Ambiente em Portugal
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Sofia Guedes Vaz
Sofia Guedes Vaz tem trabalhado em diversos organismos públicos e privados, nacionais e internacionais, na área do ambiente. A sua formação académica, que começou em engenharia do ambiente e acabou em filosofia do ambiente, deu-lhe uma perspectiva interdisciplinar e uma compreensão abrangente do tema. Como comunicar melhor sobre temas ambientais é uma das suas paixões e fez parte dos Cientistas de Pé, um grupo que comunica ciência através de stand up comedy.
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Ambiente em Portugal - Sofia Guedes Vaz
Prelúdio
"Já sabemos quem é o inimigo. Somos nós"¹ foi a frase do cartoon que em 1970 marcou a primeira celebração do Dia da Terra e que resume de forma eloquente a relação que temos tido com o ambiente – porque, apesar de todos querermos um melhor ambiente, nem sempre é fácil, nem desprovido de contradições, conseguirmos ir nesse sentido. Um bom ambiente conflitua muitas vezes com outros bens
, e, por isso, os governos, as empresas e os indivíduos têm de enfrentar dilemas e tensões que nem sempre são fáceis de resolver.
Sabemos que os problemas ambientais são muitos e que o nosso planeta enfrenta actualmente escassez de alguns recursos, degradação dos ecossistemas, diminuição da capacidade para absorver todos os resíduos que são produzidos, e sabemos ainda que a capacidade de resiliência da Terra está a atingir o seu limite. Não são boas notícias, mas também não são novas, e os esforços feitos nas últimas décadas no âmbito político, científico e mesmo individual têm sido determinantes para contrabalançar os impactes ambientais provocados por um progresso e uma economia imparáveis e implacáveis.
A temática ambiental é complexa, envolve alguma dose de incerteza, e, por vezes, as soluções dependem do enquadramento dado, nem sempre havendo respostas taxativamente certas ou erradas. Uma das coisas que podemos fazer é informarmo-nos para que possamos enunciar opiniões mais fundamentadas sobre assuntos que nos afectam directa ou indirectamente. Esse é o objectivo último deste livro.
A Comissão da União Europeia lançou, em 2010, a Estratégia Europa 2020 que consubstancia a sua visão para o desenvolvimento da Europa, e onde apresenta cinco metas principais: emprego; investigação; educação; redução da pobreza; clima e energia. Esta estratégia centra-se na promoção de um crescimento inteligente (mediante o investimento na educação, na investigação e na inovação); sustentável (dando prioridade à transição para uma economia de baixo teor de carbono, eficiência de recursos e indústria competitiva); e inclusivo (que dedica especial atenção à criação de emprego e à diminuição da pobreza, assegurando a coesão social e territorial). Em 2014, na sua Comunicação em que avalia o estado da Estratégia, afirma: Ao longo do século XX, a utilização mundial de combustíveis fósseis foi multiplicada por 12 e a extracção de recursos materiais por 34. Hoje em dia, na UE, cada pessoa consome anualmente 15 toneladas de recursos e gera 5 toneladas de resíduos, acabando metade em aterros. As fontes de minerais, metais e energia, bem como os recursos haliêuticos (pescas), madeira, água, solos férteis, ar puro, biomassa e biodiversidade estão sob pressão, o mesmo acontecendo com a estabilidade do sistema climático. A procura de alimentos para consumo humano e animal e de fibras pode aumentar 70% até 2050, sendo que 60% dos ecossistemas mundiais mais importantes que contribuem para a produção desses recursos já foram degradados ou são utilizados de forma insustentável. A qualidade da água e os níveis de poluição atmosférica continuam a ser problemáticos em muitas regiões da Europa. A utilização insustentável dos solos está a consumir os terrenos férteis e, enquanto a sua degradação prossegue, a utilização de infra-estruturas verdes continua a estar abaixo do nível ideal. Paralelamente, a utilização não sustentável dos mares ameaça o frágil equilíbrio dos ecossistemas marinhos e afecta as actividades económicas relacionadas com a pesca e o turismo
. Não é uma descrição que nos deixe muito descansados, há ainda muito que fazer a vários níveis, e o individual, foco deste pequeno livro, nunca será despiciendo.
Mas, no fundo, talvez não exista uma crise ambiental. O conceito de crise pressupõe um estado passageiro ultrapassável, e a situação em que temos vivido nas últimas décadas veio para ficar. Mais do que uma crise, o que vivemos é um estado de transição ao qual nos deveríamos habituar, não de forma passiva, mas estudando para onde podemos, devemos e queremos ir. Um mundo pristino está fora de questão, assim como um crescimento económico estável. Os pontos de equilíbrio conhecidos estão a fugir-nos debaixo dos pés e temos de encontrar um novo tipo de harmonia social, ambiental e económica. Nada de novo para a humanidade, que é complexa e dinâmica. Mas agora é mais difícil, pois temos muito a perder, não conseguimos desmaterializar as nossas vidas de confortos vários, nem ver a face positiva de um futuro desconhecido. Além disso, resistimos a aceitar que o problema seja também nosso.
A atitude displicente relativamente ao planeta e às gerações futuras está assente numa cultura em que se ignora a pressão sobre os ecossistemas, e em que não se dá suficiente ênfase a questões de equidade, intra e inter-geracionais. A nossa sociedade de consumo, tecnológica, materialista, gastadora de recursos e utilizadora de mais do que aquilo de que o planeta dispõe, poderia interpelar-nos para um processo introspectivo, mas temos tendência para pensar o ambiente como algo que é essencialmente exterior a nós e remetemos facilmente a responsabilidade para o âmbito político ou científico, atribuindo a culpa aos outros; raramente o individual
entra nessa equação. O ambiente é tido como um problema
da política e dos políticos, da ciência e dos cientistas, da indústria e dos industriais, das empresas e dos empresários, e da sociedade em geral – não havendo um eu
em particular que se deva preocupar com o ambiente ou possa, por si só, resolver alguma coisa. Gostamos de pensar que fazer reciclagem chega. Mas a sustentabilidade impõe-nos certas exigências éticas, quer no plano pessoal (comportamentos), quer no plano político – individual (cidadania), e, por isso, é importante convocar uma reflexão sobre as nossas representações e sobre a maneira como nos relacionamos com o