Discover millions of ebooks, audiobooks, and so much more with a free trial

Only $11.99/month after trial. Cancel anytime.

Sob Domínio
Sob Domínio
Sob Domínio
Ebook227 pages3 hours

Sob Domínio

Rating: 0 out of 5 stars

()

Read preview

About this ebook

Numa cidade de interior, onde a maior problemática era a poluição de um de seus rios por um fábrica, repentinamente se vê cercada de mistério e a possibilidade de histeria em massa. Há quem diga que tudo tem a ver com uma lenda local sobre um bruxo que foi expulso da cidade. Estão dizendo que ele agora está de volta e sedento de vingança.
LanguagePortuguês
Release dateMar 24, 2019
Sob Domínio

Read more from Emerson Monteiro Da Silva

Related to Sob Domínio

Related ebooks

Religion & Spirituality For You

View More

Related articles

Related categories

Reviews for Sob Domínio

Rating: 0 out of 5 stars
0 ratings

0 ratings0 reviews

What did you think?

Tap to rate

Review must be at least 10 words

    Book preview

    Sob Domínio - Emerson Monteiro Da Silva

    Emerson Monteiro da Silva

    Sob Domínio

    O Horror invade as R uas

    Salvador

    2019

    1

    2

    Parte I

    1983 — Num sábado chuvoso de dezembro, uma verdadeira tropa de homens comuns e policiais fazia o que lhes parecia o mais correto a fazer, livrar a bela cidade de Ribeira do Sudoeste de um louco, pior, um louco que mexia com magia negra, alguém muito perigoso. O que agravava ainda mais a situação era o fato daquela comunidade ter um grande número de indivíduos extremamente religios os.

    O homem, aparentando pouco mais de vinte e cinco anos, apesar de alto trazia o corpo vergado pelo cansaço, a barba crescida cobria seu rosto, estava sujo, vestia farrapos de roupas caras, ele parecia descontrolado.

    —Isto não vai ficar assim! Vocês vão se arrepender um dia! Ruth, meu amor, em nome dos velhos tempos, me ajude! Por favor!

    A multidão guarnecia os limites do lugarejo como se precavesse contra a invasão de uma tropa bárbara, mesmo vendo ali apenas um homem .

    3

    E do meio de toda aquela gente que tomava a saída da cidade surge uma mulher aparentando a mesma idade do homem, vestia uma saia comprida preta e uma camisa cinza como se de luto estivesse, o vento que soprava ruidosamente parecia brincar com seus longos cabelos negros, ela trazia um semblante de tristeza e decepção.

    — Eu exijo respeito, nosso caso acabou faz tempo, hoje sou casada e mesmo que não fosse... Jamais me envolveria com alguém que...

    Ainda olhou na direção dos olhos daquele farr apo humano procurando uma razão. O que ela queria? Que ele fizesse alguma declaração miraculosa que o inocentasse de imediato? O homem sabia o que se passava na cabeça daquela mulher, assim como também sabia que qualquer coisa que falasse naquele momento seria inútil e mesmo que ela tivesse certeza de sua inocência nada convenceria a turba que o cercava com paus e pedras, o julgamento já havia sido feito e não adiantava mais lutar, por isso ele retribuiu com um olhar triste, mas permaneceu calado.

    —Meu Deus, você faz bruxaria! – ela cobriu o rosto para não mostrar as lágrimas que caiam copiosamente. Então saiu e não viu que algumas das pessoas ali presentes

    4

    jogavam pedras no homem como se voltassem aos tempos anteriores à Idade Média. Os perseguidores gritavam:

    —Fora demônio!

    —Mantenha-se longe de nossos lares!

    — Se voltar nem toda bruxaria do mundo irá te salvar!

    Enquanto bradavam jogavam paus e pedras, algumas acertando o alvo causando feridas que ficariam para sempre naquele homem que estava tendo um julgamento no mínimo cruel.

    — Vivíamos com o inimigo ao nosso lado, influenciando nossos jovens!

    E mais pedras riscavam o ar, por um segundo passou em sua mente deixar que alguma delas acertasse um ponto vital e acabasse de uma vez com aquele sofrimento, mas algo não permitia que se entregasse, o que seria? Seria algo escondido no fundo do olhar daquela mulher? Talvez, mas um outro sentimento prevalecia naquele instante, algo tão forte como o amor que sentia por aquela mulher, o ódio, o ódio por toda aquela cidade e a vontade de vingança.

