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COMENTÁRIOS AO CODIGODE PROCESSO CIVIL

TOMO XIII

(arts. 890-98 1)

LIVRO IV

DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS

TITULO 1

Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa

1)Especialidade e rito processual


2)Cumulação objetiva: condicional sucessiva, condicional eventual e concorrente

CAPÍTULO 1

Da ação de consignação em pagamento

1)Prestação “in obligatione” e “in solutione”


2)Análise da ação de consignação em pagamento
3)Legitimação ativa

Art. 890 e art. 891 e parágrafo único

1)Ação de depósito em consignação ou de consignação em pagamento


2)Tempo para o pedido de consignação em pagamento
3)Lugar da propositura da ação de conginação em pagamento
4)Coisa devida cujo lugar da entrega foi previsto
5)Juros e riscos

Art. 892

1)Principio de economia
2)Prestações periódicas no mesmo processo
3)Falha de prestação em tempo

Art. 893

1)Citação do credor
2)Contraprestação e depósito com cláusula

Art. 894

1)Escolha que cabe ao credor


2)Lugar do depósito e lugar da execução

Art. 895

1)Disputa da prestação e dúvida quanto a quem se há de fazer


2)Ignoráncia e dúvida sobre quem seja o credor ou sobre quais sejam os credores

Art. 896

1)Recebimento do depósito
2)Recusa e mora
3)Recusa justa
4)Despesas quanto ao tempo, lugar e importe do depósito
5)Suficiência satisfativa do depósito
6)Contestação pelo réu
7)Litispendência

Art. 897 e parágrafo único

1)Comparecimento do credor para receber


2)Não-comparência
3)Falta de contestação
4)Recebimento e quitação
5)Cognição completante
6)Comparência sem contestação
7)Curador à lide
8)Contagem do prazo para a contestação
9)Curso ordinário
10)Termo de entrega
11)Levantamento pelo devedor, até quando pode ser feito
12)Despesas com o depósito

Art. 898

1)Credor desconhecido ou dúvida quanto ao credor


2)Dia para o recebimento, dependendo de legitimação....
3)Citação e interesse do não-citado
4)Falta de acordo
5)Entrega da prestação
6)Não-comparência
7)Comparência
8)Arrecadação

Art. 899
1)Depósito que não foi integral
2)Prazo de dez dias

Art. 900
1)Resgate de aforamento

Da ação de dep6sito
1)Ação de depósito e conceito de depósito
2)Pretensões do depositante
3)Natureza da ação de depósito quanto à eficácia

Art. 901 e art. 902 e §§ 1.0 e 2.0

1)Ação de depósito
2)Depósito e negócio jurídico formal
3)Frutos e acessões
4)Coisas fungíveis e coisas não-fungíveis
5)Legitimação ativa
%)Legitimação passiva
7)Pena de prisão
8)Contestação e prazo para ela
9)Réu que contesta e prosseguimento do processo
10)Entrega, não-entrega e prisão
11)Valor da coisa
12)Documento necessário à propositura
13)Aparição e desaparição da coisa
14)Depositário judicial
15)Valor equivalente
16)Alegações do réu
17)Auto de entrega e solução da divida

Art. 903
1)Autos de entrega ou contestação
2)Exceção de incompetência ou de suspeição
3)Defesa, sobre o que pode versar

Art. 904 e parágrafo único


1)Réu que não entrega, ou não consigna a coisa depositada ou o equivalente
2)Pena de prisão
3)Busca e apreensão
4)Despesas e prejuizos

Art. 905
1)Busca e apreensão
2)Eficácia da busca e apreensão

Art. 906
1)Prosseguimento do processo
2)Execução pela quantia certa conforme a equivalência do valor da coisa

CAPÍTULO III

Da ação de anulação e substituição de titulos ao portador


1)Titulos ao portador
2)Ação de recuperação (substituição) do título ao portador
3)Conhecimento de transporte por terra, água e ar
4)Direito cambiário e cambiariforme
5)Perda e furto de títulos ao portador e ação vindicatória da posse
6)Melhor posse e vindicação
7)Prova a ser feita
Art. 907

Art. 908

1)Perda e desapossamento
2)Entrega ou amortização com a substituição da cártula
3)Amortização, em caso de perda e destruição
4)Pessoas injustamente desapossadas
5)Pretensão a não serem pagos a outrem capital e interesse
6)Petição inicial
7)Indíviduação do titulo
8)Tempo e lugar da aquisição e recebimento dos últimos interesses
9)Interesses
10)Negociação dos títulos
11)Réu ou réus
12)Intimação do devedor

Art. 909 e parágrafo único

1)Justificação inicial do pedido


2)Tenedor desconhecido ou incerto, lugar ignorado ou inacessível
3)Citação do tenedor
4)Terceiro que compareceu
5)Terceiro que se apresenta sem título e terceiro que se apresenta com titulo
6)Tenedor com o título e tenedor sem o título
7)Pluralidade de objeto

Art. 910 e parágrafo unico


1)Contestação
2)Apresentação da contestação

Art. 911

1)Procedência da ação
2) Improcedência da ação
3) Morte do título ao portador
4)Eficácia constitutiva, negativa ou positiva, da sentença
5)Prazo determinado pelo juiz
6)Natureza da sentença
7)Titulo da dívida pública ao portador
8)Não cumprimento da ordem pelo subscritor ou emissor

Art. 912 e parágrafo único

1)Destruição total .
2)Destruição parcial
3)Processo se não há contestação e processo se há contestação

Art. 913
1)Leilão público ou bolsa de valores
2)~ Heterotopia da regra de direito material’
3)Depósito da quantia apurada
CAPÍTULO IV

Da ação de prestação de contas

1)Pretensão à prestação de contas


2)Comínações

Árt. 914

1)Ação de prestação de contas


2)Sucessão
3)Direito de exigir prestação de contas e dever de prestá-las
4)Dever de prestar contas e direito de exigi-las

Art. 915 e §§ 1.0, 2.0 e 3•O

1)Pretensão a exigir contas


2)Prestação das contas pelo réu
3)Falta de contestação da ação e de alegação de não ser obrigado a prestar contas
4)Prazo para prestar contas ou defender-se
5)Apresentação das contas, em segundo mandado com preceito
6)Contas, apresentação pelo réu ou pelo autor
7)Consequências da inatividade do reu

Art. 916 e §§ 1.0 e 2.0

1)Prestação de contas pedida pelo que as deve prestar


2)Petição inicial e documentação
3)Oferecimento das contas e atitudes do réu
4)Aceitação das contas pelo réu
5)Cálculo em forma mercantil
6)Rito, se há contestação

Art. 917

1)Contas e inventário
2)Cumulação de ações
3)Forma mercantil e falta de pressuposto
4)Abrangência da regra jurídica

Art. 918

1)Saldo das contas e execução contra o devedor


2)Custas

Art. 919

1)Réu inventariante, tutor, curador ou depositário, ou outro administrador


2)Recurso

CAPÍTULO V

Das ações possessórias


1)Posse, poder fáctico
2)Posse de coisas incorpóreas
3)Espécies de posse: posse imediata e posse mediata
4)Pluralidade possível de posses mediatas

5)Unicidade da posse imediata


6)Medidas constritivas
7)Posse e limites
8)Enfiteuse e posse
9)Ação possessória contra o senhorio
10)Usufruto, uso e habitação, acontecimento no mundo fáctico
11)Legitimação ativa
12)Tutela possessória
13)Morte e sucessão do titular do direito real limitado
14)Incursões de usufrutuário, usuário ou habítador
15)Conteúdo do direito real limitado e posse
16)Anticrese e ações possessórias
17)Penhor e ações possessórias
18)Servidão e proteção possessória
19)Ações possessórias
20)Legitima defesa e justiça de mão própria
21)Servidões descontinuas e servidões ccntínuas não aparentes
22)Posse e registro
23)Possuidor da servidão
24)Ações possessórias e atos necessários ao exercício da servidão
25)Mandado de segurança e ação possessória

Das disposições gerais

Art. 920
1)Classificação da ação
.2) Composse e processo
3)Posse e falso locatario

Art. 921
1)Cumulação de pedidos
2)Condenação em perdas e danos
3)Cominação de pena para caso de nova turbação ou de esbulho
.4)Desfazimento de construção ou de plantação feita em detrimento de posse
5)Indenização das perdas e danos e cômputo
6)Onde se condena
7)Eficácia da sentença
8)Pluralidade de pessoas que se dizem possuidoras
9)Se o reintegrado é, afinal, vencido
10)Sentença contrária, para todas as partes
.11) Novo esbulho ou nova turbação
12)Honorários de advogado

Art. 922
1)Ação metida na contestação
2)Se há duplicidade na ação de manutenção; “actio duplex”
3>Se há duplicidade na ação de reintegração

Art. 923
1)Alegação de dominio
2)Cognição incompleta na ação possessória quanto à alegação de domínio
3)Sentença “in petitorio”
4)Posse imprópria e exceção de domínio
5)Dúvida sobre a posse, não quanto ao domínio

Art. 924
1)Ações interdita is
2)Elementos eficaciais
3>Cognição incompleta
4 Recurso
5) Legitimação ativa
6)Legitimação passiva
7)Posse e atos judiciais
8)Posse, pré-contrato e contrato
9)Ação de esbulho contra terceiro
10)Servidor da posse, legitimado passivo
11)Composse e defesa

Art. 925
1)Caução
2)Seqüestro e cauçao
3)Seqüestro convencional

Art. 929

1)Expedição imediata do mandado de manutenção ou de reintegração


2)Falta de expedição

rt. 930 e parágrafo uníco


1)Decisão liminar
2)Citação
3)Cominação da pena

Art. 931
1)Ordinariedade eventual
2)Complemento da cognição

Seção II
Seção III

Da manutenção e da reintegração de posse


1)Proteção interdital
2)“Interdicta retinendae possessionís”
3)Reintegração, recuperação
4)Forma do processo
5)Ação de demarcação e posse
6)Confusão de limites
7)Justificação administrativa da posse
8)Concorrência de pretensões e pretensão à tutela da posse

Art. 926

1)Manutenção
2)Reintegração

Ârt. 927 e art. 928 e parágrafo único

1)Posse, turbação e esbulho


2)Postulação e prova
3)Fato do réu
4)Data da ofensa
5)Só se mantém, segundo os princípios, quem tem posse
6)Esbulho e posse perdida
7)Justificação prévia
8)“Inaudita altera parte”
9)Sumariedade e ordinartedade
10)Posse de menos de ano e dia
11)Posse de mais de ano e dia
12)Manutenção ou reintegração contra pessoas jurídicas de direito publico

Do interdito proibitório

1)Interdito proibitório, origens


2)Posse e interdito proibitório

Art. 932
1)Ação de força iminente
2)Receio
3)Turbação ou esbulho iminente
4)Posse
5)Ofensa
6)“Justo receio”
7)Pressupostos
8)Infração do preceito
9)Mandado de manutenção, eventual

Art. 933
1)Direito ao interdito proibitório e exercício da ação
2)Pessoas jurídicas de direito público
3)Redução da cominação
CAPÍTULO VI

Da ação de nunciação de obra nova

1)“Operis novi nuntiatio”


2)Cumulação objetiva
3)“Opus”
Art. 934
1)Pretensão de nunciar
2)Em que se baseia a pretensão de nunciar
3)Obra nova
4)Relação de vizinhança
5)Servidão e obra nova
6)Condomínio e obra nova
7)Município e outra entidade estatal

Art. 935 e parágrafo único


1)Embargo extrajudícial
2)Pluralidade de nunciados
3)Ratificação
4)Legitimação ativa pelo direito real ou a posse
5)Condomínio ou outro co-propriedade
6)Município ou outra entidade estatal

Art. 936 e parágrafo único e art937

1)Embargo da obra
2)Auto de embargo
3)Pedidos do nunciante
4)Apreensão e depósito de materiais e produtos retirados5)Embargo liminar, ou após justificação prévia, em ação
denunciação de obra nova

Art. 938

1)Notificações e intimações
2)Estado da obra embargada
3)Justiça ou injustiça da nunciação
4)Auto circunstanciado
5)Estado da obra
6)Rito processual da nunciação
7)Pretensão a afirmar o contrário
8)Pluralídades de legitimados passívos
9)Eficácia sentencial
10)Pluralidade subjetiva ativa

Art. 939

1)Se não foi contestado o pedido


2)Relevância da remissão

Ârt. 940 e §§ 1.0 e 2.0

1)Caução pelo nunciado


2)Objeto da caução
3)Prejuízo causado e caução
4)Continuação da obra e do processo
5)Regulamentos administrativos
CAPÍTULO VII
Da ação de usucapião de terras particulares

1)Usucapião
2)Ação de usucapião e ação Publiciana

Art. 941
1)Usucapião
2)Prazos da usucapião
3)Natureza da sentença
4)Correção acertada
5)Servidões, aquisição pela posse
6)Mandamentalidade e transcrição
•7)Efeito do mandamento

Art. 942 e §§ 1.0 e 2.~


1)Requisitos da usucapião (direito material)
2)Produção de provas da posse e procedimento edital
3)Ação declaratória
4)Legitimação passiva
5)Publicação
6)Prazos
7)Ineficácia e nulidade
8)Citação de confinantes
9)Citação de todos
10)Justificação da posse
11)Pluralidade de réus e citação
12)Publicação
13)Citação da pessoa em nome de quem está transcrito o imóvel
14)União e outras unidades intra-estatais

Art. 943 e parágrafo único

1)Prazo para contestar a ação


2)Falta de contestação pelo interessado ou pelos interessados
3)Rito processual ordinário
4)Observância do procedimento ordinário

.4rt. 944
1)Intervenção obrigatória
2)Todos os atos do processo

Art. ~
1)Julgamento da ação
2)Trânsito em julgado e transcrição

CAPÍTULO VIII

Da ação de divisão e da demarcação de terras particulares


1)Divisão de terras e ação de divisão
2)Demarcação e ação de demarcação
3)Divisão e partilha de coisas móveis
4)Defeitos e correções na técnica legislativa
5)Competência para a ação de divisão e a de demarcação

Seção 1

Das disposições gerais

Art. 946
1)Ação de demarcaçãO
2)Ação de divisão
3)Finalidade da ação de demarcação
4)Divisão e demarcação parciais e divisão e demarcação por acordo

Art.947

1)CumulaçãO objetiva
2)Citações
3)Confrontantes e processo demarcatório
4)Competência para as ações cumuladas

Art. 948 e art. 949 e parágrafo único


1)Fixação dos marcos
2)Restituição da área invadida
3)Confinantes terceiros e opoentes, na ação de divisão
4)Invasão de área dos confinantes
5)Foro
6)Partilha de bens recebidos hereditaríamente
7)Condenação alternativa
8)Confinante terceiro e ineficácia sentencial relativa
9)Legitimação passiva
10)Razão de só haver uma citação
11)Continuação da eficácia executiva da sentença
12)Eficácia relativa da sentença

Seção II
Da demarcação

Art. 950

1)Instrução da petição inicial


2)RequisitOs da petição inicial

Art. 951
1)Cumulação de pedidos
2)Interditos possessórios
3)Inteligência das regras jurídicas
4)Cumulação incidental, alegação e propositura de interditos possessórios
Art. 952
1)Condômino autor ou condóminos autores
2)Eficácia da sentença na demarcação

Art. 953
12 Residentes na mesma comarca e citações
2)Citação excepcional por edital
3)Condôminos e os confrontantes
4)Fora da comarca

Art. 954 e art. 955


1)Citação e contestação
2)Não-exercício da pretensão ao contraditório
3)Contestação de rito processual
4)Acordo das partes
5)Afirmações
6)Falta de contestação e acordo das partes

Art. 956, art. 957 e parágrafo único e art. 958

1)Nomeação de arbitradores e agrimensor


2)Duvidas suprevenientes
3)Conclusão dos estudos
4)Autenticação e anexações
5)Alegações das partes
6)Sentença que julga procedente a ação e determina o traçado da linha demarcanda
7)Eficácia sentencíal

Art. 959
1)Trânsito em julgado e demarcação
2)Negócio jurídico entre as partes

Art. 960
1)Defeito de técnica legislativa
2)Trabalhos de campo e exigências legais
3)Declinação magnética da agulha
4)Técnica
5)Fitas metálicas ou correntes
6)Estações e estacas
7)Visadas
~8)Aneróides

Ârt. 961 e parágrafo único


1)Planta
2)Medição de área
.3)Variação das escalas

Art. 962
1)Cadernetas de operações
2)Ponto de partida e outros dados
3)Composição geolôgica dos terrenos, qualidade e extensão dos campos, matas e capoeiras
4)Acidentes encontrados e outros dados
5)Novos marcos e as culturas existentes
6)Vias de comunicação
‘7)Estrada de ferro, porto de embarque e mercado mais próximo
.8)Levantamento da linha e identificação da linha já levantada

Ârt. 963
1)Marcos de colocação obrigatória
2)Exceções ao principio da exigência dos marcos

Art. 964
1)Linha percorrida pelos arbitradores
2)Terras já demarcadas

Art. 966
1)Prazos
~2) Manifestações das partes no prazo comum
.3)Correções e retificações

Art. 966
1)Auto da demarcação
2)Sentença

Seção III

Da divisão
Art. 967

1)Requisitos da petição inicial


2)Indicações quanto aos condôminos
3)Interessados com benfeitorias e culturas .
4) Benfeitorias comuns

Art. 968

1)Parte na ação
.2) Remissão e regras jurídicas anteriores

Art. 969
1)Compromisso pelos arbitradores e pelo agrimensor :
2) Medições anteriormente feitas e operações iniciadas ....

Art. 970 e art. 971 e parágrafo único


1)Intimação dos condôminos
:2) Dois prazos
3)Preclusividade do prazo
4)Razões de divergência entre os interessados
5)Recurso
‘6)Impugnação e não-impugnação

Art. 972 e art. 973 e parágrafo único


1)Medição
2)Benfeitorias feitas pelos confinantes
.3)Espécies de benfeitorias

Art. 974 e §§ 1.0 e 2.0


1)Usurpação de terrenos em caso de ação de divisão
2)Citações
.3)Ressarcimento aos atingidos pela sentença de restituição

Art. 975 e §1 1.0 e 2.~

1)Conclusão dos trabalhos de campo, planta do imóvel e memorial


.2)Divisão geométrica e divisão econômica ou estética ou com outra razão
.3)Decisão do juiz

Art. 976

Art. 977
1)Arbitradores e trabalhos de campo
2)Funções dos arbitradores e do agrimensor
.3)Divisão geométrica e divisão econômica

Art. 978 e §1 1.0, 2.0 e 30


1)Laudo
2)Recomendações aos arbitradores e agrimensor
3)Contiguidade e quinhões
4)Glebas separadas

5)Histórico das aquisições


6)Menções
7)Plano de divisão

Art. 979
1)Audiência das partes e prazo
2)Benfeitorias comuns
3)Servidões indispensáveis
4)Benfeitorias particulares
5)Pagamentos

Art. 980 e §§ 1.0 e 2.0


1)Quinhões desenhados na planta
2)Sentença homologatória da divisão
3)Natureza e eficácia da sentença
4)Situação e extensão do imóvel
5)Classificação das terras
6)Reduções e ressarcimentos
7)Folha de pagamento

Art. 981
1)Demarcação
2)Remissão às regras jurídicas sobre demarcação
LIVRO IV

DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS

TÍTULO 1

DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE


JURISDIÇÃO CONTENCIOSA 1)2>

1)ESPECIALIDADE E RITO PROCESSUAL. Procedimentos especiais são ditas as formas de procedimento


para a obtenção de tutela jurídica quando, por algum dado do direito material, ou do documento em que se funda
a demanda, ou da pessoa autora, ao legislador pareceu ser inadequada a forma ordinária ou algumas regras
jurídicas. Não há razão unitária, nem, sequer, elemento comum, para a especialidade. Resulta a escolha da
sugestão plural de muitas razões, histórica e logicamente diferentes, e nem sempre justificáveis perante a crítica
científica. Aliás, qualquer critério que se tivesse para classificar as formas de processos pecaria pela contingência
de não nos podermos desvencilhar de resíduos romanos, germânicos, ou canônicos, que ainda amontoam, no
processo, idades diferentes. No Brasil, principalmente, a inclusão de procedimentos de origem na chamada
“jurisdição voluntária” perturba a técnica classificatória e faz o Código de Processo Civil mestiçagem insólita de
nada menos de dois milênios de civilização européia. Por outro lado, a recente influência austríaca, alemã,
italiana e portuguesa de agora não conseguiu atenuar esse passado; e as duas últimas trouxeram colorido
estranho, às vezes impróprio, ao sentido da vida, O que logo espanta é que o Código haja dedicado o Livro IV
aos processos especiais e o Livro III aos processos cautelares, que

especiais também são. Melhor teria sido haverem-se separado os processos especiais de integração de negócios
jurídicos, documentais e cambiários, os monitórios e outros, os preparatórios e os incidentes, pondo-os, todavia,
no mesmo Livro. Outras sugestões teria a técnica legislativa.
A especialidade, no Código, nem sempre significa exclusão da ordinariedade; às vezes, essa ordinariedade
persiste e apenas se modifica algum momento inicial; ou apenas se alude a que se manteve a forma ordinária, a
despeito da especialidade da pretensão e da ação.

2)CUMULAÇÃO OBJETIVA: CONDICIONAL SUCEsSIvA, CONFICIONAL EVENTUAL E


CONCORRENTE. Enganar-se-ia quem quer que se abalançasse a explicar muitas ações, de que falaremos daqui
em diante, como se cada uma delas fosse uma só ação, como se à base delas estivesse uma só pretensão.
A cumulação objetiva (o autor propõe uma + x demandas, qualquer das quais poderia ser proposta de si só, com
a conseqúente relação jurídica processual separada) pode ocorrer:
a)dentro da mesma classe de ações (declarativa, constitutiva, condenatória, mandamental, executiva); o que é o
caso mais simples (e. g., pedido de declaração da existência da relação de dívida de cem mil cruzeiros e da não-
existência do recibo de pagamento); b) ou em duas ou mais classes de ações (declarativa + condenatória;
declarativa ± executiva; executiva ±condenatória). Os casos b) ou são simples, ou condicionados (alternados ou
sucessivos). A cumulação sucessiva é firme ou é eventual.
Nas ações executivas de títulos extrajudiciais, havia sucessividade, condicionalidade do processo da ação de
condenação e há, hoje, a cumulaçãO específica, o que permitiu que se fizesse o adiantamentO da execução, para
se porem na classe das ações de execuçãO; nas ações de rito ordinário em que se atende a regra jurídica, de
direito material, quanto à cominatoriedade, sucessividade e condicionalidade
do processo e da ação de condenação e, às vezes, da ação mesma, pois a causa petendi da ação de condenação,
em a.lguns casos, nasce depois da citação do réu.

A)A cumulação objetiva sucessiva é típica na ação de restituição da coisa alienada em relação à cumulação de
rescisão do contrato de alienação, na de petição de herança cumulada com a de anulação de testamento, na ação
do iudicium rescindens cumulada com a do rescíssorium, na de nulidade de testamento cumulada com a de
petição da herança da parte disponível, etc.

TABELA XLIII CUMULAÇÃO OBJETIVA SUCESSIVA


Ação “prima”
Ação de rescisão, resolução ou resilição OU revogação de contrato

Ação de petição de herança legitima


Ação de nulidade do testamento
Ação do iudicium. rescendens
Ação de anulação do laudo arbitral é condição necessária da ação “secunda”
Ação de restituição de coisa alienada

ação de inoficiosidade da verba testamentária

ação de petição de herança legitima quanto à metade disponível

ação do ludicium rescissorium

ação relativa ao mérito é condição suficiente da ação “secunda”

acão de inofielosidade da verb testamentâria

ação de petição de h e r a n c a legitima quanto à metade disponível

Observe-se que, não fosse o principio de economia do


processo, se teria de esperar que uma sentença, a da ação prima, transitasse em julgado, para depois se propor a
ação secunda. A cumulação, mediante adiantamento do exercício da tutela jurídica, provoca o fato,
surpreendente na aparência, de parecer não existir, no momento de se intentar a demanda, a ação secunda.
Alguns escritores falam de não existir o direito; outros, de não existir a pretensão. Uns e outros erram. O direito e
a ação podem já existir; o que não existe é a “ação” (no sentido processual), pela prejudicialidade fundamental da
outra. Nada, porém, de extraordinário
se passa, porque a pretensão à tutela jurídica já existe, já existem, talvez, a pretensão e a ação de direito
material; o que não existiria seria a “ação” (no sentido de direito processual), e o direito processual a criou, desde
logo. No plano do direito processual, a lei de processo pode colocar, como entenda, as pretensões e ações, desde
que não sacrifique, na sentença definitiva, a realização do direito objetivo. Quando GIU~EPPE CHIovENDA
(Principii, 1129) disse que, aí, “a ação não existe no momento da emenda”, baralhou a ação (no sentido em que
empregou o termo) e a ação processual. a) As ações para anulação do laudo arbitral e a ação para julgar o mérito,
no sentido do direito material, já existem, posto que essa, processualmente, dependa daquela. b) A ação de
declaração positiva cumulada com a ação própria da relação jurídica declarada somente se distingue dessa, em
que o elemento declarativo e o da ação própria são temporalmente incindíveis, ainda no plano processual: não se
dá sucessão; se bem que, no plano do direito material, não se deva pensar em duas espécies diferentes, a) e b). A
sucessão cronológica daquela é só processual; a dependência lógica é comum
àquela e a essa.

Em todos esses casos de cumulação sucessiva, sem ser a ação prima condição suficiente da segunda, há plus na
segunda, que permite acolher-se a primeira sem se acolher a segunda.

B)A cumulação objetiva eventual figura os casos de ação secunda, proposta para quando seja ineficaz ou
repelida a ação prima.
C)A cumulação objetiva alternativa, que pede o acolhimento de uma, entre duas ou mais ações.

TABELA XLV CUMULAÇÃO OBJETIVA ALTERNATIVA


Ação “prima”Acolhimento da ação‘‘prima~ ou Ação redibitóriaactio quanti minoris

D)A cumulação concorrente, em que o juiz acolhe todas ou algumas das ações cumuladas, a despeito de só uma
poder ter eficácia, ou qualquer delas ser suficiente em eficácia (exaustiva).

O processo documental cambiário tem a particularidade de fazer parcial a cognição, sem que a sentença deixe
incólumes as ações que acaso estejam na parte “cortada” da. cognição (e. g., as ações do negócio subjacente ao
negócio cambiário). Alguns juristas têm construído a ação executiva de títulos cambiários e cambiariformes,
como caso de condenação com reserva. Assim, GIUSEPPE CHIOVENDA (Principii,. 1181); porém, devemos
proceder à revisão desse ponto, que não mais atende ao estado atual da teoria dos títulos abstratos. O mandatum
de solvendo e a oposição ao mandado, no processus executivus, atendia às exigências da cognitio summaria, com
o exame das defesas quae incontinenti probari possunt e a “reserva” daquelas quae altiorem requirunt in-
daginem, defesas que outro juízo, o separatum judicium, examinaria (co gnitio plena, no processo ordinário).
Mas, hoje, com a sistemática dos títulos cambiários abstratos, o processo executivo dos títulos extrajudiciais é
exaustivo da cognição do negócio cambiário ou cambíaríforme. Se o negócio subjacente dispõe de outras ações,
nada tem isso com o processo executivo dos títulos extrajudiciais, nem faz a sentença, na ação, sentença com
reserva, ou de non plena ou summaria cognitio. O fracionamento, o corte nas defesas (exceções), opera-se no
plano do direito cambiário material, não do direito processual. Foi esse ponto que escapou a GIUSEPPE
CHIOVENDA (Principii, 1181 5.), que aliás tão bem viu que já hoje a cognição é ordinaria cognitio, sem
qualquer reminiscência da cognição (final) superficial, da qualis qualis demonstratio. A sua qualificação da
sentença no processo cambiário como sentença com reserva choca-se com essa explicação histórica e com a
teoria do título cambiário abstrato. A sentença, no processo executivo da cambial e do cheque, nada tem de
reservar, porque não se conheceu de qualquer outra matéria que da res in iudiczuin deducta, própria da ação
cambiária.

(De passagem observemos que a demora dos sistemas jurídicos francês e italiano, como necessariamente, dos
que imitaram aquele ou esse, ou a ambos, em receber a teoria dos títulos cambiários e cambiariformes como
constituídos por declarações unilaterais de vontade e abstratos, impediu que os seus juristas apanhassem a
realidade da vida, que as teorias contratualistas e concretistas recobriam de artifícios. Por outro lado, não
amadureceram para a teoria da posse.>

Dá-se concurso de normas quando se há de ver qual de duas ou mais é a norma a aplicar-se, sabido que uma
delas o tem de ser. Em verdade, não há concurso: só uma é aplicável, porque só uma incidiu. Se duas incidiram, é
ilusão ~ pensar-se na mesma pretensão: não há identidade de pretensão, ou de ação, quando as regras jurídicas
são duas. Se’ há duas causas de pedir e uma delas exclui a outra, é que existe terceira regra jurídica que assim o
determina. Entendeu GIUSEPPE CHIOVENDA (Istituzioni, 1, 335) que ainda não somos completamente livres
da reminiscência romana, e por isso ainda falamos de ações “diversas” (ação aquiliana, ação contratual de
ressarcimento dos danos). Em verdade, com essa argumentação procura-se fundamentar o princípio luranovit
curia, que não precisa dela. Não proveío de qualquer concepção de ser uma só a ação, e sim de haver a exposição
do fato, o pedido e, ainda errada a construção, conhecer o juiz a lei. Dizer-se que, no caso de desastres, a ação é a
mesma, quer se trate de responsabilidade aquiliana, quer de responsabilidade contratual, destoa de toda noção de
incidência e de aplicação da regra, de pretensão e de ação.

A ação é identificada pela pessoa, pela coisa e pela causa petendi, mas, aí, “ação” está no sentido de demanda, de
modo que, se o réu invoca a regra de direito A, em vez da regra de direito B, que o juiz aplicou, e a aplicação da
regra de direito A daria resultado diferente, não há coisa julgada material, porque houve, realmente, duas ações
(no sentido do direito material), correspondentes a duas pretensões diferentes. Dizer-se que a causa é o fato
jurídico e, se há duas regras jurídicas, o mesmo é o fato jurídico que elas produzirem, incidindo, só é proposição
verdadeira se as regras

jurídicas enunciam o mesmo, ou se a sentença já decidiu quanto ao fato que se tem como duplamente jurídico, de
modo tal que a segunda sentença entraria em contradição com a primeira, ou quanto à incidência de nova regra
jurídica, caso em que nada importa invocar-se outro fato para se considerar o fato jurídico. Todo fato jurídico é
fato e incidência de certa regra jurídica. Se há fato jurídico, e a regra jurídica, que incidiu, é outra que a invocada,
então o juiz aplica a que incidiu, ou se com isso satisfaz o pedido, ou se o repele (lura novit curia). Se não tivesse
havido lei que incidiu, o fato não seria “jurídico”. Não podemos pleitear de novo sobre o acidente de automóvel
se- perdemos a demanda, ainda que descubramos ter ocorrido de maneira diferente da que deduzíramos: então,
disséramos qual o fato e qual o fato jurídico em que ele importava, ao contacto com a lei; não mais podemos
“mudar” o fato; se invocarmos outra lei somente seremos atendidos se a nova lei faz ser fato jurídico dferente o
fato antes descrito. Duas ações somente são idênticas quando são ações fundadas no mesmo fato, porém não é
verdadeiro que o mesmo fato só dê causa a uma ação. O mesmo fato, sobre que incidem duas ou mais normas, ou
é o mesmo fato jurídico, ou não o é. Se o fato f sob a lei m não nos dá o mesmo fato jurídico fi, é que m é
diferente de 1. Não há fugir-se daí e devemos afastar a argumentação de GIUSEFPE CHIOVENDA (Principii,
288-290; Istituzioni, 1, 335 s.). O exemplo da actio legis Aquiliae e da ação contratual não serve: a ação, diz o
processualista italiano, é uma só. Nunca ofoi. Nem entre Romanos, nem depois. O que se dá é que, indenizados
os danos pela culpa leve in abstracto, falta o fato, a diminuição na esfera jurídica do lesado, para fundamento da
ação por culpa leve in concreto. Para se tirar a prova da proposição (há dua.s ações), basta ponderar-se que
repelir-se a ação do contrato nem sempre impede a propositura de ação fundada na culpa aquiliana (cp. J. H.
CORREIA TELES, Doutrina das Ações, 425, nota 2).
Otítulo executivo resulta da regra jurídica de tutela jurídica, que cria a pretensão à execução, e da estruturação
pré-processual, que dispensa a condenação prévia, ou que fixa os requisitos da ação de execução. A pretensão a
executar não corresponde a responsabilidade executiva, aquela a parte creditoris e essa a parte debitoris (assim,
ENIUco TuLLIo LIEBMANN, Le Opposizioni di merito, § 11); a pretensão a executar corresponde à obrigação
do Estado à tutela jurídica de execução; a responsabilidade executiva existe perante o Estado, a que passou o
monopólio de executar forçadamente.
A pretensão à tutela jurídica é pretensão contra o Estado.
O Estado prometeu a tutela, uma vez que proibiu, em princípio, a justiça de mão própria, a tutela privada. A
pretensão pre-processual é para que o Estado (= o juiz) declare, ou constitua, ou condene, ou mande, ou execute.
O devedor tem de não-negar a relação jurídica de dívida, tem de pagar; mas essas obrigações são de direito
material, e não de direito pré-processual. Concorre para algumas confusões e obscuridades dizer-se que o
devedor tem de executar o prometido e o Estado tem de executar se o devedor não executa. Se o devedor não
executa, o Estado, que prometeu a tutela jurídica, tem de executar o que prometeu (prestar a sentença, Entregar a
prestação jurisdicional): a sentença é que executa, for ç2damentc, o que o devedor não executou.
As tentativas de definir o título executivo como instituto de direito material (privado e público, ou somente
privado), anda as que artificialmente ou desesperadamente recorriam à teoria da prova, fracassaram de todo.
Reduzir-se o título de crédito a título executivo, esquecendo-se de que há ou pode haver títulos de crédito não
executivos, e reduzirem-se os títulos executivos a documentos é ignorar-se (ou não se querer ver) a natureza dos
títulos de crédito no direito material, de onde eles vêm, e ao mesmo tempo tentar-se a volta à prova legal,
borrando-se a diferença entre dois conceitos (o de título de crédito e o de título executivo) pela deformação de
ambos. Aliás, deformação das próprias leis positivas, como ocorreu a FRANCEscO C~xi~Lu~r¶rI (Lezioni, V,
226), sustenta-•dor máximo da última e mais infeliz tentativa (Titolo esecu tivo, Rivista, VIII, Parte 1, 313; como
ele, MAmo CASANOVA, Disciplina giuridica delie Obbligazioni di restituzione nel failimento, 168 e 207 s.).
FRANCESCO CARNELUTTI procedeu como quem pintasse parede de pedras para se não verem as pedras
naturais e só se verem as artificiais. TuLLIo LIEBMANN teve toda a razão em falar das suas “ficções e artifícios
inadmissíveis”.
O que dissemos sobre os títulos de créditos entenda-se também em relação aos títulos representativos. Há os
títulos que incorporam domínio e penhor, respectivamente (conhecimentos de depósito e warrants). A lei podia
não lhes dar a ação executiva de títulos extrajudiciais, mas deu-lhes a mesma ação, ai, real, que aos títulos de
crédito. Percebe-se a diferença entre a pretensão à tutela jurídica (à execução), a pretensão à restituição dos bens
depositados (pretensão de-direito material) e o remédio jurídico processual de execução de títulos extrajudiciais.

(a) Existe um princípio, que proveio do direito romano, segundo o qual só se executa forçadamente a pretensão,
depois de ter havido cognição completa e coisa julgada. É o princípio da executabilidade forçada dependente da
cognição completa. Funciona, no direito processual, como princípio-tese e pertence à mesma classe que o
princípio canônico Lite pendente nil est innovandum. Segundo aquele, “Ab executione non est inchoandum sed
primo debet de causa cognosci, et per definitivam sententiam terminari”. Tal a tese.

(b)A esse princípio opôs-se outro (antítese), que se acentuou, principalmente, após o século XIII, e foi o da.
execução dos negócios jurídicos, baseada em títulos instrumentais sem a força da sentença. Nos inícios, esse
princípio era comum entre os homens, pela não-interposição do Estado para conhecer das disputas (cognição); e
a manus iniectio judicial, isto é, verificada in iure perante o magistrado, foi forma posterior, já estabilizada, da
manus iniectio extra-judicial, cujo tipo intermediário está nas XII Tábuas (1,2):
imposição da mão, para levar o devedor ao tribunal. A auto prendação ainda se encontrava no direito português
dos forais.
(c) As diferentes soluções, que as leis processuais adotam para a execução que atenda ao princípio (b), são
tentativas de síntese, reguladoras da execução sem completa cognição, e assentam na definição ou na
enumeração dos casos de cognição incompleta suficiente.
A evolução das medidas cautelares, posto que, às vezes, toque a evolução dos processos executivos de títulos náo
-sentenciais, obedece a outras linhas. Enquanto o princípio (b) provoca as sínteses (c), sem que outra pretensão
surja, as medidas cautelares exigem pretensão à segurança que sirva quase sempre de alicerce à petição de
mandamento (ações cautelares mandamentaís).

A determinação de como se há de exercer a pretensão à tutela jurídica executiva pertence ao processo; mas a
permissão de se começar pela execução é pré-processual.

A diferença do direito anterior, o Código de 1973 retirou da enumeração dos procedimentos especiais as ações
executivas de títulos extrajudiciais (arts. 580-582, 583, 585 e 745). Uma vez que o legislador optou pela unidade
de procedimento entre execução de títulos judiciais e execução de títulos extra-judiciais, apagou a suficiência da
especialidade, e tratamento, hoje, consiste apenas na diferença entre executar sentença e pedir execução
antecipada à eficácia sentenciaL O assunto passou a pertencer a procedimento executivo, com pequenas
características.

DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO 1)2)3>

1)PRESTAÇÃO “IN OBLIGATIONE” E “IN SOLUTIONE”. Vista do lado do devedor, a execução é liberação.
Do lado do credor, entrega, pelo devedor, do objeto da sua pretensão. Se a prestação não é, ao mesmo tempo, in
obligatione e in solutione, o que o credor pode exigir não libera o devedor. Ao devedor, às vezes, é dado liberar-
se, sem que o credor pudesse exigir (e. g., faculdade alternativa a favor do devedor); às vezes, é terceiro, e não
devedor, quem entrega a prestação. Se a prestação exige o concurso do credor, tal como se o devedor tem de
vender imóvel ao credor, não pode ser dispensada essa co-participação. Casos há (como se a obrigação é de
“expedir”
mercadorias), em que a cooperação do credor não é de mister.
Se a execução depende de ato material, ou omissão a certo momento, nem sequer é necessário o animus solvendi.
Não assim, se consiste em negócio jurídico. Na hipótese de ser entregue coisa, que era devida, por outra causa,
ao credor, esse tem exceção para ficar com ela. O princípio é o de que a prestação se há de fazer nas mãos do
credor; mas há exceções (representante legal, assinatário, etc.). Se o credor está em mora e a prestação consiste
em entrega de coisa, pode o devedor consigná-la. A lei considera processo especial a consignação judicial, para
extinguir a obrigação, solvê-la. Essa judicialidade é um dos resíduos romanísticos do processo e do direito
material, que ainda não se desvencilhou dessa exigência formalistica. A própria oblação, antes da consignação,
tem de ser judicial (Código de Processo Civil, art. 893, verbis“vir ou mandar receber a quantia devida”).

No sistema do Código, a citação é para vir receber ou mandar receber, conservando o autor o seu direito de
revogar, por meio, portanto, de declaração de vontade, a consígnação feita, levantando o depósito, se o faz antes
da contestação. Isso é ponto essencial na construção do instituto (processual) da ação de consignação, no estado
atual do direito brasileiro. Depois da contestação, cessa essa liberdade, e a processualidade de qualquer emissão
de vontade ou de conhecimento exige o consentimento das outras partes (art. 267, VIII, e4.0).

Segundo ponto essencial é o de existir uma das duas espécies de pressupostos, os de mora (art. 896, 1) e os de
incognição (art. 898) do sujeito ativo da relação de direito material e passivo da futura relação jurídica
processual, podendo acontecer que confluam.

2)ANALISE DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. INa ação de consignação em pagamento, o


autor pretende, com a oblação real, liberar-se. A oblação real supõe efetiva (a) apresentação da coisa e (b)
depósito. Desde (b), cessam os interesses que o devedor acaso pudesse ter e a coisa fica a risco do credor. Sem
que os elementos, apresentação e depósito, se juntem, não se produz mora accipiendi, havendo, apenas, a
exceção aparente do pedido de consignação em pagamento instruído com ato de outro juízo, ou do mesmo,
transferindo o depósito. Aí, a apresentação do ato bastante ~é apresentação da coisa.
É possível que, antes da consignação, tenha havido oblação formal, suficiente (e, às vezes, por lei ou pela
convenção, necessária) e já se ache em mora o credor. Isso não torna inútil, menos ainda supérfluo, o processo de
consignação em pagamento. Mostra mesmo, mais ao vivo, a sua função própria, à parte daquela função
interpelativa, que se lhe atribui, e ele tem, quer histórica quer sistematicamente. A mora ereditoris, causada pela
oblação extrajudicial, de modo nenhum obsta a que se discuta o fato da oblação. Demais, normalmente, a ação de
consignação em pagamento supõe , às vezes, mora anterior.

Cumpre, porém, ter-se em vista, sempre que os efeitos da oblação extrajudicial, anterior à oblação real do
processo de consignação, hão de ser atendidos, inclusive para consequências processuais. As despesas e custas
da oblação e do depósito, quando procedente o pedido de consignação, correm por conta do que recusou a
oblação simples; portanto, do que incorreu em mora, antes do pedido de consignação. Se não houve mora
anterior a esse, por conta do que incorreu em mora devido à oblação real, perante o juízo.
O direito processual não rege a mora. A lei que regula a relação jurídica (res in iudicium deducta) é que dita as
normas sobre a oblação (formal, real; extrajudicial, judicial) e sobre a mora. Também esse ramo do direito é que
decide do lugar em que a coisa deve ser prestada. O art. 896, III, refere-se a esse foro, em regra especial, não ao
chamado “foro do contrato”. O Código não possui regra jurídica geral sobre esse foro. Regem os arts. 95, 107, 94
e outros. Naturalmente, se a oblação formal ou real tem de ser feita no lugar, que não coincide ser o do domicílio
do credor, nem o do domicílio do devedor, a situação é embaraçosa para o devedor. Mas isso resulta de fato seu
ter admitido diferença entre o lugar da oblação e o do foro do lugar do pagamento (provavelmente, domicílio do
credor) e não se podem mudar os princípios. A regra jurídica do art. 896, III, é a que se há de consultar, mesmo
porque a ação de consignação em pagamento tende, não a preparar a ação do credor contra o devedor, cujo foro
seria o do domicílio desse, mas a liberar o devedor.

(A) É competente para a ação de consignação em pagamento, proposta em via principal, o juiz do lugar em que
se tem de efetuar o pagamento.

(B) Se incidenter, o foro da ação que se propôs, ou se vai propor (o do réu, devedor; ou o do réu, credor; ou
outro, que seja derrogação às regras jurídicas de competência). Nada se pode opor a (B), pois o art. 108 é claro.
Quanto a (A), o Código possui o art. 896, III. O Reg. n. 737, art. 397, ~ 2.0, já dizia poderem os “embargos” do
credor consistir “em ter sido feito o depósito fora de tempo e lugar do pagamento”, citando o Código Comercial,
art. 431. No Código de 1939, havia o art. 316, III.
Essa questão da competência para a ação de consignação em pagamento proposta como ação autônoma foi
descurada e “perturbada” pelos velhos juristas portugueses, cujas convicções econômicas lhes toldaram o senso,
fossem praxistas ou fossem juristas teóricos. Poucas investigações tivemos tão infrutíferas como ao procurarmos
solução ao problema da competência, assim de lege ferenda como de lege lata, nos infólios da península.
AGOSTINHO BARBOSA, no voto 80, ns. 18, 21 e 25, dos Vota Decisiva Canonina, cogitou da nulidade do
depósito feito perante juiz incompetente, o que agravava, em vez de resolver a questão, e frisou a necessidade
(quanto àeficácia) da angularidade da relação jurídica processual (citação do réu). Quando, porém, se descia ao
terreno da vida real, os doutores logo se dividiam, querendo uns que, sendo réu, como é, o credor, o depósito
fosse feito no domicílio dele, e não no domicilio do devedor, autor da ação. Outros, que se fizesse no domicílio
do devedor, embora autor. O espécime que mais impressionava àqueles era a ação de resgate do foro, que eles
submetiam ao foro do senhorio ou do censualista (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Tratado prático
comq~endiário dos Censos, 120 s.). No entanto, a doutrina não deveria preocupar-se com isso, sendo a ação de
resgate (hoje, Código Civil de 1916, art. 693) ação dupla ou duas ações cumuladas simultâneas, a de resgate, que
é principal (constitutiva negativa), e a de depósito em consignação, que é acessória. O foro tinha de ser o do
senhorio ou do censualista, sem se precisar ferir toda a doutrina das ações de consignação em pagamento,
propostas principaliter.

Se o devedor propõe a ação de depósito em pagamento como incidente (prévio ou não) de ação dele, claro que o
foro tem de ser o do réu, credor. Se o credor propôs ação, ou o devedor sabe que vai propó-la, o depósito
incidente, por esse, tem de ligar-se ao foro da ação do credor, devendo ser feita ao juízo essa comunicação de
conhecimento, determinadora da aplicação do art. 108.
O problema fica restrito à ação principal de consignação em pagamento, que, por definição, não depende de
outra, e é possível que outras venham a depender dela. Tal ação, a priori, é contra o credor, cuja mora accipiendi
se vai produzir, ou já se produziu. Na falta de regra jurídica como a do art. 896, III, o foro competente seria o do
domicílio do credor, que é o réu (art. 94). Mas há a regra jurídica, do art. 896, III, de modo que a principalidade
da ação de consignação em pagamento estabelece o foro competente, que é o do “lugar do pagamento”.
“Lugar do pagamento” e “lugar de oblação” de ordinário coincidem; se não há lugar convencionado para o
pagamento, a lei de direito material provê (Código Civil de 1916, arts. 950 e 951, aquele regra jurídica
dispositiva, e esse, cogente).
Tratando-se de liberação de obrigações de consignar bem imóvel, basta que o devedor consigne a chave, se assim
decide o direito material; porque é a esse, e não ao direito processual, que cabe regular a mora accipiendi e os
seus pressupostos necessários e suficientes.

3) LEGITIMAÇÃO ATIVA. Legitimado à ação de consignação em pagamento é o devedor (ou seu


representante, é claro), ou quem possa pagar por outrem (Código Civil, art. 930 e parágrafo único; cf. art. 932).
Os arts. 7.0~13 do Código de Processo Civil incidem (e. g., o síndico da falência pode pedir o depósito em
consignação, cf. 6~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 28 de junho de 1946, R. F., 108,
311).

Art. 890. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer 1), com efeito de pagamento, a
consignação 2) da quantia ou da coisa devida.
Art. 891. Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento 3), cessando para o devedor, tanto que se efetue
o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada improcedente 5)•
Parágrafo único. Quando a coisa devida for corpo que deve ser entregue no lugar em que está, poderá o
devedor requerer a consignação do foro em que ela se encontra4).

1)AçÃo DE DEPÓsITO EM CONSIGNAÇAO OU DE CONSIGNAçÃo EM PAGAMENTO. Lê-se no art. 890


que a ação compete nos casos previstos em lei; porque o Código Civil mesmo (art. 973) limita o uso da
consignação como meio liberatório e assim também já procedia o Código Comercial, art. 437 (c{.d:go de
Processo Civil de 1973, art. 672, § § 1.~ e 2.0). O
depósito para evitar a falência não é consignação em pagamento, conforme a jurisprudência assente.

A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 23 de novembro de 1948 (R. F., 125, 477), admitiu o depósito em
consignação para pagamento de notas promissórias, que não
tenham vencimento determinado (= o portador podia inserir a indicação da data do vencimento), mas, in casu, se
sabia quem era o portador. Ora, a citação é ao interessado, ou aos interessados; tratando-se de título endossável,
como é a nota promissória, teria de ser conforme o art. 895, ou por edital.
A mesma 2.R Turma, a 8 de maio de 1951 (R. F., 138, 135), repeliu que se empregasse a ação de consignação em
pagamento para se haver recibo provisório, até que o poder público decidisse se a empresa de serviços ao público
pode, ou não, cobrar determinada quantia por prestação de serviço. Sem razão. Uma das causas para se depositar
em consignação é haver litígio sobre o objeto do pagamento (Código Civil, art. 973, V). Se a empresa não queria
dar recibo com ressalva de decisão posterior, judicial ou da administração, o caminho que tinha o interessado era
o da ação de consignação em pagamento.
Na ação de consignação em pagamento, não se pode discutir o que seria objeto de ação constitutiva negativa,
exceto inexistência ou nulidade do negócio jurídico. Por isso mesmo, seria impertinente invocar-se o art. 1.092,
parágrafo único, do Código Civil, que regula a resolução por inadimplemento (7.a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal, 28 de setembro e 26 de outubro de 1948, R. F., 126, 473, e 124, 143), ou legalidade
ou inconstitucionalidade de imposto ou taxa (7.a Câmara Cível, 2 de abril de 1950, D. da J. de 17 de março de
1952, cf. 4•~ Câmara Cível, 4 de abril de 1950. 1?. F., 145, 240).
Se o citado alega que recusou a prestação por não ser aquela a que tinha direito, não se pode dizer que tal
discussão
não cabe no processo da ação de consignação em pagamento.
Daí ser vago e poder ser errado, in casu, dizer-se que a ação de consignação em pagamento não comporta
discussão sobre “a origem e qualidade da dívida” (1.R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, 3 de agosto de 1948, R. F., 124, 525), “dúvidas e controvérsias surgidas entre as partes” (2.a Câmara Cível
do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 11 de setembro de 1950, 150, 317), ou “divergências entre as partes”
(Tribunal de Justiça de São Paulo, 6 de março de 1951, R. dos T., 192, 697; 6.R Câmara Civil, 15 de agosto de
1952, 204, 280; aliter, Tribunal Regional do Trabalho da 1.a Região, 27 de junho de 1951, D. da J. de 12 de
outubro).
Se o negócio jurídico prevê alguma prestação para denúncia do contrato e o credor se recusa a recebê-la, pode ser
feito o depósito em consignação (2.a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, 30 de abril de 1952, R. dos T.,
203, 439, que aliás confundiu denúncia mediante pagamento de certa prestação e resolução, o que dependeria de
ação própria).
As alegações de anulabilidade não podem ser insertas na contestação, e. g., a anulabilidade por dolo, erro,
violência ou simulação (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 24 de junho de 1949, R. F., 128, 457).

2)TEMPO PARA O PEDIDO DE CONSIGNAÇAO EM PAGAMENTO.

~,Quando deve e até quando pode ser pedida a consignação em pagamento? No caso de mora creditoris, sempre;
se o devedor mesmo já incidiu em mora solvendi, não, salvo se o credor reincide. O principio é o de que o
devedor não pode ser mantido, malgrado seu, na relação jurídica de obrigação. O credor em mora não viola
obrigação, como violaria o devedor; portanto, não sofre a obrigação de perdas c danos, como ocorre com o
devedor. A oblação do devedor é o convite ao credor para que receba a prestação. Quase sempre é real; nas
dividas projectícias (~ de ir levar), é essencial a realidade da oblação. Nas dívidas receptícias (= de vir receber),
basta a oblação verbal. Também pode ser verbal se o credor impugna a existência ou a validade do contrato, ou a
prestação quanto à qualidade ou à quantidade. As leis estabelecem mora ipso jure, e o legislador do Código Civil
de 1916 incluiu no texto o art. 955 (Dies interpellat pro homine). Não se tomem as proposições de alguns
acórdãos, e. g., 1.R Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 13 de fevereiro de 1941, R. F., 87,
174, como princípios gerais.
A consignação em pagamento contém sempre a oblação real, seguida do depósito. Há, portanto, menos casos de
consignação do que de pagamento.

3)LUGAR DA PROPOSITURA DA AçãO DE coNsIGNAçAo EM PAGAMENTO. A lei foi explícita em


dizer que a ação de consignação em pagamento se propõe no lugar do pagamento. Havemos de entender que a
regra jurídica do art. 891 incide, mesmo se a competência para a propositura de ação do credor contra o devedor
seria de outro juízo. Todavia, no art. 891, parágrafo único, alude-se a exceção fictícia à obrigatoriedade do juízo
do lugar do pagamento.
Uma das conseqúências da consignação em pagamento é a de, no momento do depósito, não mais correrem juros
contra o devedor, nem responder ele pelos riscos.

4)COISA DEVIDA cujo LUGAR DA ENTREGA FOI PREVISTO. No art. 891, parágrafo único, diz-se que,
“quando a coisa devida for corpo que deva ser entregue no lugar em que está”, pode o devedor requerer que a
consignação seja no foro em que ela se encontra. Ora, “corpo” que “deva ser entregue no lugar em que está” é
coisa, objeto de prestação, com local de pagamento. A exceção é fictícia. Se não está no lugar que não é aquele
em que devia ser entregue, permitir-se ao devedor pedir no foro em que ela apenas agora se encontra seria
contradição: dar-se-ia ao devedor a facilidade de entregar em lugar que não é aquele em que “deve ser entregue”.
O credor pode argúir que as despesas para a entrega no lugar em que devia ser entregue correram por conta do
credor e cabe ao devedor pagá-las.

O art. 891, parágrafo único, pode ser mal interpretado como se nele estivesse dito que o devedor pode pedir a
consignação em pagamento no lugar em que agora está, mesmo se esse não é o lugar em que devia ser entregue.
Houve apenas imperfeição da redação, com a referencia a “lugar em que ela se encontra”. Houve dever e
obrigação de entrega em lugar designado, e esse é o lugar em que tem de ser feita a consignação em pagamento.
Seria absurdo que, tendo-se dito que a coisa teria de ser entregue no lugar c, pudesse o devedor pedir a
consignação em pagamento no lugar d ou e, para onde ele, mesmo de boa-fé, a transportou, ou que, quando se
assumiu o dever de entregá-la no lugar c, já estava a coisa no lugar a ou b. O credor evidentemente não quis a
entrega em d ou e, ou em a ou b, porque a cláusula foi expressiva: no lugar c. O art. 100, IV, d), não pode ser
desatendido.
5) JuRos E RISCOS. Se o devedor consignou em pagamento no lugar em que devia fazê-lo, pelos juros e riscos,
anteriores à data da consignação, foi e é responsável o devedor. Se consignou em pagamento, no lugar devido e
não houve improcedência do pedido, sem ter havido obrigação de juros e de riscos, tudo corre, desde a data da
consignação, por conta do credor. É possível que a dívida tenha juros anteriores à entrega da prestação, mas aí a
quantia se insere na dívida.
Ao terminarmos o comentário do art. 891 temos de frisar que este texto não estava no Código de 1939: o art. 891
e seu parágrafo único foram inovações, de modo que os havemos de interpretar como relativos à revelação no
sistema jurídico.

Art. 892. Tratando-se de prestações’ periódicas 1), uma vez consignada a primeira, pode o devedor continuar a
consignar, no mesmo processo2) e sem mais formalidades, as que
se forem vencendo, desde que os depósitos sejam efetuados até cinco (5) dias, contados da data do vencimento
3)~

1) PRINCIPIO DE ECONOMIA. Por economia processual, se a solução da dívida tem de ser em prestações
periódicas, ou se o contrato exige que as prestações sejam ao fim de prazos convencionados, depositam-se em
continuação, evitando-se a pluralidade de processos. Tal a jurisprudência assente. O Código de 1973, no art. 892,
atendeu a isso.
As prestações reiteradas são prestações de uma vez, mas regularmente (periódicas) ou irregularmente repetidas
(circunstanciais). A dívida de conservação pode ser com obrigações de exame e atividade cada mês, ou quando
seja preciso, informado o devedor.
Prestações parciais são partes de prestação, que, feitas, apenas diminuem o que é devido. Não há reiteração,
porque não há pluralidade; há unidade, que se parte. A prestação parcial é prestação fracionária do devido. As
prestações parciais, que na espécie se admitam, são prestações que objetivamente dividem a prestação que se
deve, mas sem que ocorra a liberação do devedor. A unidade jurídica permanece. O devedor pode fazer
prestações parciais se o negócio jurídico lho permitiu, se, pela natureza da prestação, não pode ser feita de um
jato (sem se tratar de prestação continua), ou se o crédito só foi reconhecido, judicialmente, em parte, ou em
parte foi reconhecido pelo devedor, e nada obsta a que se preste a parte reconhecida. Se o credor aceita parte do
pagamento, o crédito subsiste pelo resto, com as garantias. que tinha.
Nas obrigações a prestações sucessivas, não tem o credor, salvo disposição em contrário, de fazer os pedidos ou
de reclamar, em certo prazo, os adimplementos parciais (fornecimentos sucessivos, inclusive periódicos). Se
houve pacto de dever de pedir, ou de ir buscar, ou de cooperar no ato de adimplemento, podem dar-se a mora
accipiendi e a mora debendi. Circunstâncias especiais não podem estabelecer qualquer desses deveres, mas a
manifestação de vontade pode ser tácita.
Se a prestação é divisível, tem o devedor de prestá-la como um todo e de uma vez, ou, se consta de cláusula
negocial, em parcelas, a datas marcadas, ou periodicamente. É a essas que se refere o art. 892.

