Prematuros
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João Pedro George
Nasceu em Moçambique, a 13 de Fevereiro de 1972. Doutorado em Sociologia da Cultura, é professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (Universidade Nova de Lisboa) e autor de obras como O Meio Literário Português (1960-1999); Não é Fácil Dizer Bem; Como Sobreviver a um Terramoto em Portugal; Puta que os Pariu! A Biografia de Luiz Pacheco ou O Que é um Escritor Maldito? Ensaio de Sociologia da Literatura. Em paralelo, depois de ter colaborado na imprensa (O Independente e Periférica), na secção de crítica literária, divide a sua actividade como tradutor, editor de textos, revisor tipográfico e ainda como escritor-fantasma, trabalhos que lhe permitiram, durante anos, viver exclusivamente da escrita.
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Prematuros - João Pedro George
1.
Quando entrei na UCIN do Hospital Santa Maria, a primeira que visitei para esta viagem ao mundo dos cuidados intensivos neonatais, as recordações dispersas e difusas do nascimento da minha filha materializaram-se novamente, converteram-se em algo real e palpável. Ser mãe ou pai de um «grande prematuro»¹ é uma dura circunstância, enche-nos de sombras e de dúvidas, obriga-nos a fazer perguntas terríveis: o que é que fizemos de errado? Porque é que isto aconteceu? Porque é que o nosso filho nasceu tão abruptamente? Sobreviverá? Será saudável? Conseguirá andar, falar, ver? O medo, o desconhecimento, a incerteza.
Em contraste com o aspecto sombrio do enorme edifício do Hospital Santa Maria, onde os corredores são grandes como ruas, a neonatologia do departamento de pediatria (no 7º piso do Bloco de Obstetrícia e Pediatria), dirigido pelo Professor Doutor Carlos Moniz, procura criar um ambiente diáfano e alegre. Quando se entra, a primeira coisa que chama a atenção é o Panda gigante que nos saúda, a um canto da entrada, com uma expressão sorridente. Depois, as paredes brancas adornadas com desenhos infantis – balões, pássaros, nuvens, ursinhos –, transmitem uma sensação de calma e serenidade. Junto à porta que nos introduz na neonatologia, do lado direito, uma lista com os nomes das empresas que ajudaram a melhorar aquele serviço. Graças a esses apoios, «neste momento o Santa Maria não tem carências. Tivemos alguma sorte, porque o serviço foi todo equipado há poucos anos e as instalações foram remodeladas em 2011», diz Carlos Moniz.
Avanço pelo corredor, passo por várias divisões, um gabinete médico, uma sala de desinfecção, outra de arrumações. Detenho-me no gabinete da enfermeira-chefe, Ana Sequeira, a pessoa que mais sabe sobre aquela UCIN. Antes de me fazer uma visita guiada, explica-me tudo sobre os procedimentos e o funcionamento da unidade, que conta com dez neonatologistas (pediatras com treino especializado em recém-nascidos), 38 enfermeiras (37 mulheres e um homem, o que parece confirmar a ideia de que o sexo feminino está mais vocacionado para esta área dos cuidados médicos), a maioria das quais especializadas em pediatria, e 12 assistentes operacionais, ou auxiliares de acção médica, que fazem a limpeza do equipamento, lavam a unidade do paciente que sai e preparam-na para o bebé seguinte. «São uma das peças fundamentais neste serviço», sublinha Ana Sequeira.
A unidade de neonatologia do Hospital Santa Maria recebe todos os bebés que nasceram com problemas e necessitam de vigilância, e que não têm condições para ficar no berçário, sejam prematuros ou não (uma UCIN só para prematuros não era comportável economicamente). Em 2010 nasceram ali 192 prematuros, dos quais 14 tinham menos de 28 semanas de gestação (cinco tinham apenas 25 semanas) e 23 desses bebés tinham menos de mil gramas. Em 2011, esse número subiu para 217 nascimentos prematuros, dos quais 33 tinham menos de 28 semanas de gestação e outros 33 pesavam menos de mil gramas. Muitos desses bebés vinham transferidos de outros hospitais ou maternidades do país, como Lisboa, Barreiro, Vila Franca de Xira, Caldas da Rainha, Santarém, Portimão, Cascais, Ponta Delgada, Beja, Évora, Penafiel ou Porto.
Além de servir todo o país, a UCIN deste hospital possui outra vantagem, que a singulariza: a pediatria está implantada num hospital geral, multidisciplinar e polivalente, com todas as valências, ou seja, acumula uma série de recursos de diversas áreas médicas (os monovalentes, que geralmente só contam com obstetras e pediatras, dispõem de menos capacidade de resposta: outros especialistas, como neurocirurgiões, cardiologistas ou oftalmologistas, têm de ser chamados de outros hospitais).
Em 2010 morreram na UCIN de Santa Maria nove crianças e em 2011 morreram 11. Ainda assim, «uma parte satisfatória corre bem», diz Carlos Moniz. «Em 2011 tivemos um bebé com 25/26 semanas de gestação e 500 e tal gramas, que nos primeiros dias ainda desceu para 470/480 gramas, e que após várias ocorrências, desde infecções a hemorragias cerebrais, acabou por ter alta e saiu daqui sem sequelas, com visão, audição… As hemorragias tinham sido reabsorvidas e correu tudo bem. Como este caso há vários.» Anos antes, em 2008, receberam também um bebé que sofrera uma asfixia grave durante o parto e que, na sequência disso, apresentara várias complicações multiorgânicas. Felizmente, o organismo do bebé conseguiu dar a volta e acabou por abandonar a UCIN com um bom desenvolvimento a nível psíquico. «Toleramos mais um insucesso num prematuro extremo que tem uma probabilidade de sobreviver mais reduzida que um problema num parto que dá origem a uma asfixia grave, por um acidente do parto, uma criança que não era prematura e que acaba por morrer ou ficar com sequelas graves. Todas as crianças têm direito a nascer bem, o que mais me incomoda é uma criança que tem o direito a nascer bem e que nasce mal. É pensar que poderíamos ter feito alguma coisa mais para que ela pudesse ter nascido