Sociedade de Consumo e Consumidores em Portugal
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Mário Beja Santos
Mário Beja Santos trabalhou cerca de 40 anos em política dos consumidores. Além da atividade funcional, foi representante associativo, tendo exercido funções no Comité Consultivo dos Consumidores, na Comissão Europeia, e na direção da Associação Europeia de Consumidores. Foi autor de programas televisivos e radiofónicos, bem como de dezenas de trabalhos no campo específico do consumo. Colabora frequentemente com a imprensa regional e blogues, e exerce benevolato com associações de consumidores, como seu representante. Desde 2006 que se dedica igualmente a estudos sobre a colónia da Guiné portuguesa e a vida política na Guiné-Bissau, temas sobre os quais publicou uma dezena de livros.
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Sociedade de Consumo e Consumidores em Portugal - Mário Beja Santos
Sociedade de Consumo e Consumidores em Portugal Mário Beja Santos
Portugal chegou tarde à sociedade de consumo, mas adotou-a de forma inequívoca, assimétrica e concentrada na faixa litoral. Desde então, os portugueses aceitaram os benefícios de uma política de consumidores, mas sem se envolverem num movimento social com efetiva participação cívica: capaz, por exemplo, de questionar as decisões da União Europeia ou de responder às questões ambientais e de sustentabilidade.
Este ensaio contextualiza e traça o itinerário do consumidor português. Radiografa o presente e alerta para a transversalidade da chamada defesa do consumidor, que é muito mais do que a salvaguarda de direitos e se firma numa prática concreta de cidadania do consumo, em que os consumidores podem agir, entre a multiplicidade de parceiros, como um fio condutor do Bem comum.
Na seleção de temas a tratar, a coleção Ensaios da Fundação obedece aos princípios estatutários da Fundação Francisco Manuel dos Santos: conhecer Portugal, pensar o país e contribuir para a identificação e para a resolução dos problemas nacionais, assim como promover o debate público. O principal desígnio desta coleção resume-se em duas palavras: pensar livremente.
IMG_7786.jpgMário Beja Santos trabalhou cerca de 40 anos em política dos consumidores. Além da atividade funcional, foi representante associativo, tendo exercido funções no Comité Consultivo dos Consumidores, na Comissão Europeia, e na direção da Associação Europeia de Consumidores. Foi autor de programas televisivos e radiofónicos, bem como de dezenas de trabalhos no campo específico do consumo.
Colabora frequentemente com a imprensa regional e blogues, e exerce benevolato com associações de consumidores, como seu representante. Desde 2006 que se dedica igualmente a estudos sobre a colónia da Guiné portuguesa e a vida política na Guiné-Bissau, temas sobre os quais publicou uma dezena de livros.
Mário Beja Santos
Sociedade de Consumo e Consumidores em Portugal
Ensaios da Fundação
logo.jpgLargo Monterroio Mascarenhas, n.º 1, 7.º piso
1099-081 Lisboa
Portugal
Correio electrónico: ffms@ffms.pt
Telefone: 210 015 800
Título: Sociedade de Consumo e Consumidores em Portugal
Autor: Mário Beja Santos
Director de publicações: António Araújo
Revisão de texto: Mariana Matias
Validação de conteúdos e suportes digitais: Regateles Consultoria Lda
Design e paginação: Guidesign
© Fundação Francisco Manuel dos Santos, Mário Beja Santos, Janeiro de 2023
As opiniões expressas nesta edição são da exclusiva responsabilidade do autor e não vinculam a Fundação Francisco Manuel dos Santos.
A autorização para reprodução total ou parcial dos conteúdos desta obra deve ser solicitada ao autor e ao editor.
Edição eBook: Guidesign
ISBN 978-989-9118-67-6
Conheça todos os projectos da Fundação em www.ffms.pt
Consumatum Est
Introdução Somos aquilo que (e como) consumimos
O Big-Bang
O nascituro consumidor entra em cena: anos gloriosos (1945–1973)
Chegámos à sociedade pós-industrial: Portugal bate à porta da sociedade de consumo
A globalização, o mercado interno europeu, a redefinição da política dos consumidores em Portugal
Chegados ao ano 2000: consumidor mais equipado, cidadão mais desinteressado
Cultura de massas, o primo direito da sociedade de consumo
Saber mais sobre a sociedade de consumo e os direitos dos consumidores
Consumatum Est
No caso consumado do consumo
em que o marchante de toda a tralha acampa
do apetite bem espremido o sumo
o consumido também consome a campa.