    As pedras pararam de voar e a turba ensandecida cansou do espetáculo sinistro, o homem chegou a perceber

    5

    um certo medo nos olhos dos mais próximos, afinal de contas ele era um bruxo!

    Antes de se levantar da estrada onde foi bruscamente jogado, ele firmou seu olhar para todas as pessoas que agora davam as costas e voltavam para seus lares e pensou:

    Pelo menos o meu dever eu cumpri. Hoje! Mas, mais tarde eles se arrependerão! Amargamente! – tirou um pouco da poeira das vestes e começou sua nova jornada. Segundo o comentário do povo, ele saiu andando sem destino e ainda vaga pelo mundo sem ser aceito em lugar algum.

    E o bruxo foi banido e condenado a viver para sempre fora da cidade, seria alguém exilado, mas nunca foi totalmente esquecido. Naquele e por mais doze dias, choveu ininterruptamente, rios transbordaram, pontes caíram e plantações foram perdidas, muitos disseram se tratar de uma praga enviada pelo bruxo por ter sido expulso, no entanto, ninguém teve crise de consciência ou pelo menos ninguém demonstrou.

    O tempo passou e a vida continuou seu ritmo, aos poucos esta história foi se tornando parte do folclore local.

    6

    Muitas versões foram criadas, algumas diziam que ele tornou-se um pássaro grande e negro que sobrevoava pelas estradas assombrando os viajantes, outras diziam que as corujas, aves que começaram a aparecer na região seriam espiões alados do bruxo, havia também os que diziam que as crianças mortas precocemente teriam suas almas cativas pelo maldoso homem, uns mais coerentes diziam que o homem teria simplesmente se mudado para uma outra cidade e vivia tranqüilamente tentando esquecer o ocorrido, os mais exaltados diziam se tratar do próprio senhor das trevas, não se sabia mais o que era verdade ou o que era pura crendice popular.

    7

    Parte 2

    2002 – 09 de janeiro, 9:45. Uma quinta feira de céu claro e sem nuvens, o sol ainda brilhava intenso como em qualquer manhã de verão, pássaros voavam de um lado para o outro em constante alegria, a pequena cidade de Ribeira do Sudoeste realizava mais um de seus eventos sociais em que boa parte da população se reunia. Estavam lá entre outros: padeiros, carteiros, professores e principalmente donas de casa que não tinham muita coisa interessante para fazer em suas vidas e esperavam situações como esta para se interagirem com a comunidade, em outras palavras era um povo muito curioso – para não usar outro termo!

    —... Em nome do Pai, do filho, do Espírito Santo, Amém! – encerrava assim a cerimônia do padre Tenório e foi apenas isso que a jovem Valéria ouviu em todo o tempo em que esteve no funeral de seu inesquecível Dagoberto Cabeludo ou o Betinho, que era como preferia chamar seu namorado, infelizmente agora tudo estava além de qualquer coisa que pudesse fazer, ele estava morto e

    8

    enterrado. E ela? Bem, ela não conseguia nem se mover, ainda estava em choque tentando assimilar o que aconteceu. Valéria era um belo exemplo de juventude, alta, magra, cabelos castanhos e compridos, seu lindo sorriso era admirado por todos, mas ninguém o veria por um bo m tempo, assim como seus olhos que antes eram radiantes e agora adquiriram um aspecto vazio.

    — Val? Val! Olha pra mim? – era Isabel, sua melhor amiga, uma garota bonita, não chamava tanta atenção quanto Valéria, mas também era admirada pelos garotos da cidade. Era morena de olhos verdes e tinha um corpo invejado pelas colegas do terceiro ano do ensino médio, mas neste momento nem toda a vaidade do mundo a tiraria de perto daquela que era sua amiga desde a infância. Ela apenas abaixou a cabeça.

    —Vamos, sua mãe já está indo pro carro. Venha! —Ele nem sequer veio!

    —Ele quem?

    —O velho!

    — Você sabe que ele nunca aprovou seu namoro com o Cabe... Quer dizer, com o Dagoberto, além do mais seu pai anda muito ocupado.

    9

    — Tem razão, todo aquele pessoal ativ ista protestando contra a fábrica, mas, puxa vida, ele trabalha a poucos metros daqui, era muito importante pra mim sua presença aqui comigo!

    — Vamos, sua mãe já entrou no carro, está nos esperando.