2)PRESTAÇÕES PERIÓDICAS NO MESMO PROCESSO. O art. 892 veio permitir que se consignem as
prestações periódicas no mesmo processo em que se fez a primeira prestação, mas até cinco dias contados da data
do vencimento. Se ainda não se fez, passados os cinco dias, é noutro processo que se há de fazer a prestação.
Se as prestações periódicas tinham de ser no foro do domicílio do autor ou no foro do domicílio do réu, o art. 892
permite que o foro em que se consignou a primeira prestação periódica se faça competente para a consignação
das outras prestações no mesmo processo. O que pode ocorrer é que alguma cláusula negociável tenha afastado a
invocação do art. 892, que se há de entender como criativa de jus dispositivum, e não de ius cogens.

3)FALHA DE PRESTAÇAO EM TEMPO. Se alguma prestação periódica teve de ser feita noutro processo,
porque o devedor não respeitara o prazo do art. 892, nada obsta a que, respeitado o prazo, outra ou outras
prestações posteriores se consignem no novo processo; não, no primeiro.

Art. 893. Na petição inicial o autor requererá a citação do réu para em lugar, dia e hora determinados, vir ou
mandar receber’) a quantia ou a coisa devida, sob pena de ser feito o respectivo depósito 2)•
1) CITAÇÃO DO CREDOR. A citação do credor, que o art. 893 exige, não decorre de princípio a priori, a que
o legislador tivesse de obedecer, ou conviesse obedecer. É regra de lege lata, positiva. A lei fez da consignação
relação jurídica de depósito entre o devedor e o Estado, ou o estabelecimento incumbido de receber os depósitos
em pagamento, a favor e por conta do credor. É preciso que seja da prestação devida no momento da
consignação. O art. 892 contém regra jurídica especial de prazo, com eficácia apenas de direito processual civil.

MANUEL DE ALMEIDA E SousA tinha bem vivo na mente que a relação jurídica processual se constitui, ainda
que somente entre autor e Estado. Exatamente a respeito dos depósitos judiciais falou como se fora processualista
do século XX, discutidor e fixador das diferenças entre existência, validade e eficácia. Em Tratado prático
compendiário dos Censos (121), foi claro: “o depósito para ser eficaz e ter força de solução deve ser feito com
citação da parte interessada”. Se não foi citado o interessado, a relação jurídica processual existe, e pode ser que
seja válida; no entanto, não tem, quanto a esse, eficácia. Isso permite que o interessado, não citado> entre,
espontaneamente, na relação jurídica processual, que existe.

Pergunta-se:diz a lei que, na petição inicial o autor referiu-se à citação do réu para, em lugar, dia e hora
determinados, vir ou mandar receber a quantia ou a coisa devida, sob pena de ser feito o respectivo depósito,
~,isto afasta que possa o devedor requerer o depósito prévio, alegando estado de necessidade (e. g., não poder
estar no lugar, no dia e hora determinados, por ter de achar-se ausente ou estar internado em hospital)? Ou o
devedor outorga poderes a alguém que o represente, ou requer o depósito alegando o que se passa, dizendo o
juiz, na ocasião do deferimento, a razão por que se deposita e que o credor pode levantar a quantia depositada.
Não se pode exigir que, em vez do mais se faça o menos. O devedor já tem o quanto necessário ou a coisa devi-
da e apenas não pode aguardar que, citado o credor, venha receber e só após depositar, uma vez que não pode
estar presente. Se o credor comparece para receber ou alguém por ele vem, encontra em juízo o documento
concernente ao depósito prévio, ou, se não comparece, ou não se representa para receber, o depósito torna-se
definitivo, com todos os efeitos peculiares.

2)CONTRAPRESTAÇÂO E DEPÓSITO COM CLÁUSULA. Se ocorre que o devedor tem direito a


contraprestação, nada obsta a que se faça o depósito com a cláusula de só ser levantado se o credor a satisfizer.

Art. 894. Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao credor 1), será este citado para
exercer o direito dentro de cinco (5) dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que
o devedor o faça, devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se fará a entrega,
sob pena de depósito 2)

1)ESCOLHA QUE CABE AO CREDOR. A escolha que cabe ao credor abrange mais do que a divida
alternativa, ou com a facultas alternativa. Nem se deve pensar em coisa indeterminável. Não existe obrigação
cujo objeto seja coisa indeterminável. Sempre que a escolha toque ao credor, ao devedor assiste a faculdade de se
liberar com a citação do credor, para que exerça o seu direito de escolher; e. g., se a determinação da prestação é
genérica, ou genérica mista (certa quantidade de coisas determinadas individualmente).
A solução da questão de se saber se, no caso de não ter havido a citação edital, nem a de algum. interessado,
pode esse inserir-se na relação jurídica processual, foi iniciada antes. A relação jurídica processual existe; apenas
não tem eficácia quanto aos que não foram citados. Esses não-citados, provando a sua legitimação, ingressam na
relação jurídica processual, angulando-a. Se essa legitimação está envolvida na dúvida (art. 895), então ao
interessado cabe tomar a atitude que melhor atenda aos seus interesses (oposição principal, arts. 56-61;
litisconsórcio, arts. 46-49; intervenção do art. 54, etc.). Não há solução a priori. Se pede para entrar na relação e
na disputa e não lho permitem, a sua atividade não pode prejudicá-lo, nem favorecê-lo. A sentença na ação de
consignação em pagamento somente produz coisa julgada
material entre os citados, ainda que por edital. Os citados, desde a citação, ainda que não tenham comparecido,
estão na relação jurídica processual.

O credor citado, que tem direito à escolha, pode outorgar poderes a alguém, que possa escolher, ou escolher e
receber. A pessoa que comparece dizendo-se que obteve a outorga para representar, não é terceiro. Se o credor
alienou o seu direito à escolha, como se vendeu ou doou a coisa indeterminada, ou mesmo se só transferiu o
direito à escolha, tal pessoa tem de ser tratada como o seria o credor, mesmo se o negócio jurídico entre eles mais
se há de interpretar como de representante do que como adquirente. Se tal pessoa comparece para escolher, ou
para escolher e receber, e há dúvida sobre quem há de escolher ou de receber o pagamento, tem o autor de
requerer o depósito e a citação dos que o disputam para provarem o seu direito (cf. art. 895). Pode acontecer que
o próprio autor se inclua no número deles (e. g., a outorga fora revogada).

2)LUGAR DO DEPÓSITO E LUGAR DA EXECUÇÃO . Dissemos que o lugar da execução (“pagamento”) e o


do depósito podem não coincidir, a despeito do art. 976 do Código Civil. O devedor incorre em mora se não
executa a obrigação no lugar próprio. O credor fica em mora se recusa a prestação que se lhe oferece no lugar
estipulado para o pagamento. Nos casos de prestação a ser remetida a risco do credor, dependente de
contraprestação, o lugar do pagamento é o lugar da expedição; se, porém, é a risco do devedor, é o lugar para o
qual se há de expedir. O devedor não poderia depositar no lugar da expedição, porque tem de expedir; nem no do
pagamento, pela mesma razão. Outro caso, que preocupa a ciência, é o da vencia a distância (expedição para
lugar que não é o da execução), Versendungsschuid) . A regra é reputar-se, na dúvida, “lugar do pagamento” o
“lugar da expedição”; portanto, correndo ao credor (ou terceiro) o dever de ir buscar o objeto no “lugar do
destino”. Expedida a coisa, seria supérfluo ordenar ao transportador que depositasse.
Nas compras-e-vendas ou nas trocas, em que há dois contratos de entrega a distância, tudo se resolve como
acima foi dito.

Art. 895. Se ocorrer dúvida 1) sobre quem deva legitimamente 2) receber o pagamento, o autor requererá o
depósito e a citação3) dos que o disputam para provarem o seu direito.

1)DISPUTA DA PRESTAÇÃO E DUVIDA QUANTO A QUEM SE HÁ DE FAZER. ~Quando é que a


prestação é “disputada” por mais de um pretendente? Havemos de entender quando haja duas ou mais de duas
pessoas que se digam com pretensão à prestação, o que supõe, não simples dúvida, ou suspeita, mas situação
caracterizada de disputa; e. g., lide, prova de discussão sobre a legitimação de direito material extrajudicial. O
devedor tem de examinar, com cuidado, o caso concreto,
para evitar que se lhe exijam perdas e danos pela suposição temerária de haver disputa, ou de não a haver.
Pode ocorrer que o devedor não saiba quem é o credor, tal como se passa a respeito de títulos ao portador. Se o
nome do credor não consta do negócio jurídico, o que pode acontecer mesmo em contrato (e. g., A e B
contrataram e no contrato há a cláusula de prestação direta a x), há ignorância pelo devedor de quem há de
receber. Se há disputa, há dúvida e disputa, posto que possa haver convicção do devedor e apenas luta entre os
que se dizem credores, talvez mesmo lide. A dúvida é atitude do devedor. Ele é quem há de duvidar. Se paga a E,
em vez de a A, que estão a disputar, assume a responsabilidade se o seu erro é revelado na sentença que se
proferiu a favor de A. Se não há disputa, só existe dúvida do devedor.

2)IGNORNCIA E DUVIDA SOBRE QUEM SEJA O CREDOR OU SOBRE QUAIS SEJAM OS CREDORES.
O Código de 1973, arts. 895 e 898, somente emprega a expressão “dúvida”. Dubius, no latim, é referente a duo, a
dois, à vacilação entre a e b, tal como no grego, no gótico, no antigo e no novo alto alemão; dubito, dubitare, é
ter em si vacilação entre a e b. Abstratizou -se o dois: ou a ou b. Diferente é o ignorar, ignorare, que
édesconhecer; portanto, nada se saber, para que se possa pensar em a ou em b, o que vem de in e nosco. Para se
evitar interpretação nociva (= ignorante; pense-se em gnarus), temos de distinguir a ignorância e a dúvida, de
modo que possamos dar à dúvida dos arts. 895 e 898 o significado abrangente (ou ignorância ou dúvida).
Posto que, no art. 895, só se fale de “ocorrer dúvida”, no final refere-se a “citação dos que disputam”. O Código
de 1939, art. 315, parágrafo único, dizia: “Quando mais de um pretendente disputar o pagamento, a citação far-
se-á pessoalmente, ou por edital, a critério do autor”. Preliminarmente, observemos que não há mais a espécie de
citação a critério do autor. Tem ele de obedecer ao que se estatui nos arts. 231-233. A disputa pode ocorrer antes
de ser feita a petição, caso em que o devedor, que fica em dívida sobre o credor, tem de obedecer ao art. 895, que
lhe permite, por essa circunstância, o depósito anterior às citações. Se os que se dizem com direito ao
recebimento são dois, ou mais, e disso o devedor somente soube após o despacho da petição inicial, tem esse de
requerer a citação das outras pessoas e o depósito, para que só se levante quando for provado perante o juízo o
direito de uma ou de algumas pessoas. Pode bem ser que a que fora citada seja a única legitimada ao
recebimento, que aí é levantamento do depósito; ou que ela não tenha direito. Tem de haver contestações, com os
requisitos do artigo 896, mas após a afirmação da legitimidade. Uma vez que dois ou mais disputam, o autor da
ação de consignação em pagamento livre está da relação jurídica processual, pois, no próprio plano do direito
material, a sua obrigação se extinguiu com a sentença declarativa negativa (não mais disse). No art. 898 diz-se
que continua o processo só entre os credores, com o procedimento ordinário. Cada um dos que se dizem credor
tem de proceder como autor e como réu. As alegações e as provas foram apresentadas. Têm de oferecer, no prazo
de quinze dias, a contestação, a exceção e a reconvenção (art. 297). Tal prazo é comum (art. 298). Sob o art. 898
iremos aos necessários pormenores.

Art. 896. A contestação 6) será oferecida no prazo de dez (10) dias, contados da data designada para o
recebimento 1), podendo o réu alegar 7) que:
1 não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida2);
li foi justa a recusa 3);
III o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento4);
IV o depósito não é integral5).

1)RECEBIMENTO DO DEPÓSITO. O recebimento a que se refere o art. 893, para verbis “vir ou mandar
receber”, há de ser pela pessoa legitimada a isso.

2) RECUSA E MORA. Não se trata da recusa ou mora no caso do art. 890, e sim da recusa de que resultou ter o
devedor deixado de se liberar. Essa recusa ou mora é pressuposto essencial para a consignação em pagamento
dos artigos 890-899.

3) RECUSA JUSTA. “Justa recusa” (Código Civil de


1916, art. 973, 1) é, não só a que se refere à solução da dívida, mas também a que nega a causa da obrigação,
podendo o contestante arguir o que entender, como se estivesse a contestar ação de outra natureza.
Uma das causas principais de recusa é aquela em que o pretenso credor nega que o seja. Pode ser que ele diga a)
quem o é (B citado, na ação de consignação de pagamento, argúi que o crédito foi juridicamente transferido e,
pois, outro é o credor que teria de ser citado), ou b) que apenas não o é, nem nunca o foi. Na espécie a), pode o
citado ter pedido que se citasse o adquirente, ou não o ter pedido: ali, o juiz manda que se cite o adquirente,
ouvido ou não o autor da ação. Na espécie b), acontece que o devedor não tinha dívida, embora pudesse ter
errado, e não se há de invocar o art. 898, porque tal regra jurídica somente concerne a consignação fundada ~‘em
dúvida sobre quem deva legitimamente receber”. Veja-se bem a diferença entre a dúvida que era do devedor (art.
898) e a negação da legitimação passiva. A conversão em depósito de bens de ausentes só ocorre se a dúvida era
do devedor.
4)DESPESAS QUANTO AO TEMPO, LUGAR E IMPORTE DO DEPóSITO. As defesas do art. 893, III e IV,
concernem ao pedido de depósito, e não à execução. O lugar da execução coincide, de regra, com o do depósito
(Código Civil, art. 976); pode não coincidir. Quanto ao tempo, somente há de ser intempestivo o depósito se a
obrigação já não pode ser solvida com a coisa depositada.
Na ação de consignação em pagamento, o devedor ou quer solver a dívida vencida, ou quer considerar vencida a
dívida, o que só tem de ser entendido se não há tempo, ou se não há termos de vencimento.
Se vencida foi a dívida, ou se vencidas foram as dividas, o devedor que pede a comparência do credor para
receber, vinculou-se ao pagamento na data e confessou, implicitamente, que já tinha de ser adimpilda a
prestação, ou já tinham de ser adimplidas as prestações.
Se o devedor pede o depósito em consignação, ou a fixação da data da comparência do credor, para que receba, e
quem não comparece é o devedor, demandante na ação de consignação em pagamento, não só ele se interpelou, e
tal auto-interpelação é de conseqüências jurídicas, como também revelou o mau propósito com que pediu a
consignação em pagamento.
Se, por exemplo, o devedor não compareceu para a entrega, ou se ninguém, em nome dele, compareceu, e o
credor comparecente sofreu danos com isso (E, credor, veio de avião de Belém ou de Porto Alegre para receber a
quantia ou a coisa, e A, devedor, não está no lugar, dia e hora constantes da citação), há a ação de indenização
proponível pelo credor.

5)SUFICIÊNCIA ~ SATISFATIvA DO DEPOSITO. O depósito, que se pediu fosse feito, pode não ser
integral; e o depósito, em solução, há de satisfazer as exigências de bastar. Negócio a favor de terceiro, para que
esse receba o depósito, a consignação faz nascer ao credor o direito à prestação, desde que sabe do depósito, ou
à realização da condição, ou desde ter sido atingido o termo. A suficiência da solução é dependente
da natureza e espécie da obrigação do depositante. Em princípio, há de ser tal o depósito que o credor possa
reclamar do consignatário exatamente o que o devedor lhe devia no momento da consignação. (a) Se se deve
coisa individualmente determinada, é essa coisa que se tem de depositar. (b) Se a dívida é de gênero (e. g., de
alguma quantia de dinheiro), o depósito pode ser irregular. (c) No caso de direito a contra-prestação ou a
reembolso de despesas, pode, no contrato com o consignatário, fazer-se dependente da execução da contra-
prestação em mãos do próprio consignatário o direito do credor à coisa consignada (e. g., as despesas do próprio
depósito, se é o caso, o que se tem, de regra, como tacitamente querido).
(d)Os riscos e perigos são a cargo do credor, desde a consignação, mas a propriedade só se transfere quando o
consignatário entrega o depósito. (e) Em princípio, o credor pode exigir que a prestação devida seja feita em sua
totalidade, ainda quando, pela natureza da prestação, esse tolere fracionamento. Se o devedor deposita parte e o
credor recusa o depósito, não se dá mora do credor, e o devedor fica em mora pelo todo, inclusive quanto à parte
depositada. (f) Em todo caso, se são oblatos dois objetos, por serem dois os contratos, ou separadas as duas
obrigações, o depósito de um não é prestação parcial, mas total. (g) Se há diversas prestações emanadas de um
mesmo contrato com termos diferentes (prestações sucessivas, alugueres, etc.), cada um corresponde a um
crédito, a despeito da unicidade do contrato. Aí, se há diversas prestações contemporâneas, o depositante deve
declarar a qual dos créditos se tem de imputar. (h) O devedor tem direito a fazer depósito parcial: se o contrato
lho permite; se, conforme a sua natureza, a prestação não pode ser satisfeita de uma só vez; se, contestada apenas
parte do crédito, o credor não pode recusar a parte reconhecida, de modo que, condenado o devedor a solver a
obrigação quanto ao restante, não fica em mora quanto àquela parte; se a lei expressamente obriga a receber
pagamentos parciais, o que se dá em certos contratos comerciais; no caso de execução forçada; se o credor só
reclamou parte da prestação, porque então o devedor fica com a faculdade de depositar essa parte ou o todo. (i)
Quando o credor aceita o depósito parcial, o crédito subsiste para o resto.

6) CONTE5TaçÃO O PELO REU. Em vez de opor “embargos”, o réu, na ação de consignação em pagamento,
“contesta”. A diferença, em relação ao direito brasileiro anterior a 1939, alterou a estrutura processual. Do
depósito resultam duas posições contrárias, a do devedor, que espera seja tido por eficaz o depósito, e a do
credor, se não o quer, para que se haja por ineficaz. Mas essa prioridade da afirmação de eficácia, ou de
ineficácia, é ilusória: o depósito é que é consequente à procedência da alegação da oblação e, pois, da alegação
da mora do credor, ou de alguma das razões do art. 898. Se, passado o dia para o recebimento, o depósito não foi
feito, e o credor contesta, a contestação precedeu ao depósito.
Há, pois, o ataque (a) às comunicações de conhecimento, relativas à existência da obrigação (elemento
declarativo), ao importe da divida, ao vencimento, a modalidades e a acessórios (elementos declarativos), e à
mora do credor (elemento declarativo); (b) o ataque às comunicações de conhecimento e de vontade relativas ao
depósito, como ato processual, praticado ou futuro. Não há o elemento constitutivo, necessário, que seria o de se
pór em mora o credor, pois já se supõe que o credor tenha incorrido nela. A mora, resultante da citação na ação
de consignação em pagamento, seria efeito anexo de direito material. Na ação de consignação em pagamento, ao
tempo do Reg. n. 737, arts. 393-402, o depósito era prémo, judicializando-se a execução voluntária; depois,
citados os legitimados passivos, com a execução feita no plano do direito material e no do direito processual, é
que podiam vir embargos.
A despeito de o art. 893 falar de ser a citação para vir ou mandar receber a quantia ou a coisa devida, “sob pena
de ser feito o respectivo depósito”, havemos de entender, conforme antes dissemos, que pode o devedor, na
petição, pedir o depósito prévio, se há razão para isso. O réu que comparece e não oferece contestação pode
receber o que foi depositado, extinguindo-se a obrigação do consignante. Se não comparece, ou se comparece e
nem recebe, nem contesta, o juiz julga procedente o pedido, declara extinta a obrigação e condena o réu ao
pagamento das custas e honorários advocatícios (art. 897).
O réu que comparece, mesmo sem contestar, pode reconvir (a ação de reconvenção); apenas tem de satisfazer os
pressupostos do art. 315 e § 1.0. Os arts. 316, 317 e 318 são invocáveis. Mesmo se não houve contestação pelo
réu na ação de consignação em pagamento, cabe a re-ação de reconvenção, porque quem não contesta se submete
às consequências da citação. Mais: se o consignante desiste da ação de consignação em pagamento, observado o
art. 267, VIII, e § 4~0, a ação de reconvenção persiste. Aliás, o mesmo ocorre se pende alguma causa cuja coisa
julgada a possa extinguir (art. 317).

7) LITISPENDÊNCIA. A ação de consignação em pagamento produz litispendéncia. O credor, após ela, não
pode lançar mão de outra ação para haver do devedor o adimplemento. A citação na ação principal de
consignação em pagamento produz, sempre, litispendência, inclusive quanto à ação condenatória, ou à executiva,
por alugueres.
O credor, réu, na ação de consignação em pagamento, pode reconvir com qualquer ação que esteja em relação
àres in iudicium deducta, como se prevê no art. 315.
A sentença que se profere dizendo ser “subsistente o depósito”, ou ser “válido o depósito”, ou, melhor, “ser
procedente a ação de consignação em pagamento”, é sentença declarativa, sem qualquer elemento de
condenação. Se o depósito ainda não foi feito e o juiz o autorizou, a sentença é declarativa in futurum e tem
eficácia liberatória, a favor do devedor, desde o momento em que o depósito se faça. Em verdade, declara que o
depósito futuro vai liberar. A construção da ação de consignação em pagamento como ação declarativa, com a
oblação real, que é o seu elemento distintivo, de segurança, justifica que se impugne pela contestação, e não por
embargos. Porque mais se impugna a ação declarativa que o elemento secundário, dependente, mandamental, do
depósito.
Qualquer “condenação” que ocorra na sentença proferida na ação de consignação em pagamento, é estranha à
ação de consignação em pagamento: (a) ou se. refere a reconvenção do credor, ou (b) o autor, devedor, cumulou
ações, ou (c) a ação de consignação em pagamento não foi proposta como principal. Não há sair-se daí; e essas
distinções são de grande importância prática. A executividade, que pondera, é postenor. Sobre a condenação a
custas e honorários adiante (art. 897).

Art. 897. Não sendo oferecida contestação’) dentro do prazo 2)3)5)6)7)8), o juiz julgará procedente o pedido,
declarará extinta a obrigação e condenará o réu no pagamento das custas e honorários advocaticios
9)10)11)12).

Parágrafo único. Proceder-se-á do mesmo modo se o credor receber e der quitação4).

1)COMPARECIMENTO DO CREDOR PARA RECEBER. O comparecimento do credor, para receber a


prestação depositada, firma que nada opõe à proposição implícita de que o crédito se extinguiu pela consignação.
Uma das conseqüências da consignação (aliás 1da mora do credor!) é a de obrigar o credor a pagar as despesas
feitas para consignar (custas, tais como distribuição, selos da petição inicial, taxa judiciária
mandado de citação, custas do oficial de justiça e do escrivão, termo de quitação). A entrega é, aí, ato jurídico
(não declaração de vontade), e a sentença teria simples efeito de ato judicial.
Se é “certo” (conhecido e único) o credor, recebe, acudindo à citação; se há dúvida sobre quem deva receber, ou
ignorância, depende de decisão judiciária (art. 898).
Decidiu a 1.a Câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 10 de julho de 1952, que, comparecendo o
credor, pronto para receber, não há de ser condenado nas custas. Sem razão. Se houve recusa, ou mora, o
recebimento do que ~e teria de depositar, não exime o citado de pagar as custas. Daí ter de ser suscitada a
condenação, se foi pedida, mesmo se implicitamente. O demandado é que, recebendo-o, há de declarar que não
se recusara a receber, nem incorrera em mora, ainda que somente para se forrar à condenação às custas (1.R
Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, 12 de novembro de 1952, R. dos T., 207, 468: “As custas devidas
até o momento do recebimento devem ser imputadas ao credor que, sem qualquer objeção, levantou a soma
oferecida; as demais devem ser atribuidas ao devedor que, indevidamente, reclamou o prosseguimento da lide,
pois, com o recebimento da oferta, a ação estava finda, não havendo razão que justificasse a sua continuação”).
Acima falamos do credor que é conhecido (“certo”) e único, o que evidencia a sua legitimação a receber o que
iria ser depositado, ou já foi. Temos, porém, de cogitar das hipóteses de pluralidade de credores, legitimados a
receber. Se os citados foram B e C, sem nada se dizer sobre a ordem da legitimação (e. g., no contrato foi dito
que o pagamento será a B, ou, se B está ausente, ou se não compareceu para receber, o pagamento será a C), o
recebimento por B, ou por O, extingue a dívida. Se no contrato se diz que B ou O irá receber na data do
vencimento, legitimado a receber é quem comparece; se nenhum compareceu e há a ação de consignação em
pagamento, qualquer deles pode comparecer para receber ou contestar. Têm de receber juntos ou em parte, se os
legitimados são dois ou mais.
Na sentença o elemento de condenação às custas e honorários do advogado não altera a classe de sentença
declarativa de extinção que o juiz profere. A condenação às custas e aos honorários de advogado não supõe efeito
executivo da sentença proferida. As custas e os honorários de advogado nada têm com o efeito executivo, ou com
a eficácia de coisa julgada material da sentença, nem, tampouco, os seus pressupostos são os pressupostos desse
ou daquele (com razão, JAMES GOLDSCHMIDT, Der Prosess ais Rechtslage, 504; sem razão, AXTRUR
NusSBAUM, Die ProzesshandlUngefl, 19). ~ precisamente do feito da sentença e não do seu conteúdo, que
deriva o mandado de custas. Trata-se de efeito do processo, anexo a ele (WILHELM SAuXR, Grundlagen des
Prozessrechts, 48), regulador do custo e pagamento do trabalho com o processo.

2) No caso de não-comparência, efetua-se o depósito, extraindo o escrivão as guias. O negócio de depósito em


consignação é de direito privado, ainda quando se faça com os depósitos públicos, ou pelo correio. Aliter, se por
intermédio do juiz.

3) FALTA DE CoNTE5TaçÃo . Se a contestação não foi oferecida dentro do prazo, procedente é o pedido, e
cabe ao juiz julgá-lo como tal. Na sentença está declarada a extinção da divida, da pretensão e da obrigação, e o
réu é condenado nas custas e nos honorários advocatícios. Se havia pena de multa para o caso de o credor não
receber a prestação vencida, é assunto para outra ação.

4)RECEBIMENTO E QUITAÇAO. Ao receber o que se depositou, tem o credor de passar recibo. Tem o juiz de
declarar extinto o direito a pretensão e a obrigação, e de condenar o réu ao pagamento nas custas e nos
honorários advocatícios.
No art. 899 cogita-se do caso em que o credor alegou não ser integral o depósito.

5) COGNIÇÃO COMPLETANTE. Contestada a ação, de acordo com o art. 896, a cognição completante decide
se houve, ou não, razão para o depósito, que em tanto importa qualquer das causas do art. 896. O curso é
ordinário, como se dá a respeito do próprio processo executivo de titulo extra-judicial (cognição incompleta mais
execução antecipada). A ação de consignação constitui relação jurídica processual (entre autor e Estado), como
qualquer outra; porém com promessa de prestação de serviço (não de execução) próprio ou de outrem (se o
consignatário não é o Estado), para substituir a execução. A relação de direito material (público) entre o Estado e
o consignatário e a relação entre o devedor e o consignatário são inconfundíveis com a relação jurídica
processual, posto que essa as tenha suscitado. O direito público pode publicizar a relação jurídica entre o devedor
e o consignatário, e não seria anomalia em técnica legislativa; na dúvida, entende-se que o fez.

6)COMPARENCIA SEM CONTESTAÇAO . Se o credor comparece e não contesta a ação de consignação,


corrido o prazo, pois que esse prazo já estava a correr desde a data fixada, no mandado, para o recebimento, o
juiz julga subsistente o depósito, se for o caso. O juiz não está adstrito a julgá-lo, sempre, subsistente, pois casos
há em que a sua cognição superficial inicial se desfaz. Dai o “como de direito”, de que se usava em algumas leis
processuais estaduais. O próprio efeito simplesmente liberatório do depósito e a ciência não justificariam a
mecanicidade de tal julgamento. A sentença não se confunde com o ato da nota 1). AMORIM LIMA (Código, 1,
136) e Luis MACHADO GUIMARÀE5 (Comentários, IV, 324)sustentavam que a sentença apenas diz que o
pagamento vale o que vale em relação ao pagamento do débito conforme o contrato e a lei (“julgo efetuado o
pagamento para os fins de direito”). A questão não é tão simples assim, porquanto pode ocorrer que seja a termo
e sob condição o depósito, o que exige exame de questões de fundo. Ainda mesmo que os pretendentes à
prestação não apareçam, a ação tem, até aí, caráter declarativo.
Tal como se redigiu o art. 898, a questão entre ADOLF WACH (Gutachten, 23 e 39; Der Feststellungsanspruch,
Leipz.Fest gabe fitr B. WINDsCHEID, 56, nota 99) e KONRAD HELLWIG (Anspruch und Klagrecht, 421) é de
importância: o devedor do art. 898 é parte na demanda entre os dois ou mais pretendentes. Alguns entendiam que
o seria ainda no caso do § 75 da Ordenação Processual alemã (devedor demandado que litisdenuncia terceiro
pretenso credor). A sentença, no caso de credor não contestante, faz coisa julgada material, pois o juiz já lhe não
pode mudar inter partes a eficácia, e estão vinculados à sua sentença ele e os outros juizes. Não se excetua a ação
de consignação de alugueres; porque, tendo sido proferida a sentença na ação de consignação em pagamento de
alugueres, produz ela coisa julgada material. Fato esse, que tornava idiotismo do direito processual brasileiro a
quebra da simetria entre a litispendência e a coisa julgada material, no caso do Código de 1939, art. 166, § 3~O•
O Código de 1973, como o de 1939, tornou a consignação em pagamento processo de jurisdição contenciosa. Se
não comparece, ou se comparece e recusa, está correndo o prazo para a contestação.
Alegado algum fato, na petição inicial, tem o juiz de admiti-lo como verídico, se o contrário não resultar do
conjunto das provas.

7)CURADOR À LIDE. Se o réu está preso, ou se não comparece e foi citado por edital, ou com hora certa (art.
9/>, II, tem de ser-lhe dado curador à lide. Não se confunda a resolução do juiz, em que ordena que se faça o
depósito, com a sentença que se profere no processo ordinário, quer se profira, não contestada a inicial, quer se
profira tendo havido contestação. Não há, de ordinário, o depósito prévio no sistema do Código, mas pode advir
de circunstâncias a que antes nos referimos. De regra há o depósito se o réu não comparece, ou se comparece e
não quer receber (o que faltou à lei dizer, mas subentende-se, também, porque só se pode julgar subsistente o que
já existe).
Mais um problema. Tem o juiz de nomear curador à lide, dito curador especial, se o réu é incapaz e não tem
representante legal, ou se os interesses deste colidem com os daquele (art. 9/>, 1). Nas comarcas onde há
representante judicial de incapazes, a esse compete a função de curador especial (art. 9•O, parágrafo único).
Assim, tem-se de nomear curador especial, se o credor é incapaz e não tem representante legal, mesmo que a
citação tenha sido por edital, sem se saber que o citado ou um dos citados é incapaz, ou se é sucessor, em vida ou
a causa de morte, de um dos citados.
Nas espécies dos arts. 1.143 e 1.160, é imprescindível a nomeação do curador especial.

8)CONTAGEM DO PRAZO PARA A CONTESTAÇAO. O prazo para a contestação é contado, não da


efetuação do depósito, nem da citação, mas do dia em que havia de comparecer o citado para receber, quer se
comparece e se recusa a receber, quer se não comparece. A 4Y Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São
Paulo, a 11 de setembro de 1941 R. dos T., 134, 77), falou de contar-se do depósito da coisa. Sem razão; leu o art.
317, § 1.0, do Código de 1939, contra o explícito art. 316, pr., do Código de 1939, hoje Código de 1973, art. 896.
O depósito pode demorar. Nada tem que ver com a contestação. Trata-se de disputa declarativa.
Já dissemos que a contestação ataca comunicações de conhecimento e de vontade, relativas ao depósito, não o
depósito em si. Esse, se feito diferente de como se diz nessas comunicações, pode satisfazer, ou não, o
contestante.

O credor que deixa de comparecer e pede, depois, o levantamento, tem de pagar as custas, inclusive os
honorários de advogado (3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de fevereiro de 1950, R. dos T.,
185, 322).

9) CURSO ORDINÁRIO. Se houve contestação, o curso ordinário significa que o juiz tem de: a) decorrido o
prazo para a contestação e conclusos os autos, proferir o despacho que declare saneado o processo (art. 331)
marcando logo a audiência; b) observar os arts. 444 e 445. Se à audiência não comparece o consignante devedor,
o credor contestante pode requerer a extinção do processo (art. 267, IV), ou preferir que se vá até o julgamento
do mérito. Extinto o processo, o depósito é como se não tivesse sido feito e os riscos e perigos correram por
conta do devedor. Mas a situação de direito material (mora, por exemplo) é a anterior ao depósito, isto é, a do
tempo do despacho na petição inicial. Não assim se o juiz julga a espécie. Haverá, ou não haverá, absolutio ab
actione; e produz-se coisa julgada material. Se é o credor contestante que não comparece, então o juiz procede de
acordo com o art. 453, § 2.0.
O autor tem o ônus de alegar que houve recusa, por parte do credor citado. A alegação e a prova de não ter
havido recusa ou mora incumbem ao citado; idem, a de ter sido justa a recusa. Por isso mesmo, não acertou a 2.~
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de março de 1950 (R. dos T., 181, 206), ao julgar
improcedente a ação de consignação em pagamento, por faltar prova de que o credor se recusara a receber a
prestação devida.
A sentença que julga improcedente a ação de consignação em pagamento não pode condenar o autor ao que se
reputou devido: a decisão é simplesmente declaratória. Condenação só há nas custas (Câmara Cível do Tribunal
de Justiça de Santa Catarina, 21 de agosto de 1950, J. de 1951, 78) e nos honorários advocatícios. Salvo se houve
reconvenção, e então ‘a sentença é sobre a matéria da reconvenção e as regras jurídicas sobre custas e honorários
advocatícios são atendidas.
Advirta-se que o juiz tem de julgar a ação de consignação em pagamento, diretamente, se a questão ou se as
questões de mérito são apenas quaesticmes iuris, ou, se a questão é de direito e de fato e não há necessidade de
produção de prova, ou isso acontece com todas as questões (art. 330, 1).

10)TERMO DE ENTREGA. Do termo de entrega hão de constar os nomes do devedor (ou quem por esse
pagou) e do credor, o valor e mais caracterizações da dívida quitada, assinando-o o credor (arg. ao Código Civil
de 1916, art. 940).

11)LEVANTAMENTO PELO DEVEDOR, ATÉ QUANDO PODE SER


FEITO. Até à citação pode o devedor retirar o que foi depositado. Depois da contestação, ou da expiração do
prazo, épreciso o consentimento do credor para a desistência (art. 267, VIII, e § 4.0); e figuramos os dois casos
para supor a hipótese de mudança do depósito (alteração do pedido). O ato de concordância do credor quanto ao
levantamento tem efeitos anexos de direito material quanto a terceiros (e. g., Código Civil, art. 979). Se apenas
concordou com a alteração, esses efeitos dependem do caso em concreto. Aliás, a situação, de direito material (e.
g., Código Civil, art. 978), ou de direito processual (e. g., penhora do depósito pelos credores do credor), entre o
credor e outras pessoas pode exigir que essas pessoas consintam ou assintam. Levantado o depósito, ou tendo o
autor ‘desistido do processo, o crédito fica incólume.

12)DEsPEsAS COM O DEPóSITO. As despesas com o depósito correm por conta do credor, se comparece e
recebe, ou se é julgado procedente o pedido de depósito; por conta do devedor, se julgado improcedente, ou se
houve extinção do processo sem julgamento do mérito. Cp. Código Civil de 1916, art. 982.

Art. 898. Quando a consignação se fundar em dúvida sobre quem deva legitimamente receber 1)2)3) 4) 5), não
comparecendo nenhum pretendente 6), converter-Se-á o deposito em arrecadação de bens de ausentes8); com
pareôendo apenas um~, o juiz decidirá de pIano7); comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o
depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os credores; caso em que ~e
observará o procedimento ordinário.

1)CREDOR DESCONIIECIDO OU DUVIDA QUANTO AO CREDOR. Quando o credor é desconhecido,


porém existe, ou é possível que exista, ou é determinável, porém ainda não se determinou (e. g., unus ex
publico), como se observa nas promessas de recompensa e nos concursos públicos), a falta de exata ou completa
cognição do credor permite a consignação “a quem de direito”. Naturalmente, o consignante não pode liberar-se
sem que o credor justifique os seus direitos. Se o crédito é litigioso, ou se há dúvida quanto a quem caiba o
crédito, faz-se mister o consentimento da outra parte, ou sentença, passada em julgado, que a condene. As
expressões “ignorância” ou “dúvida” posto que os arts. 895 e 898 só falem de “dúvida”, devem ser interpretadas
no mais largo sentido. Abrangem, por exemplo, os casos de ignorância de quem sejam os herdeiros do credor, ou
se foi achado o documento de dívida sem se saber quem o tinha, ou quando alguém se pretende cessionário do
crédito sem se legitimar cabalmente, ou quando alguém (unus ex publico) foi premiado, ou se o credor, incapaz,
não tem representante a que o devedor possa fazer a oblação (art. 9•o, 1 e II). “Dúvida”, nos arts. 895 e 898, é
dúvida (A ou B; ou A ou B ou O) ou ignorância (não se sabe quem é X).
Nos casos em que o credor teria de apresentar o titulo, ou em que a obrigação nasceria dessa apresentação, só a
dúvida quanto à autenticidade pode justificar o pedido de consignação.
<,O litígio e, a yortiori, a disputa extrajudicial, de modo nenhum permitem o depósito antes da mora? ~ preciso
que o devedor constitua, antes, em mora, o credor, ou os pretensos credores? Não; os casos do art. 898 não
dependem da mora. Salvo (a) em se tratando de obrigações em que o credor teria de vir receber à data marcada,
ou ao advento de alguma condição. Nos casos (b) de obrigação de ir levar o devedor as prestaçoes, a legitimação
ativa para a consignação liga-se à
dificuldade de se saber a quem se há de pagar. De modo que a contestação, nos casos (b) do art. 898, 2.~ parte,
pode versar sobre não ter havido razão para o pedido, porém não sobre o não ter havido mora de receber.
Na ação de consignação em pagamento conforme o artigo 898, tem-se de decidir sobre quem é titular do direito
de crédito, para que possa levantar o depósito (6.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 3 de
novembro de 1950, D. da J. de 12 de março de 1951). A ação não perde razão de ser ou objeto, como disse a ~
Turma de Câmaras Cíveis, a 28 de março de 1951 (R. F., 138, 154): o levantamento, após a decisão, é efeito
mandamental; e a dissipação
da dúvida, antes da sentença, é matéria de fato a ser por essa apreciada. A 2.~ Turma não podia referir-se a
dissipação de dúvidas antes da sentença; dúvidas só a decisão judicial dissipa.

2)DIA PAIRA O RECEBIMENTO, DEPENDENDO DE LEGITIMAÇÃO .


Fixa-se dia para recebimento, porque o devedor continua com a sua liberdade de, a seu risco, pagar a quem
quiser (arg. ao Código Civil de 1916, art. 983). Vendo o que alega o pretendente, o devedor pode preferir pagar
ao comparecente. Se alguém recebe, devido a anuência do devedor, claro é que não se faz depósito. Se o devedor
não se convence, então é de se proceder ao depósito. O autor tem de ser ouvido, porque o ato de que falamos
(entregar, ou não, a coisa) é ato jurídico, ato de direito material, e não comunicação de conhecimento em direito
processual (a diferença é importantíssima, assim em teoria como na prática). Por isso mesmo, à comunicação do
art. 898, 2.~ parte, aplica-se o art. 897.

3)CITAçÃo E INTERESSE DO NÃO -CITADO. Não sendo manifestação de vontade o que disser ou deixar de
dizer o devedor, no caso de se ignorar quem é o credor, ou quem são os credores (aliter, no caso de simples
dúvida, conforme foi dito em nota anterior), o devedor não é responsável pelo que af ir-mar, salvo se houve má-
fé (art. 16), uma vez que todos os pretendentes foram citados. Ao que não foi citado nada se pode opor com a
sentença: não foi parte, nem se inseriu, voluntariamente, na relação jurídica processual.
Do que acima dissemos é de tirar-se que o emprego da expressão “dúvida”, nos arts. 895 e 898 do Código de
1973, em vez de “ignorância” e “dúvida”, no Código de 1939, artigo 318, tinha de levar-nos à explicitação feita à
nota 1, porque, se há dúvida quanto a ser A ou B ou C o credor, a citação é, de regra, pessoal, e, se há ignorância
de quem seja o devedor, há mais do que dúvida senso estrito, e a citação há de ser por edital. No caso de tal
citação de todos os que podem ser o credor ou os credores, a responsabilidade do devedor pode consistir em ter,
nos dados da petição, faltado ponto que serviria a que o credor ou os credores se identificassem.

4)FALTA DE ACORDO. Se o devedor não anui na entrega ao único pretendente, a sua posição (que é a de autor
conhecedor da “contestação” do credor, a despeito da inversão aparente) suscita algumas questões delicadas, O
processo segue com o rito ordinário, sendo os autos conclusos, aliás só depois de esgotar-se o prazo para a
contestação, a fim de
ser saneado o processo, que se rege pelo art. 331. Na audiência, ou o autor comparece, ou não. Se não
comparece, o réu, credor, pode pedir a extinção do processo, ou não pedir. Ele é que resolve como há de
proceder. (De passagem digamos que a assimilação da consignação a ação “invertida”, que
anda por aí, nasce de confusão entre perspectiva de direito processual e perspectiva de direito material. O autor é
autor e continua de ser autor.) Se é o réu, credor, que não comparece, então o juiz procede segundo o art. 453, §
3,0.Comparecendo o autor e o réu, desenvolve-se a audiência conforme os princípios.

5)ENTREGA DA PRESTAÇÃO. Comunicação de vontade, como é, ai, o ato do devedor, entregando a


prestação, tem-se de, com ela, encerrar a relação jurídica processual, e não só a angularidade, estabelecida com a
citação. De modo que ao juiz cabe proferir a sentença de efeito só de instrumentação de quitação (efeito da
sentença como ato). Os efeitos, quanto aos não-citados comparecentes, não são completos e têm de resultar da
sentença, se o devedor a seu risco se abstém da entrega. Não se aguardam as contestações dos não-
comparecentes, para se entregar a coisa. O devedor pagou a seu risco. Só se aguardam as contestações, se não há
entrega, e sim depósito.

6) NÃO-cOMPARÊNCIA . Se o autor não comparece à audiência, o interesse dos réus é que lhes dita o
caminho:pedir a extinção do processo (art. 267, IV), de modo que tudo, inclusive a citação, foi como se não
tivesse existido; ou prosseguir na demanda, para que prevaleçam as suas afirmações.
Se são os réus que não comparecem, cabe ao juiz proceder de acordo com o art. 453, § 3.Q

7)COMPARÊNCIA. Comparecendo mais de um pretendente, persiste a oportunidade, para o autor, de sair da


demanda sem o assentimento dos réus, enquanto não se extingue o prazo para a contestação (art. 267, § 4.0). Por
isso mesmo pode entregar a coisa a um deles, salvo se algum ainda poderia apresentar a contestação, pois esse
teria de consentir. A “revogação”, melhor termo para designar o pedido de levantamento, ainda se pode dar, e
com ele a entrega a qualquer dos comparecentes, por ato de declaração de vontade, que se há de tratar,
processualmente, como desistência, por ser ato de exercício de direito formativo resolutivo (aufhebendes
Gestaltungsrecht). A sentença do juiz é julgamento com valor de ato judicial e constitutivo negativo quanto ao
processo, como a própria desistência dentro do prazo para a contestação.
Se, no prazo, vêm as contestações, o processo tem de seguir, sem a presença de quem foi citado e não
compareceu, porque, quanto a comparecentes é que há de correr o processo. Se somente contestou um dos
citados, o juiz decide. Isso não significa que a simples comparência de um sem a contestação leve o juiz a julgá-
lo legitimado, tanto mais que a citação pode ter sido a um ex publico, portanto sem nome. O art. 898 supõe a
comparência ou a não-comparência. Não se fala de haver contestação, ou de não haver. (A comparência com
contestação é outro assunto. Regem os arts. 896, 897 e 899. A dúvida senso lato pertence aos arts. 895 e 898.) Há
a comparência para “legitimamente receber”. Há a comparência com contestação. Há a comparência de todos,
matéria para ser apreciada, porque só assim se sabe qual a pessoa ou quais as pessoas legitimadas a receber. O
art. 898 supõe: ou a) que ninguém compareça, a despeito das citações ou da citação edital (“não comparecendo
nenhum pretendente”), caso em que o depósito se converte em arrecadação de bens de ausentes (arts. 1.159-
1.169); ou b) apenas um dos citados comparece (ou dois ou mais que sejam os legitimados a receber), o que leva
o juiz ao exame da legitimação, cabendo, no caso de decisão favorável, a um ou a alguns; ou c) comparecem dois
ou mais, cuja legitimação somente caberia a um, e tem o juiz de decidir, só se entregando o que foi depositado
após a decisão trânsita em julgado; ou cl) quem comparece contesta. Na espécie c), o processo continua só entre
os comparecentes e o Estado (juiz), por se ter transformado em simples relação jurídica linear, a que se esperava
persistisse a angularidade. Na espécie cl), a angularidade continua, para que se julgue a ação de consignação em
pagamento. Na esp~cie a), a divida extinguiu-se e ao credor ausente ou aos credores ausentes é que compete
apresentarem-se em juízo. O devedor, que deixara de ser, não mais é parte. Na espécie b), há a entrega ao
legitimado ou aos legitimados.
Se o devedor não desiste, nem entrega a prestação a um dos pretendentes, então o feito aguarda a expiração do
prazo para as contestações e prossegue somente entre os credores (“unicamente entre os credores”).
O devedor pode pedir o levantamento, se não houve contestação; se o não faz, é que renunciou à devolução do
depósito. Em todo caso, pode, eventualmente, ter de responder pela resistência em solver a dívida, sem razão
para isso (abuso do direito material, não processual, pela falta da manifestação de vontade; ou se fez alegações
falsas a respeito das suas pretensões ou outros atos processuais de abuso de direito processual, art. 16).
c,Qual a eficácia de coisa julgada material entre esse devedor e os credores senados? A questão foi ventilada por
ADOLF WACH (Gutachten, 23, 24, 39, 40, 95 5.), OTTo FISCHER (Von den subjektiven Grenzen der
Rechtskraft, Jherings Jahrbitcher, 40, 197), e KONRAD HELLWIG (Anspruch und Kiagrecht, 421), além de
muitos outros. ADOLF WÀCH e OPTO FIsCEER, seguidos de alguns, negavam a eficácia da coisa julgada
material, quanto ao devedor; ao passo que KoNRIXD HELLWIG via o devedor liberado perante todos os
pretendentes, ainda os não-comparecentes. Para ele, a decisão que acaso exista sobre a legitimação ativa dos
pretendentes somente pode ser declarativa, a despeito da divergência entre eles (por essa razão mesma, em
sentido contrário, Lo¶rHAR SEUFFERT). A solução não pode ser a priori. Depende de se saber se o devedor se
demitiu da relação jurídica processual, o que não é sempre possível, pois algum dos pretendentes, ou alguns, ou
todos eles podem ter sido chamados com fundamento no art. 898 e terem contestação fundada no artigo 896. A
assimilação do processo ao concurso de credores que se fazia no Código de 1939, art. 318, foi retirada no texto
de 1973. A nossa crítica foi atendida. A coisa julgada material somente opera entre partes e tem-se de verificar se
o devedor ainda é parte. Ora, no concurso de credores, o devedor é apenas titular de pretensão de direito
material, a “massa” e que é titular da pretensão à tutela jurídica e o administrador da massa, segundo alguns, a
parte. Mas essa construção não se ajusta ao caso do art. 898, 3.~ parte, porque o devedor nem sempre está diante
de credores munidos das provas que cada credor tem de apresentar em concurso de credores. Naturalmente,
concurso só se dá depois de admitidos dois ou mais de dois credores, e então a cognição completa ficou para trás
com a sua eficácia de coisa julgada material quanto a cada um deles e ao devedor. O art. 898, 3.~ parte, estatui
que se continue o processo entre os credores, com a ordinariedade do procedimento, e o que a sentença final tem
de assentar é a declaração de titularidade para que se levante o depósito.

8)ARREcADAÇÃO. Não comparecendo pretendentes, ou o devedor pede o levantamento do depósito e acarreta


com as conseqüências , pelo efeito negativo ex tune da “revogação” (direito formativo resolutivo), o que também
a sua massa falida pode fazer (HuGo OsER e ANDREAs VON TurnO, porque esse direito formativo resolutivo é
elemento do patrimônio; ou renuncia à devolução, e se dá a arrecadação como de bens
53
O art. 898, l.a parte, que supõe a não-comparência de todos os citados, estabelece que se arrecade o depósito
como bem de ausentes. Pergunta-se: ~,é (a) imperativa a regra jurídica, ou (b) não sendo jus cogens, pode o
devedor preferir o levantamento, pagando as custas e o honorário do seu advogado? Temos de preferir a solução
(b), pois alguém pode surgir, não citado, ou mesmo citado, que proponha a ação contra o devedor. É verdade que,
tendo sido citado, quem não compareceu, o devedor pode alegar que ele não foi omisso na ação de consignação
em pagamento, e que o credor tem de ir ao procedimento ordinário em que se há de habilitar como ausente. Mas,
mesmo aí, não há inconveniente em cue o devedor volva e assuma a responsabilidade, tanto mais quanto alguma
pessoa a legitimada ativa (e. g., cessionária do credor) pode não ter sido citada.

Art. 899. Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral 1) é lícito ao autor completá-lo,
dentro em dez (10) dias, salvo se corresponder a prestação, cujo inadimplemento acarrete a rescisão do
contrato2).

1)DEPóSITO QUE NÃO FOI INTEGRAL. O citado pode alegar, na contestação, que o depósito não é integral
(art. 896, IV). Se é verdade o que afirma, inutilmente o devedor propôs a ação de consignação em pagamento. O
Código de 1973 abre uma porta ao devedor, quer ele tenha apenas errado, quer não: pode completar o depósito,
dentro do prazo de dez dias. Salvo, frise-se, se, no caso, o inadimplemento ou adimplemento ruim acarretasse
resolução ou resilição do contrato. (A expressão “rescisão”, no art. 899, é erro de terminologia, que lamentamos
estar no Código de 1973. Trata-se de resolução lato senso.)

2)PRAZO DE DEZ DIAS. O art. 899 permite a integralização do depósito no prazo de dez dias. ~,De quando se
há de contar esse prazo? A solução tem de ser a de se contar do dia da contestação (art. 896) e não depois de
terminado o prazo para a contestação. Quem logo contesta não pode ser prejudicado com o resto do prazo.
Surge um problema diante do art. 899, que foi regra jurídica nova. Quer no direito atual quer no anterior, uma
das alegações contestativas é a de não ser integral o depósito (Código de 1973, art. 896, IV; Código de 1939, art.
316, IV). Se o devedor não quer integralizar o depósito, dentro do prazo, tem o juiz, no processo de rito
ordinário, de decidir se tem razão o devedor ou o réu, que é o credor. O que pode acontecer é que o devedor,
pendente a ação, passe a reconhecer a deficiência e a prestar-se a atender à alegação do contestante. Ai, porém,
há elemento para a sentença do juiz favorável ao réu. Aliás, o próprio credor pode retificar, se a tempo, o que
considerava diminuição do depósito. Uma vez que o comparecente não recebeu, o depósito foi feito. Julgada a
favor do contestante a ação, o juiz manda que se deposite o que falta; se a favor do devedor, tem o contestante de
se satisfazer com o que foi depositado.
Art. 900. Aplica-se o procedimento estabelecido neste capítulo, no que couber, ao resgate do aforamento í)•

1)RESGATE DE AFORAMENTO. Todo negócio jurídico contém, pelo menos, uma manifestação de vontade:
pode haver uma, ou mais de uma, de um lado, sem, do outro lado, haver qualquer outra. Deve-se ao direito
comum ter distinguido os negócios jurídicos unilaterais e os bilaterais. O direito romano poucos daqueles
negócios jurídicos conhecia, ainda assim tirados, historicamente, dos contratos, como o testa-
mento. O consensus era o ponto de partida das construções jurídicas romanas; ao passo que o contrato foi
desconhecido do primitivo direito germânico (cf. HEINIUcH SIEGEL, Das Versprechen ais
Verpflichtungsgrund, 3). No adimplemento dessas obrigações, oriundas de declaração unilateral de vontade, é
que se podiam ver dois lados, que conduziam, portam, “vertragen”, como “vergleichen”. Daí ver-se tanto o
credor, no direito romano, e ver-se mais o devedor, no direito germânico. Os atos pelos quais se exerce direito de
perempçáo (Código Civil de 1916, art. 1.149) ou de resgate (Código Civil, art. 1.140-1.143) são negócios
jurídicos unilaterais.
Diz o Código Civil de 1916, art. 693: “Todos os aforamentos, salvo acordo entre as partes, são resgatáveis vinte
anos depois de constituídos, mediante pagamento de vinte pensões anuais pelo foreiro, que não poderá, no seu
contrato, renunciar o direito ao resgate, nem contrariar as disposições imperativas deste Capítulo” (Lei n. 2.437,
de 7 de março de 1955, art. 1.0). De início, note-se que se considera o direito do enfiteuta direito real limitado,
como peado pelo domínio, e se emprega a expressão “resgate” para se considerar o ato de liberação do foreiro,
em vez de se pensar em ato de liberação frente ao senhorio, isto é, de obliteração do gravame. Lança-se mão de
termo que mais conviria ao ato com que o senhorio tornasse livre de ônus o domínio. Em tudo isso, há
reminiscência feudal, porque se escalonariam os domínios, e a leitura de livros franceses muito concorreu para
essa visão da enfiteuse, pondo-se o investigador do lado em que está o enfiteuta (a esse tocaria o domaine de
propriété; ao senhorio, o domaine de supériorité, o droit de seigneurie). Devemos interpretar o Código Civil
livrando-nos dessas escórias, que são como ossadas que se encontram ao lavrar-se o terreno.
A regra jurídica da irrenunciabilidade nada tem com a regra jurídica da remibilidade ou resgatabilidade pelo enfi
teuta. A resgatabilidade ou remibilidade pelo foreiro é, em parte, de direito dispositivo. O próprio art. 693 di-lo,
aludindo à possibilidade de preexclusão da sua incidência: “salvo acordo entre as partes” (MANUEL DE
ALMEIDA E SousA, Tratado prático e critico de todo o Direito enfitéutico, II, 50:
“É freqúente neste Reino, e em outras nações, convencionar-se nos emprazamentos, que em qualquer tempo
poderá o enfiteuta remir a pensão imposta, e que, remindo-a, ficará o prazo extinto, e alodiais os bens no domínio
do enfiteuta”). <Que é, porém, que se pode afastar, dispositivamente, do art. 693?

