Luas de Junho
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Prosa com verso e verso com prosa. Eu me sento com a palavra e ela me conta coisas…
Luas de Junho é apenas um pequeno pedaço dessa parceria, e mais não digo: a não ser que meu sossego, meu desassossego, tudo o que me desatina, amanhece palavra.
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Book preview
Luas de Junho - Miryan Lucy de Rezende
Título:
Luas de Junho
Copyright© 2021:
Miryan Lucy de Rezende
Capa:
Alexandre França
Revisão:
Ana Clara Arantes
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra
sem o consentimento por escrito da autora.
1ª Edição digital – 2022
Adelante é um selo editorial de
Gulliver Editora Ltda.
Para mais informações:
www.gullivereditora.com.br
(37) 3511 – 1120
Aos meus pais, Elpídio e Thereza,
amor que tenho por herança.
Aos meus irmãos,
pessoas-casas, meus abrigos.
Aos meus filhos,
amor que deixarei como herança.
A vocês, gente do meu caminho.
Por isso a palavra. Solta, verbalizada, transformada em voo, em viagem, em lugar de estada ou passagem. Por isso a ela me curvo, e ela me conduz, me livra, me salva, me dá entendimento; é unguento, bálsamo e sopro quando a vida se mostra ferida aberta ou é deserto que só eu posso atravessar.
Mas ela, a palavra, sempre está lá para me dar a mão e caminha comigo ainda que no silêncio – o silêncio que nada mais é que todas as palavras unidas em prece pra que eu não me perca nunca delas.
A palavra é minha escolha e transformá-la em poemas e textos
é meu jeito de estar aqui.
No início Deus criou o verbo; eu vim junto.
Prefácio
Como um bom chef de cozinha, que intui a quantidade certa de cada ingrediente para resultar num magnífico prato, Miryan Lucy de Rezende sabe a medida exata das palavras para que elas comportem sentimentos dentro de um texto, como podemos conferir nesta obra.
Os que a conhecem sabem que esta capacidade não se restringe às palavras escritas. Miryan é daquelas pessoas as quais, após um longo papo, nos levam a ter a sensação de ter feito um passeio, uma viagem repleta de bons momentos. Sua retórica está sempre entremeada por gostosas gargalhadas, próprias de quem não tem medo de vasculhar todos os cantos da alma, olhar dentro dos olhos da tristeza, chorar sua dor, enternecer-se e depois desabrochar e cantarolar, brincando com a menina que esta mulher é.
No entanto, palavras não têm tamanho suficiente para caber uma definição desta alquimista de sentimentos e sensações. Quando ela me contou sobre a forma como havia organizado esse seu livro, considerei muito natural que fosse assim, utilizando as fases do nosso mutante satélite que ora reflete, ora esconde a luz da estrela que dá vida a todos os habitantes da nossa casa azul.
Luas de Junho poderia ser Luas da Vida. Um livro para ficar do nosso lado sempre, para lermos e relermos assim meio à toa, saboreando cada construção, conhecendo as diversas gamas que nossa Miryan, mestre das palavras, nos presenteia com sofisticada simplicidade. Cada página é uma oportunidade de nos conectarmos com sua percepção do mundo, e assim, quem sabe, brilharmos um pouquinho juntos com ela.
Ivone Santana
Jornalista, Empreendedora social, Consultora em inclusão, diversidade e sustentabilidade
Junho
Junho. Sua fogueira trepida, trepidam os corações.
Mês danado de bão!
Tem festa pra tudo que é lado, tem doce e tem salgado: pipoca, canjica, quentão.
Tem correio elegante pra juntar os casalzinho, aqueles que tão sozinho, sem amor e sem paixão.
Ah, mas pra quem tem do lado o carinho do amado tem um dia especial... o dia dos namorado.
Que mês mais chique, sô!
E como se não bastasse, é um mês de oração; novena se faz de noite, pra São Pedro, Santo Antônio, São João. Meu Deus, que animação! Em junho tá tudo em festa – até o céu com toda essa devoção! E o coitado do Antônio, o santo casamenteiro, vira amigo, escravo e companheiro da moça que quer marido e disso não abre mão.
