América Misteriosa
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América Misteriosa - Dalton Delfini Maziero
AMÉRICA MISTERIOSA
Crônicas de um Continente Mágico
Capa e Fotos
Dalton Delfini Maziero
Ilustração da Capa
Frederick Catherwood – Stela of Copán, 1839
Dalton Delfini Maziero
AMÉRICA MISTERIOSA
Crônicas de um Continente Mágico
São Paulo, 2020
Copyright © Dalton Delfini Maziero
1ª Edição
Todos os direitos reservados
A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei n° 9.610).
Dados internacionais de catalogação na publicação (CIP)
M476a
Dalton Delfini Maziero — 1966 –
América Misteriosa - Crônicas De Um Continente Mágico / Dalton Delfini Maziero - 1ª Ed. – São Paulo/SP: Independente, 2020.
226 p. A5
ISBN: 978-65-86507-12-6
1. Coleções, história, descrição, critica 2. História da América
I. Título.
CDD: 830.9
C:\Users\Sandra\Desktop\LIVRO AMÉRICA MISTERIOSA\12-6.png"A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É essa emoção fundamental que está na raiz de toda ciência e toda arte."
Albert Einstein
Mololito El Frade, Tiwanaku (Bolívia).
Ao longo da Expedição Titicaca
SUMÁRIO
11 - Introdução
21 - Machu Picchu – A descoberta da cidade perdida dos Incas
23 - Teotihuacán e o mundo subterrâneo
25 - O vulcão Huaynaputina – A Pompéia peruana
27 - Titicaca – Cidades perdidas e tesouros submersos
29 - Nazca – Os enigmáticos geoglifos do deserto peruano
31 - El Infiernito – Misterioso centro astronômico do povo Muisca
33 - As sepulturas gigantes de Sillustani
35 - Costa Rica – O mistério das esferas de pedra
37 - Cidade Perdida – Mistério e encanto na floresta colombiana
39 - Pedra do Ingá – Arqueoastronomia no sertão da Paraíba
41 - Pucara – A pirâmide de Kalasaya
43 - Calçoene – Observatório celeste no Amapá
45 - A Senhora de Cao – Poder feminino no antigo Peru
47 - Frederick Catherwood – Artista do povo Maia
49 - Cerâmica Mochica – A arte em representar a vida
51 - Crânios de Cristal – Farça arqueológica revelada!
53 - Urus – Os homens da água
55 - Chachapoyas – O povo das nuvens
57 - Samaipata – Colossal petroglifos boliviano
59 - Chinchorros – As múmias mais antigas do mundo
61 - Coyolxauqui – Deusa da Lua e dos Derrotados
63 - Paquimé – Prodígio da climatização americana
65 - Tecnologia à serviço da arqueologia
67 - Porta do Sol – Eterno mistério americano
69 - Ekkekos e Anchanchus
71 - Touro Morto – O maior campo de petroglifos do mundo
73 - Chauchilla – As múmias do deserto
75 - Tlatelolco – A Praça das Três Culturas
77 - As Sete Cidades de Cíbola
79 - Chan Chan – A maior cidade de barro do mundo
81 - Quipus – Sistema de registro incaico
83 - A grande pirâmide Cahokia
85 - Kiva – Arquitetura do sagrado
87 - Pirâmide da Lua – Adoração ao deus da montanha
89 - Pakal O Grande – Rei de Palenque
91 - A Corrente de Huáscar e o mito do tesouro perdido
93 - O Cosmovitral de Toluca
95 - O Candelabro
de Paracas
97 - Paracas e as operações cranianas da antiguidade
99 - A balsa muísca – A cerimônia do Eldorado
101 - O Monte da Serpente
103 - Concha Spondylus – Tesouro pré-colombiano
105 - Nos subterrâneos de Chavín de Huántar
107 - San Agustín – Campo de estátuas mortuárias
109 - Kjarisiri – A lenda do degolador
111 - Cholula – A grande pirâmide mesoamericana
113 - Xibalba – O inframundo Maia
115 - Cacaxtla – Mágico mural mesoamericano
117 - Mochicas – O uso sagrado de plantas alucinógenas
119 - Sambaquis – Arquivos da pré-história
121 - Descoberta revolucionária no mundo Maia
123 - Copacabana – Eterna peregrinação pré-colombiana
125 - Puquios – Engenharia hidráulica do passado
127 - Pachamama – A criação no mundo andino
129 - Saywas – Calendário solar incaico
131 - As tumbas de Tlalpan
133 - O enigma dos fornos andinos
135 - El Caño – Os guerreiros de ouro
137 - O soroche a a coca
139 - A ilha Triquet
141 - Parime – O lago lendário
143 - O mistério dos geoglifos gaúchos
145 - Qorikancha – O Templo do Sol
147 - Novas descobertas na Ilha de Páscoa
149 - Iskanwaya renascida!