A resgatabilidade é inderrogável (Código Civil, art. 693, verbis “pelo foreiro, que não poderá, no seu contrato,
renunciar o direito ao resgate”). Portanto, qualquer declaração de vontade em contrário tem de ser sem pré-
eliminação do resgate. A resgatabilidade pode ser a qualquer tempo, ou antes dos vinte anos a que se refere o art.
693 (Lei n. 2.437, de 7 de março de 1955, art. 1.0). O pagamento pode ser de menos do que se fixa no art. 693.
Discute-se se, estando composto o suporte fáctico do comisso, mas faltando a sentença, pode o enfiteuta remir
(resgatar) o direito enfitêutico, ficando com o prédio. As sofisticações do CARDEAL DE LUCA e
FRANÇIsCUS FULGINEUS não nos podem interessar: distinguiam eles a enfiteuticação em que foi outorgante
o senhorio, dono pleno ao tempo em que outorgou o direito real limitado, e a enfiteuticação em que foi
outorgante o enfiteuta, então senhor pleno do prédio.
A questão só se pode resolver com acerto se se parte de estudo da natureza da ação de comi sso e da sentença de
comisso. Se a ação é declarativa, o enfiteuta não pode resgatar, após a composição do suporte fáctico do comisso,
a que nada, ex hypothesi, faltaria. Se a ação é constitutiva negativa, o suporte fáctico do comisso só se integra
com a sentença favorável; portanto, enquanto não se desconstitul
o direito real de enfiteuse, por sentença, ainda se pode resgatar a enfiteuse e adquirir o prédio. Não escondemos
que o termo resgate dá ao enfiteuta posição em relação ao prédio como se fosse o enfiteuta, e não o dono, que
sofresse a limitação. Mas a lei o emprega, e não há grandes inconvenientes em conservá-lo. Trata-se, em
verdade, de direito formativo gerador, que tem o enfiteuta, direito à aquisição do prédio sujeito a enfiteuse,
mediante a prestação de vinte pensões, se já vinte anos passaram após a constituição da enfiteuse.
Direito formativo gerador, o direito fundado no art. 693 do Código Civil não prescreve; pode precluir. Aliás,
embora não tivessem a técnica científica de hoje, os juristas dos séculos XVII a XIX intrigavam-se com o
assunto. ~.Que é que acontecia ao direito do senhorio se não o exercia, a despeito de saber que o enfiteuta
incorrera em comisso? A solução da prescrição não se enquadraria e foi repelido o que afirmou o francês
DUNOT; apenas, do lado do adquirente, que, ex hypothesi, tem título, se opera a usucapião do prédio ou a
prescrição da ação real do senhorio que quisesse reivindicar.
O enfiteuta que incorreu em comisso pode purgar a mora e requerer o resgate. Nada obsta aos dois atos enquanto
não se desconstitui a relação jurídica de enfiteuse pelo julgamento judicial do comisso.
No resgate, há modo de extinção da enfiteuse e ao mesmo tempo exercício de direito pelo enfiteuta. O enfiteuta
tem direito ao resgate, direito que se exerce com a prestação de que cogita a lei. Do exercício desse direito resulta
o resgate, fato de aquisição da propriedade e ao mesmo tempo extintivo da enfiteuse, pela confusão na mesma
pessoa dos dois direitos reais, o domínio e o direito enfitêutico. Se raciocinamos com rigor, o resgate é
desapropriação pelo enfiteuta; porque, se havia quem deveria poder liberar-se, essa pessoa seria o senhorio, não o
enfiteuta. Foi o domínio que sofreu a restrição. Não o direito enfitêutico, que se fez com elementos tirados
ao conteúdo do domínio. Daí ter-se dito que a “potestas affrancandi repugnat contractui emphyteusi”. A ratio
legis do Código Civil, art. 693, está em que se reconhece a importância quantitativa dos elementos que compõem
o conteúdo do direito enfitêutico, importância tal que, parece, só se deixou ao domínio a pele da propriedade; e
redigiu-se regra jurídica que permite o resgate, que em verdade desapropria.
Em verdade desapropria, dissemos. Pergunta-se: resgatada a enfiteuse, ~.pode o enfiteuta conservar-se enfiteuta e
fazer-se senhorio? Não, dir-se-á; o resgate dá a propriedade, não, porém, como aquisição à parte, adquire-se o
domínio, para que não haja mais enfiteuse. Essa não é a melhor solução: a continuação da cisão pode ocorrer se o
enfiteuta faz transcrever a sentença quanto ao resgate e declara não querer cancelar o registro da enfiteuse. Tudo
se passa, ao inverso, à semelhança do que acontece em caso de comisso.
A transferência que emana do resgate é transmissão da propriedade, dando ensejo à pretensão do Estado ao
imposto de transmissão da propriedade imobiliária e à exigência da transcrição. Para que o direito ao resgate
nasça, é preciso que já tenham decorrido vinte anos, salvo se outro prazo foi adotado, ou se foi dipensado
qualquer prazo. O Código Civil, art. 693, começa por dizer “todos os aforamentos, salvo acordo entre as partes,
são resgatáveis vinte anos depois de constituídos”. A ressalva “salvo acordo entre as partes” só se refere ao
tempo exigido, suspensivamente, para o direito ao resgate. Não às outras proposições do art. 693.
~,Poder-se-ia fixar em mais de vinte anos o início da resgatabilidade? A 1.a parte do art. 693 é dispositiva, e o
prazo de vinte anos não é máximo; mas o prazo que provavelmente excede a vida do primeiro enfiteuta
implicaria pactuar-se sobre irresgatabilidade.
No direito de alguns povos distinguiam-se o direito real de resgate e o direito pessoal, segundo os pactos eram
concebidos in personam, ou in rem ipsam, isto é, a favor do primelro enfiteuta, ou de seus sucessorés. A
distinção não mais interessa ao direito brasileiro, porque o pacto que restrinja o direito de resgate, direito real,
contra o enfiteuta seria nulo. Pode o pacto favorecê-lo; não prejudicá-lo. Ainda que se houvesse pactuado só ter
direito ao resgate o primeiro enfiteuta, ou só ele e os seus sucessores a causa de morte. e tal fosse registrado,
seria nulo. Outrossim, o que estabelecesse que seriam mais de vinte as pensões anuais devidas pelo enfiteuta que
quisesse resgatar.
O enfiteuta pede, para que se dê o resgate, a consignação da quantia que a lei diz ser suficiente. O foro é o do
lugar em que está situado o imóvel. Com o depósito, cessa para o devedor a relação jurídica de enfiteuta, se
julgada procedente a ação. O senhorio é citado para, em lugar, dia e hora designados, ir ou mandar receber a
quantia, sob pena de ser feito o respectivo depósito. Se há dúvida quanto ao senhorio, ou quanto aos senhorios,
há a citação daquele ou de todos, para que aleguem e provem o direito de que se dizem titulares. Para a
contestação há o prazo de dez dias, contado da data designada para o recebimento. O senhorio pode inserir na
contestação que o depósito não se efetuou no prazo e no lugar do pagamento, ou que não era integral o depósito
feito (art. 896, III e IV). Se o senhorio não contesta dentro do prazo, o juiz julga procedente a ação. Aí, as custas
e honorários advocatícios são pagos pelo enfiteuta, se o senhorio não se recusara a receber quantia oferecida
antes da propositura da ação de resgate do aforamento. O art. 899 é invocável pelo enfiteuta. Se há dúvida quanto
a quem seja o senhorio, regem os arts. 895 e 898.

CAPITULO II

DA AÇÃO DE DEPÓSITO 1)2)3)

1)AçÃo DE DEPOSITO E CoNTRATO DE DEPOSITO. Tem-se dito que falta ao depósito elemento específico,
procurando-se ver a “guarda”, assim em contratos de locação como de mútuo, de mandato, etc. Na locação, não
há “guarda”, ou há dação, pelo locador, de espaço para a coisa, ou transferência da posse imediata sobre a coisa
para uso e gozo do locatário. Algumas vezes, a guarda vai a especificações mais rentes, como a conservação de
máquinas, as lavagens do objeto, a alimentação de animais (HEINRICH DERNBURG, Das Bzirgerliche Recht,
4.~- ed. II, 2, 629). O mútuo é no interesse do que recebe a coisa; o depósito, no interesse de quem deposita. Por
outro lado, o depósito não se confunde com as relações de gentileza, que nascem quando se permite deixar a
coisa, ainda que não se toque nela, sem se assumir o dever de depósito (PAul. OERTMANTN, Das Recht der
Schuidverhaltnisse, 3.1L4 a ed., 832, 6, c). Cada era tem o seu contrato ou os contratos prediletos; e o depósito,
com as responsabilidades que dele emanam, tem sido menos favorecido pelos juristas da época do capitalismo
tardio, preocupados em tomar locação todos os contratos, como, há alguns séculos atrás, tudo se reduzia a
mandato, e, nos tempos romanos, tudo se procurou explicar pela venda ou pela troca. O direito contemporâneo,
não-técnico, diante de papéis de legitimação, vê a esses, e não o contrato de depósito que lá está, porque essa
atitude é a mais perceptível à sua maneira de viver.

2)PRETENSõES DO DEPOSITANTE. O depositante tem a pretensão à restituição da coisa e a pretensão a que


o depositário guarde a coisa. O depositário tem a posse direta ou imediata, e como tal pode usar dos remédios
jurídicos possessórios. Se resulta do contrato, cabem-lhe as pretensões ao uso da coisa. O Código de Processo
Civil só se interessou pela ação ligada à pretensão do depositante a ser-lhe restituida a coisa que foi depositada.
Negócio jurídico bilateral, nem sempre “perfeito” (e. g., uma parte é obrigada a depositar). Contrato real, de
modo que pode existir o pré-contrato ou a promessa de depositar, com o depósito da coisa a riscos e perigos para
o obrigado. É o pactum de deponendo, que não foi regulado pelo Código Civil de 1916 e se rege pelos princípios
gerais. Na dúvida, só se entende obrigado por esse pacto o futuro depositário, não o futuro depositante (OTTo
VON GIERKE, Deutsches Privatrecht, III, 729, nota 10; PAUL OERTMANN, Das Recht der
SchuldverMltnisse, 3.~-l4.~ ed., 830); mas aquele tem, eventualmente, pretensão a ser indenizado do que
despendeu para poder depositar (PAUL OERTMANN, 830; L. ENNECCERUS, Lehrbuch, 1, 2, 489). A
responsabilidade dos empresários de teatros, cassinos, clubes, hotéis, pelas peças de vestiaria, é responsabilidade
de depositário (OTTo WARNEYER, Kommentar, 1, 1.118). Os estábulos para guarda de animais são depósitos,
se não prevalece a figura do contrato de locação. Os restaurantes e cafés abertos, sem serviço de fichas para
chapéus e outros objetos, não respondem como depositários. Também não respondem os escritórios de
advogados e os gabinetes de médicos e dentistas, quanto a chapéus, bolsas etc. O oficial de justiça, ou outro
auxiliar da justiça, enquanto a coisa não é entregue ao depósito público e permanece com ele, responde como
depositário. Se a confia a outrem, há outro contrato de depósito entre ele e esse terceiro (OTTo WARNEYER,
Kommentar, 1, 1119).
Sempre que a lei dá a alguém a incumbência de receber quantia, ou coisa pertencente a outrem, e de depositar,
em nome daquele a quem pertence a quantia, ou a coisa, a equiparação ao depositário é implícita.
A 7.~- Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 10 de maio de 1949 (D. da J. de 16 de outubro
de 1952), negou, radicalmente, ao “depósito” em garantia de dívida a ação de depósito. A 6.~ Câmara Cível, a 12
de dezembro de 1950 (D. da J., de 7 de novembro de 1951), preexcluiu a ação de depósito se o objeto do
depósito é coisa fungível. A questão é de direito material: não é verdade que o depósito de coisa fungível não
tenha a ação de depósito e a cominabilidade da pena de prisão; o que se pode discutir ése o depósito irregular
segundo o art. 1.280 do Código Civil de 1916 tem tais eficácias, o que expusemos no Tratado de Direito
Privado. Note-se bem o que escrevemos: o depositante, no depósito de coisa fungivel, tem a ação de depósito e a
cominabilidade da pena de prisão. Não o depositante, no caso de depósito irregular. O depósito a que nos
referimos é o depósito regular, e não o regido pelo art. 1.280 do Código Civil.

3)NATUREZA DA AÇÃO DE DEPÓSITO QUANTO À EFICÁCIA. A ação de depósito contém elemento de


condenação, a forte dose, mas é ação executiva. A lei joga com três técnicas executivas, a da restituição da coisa
(cf. art. 902, 1, verbis “entregar a coisa”, “depositá-la em juízo” “ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro”) e
a da constrição psicológica processual (art. 902, § l.~, verbis “cominação da pena de prisão”). A resolução
judicial é concebida nos seguintes termos: (1) ou a) entrega da coisa, ou b) depósito judicial, ou c) entrega do
equivalente em dinheiro; (2) ou prisão. A executividade é evidente se consideramos o primeiro caso da lei que
corresponde a (1), ou se consideramos o segundo, inclusive a decretação da prisão (art. 904 parágrafo único).
O segundo somente possui uma fase: citação, não-(1), (2); o primeiro tem três: citação, a) ou b) ou c) náo-(2);
contestação, curso ordinário (art. 903).
Pode dar-se o caso de haver o depósito da coisa, ou do equivalente, e não haver contestação. Então, ocorre um
dos fatos da nota ~) ao art. 903.

Art. 901. Esta ação tem por fim exigir a restituição da coisa depositada 1)3)4)5)
6)15)
Ad. 902. Na petição inicial instruída com a prova literal do depósito2)12) e a estimativa do valor da coisa 11>, se
não constar do contrato, o autor pedirá a citação do réu para no prazo de cinco (5) dias 8):
1 entregar a coisa, depositá-la em juízo ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro 10)13)14);
11 contestar a ação 9)•§ 19 Do pedido poderá constar, ainda,a cominação da pena de prisão 7) até um (1)
ano, que o juiz decretará na forma do art. 904,parágrafo único.
§ 2.0 O réu poderá alegar, além da nulidade ou falsidade do título e da extinção das obrigações, as defesas
previstas na lei civil16)17)

1)AçÃo DE DEPÓSITO. A chamada ação de depósito é a ação em que o depositante, ou quem o represente,
exige a restituição da posse da coisa. (Não se diga “restituição da coisa”, porque o depósito somente concerne à
posse e não ao domínio.)
2)DEPÓSITO E NEGOCIO JURIDICO FORMAL. O depósito não é negócio jurídico estritamente formal. Pode
fazer-se por instrumento particular, ou público; ou mediante cautela, que é título de legitimação. Tal documento
tem de ser junto com a petição inicial (art. 283). Adiante, nota 10).

3) FRUTOS E ACESSõES. A lei processual não falou de frutos e de acessões (Código Civil de 1916, art. 1.266).
Quanto às acessões , aderiram; é, pois, acadêmica essa questão. Quanto aos frutos, tratando-se de frutos naturais,
como a cria da égua ou da vaca, pedem-se pela ação do art. 901, desde que haja o documento ou outra prova.
Tratando-se de títulos de crédito com cupões, pedem-se títulos e cupões ou o dinheiro recebido com a
apresentação desses. Nem são frutos, nem acessões; porque se depositaram o titulo e o cupão, e não o título só.
Quanto aos frutos que tenham sido pedidos, ou não tenham sido pedidos, uma vez que se trata de coisa certa, a
sentença é, por lei (art. 624), título hábil para a
execução pelos frutos.

Se o que foi depositado é título de crédito ou ações de empresas, o que o depositário recebe de rendas, juros,
dividendos, ou bonificações, adere ao bem depositado. São frutos, lato senso; mesmo se se trata de prêmio ou
sorteio.

4)CoIsAs FUNGíVEIS E COISAS NÃO-FUNGÍvEIS. O depósito pode ter por objeto coisas infungiveis, ou
coisas fungiveis (Código Civil de 1916, art. 1.280), regulando-se, nesse caso, pelos princípios que regem o
mútuo (Código Civil, arts. 1.256--1.264).

5)LEGITIMAÇÃO ATIVA. Legitimidade ativa para a ação de depósito têm: (a) os depositantes; (b) os
herdeiros e sucessores; (c) os que penhoram pretensões dos depositantes ao depósito. Se divisível a coisa, o
pretendente, quanto à sua parte (Código Civil, art. 1.274). No caso de mandato ad recipienda solutione, ou de
contrato a favor de terceiro, ou terceiros, dá-se a legitimação do mandatário, ou do terceiro ou dos terceiros.

6) LEGITIMAÇÃO PASSIVA. Tem legitimação passiva para a ação do art. 901: a) O depositário, ou quem seja
processualmente legitimado, em vez dele. b) Os herdeiros e demais sucessores do depositário. A
intransmissibilidade das pretensões e ações oríundas do depósito é lenda, que se vai repetindo, com certa
aparência de chavão sábio. O que não se herda é o efeito extracivil dos atos do depositário. J. J. C. PEREIRA E
SousA (Primeiras Linhas, IV, ~ 482, nota 950) disse que somente não cabia o procedimento da captura contra o
herdeiro (naturalmente pela razão de ser fato de outrem). Bebeu-o em MAIrUEL MENDES DE CASTRO
(Practica Lusitana, 112), que ia mais longe, excluindo, contra os herdeiros e a mulher, a via executiva, citando
julgado isolado daquele tempo. SILvsrRE GOMES DE MoI~AIs (Tractatus de Executionibus, 2.~ ed., 1, 57)
repetiu a MANUEL MENDES DE CASTEO:
“iste modus executivus exigendi depositum solttm admittatur contra ipsum depositarium, non contra eius
haeredes, aut successores”. Vê-se bem que entre SILvEsTRE GOMES DE MORAIs e J. J. C. PEREIRA E
SOUsA houve diferença. Esse suspeitou da generalidade do que ousaram MANUEL MENDES DE C&s’rRo e,
antes dele, o “Senatus” lusitano. O problema técnico viu-o ULPIANO (L. 1, § 47, D., depositi vei contra, 16, 3).
Tem-se de indagar se o herdeiro ou outro sucessor conhecia a causa da posse (“ignarus depositam vel
commodatam”), para se saber se obrou com dolo, ou não. A pretensão ao valor da coisa é independente disso; o
que pode tombar é a pretensão à restituição da coisa (“non tenebitur de re”), se o herdeiro ou sucessor de boa-fé a
alienou. Portanto, a ação pode ser movida contra o herdeiro ou outro sucessor. Ele que se defenda, nas vinte e
quatro horas, provando que alienou de boa-fé, ou sofra a prisão e se defenda na contestação. o
argumento de alguns Códigos de Processo Civil anteriores a 1939, na esteira do Reg. n. 737, art. 268, terem
excluído o herdeiro ou sucessor, prova exatamente o contrário do que pretendem os que o invocam: o Código de
1939 riscou a regra. Entre os comentadores, J. M. DE CARVALHO SANTOS estava certo; sem razão, Luis
MACHADO Gtmvvu~s (Comentários, IV, 639). Bem assim havemos de entender sob o Código de 1973. c) Os
depositários por força de lei (depósito não-convencional), tais como: os hospedeiros e estalajadeiros, pelas
bagagens dos viajantes, dos hóspedes e dos fregueses (Código Civil, art. 1.284); os empresários, gerentes ou
administradores das empresas de armazéns gerais; os leiloeiros; o síndico da massa falida; o terceiro que
confessa ter dinheiro de outrem em sua mão (Código de Processo Civil, art. 672, § 1.0). As pessoas de que
falamos à nota 2) ao Capítulo II são depositários, e não pessoas equiparadas a depositários. As pessoas jurídicas
podem ser depositários (sem razão, o acórdão da antiga Corte Suprema, a 31 de março de 1937, aliás com
indevido fundamento no art. 268 do Reg. n. 737, que não mais apareceu no Código de 1939, de modo que
nenhuma pertinência teria então, nem tem hoje). Quanto ao problema da prisão, adiante, notas 7) e 8).

7)PENA DE PRISAO. A pena de prisão é, aí, tão-só meio coercitivo para se obter a execução da obrigação de
restituir o depósito. Advirta-se em que se o depositário se adianta em consignar a coisa, ou o equivalente fixado
por perito citado o depositante, não cabe pensar-se em cominação de prisão (ALEXANDRE CAETANO
GoMEs, Manual Prático, 145 e 146).

8)CONTESTAÇÃO E PRAZO PARA ELA. O prazo de cinco dias conta-se a partir do dia marcado para a
entrega da coisa ou requerimento da consignação.

9)RÉU QUE CONTESTA E PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO. Sc correu o prazo e o réu apresenta a


contestação, estabelece-se o contraditório, prosseguindo-se com o rito ordinário. Se não contestou, cumpre
distinguir: ou (a) a consignação foi feita a requerimento do autor, por não satisfazer o estado da coisa, ou não ser
a que se depositou; ou (b) foi a requerimento do réu. Nos casos (a), as alegações do autor, ao requerer o depósito,
têm os efeitos do art. 319; nos casos (b), cabe ao juiz ordenar que se entregue a coisa ao autor, ou que se lhe
entregue o equivalente depositado (se exato), ou, se foi depositado o equivalente inexato e o autor prefere a coisa,
que se expeÇa se for pedido o mandado de prisão, ou o de busca e apreensão, ad instar dos arts. 904, parágrafo
único, e 905.

10)ENTREGA, NÃO-ENTREGA E PRISÃO. A pena de prisão é a cominação usual da ação de depósito, que
tem o depositante contra o depositário. Não poderia o autor substitui-la pelo pedido de condenação à entrega,
com aplicação final do art. 625 (imissão na posse). Ainda quando pareça prudente não requerer a prisão, por
haver dúvida quanto à legitimação passiva. Se o depositário é pessoa jurídica, a pena há de ser cominada a quem
for o presentante dela em juízo. Trata-se de efeito de pretensão civil, e não criminal; de modo que o argumento
da “personalidade~~ não cabe. O principio de que a pena não passa da pessoa do delinqúente é de direito penal, e
não de direito civil; e o próprio direito penal não isenta os herdeiros de responder dentro das forças da herança.

11)VALOR DA COISA. O autor, estimando a coisa, fixa-


-lhe o valor para o caso de não poder ser-lhe restituida. Só haverá liquidação final de perdas e danos, quando,
tendo o réu depositado o equivalente, ou restituir a coisa, ao passar em julgado a sentença, e existirem perdas e
danos (art. 624). O valor estimativo, prévio, do art. 902 nada tem com o valor
posteriormente estimado segundo o art. 624. O art. 624 é aplicável, na execução. No mesmo sentido, citando o
que escrevêramos, o Tribunal Regional do Trabalho da 1Y~ Região, a 25 de agosto de 1960, (D. da J. de 1.0 de
setembro).

12)DOCUMENTO NECESSARIO À PROPOSITURA. A escrita é de exigir-se ad probationem para o contrato


(Código Civil, art. 1.281); mas o instrumento, contrato particular, ficha, cartão, recibo de depósito, etc., dito
“prova literal do depósito” (art. 902), é necessário ao exercício da ação. Não sendo ele pressuposto da pretensão,
a ação pode ser exercida com o rito ordinário. A afirmação do autor é confessável pelo réu (com razão,
TEIXEIRA DE FREITAS, Consolidação das Leis Civis, art. 430, nota 1), e CLóvís BEVILÁQUA, Código Civil
Comentado, V, 20; sem razão, JoÃo MONTEIRO, Direito das Ações, 175, nota). O escrito não é de modo
nenhum sujeito a formalidades; não é, necessariamente, o contrato “assinado” do art. 135 do Código Civil. No
próprio direito civil, não se poderia exigir a forma do art. 135, tratando-se de casos do art. 1.284 do Código Civil.
No direito comercial, menos ainda. A questão da forma tem de ser examinada em cada espécie. Mas está assente
que a certidão do registro do documento particular de depósito (sem firmas reconhecidas, deixou de explicar a ~
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 4 de março de 1942, R. dos T., 136, 621) não basta.
13)APARIÇÃO E DESAPARIÇÃO DA COISA. Não há alternativa da pretensão a favor do devedor. Há
alternativa na primeira fase do processo. Se a coisa pode ser restituida, isto é, se está com o depositário, ou é
depositada para que esse conteste, ou é depositado o equivalente em dinheiro, seguindo-se a contestação. Se o
réu deposita dinheiro e não contesta, alegando a impossibilidade de restituir a coisa in natura, é condenado à
restituição. Não se interprete o art. 902, 1, como permissivo de aquisição da coisa. Não é verdade que se
dê alternativa do pedido, ou da pretensão. O depósito do art. 902, 1, é que é alternativo, a favor do réu; não o do
art. 904, que se refere à pretensão (certa, a Corte Suprema, a 6 de dezembro de 1934, R. F., 66, 577). Cabe ao réu
o ônus da alegação e da prova da impossibilidade de restituir (cf. C>TTO WARNEYER, Komment ar, 1, 1121).

A aparição da coisa cria obrigação de restituir. A desaparição cria a de comunicar e depositar o equivalente.

14)DEPOsITÁRIO . O depositário judicial é figurante jurídico, não há dúvida. Dizer-se que é auxiliar de justiça
é elidir-se a questão. Não obsta que seja “serventuário de justiça”, ou “funcionário”. De qualquer modo, há
negócio jurídico de direito público. A ação contra ele é a dos arts. 901-906, salvo se, “funcionário público”, se
lei de direito administrativo a preexclul. Não se diga que tais regras jurídicas só se referem ao depósito de coisas
móveis, infungíveis; nem está isso nos arts. 901-906, nem a lei processual tem de ser a sombra da lei civil: tem
de dar procedimento às pretensões de restituição de depósito, quaisquer que existam. (A 2.R Câmara do Tribunal
de Apelação de São Paulo, a 19 de agosto de 1941, R. dos T., 133, 525, excluia a ação dos arts. 901-906 contra o
depositário judicial, mas é preciso atender-se ao que dissemos acima, em letra grifa. Para que o Estado preexclua
a ação, é preciso que se responsabilize, diretamente, pelo depósito.) Adiante, nota 3) ao art. 903.

15) VALOR EQUIVALENTE. Ou o equivalente está explícito no titulo mesmo (Código Civil, arts. 1.534 e
1.535) e é o valor “equivalente” a que se refere o Código; ou foi estimado, na inicial, pelo autor, entendendo-se
que há de ser razoável a estimação. Se o réu foi condenado, ou se expede mandado de busca e apreensão, ou se
levanta o depósito, cabendo alternativa a favor do autor. O valor da perda já está, ex hypothesi, fixado.
16)ALEGAÇÕEs DO REU. Entre outras alegações do réu, tais como o depósito ter sido em garantia que ainda
persiste, razão de ainda não poder ser exigida a entrega, tem ele a alegabilidade de não existir o depósito, como
acontece se é falso o título, ou de ser nulo o título ou mesmo ser anulável (feito por erro ou ignorância, dolo,
coação, simulação (terceiros têm a alegabilidade, em embargos de terceiro, de anulabilidade por fraude contra
credores). Qualquer causa de extinção da obrigação do depositário é alegável (e. g., pode ele, mediante recibo
quitativo, ter pago o equivalente do depósito).

17)AuTo DE ENTREGA E SOLUÇÃO DA DIVIDA. O auto de entrega é solução da divida, em direito


material, e negócio jurídico processual, que extingue, de regra, a relação jurídica processual, tal como a transação
e a desistência. O auto tem de ser assinado pelo juiz, porém ~,há de ser homologado para valer como sentença,
isto é, para ter a eficácia processual a que acima nos referimos? A questão tem toda a pertinência porque as
relações jurídicas processuais precisam terminar. determina com o auto, que é assinado pelo juiz?
GOu é de mister a homologação? Praticamente, produzidos os efeitos de direito material, é vulgar que se
desinteressem as partes. Para o juiz, sabe ele que a desistência prescinde de auto e de homologação (art. 158 e
parágrafo único); a transação depende de auto e de homologação, ou, se feita extrajudicialmente, por escritura
pública, de homologação (art. 269, III); a entrega do depósito, de auto, e, para a cessação da relação jurídica
processual, de homologação.

Art. 903. Se o réu Contestar 1)2) a ação, observar-se-á o procedimento ordinário 3)~

1)AuTos DE ENTREGA OU CONTESTAÇÃO. Ou o réu entrega a coisa e não vai contestar, devendo lavrar-se
o auto;ou a entrega ao juízo, requerendo para que se deposite, pois que vai contestar; ou requer o depósito
somente para haver as despesas e prejuizos de que fala, por exemplo, o Código Civil, arts. 1.278 e 1.279. Se o
réu oferece o equivalente, ou o autor o aceita, ou não aceita. Se o aceita, lavra-se o auto como se lavraria se o réu
tivesse entregue a própria coisa, solvida ficando a dívida de depósito. Se o autor não o aceita (e. g., Código Civil,
arts. 1.266, 1.267), tem de requerer o depósito judicial, impugnando o oferecimento. JORGE AMERICANO
(Comentários, II, 217) adotava a solução de ser a impugnação no tríduo, ad instar do artigo 294, IV, do Código
de 1939, relativo a prazo em se tratando de nulidades insanáveis ou sanáveis; Luis MACHADO GUIMARÃES
(Comentários, IV, 655) preferia que o autor recebesse a coisa e promovesse a vistoria ad perpetuam rei
memoriam para instruir a ação de indenização, ficando a coisa conservada em depósito. Nem uma nem outra
solução era do Código. Entrega sô se dá se o autor se satisfaz. Se não se satisfaz, o réu ou oferece o equivalente
dos danos, e o autor aceita; ou não oferece, ou o autor não aceita o que ele oferece, e a coisa tem de ser avaliada e
depositada (ou o seu equivalente, fixado na petição inicial), discutindo-se o assunto de acordo com o art. 903. O
que dissemos sobre dano vale para o caso de alegar o autor não-
-identidade da coisa oferecida.

2)EXCEÇÃO DE INCOIVIPETENCIA OU DE SUSPEIÇÃO. Se o réu tiver exceção de incompetência,


impedimento ou suspeição, ~,tem de depositar a coisa, ou o equivalente, para apresentá-la? A solução é a
suspensão da aplicação da cominação da prisão até que se decida quanto à exceção, de acordo com os arts. 112 e
265, III, mesmo porque tais exceções suspendem o processo e, pois, aquela aplicação. Quanto à exceção da
impropriedade da forma processual, aí ligada à pretensão, se, de inre condendo, estimaríamos vê-la com efeito
suspensivo,. devido à violência da cominação, de iure condito só se aprecia como matéria de contestação.

3)DEFESA, SOBRE O QUE PODE VERSAR. A defesa tem de versar sobre a não-existência da pretensão do
autor, ou sobre a impossibilidade física ou jurídica da restituição, ou sobre direito do réu a ficar com a coisa.
Não-existência da pretensão do autor ou da ação, ainda que continue a pretensão (depósito de objeto ganho em
jogo ao réu pelo autor). Impossibilidade física: perda, ou deterioração (e. g., morte do animal depositado), sem
culpa do depositário (Código Civil, arts. 1.277 e 1.274); ou furto, ou roubo, devidamente provado.
Impossibilidade jurídica: penhora ou embargo da coisa, tendo sido notificado disso o depositário (Código Civil,
art. 1.268); depósito judicial da coisa, no caso do art. 1.270 do Código Civil; desapropriação da coisa; ter-se já
substituído a coisa (Código Civil, art. 1.271). Exceção do depositário: compensaÇão, quando fundada noutro
depósito também de coisas fungíveis, ou de títulos de crédito, ou “irregular”, suspeita de furto ou roubo (Código
Civil, arts. 1.268, 1.273 e 1.280); condição da entrega pelo depositário judicial, pagamento do valor das despesas
provadas e líquidas feitas com a coisa ou dos prejuízos que do depósito provierem (Código Civil, arts. 1.278 e
1.279). O depositário convencional é nomeado depositário judicial, podendo excepcionar à restituição da coisa,
segundo o princípio de que o depositário judicial só atende ao juiz que mandou depositar (MANUEL ALVARES
PEGAS, Commentaria ad Ordinationes, III, 567; ALEXANDRE CAETANO GoMES, Manual Prático, 144).
Aliás, o depositário convencional, que sofre a penhora, arresto ou seqi.iestro, deve dar ciência disso ao
depositante convencional (“per notificationem, vel aliam quamlibet diligentiam”, explicou MANUEL ALvARES
PÉGAS, Resolutiones Forenses, V, 439, que o tirou dos glosa-dores, entre eles GREGÓRIO LÓPEZ).

Se o depositário suspeita que a coisa fora roubada ou {art~da deve recolhê-la ao depósito público (Código Civil,
arts. 1.268 e 1.270; Código de Processo Civil, arts. 898, sobre ignorância ou dúvida), a favor daquele a quem
pertencer, ou de quem seja o dono ou possuidor conhecido. Se foi citado na ação de depósito (arts. 901 e 902),
deve entregá-la, com a explicação do que sabe, devendo pedir que se notifique, pessoalmente ou por edital,
conforme o caso, o terceiro, que passa a ser interveniente litisconsorcial na ação que não deixa de ser de
depósito, pois o depositário continua como réu, a despeito de ter o terceiro ônus da prova da propriedade ou
posse. O depositário tem de provar a “suspeita”. Se não a prova, pode ter de responder em ação de má-fé. Quanto
à compensação em quaisquer casos, seria absurdo do Código Civil; ainda se houve culpa do depositante autor
quanto ao primeiro depósito, é difícil justificar-se a regra jurídica fora da interpretação que lhe demos.
Pode dar-se que o réu alegue ter domínio sobre a coisa, O que era freqúentíssímo já ao tempo de AGOSTINHO
BanBosA e de PEDRO Ru~osA (século XVII), como se alguém emprestou bens para outrem nomeá-los à
penhora, ficando o dono como depositário judicial (ALEXANDRE CAETANO GoMEs, Manual Prático, 145).

No Código de 1939, art. 192, III, vedava-se a reconvenção nas ações de depósito. O Código de 1973 retirou-o; e
não se pode invocar o art. 275, II, a), que fez as causas que versam sobre a posse ou domínio de coisas móveis ou
de semoventes, sujeitas ao procedimento sumaríssimo, e o art. 315, § 2.0, que não permite a reconvenção nas
causas de processo sumaríssimo. A ação de depósito (arts. 901-906) tem processo especial, e não sumaríssimo.

Art. 904. Julgada procedente a ação, ordenará o juiz a expedição de mandado para a entrega, em vinte e quatro
(24) horas, da coisa ou do equivalente em dinheiro 1) 4)~ Parágrafo único. Não sendo Cumprido o mandado, o
juiz decretará a prisão do depositário infiel 2) 3)
1)RÉU QUE NÃO ENTREGA, OU NÃO CONSIGNA A COISA DEPOSITADA OU O EQUIVALENTE. O
réu, ou entrega a coisa e o depositante a recebe; ou entrega o equivalente, recebendo-o o depositante; ou oferece
o equivalente e o depositante exige a coisa, devendo o réu requerer o depósito judicial; ou restitui a coisa, mas
tem de ser depositada por haver o autor alegado danos, ou não-identidade; ou não restitui a coisa, nem oferece o
equivalente. No último caso, é que se aplica o art. 904, parágrafo único. Nele, distingue-se da entrega, que, com
a homologação, extingue o processo e a lide, a consignação, que é o depósito judicial. Aliás, consignação pode
estar, ai, em sentido próprio, como modo de solução das obrigações, e. g., se o depositário oferece a coisa e o
depositante a recusa por estar danificada, ou não ser a mesma que depositara. A consignação é para a discussão,
exatamente como se passaria no caso das outras consignações; apenas, aqui, não é“voluntária”.
(O Código de 1973 não fala da entrega da coisa ou do depósito suficiente, com o recebimento em termo, mas
havemos de entender que se lavre o termo e que o juiz homologue o ato processual.)

2) PENA DE PRISÃO. A lei processual, hoje como antes de 1974, faz a cominação da pena de prisão elemento
da petição inicial. No Código de 1939, art. 367, dizia-se que “o autor na petição inicial, instruída com o
documento de depósito, requererá a citação do réu para entregar, no prazo”, que então era de quarenta e oito
horas, “sob pena de prisão, o objeto depositado ou seu equivalente em dinheiro, declarado no título ou estimado
pelo autor”. Mas, no art. 369, ainda exigia o requerimento do autor para a prisão do depositário ínfiel (“mandado
de prisão contra o depositário infiel se o autor o requerer”). Ali, a cominação da pena era assunto da petição;
aqui, a aplicação dependia de requerimento. No Código de 1973, o art. 902 fala da instrução da petição inicial e
diz que se há de pedir a citação do réu e quais os seus fitos. No art. 902, § 1.0, permitiu que da petição inicial
conste a cominação da pena de prisão até um ano, se não cumprido o mandado. Uma vez julgada procedente a
ação para a entrega da coisa ou do equivalente em dinheiro, em vinte e quatro horas, o juiz decreta prisão (art.
904). Essa decretação depende, portanto, de ter o autor inserido na petição a cominação da pena. Não mais tal
pedido é elemento essencial da petição inicial. Se na petição inicial não foi feito, o juiz não pode decretar a
prisão. Isso não afasta a responsabilidade penal, mediante a ação adequada.

3)BUSCA E APREENSÃO. Se o depósito em dinheiro foi insuficiente e mesmo se houve prisão do réu, o art.
905 permite que se promova a busca e apreensão. Trata-se de novidade, em parte, diante do que antes se
estabelecia no Código de 1939. A despeito da omissão do Código anterior, era o que já sustentávamos nos
Comentários de então (Tomo V, 427).

4)DESPESAS E PREJUIzOS . Se as despesas ou prejuízos, a cujo ressarcimento tem direito o depositário, não
estiverem provados suficientemente, ou forem ilíquidos, pode o depositário exigir caução idônea do depositante,
ou, na falta dessa, remoção da coisa para o depósito público, até que se liquidem (Código Civil, art. 1.279). Se
estão provados e líquidos, pode opor o direito de retenção, nos termos do Código Civil, art. 1.278. Aliás, é de
“depósito com condição à entrega” que se trata. O depositário, depositando, perde a posse imediata; e a entrega
ao depositante é condicional. Tem de alegá-lo ao requerer o recolhimento da coisa ao depósito de outrem, ou em
suas mãos, e é como depositário judicial. No último caso, ainda seria de construir-se como direito de retenção; e
é a melhor construção, porque a posse de depositário convencional que cessou foi só a imediata.

Art. 905. Sem prejuízo do depósito ou da prisão do réu, é lícito ao autor promover a busca e apreensão da coisa
1) Se esta for encontrada ou entregue voluntariamente pelo réu, cessará a prisão e será devolvido o equivalente
em dinheiro 2)

1)BUSCA E APREENSAO. Já antes tivemos de falar da busca e apreensão como única solução que resta se o
autor não pedira a cominação da pena de prisão, nem o réu depositara a coisa, ou o equivalente. No art. 905, que
é novidade do Código de 1973, frisou-se acertadamente, que mesmo se houve depósito do equivalente e se
houve a prisão (“sem prejuízo do depósito ou da prisão do réu”) pode o autor requerer a busca e apreensão da
coisa.

2)EFICÁCIA DA BUSCA E APREENSAO . Se se efetua a busca e apreensão da coisa, isto é, se a coisa foi
encontrada e apreendida, ou se voluntariamente o réu a entregou, cessa a prisão, o que faz dever do juiz mandar,
imediatamente, que seja solto o réu, e há a devolução do equivalente em
dinheiro, se ocorrera.
Pode ocorrer que não se apreendam todas as coisas depositadas ou que a coisa apreendida esteja com defeito, que
tenha de ser indenizada. Pergunta-se: ,~,cessa a prisão e devolve-se o equivalente em dinheiro? Se o que
corresponderia à indenização consta de parte do que foi depositado, esse quanto não pode ser levantado, ou, se
ainda não se sabe o que seria necessário a indenizar, só após ser liquidado é que se pode pensar em levantamento.
Quanto à prisão, a cessação só seria possível se o autor concordasse, não tendo o réu depositado
o equivalente. Liquidado o quanto devido, pode-se prosseguir nos autos com a ação executiva de que trata o art.
906.

Art. 906. Quando não receber a coisa ou o equivalente em dinheiro, poderá o autor prosseguir 1) nos próprios
autos para haver o que lhe for reconhecido na sentença, observando-se o procedimento da execução por quantia
certa2).
O juiz, aí, já está na ação de execução (art. 659), diante do autor devidamente legitimado. Dá-se o mesmo se o
depositário paga o valor equivalente. Cf. arts. 709-713. Pode ocorrer adjudicação (arts. 714 e 715) e até mesmo a
constituição de usufruto de imóvel ou de empresa (arts. 716-729). O depositârio -devedor pode opor embargos do
devedor (arts. 736-744).
Se há insolvência do depositário-devedor, regem os arts.748-786.
1)PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO. No mesmo processo, que é o de ação de depósito, permite a lei que,
não tendo recebido o autor a coisa, ou seu equivalente em dinheiro, se prossiga nos autos, em ação executiva pela
quantia certa. Nada mais lhe restaria que o exercício dessa pretensão; mas o art. 906 evitou que se tivesse de
iniciar outro processo:
inicia-se nele a ação executiva de título extrajudicial, pois que fora julgada procedente a ação de depósito (art.
904). O peso de executividade passa a ser preponderante (5).

2)EXECUÇÃO PELA QUANTIA CERTA CONFORME A EQUIvALENCIA DO VALOR DA COISA. O que


se colima é a retirada de bens do credor, que perfaçam a dívida, ou pela alienação de bens do depositário-
devedor, ou pela adjudicação a favor do credor, ou mesmo pela constituição de usufruto de imóvel ou de
empresa. Os arts. 646-731 são invocáveis. O autor, que passe a ser exeqúente, tem de fazer citar-se o depositário
-devedor para, no prazo de vinte e quatro horas, pagar ou nomear bens à penhora. Pode acontecer que o
depositário devedor haja encontrado a coisa que não pudera depositar. Então, tem ele de nomear o bem para a
prestação imediata.

DA AÇÃO DE ANULAÇÃO E SUBSTITUIÇÃO


DE TÍTULOS AO PORTADOR 1)~)

1)TÍTULOS AO PORTADOR. Título ao portador é a declaração unilateral de vontade, pela qual a quem
apresente o escrito se promete a prestação. A pretensão nasce com a apresentação, porque, antes disso, existe
apenas a declara-cão de vontade ao público, ligada ao papel ou outra substáncia , que se possa transmitir de mao
a mão , brevi manu, com as duas qualidades de “instrumento de declaração” e de “coisa”. Nenhuma teoria, que
suponha o vínculo direto entre o subscritor (ou o emissor) e o onus ex publicO, pode servir à solução das
dificuldades imensas, que surgem, desde a assinatura do titulo até a sua apresentação, ou da reentrada em
circulação e nova apresentação ao subscritor (ou emissor). O assunto pertence ao direito material, e dele tratamos
no livro Dos TítuloS ao Portador, em 1921, e, depois, no Tratado de Direito Privado, Tornos XXXII e XXXIII.
Segundo o método deste livro, temos de circunscrever os comentários ao texto, sem sairmos do campo do direito
processual. As principais pretensões ligadas ao título ao portador são as seguintes: a) do subscritor, para haver o
titulo que lhe foi subtraído, portanto titulo não-emitido; b) do possuidor, para reaver o título, de que foi
injustamente desapossado (titulo perdido ou furtado, em senso lato); c) do que foi injustamente desapossado do
título, para substituição d) do possuidor~ para,mediante a apresentação e em conseqúência dela, ser-lhe entregue
a prestação prometida; e) do possuidor, para que,, apresentado o titulo, lhe sejam entregues os outros títulos, ou o
outro título, em caso de substituição cartular, ou desse e de títulos-filhos, em virtude de bonificação, ou sorteio;
1)do possuidor, em caso de destruição parcial do título, para a substituição. O Código de Processo Civil trata da
ação que corresponde à pretensão c), da ação correspondente à pretensão b), e da pretensão f), que se PÔS no art.
912. Não trata das outras, exceto, quanto a alguns deles, no processo executivo de títulos extrajudiciais, quando
haja a cláusula ao portador, ou endosso ao portador, ou em branco. A pretensão a que se não pague a importância
do capital ou seu interesse (Código Civil, art. 1.509) entra no caso da letra e):
é conexa à pretensão à substituição da cártula.

2)AçÃo DE RECUPERAÇAO (SUBSTITUIÇÃO) DO TTULO AO PORTADOR. A ação de substituição do


título ao portador, disciplinada nos arts. 907, II 912, é ação constitutiva, que, se o réu contesta, dizendo que o
titulo está com ele, há transformação em ação condenatória. A diferença é assaz importante, na prática, porque
não há com a contestação, novo elemento condenatório que se some ao inicial, constitutivo. Há, no sentido
preciso, transformação: a ação deixa de ser constitutiva para ser, pela preponderância eficacial, de condenação;
não há mais o propósito de se constituírem novos títulos, mas apenas o de se apurar se o réu tem razão, ou não
tem razão. Se não tem, os títulos são restituidos ao autor. No caso de só se alegar estarem com o réu alguns
títulos ou algum, a transformação da ação constitutiva em ação de condenação é parcial, prevalecendo, para os
demais títulos ou título, a constitutividade da ação. A sentença, no caso de não haver detentor que apresente
contestação acompanhada de título reclamado, é constitutiva, de eficácia erga omnes, ao passo que, se houve tal
contestação, a sua eficácia é a da sentença de condenação. (Atenda-se ao efeito de coisa julgada material contra
o responsável pelo desapossamento, ainda nos casos de não ter comparecido, se houve citação edital.) A
constituição é só instrumento. A ação é constitutiva, mas, com a contestação, se transforma em ação
condenatória. A eficácia preponderante, que seria de constituiçao, passa a ser de condenação. Ou se restituem ao
autor os títulos ao portador ou o título ao portador, ou, urna vez que não houve apresentação verídica do título ou
dos títulos ao portador, se constituem em cártulas.
São pressupostos para a ação de recuperação de títulos ao portador: a) ter sido o autor possuidor dos títulos ao
portador; b) ter sido injusto o desapossamento. Portanto, tem de alegar e provar que foi o possuidor, dando, para
a fundamentação, todos os dados necessários para a indicação da cártula ou das cártulas. A posse, que o autor
tem de provar, é a última posse, isto é, a posse que foi retirada sine iusta causa. O que se pede é apenas que se
impeça o pagamento de capital e dos rendimentos e que se substituan. os títulos, uma vez que se citem o tenedor
e os terceiros interessados, e aquele não entregue, ou esses não entreguem os titulos ao portador, de que
desapossaram o autor.
O elemento básico, para que caiba e se julgue procedente a ação, é a alegação da posse pelo autor, com a prova
suficiente.
Antes da sentença final, trânsita em julgado, não pode haver substituição de títulos ao portador, com fundamento
em injusto desapossamento. Nenhuma providência para a substituição pode tomar o juiz, pendente a lide.

3)CONHECIMENTO DE TRANSPORTE POR TERRA, ÁGUA E AR.


Á retirada das mercadorias por extravio ou destruição dos conhecimentos de transporte não se referem os arts.
907-913. Devido à curta vida do conhecimento de transporte, mais importa a retirada das mercadorias do que a
substituição do título representativo. Amortiza-se, sem se substituir; implicitamente se amortiza, porque também
aí se atende à legitimação do autor. Todavia, pode dar-se que se tenha de amortizar e substituir o titulo
extraviado, ou de se substituir o titulo destruído. São duas espécies distintas, que merecem trato separado:
(a)Retirada das mercadorias sem substituição do título.
O conhecimento de transporte é título representativo de mercadorias que foram entregues para transporte, e hão
de ser entregues mediante a apresentação e recepção dele. Com a entrega das mercadorias e do conhecimento de
transporte, cessam toda representatividade e a posse imediata, que se achava com a empresa de transportes, ou
com o transportador, e passa a quem lhe entregou o conhecimento de transporte. É indiferente se a empresa de
transportes faz por si mesma a transportação, ou incumbe outra de a levar a cabo:
O título é representativo das mercadorias, ainda que a empresa de transportes mediatize a sua posse, confiando a
ou~ ra empresa a viagem. As relações jurídicas e possessórias que se estabelecem entre o transportador e a
empresa de transportes, ainda que tal mediatização da posse seja acidental (e. g., o veículo da transportadora teve
de parar na estrada), são indiferentes às relações jurídicas e possessórias entre o remetente e o subscritor e
emissor do conhecimento de transporte. Trata-se de título representativo. O domínio e os direitos reais limitados
transferem-se com a transferência do domínio ou dos direitos reais limitados sobre o titulo. Não há pensar-se em
títulos de crédito, a despeito dos erros de alguns juristas, brasileiros e estrangeiros. O titular do direito de
domínio, de usufruto, ou de penhor sobre o conhecimento de transporte tem as ações dominicais, as do
usufrutuário, as de titular de direito de penhor e as possessórias.
As empresas de estradas de ferro são tratadas como transportadoras, e não como empresas de transportes. Os
“conhecimentos” ou “despachos” ou “notas de embarque”, que emitem, inclusive as notas de bagagem, não são
conhecimentos de transporte para os efeitos do Decreto n. 19.473, de 10 de dezembro de 1930, em virtude do art.
10 do mesmo decreto. Todavia, se essas empresas podem assumir e assumem a função de empresas de
transportes, o que é plus em relação à sua qualificação comum, os seus deveres e os seus direitos passam a ser os
de legislação especial sobre empresas de transportes, no sentido do Decreto n. 19.473, de 10 de dezembro de
1930. O conhecimento de transporte é título representativo abstrato. Não importa que nele se aluda à causa, que
foi o transporte: a causa concerne ao negócio jurídico subjacente, não ao título (cf. LORENZ BRúTT, Die
abstrakte Forderung, 281). Em povos que recentemente tiveram a abstração dos próprios títulos cambiários,
povos cuja mentalidade resistiu, por muito tempo, a essa técnica, que revela o grau de evolução da cultura e da
técnica, compreende-se que ainda se tenham como causais os títulos da natureza dos conhecimentos de
transporte. O que não consta do título, nem se entende, por lei, constar, não é oponível ao endossatário de boa-fé,
ainda que se trate de endossatário pignoratício. A circulação do conhecimento de transporte pode set’ ao
portador, ou por endosso. A cláusula ao portador tem de ser inserta no contexto do título. Se nominativo o título,
entende-se, na falta da cláusula à ordem, que está implícita, de modo que circula por endosso. O endosso em
branco permite a posterior circulação ao portador, até que alguém endosse em preto. Lê-se no art. 9•O do
Decreto n. 19.473: “Em caso de perda, ou extravio, do conhecimento, qualquer interessado pode avisar a empresa
de transporte no lugar do destino, para que retenha a respectiva mercadoria”. O aviso de que se trata é
comunicação de conhecimento (cf. Tratado de Direito Privado, Tornos 1, §§ 8,1, 26, 1, e 44, 4, e II, ~ 233-237).
Qualquer interessado pode avisar; mas o aviso, feito pelo remetente, ou pelo destinatário, tem importância maior
para a atitude da empresa de transporte. Se endossável o titulo, ou se ao portador tem-se como dono o
endossatário, ou quem no momento o possui, de modo que o aviso pela pessoa que se diz endossatário, ou
portador é aviso por pessoa que se diz dono. O remetente e o destinatário têm maiores razões para serem cridos.
Daí a diferença de tratamento, na técnica legislativa. Principalmente porque, no sistema jurídico brasileiro, antes
do endosso, o remetente e o destinatário, se o conhecimento de transporte foi concebido à ordem, com o nome do
destinatário, o que mais importa é a posse do conhecimento de transporte: o destinatário sem o conhecimento de
transporte, ainda não tem a posse do conhecimento de transporte, nem, portanto, a das mercadorias; o remetente,
se fez tradição do conhecimento ao destinatário, perdeu a posse que tinha.

Estabelece o art. 9•O, § 1.0, do Decreto n. 19.473: “Se o aviso provier do consignatário, ou do remetente, a
empresa anunciará o fato três vezes consecutivas, à custa do comunicante, pela imprensa do lugar do destino, se
houver; se não, pelo da Capital do Estado, ou da localidade mais próxima que a tenha. Não havendo reclamação
relativa à propriedade, ou penhor, do conhecimento durante os dias do anúncio e mais os dois imediatos, a
mercadoria será entregue ao notificante de acordo com as disposições legais ou regulamentares. Se o aviso
provier de outrem, que não o consignatário, ou o remetente, valerá como reclamação contra a entrega da
mercadoria, para ser judicialmente processada na forma do § 2.0, a seguir”. O comunicante presta o que é
indispensável às despesas, ou de acordo com a empresa de transportes, promete, ou promete e dá caução de as
prestar. Estatui o art. 9•o, § 2.0, do Decreto n. 19.473: “Havendo reclamação, a mercadoria não será entregue e o
reclamante, exibindo outra via ou certidão do conhecimento, fará, no foro da comarca do lugar do destino,
justificação do fato e do seu direito, com intimação do órgáo do Ministério Público, publicando-se em seguida
editais como determina o § 1.0 deste artigo, e afixando-se como de costume. Onde houver Bolsa de Mercadorias
e Câmara Sindical de Corretores, f ar-
-se-ão público pregão e aviso a quem interessar possa. Fiudo o prazo, aguardar-se-ão mais quarenta e oito horas.
Se não aparecer oposição, o juiz proferirá sentença, nas subseqúentes quarenta e oito horas e, uma vez passado o
prazo para o agravo (§ 5.0), poderá ordenar a expedição de mandado de entrega da mercadoria ao reclamante”. A
reclamação ou oposição a que se refere o art. 9•0, § 2.0, pode ser feita com a exibição do original do
conhecimento de transporte, que legitima o exibente e tem o efeito de que fala o art. 9.<’, § 6.~>. Se o foi com
outra via ou certidão do conhecimento, dá-se a incidência do art. 9~O, § 2.~. Resta a espécie em que o
reclamanto não tem o original, nem via, nem certidão. Então, desapossado também foi, e tem de propor a sua
ação. Lê-se no art. 9~O, § 3•0, do Decreto n. 19.473: “Havendo oposição, o juiz marcará o prazo de cinco dias
para prova, arrazoando as partes, afinal, no prazo de dois dias cada uma. Conclusos os autos, o juiz proferirá
sentença em cinco dias”. Está no art. 9~0, § 4~0, do Decreto n. 19.473: “Todos os prazos judiciais correrão em
cartório, independentemente de assinação em audiência
Estabelece o art. 9•0, § 6.0, do Decreto n. 19.473: “A exibição do conhecimento original suspenderá as
diligências judiciais e extrajudiciais prescritas pelo presente artigo, continuando o título a produzir plenamente os
efeitos que lhe são próprios”. A exibição do conhecimento original, que se disse ter sido perdido ou extraviado,
tem como conseqúência a suspensão do procedimento. Ou o exibente mostra o seu direito à posse do título ou
outro processo se instaura contra o esbulhador, ou o falsificador do endosso. As medidas constritivas terão de ser
noutro processo. O procedimento cessará definitivamente com a sentença.

Se o conhecimento de transporte foi emitido nominativamente, não à ordem, “em caso de perda, destruição, furto
ou roubo”, “a entrega da respectiva mercadoria se fará ao destinatário por segunda via, ou certificado do
despacho, de acordo com os regulamentos em vigor”. Se a empresa de transportes tem aviso de cessão ou penhor
do conhecimento, tem de depositar a mercadoria por conta e risco da pessoa a quem pertencer (Decreto n.
20.454, de 29 de setembro de 1931, art. 2.0, 1.a e 2.~ alíneas).

Estatui o art. 9•O, § 7~O, do Decreto n. 19.473: “As mercadorias de valor até mil cruzeiros poderão ser retiradas,
independentemente do conhecimento, mediante as cautelas instituidas nas leis ou regulamentos em vigor. A
estimativa desse valor, não tendo sido feita na ocasião do despacho, competirá ao prudente arbítrio da empresa de
transportes no momento da entrega da mercadoria. As mercadorias de valor superior a mil cruzeiros, que forem
nominalmente consignadas a qualquer repartição federal, estadual ou municipal, poderão ser entregues, no
destino, independente do resgate do respectivo conhecimento original se a repartição consignatária oficialmente
o pedir à empresa transportadora, por escrito, e der a esta recibo idôneo passado em forma regular” (Decreto-lei
n. 4.938, de 9 de novembro de 1942, art. 1.0).

Lê-se no art. 9~O, § 8.0, do Decreto n. 19.473: “A empresa poderá requerer o depósito por conta de quem
pertencer a mercadoria não retirada em tempo, nos casos permitidos em lei ou regulamento, bem como no do §
2.0 deste artigo. Continuam em vigor as disposições relativas aos gêneros perigosos, nocivos ou de fácil
deterioração. Os gêneros alimenticios, destinados ao consumo imediato, poderão ser entregues ao destinatário,
em falta de conhecimento, mediante as formalidades usuais”. O art. 9•O, § 3.0, refere-se às mercadorias se houve
perda ou extravio do conhecimento de transporte <verbis “bem como no do § 2.0 deste artigo”) e aos casos cri;
que apenas o portador do conhecimento de transporte não se apresentou. Temos, pois, de considerar aqui a
primeira espécie. A segunda merece trato à parte.

(L)Está no art. 2.0 do Decreto n. 20.454: “Em caso de perda, destruição, furto ou roubo, de conhecimento de
frete não à ordem, a entrega da respectiva mercadoria se fará ao destinatário por segunda via, ou certificado do
despacho de acordo com os regulamentos em vigor. Se, entretanto, a empresa de transportes tiver aviso de
cessão, ou penhor, do conhecimento, depositará a mercadoria por conta e risco de quem pertencer”. Estabelece o
artigo único do Decreto número 21.736, de 17 de agosto de 1932: “Nos casos de perda ou extravio de
conhecimento que tenha consignação nomina!. desde que nenhuma reclamação tenha sido apresentada àempresa
de transporte, no lugar de destino, para retencão de mercadoria, o destinatário só poderá retirá-la mediante
assinatura de termo de responsabilidade.”