    No trajeto para o automóvel as pessoas davam pêsames, professores, colegas e amigos. Mas a jovem que havia perdido talvez o grande amor de sua vida não conseguia falar mais nada, a angustia era grande demais. Quando a Pick-up Ranger estava próxima de sua garagem a três quarteirões do cemitério uma cena chamou a atenção de todos, dona Ruth nem estacionou a carro direito e logo desceu para se dirigir a um grupo de meninos que pareciam estar espancando um outro garoto. Dois deles estavam com paus nas mãos.

    —Parem já com isso, antes que eu entre em contato com o juizado de menores, onde já se viu espancar um cole... Um gato?

    —É dona, um gato! – disse um deles.

    —Mas não era um gato comum! – falou um outro. —Como assim? – quis saber a mãe de Valéria

    10

    —Era um monstro dona! Tá vendo o Dinho? Dinho mostre a ela o que o gato fez em sua perna.

    — Oh! Venha rápido comigo! Isabel, Valéria, me ajudem aqui, este garoto precisa de cuidados urgentes, vamos levá-lo pra dentro!

    Quando acomodaram o garotinho de

    aproximadamente nove a dez anos no sofá, perceberam que ele estava fervendo em febre, a perna apresentava um machucado que não tinha nada a ver com mordida de gato ou nenhum outro animal, estava cheio de bolhas, escurecido dos lados, tinha manchas esverdeadas ao redor e exalava um cheiro esquisito, na verdade fedia muito.

    —O menino tem telefone? – perguntou Isabel a um dos meninos.

    —Não senhora, mas ele mora a duas quadras daqui, eu posso ir lá avisar à mãe dele.

    — Então vá logo, vou limpá-lo, mas acho que terei que levá-lo a um pronto socorro!

    Dona Ruth estava ficando apreensiva, aqueles sintomas eram estranhos por demais.

    Valéria apareceu com um pano úmido e um vasilhame com água quente e Isabel trazia uma série de

    11

    utensílios de primeiros socorros, foi quando esta perguntou ao menino que havia ficado ali imóvel, vendo o amigo deitado e indefeso.

    —Agora nos explique exatamente o que aconteceu! —A gente estava brincando com o Jack...

    —Quem é Jack? – pergunta Valéria.

    — Jack é o gato... Ele começou a ficar esquisito, o pêlo dele estava caindo e o couro já estava até aparecendo, estava também muito irritado, de repente ele atacou o primeiro que tocou nele, sobrou pro pobre do Dinho! Jack começou a cuspir uma gosma verde, a gente achava que ele estava se transformando num monstro! Então resolvemos agir!

    —Daí vocês decidiram matar o monstro, quer dizer, o gato? – perguntou Valéria já totalmente esquecida do enterro.

    — Ele ainda está com uma febre muito alta, vamos limpar a ferida bem devagar, eu vou segurá-lo enquanto você passa de leve o pano úmido está bem, minha filha?

    — Sim mãe. – de repente o desespero daquelas crianças mobilizou a mente daquelas três mulheres.

    12

    Quando foi feita a limpeza o menino se contorceu, soltou um grito e desmaiou, pelo menos serviu para que o buraco deixado na parte de trás da perna fosse cuidado, sangrou muito e saiu muito pus também, mas era preciso que o garoto fosse pra um pronto socorro ou qualquer outro lugar especializado.

    —Menino, vá ver se a mãe deste aqui já está vindo ! Rápido!

    Como em resposta a campanhia toca insistentemente, Valéria foi atender e viu além do garotinho uma senhora aos prantos e parecia totalmente fora de si.

    — O que vocês fizeram com meu filho, desgraçados?

    — Nós estamos cuidando do ferimento dele. S ua mal agradecida! – gritou Valéria.

    — Calma! Minha filha ela está nervosa, não sabe o que diz!

    — Mas a senhora sabe! Meu Deus! Eu sabia que ia acontecer, ele não quis se livrar daquele gato imundo! – disse a mulher ainda num tom acusatório.

    — Do que a senhora está falando? O que é que eu sei? – perguntou intrigada, dona Ruth.

    13

    — Quer mesmo saber? Aquele bicho foi achado junto de um cão morto perto do cemitério. Achei o bicho estranho e resolvi ver o lugar onde foi encontrado, lá estava o corpo do cachorro, estava muito esquisito, todo desgracento, com manchas verdes e azuis, tinha uns cinco urubus mortos do lado, pedi pro meu filho que se livrasse do gato, mas era tarde, ele se apegou com o bichano, mas eu sabia que o bicho também podia estar contaminado!

