, uma outra tradução inglesa condensada em 180 páginas, sem nome do tradutor, mas cuja revisão era atribuída a John Keill (professor de Oxford), foi publicada em Londres com o título Mathematical elements of physicks, proved by experiments: being an introduction to Sir Isaac Newton’s philosophy.¹⁴ Willem Jakob ’sGravesande ainda teve um outro compêndio mais sintético, que reunia o conteúdo de suas aulas, traduzido para o inglês e publicado em Londres, em 1735, com o título An explanation of the Newtonian philosophy in lectures read to the youth of the University of Leyden, mas o nome do tradutor permaneceu no anonimato, assinando o seu trabalho apenas como "um membro [Fellow] da Royal Society".¹⁵

    Herman Boerhaave, também professor de Leyden, teve o seu famoso compêndio, Elementa chemiae quae anniversario labore docuit, in publicis, privatisque, scholis – em que procurou associar o estudo da Química aos princípios mecânicos e experimentais formulados por Newton –, traduzido para o inglês por Peter Shaw e Ephraim Chambers e publicado em Londres em 1727, com o título A new method of chemistry; including the theory and practice of that art: laid down on mechanical principles and accommodated to the uses of life.¹⁶ O terceiro professor de Leyden que teve uma de suas obras traduzida para o inglês foi Pieter van Musschenbroek e seu título original era Elementa physicae conscripta in usus academicos, cuja tradução feita por John Colson (professor de Matemática de Cambridge) foi publicada em Londres, em 1744, com o título The elements of natural philosophy. Chiefly intended for the use of students in universities.¹⁷

    Entre os eruditos não-acadêmicos estrangeiros encontramos primeiramente o Senhor de Voltaire (François Marie Arouet), cuja importância na ampla divulgação do Newtonianismo para o público europeu é inegável, a partir das suas famosas Lettres philosophiques (Cartas inglesas), que teve a sua tradução para o inglês (feita por John Lockman) publicada em 1733, em Londres, com o título Letters concerning the English nation, antes mesmo da versão original em francês, que só foi lançada no ano seguinte.¹⁸ Em 1738, Voltaire publicou, em Amsterdam, o seu compêndio intitulado Éléments de la philosophie de Neuton, mis à la portée de tout le monde, em que procurava apresentar, de maneira bastante acessível, os princípios fundamentais do Newtonianismo. No mesmo ano, quase que simultaneamente em Londres, foi publicada a sua tradução para a língua inglesa, com o título The elements of Sir Isaac Newton’s philosophy, que foi feita por John Hanna, que era professor de Matemática.¹⁹ O pequeno tratado em que Voltaire procurou defender os princípios do Newtonianismo frente à Filosofia de Leibinitz, La métaphysique de Neuton, ou parallèle des sentiments de Neuton et de Leibnitz (publicado em Amsterdam, em 1740), também teria a sua tradução inglesa, feita por David Erskine Baker, publicada em Londres, em 1747, com o título The metaphysics of Sir Isaac Newton: or, an comparison between the opinions of Sir Isaac Newton and Mr. Leibinitz.²⁰

    Entre as obras de divulgação do Newtonianismo publicadas por eruditos não-acadêmicos estrangeiros, não podemos esquecer de mencionar o livro escrito pelo conde italiano (de origem veneziana) Francesco Algarotti, intitulado Il Newtonianismo per le dame ovvero dialoghi sopra la luce, i colori et l’attrazione, que foi publicado originalmente em Nápoles, em 1737. Este livro alcançou muito sucesso nas Cortes e nos salões europeus do final da primeira metade do século XVIII, pois destinava-se, com uma linguagem elegante e um estilo de galanteria peninsular, a apresentar os princípios mais básicos do Newtonianismo para as damas (consideradas, pela concepção de gênero dominante na época, como incapacitadas para um raciocínio filosófico-científico mais abstrato) que frequentavam estes espaços sofisticados, detendo-se mais na explanação dos fenômenos relacionados à luz e às cores, estudados por Newton na Opticks. Assim, Il Newtonianismo per le dame ovvero dialoghi sopra la luce, i colori et l’attrazione recebeu uma tradução em língua inglesa, em 2 volumes, feita pela poetisa e escritora Elizabeth Carter (que era uma das mulheres que demonstravam, com o seu trabalho, justamente o equívoco daquela concepção de gênero), que foi lançada com grande sucesso em Londres, em 1739, com o título Sir Isaac Newton’s philosophy explain’d for the use of ladies. In six dialogues on light and colours.²¹