Estatui o artigo único, § 1.0, do Decreto n. 21.736:


“Quando a empresa julgar conveniente à sua salvaguarda, poderá, se assim o entender, exigir fiador idôneo”.
Está no artigo único, § 2.0, do Decreto n. 21.736: “Esse termo ficará sujeito ao selo do n. 23, § 1.0, tabela A, do
Decreto n. 17.353. de 10 de novembro de 1926”.

As leis especiais nada disseram sobre a ação do possuidor do título à ordem, ou ao portador, em caso de perda ou
extravio. Nem sobre a ação dos outros interessados a que, aliás, alude o art. 9•0 do Decreto n. 19.473, de 10 de
dezembro de 1930. Se ao portador, regem os arts. 907-913 do Código de Processo Civil. Se à ordem, a solução é
a de atender-se àqualidade cambiariforme do endosso e invocar-se o art. 36 da Lei n. 2.044, de 31 de dezembro
de 1908.

A necessidade de substituicão dos conhecimentos de transporte é rara. O que mais importa é a retirada,
dissemos; porém é de prever-se a hipótese da empresa de transportes Que tenha assumido a guarda durante
tempo que justifique ter-se de substituir o título.

4)DIREITO CAMBIARIO E CAMBIARIFORME. Os arts. 907--913 não se aplicam (art. 1.0) ao “extravio”
(Tratado de Direito Cambicirio, 1, 387-412; II, 199-206) de letras de câmbio, notas promissórias, cheques e
quaisquer títulos que algum texto legal sujeite à Lei n. 2.044, de 31 de dezembro de 1908. Nos dois textos, trata-
se de pretensão a recuperar o título (amortização ou anulação, nossos Dos Títulos ao Portador, 2.~ ed., II, 114-
118, 235-250; Tratado de Direito Cambiário, 2i~ ed. 408 5.; II, 268 5.; III, 308 5.; IV, 189 5.; Tratado de Direito
Privado, XXXIII, § § 3.775-3.778). Assim, o direito material e o processual da Lei n. 2.044 continuam,
conforme se passou em 1917, com o Código Civil, prevalecendo a nossa opinião (Dos Títulos ao Portador, 1.a
ed., 475), contra, por exemplo, antes, a opinião de RoDiUGO O’rÁvzo (Do Cheque, 160).
5)PERDA E FURTO DE TITULOS AO PORTADOR E AçAO vINDICATORIA DA POSSE. O Código de
1973 não incluiu no seu texto a regra jurídica sobre vindicação da posse de títulos ao portador, de modo que não
excluiu a regra jurídica do art. 342 do Código de 1939, que entendia fazer de direito processual o que era e é de
direito material e está no art. 521 do Código Civil de 1916. O art. 521 do Código Civil não foi derrogado.
Contém a pretensão de direito material. O art. 907 diz qual a via processual para a pretensão à tutela jurídica.
Também se pôs claro que o pedido das providências do art. 908 não obsta à ação de quem foi desapossado de
título ao portador. Se foi proposta a recuperatória, antes de ser contestada, é livre a desistência; depois, depende
do consentimento do réu (art. 267, § 4.0). Tem-se procurado ver nas duas ações bis in eadem re. Analise-se a
situação: (1) o portador (tenedor) do título era conhecido e foi citado, compareceu e contestou, de modo que não
houve procedimento edital somente pode contestar as afirmações do autor o ter sido esse injustanrente
desapossado, e alegar direito, ou aquisição em virtude da boa-fé, por só se permitir a vindicação possessória em
caso de furto ou perda; (2) o portador previamente conhecido comparece e não contesta, entregando ao autor o
título, o que torna inútil a continuação do processo; (3) o portador previamente conhecido comparece, não
contesta, mas entrega o titulo ao juízo, para que se apure quem tem direito, caso em que se tem de instalar o
procedimento edital (não mais simples identidade do sujeito passivo); (4) o processo começou pelos editais e
alguém, que tinha o título, não compareceu; (5) o processo começou pelos editais e alguém, que tinha o título,
compareceu, dizendo tê-lo achado ou furtado, ou isso se prova; (6) alguém, que tinha o título, compareceu,
dizendo, por exemplo, tê-lo comprado a terceira pessoa (que o guardava, como possuidor direto do autor). Só no
caso (5) a ação de amortização e substituição de titulo ao portador ob.sta à vindicação da posse, mas, ainda
assim, porque essa seria inútil. Nos demais, ou se dá diferença na legitimação passiva, ou na causa.
Permite-se a vindicação da posse nos casos de perda e furto (incluído o roubo, pois esse é o sentido de direito
civil). Coisas perdidas e, pois, títulos ao portador perdidos são os que escapam à posse imediata (direta) de
alguém, sem intenção do possuidor e sem ato de outrem (por acaso, no sentido vulgar). Se deixamos, no jardim,
uma coisa, e nos esquecemos de apanhá-la, perdemo-la. A vindicação da posse é autorizada para que o acaso não
seja reconhecido como fonte de perda da posse. Sobre questões de direito material, nossos Dos Títulos ao
Portador, 2~. ed., II, 183-192; e Tratado de Direito Privado, XXXIII, § § 3.770-3.787.
A 83 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 25 de setembro de 1951 (D. da J. de 20 de
março de 1952), disse que “a reivindicação de títulos ao portador somente pode ser exercida contra o adquirente
de má-fé, ou contra aquele em que se não presume a boa-fé, porque sabia ou devia saber que o título pertencia a
terceiros”. A generalização desabusada fere, aqui e ali, o sistema jurídico brasileiro. Não se tem, no direito civil
brasileiro, ou no próprio direito comercial brasileiro, a regra jurídica geral da aquisição da propriedade com a
simples prova de boa-fé. Os títulos cambiários e cambiariformes ao portador são tratados segundo disse o
acórdão; os outros, não (cf. Tratado de Direito Privado, XV, § 1.746).
A ação de vindicação da posse é ação de direito à posse, e não de posse. Por ela, pede o autor a restituição da
posse. Tem eficácia real, e não pode ser cumulada com a possessória da reintegração da posse (arts. 926-931).
Mas pode ser cumulada com a ação nata do próprio direito (vindicação do usufruto, do penhor, ação pessoal de
direito à restituição da coisa). O que a caracteriza é a restituição definitiva do título (O’r’ro voN GIEEXE, Die
Bedeutung des Fahrnisbesitzes, 65). Exercida pelo titular de direito pessoal, e. g., o depositário do título ao
portador, não converte o direito pessoal em real, apenas o reveste de proteção eficaz perante todos (OTTo vON
GIEEKE, Die Bedeutung des Fahrnisbesitzes, 70; CIu~L CROME, Die Juristische Natur der Miethe, Jherings
Jahrbi2cher, 37, 64 s.). A ação é vindicatória, sem se confundir com a reivindicatio, tanto que dela pode usar o
que tem direito pessoal ao título ao portador e o perde, ou se lhe é furtado (CARL CROME, System, III, 241).
Protege o direito à posse do titulo ao portador. Nela foram fundidos os conceitos de ação real e de ação pessoal,
para maior utilidade técnica e social (Dos Títulos ao Portador, 2Y~ ed., II, 195; Tratado de Direito Privado,
XXXIII,. ê~ 3.762-3.770).
O Código Civil de 1916, art. 521, submeteu as coisas furtadas e perdidas a regime diferente daquele que se refere
às coisas confiadas à posse de outrem (abuso de confiança) Essa é uma das distinções entre a ação de vindicação
da posse e a ação possessória de reintegração. Assim, não cabe a ação de vindicação da posse se o tenedor do
titulo o adquiriu de credor pignoraticio, do depositário, do mandatário, do comissário, do comodatário, do tutor,
do depositário público. Cabe, se quem alienou o título era apenas servidor da posse (criados, trabalhadores,
operários, em relação aos títulos que estão ao seu alcance). Esse é ponto da mais alta relevância na distinção
(KARL WIELAND, Kommentar, IV, 513; FRANZ LEONEARD, Vertretung beim Fahrniserwerb, 109, nosso
Dos Títu•los ao Portador, 2Y- ed., II, 170 s., onde se tem a discussão sobre o caso dos direitos de fábricas,
bibliotecários, etc.). Entram na classe dos títulos ao portador furtados os que foram subtraidos: por extorsão; com
extorsão e seqüestro da pessoa; por furto ao possuidor não-proprietário; por furto imputado ao proprietário,
quando possui o título usufrutuário, o fiduciário, o credor pignoratício; por pilhagem, etc. Não entram na classe
de títulos furtados: os que forem entregues pelo possuidor, ainda sob a influência de erro, dolo ou fraude, ou
outro defeito de vontade, exceto violência (KAIiL BINDING, Die Ungerechtigkeit des Eigentumserwerbs vom
Nichteigentumer, 18 5.); os que foram alienados pelo titular da posse derivada, conheça esse, ou não, a posse que
tem (KARL WIELAND, Kommcntar, IV, 513; nossos Dos Títulos ao Portador, 2.~ cd., II, 177 e Tratado de
Direito Privado, XXXIII, § § 3.770 e 3.784); os que foram alienados pela pessoa a quem o decujo confiou, ou
pelos herdeiros, ou pelo inventariante. São reivindicáveis os cupões separados, ainda se antes de vencidos. Se
divisíveis os títulos, continuam suscetíveis de vindicação possessória as partes, quer tenha sido anterior, quer
contemporânea, ou posterior ao furto, a separação. A ação de vindicação da posse não se estende aos casos de
abuso de confiança ou de apropriação indébita (2.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Paraná, 22 de maio
de 1945, Paraná J., 42, 67).

6) MELHOR POSSE E VINDIcAçAo . A pessoa contra quem se exerce a ação de vindicação da posse é a que
tem consigo o título ao portador, e o autor alega, contra ela, ter melhor posse. O réu pode opor: a) que o possui,
de boa-fé e justo título, há três anos, sem interrupção e pacificamente (Código Civil, art. 618); b) que o possui,
ainda sem título e independente de boa-fé, há cinco anos (Código Civil, art. 619; Lei n. 2.437, de 7 de março de
1955, ari. 1.0). O possuidor pode, para o fim de contar tempo, acrescentar à sua posse a do seu antecessor
(Código Civil, arts. 552 e 619). A posse intermédia de boa-fé não obsta à vindicação da posse (Dos Titulos ao
Portador, II, 2.~ ed., 197 5.; Tratado de Direito Privado, XXXII, § § 3.656, 5; XXXIII, § § 3.764, 2 e 3.753, 4).

7)PROVA A SER FEITA. A prova que tem de ser feita na ação de vindicação da posse, que é a ação que
corresponde à pretensão de direito material do art. 521 do Código Civil, mostra bem a natureza da ação. ~
fundada na posse, e não na propriedade. Cabe quando não se possa usar, ou não se prefira usar da ação comum
de reivindicação das coisas mó,eis (o título ao portador é uma delas). No direito brasileiro, permite-se contra o
possuidor de boa-fé (aliter, no direito alemão). Estão sujeitas à vindicação da posse as debêntures, os bilhetes de
loteria, as guias de exportação.

Art. 907. Aquele’) que tiver perdido 3) título ao portador ou dele houver sido ínjustamen’~’e desapossado 4)
poderá:
1 - reivindicá-lo da pessoa que o detiver~
II requerer-lhe a anulação e substituição por outro2).

Art. 908. No caso do número II do artigo antecedente, exporá o autor, na petição inicial 5), a quantidade,
espécie, valor nominal do título e atributos que o individualizem 6), a época e o lugar em que o adquiriu 7), as
circunstâncias em que o perdeu e quando recebeu os últimos juros e dividendos 8), reque-rendo:
1 a citação do detentor e, por edital, de terceiros interessados para contestarem o pedido 10);
II a intimação do devedor 12), para que deposite em juízo o capital, bem como juros ou dividendos vencidos ou
vincendos 11);

Iii a intimação da Bolsa de Valores,


para conhecimento de seus membros, a fim de que estes não negociem os títulos 9)•

1)PERDA E DESAPOSSAMENTO. Quem é proprietário de um título ao portador e o perde não deixa de ser
proprietário, porque o que ele perdeu foi a posse. Quem tem a posse
do título ao portador, ou apenas a tença, como acontece com o empregado ou outra pessoa que foi buscar ou
levar o título ao portador, que é de A, ou de que B é possuidor, perdeu a posse, ou, como tenedor, fez perder-se a
posse de A, dono, ou de B, que só era possuidor.

O art. 907 cogitou de duas ações: para quem perdeu o título, ou quem dele foi injustamente desapossado, que e a
ação de amortização e substituição por outro; outra, a de reivindicação ou a de vindicação da posse, para quem
foi injustamente desapossado do título, que é ação de amortizacão do título e substituição por outro. No art. 907,
II, é de lamentar-se que se haja falado de “requerer-lhe a anulação ~ substituição por outro”. Não há qualquer
elemento, na espécie, que permita aludir-se a validade, de modo que é absurdo pensar-se em “anulação”, como
seria pensar-se em “declaração de nulidade”. O que em verdade se passa é a morte da cártula (Tratado de Direito
Privado, Tomo XXXIII, § § 3.776 e 3.777).
A relação jurídica processual começa com o despacho de juiz, quer ele haja tido como justificado o pedido com a
simples petição (quantidade, espécie, valor nominal do título
•e outros atributos que o individualizem, a época e o lugar em que o adquiriu, quando recebeu os últimos juros
ou dividendos e as circunstâncias que lho tiraram) quer tenha exigido algum complemento.
A angularidade ângulo, aí, em que na parte se há alguém mais um alter, ou só alter inicia-se com a citação do
tenedor ou de todos os interessados, e do alter, por edital.
No art. 907, 1, a expressão “reivindicá-lo” foi errônea, por insuficiente. No Código Civil de 1916, art. 521, diz-se
que aquele que tiver perdido, ou a quem houver sido furtado, ceisa móvel ou título ao portador, pode reavê-los da
pessoa que os detiver, salvo a essa o direito regressivo contra quem os transferiu. Reaver está aí em vez de
“reivindicar”, de “vmdicar a posse”, de “obter substituição”. As ações são diferentes. No Código de 1973, art.
907, pr., fala-se de “perdido título ao portador”, ou ser alguém “injustamente desapossado”, de modo que o erro é
ressaltante quando, logo apús, alude a “reivindicá-lo da pessoa que o detiver”. Na verdade, o que mais acontece é
vindicação da posse, ou mesmo da tença (e. g., o demandado apenas o tem consigo porque não sabe a quem há de
entregá-lo). A reivindicação pode resultar de ter o achador ou o desapossador ter passado a outrem o título,
inclusive tê-lo feito vender em bolsa ou leilão público.
2)ENTREGA OU AMORTIZAçAO COM A SUBSTITUIçÃo DA CARTLTLA. A entrega é da posse, trate-se
de autor proprietário do título ao portador, ou de simples possuidor, caso em que a entrega de modo nenhum
converte em dono quem o não era. Se não há a tradição, o que satisfaria a decisão do juiz, tem-se de amortizar a
cártula, como se destruísse, rasgasse, se tirasse da circulação. Dicionários há que confundem o termo com o usar
fundo de amortização, fundo que consiste em quantia retida ou depositada com que se vão pagando as parcelas
de dívidas amortizáveis. Amortizar é matar, extinguir. Usou-se para o ato de dar algo a corporações de bens de
mão-morta, termo jurídico que está no Novo Dicionário crítico e etimológico da Língua Portuguesa de
FRANCIScO SeLANO CONsTÂNCIO (Paris, 1852, 4•ft ed., 677). Ou o réu, citado, entrega o título, ou
apresenta contestação acompanhada do título, e julgada procedente a ação, o juiz declara caduco o título (a
cártula), caído (“caduco”), extinto, morto. A amortização é da cártula, e não da dívida ou conteúdo positivo do
titulo (e. g., título de ação de sociedade). Falar-se de “anulação” foi erro grosseiro do Código de 1973, o que não
estava no Código de 1939, nem no Código Civil. Outro erro consistiu cm se falar de reivindicação (“reivindicá-lo
da pessoa que o detiver”): vindica-se a posse, talvez mesmo a própria tença (“detenção”), como se o empregado,
que tinha em mãos ou na gaveta o título ao portador, que era do empregador (dono ou possuidor), entra com a
ação para havê-lo de quem o detém, ou, se tal não ocorre, para que se amortize a cártula e se proceda à
substituição.

Se algum terceiro comparece com a contestação, acompanhada do titulo, fez-se parte. O juiz vai dizer de quem
éo título: do autor, ou dele. A relação jurídica é entre proprietário ou possuidor vindicante e terceiro, que está
com o título. Se o autor tem razão, a sentença é de restituição do título; se é favorável ao terceiro, fica ele com o
título. Surge uma questão: há diferença entre o texto do art. 911 do Código de 1973 (“o juiz declarará caduco o
titulo reclamado e ordenará ao devedor que lavre outro em substituição”) e o art. 341 do Código de 1939 (“o juiz
poderá, na sentença. declarar caducos os títulos, ordenando ao devedor que passe outros em substituição”).
Temos de entender que, tendo sido pedida a vindicação ou a reivindicação (art. 907, 1), ou mesmo a substituição
por outro título (art. 907, II), a contestação, que supõe acompanhada do título, a solução é a exame do juízo e não
cogente, pois no caso podem não ser necessárias a lavratura de outro titulo e a substituição. O que é de A, autor,
há de ser entregue a A, pois que E, que apresentou o título, teve sentença desfavorável. Não se devem impor ao
devedor a lavratura e a substituição se o vencedor está com. o titulo, ou pode pedi-lo ao juízo.

3)AMORTIZAÇÃO, EM CASO DE PERDA E DESTRUIÇÃO . O Código de 1939, art. 336, deixara de falar
da amortização em caso de perda e destruição do título ao portador, exatamente como ocorreu ao Código Civil
(Dos Títulos ao Portador, 2.S ed., II, 70-89) e ocorre ao Código de Processo Civil de 1973. Tinha-se de proceder
conforme o art. 6.0 da Lei n. 149-B, de 20 de julho de 1893, e o art. 1.509 do Código Civil, por analogia. O
Código de 1973, art. 907, diz: “Aquele que tiver perdido título ao portador ou dele houver sido injustamente
desapossado poderá: II requerer-lhe a anulação e substituição por outro”. Hoje, como antes, deve o autor propor
a ação de amortização, se o título não for, pelo direito material, daqueles em que, perecendo a cártula, perece o
direito; e o rito é o ordinário, com as intimações ao subscritor (ou emissor) do titulo, ao presidente da Bolsa de
Valores e citação dos interessados. Se a lei especial não tiver fixado outro prazo, a amortização e a substituição
dos títulos far-se-ão dentro do prazo que a sentença assinar.
Nos casos de desapossamento injusto, a amortização e substituição são consequentes; nos de destruição, é o
pedido mesmo, uma vez que se não pode “reaver o título”. A Lei n. 2.044, de 31 de dezembro de 1908,
encambulhou as duas pretensões e os dois processos, não sem inconvenientes (já no Direito Cambiário, 1, 389;
II, 200). O Código Civil alemão facultou a substituição de títulos perdidos, mas salvo cláusula contrária do título
(§ 799), e não falou da substituição dos títulos a que se refere o art. 907, II (Código Civil, art. 1.509). O Código
suíço das Obrigações, art. 849, também não anuiu na substituição de títulos de que a pessoa foi desapossada
injustamente, mesclando esse princípio ao outro sobre substituição em caso de perda ou destruição. Ora, o
legislador brasileiro, que acedeu na reivindicação ou na vindicação da posse do título ao portador, permitiu a
amortizabilidade e a recuperação.

4)PEssoAs INJU5TAMENTE DEsAPOSsADAS. <Que são pessoas “injustamente desapossadas”? O conceito,


de direito material, foi longamente estudado por nós ao comentarmos, há mais de meio século, o art. 1.509 do
Código Civil (Dos Títulos ao Portador, 1.a ed., 481-485; 2.~ ed., II, 234-239). A injustiça do desapossamento
tem de ser apreciada do lado de quem perdeu, injustamente, a posse, e vai intentar a ação. Trata-se de qualquer
desapossamento injusto, quer tenha havido violência, erro, dolo, quer tenha havido abuso da posse por parte de
outrem; e. g., abuso da representação. A abrangência é maior do que a do art. 521 do Código Civil.

Para legitimar-se a ação de amortização de título é preciso que o demandante alegue e prove ter tido posse (3.a
Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 30 de maio de 1944, J. do T. de A., 25, 89), ou ter
estado na guarda da posse de outrem. A ação de indenização não écumulável.

5)PRETENSÃO A NÃO SEREM PAGOS A OUTREM CAPITAL E INTERESSE. A pretensão básica é a de


não serem pagos a outrem, que acaso apresente o título, o capital e os interesses; posteriormente se não aparece
o título, ou se aparece e o tenedor contesta e perde , há a pretensão àsubstituição. A pretensão à substituição,
amortizado o título, somente nasce se esses novos pressupostos se compõem. Temos, pois, que o processo
começa por simples pedido de recuperação; ao contrário do que se passa com as ações de amortização por
destruição ou por perda.
Tal pretensão é apenas pretensão à segurança, e não a pretensão de direito material, que seja a res in iudicium
deducta. Hoje, a citação é para o depósito, desde logo.

6)PETIÇÃO INICIAL. Sobre a petição inicial, arts. 282 e 283.

7)INDIVIDUAÇÃO DO TITULO. A individuação ou caracterização do título, para que se possa identificar,


depende do modo pelo qual se concebe a sua feitura. A lei exige, em geral, três informes: quantidade, espécie,
valor nominal. Os demais, como o número, são secundários e de indicação facultativa para a petição inicial; mas
a falta do número, elemento de individuação, pode fazer caírem no vácuo as intimações do art. 908, II e III. Isso
correria a risco do autor. De lege ferenda, teria sido melhor dizer-se “e o número de ordem, se o tem”.

8)TEMPO E LUGAR DA AQUISIÇÃO E RECEBIIVIENTO DOS ULTIMOS INTERESSES. Outro requisito


é o da indicação da época e lugar em que o autor adquiriu o título e recebeu os últimos interesses (“juros ou
dividendos”). Naturalmente, se o título tem cupões de interesses, há de o autor mencionar onde os apresentou e
quando, ou se 05 passou, e quando, a outrem, e quantos restam. Porque o processo de recuperação ou de
amortização, com a conseqúente substituição, se refere assim aos títulos como aos cupões.

9)INTEREsSES. Juros, dividendos, bonificações, etc.; ou, se há cupões de interesses ou títulos-filhos a serem
entregues ao apresentante do título-mãe (bonificações, etc.), também esses.

10) NEGOCIAÇÃO D05 TITULOS. Há a intimação da Bolsa de Valores, para conhecimento, por seus
membros, do que se passa, a fim de não se negociarem os títulos e os cupões. Também essa medida é ligada a
pretensão à segurança, tal como se disse à nota 5); não é res in iudicium deducta. Se os membros da Bolsa de
Valores negociam os títulos ao portador, a respeito dos quais há ação de amortização, são responsáveis perante os
adquirentes, porque negociaram com o que não podiam negociar. Nada influi isso na relação jurídica entre o
autor da ação de amortização e o réu. O autor pediu a intimação e foi feita.

11) REU OU REUS. O réu, na demanda de reivindicação ou de vindicação da posse, é o tenedor (“detentor”,
portador); ou são réus, se é desconhecido quem detém ou se são desconhecidos os que detêm, os terceiros
interessados; não o subscritor ou emissor. Pode dar-se oposição se dois ou mais de dois interessados
comparecem, porque todos contestam e não ocorre litisconsórcio entre eles; se as suas pretensões entre si se
excluem, há unidade de autor e pluralidade de réus. O instituto da oposição, combinado com a do lítisconsórcio
passivo, é que rege a espécie.
No Código de 1939, art. 337, § 1.0, só se exigia a citação edital dos terceiros interessados, se tal foi a citação do
tenedor ou possuidor (ditos “detentor”), por ser desconhecido, incerto, ou se encontrasse em lugar não sabido e
inacessível. No Código de 1973 não há referência a ligação: o art. 908, no caso de se pedir a amortização e
substituição do título ao portador, qualquer que seja a espécie, a citação dos terceiros é por edital.
A exigência da citação edital atende dos terceiros interessados à natureza circulatória do título ao portador.
~,Como se há de construir a relação jurídica processual? Trata-se de citação de tenedor conhecido, ou de
tenedores conhecidos, ou, quanto a terceiros interessados, ou pessoas desconhecidas, de procedimento edital,
chamamento público, citatório, com efeito de perda do direito que alguma ou algumas tenham, se não
comparecem para tomar parte na relação jurídica processual. A cominação dos editais faz-se efetiva pela
sentença de amortização (caducidade, exclusão). Os que comparecem são réus; os que vêm após a contestação,
intervenientes do art. 50 e parágrafo único. Sobre o direito material, nosso Dos Títulos ao Portador, 2.a ed., vols.
1 e II; Tratado de Direito Privado, Tomo XXXIII.

12)INTIMAÇÃO DO DEVEDOR. Quem teria de prestar o que consta do título, ou que teria de ter prestado, há
de ser intimado, para saber que não deve pagar a quem lhe apresente o título. O que é devido ou foi sendo devido
há de ser depositado em juízo, porque assim se evita que tenha de, a despeito da prestação ou das prestações a
quem lhe apresentou o título ao portador, prestar ao autor, que obteve a sentença favorável. Se já houve a
amortização do título ao portador, o devedor satisfez a quem não apresentou título vivo, porque tal título foi
amortizado, morreu, não mais existe. A regra jurídica do art. 908, III, estabelece medida cautelar a favor do
próprio devedor.

Art. 909. Justificado quanto baste o alegado 1), ordenaré o juiz a citação do réu 2)3) e o cumprimento das
providências enumeradas nos números II e lii do artigo anterior 6) 7).
Paragrafo único. A citação abrangerá também terceiros interessados, para responderem a ação4) 5)•

1)JUSTIFICAÇAO INICIAL DO PEDIDO. O processo come~a pela justificação do pedido. Tal adiantamento
de cognição consiste em exame perfunctório, superficial, da situação (injusto desapossamento, perda ou
destruição do título ao portador), de modo que nenhuma providência judicial postulacional fundada nele se
justifica. O adiantamento de cognição (justificação do pedido), estranho aos processos ordinários, tem apenas o
intuito de se não deferirem a citação e as intimações, perturbando-se a circulação do título, sem certa base.
Interessado aí é qualquer pessoa que não foi citada pessoalmente, que possa ser parte na ação, ou possa ter
interesse ou vir a ter interesse em adquirir o título ao portador, ou recebê-lo em garantia, ou mesmo crer que
alguém o possui.

2)TENEDOR DESCONHECIDO OU INCERTO, LUGAR IGNORADO OU INACESSíVEL. Aqui, o


procedimento é edital, estabelecendo-se, com a citação, a relação jurídica processual em ângulo: uma linha até o
juiz, e a outra linha como a abrir em feixe de linhas por sobre todo o público. A respeito, em 1927, o nosso livro
Da Promessa de Recompensa, quanto a promessas de prêmios, concursos, anúncios, etc. Naturalmente, a
ignorância é que não pode determinar o número de linhas; na realidade, são tantas quantas as pessoas que vão ser
atingidas pela coisa julgada material da sentença de condenação e pela coisa julgada formal da sentença
constitutiva.

A contestação do que não tem o título estabelece novas hipóteses, mas a sentença continua de ser de condenação,
se apresenta o título, ou de constituição, se o não apresenta, ou outrem não o apresentou.

Para se saber se a ação e a sentença são constitutivas ou não, basta que se responda se o título não foi apresentado
a juízo, ou se o foi. Não importa o conhecer, ou não, o autor da ação quem é o “detentor”. Em todo caso, o unus
ex publico, que não compareceu e foi culpado do desapossamento, tem contra si a eficácia de coisa julgada da
sentença.

3)CITAÇÃO DO TENEDOR. Conhecido o tenedor do título, deve ser citado. Se entrega o título, lavra-se o
termo da entrega. Se não o entrega e só o apresenta para ser junto ao processo, com a sua contestação, não há
obrigatório procedimento edital; salvo se diz que “achou o título” e “não pertence ao autor”, porque, aí, a citação
do unus ex publico é necessária, e tem de ser expedido o edital. Pode também dar-se que alguém compareça e
alegue ter-lhe sido tirado, injustamente, o título, caso em que seria terceiro com legitimação de embargos de
terceiro, e não de réu, salvo se nega que o autor tenha tido posse. Pode ele, aliás, propor a ação de entrega ou de
amortização.

4)TERCEIRO QUE COMPARECEU. Ou o terceiro comparece para contestar a posse do autor, de que foi,
segundo diz, injustamente privado; ou comparece como tenedor, isto é, trazendo o título. No primeiro caso, o
tenedor é outrem, que também foi citado por edital e tem de embargar como terceiro; no segundo, a contestação
tem de ser com o título reclamado, e se não contesta, o prazo dele expirou; aguardam-se os outros terceiros, se
ainda há prazo. ~Quid luris, se, citado o que tinha o titulo, lhe foi subtraído antes de comparecer?
Tem de narrá-lo na ação, e opor, se prefere, embargos de terceiro.

5)TERCEIRO QUE SE APRESENTA SEM TITULO E TERCEIRO QUE SE APRESENTA COM O TÍTULO.
Cada terceiro que se apresenta sem ter o título, somente pode ser embargante.
O terceiro que se apresenta com o título (art. 907, 1> pode contestar, porque está diante do autor que quer
vindicação da posse ou reivindicação. (Advirta-se que, diante da petição, que há de satisfazer os pressupostos
legais que estão nos arts. 907 e 908, há o exame pelo juiz, de cognição incompleta, que leva à justificação
bastante (“justificado quanto baste o alegado”), e só após se ordena a citação do réu e dos terceiros interessados.)
O réu somente pode defender-se se a contestação é acompanhada do título reclamado.

6)TENEDOR COM O TITULO E TENEDOR SEM O TÍTULO. Se o terceiro é tenedor diga-se tenedor, porque
pode ser proprietário, ou possuidor, etc. somente lhe é admitida a contestação se a acompanha o título, como é
de se exigir a qualquer contestação nas espécies de que tratamos. Se se defende sem ter o título, e. g., se também
se diz desapossado injustamente, claro que tem de ser recebida a sua defesa como opoente, ou como embargante.
Daí não ser, sempre, ordem de substituição, nem sempre ordem de entrega, a sentença que julga improcedente a
contestação.

A falta de referência do Código vigente e do anterior à contestação por terceiro não exclui que o terceiro atue até
ser proferida a sentença na ação de recuperação (vindicação) ou na ação de amortização e substituição de título,
nem que embargue como terceiro. O opoente leva ao juízo a petição inicial (arts. 57, 282 e 283), há a distribuição
por dependência e os opostos são citados para contestar o pedido no prazo comum de quinze dias. Se o processo
principal corre à revelia, atende-se aos arts. 57, parágrafo único, 213-233. Os arts. 58-61 têm de ser observados.

7) PLURALIDADE DE OBJETO. Pode haver pluralidade do objeto, de títulos ao portador. É interessante


observar-se que pode ocorrer que se tenha de processar em apenso a contestação que verse sobre parte dos títulos
reclamados. A apensação traz sempre consigo a noção de dependência, de acessoriedade, de incidente. Aqui,
haveria apenas a facilitação processual. É possível mesmo que diferentes quantidades dos títulos apareçam e haja
tantos processos quantos os comparecentes. Não se pode, todavia, estabelecer, a priori, que haja tantas relações
jurídicas processuais quantos os processos.

Depende da ligação, negativa ou positiva, entre os comparecentes.

Art. 910. Só se admitirá a contestação’) quando acompanhada do titulo reclamado.


Parágrafo único. Recebida a contestação do réu2), observar-se-á o procedimento ordinário.

1)CONTESTAÇÂO. O art. 910 refere-se a ação do artigo 907 quando se está diante do dilema: entregar-se o
título vindícado, ou não entregar; substituir-se, ou não se substituir a coisa. Quem se diz possuidor, para evitar
que se amortize o título que ele é quem possui, tem de contestar, acompanhada do título reclamado, a
contestação. O juiz vai decidir se o autor tinha direito e pretensão à vindicação ou à amortização e à substituição,
ou se não tinha. Se tinha, desfavorável foi ao terceiro, que, com o título, se introduziu no processo e contestou,
mas a sentença é favorável ao autor. O terceiro pôs-se na situação do art. 907, 1, e não do art. 907,
II. Não é declarado caduco, morto, o título, e pois não éobrigado o devedor a que lavre e emita outra cártula. Se o
terceiro não tem consigo o título e se diz dono ou possuidor, não pode contestar: continua terceiro e tem de opor-
se ou embargar como terceiro, que é e não deixou de ser (arts. 56-61 e 1.046-1.054). Advirta-se que as espécies
do art. 1.046 são exemplificativas (verbis “em casos como”). Fora da hipótese de ter a posse imediata do titulo ao
portador, de modo que possa juntar à contestação o título reclamado, não pode contestar. A sua ação é outra. Para
contestar, na ação de substituição de título, tinha de achar-se na situação de nela poder ser parte.
O contestante, que só se refere a um dos títulos reclamados ou a alguns deles, que pôs em sua contestação, pode
não ter podido contestar quanto ao outro ou aos outros, por lhe faltar o que teria de acompanhar a contestação.
Assim, ele contesta, quanto a que corresponde ao que apresentou, e pode oferecer oposição, ou opor embargos de
terceiro. Os julgamentos são em causas diversas, mas, como pode acontecer que uma das sentenças se choque
com a outra, ou com as outras, e então é de grande relevância estar-se atento àcoisa julgada material da sentença
que foi proferida antes da outra ou das outras.

2)APRESENTAÇÂO DA CONTESTAÇAO. Quer o contestante seja o devedor, quer seja o terceiro, que foi
citado e se fez parte, devido ao edital, recebida a contestação, acompanhada do título reclamado, o processo tem
o rito ordinário. Se não há contestação, tem o juiz de proferir a sentença.

Conforme antes dissemos, havemos de entender que o contestante, que, necessariamente, fez acompanhar a sua
defesa do título reclamado, pode ser condenado à entrega, ou levantamento (se houve depósito), por ser
inadequada, no caso, a substituição do título. Ao juiz é que cabe decidir, diante das circunstâncias. Há casos em
que a lavratura e a substituição são indispensáveis, como se o titulo que acompanhou a contestação estivesse
parcialmente destruído, o que se prevê no art. 912. Se a destruição foi tal que o título podia ser reconhecido, mas
impróprio à circulação, trata-se a espécie como a de “destruição parcial”.

Art. 911. Julgada procedente 1) 2) ~ ação, o juiz declarará 6) caduco o titulo reclamado 7) e ordenará ao
devedor que lavre outro em substituição3), dentro do prazo que a sentença lhe assinar4) 5) 8)~

1) PROCEDÊNcIA DA AÇAO . Se não houve contestação,. que, hoje, depende da juntada do titulo reclamado,
julga-se amortizado o título, ou julgam-se amortizados os títulos, ordenando-se que o devedor lavre outro, ou
outros, e faça a emissão. O prazo para isso é aquele que o juiz assina.

2)IMPROcEDÊNCIA DA AÇAO. Julgada improcedente a ação, afastada ficou a possibilidade de se entregar o


título ao autor da ação, ou de se amortizar e substituir o título a favor do autor. Isso não afasta que outrem
proponha a mesma ação.

3)MORTE DO TÍTULO AO PORTADOR. O título ao portador, a cártula, de que foi desapossado, sem justa
causa, o autor, e não lhe foi restituído, morre; outro lhe vem fazer às vezes. A substituição não se confunde com
a multiplicação. (muitos exemplares do mesmo título, nosso Tratado de Direito Cambicírio, 1, 266-282; II, 69).
No fundo, a preponderância da idéia sobre a matéria, bem nítida nos peripatéticos. de Roma (Dos Títulos ao
Portador, 2.~ ed., 1, 215; II, 76 5.) e no capitalismo financeiro.

4)EFICÁCIA ~ CONSTITUTIVA, NEGATIVA OU POSITIVA, DA SENTENÇA. A sentença, de que se fala,


ou determina a entrega do título ao portador, ou amortiza e engendra novo título. Esse novo título é idêntico ao
amortizado, é o próprio título~ amortizado, com o mesmo substrato, mas com outro corpo. A amortização mata;
se alguém tinha o título e direito a tê-lo, nas mãos do terceiro esse direito morre. O que fica na mão dele é a
propriedade da cártula morta; não o direito de obrigação, não as pretensões. A propriedade e a posse nascem
quanto à outra cártula (Dos Títulos ao Portador, 1, 280). Se alguém se apresenta, alegando direito que não exclui
o do autor, ressalva-se na sentença. A pluralidade de réus, se nenhum apresenta o título, constrói-se como a de
demanda em que o mesmo autor pleiteia contra diferentes réus sem solidariedade entre esses (pluralidade
subjetiva passiva). Se são dois ou mais os réus e só com um deles estava o título junto à contestação, não
importa. A litisconsorcialidade depende da relação de direito material entre eles. O processo dos arts. 907-9 12 é
Aufgebotsverfahren, tem a peculiaridade de se exercer contra réu desconhecido (KONRAD HELLWIG,
Lehrbuch, 1, 53), ou contra tenedor e outros interessados. Se o titulo foi destruído totalmente, como se ocorreu
incêndio, tem-se como perdido, tal como aconteceria se o possuidor se achasse em navio ou avião e não o tivesse
levado consigo.
A ação de desapossamento de título ao portador para obter novo título é a ação constitutiva. Tem 5 de
constitutividade, 4 de declaratividade, 3 de executividade, 2 de mandamentalidade e 1 de condenatoriedade
(Tratado das Ações, Tomo III, 642, Tabela III). Na sentença, o juiz “ordena” que o devedor faça outro título. Não
há elemento eficacial imediato, nem, sequer, mediato. O devedor, que não atende, acarreta com as conseqúências
da sentença na ação constitutiva, com eficácia declaratória imediata e executiva mediata. Assim, a coisa julgada
material atinge-o, e contra ele se pode propor a ação executiva, uma vez que a sentença tem 3 de executividade.
Omandado do juiz (art. 911, verbis “ordenará ao devedor”) não faz mandamental, nem sequer, de condenação, a
sentença: primeiro, porque a ordem, aí, tem cumprimento dependente da vontade do devedor, sujeito passivo na
obrigação de fazer; segundo, porque não há condenação contra ele. A sentença é apenas constitutiva, constitutiva
de amortização (constituição negativa); com “declaração” da obrigação nova do subscritor. Se o subscritor não
cumpre, a ordem do juiz somente tem a eficácia imediata declarativa, e a eficácia executiva mediata, devido à
intimação do art. 908, II. O interessado pode ir contra o subscritor, com a ação para que recartule a sua
declaração unilateral de vontade, ou indenize pela falta de atendimento.
Expirado o prazo para comparecer algum interessado, pode ser que não se saiba quem é o réu ou quem são os
réus; pois pode não ter comparecido, ou não terem comparecido, e a sentença, constitutiva (ADOLF WACH,
Lehrbuch, 1, 63), vai ter eficácia de constitutividade e de coisa julgada material contra ele ou contra eles. Aliás,
também tem esse último efeito contra o subscritor (KoNRAD HELLWIG, Wesen und sub jektive Begrenzung der
Rechtslcraft, 307). Afasta-se a construção da sentença do art. 911 como só declarativa (erro de OTTO FIsCRER,
Recht unci Rechtsschutz, 13). Não se pede ao juiz que declare, mas que declare e constitua. (Mesmo nos casos
de processo de perda e destruição, como se dá com os títulos cambiários, o elemento de condenação quase
desaparece; fica apenas, ressaltante, o da constituição.)
O elemento declaratório é responsável pela eficácia de coisa julgada material contra o subscritor.

5)PRAZO DETERMINADO PELO JUIZ. Quanto ao art. 911, in .fzne (“dentro do prazo que a sentença lhe
assinar”), há algo de histórico que convém lembrar-se. No Código Civil de 1916, art. 1.509, o prazo era de três
anos. O texto primitivo do Código de Processo Civil de 1939, art. 341, diminuiu-o para três meses, mas veio o
Decreto-lei n. 4.565, de 11 de agosto de 1942, que o fez subir para sete meses. Hoje, com o Código de Processo
Civil de 1973, ao juiz é que incumbe fixar o prazo. De lege ferenda, está certo.
6)NATUREZA DA SENTENÇA. <~,Qual a natureza da sentença do art. 911? A sentença faz caducos os títulos
(e tais ações são de constituição) e ordena que o obrigado faça outras cártulas, em substituição (cf. art. 641). Não
há a executividade especial do art. 641, de modo que a sentença, no caso do art. 911, é da natureza das sentenças
constitutivas; e não de simples condenação a prestação de ato. Se, hoje, aliter, no direito anterior , sentença que
condena a prestação de declaração (obrigação de fazer) tem eficácia executiva, a do art. ~rií não é título
executivo para a ação de execução, nem produz a eficácia do art. 641. O caso foi examinado sob o art. 641. A
ação do art. 911 é ação constitutiva, com a particularidade de ser pedida, como prestação final, pela sentença
definitiva e após cognição completa, a declaração da obrigação de emitir. Em relação às vulgares obrigações de
declarar, essa não é de emitir ou de reemitir a declaração, mas de fazer nova cártula (forma) do mesmo negócio
jurídico.
Se o devedor não atende à “ordem”, pode ser usada a ação condenatória com preceito cominatório, com a
particularidade de estar completada a cognição; ou a ação executiva (arts. 632, 633, 638 e parágrafo único).
Ojuiz não pode mandar expedir novo título (cártula), sem ter sido decretada a ineficácia do anterior. Se se expede
a nova cartula, sem que sentencialmente se haja amortizado a que se alegou ter sido perdida, extraviada ou
destruída, é ineficaz a nova cártula, ainda que a haja adquirido portador de boa-fé. Responde o Estado, conforme
a Constituição.

7)TÍTULO DA DÍVIDA PÚBLICA AO PORTADOR. A 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27 de


dezembro de 1948 (R. F., 125, 470), entendia não ser aplicável à amortização de títulos da dívida pública ao
portador o processo de substituição de cártulas, regulado no Código de Processo Civil.
Sobrevelo a Lei n. 891, de 24 de outubro de 1949, art. 2.0. que estatuiu: “A recuperação dos títulos da divida
pública federal, estadual ou municipal, emitidos ao portador ou dos nominativos endossados ao portador, ou em
branco, processar-se-á de conformidade com as disposições dos arts. 336 a 342 do Decreto-lei n. 1.608, de 18 de
setembro de 1939 (Código de Processo Civil) “. O art. 1.0 do Decreto-lei n. 6.961, de 16 de outubro de 1944, foi
revogado pelo art. 1.0 da Lei n. 891. Rege, hoje, portanto, o que se estatui no Código de 1973, que substituiu o de
1939.

8)NÃo CUMPRIMENTO DA ORDEM PELO SUBSCRITOR OU EMISSOR. Se o subscritor (ou emissor) não
cumpre a ordem do juiz, ~,procede-se à execução da sentença? Sim. Mediante simples requerimento, em que
exponha o fato da recusa, ~,pode o autor obter carta de sentença em que se explicite o seu valor constitutivo,
entendendo-se que tem as propriedades do titulo ao portador, a que substituiu? Certo, basta à legitimação para
recebimento de capital e interesses, efeito constitutivo, etc.; não para a recartulação. Sobre letras de câmbio,
notas promissórias e títulos cambiariformes, nosso Tratado de Direito Cambiário, 2.~ ed., 1, 427 s.; II, 277 5.;
III, 315 s.; VI, 191. O art. 641 não tem aplicação a esses títulos, levantando questões relativas à extensão da
constitutividade da sentença. A ação de recartulação é constitutiva e dotada de forte elemento declarativo (4) e
executivo (3).
Art. 912. Ocorrendo destruição parcial 1)2), o portador, exibindo o que restar do título, pedirá a citação do
devedor para em dez (10) dias substitui-lo ou contestar a ação.

Parágrafo único. Não havendo contestação, o juiz pro ferirá desde logo a sentença; em caso contrário,
observar-se-á o procedimento ordinário 3)•
1)DESTRUIÇÃO TOTAL. A ação de amortização e substituição do título, por ter sido destruído totalmente, é
como se o titulo ao portador tivesse sido furtado ou roubado, ou perdido, porém menos o elemento subjetivo. O
público interessado tem de ser citado, porque o fato da destruição pode não ser plenamente provado (e. g., o
empregado diz que entre es objetos queimados estava o título ao portador, e na verdade ele o retirara antes, ou
mesmo errou em tê-lo como incluído na pasta queimada).
A destruição total estabelece a pretensão do portador do título contra o devedor, à diferença do que se passa com
o título perdido ou furtado (lato senso). Dá-se o mesmo com a destruição parcial. A relação jurídica é entre autor
e Estado, angularizando-se com a citação do subscritor ou emitente (devedor). Se o título foi perdido ou furtado,
a relação jurídica é entre portador (autor) e Estado, mas a angularidade cstabelece-se com a citação edital do unus
ex publico, se nenhuma pessoa comparece para contestar, com a apresentação do título. A destruição total tem a
relação jurídica processual autor-Estado e Estado ex publico e do devedor, porque, aí, é indispensável a citação
do devedor, como o é na espécie do art. 912 (destruição parcial).
É supérfluo frisar-se que, nas hipóteses de destruição parcial ou total, à contestação pelo devedor não se exige o
que consta do art. 910.

2) DESTRUIÇÃO PARCIAL. Se ocorreu destruição parcial, algo fica do título ao portador, que lhe serve para
que apresente o que resta. O Código de 1973, no art. 912, pôs fora dos arts. 907 e 908 o caso específico. Não há
citações de tenedor, nem a citação edital dos terceiros interessados para contestarem o pedido, nem a simples
intimação do devedor. o que se exige é a citação do próprio devedor, porque, diante da parte restante do título
parcialmente destruído, o devedor que tem de substitui-lo, dentro dos dez dias, ou contestar a ação. Se não
contesta, o juiz julga logo a ação: ou o devedor substitui o título, dentro do prazo, que é o mesmo para contestar,
devido a alternatividade, ou não o substitui e não contesta, caso em que tem de ser proferida a sentença contra
ele. Se contesta, há o rito ordinário.
Há casos que podem levar à incidência do art. 908: o que resta do título não satisfaz à sua individuação; alguém
propusera a ação de amortização e substituição, afirmando “a época e o lugar em que o adquiriu e as
circunstâncias em que o perdeu”. Ali, a ação a propor-se é a do art. 908, e não a do art. 912; aqui, a pessoa que
diz ter-lhe sido destruido parcialmente o título ao portador, tem de atender à citação edital, porque é terceiro
interessado e tem de contestar.

3)PROCESSO SE NAO HA CONTESTAÇÃO E PROCESSO SE lIA CONTESTAçÃO. Só se admite a


contestação se a acompanha o título reclamado. Tal acontece se houve desapossamentO, ou se o contestante, que
tem o título ao portador e o junta, alega que não houve perda, nem destruição. Se o juiz admite a contestação,
tudo se passa de acordo com o que se estatul quanto ao processo ordinário.

Art. 913. Comprado o título em bolsa ou leilão público 1) 2), o dono que pretender a restituição é obrigado a
indenizar ao adquirente o preço3) que este pagou, ressalvado o direito de reavê-lo do vendedor.

1)LEILÃO PUBLICO OU BOLSA DE VALORES. A regra jurídica foi estudada por nós ao aparecer o Código
Civil. Dissemos, então, que, em atenção ao papel que desempenha, nos mercados, o título ao portador, o art. 521
do Código Civil, embora houvesse rejeitado o princípio francês * En fait dmeubles possession vaut titre, com o
que o legislador se conservou fiel à tradição do direito brasileiro, salvaguardou (1) o direito do possuidor do
título evicto contra quem, sem ser dono e sem poder dispor, lho transferiu e (2) estatuiu (artigo 521, parágrafo
único) que, sendo o objeto comprado em leilão, feira ou mercado, é obrigado o dono, que pretender a restituição,
a prestar ao possuidor o preço por que o comprou. A regra jurídica teve os seus censores (e. g., ASTOLFO DE
REZENDE, Manual 7, 361 s.); e seus defensores (CLóvís BEVILÁQUA, Código, 3, 45 s.; largamente, nossos
Dos Títulos ao Portador, l.a ed., 199, 437 5.; 2.~ ed., 1, 271; II, 181 s.; Tratado de Direito Privado, Tomo
XXXIII). Presunção de boa-fé, segundo R. TROPLONG; razão que F. LAURENT (Princ2pes, 32, 604 5.)
reputou insuficiente, parecendo-lhe melhor a da segurança do comércio. Interesse de todos in abstracto,
sustentamos nós, o mesmo fundamento que fez vinculativa a promessa de recompensa. O art. 521, parágrafo
único, contém exceção de direito material.

2)~,HETEROTOPIA DA REGRA DE DIREITO MATERIAL?. Os comentadores do Código de 1939 (e. g.,


JORGE AMERICANO, Comentários, II, 175; LUIS MACHADO GUIMARÃES, Comentários, IV, 427)
entenderam que a regra jurídica, que estava no art. 340 e hoje está no art. 913, fora posta em lugar errado:
deveria vir depois do art. 341, hoje art. 911. Não pensamos do mesmo modo. Se o portador do título comparece
desde logo e prova que adquiriu em leilão público, ou em bolsa, a regra jurídica tem incidência, posto que o
processo continue.

Não é sempre a sentença do art. 911 do Código de 1973 o que tem de condenar, condicionando a entrega do
título ao ressarcimento do art. 913. Melhor fora, certamente, que o art 913 viesse no fim do Capítulo III; não
porque fosse o seu lugar, no Código Civil, sob o art. 521, e sim porque também a ele se refere. Mas a lei,
deslocando-o, tem o efeito benéfico de torná-lo atinente a outros casos de desapossamento do artigo 907, 1 (art.
521 do Código Civil). Aliás, o titular da pretensão do art. 913 não é sempre o único réu na ação.
3) DEPÓSITo DA QUANTIA APURADA. Antes de ser proferida a sentença, ou assinado o termo de entrega do
título, deve o autor depositar a quantia; ou a sentença tem de ser concebida condicionalmente.

CAPITULO IV

Trata-se de título ao portador que foi vendido em bolsa, ou em leilão público, e da sentença resultou a entrega ao
autor da ação, que confiava, em princípio, na Bolsa ou no leiloeiro público. É justo que o vencedor na ação
readquira o título, que foi adquirido de boa-fé na Bolsa, ou em leilão público, mediante a prestação de que o
adquirente dispôs. A Bolsa ou o leiloeiro público tem os dados sobre quem o levou à venda, de modo que essa
pessoa fica responsável perante o autor da ação de restituição do título. Mas surge um problema, uma vez que o
autor da ação, que indenizou ao adquirente o preço que pagou: ~se o vendedor alega que adquiriu de outrem e
não o fez de má-fé? Cumpre distinguir: a) se adquiriu em negócio juridico fora de Bolsa ou de leilão público,
~,que há de fazer?; b) ~,se o adquirira em Bolsa ou em leilão público? Na hipótese b), tem de proceder como a
pessoa que propusera e ganhara a ação do art. 913. Na hipótese a), a ação a ser proposta é a de indenização
(preço pago, mais correcão monetária e juros legais).

1)PRETENSAO Á PRESTAÇÃO DE CONTAS. No caso de ter alguém a pretensão à prestação de contas, quer
seja pretensão a exigi-las quer a prestá-las, conforme o direito material, há a proponibilidade das ações de que
cogitam os arts. 914--919, que esgotam a matéria. Alguns elementos cominatórios persisUram inclusive o do art.
915, § 3Y, 2Y~ parte, que é de grande relevância, e põe em grave posição o réu que desatende à condenação a
que se refere o art. 915, § 2.0, 2.~ parte.

2) CoMINAçÕES. A despeito de o Código de 1973 não ter cogitado, em separado, das ações cominatórias, elas
podem ser de direito material e, condenatórias como são, se propõem com o rito ordinário, ou estar em algumas
regras jurídicas de direito processual civil, em que elas aparecem, em iniciais, ou em situações que algum dos
figurantes pode criar durante o procedimento. Seria difícil, se não impossível, retirar-se inteiramente o elemento
cominatório que através de séculos aparece nas ações de prestação de contas.
Art. 914. A ação de prestação de contas 1) competirá a quem tiver 2):
1 o direito de exigi-las 3);
li a obrigação de prestá-las 4)~

1)AçÃo DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. A expressão “ação”, no art. 914, é a de direito processual civil, que
alude a ter alguém, no plano do direito material, o direito, a pretensão e a ação (de direito material) a exigir que
outrem contas, ou a que a outrem as preste. Teve o legislador de cogitar daquela ação, acertadamente, em
primeiro lugar, no art. 915, e dessa, no art. 916: há regras jurídicas que apanham as duas ações: arts. 917, 918 e
919.

2) SUCESSÃO. Pode haver a transmissão entre vivos ou a causa de morte, no tocante à ação para exigir
prestação de contas, como no tocante à ação para prestar contas. Pendente a “ação”, também pode ocorrer a
sucessão, mesmo se concernente à execução forçada (art. 918).

3)DIREITo DE EXIGIR PRESTAÇÃO DE CONTAS E DEVER DE PRESTÁ-LAS. - O direito de exigir


prestação de contas pode resultar de muitas situações jurídicas, como ocorre em caso de procuração, mandato,
cumprimento de comodato, de anticrese, ou de atividade de comissionário, de testamenteiro, de inventariante, ou
de falecido. O direito material rege as espécies, mesmo se se trata de função de servidor judicial, de depositário
ou de curador especial. Os arts. 914-919 esgotam o assunto, no plano processual. Por vezes, a prestação de contas
resulta de negócio jurídico. Outras vezes, não, tal como acontece com a pessoa que assiste à morte de alguém e
recolhe os valores, pecuniários ou não, que estavam ao seu alcance, ou estavam com o herdeiro ou com os
herdeiros que foram partes ou se puseram na posse dos bens. Não se pense, portanto, que só há prestação de
contas de quantias de dinheiro. Ao dever de prestar contas correspondem a obrigação de prestá-las e a posição de
réu na ação de prestação de contas.

4)DEVER DE PRESTAR CONTAS E DIREITO DE EXIGI-LAS. Conforme antes dissemos, do direito de


prestar contas fica, em frente, o dever de prestá-las. Quem tem direito a que alguém preste contas tem pretensão e
ação de prestação de contas. Quem tem dever e obrigação de prestar contas tem a ação de prestar contas, em que
é o autor, em vez de réu.

O réu, na ação de prestação de contas, se autor é quem a pode exigIr, é chamado a cumprir um dever, e ou as
presta, ou contesta a ação. No contestar, ou ele alega que não mais tem, ou não teve nem tem tal dever, ou que
houve prescrição da ação, ou mesmo prazo preclusivo (e. g., no contrato foi dito que somente, dentro do prazo x,
pode o interessado propor a ação de prestação de contas).

Se autor é quem tem de prestar as contas, exerce a pretensão a isso, e a ação é para que o legitimado a acolhê-las
ou as aceite ou apresente contestação. De qualquer modo, cabe ao juiz julgar se o réu que não as aceitou tinha
razão, ou se não a tinha. Dá-se o mesmo se a ação de prestação de contas é proposta pela pessoa que pode exigir
que alguém as preste e a) o obrigado não as presta e contesta, ou b) não as presta e não contesta. O juiz, no caso
a), tem de atender ao direito que o autor tinha de exigir a prestação de contas, diante da petição e da contestação;
no caso b), incide o art. 915, § 2.~, que remete ao art. 330, onde se diz que o juiz conhecerá diretamente do
pedido, proferindo a sentença, quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de
fato, não houver necessidade de produzir prova ou audiência, ou quando ocorrer revelia. Mas a sentença que
julga procedente a ação condena o réu a prestar as contas no prazo de quarenta e oito horas, sob pena de não lhe
ser licito impugnar as que o autor apresentar (art. 915, § 2.0, 2.~- parte). O autor tem dez dias para essa
apresentação e o juiz as julga “segundo o prudente arbítrio”, podendo determinar, se entender necessário, o
exame pericial contábil (art. 915, § 3.0).

120CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (ARTS. 914-919)

Art. 915. Aquele que pretender exigir a prestação de contas 1) 2) requererá a citação do réu para, no prazo de
cinco (5) dias, as apresentar ou contestar a ação4).

§ 1.0 Prestadas as contas, terá o autor cinco (5) dias para dizer sobre elas; havendo necessidade de produzir
provas, o juiz designara audiência de instrução e julgamento; em caso contrário, proferirá desde logo a
sentença 5).

§ 2.0 Se o réu contestar a ação ou não negar a obrigação de prestar contas, observar--se-á o disposto no art.
330 3); a sentença, que julgar procedente a ação, condenará o réu a prestar as contas no prazo de quarenta e
oto (48) horas, sob pena de não lhe ser licito impugnar as que o autor apresentar 6)~

§ 39 Se o réu apresentar as contas dentro do prazo estabelecido no parágrafo anterior, seguir-se-á o


procedimento do § 1.0 deste artigo; em caso contrário, apresentá-las-á o autor dentro em dez (10) dias, sendo as
contas julgadas segundo o prudente arbítrio do juiz, que poderá determinar, se necessário, a realização do
exame pericial contábil 7).

