Humanae Absurdum: A Imagem do Humano na Obra de Albert Camus
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da antropologia filosófica; munido de todo arcabouço conceitual até então elaborado, procura apresentar nos escritos de Camus uma possível imagem do humano, na qual as três perguntas centrais da antropologia filosófica serão tratadas e pensadas ao modo de orientar a
formação de um humanismo muito peculiar.
Com linguagem fluida e muito palatável, dotado de admirável erudição, sem o peso crasso do academicismo, Carlos Eduardo Bernardo nos presenteia com esta obra, indispensável para todos aqueles que se interessam em conhecer ou se aprofundar na rica produção de Albert Camus, saber qual sua possível visão do humano e o quanto essa visão pode contribuir para a realização de nossa própria humanidade.
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Humanae Absurdum - Carlos Eduardo Bernardo
1
O EIXO PROBLEMÁTICO DA OBRA CAMUSIANA
1.1 A BUSCA DO PROBLEMA
A obra de Albert Camus é reconhecida como uma das mais marcantes produções escritas do século XX. O relativo isolamento do mise en scène filosófico francês, a partir da publicação de O homem revoltado, em 1951, a premiação com o Nobel, em 1957, e sua insistente recusa ao título de filósofo, preferindo antes o título de artista, fizeram com que a face filosófica de sua obra não recebesse da posteridade o reconhecimento que lhe é devido, dado à profundidade de seu pensamento e a liberdade de suas reflexões, que se desenvolvem em constante crítica às concepções filosóficas que se pretendem detentoras de domínio total dos problemas da realidade.
O fato de que Camus não tenha erigido um edifício filosófico logicamente estruturado, um sistema, ou mesmo que ele não tenha se intitulado um filósofo – ainda que tivesse esse título acadêmico – não inviabiliza o reconhecimento do estatuto filosófico de suas obras, além dos ensaios propriamente ditos, seus escritos versam sobre problemas existenciais, sobre o drama da existência do humano no mundo.
A natureza problemática
da escrita de Camus lhe outorga uma posição entre os filósofos, pois a sua sensibilidade estética e o seu pensamento arguto estão afinados com as incertezas e anseios de seus contemporâneos, cuja expressão se dá nesses mesmos problemas.
Reale e Antiseri na Apresentação
de sua monumental História da Filosofia caracterizam muito bem o que seja o pensamento filosófico no Ocidente e sua inextricável associação com a abordagem a uma problemática.
Existem teorias, argumentações e disputas filosóficas pelo fato de existirem problemas filosóficos. Assim como na pesquisa científica ideias e teorias científicas são respostas a problemas científicos, da mesma forma, analogicamente, na pesquisa filosófica as teorias filosóficas são tentativas de solução de problemas filosóficos.⁶
Os autores caracterizam a Filosofia como uma atividade humana centrada na solução de problemas filosóficos, portanto, sem os problemas não haveria atividade filosófica, esses problemas são a própria razão de ser da reflexão filosófica. Continuam eles:
Os problemas filosóficos, portanto, existem, são inevitáveis e irreprimíveis; envolvem cada homem particular que não renuncie a pensar. A maioria desses problemas não deixa em paz: Deus existe, ou existiríamos apenas nós, perdidos neste imenso universo? O mundo é um cosmo ou um caos? A história humana tem sentido? E se tem, qual é? Ou, então, tudo – a glória e a miséria, as grandes conquistas e o sofrimento dos inocentes, vítimas e carnífices – tudo acabará no absurdo, desprovido de sentido? [...] Eis, portanto, alguns problemas filosóficos de fundo que dizem respeito às escolhas e ao destino de todo homem e com os quais se aventuraram as mentes mais elevadas da humanidade, deixando-nos como herança um verdadeiro patrimônio de ideias, que constitui a identidade e a grande riqueza do Ocidente.⁷
Seguido da afirmação da inevitabilidade dos problemas filosóficos, temos um breve sumário de alguns dos mais espinhosos dentre esses problemas e asseverativa de que as mentes mais elevadas da humanidade
refletiram sobre e a partir desses problemas. Portanto, o debruçar-se sobre esses problemas, em certo sentido, constitui já a participação no grande fluxo da história da Filosofia, que, ainda de acordo com os mesmos autores, [...] é a história dos problemas filosóficos, das teorias filosóficas e das argumentações filosóficas
⁸.
A consideração acerca do caráter problemático da Filosofia, mais que um caráter sistemático, poucas vezes foi tão bem proposta quanto nos escritos do filósofo alemão Nicolai Hartmann