    — Contaminado? – gritaram as três mulheres em coro.

    —Isso mesmo, pela fábrica de teu marido!

    — Mas... Acho que este bate-boca agora é menos importante, temos que levar seu filho ao hospital o mais rápido possível!

    A mulher era de baixa estatura e magra, mas que demonstrava muita força, seu aspecto humilde dizia tudo: tratava-se de uma pessoa muito sofrida.

    — Se acontecer alguma coisa ruim com meu filho vocês vão pagar muito caro, entenderam bem?

    Dona Ruth, Valéria, Isabel e a mãe do ga roto entraram no carro levando a pobre e febril criança em

    14

    direção ao hospital da cidade. Durante a viagem ninguém falou, apenas se ouvia os gemidos do garoto.

    Enquanto isso, os dois companheiros conversavam sentados na calçada.

    —E aí, que é que você acha?

    — Não sei Juninho, você viu como estava o arranhão ?

    — Arranhão não! Havia um verdadeiro rombo na perna do Dinho!

    —Eu acho que ele vai ficar igual ao Jack!

    —Vire essa boca lazarenta pra lá Tico! Hum!

    — O que foi Juninho, tá sentindo alguma coisa? O que é isso na sua mão?

    O menino tentava disfarçar, mas era em vão, estava claro que algo havia de errado e o suor excessivo na testa denunciava.

    — Na-nada! – e o garoto apavorado tentava esconder a mão.

    —Deixe eu ver!

    Ele mostrou a mão, a princípio existia ali um pequeno arranhão causado pelas garras do Jack, provavelmente criado no momento em que eles atacavam o

    15

    animal a pauladas, agora surgia no lugar uma chaga aberta, cheia de bolhas e uma coloração verde- azulada.

    — Eu vou morrer ou vou ficar louco como ficou o Jack e você vai ter que me matar também! – E Juninho começou a chorar, abraçado pelo seu fiel amigo.

    —Fique frio, o Dinho vai melhorar e você também! —Não sei Tico, só sei que nunca deveríamos ter ido brincar perto daquela fábrica!

    11:00 h. O clima também estava tenso na Fábrica Pontes de Potes para Congelamento, mas por out ros motivos. A única sala com ar condicionado, era sofisticada e luxuosa, parecia um apartamento com uma série de mordomias, muito bem organizada e limpa ao contrário do restante da fábrica, situava nos fundos onde se encontrava o dono: Mauro Pontes. Sentado em sua confortável cadeira acolchoada com forro de couro importado e de espaldar alto ele espera ansiosamente a chegada de um de seus assessores. O toque do telefone o assusta.

    —Sim Clarice, quem quer falar comigo ?

    Do outro lado a voz doce e ao mesmo tempo rouca da secretária Clarice respondia.

    16

    —É o Seu Rogério, ele diz que o senhor o espera e que tem notícias urgentes!

    —E está esperando o quê criatura? Mande-o entrar! E um sujeito alto e magro aparece, sua cara de pessoa mesquinha assemelhando um corvo descrevia visivelmente em sua testa o que era: um bajulador de marca maior e de muito pouca confiança.

    — Boa tarde senhor! Tenho notícias de que não vai gostar muito!

    —Diga logo, não faça rodeios!

    — As vendas vão mal. Dizem que é por causa do que as pessoas andam dizendo da fábrica e do senhor!

    —E será que eu poderia saber o que andam falando de minha fábrica e de mim?

    —Dizem que a sua fábrica é muito poluente e que o senhor não dá a mínima pra isso, pior, dizem que o senhor subornou os agentes da vigilância sanitária. E tem mais, quando vêem algum de seus produtos nas lojas não compram, é uma espécie de boicote!

    — Eles me acham corrupto? Só por que subornei o agente, tanta gente faz isso! Você acha que agredimos muito o meio ambiente?

    17

    — Sinceramente... Acho que se referem ao vazamento de produtos químicos no rio!

    —Que vazamento?

    —O senhor não sabia?

    Nervoso Mauro franze a testa, cerra o punho e dá um murro na pesada mesa de madeira de lei, depois liga o interfone.

    — Clarice, mande chamar imediatamente o encarregado do descarte de detritos, faça isso o mais rápido possível!

    —Sim senhor! Já providenciarei!

    — Quanto a você...

    Enjoying the preview?
    Page 1 of 1