1)PRETENSÃO A EXIGIR CONTAS. Existindo a pretensão a exigir contas (mandante; gerente de sociedade,
ainda que irregular, 2.R Câmara do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 17 de setembro de 1941, R. F.,
89, 221; herdeiro contra o testamenteiro ou inventariante, mulher casada, comuneiros, incapazes, etc.), o preceito
é o de prestá-las o obrigado a contas, e a cominação, a de serem apresentadas pelo autor e julgadas afinal. A lei
cinde a cominação; e, em conseqúência, dá dois prazos. Há o de cinco dias para prestá-las, ou
defender-se, por meio de contestação (art. 915), que tem de atacar a pretensão do autor, e o efeito da sentença que
julga procedente a ação e condena o réu com quarenta e oito horas, para apresentá-las, com a cominação final,
que é a de serem tidas por bem prestadas as que o autor apresente. Há, pois, duas sentenças a do art. 915, quanto
a contestação que ataca a incompleta cognição sobre pretensão, com que o juiz o citou, e a do art. 915, § 3», que
é a sentença sobre as contas, uma vez que a questão da pretensão, à diferença do que se passaria com a prestação
de contas requerida contra o que tem direito a recebê-las, já foi resolvida. A particularidade do processo do art.
915, comparando-se com o do direito anterior a 1939, está na substituição da prestação de contas como objeto de
cominação ao processo da execução. A consequência é a de haver dois preceitos, duas cominações, duas
sentenças sobre partes do mérito, sucessivos aqueles e essas, no mesmo processo, em vez de uma sentença sobre
o mérito e outra da execução, ou sentença sobre as duas matérias. A separação da questão prévia, prejudicial mas
inclusa, necessariamente, no pedido, foi de boa inspiração, mas essa questão prévia aparece noutros preceitos
cominatórios, e a relevância é a mesma que se nota no processo de prestação de contas. Nem se diga que há a
vantagem de se atribuir força material de coisa julgada à sentença, porque as sentenças proferidas em preceito
cominatório fazem coisa julgada material quanto à pretensão do autor e quanto à do réu.
A construção do processo de prestação de contas envolve um dos problemas mais sutis do direito processual, na
parte puramente formal. Antes dele vêm os conceitos de ordem pré
-processual. a) A pretensão a que alguém preste contas de modo nenhum se confunde com a pretensão a que a
outra pessoa responda pelo que fez. Essa pode existir sem aquela; e aquela sem essa. O que nada mais deve, ou
nada deve, pode estar obrigado a prestar contas. (O imposto sobre a renda veio dar importância nova a essa
distinção, pondo em foco o valor do histórico e o da comprovação das contas.)
b) Tanto existe a pretensão a que outrem preste contas quanto a pretensão a prestá-las. A estrutura da ação de
contas (ativa), pela qual A pede que B preste contas, é assunto que se prende ao art. 915. O réu, citado, ou desde
logo as presta, ou defende-se. Se o juiz entende julgando o contraditório da prejudicial sobre a pretensão a exigir
contas
que o réu é obrigado a prestá-las, essa sentença condenatória (declaratória da relação jurídica e condenatória) é a
base da segunda fase do processo, em que o réu tem de prestar as contas, ou sofrer que o autor as preste. Há duas
ações, evidentemente, que a economia processual cumulou, sucessivamente, numa só demanda.
(Trata-se aqui de ação de prestação de contas principais; pois há ações de prestação de contas acessórias e
incidentes, nas quais, por vezes, a primeira fase está metida na sentença de outro processo, ou o outro processo é
que precisa da co’sa julgada formal e material das contas.)
Se, na primeira fase do processo, o réu apresenta as suas contas, a falta de discussão da pretensão a exigir contas
não é razão para se entender que a sentença que assina o prazo para o pronunciamento da parte adversa, seja sem
eficácia de coisa julgada material: a questão da pretensão do autor e, pois, da obrigação do réu foi decidida a
favor daquele.
Na segunda fase do processo, que é de outra ação de condenação a uma de duas direções (réu, autor), se houve
contraditório, apuram-se as contas, e o réu, se foi vencido, está sujeito ao efeito executivo da sentença e ao efeito
(anexo) da hipoteca judiciária. Tal sentença também pode servir de base, se ela é parcial, ou a pedidos
posteriores de perdas e danos, se não foram apresentados.
Ponto digno de nota é o estar incluída na contestação do réu ação reconvencional para o pagamento da diferença
a seu favor.
Também se há de pôr em relevo que a apresentação das contas contém, ao mesmo tempo, o cumprimento da
obrigação de prestar contas e o ato processual de cumprimento do mandado judicial de prestá-las. Esse se exaure
com a apresentação. Aquele não depende, como vulgarmente se pensa, de serem julgadas boas e bem prestadas:
também se exaure, desde aí, pelo princípio processual de que apresentação de contas é cumprimento, ainda feita
pelo autor, discutindo-se apenas a qualidade dele. Na linguagem vulgar, as expressões “boas e bem prestadas”
mostram que um conceito é o de prestá-las e outro conceito é o de prestá-las boas e bem. Na ação de prestação de
contas, não há na segunda fase, sentença que julgue “não prestadas”, somente há sentença que julga que foram
boas e bem prestadas, ou não .
Os arts. 267-269 (extinção do processo) são aplicáveis em processo de prestação de contas. A sentença que julga
boas e bem prestadas as contas faz coisa julgada formal e material. A ação rescisória rege-se pelos princípios
comuns (arts. 485, 487-495); e não tem o nosso direito qualquer impugnação da sentença trânsita em julgado
pelo “erro de conta”. O que pode ocorrer é a medida do art. 463, 1 e II, mas aí se supõe não ter havido o trânsito
em julgado (e. g., ainda pode ser interposta apelação). O erro teria de ser apenas de cálculo.
Há duas decisões, uma vez que se cindiu o mérito e nessa fase a cognição incompleta permite a parada, em vez
da pendência, ou dormência da eficácia (sem importância prática, em todo caso, a distinção).
É prematuro o julgamento de pagamento de honorários a advogado se a decisão, na primeira fase, é desfavorável
ao demandado (6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 5 de dezembro de 1952, R. dos T., 211,
218).
O demandado nega que seja obrigado a prestar contas~ contesta. A impugnação há de ser apresentada no
(aliter: l.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 3 de agosto de 1950, R. F., 141, 329; ~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de janeiro de 1950, R. dos T., 185, 222; 2.R Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 5 de janeiro de 1951).
Da decisão que acolhe a contestação cabe recurso. Trata-se de julgamento de questão prévia, declaratório da
existência ou da inexistência da obrigação de prestar contas. A 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas
Gerais, a 3 de agosto de 1950 (R. F., 141, 329), a 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a
7 de julho de 1950 (147, 254), e a 3•~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a 13 de
setembro de 1951 (142, 315), apontaram o recurso de apelação. Havia distinção a ser feita. Hoje, não.
Da sentença que rejeita in limine e da que julga não provada a alegação cabe apelação. É apelável também a que
as julga provadas.

2)PRESTAÇÃO DAS CONTAS PELO RÉU. O réu tem duas oportunidades, no processo de ação de prestação
de contas, proposta pelo titular de direito a exigi-las, para prestar as contas: a) no prazo de cinco dias, após a
citação, e tem o outro igual prazo para se manifestar sobre elas; b) julgada procedente a ação, é condenado a
prestá-las no prazo de quarenta e oito horas, última oportunidade que resta, porque, se não as presta, as presta o
autor e nada mais pode alegar• o réu.
Se houve a prestação de que se falou em a), é ouvido o autor, e o juiz, se não há necessidade de produção de
provas, logo profere a sentença, ou, se há tal necessidade, designa audiência de instrução e julgamento. Na
espécie b), se o réu presta, no prazo legal, as contas, tem de ser ouvido o autor, e tudo mais se passa como
dissemos acima. Se não as presta, é ao autor que cabe prestá-las, sem que se tenha de ouvir o réu.

3)FALTA DE CONTESTAÇÃO DA AÇÃO E DE ALEGAÇÃO DE NÃO SER OBRIGABO A PRESTAR


CONTAS. Se o réu, na ação em que se pede que ele preste contas, se abstém de contestar, ou se n~o diz que não
é obrigado a prestar contas, o juiz conhece diretamente do pedido, proferindo a sentença. Ou a sentença julga
procedente a ação, ou a julga improcedente, com a conseqúência de, se há julgamento de procedência, implícita
está a condenação a prestar contas. Para isso, tem o réu quarenta e oito horas para as prestar. Se não as presta tem
o autor o prazo de dez dias para as prestar. As contas prestadas pelo autor são apreciadas pelo juiz e julgadas
“com prudente arbítrio”, podendo determinar, se necessário, a realização do exame pericial contábil.

4)PRAZO PARA PRESTAR CONTAS OU DEFENDER-SE. O réu tem cinco dias para prestá-las, ou defender-
se. O conteúdo da regra jurídica é evidente. Alguns comentadores do Código de 1939 não no viam, ou o viam,
para tirar a consequência falsa de que tem de haver dois “processos” ordinários, confusão entre pretensão e ação
cominatória e procedimento ordinário (rito) dos cominatórios principais. O preceito do art. 915, § 2.0, é mandado
relativo ao praeiudicium, baseado no exame que dos documentos do autor fizera o juiz. Leva consigo a
cominação de serem tidas por verdadeiras as afirmações do autor quanto à sua pretensão, se o réu não prestar as
contas, ou não convencer o juiz de que a sua cognição incompleta era errada.

5)APRESENTAÇÃO DAS CONTAS, EM SEGUNDO MANDADO COM PRECEITO. (a) Se o réu não se
defende, sobem os autos ao juiz para mandar que o réu apresente as contas, pois à regra jurídica do art. 915, §
2.0, não falta essa particularidade do’ mandado, que é o prazo para a apresentação (segundo preceito),
acompanhado da segunda cominação, que é a de serem. apresentadas pelo próprio autor e julgadas, afinal,
prestadas.
(b) Tudo se passa do mesmo modo, se fora proferida a sentença do arL. 915, § 1.0, após as provas que o juiz
tenha admitido.

6)CONTAS, APRESENTAÇÃO PELO REU OU PELO AUTOR. As contas ou são apresentadas pelo réu, ou
pelo autor. (a) Pelo réu, o autor tem cinco dias para impugná-las (situação de autor no processo). Se não as
impugna, sobem os autos ao juiz para a sentença, que tem semelhança com a sentença de que falaremos em nota
ao art. 916. Se as impugna, abre-se o contraditório, com o rito do art. 915, § 2.0, 2.~- parte. (b) Pelo autor, dentro
dos dez dias (art. 915, § 3~0, 2.~- parte) sem contraditório.
A despeito da reconhecida apelabilidade da sentença em ação de prestação de contas ainda não estando edificado
o instituto dos agra;’os, que o direito canônico desconhecera, e sendo, nos séculos XIII e XIV, precário (cf. Lei
de 1303, nas Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 103, §§ 1, 2 e 3), tendo-se de admitir apelação preferiu-se
cortar o efeito suspensivo. Tanto mais quanto Dioao GUERREIRO, MANUEL ALvARES PEGAS e ANTÔNIO
DE PAIVA E PONA (Orfanologia Prática, II, 89) não tiveram de pensar e resolver o problema, pois já vinha
resolvido desde a Glosa e entrara em Portugal, oriundo de D. B. ALTIMARO e outros anteriores, com a solução
do corte n& efeito suspensivo. Aliás, houve agravos em prestações da contas, em Portugal e no Brasil, quando a
pessoa do juiz determinava o recurso. O Código de 1939 resolvera com simplic5dade. Se não atendêssemos à
letra da lei e distinguissemos a nosso talante onde a lei nenhuma distinção fazia, deixaríamos o problema milenar
sem a solução da Glosa, pois a regra jurídica sobre retirada da suspensividade a espécies de sentença não a
retirara à sentença do art. 303, § 2.0, do Código de 1939. A apelação sob o Código de 1973 tem efeito
suspensivo.

7)CONSEQÚÉNCIAS DA INATIVIDADE DO REU. Apresentadas as contas pelo autor, a figura processual


passa a ser anômala, pois que se previa a simetria com a ação do art. 91~ (ação do réu, provocado). Isso não tira
à segunda fase o caráter de ação do réu, como provocado (pretensão do réu a prestar contas), apenas dá ao autor o
expediente útil (e necessário) para que se prossiga. A inatividade do réu dá ao prosseguimento da lide objeto
dúplice: de um lado, inadimplemento da obrigação de prestar contas; do outro, o autor tem interesse em
reconstituir, com os meios de que dispõe, as contas (GIUSEPPE CHIOvENDA, Principii, 1290). Isso não
excluia a faculdade de apresentar o réu, ao pronunciar-se sobre as contas do autor, as suas, ou fazê-lo na
aud4ência de instrução e julgamento. Mas isso acabou com o Código de 1973: as contas são julgadas segundo o
prudente arbítrio do juiz, que pode determinar, se necessário, a realizacão do exame pericial contábil.
Observe-se que a infração da obrigação de prestar contas, pela não-apresentação de que fala o art. 915, § 2.~, 2.a
parte, pode fundamentar ação de ressarcimento do dano contra o réu da ação de prestação de contas.
Se o réu apresentou as suas contas e o autor as impugnou, segue-se o processo com o rito do art. 915, § 12.
Hoje, com o Código de 1973, o art. 520 também não fez sem efeito suspensivo a sentença proferida em ação de
prestação de contas. Assim, qualquer que seja a sentença na ação de prestação de contas, quer promovida pela
pessoa, que pode exigir que preste contas, quer pela pessoa que as quer prestar, a eficácia é devolutiva e
suspensiva. Mas, rigorosamente, a suspensividade seria sem razão de ser, salvo na espécie do art. 919.
Pergunta-se: ~,como se há de resolver se o autor da ação de prestação de contas não se manifesta dentro dos
cinco dias? Ele pedira que o réu as prestasse e o réu as prestou, cabendo ao autor dizer sobre elas no prazo de
cinco dias (o art. 915, § 3~o, 1~a parte, remete ao § 1.0). Uma vez que
O autor não se manifesta, no prazo legal, tem-se, por analogia, de atender ao art. 330, a que se alude no § 2.0, se
não há contestação.

Art. 916. Aquele que estiver obrigado a prestar contas’) requererá a citação do réu para, no prazo de cinco (5)
dias, aceitá-las ou contestar a ação2.

§ j~O Se o réu não contestar a ação ou se declarar que aceita as contas4) oferecidas, serão estas julgadas
dentro de dez (10) dias 3) 5).

§ 2.0 Se o réu contestar a ação ou impugnar as contas e houver necessidade de produzir provas, o juiz designará
a audiência de instrução e julgamento6).

1)PRESTAÇÃO DE CONTAS PEDIDA PELO QUE AS DEVE PRESTAR.


Na relação jurídica de que nasce a pretensão a que alguém preste contas, ou a de alguém a prestar contas, o que
as pede e o que as quer prestar estão em situação de processo especial.
Rigorosamente, há pretensão de provocação. A praxe luso -brasileira tratou sempre a pretensão à prestação de
contas, ativa ou passiva, como objeto de preceito cominatório. Toda obrigação de ir a juízo é obrigação de fazer.
Obrigações de fazer não são somente as obrigações de direito civil, ou de direito privado. Por outro lado, o que
importa é a pretensão a que alguém faça; e essa ressalta no que a tem à prestação de contas passivas, ou no que a
tem à prestação de contas ativas. A vantagem do preceito, estava na ação de quem as queria prestar, em que, não
contestando o réu, se tinham por bem prestadas as contas: no caso de quem queria exigir a prestação, havia a
conveniência de serem apresentáveis pelo que tem a pretensão a que alguém lhas preste. Alguns comentadores
tinham estranhado que se atribuísse ao obrigado de direito material a posição de réu; mas o que importa, tanto no
caso do que tem de receber quanto no do que tem de dar contas, é a pretensão; e o chamado “obrigado” também
a tem. Tal pretensão, de direito pré-processual, é irrenunciável, como toda outra pretensão de igual natureza (a de
demandar, a de empregar vias executivas, declarativas, ou cominatórias).
Observe-se que o Código, em vez de primeiro tratar da ação de prestação de contas ativas, tratou da ação de
prestação de contas passivas. Talvez porque, no processo da prestação de contas ativas, ao apresentar as contas, o
réu exerce, também, ação sua, a ação para obter sentença sobre as contas que apresentou. Essa inversão teria a
conveniência de mostrar, desde logo, que a ação de prestação de contas passivas é a espécie simples, ao passo
que a ação de prestação de contas ativas cumula duas ações de condenações. Mas essa simplicidade é ilusória,
uma vez que, na ação do art. 916, aquele a quem vão ser prestadas as contas pode negar a pretensão do autor
(prestador das contas) a prestá-las, ou até mesmo dizer-se devedor.
Se o réu, na ação proposta pela pessoa que tem de prestar contas, se abstém de contestar as contas, ou as aceita, a
ação, que é declarativa positiva, tem de ser julgada. Se o réu contesta, é ele que incoa a ação de condenação, que
pode apanhar a própria questão da pretensão a prestar as contas, quer no tocante à qualidade da pessoa (e. g.,
como usufrutuário, e não como fiduciário), quer ao tempo quer a algum pacto, apreciando-se, no contraditório, os
itens da ação declarativa. Note-se que, nos processos promovidos por aquele a quem se devem prestar as contas,
se o réu as apresenta e o autor não as impugna, tudo se passa, do lado do réu, que exerceu ação declarativa
positiva, como se tivesse usado da ação do art. 916. No fundo, a ação do art. 915 é provocatio ad agendum.

2)PETIÇÃO INICIAL E DOCUMENTAÇAO . Se a ação é intentada pelo obrigado a prestar contas, qualquer
que seja o direito material que a reja (exceto em casos deixados às autoridades administrativas estatais, ou
paraestatais), as contas e os documentos justificativos devem instruir, desde logo, a petição inicial. A primeira
questão que surge é a de se saber se tem aplicação o art. 283. A resposta é afirmativa. A referência a documentos
não exclui, também, a observância do art. 282.
As despesas são diminuições do patrimônio que a pessoa se impõe de vontade própria, ou por dever, ou a favor
de terceiro, ou de quem seja dono, ou tenha direito real sobre bem ou bens ou patrimônio. Se quem fez as
despesas tem direito a reembolso é porque as despesas não lhe aproveitam, ou entram no cômputo de indenização
a ser-lhe paga, ou foram feitas em virtude de negócio jurídico bilateral, ou de gestão de negócios alheios.
As despesas ou são necessárias, ou úteis, ou voluptuárias. Se aplicadas a coisas, dizem-se benfeitorias.
As despesas podem consistir em dação de dinheiro ou em objetos que o inversor emprega na conservação da
coisa ou em coisa (e. g., alimentos para animais, materiais incorporados em construção, limpeza e conservação
do edifício), ou na transferência do uso, ou no uso da coisa para utilidade de outrem, ou na prestação de serviços
(e. g., o médico atende ao chamado de alguém, porque o filho do vizinho se feriu), ou na assunção de obrigações
a favor de outrem (e. g., encomenda peças para as máquinas de outrem, devendo pagar o preço em certo tempo).
O dano que se sofre na gestão de negócio alheio não édespesa: o dano sofre-se, a despesa faz-se. O mandatário
pode reclamar reembolso de despesas (Código Civil, de 1916, arts. 1.310, verbis “as despesas de execução do
mandato”, e 1.311) e perdas que sofreu na execução do mandato, se não resultaram de culpa própria ou de
excesso de poderes (art. 1.312). Todavia, se, conhecendo o perigo, alguém expõe bem próprio no interesse de
outrem, discute-se se se há de pensar em dano, ou em despesa (cp. Código Civil, art. 160, II, onde a espécie é de
emprego de coisa alheia).
A respeito das despesas em bem ou em patrimônio alheio há: a) a pretensão à indenidade ou reparação, como
ocorre ao possuidor de boa-fé, quanto às benfeitorias necessárias e úteis (Código Civil, art. 516, 1.a parte), e ao
possuidor de má-fé, quanto às necessárias (art. 517); b) o ius toilendi; c) o direito de retenção; d) a ação para
prestar contas, fixando-se prazo para que a pessoa a favor de quem se fizeram as despesas as aprove ou impugne,
com a cominação de, não contestando, ou não impugnando, não mais ser ouvido, isto é, com rito do art. 916 da
lei processual (cf. FRIEDRICH STEINBAcH, Die Anspruche wegen Verwendungen nach dem Rechte des
Bftrgerlichen Gesetzbuchs, 28 5.); e) a acUo negotiorum gestorum contraria utilis, ou a que se irradie da relação
jurídica.

3)OFERECIMENTO DAS CONTAS E ATITUDES DO REU. Oferecidas as contas, ou o réu as contesta, ou as


aceita, ou não apresenta contestação. Se as contesta, o processo prossegue com o rito do art. 916, § 2Y. Se não
apresenta contestação, são os autos conclusos para que o juiz as julgue. Tem-se procurado introduzir a idéia de
confissão, o que destoa da natureza do preceito. As contas são julgadas boas e bem prestadas, no caso do art. 916,
§ 1.0, porque o preceitado “não atendeu” ao preceito. Confissão haveria, se ele as aceitasse, expressa ou
tacitamente (segundo o conceito contemporâneo); portanto, se revelasse aquiescência formal, ou em termos dos
quais se pudesse concluir pela existência de vontade aquiescente. A lei evitou qualquer noção de confissão. Só se
preocupou com a falta de contestação e com o acolhimento. Mais: faltando a contestação, não se têm por
confessados os fatos afixados, isto é, na espécie, as contas; têm-se por verdadeiros, o que é outra coisa, se não
contrariados por outras provas. Nos casos de preceito cominatório, o efeito de serem julgadas as contas é plus
devido à preceituação, conseqúências da desobediência ao preceito. O art. 322 é aplicável.
As contas apresentadas e não impugnadas têm-se como regulares, ainda que não hajam sido acompanhadas dos
documentos (Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 24 de abril de 1952, J. D., VI, 133), salvo se o
contrário resulta do conjunto das provas (art. 319).

4)ACEITAÇÃO DAS CONTAS PELO REU. A aceitação das contas é reconhecimento; não confissão. Sendo o
preceito processo que se inicia com base em certa porção de cognição (cognição incompleta, superficial, ou
mesmo parcial), o elemento da concordância sobre as contas, conteúdo da prestação pedida, é “declaração”, e
não vontade íntima, e perfaz o estado de cognição suficiente para que aquela, com que se começou, se complete.
A concordância deve ser sobre todos os pontos das contas oferecidas. A discordância sobre qualquer um deles,
mesmo não essencial, destrói a aceitação como plus suficiente para a conclusão dos autos. Não se leva em conta
a discordância não-expressa, nem a discordância separada, como vontade íntima, da declaração concordante.
Nem, ainda, há concordância, se o réu ressalva algum ponto para discussão ulterior no processo. O que as partes
acordes podem fazer é excluir o ponto ou os pontos ressalvados pelo réu, para discussão noutro processo, não-
cominatório.

5)CÁLCULO EM FORMA MERCANTIL. Tanto no caso de não-contestação como no de aceitação, ao juiz


somente cabe ordenar cálculo (somas, subtrações) em forma mercantil, sem qualquer invocação do seu livre
convencimento, salvo para obstar a fim dissimulado do processo (art. 129).

6)RITO, SE lIA CONTESTAÇÃO. Contestando o réu, o rito é o do art. 916, § 2.0; o juiz designa, desde logo, a
audiência de instrução e julgamento. A defesa é a que o réu tem segundo o direito material, que rege a relação
jurídica entre ele e o autor. Somente dispensam prova as pequenas despesas de que se não costuma pedir recibo.
A apreciação do juiz está subordinada ao uso e costume da não-exigência da prova e às circunstâncias do negócio
jurídico a que se refere a prestação de contas. A pretensão do autor a prestar contas pode ser-lhe negada a
existência e, então, essa questão deve ser julgada previamente, como matéria de mérito e prejudicial à da
comprovação e exatidão das contas. Mas advirta-se que a prejudicialidade, aí, de modo nenhum está ligada
àsituação de questões prévias, extra petita, e das quais a decisão dependa, sem serem premissas necessárias. A
existência da pretensão do autor é premissa necessária, está implicita no pedido do preceito de receber contas.
Donde a força material de coisa julgada que resulta da decisão em que o juiz a apreciou (art. 470).
O recurso, hoje, como no direito anterior, é o de apelação (quanto ao passado, Supremo Tribunal Federal, 24 de
agosto de 1950, R. F., 137, 441; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, 26 de dezembro de 1951, R.
dos T. da Bahia, 45, 381; 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 1.0de setembro de 1950, R. dos
T., 189, 314).
Art. 917. As contas assim do autor como do réu serão apresentadas em forma mercantil 3), especificando-se as
receitas e a aplicação das despesas 1), bem como o respectivo saldo2); e serão instruídas com os documentos
justificativos4).

1) CONTAS E INvENTARIO. Quem tem de apresentar a outrem receita e despesa, ou só receita, ou só despesa,
presta contas. Quem tem de informar sobre estado de bens (ou de patrimônio) e entregá-los, ou entregar
rendimento, há de fazer inventário, ou de fazer inventário e prestar contas. Não tem dever e obrigação de
inventariar quem apenas tem consigo bens que não fazem conjunto, provenientes de diferentes negócios
jurídicos, pois faltaria unidade de relação jurídica entre o dominus negotii e o gestor (K. LASSEN, Rechtliche
Natur und Inhalt des im § 561 Abs. 2 BGB. dem Vermieter gegebenen Anspruchs auf “Herausgabe zum Zwecke
der Zurúckschaffung”, Archiv fiir Biirgerliches Recht, 30, 274 5.).

2) CUMULAÇÃO DE AÇÕES. A ação de prestação de contas ou de apresentação de inventário pode cumular-


se a de condenação à entrega do saldo credor, ou dos objetos inventariados. Se não se deu a cumulação, a
sentença não tem carga suficiente de executividade, para que se possa requerer, nos mesmos autos, a execução
contra o devedor.
Quem gere negócios alheios, ou com procura, ou sem ela, tem de prestar contas. Há dever e obrigação de prestar
contas, a que correspondem direito e pretensão à prestação de contas. Da pretensão à prestação de contas nasce a
ação de prestação de contas, que tem o dominus negotii; da obrigação de prestar contas nasce a ação de prestar
contas, que é modo de se exercer aquela obrigação.

Têm de prestar contas, principalmente, o mandatário, o tutor e o curador, o gestor de negócios sem mandato, o
titular do direito de penhor que percebe frutos à conta da dívida, o fiduciário, o testamenteiro, o inventariante, as
diretorias de sociedades e fundações, o comuneiro que rege com ou sem poderes. Em geral, quem cuida de
assuntos alheios, ou ao mesmo tempo alheios e próprios, tem dever e obrigação de prestar contas. Quem apenas
tem direito a percentagem sobre o líquido não tem ação de prestação de contas (CARL CROME, Die
partíarischen RechtsgeschÉifte, 220), salvo se a lex spccialis o estabelece (e. g., Decreto n. 4.790, de 2 de janeiro
de 1924, art. 5.0), ou resulta de cláusula negocial. O Código de Processo Civil, nos arts. 914-919, cogitou das
ações de prestações de contas.

3)FORMA MERCANTIL E FALTA DE PRESSUPOSTO. Forma mercantil: parcelas ou colunas de entradas e


saídas (2.a Câmara Civil de São Paulo, 24 de março de 1942, R. dos T., 136, 627), deve e haver, como
demonstração gráfica, série de estados dos negócios da administração ou outra relação jurídica, com as somas
finais e o saldo. Se as parcelas vencem juros, contam-se a cada saldo parcial, ou como for de uso, ou se somam
em colunas diferentes, para que se tire o saldo deles, e se subtraia ou se junte ao saldo final.
A falta de forma mercantil causa nulidade não-cominada.
Advirta-se, porém, que a referência à forma mercantil dá ao adjetivo “mercantil” apenas a alusão ao invólucro,
porque a forma, aí, é o que importa. Se alguma lei exige dado especial ou dados especiais para a apresentação de
contas mercantis, não se há de exigir ao inventário da prestação de contas o que só lex specialis determinou. O
que se há de entender é que o art. 917 apontou como útil (a nulidade énão-cominada) o que se assemelha à
prestação de contas mercantis.

4)ARRANGENCIA DA REGRA JURIDICA. O art. 917 abrange as contas apresentadas pelo autor, ou pelo réu,
sendo impugnáveis ambas as espécies, salvo no caso excepcional do art. 915, § 3~O, 2Y- parte. Os arts. 319 e
333 são aplicáveis. Por isso mesmo, havendo impugnação, ao autor cabe ônus da prova das suas afirmações. ~
assim que se deve entender o acórdão da ~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 5 de dezembro
de 1940 (R. dos T., 139, 146).
Se as contas foram apresentadas em forma tal que puderem ser julgadas, não há pensar-se em infração do art. 917
(2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 3 de janeiro de 1950, D. da J. de 10 de janeiro de 1952). Nulidade, que
tivesse havido, seria nulidade não-cominada, e teria incidido o artigo 244.
A violação do art. 917, in thesi, é causa de ação rescisória de sentença (art. 485, V).

Art. 918. O saldo credor declarado na sentença poderá ser cobrado2) em execução forçada 1)

1)SALDO DAS CONTAS E EXECUÇAO CONTRA O DEVEDOR. A execução pelo saldo faz-se nos mesmos
autos, reminiscência da concepção executiva da ação de prestação de contas no direito luso-brasileiro. Como a
sentença definitiva fez coisa julgada formal e material, essa fase executiva da sentença é
como outra actio no mesmo processo, por princípio de economia. Particularidade da prestação de contas, como
das ações sobre contratos de conta corrente, é a de que a reconvenção é implícita na defesa, e é condenado pelo
saldo o réu ou o autor. Ou esse saldo é em dinheiro, ou em coisa certa, ou alguma das parcelas dele é ilíquida, por
algum motivo que se não pode remover durante o processo de prestação de contas. Seja como for, a natureza da
coisa devida éque determina a forma da execução da sentença, segundo os princípios sobre execução de
sentença, atendido, porém, o efeito 4 de executividade.
A sentença há de determinar o saldo devido, se o há (cf. 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, 26 de
dezembro de 1951, R. dos T., da Bahia, 45, 381; 4•~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de
agosto de 1951, R. dos T., 149, 769).
A execução “nos mesmos autos”, a despeito de não haver no art. 918 a explicitude, que antes havia no art. 310 do
Código de 1939, não tira a essa terceira fase do processo o caráter de actio iudicati e pode ser iniciada desde
logo, exceto se foi interposto recurso de apelação. Resta saber se épreciso que se faça nova citação (art. 214). O
art. 918 não a dispensou; apenas dispôs sobre a continuidade. Isso é de entender-se ainda que se trate de
dinheiros a serem levantados por ordem do próprio juiz, pois o Código não fez mandamental a sentença do art.
915, nem o do art. 916. O recurso de apelação separa a segunda e a terceira, a despeito da continuidade material,
e tem-se de esperar o trânsito em julgado. Os arts. 214 e 587 são, pois, aplicáveis.

2) CUSTAS. A questão das custas envolve a da natureza das prestações de contas. Se o réu, na ação de prestação
de contas pedida pelo que tem pretensão a que lhe sejam prestadas, provar, como prejudicial, alegada na con
testação, que procurou prestar e nunca se recusou a prestá-las, o juiz pode reconhecer a pretensão do autor,
porém não a ação, e deve sentenciar dizendo que o réu não se opunha a prestá-las. Se admite que as preste, fá-lo
por economia de processo (aliter, teria de absolvê-lo, desde logo, do preceito, julgando a ação). Esse ponto da
não-existência da mora do réu e da culpa do autor é de valor para a condenação nas custas a final. O Código de
1973, como o de 1939, deixou de inserir regra jurídica especial sobre as custas, nas prestações de contas pedidas
pelo que tem pretensão a que lhe sejam prestadas (art. 915). No caso de ação proposta pelo que tem a pretensão
a prestá-las (art. 916), também foi Omisso o Código. A prestação espontânea de contas ou se faz
extrajudicialmente~ ou em jurisdição voluntária, que o Código não disciplinou, tal como se procede com as
contas de inventariantes, tutores e curadores, ou dos testamenteiros, depositários, sindicos e liquidatários de
massas falidas etc. Aí, são incluidas nas contas, como partes das despesas da administração.
É a relação de direito material que determina a quem cabem as custas e despesas necessárias à apresentação das
contas. A mora tem conseqúências no caso de preceito cominatório, por se tratar de jurisdição contenciosa,
embora lide dúplice em que se pode condenar no saldo tanto o réu quanto o autor. O juiz tem de examinar cada
caso que se lhe ofereça, tendo em vista a relação jurídica de direito material e a possível inversão da
responsabilidade pelas custas, se uma das partes, normalmente irresponsável pelas custas, deu causa à demanda.
O saldo nenhuma influência tem no pagamento das custas. O que pode ter é a mora no prestar as contas.
Naturalmente, o réu que negou a pretensão do autor, e perdeu, tem de pagás-la, porque só judicialmente poderia
ser convencido dessa questão prejudicial. Se não negou a pretensão e estava em mora de prestá-las, ou de lhe
serem prestadas, tendo sido vencido na sua defesa, ou não se tendo defendido,
paga as custas. A omissão pré-processual é inoperante se a parte em mora, que não negava a pretensão da
advers2, apenas negava as afirmações dessa e tinha razão para fazê-lo, porque, então, a mora não se configurou:
as contas não poderiam ter sido prestadas extrajudicialmente, ou em jurisdição voluntária. Se o tutor, ou o
curador, por exemplo, tem de buscar a jurisdição contenciosa e perde a ação, paga, então, as custas.

Art. 919. As contas do inventariante, do tutor, do curador, do depositário e de outro qualquer administrador’)
serão prestadas em apenso aos autos do processo em que tiver sido nomeado. Sendo condenado a pagar o saldo
e não o fazendo no prazo legal, o juiz poderá destitui-lo, seqúestrar os bens sob sua guarda e glosar o prêmio ou
gratificação a que teria direito2).

1)RÉU INvENTARIANTE, TUTOR, CURADOR OU DEPOSITÁRIO, OU OUTRO ADMINISTRADOR. Se o


réu da ação do art. 915 (ação de quem exige prestação de contas), ou o autor na de prestá-las, é inventariante,
tutor, curador, ou deposítario judicial, ou outro administrador, pode a sentença (a), destitui-lo, (b) sequestrar os
bens sob sua guarda, (c) glosar o prêmio ou gratificação a que teria direito.
(a)A destituição do inventariante, tutor, curador, ou depositário judicial, ou outro administrador, é efeito anexo
da sentença, efeito constitutivo negativo.
Tem-se de consultar o direito material, porque tal eficácia lateral não provém do art. 919, diretamente: o Código
apenas explicitou que na mesma sentença se pode destituir. Uma vez que nem todos os casos de procedência
envolvem culpa do réu na ação do art. 915, ou do autor na ação do art. 916, não se exige verificação. Advirta-se,
também, que a destituição somente se decreta se o juiz, competente para a ação de prestação de contas, também o
é para a destituição, ou se prorrogável a competência.
(7)O seqüestro dos bens sob a guarda do que foi réu na ação do art. 915, ou autor na ação do art. 916, é efeito
mandamental anexo, de origem processual. Não se precisa consultar o direto material. Esse, aliás, pode ter outros
efeitos anexos.
(c) A glosa do prêmio ou gratificação é efeito anexo, constitutivo negativo, mas, aqui, de direito material; de
modo que o juiz tem de verificar se houve, durante o processo, prova de alguma falta, bastante para a glosa. Se a
lei é omissa, entende-se que o Código supôs princípios gerais de direito que incidam.

2)RECURSO. O recurso é o de apelação (já antes, a 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, 7 de julho de 1950, R. F., 147, 254). A eficácia é suspensiva.

CAPÍTULO V

DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS 1>-25)

1)PossE, PODER FÁcTIcO. O direito objetivo atribui ao poder fáctico de alguém sobre a coisa consequências
diversas. Esse poder é a posse. Entre outras, são conseqúências jurídicas: o direito de defesa da própria posse; o
dever de restituição a quem seja o dono, e somente a ele, em princípio; ser pressuposto para a formação, ou a
transformação, ou a extinção de relações jurídicas. A posse, no sentido que aqui nos interessa, é estado de fato, a
que a lei liga consequências jurídicas. Não é a soma dos efeitos que ela produz, segundo o direito. Tal redução
não é possível. ~ a fonte, a base, desses efeitos. Como fonte, é que é relevante. Nisso, ela se distingue da
propriedade, que só existe como conceito juridico, soma dos efeitos que se colam a outros conceitos jurídicos.
O direito romano teve de ver o fato da posse, teve de abrir janelas para o mundo fáctico e contemplar as relações
possessórias, quando se apresentou o problema das tenças de terras comuns, do ager pubUcus. A posse de
imóveis foi a que primeiramente teve tutela (cf. B. G. Nrmtmn, Rõmische Geschichte, II, 168; J. MARQUARDT,
Rõmische Staatsverwaltung, 2.~ ed., 700; PH. E. HUscnxs, tiber die Stelle des Varro von den Licíniern, 75 s.,
que antes o afirmaram; só na 6.~ ed., em Das Recht des Besit~es, F. O. voN SAVIGNY advertiu nisso, mudando
de opinião). Começou-se, portanto, a ver o precanum (cf. Th. MOMM5EN, Abniss <les rõmischen Staatsrechts,
1, 2.~ ed., 163, e II, 446; HEíI’nuc~I DEXINEURO, Entwicklung und Begriff <les juristischen Besitzes <les
rõmischen Rechts, 6). A tutela possessória nascia, assim, do fato da posse, ou por ocupação (FESTUS, ed.
ODOFREDO MuLLER, 241), ou pela concessão, tácita ou não, do Estado (PAULO, Sententiae, V, 6,
~ 11), o que mostra que a relação do precarista, fáctica, foi que se veio a chamar posse. O interdictum uti
possidetis serviu à restituição da posse do precarista. A relação do precarista com o precanio dans não era
tutelada com actio; daí o interctictum de precario. Com a posterior introdução da actio praescriptis verbis e sua
aplicação ao precário, tornou-se supérfluo o interdictum de precanio. Pensou-se que o interdito uti possidetis
somente cabia se se infringia o mandamento do Pretor (F. C. VON SAVIGNY, Das Recht <les Besitzes, 396; K.
A.ScHMIDT, Das Interdilctenverfahren, 180 s., 196), mas PAUL KRÚGER (Kritische Versuche im Gebiete
<les rõmischen Rechts, 88 s.) mostrou o erro: tratava-se de regular os papéis no processo da propriedade, e daí
começou a evolução para se atender a posse (HEINRIcH DERNBURG, Entwiclclung und Begniff, 13). Depois
de se cuidar dos precaristas do ager publicus foi que se cuidou de quem possuia ager privatus. Para se proteger a
posse, que tinha o precarista, foi que se criou o interdito uti possidetis. Tentou combater isso, depois, OTTO
KAELOWA (Rõmische Rechtsgeschichte, II, 1, 313-317).
Somente concebida a posse como poder de fato, podem ser-lhe explicadas, convenientemente, a transferibilidade
entre vivos e a hereditariedade. O fato é que se transfere. O fato, e não o conceito, cria o direito. Por isso mesmo
lhe falta a definitividade, que o direito empresta à propriedade. Se o direito procedesse com o mesmo
desembaraço em relação àposse, estaria a falsear o provisório da vida mesma, dos fatos de posse; e a posse seria
“conceito”, como a propriedade, e não “fato”. (Sobre essa diferença, RUDOLF STAMMLER, Die Lehre von
dem nichtigen Recht, 332; ANDEEAS voN Tuim, De? Aligemeine Teu, III, 455.) Daí resulta que a posse só se
protege provisoriamente. ~ transitória, como o homem e o poder do homem. Não figura em registros públicos,
nem o que transfere a posse “dispõe” do objeto, dispõe da posse. A sua transferência não paga imposto, mas
apanha tanto a coisa, enquanto existe de fato, que gera ações semelhantes às de reivindicacão. JosEF KOHLER
chegou a chamar “ordem da paz” àquela em que acontecem as posses, em contraposição à ordem definitiva,
despótica, em que se escalonam os blocos conceptuais da propriedade.
O conceito de posse, que entrou no Código Civil brasileiro de 1916, é o conceito contemporâneo europeu,
combinação do pensamento romano com o germânico (com abstração do animus dominantis). A novidade do
direito brasileiro foi abstrair do corpus, o que lhe deu certa espiritualidade, quando o espírito do país podia reagir
eficazmente contra a distinção entre possessio e detentio e contra a intromissão de “conceito” no piano fáctico
das posses. Isto é, contra a filosofia decadente, que pretendia platonizar a posse, e contra o orientalismo de
tapeçaria, com que se pretendia reduzir a detentores os que colhiam frutos sem ser dono (o arrendatário, o que
plantou com permissão, e outros) e com que se repeliam a transferibilidade e a hereditariedade da posse.
A evolução jurídica traduz condições econômicas e psíquicas. O conceito hodierno de posse é a síntese, a que se
chegou, um tanto diferente nos povos mesmos que a atingiram, mas em torno de linhas comuns, depois da tese
romana e da antítese germânica, e das sucessivas teses e antíteses, seguidas de sínteses provisórias, que foram as
“teorias da posse”.
Cumpre fixar alguns enunciados, que debuxam a concepção vigente no direito brasileiro:
(a) A posse resulta da posição do sujeito para com O objeto e para com a totalidade dos sujeitos, para com a
ordem social existente entre os cidadãos (PAUL SOKOLOWSKI, Der Besitz, 246). Não precisa do animus
savigniano, nem do corpus, segundo RU-DOLF voi~ JHERING, nem do tactus; nasce das entranhas da vida
simples, real, sem tecidos de conceito dos direitos.
(b)A posse pode recair em coisa, ou em parte da coisa, quer se trate de partes de coisa indivisa, quer de coisa
comum divisa (prédios, andares, apartamentos, gavetas de cofres ou armários, partes de paredes, placas, lugar de
anúncios etc.). A posse, manutenível ou reintegrável, só é possível em coisas; não em conceitos (direitos, por
exemplo), ou em forças da natureza, ou em pensamentos. Mas há objetos dos direitos reais, que não são
materiais, como ocorre com o objeto que é elemento de suporte fáctico de regra jurídica sobre propriedade
intelectual ou industrial.
(c)O conceito de posse é conceito básico, experiencial, que tem resistido a todas as tentativas de definição.
Participa do vivido em cada tempo. Daí ser um desses conceitos em que a divergência de opiniões constitui
material de estudo para os psicobiologistas. As convicções filosóficas dos juristas gregos, romanos, medievais e
contemporâneos refletiam-se e refletem-se nelas. A concepção da vida, a tendência económica, ressalta em cada
um, e tem sido objeto de pesquisas, nos hospitais e fora deles.
(d) Supõe a posse que o poder efetivo perdure; não basta o tocar, passando; mas em verdade pode prescindir de
qualquer tocar. Assim, sem razão, aí, RUDOLF voN JHEEING (ti ber deu Grund <les Besitzschutzes, 2.~ ed., 1
5.). Quem está sentado em casa de alguém não tem a posse da cadeira. Os servidores da posse não têm posse.
Têm o direito de defesa própria, não a pretensão à tutela jurídica; porém nos seus direitos de defesa própria estão
incluldos os do possuidor a quem servem (ANDREAS voN Tu~u~, Der Aligemeine Teu, II, 2, 587). A relação
entre eles não é, aí, jurídica; é social, e não se deve confundir com o direito e o dever jurídicos que acaso existam
(cp. V. BRUNs, Besitzerwerb durch Interesseuvertreter, 144 5.). Os regulamentos por exemplo, os regulamentos
militares procuram defini-la, e ela como que se esgueira, sem se deixar apanhar, ou enche de mais os artigos
regulamentares.

(e)Quando se lêem a L. 41 (PAULO), D., de adquirenda veZ amittenda possessione, 41, 2, e regras jurídicas de
hoje, ressalta a profunda diferença de concepção entre o sistema jurídico romano e o sistema jurídico
contemporâneo. Enquanto PAULO, na L. 41, alude ao direito de amizade, em virtude do qual entra alguém no
terreno do amigo, sem que se torne possuidor (entrou sem ânimo de o possuir, posto que corporalmente se ache
no fundo, “non eo animo ingressus est, ut possideat, licet corpore in fundo sit”), hoje se diz que não é possuidor
aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste, e em
cumprimento de ordens ou instruções, e ainda se enuncia que não induzem posse os atos de mera permissão ou
de tolerância. Na L. 41, já se viu entre os dois amigos o irradiado do fato jurídico da amizade, mas só se
concebeu a posse como relação do homem com a coisa: o amigo, que entra no terreno, não se põe em relação
possessória com a coisa, porque não tinha o ânimo de possuí-la. Hoje, o que se leva em conta, o que se vê (para
Isso nos preparou evolução filosófica que chegou até 1. KANT e, depois, até o empino-criticismo) são relações
entre homens, a que correspondem atos não-possessórios e atos possessórios, conforme o conteúdo dessas
mesmas relações.

2)POSSE DE COISAS INCORPÓREAS. As coisas corpóreas, no sentido estrito, não são as coisas únicas
suscetíveis de posse. Isso não quer dizer que os direitos pessoais, que não são bens corpóreos, possam ser objeto
de posse. Apenas se enuncia, com tal afirmação, que o sentido antigo de coisas corpóreas foi estendido pela física
contemporânea: a eletricidade é coisa, não-incorporal (no novo sentido); e, como tal, suscetível de posse; a
propriedade industrial e a intelectual são suscetíveis de posse. “Ao lado da matéria”, escreveu PAUL
SoKoLowsKI, Die Philosophie im Privatrecht, II, 282, “acha-se aqui segundo elemento, não menos essencial, a
energia, e ambos subordinam-se, contanto que sejam definidos e delineados, ao nosso poder fáctico. Onde,
porém, faltar determinação e delimitação não pode ser exercida a posse, mesmo na matéria corpórea; água
corrente, ar, sol e estrelas, também~ não são objeto de posse. Por outro lado, não há dúvida em que é possuida
certa quantidade de energia elétrica; vale como realidade material, sobre a qual a vontade do homem pode dispor
e sobre a qual pode ele exercer o seu poder fáctico”.
A posse recai sobre a coisa. Uma das confusões mais graves, e ninguém errou mais, a esse respeito, do que Rui
BARBOSA, foi a de se falar de posse de direitos reais e posse de direitos pessoais. O locatário não tem posse do
direito pessoal de locação; tem posse da coisa; nem do direito real de usufruto, uso, habitação, ou penhor, o
usufrutuário, o usuário, o habitador, ou o credor pignoratício, têm a posse da coisa usufruida, usada, habitada, ou
empenhada. Tanto assim que pode não ser usufrutuário, usuário, titular do direito de habitação, ou credor
pignoratício o que a possui. Quem tem direito real, portanto, constante de registro de imóveis, se se trata de
direito real imobiliário, não tem, somente por isso, posse, pretensão e ações possessórias. Tem as ações
petitórias, tem a ação declaratória, tem as ações ligadas ao seu direito. A pretensão e as ações possessórias
somente as tem o titular do direito real, se possui, durante o tempo em que se dá a ofensa, o objeto de que se
cogita. Assim, o proprietário do prédio A, que tem servidão registrada, quanto ao prédio B, e nunca a exerceu,
não tem posse e, pois, nenhuma pretensão ou ação possessória lhe cabe. A pretensão possessória nasce da posse
mediata ou imediata do dono ou simples possuidor do praedium dominans sobre opraedium serviens, e não do
registro.
A posse pode recair sobre universitas iuris. O direito romano admitia-o. O usufrutuário, o usuário e o titular do
direito de habitação fazem inventário do que recebem. Cabe a vindicatio universitatis. Sobre o todo inventariado
tem posse mediata o dono dele, que o é de cada coisa, ou somente de algumas (usufruto de fazenda, cujas terras
são de A e a maquinaria de B).
Quanto a coisas que fazem parte de universalidade de fato, o poder fáctico sobre uma delas só se pode dar se
ocorre separação. Se assim não fosse, haveria duas posses pela mesma pessoa (J. W. J. BORNEMANN,
Systematische Darstellung, 1, 2.~ ed., 514); e, tratando-se de bens móveis, ficariam sujeitos ao direito das coisas
móveis e, como pertenças do imóvel, ao direito das coisas imóveis (PAUL SOKOLOW5KI, Die PhilOsophie im
Privatrecht, II, 438, nota 493). As partes integrantes da coisa não podem ser objeto de direitos especiais, mas o
princípio não exclui a separação pelo fato da posse ou da aquisição da propriedade, nem pela posse de outrem
sem atenção à res composita, nem pela figura da reserva de domínio. A penhora do estabelecimento pode ser no
todo, com inventário, ou de cada coisa componente, parte integrante ou pertença. As vezes, porém, só a penhora
do todo é que se tem por fito e se deve levar a cabo. Por exemplo, nas espécies de administração de bens
penhorados. As coisas comçonentes continuam coisas, mas o interesse que as une pode prevalecer para os efeitos
que importem (cl. OTTo vON GIRaKE, Deutsches Privatrecht, II, 53 5.).

A propriedade intelectual (artística, científica) e a industrial são direitos sobre bens incorpóreos. Tais bens são,
pelo princípio de coextensão da posse e da propriedade, suscetiveis de posse e de tutela possessória. No mesmo
centro do que afirmáramos, a í.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 20 de junho de 1949 (R. F., 128, 426). O
bem industrial, bem incorpóreo, como o bem intelectual, é suscetível de posse. As pretensões e ações
possessórias podem ser exercidas. Tais ações somente nascem com a patenteação da invenção. Não se confunda
a ação possessória do titular da patente com a que tem o pré-utente antes de se exercer o direito formativo
gerador. ~ ação possessória oriunda de outro direito, o direito de propriedade intelectual ou o direito sobre a
coisa corpórea. Com o registro, nascem as pretensões e ações possessórias quanto aos sinais distintivos.
As ações possessórias nascem a qualquer pessoa que tem poder sobre a indicação de proveniência. Qualquer fato
que o exprima basta.
Em França, pretendeu-se a) que a posse da marca de fábrica ou de comércio não se toma com o simples fato do
depósito e há, apenas, o animus de possuir, não o corpus, porque tal elemento somente surge quando o público
(!) vê aparecer a marca nos produtos, ou nas mercadorias (e. g., A. LABORDE, Traité théorique et pratique des
Marques de 1 abrique et de commerce, n. 114); ou b) que o depósito confere a posse (PAUL ROUBIER, Le
Droit de la Propriété industrielie, II, 61~3 5.). Temos de evitar que se cinda, no sistema jurídico brasileiro, que
superou a distinção entre animus e cor-pus e se pôs, cientificamente, acima dos outros sistemas jurídicos, o
poder láctico da posse; e expor o que em verdade se passa. Todo o interesse científico está em tal terreno.
Se quem tinha a posse do bem corpóreo, ou do bem incorpóreo, e poderia opor-se ao registro e não se opôs,
deixando que a pretensão processual precluísse com a expiração do prazo legal e do prazo concernente à ação de
nulidade, ou se opôs e foi vencido, não tendo proposto, no prazo legal, a ação de nulidade, ou se opôs, ou não se
opôs, mas propôs a ação de nulidade, no prazo legal, sendo vencido, não há cogitar-se de ter mantido ou
recuperado a posse. Na primeira espécie, não mais pode o possuidor reaver a posse, porque foi perdida com o ato
do requerente do registro, que foi ato de tomada de posse, com ou sem a vontade do possuidor, que não foi
manutenido, nem reintegrado em tempo competente. Tanto mais quanto não poderia exercê-la o perdente, após o
depósito pelo requerente. A oposição, na espécie de pedido de registro, é exercício de pretensão de propriedade e
de posse. Na segunda espécie, que é a de ter havido oposição desfavoravelmente julgada, o opoente teve exame e
decisão sobre o seu direito e a sua posse, e não propôs em tempo a ação de nulidade, que embora não incluído o
pedido da declaração do seu direito e da sua posse, pois, devido à natureza da causa de nulidade, estaria implícito
teria sentença desconstitutiva do registro e declarativa da relação jurídica e da relação possessória do autor da
ação de nulidade. Na terceira espécie, que é a de ter o terceiro, que se opôs, ou que não se opôs, proposto a ação
de nulidade, ou ele venceu ou não venceu: se não venceu, não há pensar-se em ter recuperado a posse.
Se o possuidor se opôs, em tempo devido, ganhando, a decisão administrativa retirou qualquer efeito ao depósito,
que, como dissemos, contém ato de tomada de posse, com ou sem a vontade do possuidor. Se se opôs, e perdeu,
mas exerceu a pretensão desconstitutiva, propondo a ação de nulidade, e venceu, a decisão judicial retirou
qualquer efeito ao depósito e ao registro. Se sobreveio julgamento de caducidade pela autoridade administrativa,
por não ter usado o titular da propriedade o sinal distintivo, a eficácia da decisão é a partir da expiração do prazo
para tomada ou retomada de uso (= perfazimento do lapso de não-uso). Qualquer posse somente pode ser
posterior à eficácia da decisão, o que não coincide com a data da decisão.
Posse da marca, bem incorpóreo, tem quem destinou a res a ser marca, ou por ser utente, isto é, já a ter usado
como marca, ou por ,ter praticado atos que se hajam de considerar poder fáctico sobre o que vai ser marca
(destinação como sinal distintivo especial), ou por ter requerido o registro. Quem requereu o registro, ou a) podia
requerer e já tinha a posse, ou não podia requerer e esbulhou posse, ou b) tomou posse de bem alheio sobre o
qual não há posse do proprietário. Se, na espécie b), o possuidor vem com a sua oposição, ou a autoridade
administrativa a acolhe e julga procedente, o que opera como restituição da posse sobre o bem incorpóreo, ou o
faz o juiz, examinando o ato da autoridade administrativa, ou a autoridade administrativa decide pela
improcedência, ou o faz o juiz, examinando o ato da autoridade administrativa, e há reconhecimento da posse
pelo depósito, ou da posse anterior ao depósito, por parte do requerente.
Alguns sistemas jurídicos têm (a) o direito sobre marca, ainda antes do registro, como direito real, de modo que a
eficácia do registro seria preponderantemente deckiratória. Nos sistemas jurídicos que têm (b) o registro como
constitutivo, ou a) se entende que se constitui, ex nihilo, o direito (= pelo fato do registro e desde ele, ou, em
virtude de eficácia ex tunc, desde o requerimento e o depósito), ou b) se entende que só se constitui a eficácia
real, por existir, antes, direito formativo gerador. O sistema jurídico brasileiro adotou a solução técnica (b), b).
Por terem visto superficial-mente o problema e não atenderem a que pode haver disputa sobre o direito formativo
gerador e ao alcance das oposições, alguns intérpretes estranham que o registro seja, no direito brasileiro,
constitutivo e haja regra jurídica como a de oposição a registro por outrem ter o uso. Com isso revelam que não
levaram em conta que a decisão administrativa, ou a sentença, que constitui, pode constituir direito (que efeito é)
ou efeito de direito (e. g., realidade do direito, eficácia erga omn es).
Não é só o uso, como elemento criador do direito formativo gerador, que pode ser matéria de objeção, ou de ação
de nulidade. O uso pode ser elemento de algum direito já existente sobre o que se quer registrar como marca; e.
g., o direito autoral de exploração que tem o desenhista. Por outro lado, pode o uso não ser legítimo, exatamente
porque há direito ao uso, que o uso por outrem pode ofender.
Se duas ou mais pessoas apresentam pedidos de registro da mesma marca, não pode o Departamento deixar de
processar os pedidos. A prioridade dos depósitos só se apura quando se tem de fazer o registro e se expede a
certidão de regIstro. Por isso mesmo, a regra jurídica se põe após o lugar em que se trata da expedição da
certidão. Pode dar-se que esteja deferido o registro da marca, cujo pedido entrou depois, e pendente de recurso o
pedido que foi depositado antes. O exame de antecedências há de ter informado da existência da via recursal,
tenha havido, ou não, oposição. Se não houve oposição, a solução que tem a autoridade administrativa é a de
aguardar que se resolvam todas as questões que possam ter relevância na aplicação da regra jurídica.
Se houve oposição, da decisão sobre essa é que depende a sorte do pedido.
Se houve simultaneidade de pedidos, têm de ser notificados os requerentes para a prova do direito formativo
gerador (quem adquiriu o direito formativo gerador, ou, se só há prova de uso ou posse, quem usou ou possuiu
por mais tempo).
A regra jurídica, que se refere a mais tempo de posse, atende a que a mesma marca pode ser possuida por duas ou
mais pessoas, distintamente, porque se trata de bem incorpóreo. O bem incorpóreo pode ser possuído por
pluralidade de pessoas, sem composse, nem posse pro diviso. Cada uma das pessoas tem a sua posse. Devido a
isso, quem é pré-utente pode achar-se diante de outro pré-utente, porque o usi por essas pessoas é pré-uso em
relação ao requerente. Não só. O requerente pode ter usado a marca desde antes do opoente. ou simultaneamente,
ou depois. Se o opoente não tinha uso ao tempo em que se fez o requerimento do registro, não mais tinha uso, e a
razão para opor-se desaparecera antes de ter o requerente depositado o pedido. Quando na lei se fala de
simultaneidade de apresentação e preferência ao requerente
que por mais tempo usou a marca, supõe -se que a hajam usado até o dia do requerimento, de modo que se haja
de preferir quem por mais tempo usou. Não tem preferência o que a usou por mais tempo, sem mais a estar
usando ao requerer o registro.
O que se disse sobre o uso também se entende quanto à posse.
<‘~Se há uso e posse, uso por uma pessoa e posse por outra? Uso é posse, porém nem toda posse é uso. (Uso, aí,
é uso como titular de direito.) Em tal espécie, há pluralidade de posses, o que perfaz a figura de que falamos.
Todavia, nada obsta a que à posse da outra pessoa oponha o outro possuidor o justo título. A questão desloca-se,
então, para o terreno do direito formativo gerador, isto é, passa ao mundo do direito, saindo do plano do mundo
fáctico.
Se não há prova de quem seja o titular do direito formativo gerador, nem, sequer, de quem possuiu ou usou por
mais tempo, têm de ser alteradas as marcas idênticas, ou uma. delas, se duas, ou todas menos uma, ou todas.
Entre dois utentes que não depositaram simultaneamente, decide a autoridade administrativa. O sistema jurídico
s6 re rmite que se aguarde decisão judicial se concorrem os seguintes pressupostos: a) simultaneidade de
depósitos; 1,) questão sobre uso ou posse; c) dúvida. Se a questão é sobre direito de propriedade intelectual, ou
sobre existência de direito formativo gerador por parte do requerente, não precisa haver simultaneidade de
depósitos para que a autoridade administrativa possa remeter os contendores à via judicial. São pontos da
máxima relevância.
A dúvida sobre o direito formativo gerador, se houve uso anterior ou posse anterior, não se trata como a falta de
alegação e de prova, ou a falta de prova. Então, a autoridade administrativa, entendendo que não está convencida,
remete os interessados à justiça. O art. 126 do Código de Processo Civil não é invocáveL.
A apresentação de oposição não obsta a que os opoentes, que se dizem titulares do direito formativo gerador,
ainda que só aleguem posse ou uso, proponham as ações petitórias e possessórias que tenham.
Se o sinal distintivo é objeto de propriedade mobiliária sobre bem corpóreo ou sobre bem incorpóreo, ou de
posse, tem o titular do direito ou da posse as ações reais e as possessórias que não dependem da existência de
propriedade industrial ou de posse do bem incorpóreo objeto de propriedade industrial. As ações possessórias,
quanto ao bem incorpóreo, que pode vir a ser objeto de direito real, preexistem à formação do direito de
propriedade industrial, como as ações possessárias quanto a bens corpóreos, e. g., quanto a terrenos, preexistem à
aquisição da propriedade.