Vais do teu tempo à morte, homem sem humo,
Oco e lançado, mas não pela tua rampa.
Ditam-te o pasto; és rês e deitas fumo.
És só pressão; e não te salta a tampa.
E, no último anel desta espiral,
com recibos por coluna vertebral,
do gesto aquisitivo, a estrénua caça
remexendo em ruínas e concheiros,
de humanos dias, só acha, verdadeiros,
restos de um anjo com dentadura falsa.
Natália Correia
Introdução Somos aquilo que (e como) consumimos
Agradeço, penhorado, o convite que me foi endereçado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, pois é pública e notória a inexistência de livros em português que reflitam sobre a sociedade de consumo; e nem mesmo dispomos de traduções de autores estrangeiros que colmatem esta falta.
Cumpre-me, em primeiro lugar, justificar o itinerário escolhido para esta narrativa, em que ficam de fora temas de primeira importância para se tentar entender a grande angular que é a sociedade de consumo — como é o caso, por exemplo, da cultura de massas (aqui abreviadamente tratado), da digitalização e inteligência artificial, entre outros, e que, seguramente influenciam o modo de olhar estas medidas políticas. Na verdade, não é possível compreender o consumidor sem primeiramente nos interessarmos pelo indivíduo, na longa caminhada pela sociedade de consumo. O consumidor não é um tubo digestivo ambulante, nem lhe está destinado viver como um disco rígido de direitos, escritos e vigiados pelo Estado, ou por quem o representa. Os consumidores não têm existência própria (consumidor é um estatuto), pelo que será inútil querer analisar as atitudes e comportamentos em matéria de consumo sem previamente observar as transformações que se desencadearam (e estão em permanente processo) nos nossos sistemas de valores, mentalidades, aspirações e opiniões. É esta a questão central do meu ensaio, justapondo, sempre que possível, o itinerário do consumidor português.
Vivemos um equívoco colossal, alimentado por muitos: tratar como sinónimos a política dos consumidores e a política de proteção do consumidor (designada em Portugal por política de salvaguarda dos direitos do consumidor). A política dos consumidores é transversal a qualquer sociedade, como entoa Sérgio Godinho em «Liberdade»: «A paz, o pão, habitação / Saúde, educação / Só há liberdade a sério quando houver / Liberdade de mudar e decidir.» Isto para significar que no amplexo de medidas de política a favor dos consumidores podem caber a tarifa social de eletricidade ou de gás natural, o livro de reclamações, a questão do crédito aos consumidores, as viagens organizadas, o tratamento de dados pessoais, mas também o apoio aos consumidores vulneráveis, a sua educação quanto à importância de consumirmos com limites, e de, a par de consumidores/utentes de bens e serviços, termos igualmente este estatuto em áreas como a da saúde; e, fruto do nosso tempo, podermos intervir e contribuir para um mundo mais sustentável, desde as alternativas energéticas à redução das desigualdades. Ora, o que está em voga é querer convencer o consumidor de que se tomam, com oportunidade, medidas em sua defesa, e que há uma multidão de juristas a transpor leis, que serão ratificadas pelos órgãos de soberania, e assim se prossegue na senda do progresso e do bem-estar. Há que distinguir que a política dos consumidores é transversal aos assuntos do Estado, e pressupõe um movimento social, isto é, cidadãos atuantes. Por sua vez, a política de proteção do consumidor (ou dos direitos do consumidor) tornou-se um assunto do Estado, e pode funcionar sem movimento social, agindo como uma burocracia zelosa, no pleno contentamento da transposição do que se decide em Bruxelas para melhor olear o mercado interno europeu. Esta é a grande diferença.
Convém recordar que tudo começou por