Meninos...homens...heróis!epub
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Meninos...homens...heróis!epub - Paulo Oliveira
FICHA TÉCNICA
Capa – Ícaro Lopes Alves
Desenhos – Pedro Lima
Revisão – Profª Antonia Isabel Oliveira Monteiro
Profª Angela Cruz Nunes
Prof. Paulo Oliveira
Foto – Profª Angela Cruz Nunes
Digitação – Prof. Paulo Oliveira
OLIVEIRA, Paulo
Meninos...Homens... Heróis! – 1ª Ed. – Seabra-BA:
Atual Gráfica, 2013.
Fundação Biblioteca Nacional
Ministério da Cultura
Escritório de Direitos Autorais
Nº de Registro: 521.013
Livro: 988
Folha: 461
Paulo de Oliveira Alves
Todos direitos reservados a Paulo de Oliveira Alves
Email: Paiik@hotmail.com
O RESGATE DO PARAISO DA INFÂNCIA E A AVENTURA DA BUSCA HERÓICA DE SERMOS NÓS!
Esta obra relata a história de três amigos, por diferentes fases de suas vidas. Demonstrando a capacidade e as peripécias desses três em envolver toda uma cidade em suas armações e brincadeiras juvenis, resgatando a simplicidade da amizade de um tempo onde se era gostoso viver sentindo o calor do sol e a delícia da água da chuva, fora dos espaços fechados das lan houses, da bitolação dos vídeos games, playstations e da frieza das tribos da internet. A história demonstra também as transformações desses mesmos personagens no contexto em que se refere ao amadurecimento da personalidade num jogo inconsciente para a perda da magia da infância. Algo que, de certa forma, vem contemplar o amadurecimento induzido pela cultura da sociedade em que vivemos.
Este livro está recheado de humor, aventura, romantismo, da busca do destino, do caminho interior e do herói que ainda se encontra bruto para ser lapidado em nossa alma, a partir do momento em que nascemos neste planeta Terra.
Boa leitura.
Paulo Oliveira
AGRADECIMENTOS
Aos meus avós, que foram a base.
A minha mãe Iola e ao meu pai Jason, que me fortaleceram.
Aos meus irmãos, que dividem a força.
Aos meus filhos, filha e esposa, que me inspiram.
Aos meus tios e tias, que me aconselham.
Aos meus primos e sobrinhos, que me alegram.
Aos meus amigos e amigas de infância e de hoje, que me apoiam.
A todos os Professores e Professoras.
A Inácio, Emmanuel, Nando, Gadú, Tio Bozó, Marlene, Renatão, João Pires,Tia Valdinha, Mota, Jules Lobo e Morvan Lobo, ao grande professor Lobão( e a Robinson Queiroz que conheci através dele), Drª Cida Fernandes e tantos outros amigos e amigas, que partiram cedo demais para perto de Deus.
Também,
Aos que cultuam a liberdade
E a ensina às gerações vindouras!
Quando em tua busca o silêncio e as lágrimas se fizerem
Presentes.
E a exatidão de tudo que te ensinaram for a tua única Certeza,
Ainda restará um caminho!
O teu...
Pois só assim caminharás em tua própria vida!
Paulo Oliveira
ÍNDICE
Primeira Parte – Infância e Pré-adolescência
1. As Seriguelas ....................... 07
2. A Festa................................... 25
3. A Cascavel ............................ 49
4. A Cachorrada e o Futebol ... 66
Segunda Parte – Juventude e Idade Adulta
5. As Mudanças ........................ 82
6. Chegada ao Exército............ 96
7. Nova Realidade (Érika)........109
8. O Fim da Dureza.................. 125
9. Assaltos..................................139
10. A Central Telefônica ...........141
11. O Major Cabral....................153
12. O Despertar.........................159
13. Passos do Tempo...............177
Primeira parte
(Infância e Pré-adolescência)
I
As seriguelas
Garoto travesso, não parava um minuto sequer. Onde estivesse, podia saber que estava aprontando alguma peripécia. Alguma era alguma mesmo. A cara já dizia tudo; era olhar para ele e ter a certeza de molecagem esperta e inteligente. Ele era uma criança com um cérebro poderoso, procurando sempre algo para poder aprontar. As coisas eram feitas passo a passo para não haver nenhum erro. O medo maior que tinha era de sua mãe, dona Iracema. Se ela descobrisse mais uma das travessuras de Timbal, era castigo na certa. Mas Timbal, (apelido que recebera Carlos Luiz Krust Gonzaga, porque quando pequeno, pouco antes de andar, se levantava e batucava com as mãos nos móveis baixos de sua casa, tentando imitar os sons dos repiques baianos que escutava nas músicas que o seu pai, Juca Gonzaga, colocava para tocar no seu aparelho de som) era muito esperto e dificilmente alguém o pegava com a boca na botija.