    Mas, voltando a falar sobre os cursos de Filosofia Natural e Experimental ministrados pelos professores independentes e/ou itinerantes, podemos indicar que estes foram obviamente uma lucrativa fonte de renda para estes indivíduos, como também devemos ressaltar que tais cursos tiveram um grande impacto sociocultural no sentido de fomentar um crescente interesse pelo Conhecimento Útil e Aplicado, que, por sua vez, constituiu-se numa sólida base de apoio para os experimentos que industriais, engenheiros e mecânicos realizaram no processo de criação de novas máquinas e aperfeiçoamento das já existentes. Portanto, entendemos que a divulgação do Newtonianismo pelos professores independentes e/ou itinerantes e o desenvolvimento de um ideal de Conhecimento Útil e Aplicado são fenômenos histórico-culturais associados, mas de grande complexidade que vêm sendo problematizados pela historiografia desde o final dos anos 1960, sobretudo pelos diversos historiadores que já mencionamos anteriormente, nesta introdução.

    Obviamente, nossa atenção maior se relaciona à relevante atuação dos professores independentes e/ou itinerantes neste processo histórico. Mas convém ressaltar que outros atores sociais, tais como professores universitários, professores de Academias de Ensino (sobretudo as Academias Dissidentes ou Não-Conformistas²²), fabricantes de instrumentos matemáticos e filosófico-científicos, editores, impressores, livreiros, autores e jornalistas, assim como instituições e entidades filosófico-científicas ou filosófico-literárias, desde a Royal Society de Londres até aquelas que surgiram nas diversas cidades provinciais ao longo do século XVIII, foram também importantes no processo de divulgação e aceitação dos princípios da Filosofia Natural e Experimental Newtoniana pela sociedade inglesa e britânica e na construção de um ideal de Conhecimento Útil e Aplicado. Inclusive, no Capítulo 1 de Newtonianos no mercado (a seguir), focalizaremos as trajetórias e as obras daqueles professores universitários de Oxford (David Gregory e John Keill) e Cambridge (William Whiston, Roger Cotes e seu primo e executor literário, Robert Smith) que procuraram interpretar e divulgar as ideias de Newton para seus alunos, e mesmo para um público fora das universidades, no final do século XVII e nas décadas iniciais do século XVIII.

    A ampla divulgação dos princípios da Ciência Newtoniana e do ideal de Conhecimento Útil e Aplicado, desde as primeiras décadas do século XVIII, atingiu, além de setores da aristocracia, a outros segmentos sociais letrados, criando-se, no decorrer deste século, uma atmosfera intelectual cada vez mais propícia ao desenvolvimento da perspectiva teórica e prática de uma Filosofia Natural e Experimental cada vez mais voltada para a resolução dos problemas e das necessidades humanas, começando por aquelas da vida produtiva e dos negócios até chegar ao bem-estar e à saúde dos indivíduos. Entre estes segmentos sociais letrados podemos encontrar religiosos (Anglicanos e Dissidentes), oficiais militares, funcionários públicos, advogados, médicos, cirurgiões, proprietários rurais, comerciantes e aqueles mais vinculados à produção industrial, tais como produtores manufatureiros, engenheiros e mecânicos.