Ô mês danado de bão! E ainda tem simpatia que também não se faz de dia, só de noite, na surdina da madrugada, na hora determinada, pra descobrir tanta coisa: a primeira letra – um nome –, aquele tão esperado... como se chama o amado, o reservado pra mim?
E, mais uma vez, santo Antônio! É ele o requisitado; e que não falhe o danado, senão, nem sei coitadim...
É o mês dos namorado! É também mês de barracas, de sanfona e de quadrilha e é tudo maravilha – nas cores, nas fitas, na gente bonita, que dança, que brinca, que agita, que faz dessa festa um romance sem fim.
É nesse mês tão caipira que eu redescubro a cabocla que ainda mora em mim.
Pois foi assim que eu vim. Numa noite bem junina, com uma lua cristalina, o amor me acolheu. Alguns junhos já passaram, tantas luas já brilharam no arraiá e sobre mim.
Então, num correio elegante, peço a Deus mais um instante, mais um junho trepidante na fogueira do viver.
Na linha da minha vida, mais uma bandeirinha de chita, hoje eu vou estender!
Parte I
Lua Nova
Entre Sol e Terra
A Lua habita
A Lua orbita
Longe da órbita do nosso olhar.
Eu abri a palavra céu, e ela pingou estrelas, debulhou-se em nuvens,
clareou, amanheceu, anoiteceu, enluarou.
Por fim, desmanchou-se em chuva até o último pingo reconstruir o azul.
Foi quando eu vi o infinito.
Achei lindo.
Das Querências
Quero sol e mar
Sal e ar
Conchas pro colar
Ave a navegar
Asa delta de um anjo milenar
Serramar
Lá onde o mar encontra a serra
Lá onde a serra beija o mar
O meu olhar em espuma se derrama
Na areia do teu corpo a me esperar.
Chuva
Havia um tempo...
Chovia.
A chuva convidava: só para vê-la a gente saía.
Quanto mais chovia, mais a gente se queria.
Houve um tempo em que chover era nossa mais pura poesia.
Lições do mestre
O discípulo pergunta:
– Mestre, o que é um encontro de almas?
– É quando você, ao conhecer alguém, diz muito prazer, enquanto sua alma sussurra:
Que saudade!
Partidas
A vida pode estar por um segundo
Pode estar indo do mundo.
A vida pode estar se despedindo
Pode estar indo.
A vida pode estar a um passo
Estar por um fio
Te deixar com frio de ausência e dor.
A vida pode estar partindo.
A vida pode virar saudade
Assim, de repente,
Quando alguém parte.
Pequeno esboço de uma alma
Ela tinha, assim, por se dizer, uma flacidez na alma. Alma esponja, por onde ia entrando o mundo. Chorava o choro de muitos e ria as felicidades de tantos.
E ia se crucificando a cada engano, como se lhe tivessem atribuído apenas o dever de sangrar.
Coração pé de serra
Quanto maior a desilusão, quanto mais o mundo se agiganta, mais tiro dos pés os sapatos, mais tenho ouvido pra riachos, mais amiúdo os zóio
, pra ver o que é mais pequeno e bom.
Quanto mais aperta meu peito essa tal desilusão, mais pé de serra, seu moço, é esse meu coração.
Receitinha de paz
Ficou triste: pintou de azul.
Foi ferida: pintou de azul.
Decepcionada: pintou de azul.
Inconformada: pintou de azul.
E aí, um dia, de novo, ela virou céu!
Testamento
Quando eu partir vou te deixar três certezas pra enfeitar o caminho:
Que a margarida é bela.
Que o segredo do colo é ser ninho.
E que foi a poesia que te fez passarinho.
Das belezas
A beleza dá em cachos; riachos.
A beleza é rasteira, feiticeira dos campos.
A beleza está no alto; no escondido recanto.
No canto – encanto de cada ser.
Verde
Verde que te quero canto
Verde que te quero manto
Verde que te quero encanto
Verde que te quero ver-te como quero: meu!
Despedida
É frio. É fim. É tarde.
Nem malas, nem mágoas carrego.
Lembranças eu levo.
São meu cobertor.
Esperas
A flor já está no vaso, e a cortina de renda, tecida de esperas, também espera um pouco aflita.
A chave, atada a uma delicada fita, faz de um