151 - A épica viagem oceânica de Tupac Yupanqui
153 - Um novo rosto para Luzia?
155 - O mito da criação Muísca
157 - Museu da Natureza
159 - Puma Punku – Um quebra cabeça em 3D
161 - Tulor – Vida em meio ao deserto
163 - Centéotl – A deusa do milho
165 - Os Atlantes de Tula
167 - Huaca Pucllana – Os adoradores do mar
169 - A pirâmide redonda de Cuicuilco
171 - O mito da Pedra da Gávea
173 - Pucará de Tilcara
175 - Os alucinógenos no mundo pré-colombiano
177 - Têxteis pré-colombianos
179 - O maior painel de gravura rupestre de São Paulo
181 - O mundo subaquático – Caminho para o inframundo
183 - O chocolate mais antigo do mundo?
185 - A civilização Chimú e o sacrifício de crianças
187 - Ilopango – O vulcão que abalou a civilização Maia
189 - Pachataka – A Forca
do Inca
191 - A elaborada arte do povo Hopewell
193 - As múmias de Qilakitsoq
195 - Inca Uyo – O Templo da Fertilidade
197 - Paracas – A tatuagem como status social
199 - Cieza de León – As Crônicas do Peru
201 - Waru Warus – Alimento no mundo pré-colombiano
203 - USME – Uma necrópole pré-colombiana
205 - O calendário asteca
207 - Machu Picchu – O enigma da falha tectônica
209 - Pueblo Bonito – A Árvore da Vida
211 - Ilhas artificiais no Amazônas
213 - Tambo Colorado – A casa vermelha Inca
215 - A estrada branca de Cobá
217 - A genética dos povos pré-colombianos
219 - Monte Sierpe – O maior geoglifo peruano
Ao lado de um dos Atlantes de Tula (México)
AMÉRICA MISTERIOSA
Crônicas de um Continente Mágico
A América exerce um poder absoluto sobre meu imaginário.
Desde criança estive acostumado a ler sobre os grandes exploradores de nosso planeta. O gosto pela leitura e o acesso aos livros do gênero, eu devo aos meus pais. Nas lembranças mais remotas, recordo minha mãe foleando "Deuses, Túmulos e Sábios de C. W. Ceram;
E a Bíblia tinha razão de Werner Keller;
Aku Aku – O Segredo da Ilha de Páscoa de Thor Heyerdahl;
A Estrada do Sol de Victor W. von Hagen entre outras pérolas do gênero
romance da arqueologia". As fotos existentes nesses livros são antológicas. Lembro-me de um homem ostentando chapéu branco e roupas de caçador, ao lado de beduínos com seus turbantes em pleno deserto. Eles observam a estátua recém-descoberta de Ichtup-ilum na antiga cidade de Mari, na Síria. Eram europeus – mistos de cientistas e exploradores – cercados muitas vezes por centenas de trabalhadores, que cavavam dia após dia, desenterrando muralhas e palácios. Em outra imagem, um grupo de nativos lacandones em frente às misteriosas ruínas maias, recém-saídas da floresta de Yucatã. Que lugares eram aqueles? Que povos haviam construído tais obras, para depois abandoná-las nos desertos e florestas mundo afora?