    Evidentemente, alguns fatores históricos contribuíram para a ampla divulgação dos princípios Newtonianos para diversos segmentos sociais através dos cursos e publicações dos professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental, como também através de publicações de alguns professores universitários e eruditos não-acadêmicos ingleses e estrangeiros, como já adiantamos. Em primeiro lugar, é importante mencionar que o quadro político-institucional que se instaurou no pós-1689, com o triunfo da Revolução Gloriosa, apontou para o estabelecimento de um contexto de maior tolerância religiosa, com o Toleration Act (embora as restrições aos dissidentes religiosos não tenham sido abolidas), de liberdade política e individual, com a consagração do princípio jurídico do Habeas Corpus, e de liberdade de imprensa e pensamento, com a revogação do antigo Licensing Act, em 1695, que determinou a abolição da censura prévia às publicações. O fim da censura, consagrando o princípio da liberdade de expressão, foi, certamente, um fator importantíssimo para o desenvolvimento, sem precedentes, da indústria editorial a partir do início do século XVIII, com a disseminação dos jornais e de outros tipos de periódicos (magazines, almanaques etc.) na região metropolitana (formada pelas cidades contíguas de Londres e Westminster) e também nas cidades provinciais inglesas. O fim da censura também teve um impacto positivo para aquele segmento da indústria editorial voltado para a publicação de livros de diversos gêneros, com o crescimento excepcional das atividades dos editores e livreiros metropolitanos e provinciais. Evidentemente, abriu-se um espaço maior de oportunidade para a publicação de livros filosófico-científicos e isso beneficiou bastante a atuação daqueles que divulgavam os princípios Newtonianos.²³

    Outros fatores históricos importantes para entendermos a ampla divulgação do Newtonianismo correspondem aos processos de revolução do consumo e comercialização do lazer que se deram no âmbito do desenvolvimento de uma sociedade cada vez mais mercantil, que se intensificou nas décadas iniciais do século XVIII e propiciou a integração de novos setores sociais ao consumo de bens materiais e culturais, anteriormente restritos aos setores mais aristocráticos e à grande burguesia comercial (vinculada sobretudo ao comércio marítimo internacional), que também compartilhava, com aqueles primeiros, os valores de uma sociedade agrária e baseada na propriedade territorial. Genericamente denominados de classes médias, como forma de distingui-las da aristocracia ou da população trabalhadora dos campos e das cidades, estes setores emergentes (formados por comerciantes, banqueiros, industriais, profissionais liberais, oficiais militares, funcionários públicos, clérigos, pequenos e médios fazendeiros etc.) determinaram o estabelecimento de um novo padrão de consumo e produção não apenas em relação aos bens materiais, como também em relação à cultura, às Ciências, às Artes e ao entretenimento. Por outro lado, os novos valores ideológicos sustentados por segmentos destas classes médias enfatizavam não apenas a centralidade do trabalho para a criação da riqueza social, como também reconheciam a necessidade do repouso e do lazer para a reposição das forças físicas e espirituais dos indivíduos.²⁴

    Se no campo da produção de bens materiais este amplo alargamento do mercado se constituiu numa das condições prévias para a grande transformação técnico-produtiva iniciada nas décadas finais do século XVIII, representada pela Revolução Industrial, nos campos cultural, filosófico-científico e artístico, ele propiciou o surgimento de profissionais especializados que passaram a oferecer seus serviços a um grande número de consumidores e de espaços públicos determinados para a realização de seu trabalho. A divulgação e o consumo da cultura, das Ciências e das Artes extrapolou o espaço da Corte ou das propriedades aristocráticas e passou a atingir um grande público nos espaços dos museus, das galerias de arte, dos teatros, das salas de concerto, das casas de café, das tavernas, das livrarias, dos clubes e das sociedades filosófico-científicas e literárias. Eram estas as características básicas de um processo de comercialização do lazer e emergência de espaços públicos de diversão e aquisição de cultura em uma sociedade com novos atores sociais que se pretendiam ilustrados e polidos.²⁵