Timbal era um garoto, moreno claro, forte, atento a tudo em sua volta, tinha o rosto bem feito e com uns olhos tão verdes que mais pareciam duas esmeraldas. Os olhos verdes eram por causa de sua descendência alemã. Contam que sua bisavó (Lua Nascente) registrada mais tarde com o nome de Isabel, foi uma índia muito bonita, que viveu e mais tarde casou-se com o seu bisavô, um único alemão chamado Albert Krust que veio com outros desbravadores para a região da Chapada Diamantina. Ele se apaixonou pela bela índia, e aqui mesmo ficou.
Ainda muito pequeno, Timbal só dormia depois que Dona Iracema sentasse à sua cabeceira e lhe recontasse a história do Soldadinho de Chumbo e da Bailarina. Por causa do seu repetitivo gostar da história, sua mãe de vez em quando o chamava de meu soldadinho de chumbo. A história o fascinava. Quando dormia, seu sonho quase sempre ia transformá-lo em um valente soldado com uma linda namorada bailarina, no meio, o sonho sempre ficava conturbado, com cenas impossíveis de serem decifradas, logo em seguida, havia um tiro... Um tiro... Um tiro não, era sua mãe batendo levemente na porta do seu quarto, para que ele despertasse para a missão matinal... Levantar, fazer o dever de casa, ajudá-la em algumas tarefas para mais tarde ir à escola estudar.
1Tinha dois amigos fiéis, que lhe serviam de ajudantes nas travessuras pela cidade a fora. Eram eles: o Antônio, conhecido como Bicudo, apelido que recebeu por ter chupado chupeta até os sete anos de idade, isso fez com que os lábios dele engrossassem e daí o apelido Bicudo, pois aqui em nossa cidade chamamos chupeta de nenê de bico. Bicudo era magro, moreno claro com os cabelos lisos e meio amarelados. Na hora em que a coisa apertava, tinha um discurso embromador feito político, em época de eleição. O outro amigo era Manoel, apelidado de Pimenta, isso porque certa vez não soube distinguir uma suculenta e vermelha pimenta de cheiro, de uma pitanga; ele a mastigou e sentiu o ardor voraz no seu inocente paladar. Desse dia em diante, os garotos da rua passaram a chamá-lo de Pimenta para que ele nunca mais confundisse pimenta de cheiro com pitanga e também não se esquecesse do triste dia. Pimenta era também moreno claro, tinha os cabelos negros e encaracolados, um sorriso calmo e sempre aberto, era o mais baixo dos três, mas corria feito um raio na hora que precisava.
A garotada da rua quando os via, ficava logo esperta. Era como se estivesse sentindo cheiro de fumaça no ar. Gostavam de pescar piabas, trairas, jundiás, corrós, uiuiús, piaus, eram os deliciosos peixes pequenos que existiam no rio Cochó, no rio Campestre e no rio da Prata. Também eram bons nadadores e sempre ganhavam as disputas de natação no poço da vaca, paredão, maravilhão, poço grande ou em qualquer parte de um dos rios que cercavam nossa cidade. Craques em bolinhas de gude, como nunca vi iguais. Juntavam e enchiam várias garrafas de água mineral com bolinhas de gude, para depois saírem numas caçadas. Era o que mais faziam em dias de sol e às vezes, até no meio da chuva. Aprontavam um corre-corre atrás da passarinhada que voava enlouquecida pelo mato. As arapucas que armavam, de vez em quando pegavam codornas, inhambus, juritis, preás, mas geralmente eram pássaros pequenos que caíam nas armadilhas.
Tinham um viveiro cheio de pássaros de várias espécies. Os passarinhos faziam uma grande festa quando o dia estava amanhecendo. Canários, pintassilgos, cardeais (galo da campina), azulões, coleiras, chupa capim... Passarinhos que não acabavam mais. Uma vez ou outra vendiam alguns passarinhos para comprar a borracha dos estilingues que rompiam depois de meses de uso pelo mato. Era um tempo em que culturalmente faltava a consciência ecológica e de proteção aos animais.
Todas as sextas-feiras, às cinco horas da tarde, quando os três que estudavam na mesma sala, saíam da escola, já tinham endereço certo: passar pelos fundos do hospital, seguindo pelos fundos da igreja, indo dar de encontro direto com o quintal dos padres. Lá estava o tesouro escondido e guarnecido... As seriguelas! Para os três não havia coisa melhor do que seriguelas apanhadas na casa dos padres, apesar dos riscos...
__Vê se anda devagar Bicudo de uma figa! __Timbal reclamava em voz baixa __ se o vigia dos padres descobre a gente aqui, o padre irá bater na casa da gente e ainda fala o nosso nome na missa do domingo, você sabe muito bem como ele é!