3)EsPÉcIEs DE PossE: POSSE IMEDIATA E POSSE MEDIATA.


A posse é mediata ou indireta quando alguém que não esse possuidor teria a posse imediata ou direta. O
possuidor imediato, ao contrário do servidor da posse, tem posse e pretensão a que correspondem as ações
possessórias. Há, então, duas posses, sem que uma exclua a outra. Para que isso se dê, basta que, nas relações da
vida, se estabeleçam os dois fatos da posse. Exemplo: o usufrutuário, o credor pignoraticio, o locatário, o
comodatário, o administrador, o depositário (não o comprador no caso de compra-e-venda com reserva de
domínio; sem razão, ANDREAS vON TUHR, Der Alígemeine Teu, des Deutschen Rechts, III, 312), o armazém
geral, o transportador por convenção, o testamenteiro, o marido, o pai, o tutor, o curador, o síndico da falência.
Espiritualiza-se o conceito de poder fáctico sobre o objeto, para se separar da posse imediata a mediata. Essa é
contemporânea, co-presente, e não simples expectativa para quando cesse a posse imediata. O que se cedeu foi a
posse direta ou imediata; a outra ficou, defende-se, impõe-se. A volta da outra é que tem o seu momento; e volta
ela como elemento integrador, e não como outra posse. Razão por que pode não voltar, se o possuidor imediato
ou direto a perdeu para terceiro. O que volta é o elemento que se destacou e a fez; não ela. O achador da coisa
não tem a posse imediata; tem a posse, simplesmente. No entanto, pode-se adquirir posse imediata antes que o
possuidor mediato adquira a sua. O vendedor, que, no momento de vender, aluga a coisa vendida, passa a ser
possuidor imediato, por força da mudança nas relações entre ele e o comprador. Na compra-e-venda com reserva
de domínio, a posse que se transmite ao comprador é posse de dono; porque só se reserva o domínio, não a posse.
Posse mediata é a que se tem por sobre outra, que serve de mediadora para o poder fáctico. Cumpre, porém, não
se exagerar o papel de mediação. O possuidor mediato está em plano superior; é a sua posição, aí, que o faz o
superior, não a existência do possuidor imediato. Os juristas costumam figurar as duas posses, como se as duas
pessoas estivessem de pé, uma sobre os ombros da outra, de modo que, faltando a de baixo, a outra viria ao solo,
deixando o nível em que se achava. Não é isso o que ocorre.
A posse imediata, ai, é apenas posse direta exercida por outrem; se falta o possuidor imediato, ou o possuidor
próprio vem, também, até embaixo, enchendo toda a extensão possível do poder fáctico, ou se abstém de descer
até à coisa, e isso se expõe a que alguém se insinue no estrato em que escava o possuidor imediato. Essa é que é a
concepção científica das espécies de posses. O que alugou o terreno e cria que o locatário lá estava, quando já se
ausentara definitivamente e terceiros exploravam o terreno, está exposto a que esses terceiros se digam
locatários, sem o serem, mas, também, a que comecem de possuir como donos (= subindo ao nível do possuidor
próprio). O locatário, que não passou a ter poder fáctico como dono, e continua a considerar-se tal, a despeito de
não mais haver relação jurídica de locação, porque o dono da coisa renunciou à propriedade imobiliária, ou
derrelinqiliu a propriedade mobiliária, é possuidor imediato. Por onde se vê que a posse imediata, aí, é posse
direta da coisa pelo que não é dono da coisa, e não necessariamente, posse direta da coisa em nome de alguém. O
proprio nomine e o alieno nomine revelam resíduos de teorias da posse já superadas. Para os conservarmos,
teríamos de esvaziá-los da antiga concepção da detentio dos possuidores imediatos. Emlora não sejam imunes à
crítica, prefiramos “posse própria” e “posse não-própria”.
A posse mediata, por sua vez, pressupõe que o poder fáctico não seja direto. Dizer-se que pressupõe relação
entre o possuidor mediato e o imediato é “imaginar” a sua formaçáo; não, defini-la. O possuidor a título de
usufrutuário continua possuidor imediato, a despeito de ter cessado o usufruto; o possuidor mediato continua no
seu nível, a despeito de ter falecido o usufrutuário, ou de ter-se mediatizado, ele mesmo, pela locação do prédio
usufruído. A teoria da posse ganha em se terem as posses mediata e imediata como dois elementos topológicos.
E’ e E”, cuja soma é E (posse plena). O problema é de analisis situs, e não de psicologia, menos ainda de
utilização do homem pelo homem. A situação do possuidor mediato que não assumiu a posse direta é a de
conjunto possessório E, não vazio, em que há “interior” vazio; a situação do possuidor mediato, que assume a
posse imediata, é a de posse em que se dá a aderência de E’ e E”.
A posse mediata é a que, pelo menos ao se formar, continha pretensão à entrega, sem ser por ato ilícito do obri
gado. Está claro que, ao dizermos isso, já aludimos a efeitos-da posse, portanto à posse, no sentido b), e não no
sentido. a), pura situação de fato. Situação de fato não pode conter pretensão, que é conceito jurídico. Tampouco,
a proposição “toda posse mediata importa pretensão à entrega, por ato não ilícito, contra alguém”, serviria para a
definir: já se estaria no plano da eficácia.
É erro exigir-se à posse mediata e à imediata existir entre elas relação jurídica (e. g., L. F. A. E. BARTELS,
Ausfiihrungen zur Besitzlehre des BGB.; Gruchots Beitrãge, 42, 659; C~uu.. REIss, tber mittelbaren Besit~, 20).
A relação não éjurídica, é fáctica, donde ser impertinente exigir-se-lhe-validade ou eficácia jurídica.
As teses de ser o possuidor imediato o representante do possuidor mediato (absurdo de ADOLF LAST, Fragen
der Besitzlehre, Jherings Jahrbucher, 63, 71 5.), ou exercente da posse do possuidor mediato (FERDINAN-D
Kxii~r, Der Besitz~ 12), ou servidor da posse, são insustentáveis. Tampouco énecessário que, uma vez que existe
posse imediata, exista possuidor mediato, erro que consiste em se falar juridicamente (= de dentro do mundo
jurídico) quando se está a. tratar do mundo fáctico, ao que não se forrou FRIEDRICH ENDEMANN (Lehrbuch,
II, 1, ~ ed., 167).
A posse imediata pode perder-se, sem que a posse mediata que vem logo acima se perca, ou vice-versa. Qualquer
das posses mediatas pode perder-se sem que outra ou outras posses mediatas se percam. Se o esbulho foi somente
contra o possuidor imediato, não ofende a posse mediata, salvo se está implícita a ofensa. A ofensa à posse
própria pode ser contra todas as posses, ou não, mas, de regra, tem as conseqi.iências negativas do exercício que
seria o da posse própria.

4)PLURALIDADE PO55IVEL DE P055E5 MEDIATAS. Pode haver duas ou mais posses mediatas, porque E
pode ser a. soma de E’, E’’, E’’’; a relação E’’ para ~ e como a de E’ para E” (locador, locatá.rio, sublocatário;
proprietário, usufrutuário, locatário, sublocatário). Nada obsta a que a mesma pessoa seja possuidor mediato do
grau superior e possuidor imediato (nu-proprietário, usufrutuário e locatário do prédio usufruído; devedor
penhorado, juízo e devedor-depositário). O que não teria sentido seria ser possuidor mediato do último grau
inferior e possuidor imediato (= ser E’ e E” ou possuidor mediato de dois graus vizinhos). Diferente é o que se
passa quando alguém, que é locatário, énomeado depositário judicial da coisa locada, que se seqtiestrou ou
penhorou: aí, há o mesmo possuidor imediato, sob duas posses mediatas do mesmo grau. (O ato do árgão da
pessoa jurídica é ato da pessoa jurídica, e não dele, de modo que falta o pressuposto de duas titularidades de
posse, pelo menos.)
Não se pode reduzir a posse mediata a simples situação de titularidade da pretensão à restituição, como pretendeu
Orro WENDT (Der mittelbare Besitz, Archiv flir die civilisti~sche Praxis, 87, 47 s. e 69; Gutachten, 5 5.).
Primeiro, com isso se aludiria ao direito e à pretensão à restituição, que -estão no mundo jurídico. Segundo, se
rebaixaria a posse mediata, que é tão posse, tão poder fáctico, quanto a outra (OTTo vo~ GIEEXE, Die
Bedeutung des Fahrnisbesitzes, 7, nota 15; Gutachten, 32 e 35 5.). Não se trata de ficção, mas de concepção
germânica da posse, da Gewere alçada (FRANz LEONHABD, Vertretung beim Fahrniserwerb, 70).
Disse MARTIN WOLFF (Lehrbuch, III, 27.a~32.a ed., 26) que, no contrato de prestação a favor de terceiro, o
promissário é possuidor mediato e o destinatário também. Mas, evidentemente, aí ainda se está no plano
obrigacional. A transmissão da propriedade ou da posse não pode ser a dois, exclusivamente para um e outro. Só
um pode ser o possuidor próprio. Se o depositante, que estipulou a favor de terceiro, transmitiu a posse ao
destinatário e ficou com a propriedade, então há a posse do depositário, sobre a qual está a do terceiro, e sobre
essa está a do proprietário que ainda não perdeu. a propriedade e, pois, a posse própria.
Tentou ADOLF LAST (Fragen der Besitzlehre, Jherings Jahriiicher, 63, 98 5.) mostrar que derivou do direito
romano o conceito de mediatização da posse; não no conseguiu. A origem é germânica. Não se pense, todavia,
que o direito brasileiro só a teve com o Código Civil de 1916. Textos do século XVI falavam de posse dos que
têm direito a dízimos: constando que o dito cabido está na posse de haver e lhe pagarem os ditos dízimos, o
mantenham na dita posse... em quanto por sentença final.., o contrário não for determinado” (Alvarás de 3 de
fevereiro de 1550, 2 de maio de 1647 e 18 de fevereiro de 1778). No século XVI, PEDRO BAR BOSA, no
comentário à L. 2, C., de praescriptione, n. 270, ÁLv~o VALASCO (Quaestionuin luris Emphyteutici, 9, 18, n.
12) e MANUEL ALVAREs P~GAS (Resolutiones Forenses, II, 917) concebiam a posse do senhorio dos bens
enfitêuticos como posse mediata; e Jo~o RODIUGUES CORDEIRO (Dubitationes, d. 42, n. 38 e 43) frisava
caberem as ações possessórias contra quem lhe negasse a posse, inclusive o foreiro que nega o foro. Nem
ANTÔNIO DE SousA DE MACEDO (Decisiones, 151), nem MANUEL ALVARES PÊGAS (Tractatus varii, 1,
c. 5, n. 444, e Resolutiones Forenses, II, 919 e 941) confundiram a falta de execução da obrigação de foro com a
turbação ou esbulho da posse do senhorio. Confundiu-os, sim, J. H. CORREIA TELES (Digesto Português, 1, n.
662, 84).

5)UNICIDADE DA POSSE IMEDIATA. Posse imediata só há uma; posses mediatas podem coexistir, em graus
diferentes (e. g., dono-locador, locatário-sublocador). Se A, dono da casa a, que tem quatro quartos, banheiro,
sala e cozinha, dá em locação a B dois quartos e B os subloca a C, A é possuidor mediato dos dois quartos
locados, como B o é, já em segundo grau, e possuidor imediato dos restantes dois quartos, banheiro, sala e
cozinha; C é possuidor imediato dos dois quartos sublocados e pode mediatizar-se sublocando-os, por sua vez, a
D. É de repelir-se que C tenha a posse imediata, e exerça a de B e a de A, ou que B, se não sublocou os dois
quartos, tenha a posse imediata e exerça a de A. Ocorreu isso a FERDINAND KNIEP (Der Besitz, 12); mas é
falso, porque a relação jurídica entre B e A, ou entre C e B ou A, não é possessória, é obrigacional. Por outro
lado, leva a equívocos dizer-se que a posse mediata precisa da posse imediata para que exista (o locador continua
possuidor mediato se o locatário perdeu a posse), ou pensar-se em representação do possuidor mediato pelo
imediato, o que orça por intempestivo e falso romanismo, pois o direito romano não tinha a representação:
o prestar ministerium à posse alheia não era representar, como parecia a ADOLF LAST (Fragen der Besitzlehre,
Jherings Jahrbucher, 62, 71 5.). A diferença principal está em que hoje se tem a posse imediata como protegida
como tal, sem mais se conceber que o possuidor apenas “praestat alienae possessioni ministerium” (L. 18, pr.,
D., de adquirenda vei amittenda possessiOne, 41, 2). A relação jurídica a que a posse imediata implicitamente
alude, apenas “qualifica” no mundo fáctico, entenda-se a posse de alguém que não contém a situação de
plenitude (posse de dono).
O fato de ser jurídica e não só fáctica essa situação de modo nenhum faz ser jurídica a subordinação da posse
imediata à mediata. Tanto assim que O pode exercer a posse de sublocatário, que é imediata, sem que tivesse
havido locação a B; e B mesmo pode exercer a posse de locatário, posto que nunca tivesse havido locação (e. g.,
por ser contrato inexistente ou contrato nulo). O possuidor imediato só o é porque se porta como tal, e não
porque exista a relação jurídica de locação: o limite da posse imediata está nela mesma; o que fica. para aquém
dela é a posse mediata. Por isso mesmo, turva o trato do problema dizer-se que a posse imediata deriva sempre
do ius possessionis do dono, ou de quem se mediatizou. O possuidor imediato pode ter recebido (e éprovável que
tenha recebido), de alguém, possuidor mediatizado, a posse, mas posse derivada e posse imediata nem sempre
coincidem. O possuidor-locatário, que recebeu a coisa do usufrutuário, que por sua vez é titular de direito de
usufruto constituído por não-dono, embora esteja exposto à reivindicação pelo dono, é possuidor imediato, com a
tutela possessória, ainda que nula, e não só ineficaz, a constituição do usufruto.

6) MEDIDAS CONSTRITIVAS. Os atos de incursão estatal na esfera jurídica das pessoas, tais como as
penhoras, os seqüestros, os arrestos, as buscas e apreensões pela justiça, ou pela policia, não são atentados à
posse (sobre essas, 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 15 de agosto de 1940, R. F., 87, 689). O arresto, o
seqüestro, a penhora e qualquer outra medida constritiva, que atinja a posse, restringe a posse do arrestado, do
seqúestrado, ou do executado e cria outra posse (imediata), ou talvez intercale outra posse, ou crie outra e a
intercalar; mas tal restrição e tal criação resultam da legítima incursão do Estado na esfera jurídica dos sujeitos
de direito, desde que o seja na medida em que tais sujeitos estão subordinados, por lei, a sofrer a incursão estatal.
Situações semelhantes têm-se com o depósito em consignação.
Mas atenda-se ao pressuposto: a incursão do Estado na esfera jurídica e na esfera fáctica das pessoas, inclusive
outros Estados, ou outras unidades estatais do mesmo Estado, precisa ser conforme a lei, e não com infração da
lei.

7) POSSE E LIMITES. Os limites da propriedade podem ser incertos, sem que o seja a posse. Por isso mesmo,
em caso de confusão de limites (= em caso de incerteza invencível),
atende-se, primeiro, à posse. A posse pode ser certa, sem que os limites o sejam. Por isso, são absurdos os
acórdãos e violam letra da lei que preexcluem, a priori, a proteção possessória, se os limites são incertos: a
posse pode ser certa. Quem tem posse tem ação possessória, em caso de ofensa, ainda que, no terreno da
propriedade, haja confusão ou incerteza de limites (sem razão: a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 2 de
junho de 1950; a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, a 12 de abril de 1943, J. e D., VII, 18; a 1.a
Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, a 17 de junho de 1952; R. de D. 1., 15, 291). Posse e domínio (ou
direito real limitado) têm tutelas jurídicas distintas e ações distintas (cf. 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 8 de março de 1951, R. dos T., 192, 169; 2.0 Grupo de Câmaras Civis, 29 de janeiro de 1953, 210,
131).

8)ENFITEUSE E POSSE. O Código Civil de 1916 conservou a enfiteuse, que é um dos cânceres da economia
nacional, fruto, em grande parte, de falsos títulos que, amparados pelos governos dóceis a exigências de
poderosos, conseguiram incrustar-se nos registros de imóveis.
Discutiu-se se o senhorio tem ou não tem posse imediata, o que importava negar-se-lhe ou afirmar-se-lhe ser
possuidor. Ou ele é possuidor e então é possuidor imediato; ou não tem posse, como enfiteuta. Se se afirma que
tem posse, o enfiteuta é possuidor imediato; se se lha nega, a posse do enfiteuta seria própria, como proprietário
que também seria. Já a respeito do direito romano havia divergência entre os juristas:
uns entendiam que a posse que se protegia ao enfiteuta era a posse da coisa e outros a viam como iuris possessio,
com conteúdo de detenção da coisa, à semelhança do que se pas~ava com o usufruto (LuDwía ARNDTS
RITTER VON ARNESBERG, Gesammelte civilistiche Schrif teu, 277-317). lus predii, a enfiteuse, para F. C.
VON SAVIGNY (Das Recht des Besitzes, 7.a ed., 119), gerava posse, contra o que fora de esperar-se. No
direito contemporâneo, a discussão mais versou sobre o direito de superfície, que não temos, mas ela se reflete na
doutrina da enfiteuse, que o Código Civil de 1916 conservou.
Já em outros termos se pôe a questão: j,o enfiteuta é possuidor próprio, ou possuidor de coisa alheia? Ou,
melhor:~o enfiteuta é possuidor imediato, por ser mediato o senhorio, ou o senhorio não tem posse? As
expressões “temporariamente” (Código Civil de 1916, art. 486) e “auf Zeit” (Código Civil alemão, § 868) alguns
atribuíram que tem posse própria quem exerce o poder fáctico perpetuamente, o que seria decisivo, no direito
alemão, para o direito de superfície se não há condição nem termo e, no direito brasileiro, para a enfiteuse, que é
perpétua (assim OTTO WENDT, Der mittelbare Besitz, Archiv filr die civilistisChe Praxis, 87, 61). Quanto ao
direito de superfície, a doutrina alemã acabou por assentar ser o dono do prédio possuidor mediato e possuidor
imediato o superficiário quanto ao prédio, ou à parte do prédio, em que tem o direito de superfície ou de
construção. o não-dono do prédio, que tem a posse própria, pode usucapir; o superficiário, ou o terceiro, que não
tenha a posse mediata, pode ser repelido, possessoriamente (OTro voN GIERKE, Die Bedeutung des
Fahrnisbesitzes, 7; THEODOR KIPP, em B. WIND5CHEID, Lehrbuch, 1, 796; FERDINAND KNIEP, Der
Besitz, 135; MARTIN WOLF¶, Lehrbuch, III, 2’l.a~32.~ ed., 25; G. PLANCK, Kommefltar, III, 84; contra
KARL MAENNER, Sachenrecht, 269). A enfiteuse é perpétua (Código Civil brasileiro de 1916, art. 679, 1.a
parte), posto que possa acabar pelo comisso, pelo falecimento do enfiteuta sem deixar herdeiros, salvo o direito
dos credores (Código Civil de 1916, art. 692, II e III), ou pelo’ resgate (art. 693), ou, ainda, pela excepcional
renúncia (artigo 687, 2Y~ parte). De regra, o senhorio tem a posse mediata ou indireta. Um dos argumentos nesse
sentido ocorreu a J. G. C. GONDIM NETO (Posse indireta, 101 s.): se já se iniciara o prazo para usucapião pelo
outorgante, tem-se de levar em conta o tempo após a outorga. Outro argumento é o de não se poder negar ao
senhorio a ação possessória contra o enfiteuta, que se diga proprietário, e, a jfortiori, contra o terceiro, conluiado,
ou não, com o enfiteuta.
O enfiteuta é possuidor imediato, que se pode mediatizar. O senhorio é possuidor mediato. Só o senhorio tem
posse própria. A posse do enfiteuta está no plano das outras posses que co’rrespondem aos direitos reais.
Afirmar-se que o senhorio não tem posse é inadmissível; afirmar-se que o enfiteuta tem posse própria seria
conceberem-se duas posses próprias. Cf. Tratado de Direito Privado, Tomo X, § § 1.064, 2, e 1.066, 2. Podem
eles perder a posse, ou receber, sem posse, o direito.

9)AçÃo POSSESSóRIA CONTRA o SENHORIO. Se o senhorio, qualquer que seja a causa, toma a posse que
cabe ao enfiteuta, tem esse ação possessória. Ainda que apenas se trate de turbação. Ou por obras em casa
própria que tenha no prédio enfitêuticO.
Os herdeiros do enfiteuta recebem o direito real limitado e a posse (Código Civil de 1916, art. 1.572). As ações
transmitem-se aos herdeiros e nascem-lhes como ao decujo nasceriam (cp. Alvará de 9 de novembro de 1754).

10)USUFRUTO, USO E HABITAçAo , ACONTECIMENTOS ro MUNDO FÂCTICO. O usufruto, o usar e


fruir, o uso e a habitação, no sentido de direitos reais limitados, pertencem ao mundo jurídico, são efeitos de fatos
jurídicos. Mas pode-se possuir a coisa como usufrutuário, usuário ou habitador, ainda sem se ser usufrutuário,
usuário ou habitador. A posse de usufrutuário, de usuário ou de habitador pode não corresponder o direito de
usufrutuário, de usuário ou de habitador. Porque a posse é poder fáctico.
A ação de reintegração de posse é, propriamente, recuperativa. Recuperar é recaptar. Para que se tenha a ação de
reintegração é preciso que se não tenha perdido a posse em virtude de regra jurídica, e não por ter havido
espoliação. Assim, quem perde a posse, pela posse de outrem, se não houve manutenção ou reintegração em
tempo que a lei fixou (Código Civil de 1916, art. 520, IV), não mais pode pedir reintegração. Também falta
legitimação a quem tinha a posse como usufrutuário, usuário, ou titular de outro direito real, e o direito real se
extinguiu por lei ou algum ato jurídico. Para que se possa readquirir a posse, é preciso que se vença por ação
declaratória de não-extinção, ou em ação de decretação de invalidade da lei ou do ato jurídico.
O usufrutuário, o usuário e o habitador podem não ter posse. Pode-se ter posse antes de se ter direito de usufruto,
uso ou habitação. Pode-se perder o direito real de usufruto, ou de uso, ou de habitação, sem se perder a posse de
usufrutuário, usuário ou habitador. Pode-se perder a posse de usufrutuário, de usuário, ou de habitador, sem se
perder o direito de usufruto, ou de uso, ou de habitação.
Adquire-se a posse de usufrutuário, ou de usuário ou de habitador, como se adquire qualquer outra posse,
imediata ou mediata. Também ela pode ser mediata ou imediata, desde o início; ainda em se tratando de uso ou
habitação, porque, embora o usuário e o habitador tenham de utilizar-se do bem gravado de uso ou de habitação,
pessoalmente, é possível que só haja recebido a posse mediata e ainda não haja conseguido a posse imediata. Por
exemplo: se o bem gravado estava em locação e ainda não se tirou a posse, ou não cessou, por ato do locatário, a
posse imediata desse, ou se o bem gravado ainda se acha sob a posse imediata do inventariante ou do síndico.
A posse imediata de usufrutuário, de usuário, ou de habitador, nasce com a obtenção do poder fáctico, sem outro
possuidor mais próximo e sem possibilidade disso. No sistema jurídico brasileiro, há abstração do animus e do
corpus.
A apreensão é causa de se obter a posse de usufrutuário, usuário ou habitador. Se a alguém se permite tomar
posse de usufrutuário, usuário ou habitador, como se o dono do bem prometeu constituir o direito real limitado e
transmitiu a posse, há, desde o momento em que o poder fáctico se iniciou, posse de usufrutuário, usuário ou
habitador. O art. 493, II, do Código Civil de 1916, também incide em matéria de posse de usufrutuário, usuário
ou habitador (Tratado de Direito Privado, Tomo X, § 1.083).
Há tradição da posse de usufrutuário, usuário ou habitador. A tradição pode ser simples, ou brevi manu, ou longa
manu, ou pelo constituto possessório, mas advirta-se em que, no mundo jurídico, o uso e a habitação não podem
ser cedidos. Também há a aquisição da posse de usufrutuário, usuário ou habitador em virtude de cessão da
pretensão à entrega (Tomo X, § 1.085). Há aquisição ex lege da posse de usufrutuário, usuário ou habítador,
como a do titular do pátrio poder a cada obtenção de posse pelo filho, ou se só após a obtenção de tal posse pelo
filho se iniciou o pátrio poder. A aquisição pode ser iure hereditario (Código Civil, arts. 495 e 1.572).
Pode haver representação na aquisição da posse de usufrutuário, de usuário ou de habitador (Código Civil de
1916, art. 494, II; Tratado de Direito Privado, Tomo X, § 1.090); e isso não se choca com o caráter
personalíssimo do uso e da habitação: quem recebe a posse é o usufrutuário, o usuário ou o habitador.
As pessoas jurídicas ou adquirem a posse por seus órgáos, ou por seus representantes.
A perda da posse rege-se pelos princípios gerais (tomada da posse por outrem, tradição, destruição do bem
gravado, cessão da pretensão à entrega, extracomercialização, abandono da posse).
O esbulho da posse corporal não retira a posse ao esbulhado: é preciso que se haja dado a extinção do direito de
usufruto, de uso ou de habitação, pela prescrição das ações reais (Código Civil, arts. 739, VI, 745 e 748), ou, pelo
menos, das pretensões e ações possessórias do esbulhado (art. 520, parágrafo único, e 520, IV, combinado), ou
tenha cessado o vicio do esbulho, caso em que só a restituição se pode dar (Tratado de Direito Privado, Tomo X,
§ 1.106, 4).

11) LEGITIMAÇÃO ATIVA. As ações possessórias competem a quem tem posse ou pode pedir a restituição, e
não a quem apenas tem direito à posse. O usufrutuário, o usuário ou o habitador pode nunca ter tido posse. Os
servidores da posse, inclusive as pessoas da família segundo o conceito do sistema jurídico brasileiro (Código
Civil de 1916, art. 742, não são possuidores. Os atos de tolerância não induzem posse) (art. 497).
Não há no direito brasileiro regra jurídica que mande atender-se à posse do último ano; há, apenas, o art. 507, do
Código Civil, sobre melhor posse.
Se a ofensa é só ao usufruto, ao uso, ou à habitação, só o usufrutuário, o usuário, ou o habitador é legitimado; se
só ao nu-proprietário, só esse o é. Se ambos, titular do direito real limitado e titular do domínio são legitimados.
Se a incursão na posse não ofende a direitos suscetíveis de usucapião, mas apenas ao usufruto, ao uso ou à
habitação, só o usufrutuário, o usuário ou o habitador é legitimado.
A ofensa à posse de servidão tanto atinge o dono do bem como o usufrutuário, o usuário, ou o habitador. Aliás, a
ofensa à servidão pode partir do nu-proprietário ou do usufrutuário, usuário ou habitador, e legitimado ativo a
titulo possessório é o ofendido e legitimado passivo o ofensor.
O esbulho da posse de usufrutuário, usuário ou de habitador interessa, em princípio, ao nu-proprietário, porque a
ingerência de terceiro lhe pode ser lesiva, ainda que o terceiro reconheça o domínio do proprietário ou possuidor
próprio atual.
12) TUTELA POSSESSORIA. O possuidor como usufrutuário, usuário ou habitador tem a tutela possessória,
como os demais possuidores não-próprios, inclusive a legítima defesa e a justiça de mão própria (Código Civil de
1916, art. 502). Não há exceção similar à do art. 505, 2.~ parte; o que pode ocorrer é a objeção de viciosidade da
posse (art. 489).
As pretensões e ações possessórias são reais. Tanto se exercem contra o terceiro como contra o constituinte do
usufruto, do uso ou da habitação, ou contra o proprietário ou possuidor próprio do bem usufruído, usado ou
habitado.
No art. 730 do Código Civil de 1916, diz-se que o usufrutuário, que não quiser ou não puder dar caução, perde o
direito de administrar o usufruto. O proprietário pode negar-se a dar-lhe a posse imediata de usufrutuário, posse,
aí, de administrador. Se lha deu, não a pode tomar, fazendo-se justiça de mão própria. A posse mediata de
usufrutuário, ele a tem, preste ou não caução, salvo se o proprietário não lhe quis dar qualquer posse: se só se
negou a dar-lhe a posse de administrador, transferiu-lhe posse mediata, donde três posses: a mediata própria, que
o dono do bem usufruído tem; a mediata do usufrutuário; a imediata do dono-administrador.
Quanto ao uso e à habitação, não cabe falar-se em ficar ao proprietário a administração. O usuário ou habitador,
se lho exige o proprietário, ou se é obrigado a caucionar, se coube, in casu, medida cautelar, cauciona.
Se o usufrutuário recebeu a posse imediata, ou mediata, ou se não a recebeu, é questão de fato, e não de direito.
O usuário ou recebeu a posse mediata, ou imediata, ou ainda não recebeu posse. Diga-se o mesmo quanto ao
habitador. Se o constituinte tem posse, ou pode pedi-la, o usufrutuário, o usuário ou o habitador pode pedir a
posse que lhe toca.
A respeito da posse do usufrutuário, do usuário e do habitador, cumpre ter-se em vista que a teoria da posse, no
sistema jurídico brasileiro, se alçou à altura do sistema jurídico alemão e, em alguns pontos, o superou. A
distinção entre posse do dono e detenção do usufrutuário, usuário ou do habitador, em que ainda se insiste em
alguns sistemas jurídicos, já não tem sentido para o sistema jurídico brasileiro; e há de ter-se todo cuidado na
leitura de livros franceses e italianos.

13)MORTE E 5UCESSAO DO TITULAR DO DIREITO REAL LIMITADO. Não há successio possessionis,


em se tratando de usufruto, uso ou habitação. Quem tem posse de usufrutuário não deixa aos herdeiros posse de
usufrutuário, nem quem tem posse de usuário ou de habitador a transmite. O herdeiro ou o inventariante tem
posse imediata de administrador. Não há, portanto, por onde pensar-se em continuação da posse, nem em união
das posses.
No caso de extinção da pessoa jurídica, titular do direito real limitado de usufruto, uso, ou habitação, dá-se o
mesmo. Se o sucessor é universal, a posse, que recebe, quanto aos bens usufruidos, usados ou habitados, é a de
administrador; não a de usufrutuário, usuário, ou habitador. Se o sucessor se crê titular de outro usufruto, uso ou
habitação, e passa a exercer a posse como tal, de modo nenhum se há de pensar em sucessão na posse: há nova
posse, ou injustificada mutatio causae possessionis.

14)INCURsÕEs DE UsUFRUTUÁRIO, U5UARIO OU HA2BITADOR.


Se a pessoa que se diz usufrutuário, usuário ou habitador ofende a posse própria ou imprópria de outrem, ou se a
ofende quem, em verdade, é usufrutuário, usuário ou habitador, cabe ao ofendido a proteção possessória.
Não só a posse própria (posse do dono do prédio ou de quem se porta como dono do prédio) pode ser ofendida.
Ao usufrutuário, ao usuário ou ao habitador, ou a quem se diga tal, pode-se ofender a posse não-própria mediata
ou imediata.
15) CONTEÚDO DO DIREITO REAL LIMITADO E POSSE. Se o ato do usufrutuário, do usuário ou do
habitador não cabe no conteúdo do usufruto, do uso ou da habitação, de que tem posse, e ofende a posse de
outrem, tem o ofendido ação possessória. Igualmente, se a ofensa vem de quem se diz titular do direito real
limitado, sem o ser, tenha ou não tenha posse de usufrutuário, usuário ou habitador.
Se o usuário ou o habitador deu posse de locatário, ou posse, semelhante, a alguém, ofende a posse mediata do
proprietário, porque ele não pode alugar, nem, por outro negócio jurídico, ou ato jurídico stricto sensu, ou ato-
fato, transmitir o que é intransmissível. O proprietário pode ir contra o outorgado por ser a recepção da posse
outorgada, como a mesma outorga, ofensiva da sua posse.
Praticamente, há de o proprietário pedir a citação dos dois, do outorgante e do outorgado.
Se o ato de tomada de posse foi somente de quem se diz locatário, ou com outro direito à posse, contra essa
pessoa é que se há de dirigir a ação.
Se foi o proprietário que deu a posse imediata ao terceiro (ou posse mediata), o ato dele ofende o direito ou o
direito e a posse do usufrutuário, do usuário, ou do habitador.
A posse mediata do proprietário pode ser transferida com a propriedade, ou por direito que não implique o de
uso.

16)ANTICRESE E AÇÕES POSSESSORIAS. O dono ou enfiteuta do prédio gravado de anticrese tem a tutela
possessória, como qualquer possuidor mediato, se admite a anticrese; se nega a anticrese e afirma a posse
imediata, tem a ação possessória contra quem se diz, ou não, titular do direito de anticrese e não teve a posse, ou
não a tem mais. Todavia, na ação possessória, o problema da existência do direito real limitado não pode ser
discutido.
Se a anticrese foi constituída por pessoa que não era legitimada a constituí-la, dita, por abreviação, anticrese a
non domino, o possuidor, que estava de boa-fé, é tratado segundo os arts. 510, 511, 514 e 516 do Código Civil de
1916, e o que estava de má-fé, segundo os arts. 513, 515 e 517. No sistema jurídico brasileiro, a posse imprópria,
mediata ou imediata, do anticresista há de ser tratada como qualquer outra posse. O possuidor mediato ou
imediato, que recebeu do anticresista a posse, responde ao anticresista e por ele responde o anticresista ao
constituinte da anticrese, mas a boa-fé, em que estava o possuidor mediato inferior ao anticresista, ou o possuidor
imediato, é alegável perante o dono, o enfiteuta, que reivindica ou que exerce ação de restituição.
É da máxima importância observar-se que o sistema jurídico brasileiro não contém regra jurídica como a do §
957 do Código Civil alemão, concernente à aquisição dos frutos pelo terceiro de boa-fé, ou de má-fé que lhe deu
a posse inferior.
A posse gera os direitos de que se trata nos arts. 510-516 do Código Civil, independentemente de ser própria a
posse, ou de ser imprópria, mediata ou imediata.

17)PENHOR E AÇÕES POSSESSóRIAS. O titular do direito de penhor tem a proteção possessória, quer como
possuidor imediato, quer como possuidor mediato, segundo os princípios. O titular do direito de penhor tem as
ações possessórias e a de vindicação da posse, que se não confunde com a vindicação do (direito real de) penhor,
ação que corresponde à rei vindicatio.
Sempre que tenha de reaver a posse do bem, a prestação de perdas e danos cabe nos mesmos termos em que a
pretensão tocaria ao dono, mas o dono tem de ser inicialmente citado para ser litisconsorte, porque o titular do
direito de penhor, que recebeu a posse imediata, responde como depositário. A eficácia da prestação de perdas e
danos é só entre autor e réu (cf. ERWIN SCHULTZ, Die Pfandanspruche nach § 1.227 des BGB., 31 5.).
Se o titular do direito de penhor não mais tem a vindicatória da posse, ou não tem ação possessória contra o dono
do bem, cabe-lhe a ação de vindicação do penhor (cf. P. MIETHKE, Wesen und Umfang der Klage des § 1.007
des BGB., 31 5.; ERWIN SCHULTZ, Die Pfandansprúche nach § 1.227 des .13GB., 86).
Se a ofensa é ao direito real de penhor, tudo se passa como a respeito dos outros direitos reais limitados (Tratado
de Direito Privado, Tomos XVIII, § 2.240, e XIX, § § 2.343, 1, 2.345, 3 e 2.412).

18)SERVIDÃO E PROTEÇAO POSSESSóRIA . Pode-se ter posse de servidão, antes de se ter direito real de
servidão; pode-se ter direito real de servidão, antes de se ter posse. Pode-se perder o direito real de servidão, sem
se perder a posse da servidão; pode-se perder a posse da servidão, sem se perder o direito real de servidão. A
posse da servidão adquire-se como se adquire qualquer outra posse, imediata ou mediata. Também ela pode ser
imediata ou mediata. O dono do prédio dominante que constitui a favor de outrem usufruto, ou que recebeu a
propriedade já detraída de usufruto, de uso ou de habitação, ou simplesmente locada, apenas recebeu, com a
entrega da posse, posse mediata. O usufrutuário, que recebeu a posse imediata e aluga o prédio, dando posse ao
locatário, mediatiza a sua posse. A posse imediata da servidão nasce com a obtenção do poder fáctico, sem outro
possuidor mais próximo. No sistema jurídico brasileiro, abstraiu-se do corpus e do animus. Há aquisição da
posse da servidão pela apreensão da coisa para a servidão. Se a alguém se permite tomar posse da servidão,
adquire-a quem a toma. Quem exerce poder fáctico que se contém no direito de servidão, ainda que não tenha tal
direito, é possuidor. O art. 493, II, do Código Civil, incide em matéria de servidão (Tratado de Direito Privado,
Tomo X, § 1.083). Há tradição da posse da servidão e esse elemento, que fora essencial à aquisição do direito de
servidão, hoje não o é mais. A tradição da servidão pode ser simples, brevi manu, longa manu, ou pelo constituto
possessório. Também há a aquisição da posse da servidão pela cessão da pretensão à entrega (Tratado de Direito
Privado, Tomo X, § 1.085). O sistema jurídico brasileiro permite a representação na aquisição da posse (Tomo
X, § 1.090).
Também há aquisição ex lege da posse da servidão (§ 1.092) e transmissão ipso iure (§ 1.094).
Quanto à perda da posse da servidão, regem os princípios gerais (Tratado de Direito Privado, Tomo X, § §
1.098-1.108, 1.100, 4). Perde-se a posse da servidão pela tomada da posse por outrem, pela tradição, pela
destruição do prédio dominante ou do prédio serviente, pela cessão da pretensão à entrega, pela
extracomercialização, pelo abandono.
Também pode haver abandono da posse da servidão; e. g., se o que tinha a servidão de luz fecha a janela, com
propósito definitivo, ou se o que tem servidão tigni immittendi retira, com propósito definitivo, a instalação. O
esbulho da posse corporal da servidão não retira a posse ao esbulhado: é preciso que, se há servidão registrada, se
tenha dado o não-uso durante dez anos (extinção do direito, Código Civil de 1916, art. 710, III), ou esteja perdida
a prova por impossibilidade (art. 520, parágrafo único, combinado com o art. 520, IV). O prazo de preclusão
somente corre, nas servidões negativas, desde que se executou o ato contrário, com ou sem oposição do
possuidor. Se consiste em instalação, não começou de correr enquanto existe instalação que induza posse.
Cumpre que se não confundam posse da servidão e exercicio do direito de servidão, erro que se encontra em
muitos juristas (sobre o assunto, Tratado de Direito Privado, Tomo X, § 1.076). Quem perde a posse da servidão
pode não perder o usus; quem tem o usus da servidão pode não ter posse. No art. 698 do Código Civil de 1916,
que concerne à usucapio servitutis, o que importa é a posse. No art. 710, III, referente àextinção de servidão, o
que importa é o non usus.
19) AÇÕES POSSESSÓRIAS. A ação possessória, também em se tratando de servidão, pertence a quem tem
posse e não a quem tem direito à posse. O titular do direito de servidão pode não ter e, até, nunca ter tido a posse
da servidão, ou por não ter tido a do prédio dominante, ou por ter tido a essa sem aquela. Também aqui o direito
brasileiro abstrai do animus e do corp/us. Os servidores da posse (Código Civil de 1916, art. 487) não são
possuidores e os atos de tolerância não induzem posse. Os princípios sobre posse incidem. Não há no direito
brasileiro regra jurídica que mande atender-se à posse do último ano (cp. Código Civil italiano, art. 1.066); há o
art. 507 sobre melhor posse. Tem-se de atender a que há servidões intermitentes como a de tirar água, de noite,
ou de dia, ou só no verão (cf. L. 1, § 4, D., de aqua cottidiana et aestiva, 43, 20). A L. 1, § 2, D., de intinere actu
que privato, 43, 19, referia-se ao tempo para o interdito (cf. ALESSANDRO SACCRI, Tratt ato teorico-pratico
delie Servità prediali, 1, 873).
Nas velhas doutrinas da posse, atribuía-se ao titular da servidão o interdictum uti possidetis utile (F. C. voN
SAVIGNY, Das Recht des Besitzes, 486 e 502), sendo sem base as dúvidas de HUBERTUS Gí~uxr~Ius (Ex
planationes difficilior. et celebrior. Leg. Cod. 302). No sistema jurídico brasileiro, seria surpreendente levantar-
se questão: há a posse da servidão, como há a posse de dono, a de usufrutuário, a de usuário e a de habitador.
Igualmente, o interdictum quod vi aut clam. Porém não o interdictum unde vi, porque, dizia-se, não se pode
conceber espoliação de servidão, por ser incorpórea a coisa (!). Assim se expressava, por exemplo, Cim. FR.
VON GLUCK (Ausfiihrliche Erltiuterung der Pandecten, X, 209), citando a L. 4, § 27, D., de usurpationibus et
usucapionibus, 41, 3, e F. C. VON SAVIGNY (Das Recht des Besitzes 488 5.), que aí não via deiectio
propriamente dita. É digno de nota que ANTÓNIO JOAQUIM RIBAs (Da Posse e das Ações possessórias, 300)
parece que já o admitia. Quem tira ao titular da servidão a posse, toda, esbulha-o: a deiectio ressalta.
O direito romano precisou de interditos especiais para a tutela da servidão. Deles não precisa o direito
contemporâneo, principalmente o brasileiro, que tem o mais alto grau de teoria da posse. Os nomes dos interditos
romanos apenas se prestam a designação da ação possessória que se intenta, in casu.

20)LEGÍTIMA DEFESA E JUSTIÇA DE MAO PRÓPRIA. O possuidor da servidão tem a tutela possessória,
como os demais possuidores, inclusive a legítima defesa e a justiça de mão própria (Código Civil de 1916, art.
502). Quanto ao petitorium absorbet possessorium, cf. o art. 505, í.~ parte (“Não obsta à manutenção, ou
reintegração na posse, a alegação de domínio, ou de outro direito sobre a coisa”), porque a exceção a ela só é
concernente ao esbulho à posse de dono (art. 505, 2.~ parte: “Não se deve, entretanto, julgar a posse em favor
daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio”). O que se pode objetar é a viciosidade da posse
(violência, clandestinidade, precariedade). Assim, na servidão aparente contínua, o possuidor do prédio serviente,
proprietário ou não, pode alegar que a posse da servidão se~ iniciou contra a sua vontade. Na servidão não
aparente, registrada, o possuidor, proprietário, ou não-proprietário, pode alegar que se iniciou sem sua vontade.
Tanto ali quanto aqui, o locatário (por exemplo) pode objetar o não ter permitido o início da posse. Durante os
prazos legais, o possuidor do prédio serviente pode defender-se, judicial ou extrajudicialmente, contra o que
exerce ato de exercício, ainda que não seja o primeiro; mas os prazos começam de contar-se do primeiro ato de
exercício (MAI~TíN WOLFF, Lehrbuch, III, 24, nota 19; sem razão. TREODOR Kn’p, em B. WINDSCHEID,
LehrWuch, 1, 9.a ed., 849 5.). Tem-se de atender ao art. 502, in une.

21)SERvIDÕEs DESCONTÍNUAS E 5ERVIDOES CONTINUAS NÃO APARENTES. Quanto à posse, diz o


Código Civil de 1916,art. 509: “O disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões contínuas não
aparentes, nem às descontínuas, salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio serviente,
ou daqueles de quem este o houve”. Noutros termos: em se tratando de servidões continuas aparentes, há a
proteção possessória contra qualquer possuidor do prédio serviente (arts. 499-508); fora dai, não. A regra jurídica
não diz haver posse de servidões contínuas não aparentes, nem de servidões descontínuas; apenas diz que não
tem eficácia contra quem não foi autor do título, nem é seu sucessor. Há corte no plano da eficácia; não, pré-
exclusão do plano da existência. Existe posse de servidões contínuas não aparentes e de servidões continuas; os
seus efeitos é que são subjetivamente limitados. Devido ao art. 697, que só admite servidão não aparente quando
registrada, o direito da servidão não aparente, continua ou descontínua, tem por pressupostos o registro, posto
que o poder fáctico, antes disso, possa entrar no mundo jurídico (= é fato jurídico stricto sensu, é posse). Não
devido ao art. 509, que só se refere ao plano da eficácia. Donde as conseqúências: se houve injustiça no
cancelamento, o poder fáctico pode continuar no mundo jurídico; ainda se o registro foi injusto ou a retificação, o
poder fáctico pode entrar, ou sair do mundo jurídico. Todas as outras servidões (as aparentes) podem ser objeto
de posse, sem o registro ou depois do cancelamento dele. Diferente, o direito alemão, para o qual a exigência do
registro concerne a todas as servidões (§ 1.029; cf. O. STRECKER, em G. PLANCX, Kommentar, III, 4.~ ed.,
595).

22) POSSE E REGISTRO. A posse da servidão, além dos limites do registro, contém a posse nos limites do
registro e o excesso, de modo que apenas para as servidões não aparentes (que dependem do registro) o excesso
não entra no mundo jurídico. A posse da servidão aparente pode ser maior do que a que seria dentro dos limites
constantes do registro;
se descontínua, só pode ser eficaz contra o possuidor do prédio serviente, de que proveio, ou seu sucessor. A
posse da servidão aquém dos limites que lhe traçou o registro não se entende extensiva a esses limites. Quem
pode passar a pé, a cavalo e de automóvel, se só exerce o passar a pé, somente de passar a pé tem posse de
servidão, posto que tenha direito real de servidão quanto a passar a pé, a cavalo e de automóvel. Se ainda pode
exercer o resto, começa do primeiro ato o exercício; se não mais o pode, como, por exemplo, se o automóvel não
entraria mais, devido ao estreitamento da passagem, o único remédio jurídico é o petitório, com a prévia
adequação da passagem e a imissão de posse. Se há escolha permanente, como se se permite passar por esse
caminho e por aquele, o uso de um importa posse dos dois.
É preciso, portanto, prestar-se toda a atenção ao diferente tratamento da posse e do exercício do direito de
servidão. Quem exerce, em parte, o direito de servidão exerce-o todo. Quem só em parte tem posse da servidão
só é possuidor da servidão quanto a essa parte.

23) PoSSUIDoR DA SERVIDÃO. Possuidor da servidão éo possuidor do prédio dominante, seja imediato ou
mediato. O dono do prédio dominante que o alugou e utiliza a servidão para as reparações, que faz ao prédio
alugado, tem posse da servidão, ainda que o possuidor imediato não tenha tomado posse dela. O sucessor
singular na posse, inclusive o possui.dor imediato, ao receber a posse do prédio dominante, recebe a posse da
servidão como parte integrante daquela, ainda que desconheça a existência ou o direito de servidão; mas recebe-a
tal qual é: vindo a exercê-la, pode unir a sua posse à do antecessor, para os efeito legais (art. 496, 2Y~ parte). O
sucessor universal continua-a de direito (Código Civil de 1916, art. 496, 1.a parte). Ao herdeiro ou legatário
transmite-se com todos os caracteres (art. 495): há successio possessionis.
24)AÇÕES POS5E55óRIAS E ATOS NECESSARIOS AO EXERCÍCIO DA SERVIDÃO. A turbação à
servidão pode consistir em obstáculos a atos necessários ao exercício da servidão, como a obras de limpeza e
conservação. O possuidor da servidão não precisa provar que houve o registro; e tal ocorre, ainda em se tratando
de servidão não aparente ou aparente descontinua, desde que o título proceda do demandado (Código Civil de
1916, arts. 698 e 509). Disse a 4.~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 18 de março de
1941 (R. de J.B., 53, 53): “Tratando-se de servidão contínua e aparente, não é indispensável a transcrição do
título respectivo no registro de imóveis. O art. 699 do Código Civil confere ao dono da servidão o direito de fazer
todas as obras necessárias à sua conservação e uso: são os adminicula servitutis e, em se tratando de servidão de
águas, que passam por vala ou rego, essa servidão é inseparável do direito de conservar o atravessadouro ou
passagem necessária à conservação e limpeza da referida vala” (cf. Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 23 de maio de 1924, R. dos T., 50, 342: “Aquele que tem direito à servidão pode entrar
no prédio vizinho para fazer as obras necessárias à sua conservação. Isso não constitui turbação da posse, nem
pode dar lugar à indenização de danos”).

25)MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO POSSESSóRIA. Com o surgimento do mandado de segurança,


tem-se levantado a questão de se saber se cabe a ação possessória, se também caberia mandado de segurança, ou
vice-versa. A Câmara Cível da Corte de Apelação de Minas Gerais, a 11 de março de 1936 (R. F., 67, 155),
chegou, certa vez, a dizer que, “com a criação do mandado de segurança, não há mais razão para se estender o
remédio jurídico possessório à defesa contra atos da administração pública que não ofendam a posse do
particular sobre coisas corpóreas ou direitos reais.. . “. Primeiro, o mandado de segurança cabe por ser ilegal o
ato administrativo e ter havido ofensa a direito, qualquer que seja, e a alegação de posse não é alegação de
direito, de jeito que só a proteção possessória pode ser invocada. Segundo, não é verdade que a ação possessória
se prenda à coisa ou a direitos reais, simplismo que destoa da lei e da doutrina. Se o autor argúiu que houve
apreensão ilegal de objetos de sua propriedade, a pretexto de se proibir jogo ou de se reprimir jogo proibido,
claro que não é de ação possessória que se há de tratar, e o mandado de segurança é o indicado (cf. Supremo
Tribunal Federal, 12 de maio de 1942, R. F., 99, 76); não assim se apenas se alega posse (com razão o voto
vencido do Ministro OROSIMBO NONATO ao acórdão citado). Acertadamente, decidiu a Câmara Cível do
Tribunal da Relação de Minas Gerais, a 5 de novembro de 1932 (59, 382): “Embora precário o estado de um
prédio, não pode a prefeitura. por si mesma, demoli-lo, sem recorrer, na falta de assentimento do proprietário, ao
Poder Judiciário. Se o faz, o proprietário pode recorrer à proteção possessória”. Ainda a 1.a Câmara Cível da
Corte de Apelação de Minas Gerais, a 1.0 de setembro de 1934 (A. J., 32, 257): “O que ao poder municipal
compete é impor multas aos infratores de seus regulamentos de veículos, para cuja cobrança já goza do privilégio
da ação executiva fiscal, não se lhe podendo reconhecer o direito de fazer justiça por si próprio, lançando mão de
meio coercitivo, que é a apreensão da coisa por tempo indeterminado, ou até que o infrator satisfaça as multas ou
exigências de seus regulamentos. Autos sucessivos de infração e execução imediata das penas são as medidas
eficazes com que a lei arma a ação do poder público, que por meio delas fará cumprir e respeitar os seus
regulamentos protetores da incolumidade pública. Ir além, praticando um seqüestro administrativo desconhecido
pela lei, sem forma nem figura de juízo, importa levar a efeito uma violência que, consistindo na ilegal retirada
da coisa da posse de seu proprietário, fere direito real e caracteriza esbulho típico, defensável pela ação de torça
nova espoliativa. Consumado o esbulho, feita está àposse moléstia que justifica o remédio jurídico possessório,
pouco importando que o esbulhador tenha ou não o ânimo de possuir. Este só seria de se indagar no interdito de
manutenção, não, porém, diante do esbulho já praticado, pois que a perda só da posse por ato violento de outrem
fundamenta o interdito reintegratório. Nesse sentido, aliás, é a jurisprudência”. Outro exemplo tem-se na abertura
de estrada por terras alheias, sem prévia desapropriação (Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas
Gerais, 17 de julho de 1939, R. F., 81, 183). Em geral, o Tribunal de Justiça do Paraná, a 16 de novembro de
1948 (Paraná J., 48, 476). Certamente, onde não há pensar-se em posse não se há de invocar proteção
possessória (e. g., para direitos de personalidade, ou para liberdade de comércio, cf. 1.a Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 17 de agosto de 1948, R. F., 121, 534). A 2.~ Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, a 26 de abril de 1929 (R. dos T., 70, 415), julgou procedente ação de
manutenção de posse contra o poder público municipal que, sob pretexto de consertar estradas públicas, invade
terrenos particulares, violando o domínio e a posse do proprietário marginal.
A 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 15 de maio de 1940 (R. F., 87, 689), disse que a ação possessória
não éa própria para se reclamar dinheiro apreendido pelo polícia. Tal dinheiro é apreendido e individualizado
para que perca, transitoriamente, a fungibilidade, de modo que, se é ilegal o ato da policia, ou, ainda, contrário à
Constituição, nada obsta a que se apure isso no processo da ação possessória, tanto mais quanto nenhum ato do
poder público, que fira direitos individuais, pode ser subtraído à apreciação judicial (Constituição de 1967, com a
Emenda n. 1, art. 153, § 4.0). Não ficam bem à justiça essas proposições demasiado gerais, que não
correspondem a estudo do direito que ela tem de aplicar, mencionando textos ou princípios não escritos. Outro
exemplo de tais generalizações desabusadas deu a mesma 1.a Turma, a 17 de novembro de 1941 (90, 403),
quando lançou que não pratica ato de esbulho a administração de estrada de ferro que, cercado o leito da linha,
impede a saída do imóvel que lhe fica paralelo e tem acesso por outra rua. Pode ser que a saida, que se fechou,
tenha sido saída para a rua, e as estradas de ferro não podem fechar, diminuir, ou cortar ruas. Se o imóvel em que
há construção tem frente e fundo, não podem as estradas de ferro obstruir a saida pela frente, forçando os
proprietários e possuidores a tornar frente os fundos da casa.
Absolutamente fora dos princípios foi o acórdão das 4•~ e 5~R Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São
Paulo, a 14 de dezembro de 1932 (R. dos T., 87, 618), que, discutindo poder, ou não, ser proposta ação
possessória contra o Estado, quis distinguir direitos pessoais e reais. É levar muito longe o desconhecimento da
teoria da posse.