    As novas concepções de educação e polidez, surgidas no início do século XVIII em comunhão com o ideário da Ilustração inglesa, estimulavam os hábitos de leitura e o interesse pela Filosofia Natural e Experimental, pela literatura, pela música, pela dança, pelo teatro, pela pintura e demais artes plásticas – os prazeres da imaginação (the pleasures of imagination), para utilizar a consagrada expressão cunhada por Joseph Addison em sua coluna no The Spectator.²⁶ Desse modo, nos ambientes urbanos da Inglaterra do século XVIII, formou-se um grande segmento de pessoas com elevado poder aquisitivo e interessadas no consumo de bens culturais, situação esta que esteve na base da profissionalização, cada vez maior, de filósofos, literatos e artistas, e deu origem a um personagem fundamental no processo de construção de uma Cultura Polida e de uma Ciência Pública Newtoniana, com sua dimensão de utilidade e aplicação, que era o professor independente e/ou itinerante de Filosofia Natural e Experimental.²⁷

    Aproveitemos, então, nesta introdução, para falar um pouco mais deste personagem importante nos cenários filosófico-científico e cultural da Inglaterra setecentista, que era o professor independente e/ou itinerante de Filosofia Natural e Experimental, que contribuiu significativamente para o desenvolvimento de um ideal de disseminação e popularização do conhecimento filosófico-científico na Inglaterra setecentista. Em 1711, este ideal foi entusiasticamente defendido por Joseph Addison e Richard Steele, num dos primeiros números de seu periódico The Spectator, procurando seguir os passos de Sócrates que, na Grécia Clássica, trouxe a Filosofia do Céu para viver entre os Homens, e reiteravam a necessidade de retirá-la dos Gabinetes e Bibliotecas, Escolas e Faculdades, para que esta pudesse residir em Clubes e Reuniões, Mesas de Chá e Casas de Café. Esta icônica reflexão do Addison e Steele (que, inclusive, escolhemos como epígrafe do presente livro) serviria como um dos embasamentos da concepção de Conhecimento Útil e Aplicado, preconizada pelos ilustrados ingleses e britânicos ao longo do século XVIII.²⁸

    Podemos chamar este nosso personagem de professor independente porque, na maioria das vezes, ele não estava vinculado a nenhuma instituição de ensino, atuando individualmente, ou em parceria com mais alguém, no mercado que surgiu na Inglaterra, no início do século XVIII, para os cursos públicos de Filosofia Natural e Experimental. Todavia, um professor independente poderia atuar como um professor itinerante, viajando para muitas cidades do interior inglês para oferecer e ministrar publicamente os seus cursos, o que iria acontecer com frequência a partir do final dos anos 1730, procurando aproveitar os meses mais quentes do ano para percorrer o país, com sua volumosa e pesada bagagem com instrumentos para suas demonstrações experimentais, e evitar assim as péssimas condições das estradas nos meses de inverno, cobertas pela neve ou pela lama. Nos meses mais frios, um professor itinerante procurava permanecer na localidade em que residia ou se estabelecer numa cidade provincial ou ainda circular num conjunto de cidades bem próximas, para se livrar de grandes e complicados deslocamentos.

    Aqui, podemos mencionar a metáfora cunhada pelo historiador Oliver Hochadel, ao estudar a trajetória do italiano Giacomo Bianchi (Jakob von Bianchi, professor itinerante de Filosofia Natural e Experimental nos estados alemães), que assinalava que "os professores itinerantes eram, no verdadeiro sentido da palavra, os soldados de infantaria da Ilustração".²⁹ Talvez, possamos utilizar uma metáfora menos militar e dizer também que estes professores independentes de Filosofia Natural e Experimental representavam a versão itinerante da Ilustração, ou, a própria Ilustração itinerante. A presença de professores independentes e/ou itinerantes também foi um fenômeno comum no cenário cultural e filosófico-científico, ao longo do século XVIII, de alguns países do continente europeu, tais como a França, Holanda, Alemanha e Itália, mas consideramos que esta presença não chegou a atingir a dimensão que este fenômeno alcançou na Inglaterra, na Escócia e mesmo na Irlanda.³⁰ Inclusive, para um melhor entendimento geográfico acerca da atuação dos professores independentes e/ou itinerantes, sobretudo na Inglaterra setecentista, indicamos a consulta às Ilustrações 1 e 2, reproduzidas ao final deste nosso trabalho (ver Ilustrações), nas quais são apresentados o mapa com os condados históricos dos Reinos da Grã-Bretanha e da Irlanda), incluindo as suas principais cidades (Ilustração 1), e o mapa das cidades de Londres e Westminster, incluindo o Burgo de Southwark, na margem direita do Rio Tâmisa, em frente àquelas duas cidades (Ilustração 2).³¹