__Tudo bem, fica frio. Olha só que beleza este pé de seriguelas! Parece até um sonho colorido. O saco está na mão, é só subir e... Crau! Maravilha! Quando estou aqui até esqueço que os problemas do mundo existem! __ Bicudo falava e sorria com a boca cheia a imaginar os problemas do seu mundo que naquela idade ainda nem existiam.
2__ Olha só o que eu achei lá embaixo! __Pimenta expressava segurando uma jaca mole, no ponto de comer __ sou mais esta beleza de jaca, do que seriguelas, elas me dão dor de barriga e daí já viu né, é pum e privada na madrugada agoniada... É pum, pum e privada na madrugada agoniada!... __Pimenta sorria e pulava.
__Deixa de porcaria Pimenta! Não vê que estou com a boca cheia, e além do mais tenho o estômago fraco, se você falar mais uma vez, jogo fora tudo que comi! __ Bicudo reclamava e fazia uma feia cara de nojo.
__Pois comigo não tem disso não, quando estou com fome, pode falar e fazer o que quiser que eu não tô nem aí, eu como minha comida, lambo o prato e peço mais, igual na música, bis! Bis! Bis! __ Pimenta cuspia fora mais um caroço de jaca e sorria arreliando o enojado Bicudo.
As horas passaram depressa, as primeiras sombras da noite já faziam adormecer os pássaros, que já se aquietavam e retornavam para os seus ninhos e para as copas das árvores na silenciosa paz das seis horas da tarde. Os morcegos que moravam no alto da torre da igreja, toda construída de pedras, já começavam a sair e a fazer seus voos rasantes e a procurar pelos insetos que vacilavam atraídos pela claridade dos postes de iluminação e também pelo cheiro das frutas.
Cada vez mais ficando escuro... Timbal, Pimenta e Bicudo continuavam dentro do pomar se deliciando com as frutas e dando sopa para o azar. Já estava quase na hora de Pé de Padre chegar.
Pé de Padre era como as pessoas da cidade chamavam o vigia do pomar da casa dos padres e também eterno coroinha. Pé de Padre era um sujeito magricela, mais falador do que a própria língua, parecia mais uma beata a tagarelar pelos salões paroquiais, fuçando cada milímetro da vida alheia, agindo como um psicanalista contrário... Não sabia guardar segredos. Ele conhecia todas as pessoas da cidade. Era de uns que ficavam nos finais de semana acordado para saber o que estava acontecendo com a vida alheia, depois ir se juntar com as beatas e levar os acontecimentos e as fofocas aos ouvidos do padre João, para que o pároco soltasse a sua feroz língua indicativa nos sermões da igreja, envergonhando qualquer cristão que para ele ousasse pisar na bola e atravessar as ordens da sua filosófica, dura e atrasada lógica de indução pastoral.
Foi então que...
__Pimenta, Bicudo, vamos embora, já tá tarde. Também está na hora de Pé de Padre chegar, e se ele chega...
Neste mesmo instante, uma voz fina e estridente ecoou...
__Espera aí cambada de vagabunda, tá pensando que eu não sei quem são vocês? Mas primeiro eu vou assar suas bundas com tiro de sal! __Pé de Padre gritava do alto de um murundu, no meio das sombras da noite ao ver só o vulto dos garotos.
__Mãe do céu, Pé de Padre está com a espingarda véia carregada com tiro de sal grosso, estamos fritos! __ Pimenta expressava-se, pulando de cima do pé de seriguelas e com o coração pra lá de acelerado.
__Frito que nada! Sebo nas canelas... Aquela beata velha
não nos acompanha nunca! __Timbal respondia já correndo.
Pé de Padre mirou sua velha cartucheira e disparou o tiro no vulto dos garotos que saíram em louca disparada com destino a qualquer saída da cerca de arame... Os caroços quentes de sal grosso que saíram do cano da espingarda foram zunindo, cortando as folhas das plantas mais baixas, fazendo o barulho de um chicote de couro quando é estalado no ar e se perderam junto às folhas secas caídas no chão... Felizmente por pouco os garotos não foram atingidos na fuga, a escuridão os ajudou.
Timbal, Pimenta e Bicudo como um relâmpago cruzaram o pomar. Passaram rapidamente por baixo da cerca de arame. Deram a volta pelo rio que ficava logo após os fundos do pomar e saíram numa rua acima da igreja. As mãos estavam vazias, pois os sacos com as seriguelas ficaram para trás, na cerca de arame. Só ficaram mesmo com as que haviam colocado na barriga. As pernas estavam trêmulas, mas suas bundas aliviadas, os tiros de sal não haviam acertado no destinado alvo.
__Será que ele reconheceu a gente? Se ele reconheceu estamos ferrados, estamos no mato sem cachorro, como diz minha tia! __indagou Bicudo, ainda bastante trêmulo.
__Rapaz, se ele viu a gente, o negócio tá feio, tá mais feio do que a boca murcha de Zé da Pinga, tá bravo!__ acrescentou Pimenta, num tom gozador.