SEÇÃO 1

Das Disposições Gerais

Art. 920. A propositura de uma ação possessória 1) em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido
e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos requisitas estejam provados 2) 3)~

1)CLASsIFIcAÇÃO DA AÇÃO. O que o art. 920 permite não é que se possa mudar ação de manutenção em
ação de esbulho, ou vice-versa, nem alude à troca de formas de processo (que é uma só: a forma dos arts. 924 e
930); e sim que se julgue o esbulho, ou a manutenção, se foi proposta aquela, em vez da ação de manutenção, ou
essa, em vez da ação de esbulho. Alude-se à pretensão mesma, e não ao rito. Também não se refere à ação do art.
932, ou à ação ordinária. Tornaram-se, portanto, inúteis as defesas de ter sido esbulhado o que pede a
manutenção, ou apenas turbado sem esbulho o que pede reintegração. A argUição de ter mais de ano e dia a
ofensa à posse para excluir qualquer das duas, quanto ao rito, continua de ser permitida: e é útil. O art. 920 de
maneira nenhuma permite a troca; porém o art. 250 com o parágrafo único é invocável.
O art. 920 está colocado no Capítulo V, que se refere às ações possessórias. Mas boa interpretação há de lê-lo
como referente às ações possessórias; não à ação de imissão de posse, que é ação petitória. Aliás, antes,
diferentemente, o acórdão da 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, a 19 de dezembro de 1951 (R.
dos T. da Bahia, 45, 195), confirmativo de Sentença do Juiz em Camaçari (Bahia), a 8 de agosto de 1951, o da
7Y~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 16 de novembro de 1951 (D. da J. de 14 de abril
de 1952), e o da 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 14 de março de 1950 (R. dos T., 186,
243; discordante, a 1.a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, a 16 de abril de 1952, 201, 426).
Desde que haja transcorrido o prazo do art. 924, o rito da ação possessória é o ordinário (já até 1974, sem razão,
a 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 27 de março de 1950, R. F., 136, 485; a ~ Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, a 17 de maio de 1952, Paraná J., 56, 114). Riem, no interdito proibitório
(art. 933); não, na imissão de posse.

Proposta a ação de reintegração, se, no curso do processo, ficar provado que não houve esbulho, mas turbação, a
ação pode ser julgada procedente em parte, para se deferir a manutenção (Turma Julgadora do Tribunal de
Justiça de Alagoas, 12 de junho de 1951, J. A., 1, 218). Quem esbulha faz mais do que turbar, de modo que a
turbação se inclui no esbulho. Aliás, o art. 375 do Código de 1939, hoje art. 920, poderia ter sido invocado.

Se houve esbulho, e não turbação, ou se o esbulho sobre-veio, a sentença pode dar a reintegração, em vez da
simples manutenção, que não teria sentido, ou não mais teria sentido. Em verdade, com a letra da lei, o sistema
jurídico fez ler-se todo o pedido de manutenção de posse, ou de reintegração de posse, como pedido de proteção
possessória. “Proteja-me”, há de ser entendido, onde apenas se diga “Mantenha-me na posse”, ou “Reintegre-me
na posse Se houve manutenção de posse, em vez de reintegração, o que o turbador aplicou à terra (sementes,
construções) foi ato ilícito, e não pode ter havido posse de boa-fé ou de má-fé, por se não retirar posse se apenas
se tentou. Daí não se haver de pensar em invocação de regras jurídicas sobre proteçao da posse (Código Civil,
arts. 510-519; cf. 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de junho de 1948, R. dos T., 175, 575).

2)CoMPossE E PROCESSO. A posse é acidental para o condomínio como o é para o domínio. Pode haver
domínio e posse, domínio e composse, condomínio e posse única, condomínio e composse, como domínio sem
posse e condomínio sem posse.
a)Qualquer dos condôminos pode exercer os atos inerentes à posse, desde que não exclua a posse dos outros
condôminos. O Código Civil de 1916, no art. 488, previu: “Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, ou
estiverem no gozo do mesmo direito, poderá cada uma exercer sobre o objeto comum atos possessórios, contanto
que não excluam os dos outros compossuidores”. A posse e a defesa da posse
comum exercida por um só ou por alguns dos condôminos aproveitam a todos. O ato de um, ou de alguns,
aproveita a todos, quer para interromper o prazo para a usucapião da propriedade, ou da servidão, quer para
outros efeitos de direito. Tanto o compossuidor direto quanto o indireto têm defesa possessória, portanto,
também o que alugou a coisa comum. Não há, no direito brasileiro, a ação possessória para determinação dos
limites do uso entre condôminos; porque a questão é petitória. Porém permanece a ação possessorla contra
turbação ou esbulho da composse.
b)O comuneiro, na comunhão pro diviso, se tem posse, a sua posse é tratada como a de qualquer outro. Cedo foi
assente isso no direito português e, depois, no direito luso-brasileiro. ANTÔNIO GOMES, em Variarum
Resolutionum luris Civilis et Regni Libri tres e no In Leges Tauri Commentaria, aludiu ao interdito recuperatório
da parte divisa; e MIGUEL flE REINOSO (Observationes Practicae, 186) viu bem o problema da posse pro
indiviso e da posse pro diviso: “Pars certa pro diviso vel pro indiviso possidetur”. Tanto tem posse o que possui a
parte intelectual ou ideal como o que possui a parte divisa. Ambos são in re certa. Posto que miudeasse casos,
MANUEL DE ALMEIDA E SousA (TratadO dos Interditos, 190) não no disse melhor. Incluiu, com razão,
aquele, que lembrara a DIOGO GUERREIRO, O dos herdeiros ou sócios que, “por arrumação antes das
partilhas”, se põem de posse de partes divisas. Sobre as ações possessórias entre condôminos e donos de
apartamentos, nosso Tratado de Direito Privado, Tomo XII.

3)PossE E FALSO LOCATAIRIO. A posse, e não o direito, é o que se apura, nas ações possessórias. O que
importa é verificar-se o fato, e não o título, o direito, a origem da posse. Por isso mesmo, a sentença não impede
que, pelas vias próprias, se indague do direito, inclusive do domínio (Câmara cível do Tribunal de Justiça do
Ceará, 24 de fevereiro de 1947, R. F., 115, 551; 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 25 de
setembro de 1947, 116, 508).
A ação, que se há contra o intruso, que se diz locatário e locatário não é, é a ação de esbulho, ou a de turbação,
e não a de despejo (4.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 26 de agosto de 1947, R. F.,
118, 155).

Art. 921. É licito ao autor cumular 1) 8) ao pedido possessório 9) 10) 11) 12> de:
6)7);
1 condenação em perdas e danos2) 5)
II cominação de pena para caso de-nova turbação ou esbulho3);
III desfazimento de construção ou plantação feita em detrimento de sua posse4).
1)CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. O art. 921 permite a cumulação de pedidos com o de manutenção ou de
reintegração, mas só nos casos que a lei aponta. Observe-se que se dá, aí, cumulação de pedidos, de modo que a
contestação e a sentença podem ser a todos, separadamente, ou a alguns, ou a algum. Poder haver confissões ou
desistências sem serem a todos.

2)CONDENAÇÃO EM PERDAS E DANOS. Pede-se, na ocasião do pedido de manutenção ou de reintegração,


a condenação em perdas e danos. Pode ser que, ao pedir-se a manutenção, já houvesse ocorrido danos, devidos à
ameaça ou temor, ou à turbação. Ali, cabe o interdito proibitório (art. 932), a que também se aplica o art. 921.
Aqui, a ação de manutenção ou de restituição (art. 926). Seja como for, há sempre a cumulabilidade, o que
simplifica as soluções...
3) COMINAÇÃO DE PENA PARA CASO DE NOVA TURBAÇÃO OU DE ESBULHO. Se se trata de
interdito proibitório (art. 932), há o pedido de segurança contra a turbação ou o esbulho iminente, com a
cominação de pena pecuniária, caso transgrida a preceituação. Se a ação é de manutenção, ou de reintegração,
além da condenação em perdas e danos, cabe a cominação de pena para caso de nova turbação ou de novo
esbulho. A sentença é de conteúdo múltiplo (manutenção ou reintegração, condenação em perdas e danos,
cominação de pena para caso de nova turbação ou de novo esbulho).

4)DESFAZIMENTO DE CONSTRUÇÃO OU DE PLANTAÇÃO FEITA EM DETRIMENTO DE POSSE.


Esse pedido de desfazimento é cumulável ao pedido de manutenção ou de reintegração, ou a qualquer dos dois de
que antes falamos (art. 921, 1 e II), ou a todos. O desfazimento de construção, ou de plantação, pode ser pedido,
ou afastado, a requerimento do réu ou do autor, para se computar na indenização a benfeitoria.

5)INDENIZAÇÃO DAS PERDAS E DANOS E CÔMPUTO. A indenização pode consistir em quantia certa,
que se haja fixado durante o processo, isto é, devidamente apurada, ou fixável na execução da sentença, pois que
há a sentença relativa ao pedido de manutenção, ou de reintegração, e ao pedido de indenização. Isso não obsta a
que, em vez de cumulação, prefira o autor a propositura de duas ações, talvez mesmo de três ou quatro (a de
manutenção ou de reintegra~áo; a de condenação, em perdas e danos; a de comínação da pena para caso de nova
turbação ou esbulho, a de desfazimento de construção ou de plantação em detrimento da posse).
Só se condena o réu a prestar indenização se o autor obtém sentença favorável (1.R Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Minas Gerais, 5 de fevereiro de 1942, R. F., 90, 776); e só se condena o autor, se perdeu. Se o réu,
que perdeu, ou o autor, que perdeu, tem pretensão a perdas e danos, tal pretensão somente pode resultar de má-fé
(art. 17). A 1.a Câmara Cível, acima referida, excluiu as perdas e danos causados durante o mandado de
adiantamento de execução, o que não está certo.
O pedido de indenização tem de ser feito na petição inicial (7.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, 4 de junho de 1951, R. de D. 1., 14, 65), ou reconvenção, ou incluso na contestação.
A expressão “perdas e danos” abrange todos os danos e prejuízos que haja sofrido ou sofra o autor ou o
demandado, se os pediu (4.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 4 de maio de 1950, R. dos T.,
187, 243).
A pretensão à indenização das perdas e danos é à semelhança da pretensão a reivindicação. Sempre o foi. Não
há Confundir-se com a pretensão à manutenção ou à reintegraçâo, que provém da ofensa à posse. Quando regra
jurídica de direito material ou processual, diz que a reintegração se opera à custa do esbulhador, no mesmo lugar
do esbulho, refere-se à satisfação de pretensão por ofensa à posse; e tal pretensão é objeto mesmo do pedido.
Quando fala do direito à indenização dos prejuízos sofridos, cogita de perdas e danos, além do que, para a
reintegração, se fará à custa do demandado. Se havia, por exemplo, má-fé, essas perdas e esses danos. por perda
ou deterioração da coisa, são quaisquer, ainda sem culpa. O de boa-fé não responde por essa perda ou
deterioração, ainda se teve culpa. É preciso não se encambulharem as pretensões. A reintegração à custa do
demandado fez-se como ato de execução forçada da decisão que apreciou a posse. É de frisar-se a distinção entre
as duas pretensões: a pretensão à indenização por perdas e danos e a pretensão à manutenção ou reintegração.
Por outro lado, não se confunda boa-fé (ou má-fé), referindo-se a posse, com a culpa, que concerne ao fato ilícito
causador do dano. Na jurisprudência, algumas vezes juizes encambulharam os dois conceitos, com prejuízos da
sistemática jurídica e das partes. Adiante, no fim da nota, damos exemplo.
O esbulhado não precisa de pedido à parte, para que se dê, à custa do esbulhador, a reintegração: pediu-o,
pedindo a reintegração. Quanto à indenização por perdas e danos, não: tem de alegar e provar perdas e danos,
passados, presentes ou futuros; portanto, tem de pedi-los. Cf. 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 29 de agosto de 1952 (R. dos T., 205, 159).
Só se entendem implícitos os pedidos de indenização das perdas e danos resultantes da ofensa à posse até ser
mantida ou reintegrada.
Quanto às perdas e danos futuros, tem de ser explícito o pedido.
O juiz não pode condenar a indenização de perdas e danos, passados, presentes ou futuros, sem que o autor ou o
réu o tenha pedido (contra os princípios, o parecer do Procurador Geral da República, a 22 de abril de 1953,
publicado no D. da J. de 28 de maio; certa a jurisprudência, e. g., 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 19 de junho de 1951, R. dos T., 193, 842, quanto à necessidade do pedido pelo réu, e Câmaras Civis
Conjuntas do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de abril de 1951, R. dos T., 192, 334, e R. F., 141, 282).
A reintegração à custa do vencido, na ação possessória, é elemento da executividade. Não se confunde com a
indenização de perdas e danos que não são elementos da reintegração. Dai aquela não precisar ser explicitamente
pedida: o pedido contém-na.
Terminada a instrução, fixa o juiz o objeto da demanda e os pontos em que manifestou a divergência. Não é
antes da instrução que o juiz tem de dizer quais os prejuízos a serem indenizados, e sim após a instrução, na
audiência (sem razão, a 2Y- Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, a 31 de outubro de 1951, R. dos T. da
Bahia, 45, 32).
O possuidor de má-fé responde conforme o direito material. A 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 3 de
julho de 1950 (R. F., 133, 425), decidiu que a condenação por perdas e danos, na ação possessória, depende de
má-fé ou dolo. A falta de terminologia exata no voto do relator foi alarmante: apura-se se houve posse de má-fé,
ou de boa-fé; se houve posse de má-fé, rege o art. 515 do Código Civil de 1916. Não se tem de apurar dolo, nem
culpa. Com muita sabedoria, o direito anterior, em que o art. 515 do Código Civil de 1916 se inspirou, ia buscar a
solução à L. 15, § 3, D., de rei vindicatione, 6, 1: “Si servus petitus vel animal aliud demortuum sit sine dolo
malo et culpa possessoris, pretium non esse praestandum plerique aiunt: sed est verius, si forte distracturus erat
petitor si accepisset, moram passo debere praestari: nam si ei restítuisset, distraxisset et pretium esset lucratus”.
Assim, já ULPIANO repelia opinião errada, como a da 1.a Turma, no acórdão citado, e claramente assentava a
verdadeira. Se o escravo pedido, ou qualquer animal, morreu, sem dolo mau nem culpa do possuidor, dizem os
mais que não se há de prestar o preço; mas verdadeiro é que, se acaso o houvesse alienado o demandante e
recebido o preço, prestal’ dever-se-ia a quem sofresse a mora: porque, se lho houvesse restituído e ele o
alienasse, teria ganho o preço. Foi a segunda opinião que se pôs claro no Preussisches Alígemeines Landrecht, 1,
Título 7, §§ 240 e 241, no livro de M. A. COELHO DA ROCHA (Instituições, 1, 354) e no Código Civil de
1916, art. 515.

6)ONDE SE CONDENA. A condenação a perdas e danos. é feita na sentença final da ação de manutenção ou de
reintegração da posse; não na sentença sobre o atentado.
7) EFIcÁcIA DA SENTENÇA. A sentença, nessa parte, éde condenação, e como tal deve ser tratada. A lei
ordena, implicitamente, que o juiz condene. É ele o juízo do an debeatur; a ele toca decidir se há
responsabilidade pelo dano, ou se não há. A execução da sentença apenas ficará resolver sobre o quantum
debeatur, sobre a importância do débito. O juízo cinde-se: sentença sobre o an debeatur; sentença sobre o
quantum debeatur. Assim, permite-se essa separação do existir e do quanto, com a conseqúência, discutida em
doutrina, se lei expressa não a faculta, de não ir a sentença até onde queria que ela fosse o pedido do autor
(thema decídendum). Tem-se procurado construir como citra petita necessitatis (vei utilitatis) causa, e a
jurisprudência brasileira, como a de muitos outros países, usou e abusou desse expediente de cisão do juízo.
Tratamos disso no Livro II; aqui apenas deixemos claro: a) que o juiz não deve deixar para a execução, como se
danos existissem, a liquidação deles, se não está convicto da existência de algum; b) que deve motivar a razão da
cisão, quando não está no pedido, ou esse não a contém como alternativa; c) que, se o autor não pediu o quantum
debeatur, mas apenas decisão sobre an debeatur, lhe é vedado julgar ultra petita.
Temos, agora, de examinar ocorrência legislativa. No Código de 1939, art. 374, dizia-se que “a indenização das
perdas e danos, a que qualquer das partes for condenada, liquidar-se-á na execução da sentença, quando o seu
valor não houver sido apurado na ação”. O Código de 1973 retirou-o; porém a parte da sentença, a que se alude,
é condenatória, de modo que ou há o peso 4 de executividade ou o peso 3.
Precisa-se de liquidação se ilíquida a dívida; dela não se precisa, se líquida. A liquidação é assunto do art. 603-6
11.

8)PLURALIDADE DE PESSOAS QUE SE DIZEM POSSUIDORAS.

Se duas ou mais pessoas vão a juízo e alegam ser possuidores, estabelece-se dúvida, que, de ordinário, impede a
cognição incompleta a favor de quem primeiro foi a juízo. Seria arriscado provisoriamente manter-se o que
primeiro pediu a proteção possessória, se não tem consigo a coisa. Daí o problema técnico: se alguém se há de
manter provisoriamente, há de ser aquele que alega e prova a tença da coisa, salvo se manifestamente a obteve de
algum dos outros, viciosamente (violenta ou clandestinamente). É isso o que se estatui no sistema jurídico: se
duas ou mais pessoas se dizem possuidores, mantém-se provisoriamente a que detém a coisa, não sendo o
manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso. Aplicando-o, disse a Câmara Cível da Corte de
Apelação de Minas Gerais, a 23 de setembro de 1936 (R. F., 68, 587): ..... o que ensinam os melhores autores é
que a hipótese prevista no art. 500 do Código Civil de 1916 é a de diversas pessoas, dizendo-se cada qual
possuidora. com exclusão das outras. Uma delas detém a coisa, mas há dúvida sobre o seu direito. Se essa
detenção não resulta de um esbulho ou abuso de confiança, o juiz mantém a posse aparente, enquanto não se
apura a quem, realmente, ela cabe”. A fonte do art. 500 do Código Civil de 1916 é o direito posterior ao século
XIII, na Itália (mandatum de manutenendo), em Espanha (initio de interim), em França (recredenticz). Não se
encontra na glosa, mas está em DURANTE e em JOHANNES ANDREA.

9)SE O REINTEGRADO É, AFINAL, VENCIDO. Se, após a reintegração, é vencido o reintegrado, indeniza o
que de prejuízos resultou da reintegração (4.a Câmara da Corte de Apelação do Distrito Federal, 1.0 de dezembro
de 1933, A. J., 31, 235: “Ao possuidor que, depois de reintegrado na posse, eio a perder a demanda em virtude de
sentença judicial, cumpre indenizar os prejuízos que da reintegração, por ele requerida e obtida, resultaram ao
vencedor da ação possessória. Apresenta-se, assim, situação semelhante à do art. 503~
do Código Civil. E sendo exigida indenização pela renda que a coisa produziu, não é possível exigir-se,
cumulativamente, indenização pela depreciação resultante do uso normal”; 5 ~a Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 8 de setembro de 1938, R. dos T., 117, 131; 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação
de Minas Gerais, 5 de fevereiro de 1942, R. F., 90, 776).
Opossuidor, que pede a manutenção ou a reintegração, ou pede desde logo a indenização, ou não na pede. Se a
pediu, não pode o juiz deixar de deferir o pedido, se deferiu o de manutenção ou de reintegração. Se não foi
pedido, não éjulgar extra petita condenar o réu a indenizar. Entende-se implícito o pedido. Surgem dúvidas
quando o juiz deixa de condenar, explicitamente. Aí, não se pode exigir, se a sentença transita em julgado, que se
inclua, como eficácia imediata, ou mediata, da sentença de manutenção ou de reintegração (que é de pesos 4, 2,
3, 5 e 1, na de manutenção; e 3, 1, 4, 2 e 5, na de reintegração), a indenização: é preciso ter havido a condenação,
de modo que haja 4 de executividade (na própria ação, portanto), ou 3, em ação àparte, como é no direito
brasileiro. Se ainda não transitou em julgado a sentença de manutenção ou de reintegração, a que falta a
referência à condenação, não está completa (~ a decisão é menor do que o pedido), e há de alegar-Se em recurso
(cf. ~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 26 de agosto de 1947, R. F., 118, 153).
Durante a posse, pode dar-se que tenha havido dano, ou deterioração da coisa, ou perecimento, pelo qual haja
alguém indenizado, por culpa, ou ainda sem culpa. Se esse solvente ignorava que a coisa não era do possuidor,
ou que era viciosa a posse, ou que sobre a coisa tinha algum direito, está liberado; aliter, se o sabia. Tal princípio
protege o tráfico, a livre atividade da vida. É o mesmo que saber o dever saber. A regra jurídica não concerne
apenas às obrigações ex delicto (KONRAD HELLWIG, Wesen und sub jektive Begrenzung der Rechtslcraft,
423; EDIVIUND MEYER, Die Legitimationskraft des Besitzses nach § 851 BGB., 28 s.).
Nas ações possessórias, se nenhuma das partes prova a posse, o juiz tem de julgar improcedentes a ação e a
reconvenção, mesmo se implícita (6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 5 de junho de 1950, R.
dos T., 188, 118).
O réu vencido na ação possessória tem de prestar o que recebeu.

10)SENTENÇA CONTRARIA, PARA TODAS AS PARTES. Se nenhuma das partes consegue provar a posse,
a sentença, que julga improcedente a ação, deve deixar claro que não reconhece a posse de qualquer dos
litigantes (6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 5 de junho de 1950, R. dos T., 188, 118). Aliás,
se nada diz, não se há de interpretar como tendo reconhecido a posse do réu, o que decidiu foi quanto a não ter
posse o autor.
Todavia essa sentença não dá jus a que se atente contra o princípio Quieta non movere. O juiz pode manter a
tença (Código Civil de 1916, art. 500), ou reintegrar o tenedor, com explícita declaração da razão por que o faz.

11)Novo ESBULHO OU NOVA TURBAÇÃO. A sentença favorável na ação de turbação ou de esbulho não
impede que se proponha nova ação, por outra turbação, ou por outro esbulho (cf. Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 23 de fevereiro de 1931, R. dos T., 77, 527: “O fato de ter sido o possuidor reintegrado não
impede proponha nova ação, versando sobre a mesma coisa, com queixa de novo esbulho ou turbação, pois ao
possuidor é lícito propor tantas vezes ação em defesa de sua posse quantas forem as agressões a ela feitas’~). A
pretensão é outra, embora a mesma a posse e o mesmo o ofensor.
12)HONORÁRIOS DE ADvOGADO. A respeito da inclusão ou não-inclusão dos honorários do advogado no
quanto da indenização, há a tese da inclusão (e.g., 5.~- Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, 17 de
novembro de 1937, R. F., ~3, 99, 3Y- Câmara, 5 de março de 1940, 1?. dos T., 127, 198; í.a Câmara, 14 de
agosto de 1945, 160, 729; 17 de dezembro de 1945, 162, 214; 1.a Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, 3
e 14 de abril de 1947, 167, 654, 168, 669; 3~R Câmara, 26 de julho de 1947, 169, 600; 2.~ Câmara, 5 de agosto
de 1947; 169, 682; 2.0 Grupo de Câmaras Civis, 6 de novembro de 1947, 172, 554; 6.R Câmara, 7 de dezembro
de 1948, 179, 194; 3•a Câmara, 10 de fevereiro de 1949, 179, 118; 6.~ Câmara, 11 de fevereiro de 1949, 179,
115; 1.0 Grupo de Câmaras Civis, 7 de março de 1950, 186, 129); e a antítese da não-inclusão (Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Norte, 3 de dezembro de 1941, R. E., 93, 554; 2.~~ Grupo de Câmaras Civis do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de outubro de 1948, R. dos T., 177, 639). A pretensa síntese só exige que se
apure o dolo. Certa é a tese, não pelos fundamentos que se apresentam nos julgados, mas porque, em caso de
manutenção ou de reintegração da posse, a ação de indenização está em regra jurídica de responsabilidade ainda
sem culpa.
Se a sentença foi concebida em juízo dúplice e manteve ou reintegrou o réu e há condenação à indenização,
incluem-se os honorários (4.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de abril de 1931, R. dos T.,
78, 66; 2.~ Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, 9 de junho de 1938, 115, 289; 2.~ Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 14 de julho de 1938, Justiça, 14, 231:
2.c Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Apelação de São Paulo, 5 de novembro de 1941, R. dos T., 136, 213;
l.a Câmara, 14 de agosto de 1945, 160, 729; 6.~ Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, 10 de junho de
1949, 182, 190; 2.’~ Grupo de Câmaras Civis, 10 de novembro de 1949, 184, 63).
O pedido de honorário de advogado é independente do pedido de indenização por perdas e danos (5.R Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 9 de agosto de 1949, R. E., 133, 136), mas está incluído no de
perdas e danos, se foi feito em geral (1.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de
março de 1950; 2.~ Câmara Civil, 22 de novembro de 1949, R. dos T., 186, 129; 6•R Câmara Civil, 16 de junho
de 1950, 188, 273; 3~R Câmara Civil, 28 de setembro e 14 de dezembro de 1950, 189, 740 e 191, 228; 1.a
Câmara Civil, 1.0 de abril de 1952, 201, 142).
Quanto aos honorários de advogado, incide o art. 20 (antes, havia divergências, e. g., 3•a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 6 de setembro de 1951, R. dos T., 195, 178). Alguns acórdãos partiam do falso
postulado de serem atos ilícitos, scmpre, os atos de ofensa à posse, sem atenderem a que há atos-fatos ilícitos que
a atingem e a que a reintegração pode ser contra o possuidor de boa-fé (e. g., 6.R Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 12 d’~ outubro de 1951, R. dos T., 196, 92; e 1?. F., 143, 296; 18 de maio de 1952, R. dos
T., 202, 221).
Não se pode, a pretexto da natureza dúplice da ação possessória, entender que os honorários de advogado
precisam sempre ser pedidos, ou que eles, ai, nem sempre se devam. No Código de 1973 há a regra jurídica que
estava no art. 64 do Código de 1939. Rege, hoje, o art. 20. Mas temos de admitir que, na ação possessória,
mesmo se o vencido procedera ilicitamente, há prestação de honorários.

Art. 922. É licito ao réu, na contestaçâo 1), alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção
possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor2) 3)•
195
1)AçÃo METIDA NA CONTESTAÇÃO. O Código de 1973 permitiu que o réu, nas ações possessórias, em vez
de apenas contestar o pedido de manutenção ou de reintegração, insira na contestacão a contra-ação possessória
e a ação de inclenização. Não se trata de simples contestação, a despeito de ser nela que se pode incutir o pedido
possessório do réu. Em vez de reconvenção, que seria outro procedimento, o art. 922 estabeleceu a possibilidade
da actio duple~r, mas em contrário. Não havia, de lege ferenda, qualquer óbice a essa atitude do legislador. De
certo modo, apenas estendeu às ações de reintegração da posse o que se estendia a respeito da actio duplex de
manutenção, de que na nota 2) falaremos.
Oautor da ação de reintegração pede que se lhe entregue o que o réu esbulhou. O réu pode contestar: não tinha
posse o autor; não houve esbulho e o autor não perdeu posse, pois que não a tinha. Pode ir além: alegar que
turbado ou esbulhado fora ele, posto que continuasse na posse, ou a tivesse retomado, de mão própria. O que põe
na contestação pode ser acrescentado com o seu pedido de proteção à sua posse e a de indenização pelos
prejuízos que sofrera com a turbacão ou com o esbulho.

2)SE HÁ DUPLICIDADE NA AÇAO DE MANUTENÇÃO; “ACTIO DUPLEX”. No piano do direito


processual, a actio ou era actio simplex ou actio duplex. O principio assente é o de que o exercício da pretensão à
tutela jurídica, com a vocatio in lus, não implicava que o vocado se fizesse autor: a relação jurídica processual é
em ângulo (autor, Estado; Estado, réu), porém a relação não é recíproca. Daí poder o juiz absolver o réu, porém
não condenar o autor. Para que se pudesse e se possa condenar o autor era e é preciso que o réu haja exercido, dc
um lado, a pretensão à tutela jurídica, no direito anterior, reconvindo. Hoje, basta a contra-ação inserta na
contestação (art. 922). Todavia, nos interdicta retinendae posseSsiOnis (L. 10, D., finium regundorum, 10, 1; L.
37, ~ 1, D., ae obligationibus et actionibus, 44, 7), a fórmula permitia que se chegasse à condenação do autor.
Tudo dependia, portanto, da concepção da fórmula (cf. B. WINDSCHEID, Die Actio des rõmischen Civilrechts,
27, nota 3; Abwehr, 40 5.; F. C. voN SAVIGNY, System, VI, 328-330; principalmente, ERN5T ECK, Die
sogennanten doppelseitigen Klagen, 68 s. e 141 5.). As actiones duplices só o eram devido à concepção da
fórmula. Outro é o problema quanto ao direito brasileiro de hoje. i.Existem no direito moderno actiones
duplices? A questão foi assaz discutida para o direito comum e para cada um dos sistemas jurídicos. Escusado é
advertir-se que se tem de pôr no terreno do direito processual e que devemos abstrair do que se argumentava no
direito comum.
O primeiro argumento que se traz a favor de ser duplez a ação de manutenção de posse é o de assim terem
entendido, no direito anterior, alguns juristas, e. g., LAFAIETE Ro]M~GUE5 PEREIRA (Direito das Coisas, ~
19, 61): “Esta ação pertence à classe das duplas ou mistas (iudicia duplicia),isto é, daquelas ações em que o autor
pode se tornar réu, e o réu autor; o que em relação ao presente interdito ocorre de dois modos: a) ou quando o réu
prova que é ele quem efetivamente está na posse, caso em que deve ser mantido nela, sendo o autor condenado
como turbador; b) ou quando prove que relativamente a ele a posse alegada pelo autor é viciosa, hipótese em que
o autor, sendo reputado esbulhador, é condenado a restituir-lhe a coisa” (cf. Corte Suprema, 15 de maio de 1936,
A. J., 43, 366; 3,a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 12 de setembro de 1941, R. F., 89,
140; 5.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 15 de outubro de 1948, 177, 868; 1.a Câmara, li de
outubro de 1950).
Um dos argumentos a favor da duplicidade da ação era tirado da regra jurídica, onde se fala de poder ser
condenada à indenização de perdas e danos qualquer das partes (1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 1.0 de agosto de 1950, em JOSÉ G. R. DE ALCK1VIIN, Repertório de Jurisprudéncia, 1, 130 5.; depois,
a 2Y~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27 de dezembro de 1951, M. F., VI, 104).
Foi um pouco longe no conceituar a duplicidade a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 17 de
dezembro de 1926 (R. dos T., 62, 276), quando interpretou que a sentença que julga improcedente a ação
possessória cria ao autor vencido dever de não mais ir contra o reu. Apenas não se lhe deferiu a petição. A
duplicidade somente pode haver se foi alegado e provado da parte do réu que tinha posse. A discussão em torno
de ser dúplice o juízo éno sentido de se saber se é dúplice, ou se não no é, isto é, se se precisa alegar e provar em
contrariedade que se tem posse, ou se é preciso que se venha com a reconvenção. Não se dispensam de modo
nenhum a alegação e a prova, como se a duplicidade fosse de iure, o que não está nos princípios. A chamada
exceção de posse viciosa é relativa ao autor ou ao réu, pela duplicidade do juízo (2.a Câmara Cível do Tribunal
de Justiça de Minas Gerais, 3 de fevereiro de 1947, R. F., 113, 157); porque a viciosidade é relativa, e não erga
omnes. O art. 504 do Código Civil é regra jurídica de legitimação passiva.
Diante do art. 922, temos de pensar em reconvenção, que. inserta na contestação, se fez contra-ação, ação
contrária àque se propusera, e, em vez de apenas ser “no mesmo processo” (art. 315) e ser julgada na mesma
sentença, se mete na própria contestação (art. 922). Não se trata, portanto, de oferecimento simultâneo “em peças
autônomas”, como se daria com a contestação e a reconvenção (art. 299).

3)SE HÁ DUPLICIDADE NA AçAO DE REINTEGRAÇAO. Há possibilidade de actio duplex na ação de


reintegração. O art. 922 referiu-se à turbação e ao esbulho, de modo que, na ação de reintegração da posse,
também se pode meter na contestação assunto que duplica a ação: na contestação não só se contesta como
também se exerce ação contra o autor da ação de reintegração, que se defende como se o assunto exposto pelo
réu fosse apenas elemento da contestação. Assim, como a respeito da atitude no réu, se a ação proposta foi de
manutenção, o réu faz-se autor, em contra-ação, que apenaS tem a peculiaridade de ser embutida na contestação.

Art. 923. Na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação de
reconhecimento do dominio 1). Não obsta, porém, à manutenção ou reintegração na posse a alegação de
dominio2) ou de outro direito sobre a coisa; caso em que a posse sera julgada em favor daquele a quem
evidentemente pertencer o domínio3) 4) 5)•

1)ALEGAÇÃO DE DOMINIO. Não obsta à manutenção, ou à reintegração na posse, a alegação de domínio, ou


outro direito sobre a coisa. Aí, elide-se, em princípio, a objeção petitória contra a pretensão e a ação possessória,
quer objeção derivada de direito à posse (ius possidendO, quer de direito a praticar o ato de incursão na esfera
alheia (e. g., alegação de que tomou a coisa, ou turbou a posse alheia, em ato de legítima defesa, ou em estado de
necessidade). Todavia, não se deve julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertence o
domínio, se a posse não colide com essa conclusão. No art. 923, diz-se que, na pendência do processo
possessório, é defeso assim ao autor como ao réu, intentar a ação de reconhecimento do domínio. Pergunta-se:
~veda-se (a) apenas que se reconvenha com a alegação de domínio, ou que se meta a contra-ação, inserta,
conforme o art. 922, na contestação, ou (b) que se proponha, noutro processo, a ação declaratória de domínio, ou
a ação de reivindicação? O que se há de entender é que não se pode, pelo simples fato de ter alguém proposto
ação possessória, ficar inexercível a ação de reivindicação, ou mesmo a ação de declaração do domínio, fora do
processo possessório. No processo da ação possessória de modo nenhum se pode propor, com a contestação, a
contra-ação em que se alegue o domínio, ou se meter na petição da ação possessória o pedido de reivindicação,
ou de declaração do domínio. Seria absurdo que, pela simples pendência de ação possessória, que pode ir até o
julgamento de recursos, ficasse o proprietário privado do exercício da pretensão à tutela jurídica.
No art. 923, 1.a parte, diz-se que, na pendência do processo de ação possessória, nem o autor nem o reu pode
propor ação de reconhecimento do domínio. Advirta-se que não havia tal regra jurídica no Código de 1939, nem
no Código Civil de 1916. Vedar-se a quem é proprietário propor ação de reivindicação, ou mesmo a ação de
declaração da propriedade (art. 4.0), inclusive a de usucapião, que é declaratória e, seria nada menos do que se
permitir que alguém, que sabe da próxima propositura da ação concernente à propriedade, entre com a ação
possessória, para que a pendência de tal ação obste ao exercício da pretensão e da ação do proprietário. Na
própria ~ parte do art. 923 se prevê a alegação de domínio e a prova de que evidentemente o domínio pertence a
quem alegou.
Por outro lado, seria de todo inadmissível que A, que e proprietário e foi esbulhado ou turbado na posse própria
não possa propor ação de declaração da propriedade ou de reivixidicação. No próprio art. 923, 2Y~ parte, diz-se
que não obsta. À manutenção ou à reintegração na posse a alegação de dominio ou de outro direito sobre a coisa,
o que está certo; e em seguida prevê dívidas quanto à posse e ter-se de julgar a favor de quem evidentemente é
proprietário. Ora, se, na sentença da ação possessória, se julgou a evidência do domínio, apreciou-se a relação
jurídica de propriedade, declarando-se o domínio, reconhecendo-se. Então, a interpretação do art. 923, 1.a parte,
seria no sentido de se admitir a ação embutida de reconhecimento de domínio e se vedar a propositura lá fora. Se
em tal ação a petição é quanto a propriedade e a posse e está pendente ação possessória, o que pode ser argúido é
haver litispendência (art. 267, V), mas tal pendência de lide apenas seria no tocante à posse.
A oposição da exceptio dominji no juízo dos interditos repugnaria aos juristas romanos. Por outro lado, tem-se
estranhado que se levante tal exceção em processo sumário de manutenção, com o julgamento posterior em rito
ordinário (JOAQUIM GONDIM NETO, Posse indireta, 44). Mais: tem-se argúido que a exceção de domínio
tirarira o caráter possessório da ação. Todas essas considerações são de lege fere nda. Em direito lato, temos a
exceptio domin ii, se evidente a prova contrária à pretensão do possuidor que se diz proprietário. Grave foi que o
autor do Projeto do Código Civil de 1916, e outros, ao seu tempo, tivessem acreditado em que a admissão da
exceptio dominii é conseqúência necessária da teoria de RUDOLE vo~ JHERING: não no é. Lamenta-se que a
exceção de domínio haja entrado em forma de negação: não se disse que se há de julgar com entrega da posse a
favor de quem tem o domínio, o que inseriria no processo possessório a restituição, pela procedência, da
exceção; mas que não se deve julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio.
Portanto: deve ser julgada a posse a favor do que é possuidor próprio e prova a propriedade; deve ser julgada a
posse a favor de quem a tem e pode ser o dono:
não deve ser julgada a posse a favor daquele que, evidentemente, não é dono. Claro que se está a falar da posse
de dono. Todo possuidor imediato, por se supor a mediatidade de outra posse, ou de outras posses, exerce o
poder fáctico sobre coisa que reputa alheia. Isso não quer dizer que o seja. Se A loca a B, com permissão de
sublocar, e B subloca a A, A é possuidor imediato sem ter deixado de ser possuidor mediato, intercalando-se
entre a posse mediata de A e sua posse imediata a posse mediata de B. Por outro lado, se B recebeu de A a coisa,
em locação, mas continuou a ação de reivindicação contra A, vindo a ganhar, a posse de locatário só
correspondia à posse do não-dono, pois dono era o próprio B. Intentou C contra A ação de manutenção, ou de
esbulho, e A alega que tinha e tem a posse e que é dono. ~ preciso que haja prova de que C não é dono, nem tem
posse própria, pois que o é A. Se C propõe a ação contra D, que é locatário, por ter contratado com A, pode D
alegar que C não é, evidentemente, o dono, e não pode o juiz retirar a posse de D. Isso não quer dizer que C não
possa ser possuidor próprio, sem ser dono. Porque a exceção só aproveitou a D. Se alguém se diz dono (no caso,
A), a ação pode ir contra ele, e A terá de provar que C não é dono, e que ele o é. Mas a exceptio dominji não
basta para se reintegrar na posse do dono, que não a tinha. O que C pediu foi a manutenção, ou a reintegração, e
não se lhe defere pedido, por se tratar de possuidor próprio que não é dono e o ofensor foi o dono, ou alguém que
transferiu posse ao demandado.
A priori, são inadmissíveis objeções petitórias contra as pretensões e ações possessórias. Assim, se há direito à
posse, ou à prática do ato de incursão, não é exercível, no possessório, a objeção. O principio é, portanto, o de
não se admitir a reconvenção fundada no petitório (ins possidendi, ou direito à prática do ato), salvo, está claro,
se o autor cumulou a ação possessória e a ação petitória, o que, no direito brasileiro, não se proibe. Alguns
sistemas jurídicos não abrem exceção ao principio (e.g., o Código Civil alemão, § 863); porém outros admitem a
objeção, se o direito à posse se demonstra imediatamente (Código Civil suíço, art. 927: “sofort”, “aussitôt”, cf.
FmTz O5TEI~TAG, Sachenrecht, MAN GMÚR, KOmmentar, IV, III, 2Y- ed., 50), ou somente para o ius
possidendi oriundo do domínio. Não se julga a posse própria em favor daquele a quem evidentemente não
pertencer o doniínio. No direito brasileiro, somente há, portanto, a exceção ao princípio, para a alegação de
domínio, com lus possidendi, provados devidamente, se o réu, acusado de esbulhador, é o que tem o título. Se a
demanda não é pela posse própria, mas por posse imediata perante o proprietário, possuidor mediato, a regra
jurídica não pode incidir.
Para se saber como, na vigência do Código Civil de 1916 e a partir de 1.0 de janeiro de 1974, se hão de aplicar as
regras jurídicas do Código Civil, art. 505, e do Código de Processo Civil de 1973, tem-se de examinar o conteúdo
da~ regras jurídicas, a despeito da similaridade. No art. 505, 1.a e 2.~ partes, diz-se que “não obsta à
manutenção, ou reintegração na posse, a alegação de domínio, ou de outro direito sobre a coisa. Não se deve,
entretanto, julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio”. Tivemos de dar
interpretação do art. 505 que não se chocasse com o sistema jurídico. No art. 923, 2.~ parte, do Código de
Processo Civil, estatui-se: “Não obsta, porém, à manutenção ou à reintegração na posse a alegação de domínio ou
de outro direito sobre a coisa; caso em que a posse será julgada em favor daquele a quem evidentemente
pertencer o domínio”. A diferença maior está no final dos dois textos: o Código Civil estabelece que “não se
deve julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio”. Não estava certo, porque
seria não se poder julgar a posse a quem não é proprietário, posto que possuísse a co5.sa como própria (posse
própria). O Código de Processo Civil apenas dá a preferência à posse do proprietário, se evidentemente o é. Tem
de ter havido dúvida quanto às posses que as partes afirmaram e a alegação de propriedade, que foi
evidentemente provada. Se o autor da ação possessória por posse própria se disse proprietário e não é, pode
acontecer que também não o seja, evidentemente, o réu; e se foi o réu que alegou a propriedade e a posse própria
e provou a posse que tem e não a propriedade, de modo nenhum se pode invocar o art. 923, 2Y~ parte. Em todas
essas espécies, o que importa é saber-se qual das duas partes tem a posse própria. Se o autor não prova a posse,
posto que tenha adquirido a propriedade (aquisição sem tradição da posse), também o art. 923, 2.~ parte, é
estranho ao assunto. Pode ser que o réu tenha pensado que tem a pos.se, em que quer ser mantido, ou que a tinha
e o proprietário o esbulhou. A ação para que o adquirente entre na posse é outra ação: a ação de imissão de posse.
No art. 625, o Código de Processo Civil cogitou da ação executiva para entrega de coisa certa, chamando imissão
de posse a entrega judicial da posse do bem imóvel e busca e apreensão a entrega judicial da posse do bem
móvel. A ação de imissão de posse, que se exerça contra o alienante da propriedade (mais a posse), quer contra
terceiro (e. g., quem passou a possuir bem de que não tinha posse) não é ação possessória, é ação executiva, que
pode ser proposta pelo que tem título executivo judicial (e. g., venceu na ação de condenação), quer tenha título
executivo extrajudicial (cf. arts. 583, 584, 585, II, 625 e 738, III).
No art. 923, 1.a parte, diz o Código de Processo Civil de 1973 que, na pendência do processo possessório é
defeso ao autor como ao réu intentar a ação de reconhecimento do domínio. No art. 505 do Código Civil de 1916
não ze fez tal explícita limitação. Quem propõe ação possessória, ou a pessoa contra quem se propõe, não pode
meter na petição ou na defesa a ação declaratória da propriedade. Isso não significa que não possa alegar o
domínio ou outra direito sobre a coisa (e. g., penhor, usufruto, uso). Se ação de reivindicação (propriedade mais
posse) de modo nenhum é autor de ação possessória, nem o é quem propõe ação (executiva) de imissão de posse,
porque essa não é ação possessória.
2)COGNIçÃO INCOMPLETA NA ACAO POSSESSóRIA QUANTO À ALEGACAO DE DOMINIO. Se o
que se diz titular do jus possiden cli, ou do direito a exercer a intromissão na esfera jurídica alheia, perde a causa,
na ação possessória, isso não obsta a que pleitele no petitório (e. g., reivindicação da propriedade), e ganhe. A
ação de imissão de posse pode vir após a sentença na ação possessória, ou ser proposta antes, ou durante esse.

Não há prevenção de jurisdição, nem exceção de litispendência (sem razão, OTTO WARNEYER, Kommentar,
II, 15). Se o que tem o jus possidendi, ou o direito de intromissão, faz justiça de mão própria ilegal (= não
incluída na regra jurídica permissiva), e, depois, ganha no petitório, a pretensão do esbulhado, ou turbado,
desaparece, absorvida pela pretensão petitória contrária: Petitorium absorbet possessorium. Assim, comprou A
na livraria B o livro, que se lhe haveria de enviar e não lhe foi remetido, apesar de ser identificável o exemplar
(capa azul, edição de 1850); A apanha-o, depois, e diz “Esse é o meu exemplar”; o livreiro B demanda pela posse
e ganha, porque A não pudera fazer qualquer prova da propriedade, no possessorium; A aciona no petitorium e
faz a prova da compra-e-venda, com a transmissão do domínio: a força e a eficácia da sentença na ação
possessória não são óbice à força e eficácia da sentença na ação de reivindicação. Discute-se se é preciso: a) que
essa sentença seja quanto a direito do autor sobre a coisa (E. BRODMANN em G.PLANCK, Komínentar, III, 4.~
ed., 71; KARL KOBER, J. V. Staudingers Kommentar, III, 51; KAIiL MAENNER, Sachenrecht, 148, nota 56;
KCNRAD CosAcx, Lehrbuch, II, 6Y~ ed., 77; FRIEDRICH BUNSEN, Besitzschutz, Archzv fiir Burgerliches
Reeh, 23, 77); ou b) que seja sobre direito do autor sobre a coisa, ou sobre direito fundado em posse mais antiga;
ou c) sobre qualquer desses ou sobre crédito referente a coisa determinada (JOHANNES BIERMANN,
Sachenrecht, 37; LEO ROSENRERO, ,Sachenrecht, 100 s.; OTTO vo~- GIERKE, Deutsches Privatrecht,
II, 254, nota 36; FRIEBRIcH ENDEMANN, Lehrbuch, II, 1, ~ Uú., 232; CARL CROME, System, III, 74;
HEINRICH DERNEURG, Das Bárgerliche Recht, IjI, 3~a ld., 96; W. TURNAU-K. FóRSTER, Das
Liegenschaftsrecht, ~, 3.a ech, 79; MARTIN WOLFF, Das Kecht zum Besitze, 9, e Lehrbuch, III, 49, nota II;
Eiviía SIROHAL, Der Sachbesitz, Jherings Jahrbiicher, 38, 12; E. ROHDE, Studien, XXII, 48). Note-se, quanto
ao crédito, que se supõe ter o credor da posse tido a posse; fora daí, continua, apenas, a obrigação de prestar a
coisa, ou a posse.
Se o locatário, que tomou a coisa locada, perde a ação possessória, a sentença, que lhe reconhece o direito de
crédito à posse, mais a prova, pela sentença anterior, de que a posse (viciosa) estivera com ele, dão o suporte
fáctico do principio Petitorium absorbet possessorium; não assim se só turbara a posse do locador. Essa
explicação supera a divergência entre a) e c). Mais sutil é a espécie em que o virtuoso na ação petitória, que não
pôde objetar com o seu direito à posse, ou à incursão, toma, por mão própria, a posse. Então, pergunta-se se tem
ele a proteção que corresponde ao seu direito á posse (LEo RO5ENBERG, Sache nrecht, 100; FrnEDEICH
ENEEMANN, Lehrbuch, II, 1, 233; ERNST ECK, Vorirage, II, 46; E. 1. BEKKER, Der Besitz beweglicher
Sachen, Jherings Jahrbiicher, 34, 17; E. ROnDE, Studien, 1, 16, e XXII, 49; HUGO KRESS, Besitz und Recht,
342); ou se não se dá a absorção (J.BIERMANN, Sachenrecht, 38; E. BRODMANN, em G. FLANCK,
Kommentar, III, 71 s.; KARL MAENNER, Sachenrecht, 149; E.GOLDIVIANN-H. LILIENTHA.L, Das
burgerliche Gesetzbuch, II, 23; MARTIN WOLFF, Lehrbuch, III, 50; F. KRErZSCHMAR, Sachenrecht, 32;
CARL CROME, System, III, 74; XV. TUENAU-K. FÕESTER, Das Liegenschaftsrecht, 1, 79). Os argumentos
mais fortes são: a favor da absorção, que, se assim não se decidiu, otitular do ius possidendi, que esperasse a
sentença, estaria em melhor situação do que aquele que já a tivesse; a favor da negativa, que o titular do ius
possídendi pode, após a sentença, ter dado a posse, inclusive a imediata. Mas tudo se resolve se, antes de menos
de ano e dia, o esl;ulhador da posse propõe a ação, porque se apura qual a melhor possa

3)SENTENçA “IN PETITORIO”. ~, A sentença ín petitona absorve o julgado do passessorium, ainda que a
sentença tenha sido em ação de medida preventiva ou cautelar? Responderam, afirmativamente, HEINRICII
DERNBURG (Das Burgerliche Recht, III, 96), G. PLANCK (Kommentar, III, ‘71), E. KRETZSCHMAR
(Sachenrecht, 33); negativamente, JOHANNEO BIERMANN (Sachenrecht, n. 7), LEo RO5ENBERG
(Sachenrecht, 100) e KARL KOBER (J. v. Staudingers Kommentar, III, 52). O art. 807 do Código de Processo
Civil exclui a primeira .