    Falemos, então, sobre o início do processo de atuação dos professores independentes de Filosofia Natural e Experimental. Diante das novas possibilidades de consumo que se abriram, inicialmente no mercado metropolitano (formado pelas cidades contíguas de Londres e Westminster), os filósofos naturais e professores adeptos do Newtonianismo logo encontraram uma atividade remunerada através do oferecimento de cursos para uma clientela, sobretudo de classe média, cada vez mais interessada no conhecimento da nova Filosofia Natural e Experimental. Pode-se dizer que este movimento começou no final dos anos 1690 e se intensificou na primeira década do século XVIII através da atuação de professores independentes que ofereciam seus cursos públicos de Filosofia Natural e Experimental, que eram anunciados frequentemente nos jornais londrinos e divulgados em folhetos nas livrarias, nas lojas de instrumentos matemáticos e filosófico-científicos, nas casas de café e nas tavernas, que eram espaços em que estes professores independentes muitas vezes ministravam seus cursos, além de espaços das suas próprias residências, transformados em salas de aula.

    Na primeira metade do século XVIII, algumas casas de café da região metropolitana se tornaram famosas como pontos de encontro e locais de trabalho de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental, tais como a Marine Coffee House e a Jones’s Coffee House, nas proximadades do Royal Exchange (Bolsa de Valores de Londres), e a Bedford’s Coffee House, em Covent Garden (Westminster), também reduto de artistas e políticos Whigs. Mas também era comum que professores independentes e/ou itinerantes, em certas ocasiões, ministrassem seus cursos em grandes salas e auditórios ou mesmo teatros, como aconteceria, com frequência, nas décadas finais do século XVIII e início do XIX.

    Ao se lançarem no mercado, os professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental passaram a oferecer e a ministrar seus cursos, com aulas e demonstrações experimentais, para uma clientela socialmente cada vez mais diversificada e, assim, contribuíram para a ampla divulgação dos princípios filosófico-científicos Newtonianos para o público letrado e para a formação de uma mentalidade prático-experimental entre alguns segmentos profissionais. Entre estes segmentos se destacavam, sobretudo na segunda metade do século XVIII, industriais, engenheiros e mecânicos, que seriam os principais protagonistas da Revolução Industrial e do processo de transformação sócio-produtiva da sociedade inglesa, que se iniciaria nas décadas finais daquele século.

    Estes professores independentes e/ou itinerantes anunciavam seus cursos nos diversos periódicos diários, que passaram a ser publicados abundantemente na região metropolitana de Londres e Westminster, assim como nas diversas cidades do interior da Inglaterra e de toda a Grã-Bretanha, como uma forma eficaz de atrair a audiência necessária para viabilizar suas atividades docentes. Divulgavam seus cursos também através de anúncios impressos (ou mesmo manuscritos) que eram afixados nas livrarias, tavernas e casas de café da região metropolitana e das cidades provinciais, muitas das quais eram os locais em que eles ministravam as suas aulas. Além disso, publicavam seus programas de curso (syllabuses), com o roteiro e o detalhamento de suas aulas (que ainda tinham finalidades propagandísticas), como também manuais (textbooks) com o conteúdo destas aulas, para servir como uma espécie de memória (memoir) para suas audiências. Não era raro que alguns destes professores independentes publicassem obras mais extensas e aprofundadas sobre o conteúdo dos seus cursos ou campos específicos da Filosofia Natural e Experimental, que se constituíam como verdadeiros compêndios que se rivalizavam com aqueles publicados por professores universitários ou eruditos não-acadêmicos.