As imagens existentes nesses livros são estranhas e enigmáticas. Pouco nítidas, esfumaçadas, dando muitas vezes a impressão de retoques a lápis sobre a fotografia. Em outras páginas, reconstruções elaboradas de como seriam os monumentos do passado, davam margem a imaginação desses cientistas europeus. O século XIX até meados do XX foi o período romântico da arqueologia, onde a criatividade muitas vezes se sobrepunha à ciência. Mas pouco importava os erros de (re) construção e os métodos pouco técnicos de escavação daquela época. No imaginário de uma criança, aquilo era arqueologia! E isso significava descobrir o impossível, correr de setas envenenadas, escapar de armadilhas ancestrais, entrar em florestas impenetráveis e voltar de lá carregado de artefatos desconhecidos em ouro. Significava escavar vestígios de civilizações desaparecidas, trazendo à tona um passado esquecido. Significava vender artefatos aos museus do mundo, ficar famoso e entrar para a história! Significava enfim, sair do desesperador anonimato no qual me encontrava.
Estas antigas obras eram também, repletas de termos indecifráveis. Repetia aqueles nomes estranhos em minha cabeça, até decorá-los: Lacandones, Nínive; Nabucodonosor; Lorde Carnavon; Chichen-Itzá; Catherwood... Eram tantos nomes. E tanto orgulho quando eles saiam de minha boca naturalmente. Sonhava um dia ser como aqueles homens de chapéu branco, verdadeiros heróis do passado! Foi nessa época que, ainda criança, ganhei de presente uma pedra que mais parecia um vidro derretido. Era transparente como vidro. Disseram-me que provinha do vulcão Vesúvio, que destruiu Pompéia. Se era verdade, realmente não sei até hoje. Mas junto com outras peças, fez parte do meu
museu particular, que fundei com meu irmão nos anos 1970. Tinha também uma chave velha enferrujada, restos de ossos que encontrei perto de casa, um ferro a carvão de passar roupa e outras coisas que já não me recordo bem agora. Acho que tentava com isso, ser como aqueles cientistas
que via nas fotos. Mas logo percebi que minhas peças estavam longe da grandiosidade das encontradas mundo afora, na Mesopotâmia, Egito, Grécia ou Peru.
Com o tempo, entendi que aqueles livros não eram acadêmicos. Na verdade, cientificamente pouco confiáveis. Mas não importa! Eles me fascinam até hoje e vejo neles o embrião - não de um arqueólogo propriamente dito - mas de um historiador da arqueologia!
E então, descobri a América!
E fiquei fascinado ainda mais, ao ver que tudo estava tão perto do Brasil!
A América – ao contrário dos outros continentes – despertou a certeza que era possível chegar a esses lugares exóticos que vi nos livros. Com um pouco de dinheiro e planejamento, não eram destinos inacessíveis do outro lado do mundo, reservados apenas a alguns poucos mortais de chapéus brancos acompanhados por centenas de operários de pele queimada, que faziam o trabalho pesado.
Comecei a me interessar mais e mais pela conquista de nosso continente e pelos povos que aqui viveram. Eram relatos repletos de aventuras em terras selvagens! Relatos que custaram centenas de vidas, mas que transformaram meros homens em heróis
, em aventureiros. Com o tempo percebi que suas ações, na maioria das vezes, tinham pouco de heroísmo e muito de ganância – e ignorância – capitalista. Poucos foram os que se preocuparam em registrar o que viram. Quase nenhum explorador tentou entender o que presenciava. A conquista da América teve muito de massacre, de sangue, de desrespeito, e pouco de efetiva construção e compreensão. Contudo, aprendi que aqueles homens – os conquistadores – tinham sua função nesse processo doloroso.