    Estas publicações dos professores independentes e/ou itinerantes de Filosofia Natural e Experimental se constituíram em nossa fonte primordial de pesquisa para a elaboração do presente livro (Newtonianos no mercado). Embora tenhamos procurado apresentar informações sobre a trajetória geral de vida destes professores, não consideramos que a natureza deste nosso livro seja a realização de um estudo biográfico individual ou coletivo (prosopográfico), visto que utilizamos e nos baseamos numa ampla bibliografia secundária que nos fornece informações diretas (estudos biográficos) ou mesmo indiretas acerca das trajetórias destes homens, sem deixar de mencionar o amplo e riquíssimo acervo de estudos biográficos representado pelo Oxford Dictionary of National Biography, hoje também editado eletronicamente. Portanto, nos programas de curso, manuais e compêndios publicados pelos professores independentes e/ou itinerantes, procuramos obter as informações necessárias sobre os roteiros e os conteúdos das aulas ministradas e também analisar os seus prefácios e, em alguns casos, ensaios complementares incluídos como apêndices, pois era através destas partes de suas publicações que estes professores, muitas vezes, revelavam suas ideias e concepções de mundo e as particularidades do seu entendimento do Newtonianismo, pois, mesmo seguindo esta tradição filosófico-natural-experimental, estes homens tinham origens sociais e formações intelectuais bem diversificadas.

    Em suas publicações, principalmente nos programas de curso e nos manuais, os professores independentes e/ou itinerantes também aproveitavam para informar à sua potencial audiência acerca das condições de realização dos seus cursos através de anúncios ou notas incluídas no início ou no final destas publicações. Nestes anúncios ou notas informativas, era possível saber os locais de realização dos cursos, os dias da semana em que ocorriam, o tempo de duração das aulas, os preços das subscrições individuais para os ouvintes etc. Havia também aqueles professores independentes e/ou itinerantes que aproveitavam a oportunidade para também divulgar suas publicações anteriores ou outras atividades que porventura desenvolvessem paralelamente ao seu trabalho docente. Não era raro também que diversos editores aproveitassem a ocasião das publicações destes professores para divulgar, ao final delas, várias outras publicações editadas por seus estabelecimentos. Em síntese, os syllabuses e os textbooks dos professores independentes e/ou itinerantes setecentistas nos fornecem informações não apenas sobre as formas e os conteúdos dos seus cursos, como também acerca das condições em que eles eram realizados.

    Com base nas fontes documentais e na bibliografia secundária consultadas, elaboramos a tabela localizada ao final desta introdução (Tabela I), na qual procuramos identificar as diversas gerações de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental que atuaram, do início ao final do século XVIII (e mesmo nas décadas iniciais do século XIX), na Inglaterra, e alguns deles também na Escócia e na Irlanda. Optamos por não indicar, como fontes desta tabela, a documentação examinada (programas de cursos, manuais e compêndios publicados pelos professores independentes e/ou itinerantes) e a bibliografia secundária relativa ao estudo de suas trajetórias profissionais e intelectuais (livros, artigos em periódicos e verbetes no Oxford Dictionary of National Biography), em virtude do seu grande volume. Certamente, estas fontes documentais e referências bibliográficas poderão ser reconhecidas nos capítulos seguintes, que tratarão das trajetórias e da produção intelectual destes professores.

    Contudo, de acordo com os dados apresentados na Tabela I, podemos reconhecer a existência de pelo menos cinco gerações de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental que atuaram ao longo do século XVIII. A primeira geração de professores independentes, que atuou entre os anos 1690 e 1710, será estudada no Capítulo 2 e, nela, destacaram-se John Harris, Francis Hauksbee (O Velho), Humphry Ditton e James Hodgson, que desempenharam pioneiramente o importante papel na divulgação do Newtonianismo e no ensino da Filosofia Natural e Experimental para além dos muros das universidades de Oxford e Cambridge e das discussões nas reuniões da Royal Society.

    A segunda geração de professores independentes atuou a partir dos anos 1710 e 1720 e durante boa parte da primeira metade do século XVIII, como foi o caso de John Theophilus Desaguliers, William Whiston e Peter Shaw, e foi a responsável pela ampliação do mercado para os professores independentes, além da consolidação da Ciência Pública Newtoniana e da importância da região metropolitana como foco irradiador desta Ciência. Outros desta geração, como Francis Hauksbee (O Jovem), Benjamin Worster, James Stirling e Thomas Watts, tiveram carreiras mais abreviadas. Mas, no âmbito provincial, sobretudo no Nordeste da Inglaterra, começaram a se destacar as figuras pioneiras de James Jurin e John Horsley. Entretanto, desdobraremos o estudo dos professores independentes integrantes desta terceira geração em três capítulos distintos: no Capítulo 3, estudaremos as trajetórias e as obras de William Whiston, Francis Hauksnee (O Jovem), Peter Shaw, James Hurin e John Horsley; no Capítulo 4, focalizaremos as trajetórias e as obras de Thomas Watts, Benjamin Worster e James Stirling, que também foram professores da Academia de Ensino de Little Tower Street, em Londres; e o Capítulo 5 será dedicado integralmente ao estudo da trajetória e das obras de John Theophilus Desaguliers, que foi o responsável pela constituição de um modelo de organização dos cursos públicos de Filosofia Natural e Experimental que foi utilizado até o século XIX.

    A terceira geração de professores independentes começou a atuar a partir dos anos 1730 e 1740 e era bem diversificada, com homens que atuavam tanto nas cidades do interior como na região metropolitana, sendo, inclusive, alguns deles originários da Escócia. Alguns destes professores independentes exerceram plenamente suas atividades até os anos 1770. Entre aqueles que viviam e atuavam na região metropolitana, estavam William Lewis, Erasmus King (ex-assistente de John Theophilus Desaguliers), Benjamin Rackstraw e Joseph Sowerby. Entre aqueles que viviam em cidades do interior, estavam Benjamin Martin (antigo aluno de Desaguliers), Caleb Rotheram, William Griffiss, Thomas Peat e Isaac Thompson, atuando em suas cidades e também exercendo suas atividades docentes em diversas outras cidades provinciais como professores itinerantes. Benjamin Martin era inegavelmente um dos professores independentes e itinerantes mais famosos, além de um prolífico autor de compêndios e manuais, e, em meados dos anos 1750, fixou-se em Londres, como fabricante de instrumentos óticos e filosófico-científicos. Entre os originários da Escócia, estavam John Booth, Richard Jack e James Ferguson, sendo este último o mais famoso deles, com diversas publicações importantes, exercendo suas atividades a partir de Londres e Westminster e percorrendo muitas cidades do interior inglês. Há que se destacar ainda o nome de Stephen Demainbray (também discípulo de Desaguliers), que era originário de Londres, mas iniciou a sua carreira como professor independente na Escócia, retornando posteriormente a Londres.

    Para esta terceira geração de professores independentes dedicaremos inicialmente o Capítulo 6, no qual faremos uma apresentação geral dos integrantes desta geração e, particularmente, serão estudadas as trajetórias e a produção intelectual (não muito alentada) de dois discípulos de Desaguliers, Erasmus King e Stephen Demainbray. A Benjamin Martin (também discípulo de Desaguliers) e James Ferguson, que podem ser considerados os integrantes mais famosos e importantes desta terceira geração, também dedicaremos capítulos específicos (respectivamente, Capítulos 7 e 8), para o estudo das suas trajetórias e produções intelectuais. Os demais professores independentes integrantes desta geração – William Lewis, Caleb Rotheram, William Griffiss, Isaac Thompson, Thomas Peat, Benjamin Rackstrow, John Booth, Joseph Sowerby e Richard Jack – terão suas trajetórias e publicações estudadas no Capítulo 9.