Adoro cinema! Não me esqueço de uma cena na qual Colombo – interpretado por Gérard Depardieu – confronta o personagem Gabriel Sánchez (Armand Assante), tesoureiro da Corte espanhola. O filme é "1492 – A Conquista do Paraíso" (1992). Colombo, destroçado física, financeira e mentalmente após o retorno fracassado de suas viagens, insiste em sua obsessão pela América. Na cena, Gabriel irritado tenta entender o motivo de tamanha ambição, ao qual Colombo responde:
Gabriel: Você é um sonhador!
Colombo, olhando para uma janela: Olhe ai fora! O que vê?
Gabriel: Eu vejo torres, vejo palácios, vejo campanários. Vejo civilização! E vejo pináculos que atingem o céu!
Colombo: Tudo criado por pessoas como eu. Não importa quanto tempo viva Sánchez, há uma coisa que jamais mudará entre nós dois. Eu fiz. Você não!
Esse diálogo resume bem a função do explorador, do conquistador. Ele descobriu, fez o primeiro contato. Ele desbravou. Deu a cara para bater! Abriu caminho. E depois, como acontece na esmagadora maioria das vezes, é descartado pela burocracia, pelo Estado ao qual prestou serviços. Ele é quem faz o trabalho pesado, o serviço sujo. É quem mancha as mãos de sangue. É quem mata para não morrer. É quem semeia o caos. Mas embora descartado, é ele quem viu o nascer de uma nova era. Ele que teve a primeira sensação, rude e elementar. Ele que presenciou o modo de vida natural de antigos povos. Ele que descobriu novos mundos, pagando por isso com a própria vida. Enfim, ele que fez.
Senti parte dessa sensação na pele, quando contornei o lago Titicaca a pé em 1997, na fronteira entre Peru e Bolívia. Tive minha experiência, mesmo que pequena, como explorador. Presenciei coisas incríveis! Mas também sofri, machuquei meu corpo e cheguei a lugares que nenhum brasileiro jamais colocou os pés. Não fui reconhecido como explorador do modo como gostaria, mas no fundo ficou aquela sensação impagável comentada por Colombo. "Eu fiz. Você não!"
Dessa forma, ler os relatos de Vasco Nuñez de Balboa, Hiram Bingham, Pedro Sarmiento de Gamboa, Álvar Núñez Cabeza de Vaca, John Cabot, Alexander von Humboldt, Francisco de Orellana, Francisco Pizzaro, Hernán Cortés, entre outros, serviu-me para criar intimidade geográfica e espiritual com nosso continente, trabalhando meu imaginário em relação às Américas.
Claro que nunca fechei os olhos para outras regiões do planeta. Sempre vi com curiosidade e respeito as explorações de terras como a África, Ásia e Oriente Médio, com suas selvas impenetráveis, desertos gigantescos, rios caudalosos e tribos belicosas. Contudo, esses lugares citados sempre me passaram a impressão de terras conhecidas, de locais anteriormente explorados. Não eram terras totalmente perdidas. Muita gente já sabia que eles estavam lá. Antigas ruínas egípcias, gregas e romanas; assim como Persépolis, Jerusalém, Petra, Babilônia, Baalbek. Tudo isso já estava incorporado no imaginário do homem europeu.
Li sobre as Minas do Rei Salomão, as viagens navais de Sataspe e Eudóxio ao redor da África, a aventura de Marco Polo pela Rota da Seda e as explorações vikings pela Europa e muito além dela. Tudo isso me fascina até hoje, mas quase todos os relatos apresentam um nível de mistério senão aparentemente menor, talvez mais terreno. Isso ocorre talvez, pelo fato que os primeiros exploradores dessas regiões se perderam no tempo. Tomemos como exemplo o Egito. Não existem relatos de algum explorador que primeiramente descobriu aquelas ruínas perdidas no deserto. Até porque, não estavam perdidas. Embora muitas delas abandonadas, a região de fato jamais deixou de ser ocupada ao longo da história.
O mesmo não acontece com as Américas.
Com a América, criou-se um rompimento.
Não será exagero dizer que a descoberta das Américas foi - séculos XV-XVI -, o equivalente à descoberta de um "novo