    A quarta geração de professores independentes, que começou a atuar a partir dos anos 1750 e 1760, será estudada, em geral, no Capítulo 10. Esta quarta geração também era bastante diversificada e seus integrantes, em sua maioria, exerciam suas atividades docentes a partir das cidades em que viviam no interior inglês. Alguns deles puderam atuar como professores independentes e/ou itinerantes até as primeiras décadas do século XIX. Entre estes professores estavam aqueles que desenvolviam suas atividades nas cidades em que estavam baseados, como Benjamin Donn (em Bideford, Bristol, Taunton e, novamente, Bristol), Adam Walker (em Manchester e, depois, Londres) e John Arden (Derby, Beverley e Bath), mas também, de forma itinerante, percorriam diversas cidades provinciais. John Warltire parece não ter se fixado, por muito tempo, em alguma cidade, desenvolvendo uma atividade docente itinerante constante. Thomas Newberry, John Neale, Temple Henry Crocker, um certo Richardson e um certo Oliver atuaram basicamente na região metropolitana inglesa, nos anos 1750 e 1760, enquanto que Robert Gibson, de Dublin, parece ter limitado a sua atuação à Irlanda nos anos 1750. Charles Hutton e Henry Clarke também preferiram não se jogar nas estradas e atuaram como professores independentes baseados, respectivamente, nas cidades de Newcastle-Upon-Tyne e Manchester. É importante notar que Charles Hutton se tornou um dos grandes nomes da Matemática inglesa do final do século XVIII e início do XIX, enquanto que Benjamin Donn e Adam Walker eram professores independentes e itinerantes bastante reconhecidos, com diversas publicações de manuais e compêndios. Para Benjamin Donn, inclusive, destinamos um capítulo específico (Capítulo 11) para o estudo da sua trajetória e produção intelectual.

    A quinta geração de professores independentes de Filosofia Natural e Experimental será estudada no Capítulo 12. Os integrantes desta geração começaram a atuar a partir dos anos 1770 e a maioria deles desenvolveu suas atividades docentes até as primeiras décadas do século XIX. Entre os integrantes desta geração, alguns se tornaram destacados professores itinerantes, que percorreram diversas cidades da Inglaterra e também da Escócia e da Irlanda, como John Banks, Henry Moyes, James Dinwiddie, I. Atkinson e Gustavus Katterfelto. Outros professores itinerantes não eram tão reconhecidos, mas deixaram rastros de suas passagens por algumas cidades, como John Holloway, John Lloyd, Thomas Clark, o Sr. Bradberry e o Sr. Burton. Todavia, também existiram aqueles professores independentes que preferiram desenvolver suas atividades mais restritas às cidades que residiam e desenvolviam suas outras atividades profissionais, como Peter Clare e John Dalton, em Manchester, e Benjamin Smith, Abrahan Didier e Raphael Gillum, em Bath. Outros dois nomes identificados, Edward Athenry White e James Lynch, parecem ter restringido suas atividades a Dublin e a outras cidades da Irlanda. Certamente, John Banks e John Dalton foram os nomes desta geração que mais se destacaram, não apenas por suas atividades docentes, como também pelos importantes livros que publicaram. Inclusive, indicamos a possibilidade de John Dalton ser considerado como integrante de uma sexta geração de professores independentes que desenvolveriam suas atividades por boa parte da primeira metade do século XIX. Mas o estudo aprofundado das atividades destes professores já se encontra fora dos limites cronológicos de nosso presente trabalho.

    No Capítulo 13, abriremos uma exceção e focalizaremos a trajetória e a produção intelectual de George Adams Junior, que era um fabricante de instrumentos matemáticos e filosófico-científicos e se tornou um importante autor de livros e compêndios de Filosofia Natural e Experimental nos anos 1780 e 1790. Ele não chegou a atuar como um professor independente e/ou itinerante, mas se tornou um caso muito especial ao publicar, em 5 grandes volumes, talvez, o mais extenso e aprofundado compêndio de Filosofia Natural e Experimental do século XVIII.

    No último capítulo de Newtonianos no mercado (Capítulo 14), a partir da análise das listas ou relações dos subscritores de livros de John

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