4)PossE IMPRóPRIA EXECEÇÃO DE DOMÍNIO. ~ A exceção de domínio pode ser oposta assim ao possuidor
próprio como ao impróprio, se esse afirma que adquiriu de outrem a posse? Responderam negativamente: a 1.a
Turma do Supremo Tribunal Federal, a 31 de julho de 1941 (R. F., 89, 96: ..... a defesa fundada no domínio só é
admissível nas ações possessórias em dois casos: a) quando duas pessoas disputam a posse a titulo de
proprietários; b) quando é duvidosa a posse de ambos os litigantes”); a 2.~ Turma, a 21 de maio de 1946 (108,
72: “A exceptio pra pnietatis, em ação possessória, só é admissível quando as partes disputem a posse como
proprietários e apenas a esse título. Fora desse caso, cumula o possessório e o petitário quem acolhe a defesa de
que se trata”), a 16 de maio de 1947 (114, 337: “A questão dominical só se admite em pleito possessório quando
as partes reclamam a posse a título de propriedade. A querela proprietatis está, então, no fundo da questão
possessória”) e a 27 de junho de 1947 (A. J., 85, 438: “E para our o art. 505 do Código Civil não enegreça a
mácula de uma contradição, é necessário se entenda que a exceptio propnietatís somente é possível na ação
possessória quanto os todos os litigantes pretendam a posse
apenas como proprietários. Em tais casos, a propriedade é o fundamento mesmo da ação possessória”); e a
Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, a 4 de junho e a 22 de junho de 1938 (R. F., 75, 614 e
612). ~ preciso que haja dúvida sobre a posse e tal alegação de domínio não ze aprecia liminarmente, de modo
que a manutenção liminar se rege por outros princípios. Nem o art. 371 do Código de Processo Civil de 1939 ou
o art. 924 do Código de 1973 (cf. Câmara Cível da Corte de Apelação de Minas Gerais, 11 de janeiro de 1936, A.
J., 37, 506), nem o art. 500 do Código Civil são afastados pelo art. 502, 2.~ parte, que só se aplica, em caso de
dúvida, ao se julgar a posse, definitivamente (cf. 2Y~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 24 de agosto de
1947, D. da J. de 5 de outubro de 1949: “A propriedade e, em geral, o titulo, a causa possessionis, podem
considerar-se no juízo possessório, quando se trata da dubia possessio e quando há controvérsia sobre quem é
possuidor. Neste caso, a posse será do proprietário, conforme o art. 505, ou peiteucerá a quem tiver justo titulo,
segundo o parágrafo único do art. 507 do Código Civil”; 20 de julho de 1948, R. F., 121, 114: “Quando é o
domínio o fundamento único do debate possessório e a prova respectiva resplandece sem mácula, éque se aplica
a segunda parte do art. 505, porque, historicamentc, suas razics se prendem ao Assento de 16 de fevereiro de
1786. Na hipótese aludida de fundar-se no domínio apenas o debate possessório, o juiz versa a questão do
domínio forçosamente, porque há de examinar o fundamento da ação possessória. Esse exame não é vedado na
hipótese aludida.
como não o é quando se torna indispensável a verificação do caráter da posse e em casos semelháveis”; 10 de
dezembro de 1948, 128, 443; Tribunal de Apelação do Amazonas, 17 dc setembro de 1946, 114, 468: “A questão
do domínio só tem lugar no juízo possessório como elemento subsidiário para efeito de não se decidir um pleito,
no qual a posse alegada pelas partes não tenha ficado provada, contra aquela a quem evidentemente não pertencer
o domínio”). Não se pode ir ao extremo de se dar por inexistente a regra do art. 502, 2.~- parte, por influência de
jurisprudência hostil à chamada exceptio clominii (e. g., Tribunal de Justiça do Ceará, 24 de fevereiro de 1947,
115, 551, que cita jurisprudência anterior ao Código Civil).
Se o autor alega que adquiriu a posse que tem, não-própria, de outrem, que é possuidor próprio, ou a recebeu, por
sua vez, de possuidor próprio, a exceção de domínio é contra aquele de que derivou a posse, e tem de ser trazido
à relação jurídica processual, para que contra ele se prove que não lhe compete, evidentemente, o domínio. Se,
em vez disso, é o demandado que alega ter havido de outrem a sua posse, posse imprópria, então não precisa ele
trazer à relação jurídica processual o terceiro, basta que faça a prova de que não tem, evidentemente, domínio,
quem alega, como autor, posse própria.
Acertadamente, confirmando sentença do Juiz da 7•~ Pretona, disse a 3•a Câmara Cível da Corte de Apelação do
Distrito Federal, a 11 de agosto de 1927 (R. de D., 85, 591):
“Desta regra não se afastou o nosso Código Civil; ao contrário, reafirmando o direito anterior, estabeleceu no art.
505 que: “Não obsta à manutenção, ou reintegração na Posse, a alegação de domínio, ou de outro direito sobre a
coisa”. Verdade é que o citado artigo reproduziu a doutrina contuia no Assento de 16 de fevereiro de 1786, de
que se não deve julgar a posse a favor daquele a quem, evidentemente, não pertence o domínio. Principio, este,
que não era recebido com igualdade de vistas pelos nossos juristas; ao contrário, havia divergências aventadas,
que não cabe agora reproduzr. Daí resulta que o Juiz do possessório pode conhecer dos títulos, não só quando
atributivos de direitos, como quando simples prova de fato, demonstrando a origem e o caráter da posse, e sobre
eles se fundar a sua sentença. Sobre o primeiro aspecto, como a evidência do domínio deve sobressair do título,
se se der uma contestação específica da sua eficácia legal ou da pretensa atribuição do direito, já não pode o juiz
tomar em consideração o título produzido, para substituir, por presunção de bom direito ou maior probabilidade
de vencer no petitório, a posse de fato, fundamento da manutenção, isto é, fundar-se o juiz em título contestado
para não julgar a posse a favor do possuidor. Desde que estão conjugados no citado art. 505 do Código Civil dois
princípios, um que constitui regra geral de que à manutenção ou reintegração na posse não obsta a alegação de
domínio, e outro, exceção à regra, de que não se deve julgar a posse a favor daquele a quem, evidentemente não
pertencer o domínio, é claro que outra não pode ser a interpretação dada ao princípio da exceptio dominii; do
contrário se chegaria ao absurdo de se presumirem palavras inúteis no texto legal”.
Por isso, provada a posse do autor, e provado o esbulho, não há pensar-se em atribuição da posse a quem tem o
domínio (Câmara Cível do Tribunal da Relação de Minas Gerais, 14 de março de 1928, A. J., VI, 225); nem de
tal incidência se há de cogitar se a posse do autor está provada e não no está a do réu (4 de março de 1933, 60,
252): só se invoca a regra jurídica, que já estava no Código Civil de 1916, art. 505, 2.~ parte, e está no Código de
Processo Civil de 1973, art. 923, in. une, quando é duvidosa a posse do autor (2 de setembro de 1933, 61, 145;
Corte de Apelação do Piaui, 22 de abril de 1937, R. dos T., 109, 289).
Ojulgamento da exceptio dominil dá a manutenção, de certo modo, ao réu, porém não faz coisa julgada material
quanto ao domínio (l.~ Turma do Tribunal de Apelação de Pernambuco, 13 de junho de 1941, A. F., VIII, 180;
2.~ Câmara Cível, 17 de novembro de 1944, 16, 244: “... é bem de ver que essa faculdade não vai além do que é
lógico, qual conceder ao juiz a oportunidade de examinar os títulos de domínio, não para resolver a quem este
pertence, numa ação possessória, mas exclusivamente para descobrir elementos que corroboram a posse, se
conjugada a um dos titulares do domínio”). Precisemos: não se diz quem é dono; diz-se que, de acordo com o
alegado e provado na exceptio dominii, alguém não é dono. Aquele a quem não se dá a manutenção ou a
reintegração fica sem o mandamento ou a execução, porque a sua posse própria não foi devidamente provada e
não é dono.
Finalmente:pode acontecer que réu que alega ter adquirido a propriedade e fez prova de ser titular do dominio,
nunca tenha recebido a posse e quem a tem seja o autor da ação de manutenção, ou quem a tinha é o autor da
ação de reintegração, que foi esbulhado pelo réu, que é dono. Aí,. de modo nenhum se pode aplicar o art. 923, in
une.
5)DÚVIDA SOBRE A POSSE, NAO QUANTO AO DOMÍNIO. A dúvida há de ser quanto à posse do autor e
do réu, não sobre o domínio. Se há dúvida quanto ao domínio do autor, mas houve esbuilio, é procedente a ação.
Se há dúvida quanto ao domínio do réu e do autor, não se pode pensar em que se dê o pressuposto para não se
julgar a posse a favor daquele a quem evidentemente não pertence o domínio, porque o autor ou outrem pode ter
o domínio. Se há dúvida quanto ao domínio do autor, há, necessariamente, quanto ao do réu, e pois a regra
jurídica não incide. Para que a alguém não pertença, evidentemente, o domínio, é preciso que a outrem deva
pertencer; se é evidente que o autor não tem o domínio e o réu talvez não o tenha (= não o tem evidentemente),
toda a questão é no terreno da posse. Qualquer julgado sobre a chamada exceção de domínio é julgado sobre a
afirmação de posse, que, em luta com a afirmação de outra, teve de ser preferida, devido à grande probabilidade
do domínio, com a evidência de que o outro figurante não no tem. Se todos podem ter domínio, nenhum deles
prefere ao outro. O que a lei quer é que somente não vença, na dúvida sobre a posse,
quem, evidentemente, não tem domínio. Se A e E lutam pela posse própria e o juiz tem dúvida a respeito, mas A
evidentemente não é o dono da coisa, prefere-se B, porque B e o dono, e não há só probabilidade de ser dono. A
evidência do não-domínio por parte de A não faz certo o domínio por parte de B, porque, quanto ao domínio, a
dúvida pode ser entre B e C, ou C e D. Alguns intérpretes têm negligenciado, no estudo, a leitura da lei. Nela não
se diz que “não se deve, entretanto, julgar a posse em favor de alguém se a outrem evidentemente pertence o
domínio~~. O domínio pode ser de A ou de B, evidentemente, e A ou B não ter a posse, e até mesmo nem A nem
E a ter ou só a ter imediata, sem ser própria.
A dúvida pode ser quanto à posse, não quanto ao domínio por parte de ambos os figurantes, posto que possa
haver dúvida quanto ao domínio de algum figurante se o outro evidentemente não é o titular do domínio. Aqui, a
probabilidade a favor do figurante não pesa se decidir quanto à posse, porque quanto ao domínio não se decide
na ação possessória. Razão por que é erro o juiz dizer que entrega a coisa a quem evidentemente é o dono, ou a
quem pertence a coisa, se o figurante não tem posse nem nunca a teve.
A dúvida corresponde a poder ser ou não ser possuidor o autor e poder ser ou não ser possuidor o réu; mas toda
medida de probabilidade de uma ou de outra posse é aproximada, e não se precisa de igual probabilidade para
que haja dúvida. O que é preciso é que haja probabilidade assim para o autor como para o réu, sem se exigir que
seja a mesma, quantitativismo que se desgarra das realidades. Se a probabilidade só se refere ao autor, não há
pensar-se em se contar o elemento do domínio para peso na decisão. Se a probabilidade só se refere ao réu, a
ação é improcedente, uma vez que, ex hypothesi, não há probabilidade de que seja possuidor o autor. Tem-se,
portanto, de escusar a forca de expressão com que se enunciou no Tribunal de Apelação do Rio Grande do Norte,
a 9 de outubro de 1939 (R. do T. de A., 1, 427): “A posse caracteriza-se pela prática de atos exterio rizantes do
domínio ou propriedade. E uma vez provados ditos atos, eles e só eles é que devem servir de base para solução
do litígio possessório, sem que se possa recorrer à exceção do domínio. Esta, tratando-se de questão meramente
possessória, só deverá ser invocada quando, em relação à posse, a prova se fizer positivamente tanto em favor do
autor, como do réu” (cp. a decisão do mesmo Tribunal, a 3 de julho de 1940, R. do T. de A., 208). Precisa haver
dúvida, é certo; mas sem que se tenha de pensar em equilíbrio de probabilidades (Câmara Cível do Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Sul, 28 de julho de 1938, 117, 720: “A alegação de domínio só tem lugar quando a
posse de ambos os litigantes é considerada duvidosa, caso em que esta se reconhece em favor daquele cujo
domínio esteja melhor averiguado, ou, em outros termos, quando a prova da posse é conflitante”; Câmara Cível
do Tribunal de Apelação de Santa Catarina, 19 de agosto de 1943, J., 1944, 15).
A regra é a imunidade do possessório à relação petitória. Não se abre, propriamente, exceção, porque a exceção,
que se abre, é apenas para aumentar o peso a favor da probabilidade (2.a Câmara Cível da Corte de Apelação do
Rio Grande do Sul, 3 de dezembro de 1936, Decisões 1936, II, 1171). O esbulhador é condenado a restituir a
coisa ao esbulhado, mesmo se alegou domínio, ficando-lhe salvo o direito de disputar, por ação competente, a
propriedade da coisa. A única exceção é a da 2.~ parte do art. 923 do Código de Processo Civil de 1973, que o
recebeu da 2.~ parte do art. 505 do Código Civil, reprodução do Assento de 16 de fevereiro de 1786 (“não se
deve, entretanto, julgar a posse em favor daquele a quem evidentemente não pertencer o domínio”), o que, no
dizer de TEIXEIRA DE FREITAS, é “interpretação luminosa para não se seguir absurdo visível”; Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Norte, 12 de julho de 1940, R. do T. de A., II, 233).
Cumpre advertir-se em que o dono da coisa só tem por si, na prova das posses, o peso de ter domínio, se a
discussão é sobre posse própria, de parte a parte. Se o autor alega posse imediata (não-própria) ou mediata não-
própria e o réu a posse plena própria ou a posse mediata própria, ou imediata própria, não funciona o art. 923,
2Y- parte, como não funcionava o art. 505, 2.~ parte, do Código Civil, porque as duas posses ex hypothesi,
duvidosas, podem subsistir (cf. 3.a Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, 8 de novembro de 1937, R.
dos T., 107, 206, em termos a técnicos; 5•a Câmara Civil, 3 de junho de 1936, 102, 682: “A alegação de domínio,
nas ações possessórias, somente é admissível quando existem duas posses conflitantes e ambas são invocadas a
título de proprietário”; ~ Câmara, 2 de dezembro de 1936, 107, 259; 5~a Câmara Civil, 3 de novembro de 1938,
117, 573, R. F., 77, 118; 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 30 de novembro de 1943, R.
dos T., 148, 255, R. F., 99, 104).
Mas já advertimos acima que o autor pode, possuidor impróprio, aludir à posse própria de alguém, de quem
houve a sua posse, e a exceptio dominli tem de trazer à relação jurídica o possuidor próprio. Se é o réu que
invoca a posse própria de outrem, precisa haver dúvida entre a posse própria do autor, ou da pessoa de quem o
autor houve a posse imprópria, e a posse da pessoa de quem o demandado houve a sua, para que haja a dúvida
sobre posses, e possa incidir a regra jurídica sobre o domínio.
Provados a posse e o esbulho, ou havendo dúvidas sobre a posse do autor, mas provado o esbulho, isto é, que lhe
tiraram a coisa, tem de dar-se a recuperação, porque, se assim não fosse, o art. 923, 2.~ parte, funcionaria como
permissão de força, ou clandestinidade, por parte dos proprietários, e a

justiça de mão própria só se admite nos limites da lei (cf. 3~R Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo,
17 de abril de 1936, R. dos T., 102, 247: “Essa interpretação é a única que harmoniza o art. 505 com o art. 502 do
Código Civil. Imagine-se a seguinte situação: A tem a posse, B, o dominio. 3, em vez de intentar a
reivindicatória, resolve fazer justiça por suas próprias mãos e expulsa A do imóvel. Este recorre à possessória e E
alega a exceção de domímo, com fundamento no art. 505. Mas A pode responder, vitoriosamente, que o ato de E
não foi mais que um desforço, e o desforço, em face do art. 502, há de ser imediato, e nao passados dias, meses e
anos. A interpretação diversa viria criar uma contradição entre dois artigos da mesma lei: o art. 505 e o art.
502”).
A prova não-plena do domínio, se se pode admitir que
o outro contendor seja o dono, não serve à invocação do art. 923, 2Y~ parte; porque há de não ter probabilidade
de ser dono aquele a que o art. 923, 2.~ parte, não aproveita, e é preciso que prove ser o dono aquele a favor de
quem pese tal circunstância (Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de agosto de 1927, R. dos T.,
63, 311:
“Se nenhuma das partes prova domínio, para cuja discussão se resvalou na ação possessória, não tem lugar a
aplicação do preceito do art. 505 do Código Civil, devendo-se restringir a contenda ao assunto meramente
possessório, julgando-se a posse a favor de quem houver feito melhor prova desse estado de fato”); mas a
evidência, a que se refere o art. 923, 2.~ parte, é a de não ter o domínio o que pleiteia a posse e há de ser posto de
lado, não a do domínio de que só o alega, razão para se não examinar o que disse o Juiz de Direito da Capital de
São Paulo, a 10 de julho de 1939 (71, 573): “A exceção de domínio, oponivel nas ações possessórias, é a que se
funda em domínio evidente, inacessível a dúvidas”; ou a 2.~’ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de
São Paulo, a 19 de fevereiro de 1940 (126, 552); ou a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 5 de
maio de 1931 (79, 600); “A indagação do domínio, nos termos do art. 505 do Código Civil, só é cabível quando
duvidosa a posse de ambos os litigantes, caso em que é ela reconhecida em favor daquele cujo domínio seja
melhor averiguado”. Porque, se há melhor prova, é porque não há evidência quante a não ser dono o sacrificado
pela regra jurídica do art. 923, 2.~ parte, faltando, assim, um pressuposto para se aplicar tal regra jurídica. Certa,
a ~ Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, a 8 de novembro de 1935 (201, 206).
Temos, pois, de assentar, na interpretação da regra jurídica: a) que o primeiro pressuposto necessário é não se
saber ao certo quem possuía e, pois, não se ter provado o esbulho, convincentemente; b) que o segundo
pressuposto necessário é ter-se certeza de que uma parte não tem o domínio, provando-se o domínio da outra;
portanto: pressupostos necessários são haver dúvida quanto à posse, no tocante ao autor e ao réu, e haver prova
de que o autor não é dono, como prova de ser dono, a favor do réu, ou de que o é o autor da ação possessória.
Havemos de prestar toda atenção ao art. 923, em sua concepção mesma, que é diferente da concepção de
quaisquer outros Códigos. A negatividade, com que se compôs a regra jurídica, reduz a pouca probabilidade e
procedência da alegação de não-domínio, com que se apresenta, no sistema jurídico, a chamada exceptio domin
ii, ou a posse evidente do domínio pelo próprio autor da ação possessória.
Daí a Tabela que segue:
A, B. Se não há dúvida quanto à posse do autor, ou do réu, não se há de invocar o Código de Processo Civil,
505,art. 923, 2Y- parte, antes, Código Civil, art. 2Y- parte 2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo,
15 de agosto de 1947, R. dos T., 171, 577; 6.~ Câmara Civil, 22 de outubro de 1948, 178, 769).
Não-G, não-H. Se há dúvida sobre o dominio, quanto ao autor e quanto ao réu, o art. 923, 2.~ parte, não pode ser
invocado 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 18 de março de 1947, R. dos T., 167, 692, que
aliás, a 6 de agosto de 1946, 165, 709, incorrera na alusão a “domínio melhor averiguado”). O juiz precisa estar
convicto de que um não tem, evidentemente, o domínio, e o outro o tem (cognição incompleta!). A chamada
exceção de domínio não é de domínio evidente, mas de domínio, tanto quando dele pode conhecer, em juízo
possessório, o juiz e lhe pareça evidente, porque o que se está a decidir é a posse e somente sobre posse é que há
de versar a sentença (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de junho de 1948, 175, 660), posto
que se lance mão do argumento do domínio para se resolver a favor de uma das partes, devido à duvidosidade da
posse, quer quanto ao autor quer quanto ao réu.
A regra Spoliatus ante omnia restituendus não sofre exceção contra aquele a quem “evidentemente” não cabe o
domínio. O juiz conhece da chamada exceção de domínio, se se trata, está claro, de posse como se proprietário
(aliter, se só imediata ou mediata não-própria), e autor e réu se dizem possuidores, e o réu se diz proprietário, ou
o autor se diz proprietário e o prova, aquele ou esse ser dono. A prova somente pode ser a da regularidade da
aquisição, não-litigiosidade e não-arguição digna de exame no pedido de processo de restituição ou no processo
da reivindicação. Há de constar dos autos a prova da propriedade, sem qualquer ensejo para produção de outras
provas que a dos autos mesmos,inclusive a que vem na articulação da exceção e a acompanha. Quanto a bens
imóveis, essa exceção opera como imissão, se a propriedade advém do autor da ação possessória, e não como
cognição completa do título da propriedade, para que vá a juízo próprio o espoliado, porque, no mais, é
incompleta. Não há eficácia de coisa julgada material na decisão da exceção de domínio, senão para se dizer que
existe título à posse. Nenhuma eficácia tem de decisão desfavorável à nulidade ou anulabilidade do título, porque
o processo é impróprio para essa discussão, e talvez não se haja argúido invalidade; nem de decisão desfavorável
à ineficácia. A decisão, na exceção de domínio, apenas declara que há relação de propriedade e o proprietário,
espoliado ou acusado de espoliador, tem posse do que é seu, enquanto não se prova que o título é nulo, ou
ineficaz, ou enquanto não se lhe decreta a anulação. A maior delicadeza do assunto é a respeito de bens móveis.
Mas o juiz, para se render à prova de que, se o réu tomou, tomou coisa sua, precisa estar diante de provas feitas
nos autos mesmos, ou na exceção, com o requerimento mesmo em que se opôs. Em verdade, essa “exceção” é
pedido de declaração da relação jurídica de propriedade, ação metida na petição, ou ope exceptionis, no processo
possessório. É ação, e obsta a que se restitua ao autor de posse duvidosa, ou ao réu, de posse duvidosa, não-dono,
contra dominum verum.
A exceção ao princípio da restituibilidade existia antes do Assento de 16 de fevereiro de 1786, onde se diz “seria
visível absurdo (o) de se julgar nos interditos restitutórios e nos outros casos ocorrentes no foro a posse àquele
mesmo que pelo processo e evidência dos autos se depreende não ]he deve ser julgada a propriedade”. Apenas,
se não ocorrera violência no esbulho (pro violento dejectore nuíla exceptio aut cunctatio admittatur). Assim, ou
o esbulhador cuidava que a coisa era alheia, quando esbulhou, e só após soube ser sua, e será restituído o
esbulhado, a despeito da posse, pois cometeu delito e o direito seria incoerente, incentivando cs esbulhos (assim,
as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 58, § 1, onde a exceção de domínio apenas era para evitar a pena), ou
sabia ser sua, e prova-o, devendo ser negado o amparo da justiça ao que se diz esbulhado, pois o contendor tinha
a pretensão a imitir-se na posse contra quem lhe transferiu a propriedade, pode ocupar a vacua possesSiO, e a sua
posse, não tendo sido violenta, ato ilícito não foi.
O problema de hoje cifra-se em se saber se se permite que se negue a restituição da posse ao espoliado que foi
desapossado com violência, ou outro elemento, que torne bastante para ser punível e, no plano do direito privado,
gerador de responsabilidade pelo dano (ato ilicito), a turbação ou o esbulho. Ainda aí, o problema cinde-se: A)
se é apenas gerador de responsabilidade pelo dano (ato ilícito), sem ser punível, ou a) o juiz pode negar a
reintegração do esbulhado, pela procedênca da chamada exceção de domínio, que aí opera como se fosse
reivindicatória de cognição icompleta sobre o titulo, e incompleta no mais, podendo deferir, ou não, o pedido de
esbulho, na parte da indenização, ou 1,) entrega a coisa ao dono, sem deferimento possível do pedido de
indenização (solução que elevaria a chamada exceção de domínio à categoria de objeção à ilicitude do ato de
esbulho); B) se o ato é punível e gera obrigação por ato ilícito, o juiz ou a) não pode deixar de reintegrar, nem de
deferir o pedido de indenização, ou b) pode reintegrar, deferindo o pedido de indenização, ou c) não deferindo;
C) se o ato é punível e não gera obrigação de indenizar, ou a) o juiz pode reintegrar, ou b) não pode integrar; e
não pode condenar. Sem essa análise da dejeção e sua sorte no mundo jurídico, de modo nenhum se poderia
chegar a conclusões claras.
A punibilidade do ato e a responsabilidade pelo dano são independentes. A culpa no esbulho e a pretensão à
posse, como proprietário, também o são : o que foi réu na ação de esbulho, e perdeu, não fica privado de ir, com
a ação de reivindicação, contra o autor ganhante na ação possessória. Exatamente essa independência entre
punibilidade e delituosidade civil e entre posse e propriedade torna delicadas as soluções, se não se deixa à
apreciação judicial toda a decisão, o que seria contra os princípios, e não se enquadraria na 2Y parte do art. 923.
A vedação do esbulho é fundada na necessidade de paz pública geral. O direito romano não permitia a mudança
na ordem pública, no tocante à posse, porque invadir as posses enseja grandes tumultos (L. 176, D., de diversis
regulis juris anti qui, 50, 17). A atitude do Estado tem de ser a de punir o esbulhador (ob punitionem et odium
spoliantis) e de atender com tutela jurídica ao esbulhado (ob favorem et commiserationem spoliatí). Não é
preciso que esse atendimento se dê sempre que a punição ocorra: pune-se o esbulho que não causou dano;
ressarce-se o dano do esbulho não punível.
A responsabilidade pelo dano pode ser à parte do deferimento do pedido de integração. Exemplo: o senhorio
esbuIliou o inquilino, que pede a reintegração; durante o processo. finda a locação (nos casos em que não há
prorrogação ou compensação legal de tempo, em virtude de leis emergenciais); o locatário não é restituído à
posse imediata; apenas tem direito às indenizações (MANUEL ALVARES PEGAS, Resolutiones Forenses, VII,
12 5.; Arestos do Desembargo do Porto, 16 de abril de 1676, e da Casa da Suplicação, 5 de novembro de 1676:
“condictionis tempus clapsum est, ad quod taxiquam praeteritum appellatus restitui nom potest”; e concluía, em
sua tenção, o relator do acórdão do Porto: praecedens dominus restitutionem fieri oportere ad fructus et interesse
defluxi temporis, quo appellatus sua locatione uti impeditus fuit”).
A restituição não se dá se o possuidor esbulhado alega posse como proprietário e o acusado de esbulhador prova
que tomou posse e que proprietário é ele (cf. Código Civil suíço, art. 927, alínea 2.a). O Código Civil brasileiro
de 1916, art. 505, 2Y parte, falou de domínio; mas a regra entre noutra mais geral, que diz: “Se o réu prova desde
logo que tem direito que lhe dá pretensão, ou ação, contra o que se diz esbulhado, para reaver a posse, a
reintegração não se dá”. Exemplo: A tomou a C o cão que B lhe roubara, A pode provar que o cão é seu, e a
restituição a C não se dá (assim em velho direito português como perante o Código de Processo Civil de 1973,
art. 923, 2Y~ parte, o Código Civil de 1916, art. 505, 2.~ parte, e o Código Civil suíço, art. 927, alínea 2.a).
Apenas, no art. 923, 2.~ parte, e nos outros textos, só se formulou regra jurídica de prova. Supõe-se dúvida.
Em suma: feita a prova plena do esbulho, não há pensar-se em incidir o art. 923, 2.a parte; se não há prova plena,
então é possível que se componham os pressupostos do artigo 923, 2.a parte.
No tempo em que não cessou a violência, nem a clandestinidade, não houve, ainda, esbulho; está a operar-se. Se
a clandestinidade não cessou, e ela somente tem de cessar para o ofendido, o que tomou a coisa pode aparecer
perante outrem como possuidor e tem a pretensão, porque a eficácia radical da clandestinidade (= elidente da
perda da posse pelo ofendido) e a simplesmente viciante (posse clandestina, por sua origem, embora cessada a
clandestinidade) são relativas.
Dá-se no art. 923, 2.a parte, limitação dos meios de provas. Somente servem os que são evidenciantes.
Naturalmente, hão de ser produzidos quando acompanham a petição, ou quando o juiz ouviu o réu, se é o caso,
ou na contestação. Testemunhas somente servem se produzidas pré-constítuidamente, ou no tempo de ser ouvido
o réu, ou, se a causa seguiu o rito ordinário, segundo os princípios. Perícias somente durante o procedimento
ordinário. Cf. FRrrz OSTERTAG (Sachenrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbueh, III, 3, 2.~ ed.,
54).)
A eficácia da decisão sobre o direito do réu não é a de sentença de cognição completa. Cinge-se à defesa na ação
possessória; não tem, pois, força de coisa julgada material, nem. carga de eficácia suficiente para a coisa julgada
material (FluTz OSTERTAG, Sachenrecht, Kommentar zuni schwizerischen Zi-uilgesetzbuch, IV, 3, 2.~ ed., 53:
“t~ber das Recht des Beklagten wird nicht rechtskrãftig entschieden: es wird nur zur Verteidigung gegen die
Besitzschutzklage in den Streit gezogen”).
Pode parecer que tal invocação de princípio não cabe contra os termos empregados pelo art. 923, 2Y- parte
(verbis “a quem evidentemente pertencer o domínio”). Porém o argumento é fraco: “evidentemente” está ai em
lugar de “manifestamente”; a lei, tropegamente, referiu-se à evidência do domínio do possuidor, que se diz
esbulhado, ou se acusa de esbulhador, e não do possuidor que prove o domínio. A redação ao tempo do Código
Civil, art. 505, 2.~ parte, embora defeituosa, permitia que se atendesse ao todo do sistema jurídico, para que
tivesse senso o que se escrevera.
Quanto ao art. 922, onde há indenização ainda se não houve culpa, o deferimento da objeção de domínio exclui
que se possa condenar, com base no art. 922, o réu dono da coisa: falta o elemento da sentença de manutenção ou
de esbulho. Não assim, se a sentença reconheceu que o réu, dono, fora turbado ou esbulhado. (A aplicação dos
arts. 510 e 519 do Código Civil de 1916, é para as espécies de reivindicação ou de vindicação da posse.)
A acolhida da alegação de domínio, quando esse se prove manifestamente, se prevalecesse ainda contra o
possuidor, que o é sem qualquer dúvida, seria imissão, inserta no processo possessório. Tal brecha ao sistema foi
criticada ao 1 Projeto alemão (OTTo WENIYr, Besitz und Inhabung, Archiv fur die civilistiche Praxis, 74, 153-
159; E. 1. BEKKEE, Der Besitz beweglicher Sachen, Jherings Jahrbucher, 34, 45 5.).
O Código Civil alemão tomou atitude radical, eliminando qualquer objeção de petitório. O Código Civil
brasileiro, que admitiu a objeção de domínio, em se tratando de ação de posse própria, suscita a questão.
Preliminarmente, a imissão de posse exige a legitimação passiva (alienantes dos bens ou terceiros que os
detenham, não os que possuam; antecessores na administração ou representação das pessoas jurídicas, que sejam
tenedores da posse, ou possuidores contra os quais já se possa exercer a ação da pretensão à entrega; antecessores
de mandatários, etc.). A analogia com a imissão de posse excluiria que a pretensão do possuidor manutenível ou
reintegrável pudesse ser afastada pela objeção de domínio. Naturalmente, tal objeção não pode ir contra o
possuidor imediato, nem contra o possuidor mantido ou reintegrado, ou contra o antecessor do objetante do
domínio. Resta problema preciso: se a posse não se origina de esbulho de antecessor do objetante, como se foi
tomada, de boa-fé, a quem a tinha em virtude de título nulo, ou que foi anulado, aprevalece o art. 923, 2.~ parte?
Supõe-se que o requisito da prova evidente esteja satisfeito e provada, com dúvida, a posse do autor, que não tem
vícios. A 2.~ parte do art. 923 mais se refere à ação de reintegração, portanto se o objetante tem a posse. Se a
ação é de manutenção, a objeção de domínio é pertinente, porque seria invocar o réu objetante direito de
propriedade, que ele exerceu, pois que se investiu na posse, de mão própria, ou a pediu pela ação adequada, que é
a de imissão de posse ou a de reivindicação, conforme a espécie. A situacão é diferente daquela em que o réu é
acusado de esbulho e se imitiu, em justiça de mão própria, na posse,
razão por que é de admitir-se, desde logo, a mostrar o seu direito de propriedade. Dito isso, poder-se-ia concluir
que foi a ação de imissão de posse que se inseriu no processo da ação possessória de esbulho, porém com isso
não teríamos respondido à questão, que acima se pôs: a exigência da legitimação passiva, à semelhança da ação
de imissão de posse, deixá-la-ia sem resposta quanto aquela espécies em que o autor da ação de esbulho não seria
legitimado passivo da ação de reivindicação. E aqui está o punctum doliens. O autor da ação possessória pode ter
feito prova da posse, sem afastar dúvida quanto à posse do réu, mas ter provado, evidentemente, o seu domínio.
Se o réu, que poderia ter êxito com a objeção de domínio, não a levantou, ou a levantou sem evidência de não ser
dono o autor, a responsabilidade pelos danos causados pelo réu é a do art. 922.
Não se confunda a objeção de domínio, se o proprietário é arguido de esbulhador e invoca o art. 923, 2.~ parte,
com a exceptio dominii, na condictio possessionis, que não é ação ou remédio possessório: se o réu é proprietário
da coisa, não se pode dizer que possui sine causa veZ ex injusta causa; e, salvo depois da Constituição de
Valentiniano, Teodósio e Arcádio, no ano de 389 (L. 7, O., unde vi, 8, 4), sempre cabia ao proprietário a exceptio
domin ii. Depois, o fato de ter o proprietário feito esbulho importava perda da posse. Não temos, hoje, a regra
jurídica da referida constituição, que, antes do Código Civil, se reproduzia nas Ordenações Filipinas (Livro IV,
Título 58, pr. e § 1), mas já estava em desuso (Repertório das Ordenações, II, 144 s., verbo “Esbulho”, nota d.;
TEIXEIRA DE FREITAS, Consolidação das Leis Civis, nota 22 ao art. 815; LAFAIETE RODRIGUES
PEREIRA, Direito das Coisas, 1, 67).
Oréu pode alegar que tem posse e que é o dono. O autor pode também fazê-lo, por dizer-se possuidor e dono. A
prova evidente de quem é dono exclui que a outra parte possa ser, mas a eficácia disso, na ação possessória, só
tem a consequência de se julgar possuidor quem é o dono se há dúvida quanto à posse, que há de ser, na espécie,
posse própria.
O art. 923, 2.R parte, é regra jurídica que faz suficiente à sentença favorável haver prova não plena de posse mais
prova evidente de domínio, pois a outra parte tem prova não plena da sua posse sem prova de domínio. Surge a
questão de se saber se a) a respeito de alegação de posse não-própria incide o art. 923, 2.~ parte, por analogia, ou
b) se é possível revelar-se, no sistema jurídico brasileiro, regra jurídica que, a respeito de posse não-própria,
corresponda à do art. 923, 2.~ parte. Parece que adotou a) a 1.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São
Paulo, a 31 de julho de 1944, R. dos T., 155, 703; R. F., 103, 90): “O princípio do final do art. 505 do Código
Civil de que “não se deve, entretanto, julgar a posse a favor daquele a quem evidentemente não pertencer o
domínio”, só se aplica quando duas pessoas se apresentam em ação possessória, alegando a posse e o direito de
possuir, caso em que esse direito pode ser apreciado e posto à margem quando evidentemente não existir. Mas, se
o réu não invocou o direito de possuir e sim somente o fato da posse, o que lhe era possível fazer em ação
possessória, <como decidir-sc pelo domínio, afirmando-se que este direito, que nem sequer foi alegado,
evidentemente existe?” Mas a atitude prevalecente do próprio Tribunal de São Paulo é no sentido de o princípio
só se referir à posse própria (além da jurisprudência que já se citou, a 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação
de São Paulo, a 30 de novembro de 1943, R. dos T., 148, 255, R.F., 99, 104; e a 4Y~ Câmara Civil, a 10 de
dezembro de 1944, 1?. dos T., 150, 603).
Se a posse não é própria, é nos princípios peculiares que se há de basear a decisão, porquanto a decisão sem
cognição completa do direito há de apreciar as situações.
Finalmente: a) provado o esbulho ( provada a posse do autor + provada a espoliação), não cabe atender-se à
exceção; b) provada plenamente a posse do autor, não cabe atender-se à exceção, porque provar plenamente a
posse é deixar sem probabilidade a prova da posse do adverso; c) provável o domínio do autor, não cabe atender-
se à exceção, porque a prova do domínio havia de ser evidente; d) se a posse do réu, que sequer provar, ou se
prova, não é própria, também não se atende à exceção.
Convém lembrar o que acima dissemos sobre o demandante, na ação possessória de manutenção ou de
reintegração, que alega ter posse oriunda de outra, própria (e. g., locatário que diz quem é o proprietário), e sobre
o demandado que faz o mesmo. A questão sobre a posse própria vem à balha e pode ser manifestado que o
terceiro de quem o autor houve a posse não tinha, nem tem posse. Em todo caso, para que a exceção de domínio
possa ter procedência, é preciso que haja dúvida sobre a posse imprópria do autor, pois pode o que não tinh:L
posse ter dado ao autor, ou a alguém, entre eles, o ensejo para exercer o poder fáctico, que é a posse, como se
fosse locatário. A procedência da exceção de domínio fica dependente da dúvida sobre essa posse e da dúvida
sobre a posse própria da pessoa a que se atribui a origem da posse imprópria.
Em termos rigorosamente científicos, a alegação de domínio não é exceção, mas simples alegação para peso, a
mais, em caso de provas dúbias. Trata-se apenas de regra jurídica sobre prova. Na dúvida, pesa mais a prova do
domínio como prova de posse, se se prova que evidentemente não pertence à outra parte do domínio. Por isso
mesmo, deve o juiz abster-se de aplicar o art. 923, 2.a parte, se não há os pressupostos necessários.

~,A exceção de domínio somente concerne à ação de reintegração, e não a ação de manutenção? Assim, a l.a
Turma do Supremo Tribunal Federal, a 6 de julho de 1949 (R. F., 126, 450). Não é isso o que está no sistema
jurídico. O que se exige é que a) o autor pleiteie pela posse própria, que b) tenha sido ouvido o sujeito passivo (=
tenha havido angularidade da relação jurídica processual = não tenha sido caso de esbulho que permite a ação
sem se ouvir a outra parte)
e que c) seja evidente o domínio do demandado e o não-domínio do demandante.
Todavia, se A propõe contra B ação de manutenção e nem A nem B faz prova plena da posse, e houve a exceção
de domínio, não pode o juiz deferir o pedido de manutenção contra B, que é dono, se A evidentemente não o é. O
art. 923, 2Y- parte, incide. O que o juiz tem de fazer é invocar o art. 500 do Código Civil de 1916 (possessorium
summariissimum), por obediência ao princípio Quieta non movere.
Se há negação do domínio, com alguns elementos de prova, que precisem de exame (e. g., há certidão do registro
de imóveis e se alega tempo de posse que poderia ser suficiente para a usucapião), não cabe atender-se à
exceptio, porque não é evidente o domínio do mandado.

Art. 924. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse 1)2)5)6) as normas da seção
seguinte, quando intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbuIho 3) 4) 7); passado esse prazo, será
ordinário, não perdendo, contudo, o caráter possessório 8) 9) 10) 11)

1) AçõEs INTERDITAIS. (a) Das ações interditais no prazo legal, a de manutenção, chamda durante muitos
séculos pelos juristas portugueses mczndatum de manutenendo, é acão de mandamento, e não ação condenatória,
ou executiva lato sensu, à base de cognição inicial incompleta, superficial; a condenação, essa, já se opera depois
do mandado, de modo que esse elemento aflui. Alguns juristas a tiveram como de cognição incompleta interina,
confundindo-a com o summariissimum medieval do art. 500 do Código Civil, de que se falou em notas ao
Capitulo V. Diferente é a ação de reintegração.
As ações possessórias têm sido descuradas nos estudos de direito processual contemporâneo, já depois de se
haver iniciado a pesquisa científica do processo. Não há, verdadeiramente, investigações como as que suscitaram
as ações declarativas e as ações constitutivas. A ação de manútenção de posse e a de reintegração são tratadas
sem se atender ao exato lugar que lhes cabe e não é o mesmo na classificação das ações e das sentenças,
segundo a eficácia.
Na ação de manutenção há forte elemento declarativo, mas o elemento executivo é ínfimo: “mantém-se”, apenas;
não se procede a qualquer expropriação, em senso lato, não se invade a esfera jurídica do terceiro. Na ação de
reintegração, o elemento condenatório cresce, o de execução passa à frente do declaratório e do próprio elemento
mandamental. A sentença que reintegra executa. O mandado é aí meio ou instrumento da execução. De modo
que, classificadas as ações pela preponderância da eficácia, como devem ser, as ações de manutenção são
mandament ais, e as ações de reintegração, executivas. As sentenças, naquelas, supõem declaração da existência
da posse, no que se distinguem das ações cautelares de arresto, de seqüestro e de busca e apreensão (por
exemplo), em que o elemento declarativo é fraco, mas o mandado é o elemento, superante, da eficácia, sem que
haja entrada na esfera jurídica de outrem, que pudesse reduzir o mandado a simples meio para a execução. As
sentenças, nas ações de reintegração, retiram o que se achava com o réu e entregam-no ao autor, o que perfaz a
figura da execução. O mandado serve a isso; o mandado, com a simples declaração, não exauriria a eficácia
preponderante da sentença. Porque não prestaram atenção a essa diferença essencial de preponderância do
elemento mandamental ou do elemento executivo, os juristas, ainda os que mais recentemente escreveram na
Europa, não conseguiram exata classificação das ações possessórias de manutenção e de reintegração. Não há
Executo!
na manutenção; há-o na reintegração. Nem Imito!: há isso, sim, na ação de imissão de posse.
(b) As dificuldades de classificar as ações possessórias (reais ou pessoais?) levaram os interpoladores a meter na
L. 1, § 3, D., de interdictis sive extraordinariis actionibus, quae pro his com petunt, 43, 1, a irritante contradição:
Interdicta omnia, licet in rem videantur concepta, vi tamen ipsa personalia sunt” (“... todos os interditos, embora
reais, são pessoais”). As ações possessórias de rito ordinário, isto é, sem mandado inicial, deslocam para a
sentença final a força especifica. Afirmaram que as ações possessórias não são reais, erradamente, o Tribunal da
Relação de Minas Gerais, a 16 de setembro de 1928 (R. dos T., 72, 150), a 2.~ Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Paraná, a 16 de novembro de 1950 (Paraná J., 53, 134), e a 4~ft Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de São Paulo, a 23 de julho de 1942 (R. dos T., 140, 577). Certa, a Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Minas Gerais, 2 de fevereiro e 15 de junho de 1939 (R. F., 78, 547). A ação de indenização, essa,
sim, épessoal, e prescreve no prazo legal (cf. C. G. BRUNS, Die Besitzklagen, 260-263). O interdito unde vi era
ânuo. Havia a exceptio temporis. Depois, o prazo preclusivo passou a ser de um ano e dia (Código Civil art. 523).
A ação possessória ordinária rege-se por princípios posteriores ao direito romano.
A ação possessória de força nova está sujeita ao prazo preclusivo de um ano e dia (art. 924 do Código de 1973).
A ação possessória de força velha prescreve em dez anos, entre presentes, e em quinze, entre ausentes (Código
Civil, art. 177).
É ação real (MANUEL DE ALMEIDA E SousA, Tratado dos Interditos, 217), porque é situação real a posse (cf.
1VIARTIN WOLFF, Lehrbuch, III, 11).
As ações executivas ou são pessoais ou reais. Quando o titular de algum direito real de garantia exerce ação
executiva para extração do valor do bem gravado, a ação dele éreal. Não assim a ação do portador da letra de
câmbio, da nota promissória, ou da duplicata mercantil. A ação do portador do cheque é real. Real é a ação do
portador do conhecimento de depósito ou do warrant, ou da letra hipotecária, ou da cédula real hipotecária ou
pignoratícia.
As ações executivas ou são restitutivas (vindicatórias, possessórias de reintegração ou restitutivas), ou extrativas
de valor. Nos direitos reais de garantia, por exemplo, a ação executiva hipotecária e a ação executiva pignoratícia
são extrativas do valor do bem gravado, e ação do titular do direito de anticrese é só restitutória, vindicativa ou
possessória.
As ações de reintegração são ações executivas reais.
(c) A teoria tradicional distinguia na posse dois elementos: o corpus e o animus. O Código Civil alemão,
rompendo com a tradição, não teve mais em conta o elemento volitivo ou intencional, na noção da posse: o seu §
854 proclamou, em termos gerais, que a posse de uma coisa se adquire pela obtenção do poder de fato sobre essa
coisa. Noutros termos: o poder de fato sobre uma coisa, quer ele tenha sido querido, quer não, é posse. Alguns
comentadores pensavam que a teoria do animus domini, tal qual a concebia F. C. vo~ SAVIGNY, se achava na
noção da posse em nome próprio a título de proprietário, definida no § 827: possuidor a título de proprietário
não é outro que o possuidor com animus domini. Mas JAKOB AUERBAcH (em precioso livrinho, Merkmale
und Bedeutung des Eingenbesitz, Leipzig, 1905, is.) demonstrou que não há, no Código, tal retorno à velha
doutrina do animus domini: o caráter de posse, a título de proprietário, se deduz, não do animus ou vontade
subjetiva do possuidor, mas de circunstâncias exteriores nas quais a posse se estabelece. O que imprime à posse o
caráter de em nome próprio é a causa possessionis, em se tratando de móveis, ou em se tratando de imóveis.
O possuidor mediato pode não ser dono. Tal acontece sempre que o possuidor imediato (usufrutuário, locatário,
tutor, curador) se mediatiza, e. g., se o usufrutuário aluga a coisa, ou o tutor ou curador constitui administrador,
com posse, dos bens. Daí a graduação da mediatividade: posse de dono (a), posse de não-dono (usufrutuário,
enfiteuta) que se exerce como de dono (a’), posse imediata que se conserva tal (b) e posse imediata que se
mediatiza (b’). As posses (a) e (a’) são Eingenbesitz, posse própria; as posses (b) e (b’), posse não-própria,
Fremdbesitz.
Tem-se chamado posse de primeiro grau à posse que vem após a posse imediata, e de segundo, terceiro, ou
quarto grau e assim por diante, às que se seguem àquela (FERDINAND REGELSBERGER, Der gerichtliche
Besitzschutz, Festschrift, 255 s.).
Não é sem inconvenientes esse modo de ordenar as posses:
por vezes é a posse imediata que se mediatiza, criando-se posse mediata, nova, que não existia. A intercalação de
posse mediata entre posses imediatas é rara. O exemplo mais típico é o da constituição de usufruto pelo dono do
prédio que o locara.
Mas a escala de posses mediatas é freqúente.
Não se pode dizer que a posse imediata implique existir possuidor mediato. Apenas implica o fato da posse, o
poder fáctico sobre a coisa, que se compós como se tal posse mediata existisse: o limite é riscado pelo próprio
poder fáctico, ao acontecer, e não pelo contrato, ou, sequer, o fato de existir a posse mediata. Mais aproximado
da exata expressão seria dizer-se que a posse é imediata porque não é mediata. a) Possui D o prédio a, crendo-se
locatário, ou como locatário, ainda sabendo que a pessoa que lhe transferiu a posse de locatário não no era, tem
A posse imprópria imediata. b) No testamento de A, que tinha posse própria mediata, o prédio a foi deixado ao
filho, B (ou a outrem), que por sua vez o dera em usufruto a C. Têm-se, ai, três posses: a de B, posse pró-
pria mediata; a de C, posse imprópria mediata; e a de D,. posse imprópria imediata. c) Se A perdera a posse, e o
herdeiro B não a readquirira, nem C, em verdade só há a posse imediata de D.
Também não traduz a verdade afirmar-se que a posse-imediata depende da vontade de dois possuidores, porque,
então, se desceria à investigação da causa do negócio jurídico de que pode ter provindo a posse, acentuando-se a
atividade do tradens e do accipiens. O que exerce direito de pastagem. ou de pesquisa, criado em lei, não é
proprietário, nem tem posse de proprietário, nem teve negócio jurídico com ele, e no entanto tem posse imediata.
No art. 486 do Código Civil não se aludiu só à posse “por força da obrigação”; aludiu-se à posse “por força de
direito”, o que abre portas a situações possessórias diretas (= imediatas), que se originam de ato jurídico de
outrem que o possuidor mediato, ou de lei. Sempre que é a lei que cria o direito, há posse, derivada dele,. que não
se irradiou de ato jurídico do possuidor nem, sequer, derivou do seu direito.
Posse própria Eingenbesit~, é a posse como de dono, a. posse da coisa como sua. Se o que tem a posse da coisa
como sua tem a posse direta, sem existir outra posse mediata, só ele tem a posse, e a posse é plena. Se há outras
posses mediatas que não a sua, e posse imediata, ou só posse imediata de outrem, o possuidor próprio é o
possuidor como dono, em grau mais alto que o do outro ou os dos outros possuidores mediatos, ou o possuidor
como dono sem posse direta.
Escusado é dizer-se que, a propósito de posse própria,. o direito brasileiro tanto pode abstrair do cor pus quanto
do animus. Pode-se ter posse própria sem que haja qualquer relação material, como pode havê-la sem que o
possuidor pense, sequer, em possuir. Foi difícil à teoria libertar-se da ganga metafísica que, com as teorias
subjetivistas, se formavam em torno do problema. A doutrina alemã coube pré-excluir, diante da atitude do
Código Civil alemão, o animus; à doutrina brasileira, teve a felicidade de pré-excluir o animus e o corpus. O
vicio savignyano foi tão difícil de erradicar-se quanto os de teorias objetivistas que exigiam o cor-pus. Não faltou
quem, após o Código Civil alemão, exigisse o elemento volitivo na posse e, pois, na posse própria (E. 1.
BERRER, Der Besitz bew. Sachen, Jherings Jahrbitcher, 34,,. 33; OTTO vo~ GIERKE, Die Bedeutung des
Farrnisbesit~e5, 4; FRIEDRICH ENDEMANN, Einfiihrung, 153). Raciocinou C~L FRANK (Der Besitzwille,
9): o exercício de poder fáctico é ato,. o ato há de exprimir vontade. Com isso, partia do erro de definir posse
como exercício, quando posse é apenas possibilidade de exercício.
Mostramos que não se trata necessariamente, sequer, de ato-fato. Posse é fato. A senhoria é fáctica; vontade de
senhoria é outra coisa. Não há no conceito de senhoria o elemento vontade (JAKoB AUERBACH, Merkmale
und Bedeuntung des Eigenbesitzes, 14 5.); e pode haver a vontade e a tença, ouL a vontade e a posse não-própria,
sem a posse própria.
Não se deve entender a posse própria como posse de quem é proprietário, porque o conceito de propriedade já é
conceito’ jurídico; não há, no mundo fáctico, proprietários e não-proprietários. Por isso, sem se ser dono, se pode
possuir a coisa “como sua”. (Código Civil, art. 550, verbis “possuir como seu. um imóvel”, e art. 618 verbis
“possuir como sua”). O ser como~ seu ou como sua é conceito do mundo fáctico. Daí o erro em se introduzir, ao
falar-se de posse própria, referência ao animus domini, o que importa descida ao foro íntimo e entrada no mundo
jurídico. O ser como dono, ou o ser como quem sóusa, ou usufrui, ou se serve de alguma coisa, que se possui,
passa-se no mundo fáctico, e tão-só no mundo fáctico (sobre isso, cf. EMIL STEOHAL, Zum Besitzrecht,
Jahrbúcher flir die Dogmatik, 29, 267, e Der Sachbesitz, Jherings Jahrbiicher, 38, 13; J~ucoB AuI~RBAcH,
Merlcmale und Bedeuntung des Eigenbesitzes, 14 s.; GÚNTHER FRIEBE, Ist zum Eigenbesit~ der sogenannte
animus domini erforderlich? 69; contra, ALFRED MANIGK, Die Voraussetzung des Eigenbesitzes, Archiv fiir
Burgerliclies Recht, 25, 317). Qualquer alusão à própria consciência do exercício do poder fáctico, como fez
RUD~OLF KNAUTH (Die Bedeutung des Eigenbesitzes, 14), é contra a teoria possessória do sistema jurídico.
Quanto à prova de que a posse seja própria, o Código Civil de 1916 não contém a regra jurídica do art. 2.231 do
Código Civil francês, segundo o qual “on est toujours presumé posséder pour soi et à titre de propriétaire, s’il
n’est prouvé qu’on a commencé à posseder pour un autre”, não se pode a) extrair do sistema jurídico, que não
lançou tal presunção iuris tant um, regra jurídica semelhante; nem b) a experiência aponta, a respeito, presunção
hominis. Tentou HEINRICH DERNBURG (Das Burgerliche Recht, III, í.~ ed., 43 5.; cf. também JAKOB
AUERBAcH, Merkmale und Bedeutung des Eigenbesit~es, 27) fundamentar a), mas sem convencer (cf. J.
MEIsNER, Das Biirgerliche Recht, 1.a ed., 93). O fato mesmo de constar do registro o nome do usucapiente
(pode ser que haja registro sem se ter transferido a propriedade) não importa para se estabelecer presunção.
(d) Em virtude da saisina, a posse passa aos herdeiros do decujo (Código Civil, art. 1.572). As ações que têm por
fito satisfazer a pretensão a essa posse são ações declarativas (KONRAD HELLWIG, Lehrbuch, II, 239), ou
ações de turbação, ou de esbulho, ou de ameaça, classificáveis segundo a sua espécie. Nas ações declarativas,
fundadas na regra jurídica da transmissão automática da herança aos herdeiros legítimos ou testamentários, a
situação jurídica do réu é semelhante à do possuidor da coisa que se acha, sem ameaça, turbacão ou esbulho, em
terreno ou casa pertencente a outrem.
2) ELEMENTOS EFIcAÇIAIs . O elemento condenatório não chega a ser de ação delitual. As sentenças
proferidas em ação possessória têm efeitos materiais de coisa julgada, mas sujeitas à mudança das
circunstâncias. Cf. notas ao art. 471, 1.
A ação de reintegração de posse é de pesos eficaciais 3 (declaratividade), 1 (constitutividade), 4
(condenatoriedade), 2 (mandamentalidade) e 5 (executividade, com ou sem adiantamento).

A ação de manutenção de posse é de pesos eficaciais 4 (declaratividade), 2 (constitutividade), 3


(condenatoriedade), 5 (mandamentalidade) e 1 (executividade).
A meditação do fato dessas diferenças e a consideração das suas consequências são assaz relevantes para o
conhecimento das duas ações, na teoria e na prática.
Teremos ensejo de pôr o problema dos recursos na açao de reintegração da posse, que é ação executiva real.

3)CoGNIçÃO INCOMPLETA. A cognição é incompleta, superficial; portanto, tem de ser cognição “desde
logo”, para o efeito da concessão, aí anterior à contestação . As duas f ases, a do processo executivo
condenatório superficial e a do processo condenatório definitivo, ressaltam a olhos vistos (sentenças dos arts. 930
e 931). Adiantou-se a prestação jurisdicional; depois, confirma-se, ou não. Aí, a ação é sempre executiva lato
sensu e, em parte, condenatória.
Se há manutenção liminar, ou reintegração liminar, e o demandado ofende a posse, ou de novo a retira ao
demandante, processam-se artigos de atentado (Cf. 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 5 de
dezembro de 1950, R. dos T., 190, 897), de acordo com os arts. 879-881. O Código desconhece o relaxamento do
mandado inicial durante a lide. A cognição foi superficial; não, porém, precária. Se o juiz errou, confessa que
procedeu levianamente, confundindo a cognição superficial com a cognição precária. Só afinal pode ser
convencido.
O acórdão da 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 9 de junho de 1942 (R. dos T., 140,
513), embora confessasse inferir-se da lei o principio da inalterabilidade até à sentença, disse que jem casos
especiais é recomendável a revogação! Absurdo. Os juizes são adstritos as regras jurídicas processuais. Têm
momentos para a cognição ou para as cognições. Não podem dar e desdar à vontade, nem têm arbítrio para
revogar no momento x em que se desconvenceram. Certo, o acórdão da í.a Turma do Tribunal de Justiça do
Espírito Santo, 28 de novembro de 1952 (R. dos T. de J., VII, 496). O art. 506 do Código Civil só se referiu ao
esbulho; o Código de Processo Civil arts. 928 e 929, refere-se~ ao mandado liminar, à manutenção e à
reintegração. Obsoleta, portanto, é a jurisprudência que interpretava a regra jurídica do Código Civil, art. 506, a
contrário sensu, como pré-excludente da manutenção em límine (e. g., Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, 13 de abril de 1925, R. dos T., 54, 125), pois já havia, no Código de Processo Civil de 1939, o art.
371.)
A denegação da medida liminar não obsta a que se prossiga na ação de manutenção ou de reintegração. O que
não se deferiu foi o pedido de medida liminar, isto é, o adiantamento de executividade, dependente de cognição
incompleta. Vai-se até o fim, para que, após completa cognição, favorável ou não, se defira, ou se indefira,
definitivamente, a manutenção, ou a reintegração. O requisito de menos de ano e dia da turbação ou violência só
entende com a medida liminar, não com o pedido de manutenção ou reintegração. De modo que, deferido, ou
não, o pedido de medida liminar, há o resto do pedido, que se tem de julgar, e há de promover-se a citação do réu
para contestar o resto do pedido, que é o principal. Não há, na sentença final, “confirmação” do despacho que
deferiu o pedido de medida liminar: se houve deferimento, a sentença final completa a cognição, julgando
procedente, ou não, a ação; se não houve, a sentença final encontra campo livre sem ter de reapreciar o que
desprezou,.salvo como elemento que “consta dos autos”. Sem razão, o acórdão da 3~R Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro, a 29 de novembro de 1951, que deixou de atender aos princípios acima expostos.

4) REcURsO. As duas fases caracterizam, nitidamente, a propósito do recurso.


Do despacho que defere ou que indefere o pedido de manutenção liminar ou de reintegração liminar não cabe
recurso (1Y~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 19 de maio de 1949, R. dos T., 191, 936; Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Ceará, 15 de fevereiro de 1951, J. e D., 1, 41; ~ Câmara do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 13 de setembro de 1951, 1?. dos T., 196, 301), nem reclamação (Conselho de Justiça do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal, 21 de setembro de 1948, R.F., 130, 145; 21 de janeiro a 3 de março de 1949, 126, 147
e 148; 31 de julho de 1950 e 24 de abril de 1951, 134, 462, e 137, 117), nem agravo de instrumento, com
intervenção, hoje, do art. 522, § 1.0 (2.a Turma do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, 18 de janeiro de 1950,
R. dos T., 188, 919; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 23 de novembro de 1950, Paraná J., 53,
193), nem, pois, qualquer recurso (Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, 4 de setembro e 3 de
novembro de 1952, J., 1953, 26 e 341).
Do despacho que defere ou indefere o pedido de manutenção liminar ou de reintegração liminar não cabe
mandado de segurança, salvo se, sob color de manutenção ou reintegração liminar, se ofendeu algum direito
certo e líquido: não se pode, a priori, dizer que é intentável (e. g., Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justk
a do Rio de Janeiro, 14 de maio de 1952), ou que o não é (e. g., 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são
Paulo, 7 de fevereiro de 1950, R. dos T., 185, 134; Tribunal de Justiça de Pernambuco, 18 de fevereiro de 1952,
A. F., 30, 349; ~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 25 de maio de 1951, R. F., 138, 474).
Observe-se que a petição foi de ação de manutenção ou de reintegração. A petição não foi indeferida; o juiz
apenas não determinou que se expedisse o mandado. Se indeferiu a petição, é diferente: cabe apelação.

5) LEGITIMAÇÃO ATIvA. A ação possessória é ação real. O cônjuge, para intentá-la, precisa de assentimento
do outro (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de junho de 1948, R. dos T., 176, 175).
Se os bens são comuns, autores são ambos os cônjuges. Um não tem de assentir. Ambos têm de consentir. A
figura jurídica, então, é a de co-litigantes, e não a de litigante com assentimento do cônjuge. Se há julgamento
favorável, vencem os dois; se é desfavorável o julgamento, perdem os dois.
A pretensão à proteção possessória que tem o possuidor imediato ou o possuidor mediato não-próprio é
independente da pretensão do possuidor próprio. Por exemplo: o depositário, a que se turbou ou esbulhou a
posse, tem a ação possessória, sem precisar de qualquer colaboração do dono da coisa, ou de quem o nomeou
depositário.
O herdeiro pode reclamar de quem, em virtude de invocação de direito de herança, que não existe, adquiriu a
posse, que lha restitua. Reclama o direito, mais a posse. Reclama-Se, então, a universitas juris.
Reclamando a universitas iuris, não importa se o que nela se acha é suscetível de posse ou não; porque a herança,
por si, é bem imóvel (Código Civil de 1916, art. 44, III); cf. LuDwIG ARNDTS R2rrTER vo~ ARNESBERG,
Gesammelte civilistisch.e Schriften, II, 480; RUDOLE LEONHARD, Der Erbsch,aftsbesit~, 12; sobre a
dificuldade da construção, ARNOLD LEINWEBER, Die hereditatis petitio, 7; JosEF SCHAEF’EE, Ver-
gieich zwischen Sachbesitz uná ErbschaIt5beSit~, 14 s.). A ação é real, ainda que haja elementos obrigacioflais
como bens da universitas iuris (RUDOLE LEONHARD, Der Erbschftsbesitz, 148; EMIL STROHAL, Das
deutsche Erbrech.t, 2~a ed., 551; G. PLANCX, Kommeflt ar, V, 223). A sentença não tem efeitos contra
pretendentes da herança que não foram partes.

6) LEGITIMAÇÃO PASsIvA. Legitimado passivo, na ação possessória, qualquer que ela seja, é o que ofende
ou ameaça ofender a posse. Não importa se o turbador ou esbulhador foi pessoa física, ou se foi pessoa jurídica,
inclusive o Estado (Supremo Tribunal Federal, 17 de novembro de 1920, 56, 302).
Se o autor do esbulho, ou da turbação, é absolutamente incapaz, a ação há de ser proposta contra o representante
legal. Se é relativamente incapaz, a ação tem de ir contra ele~ com a assistência do titular do pátrio poder, tutela
ou curatela. O acórdão da 4Y~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 16 de fevereiro de 1931 (R.
dos T., 17, 515), que admitiu a ação contra o titular do pátrio poder, por ser “responsável pela vigilância do
mesmo, máxime tendo havido reclamação por parte do ofendido”, foi contra os princípios. Isso não significa que,
a pretexto de velar ou administrar bens do incapaz, o representante legal do incapaz não seja,. em verdade, o
esbulhador ou o turbador.
A distinção entre serem os atos ofensivos manifestamente inconstitucionais ou ilegais, ou não, é sem pertinência
(sem razão, Supremo Tribunal Federal, 6 de junho de 1930, 55, 315, e 28 de agosto de 1936, A. J., 43, 194; 5Y~
Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 10 de dezembro de 1931, R. E., 57, 473; í.a Câmara
Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 14 de dezembro de 1943, 98, 406):
não há gradação da inconstitucionalidade, ou da ilegalidade; o ato é ou não é contrário à Constituição, ou à lei.
Por outro lado, os chamados atos de polícia podem ofender a posse, e não há preexcluir-se, aí, a proteção
possessória (Supremo Tribunal Federal, 17 de novembro de 1920, R. E., 56, 302, sobre -a ação possessória contra
o Poder Público: “Ao Judiciário reservou-se a competência de, nos casos sujeitos à sua apreciação, e sempre que
o Poder Público ou qualquer particular desconhecer ou negar um direito fundado na Constituição, ou em leis
ordinárias, amparar o prejudicado, sob forma processual apropriada à espécie, obstando a continuação dos efeitos
do ato, ou condenando o violador a repará-lo, se a intervenção não chegar a tempo de o impedir ou deter.
Admitir-se o contrário importaria em deixar-se sem eficiência e alcance o cânon constitucional invocado, e em
proclamar-se o ressurgimento dos tempos em que a vontade do soberano se superpunha ao direito do indivíduo,
situação de todo incompatível com a atual e jurídica concepção do Estado mo,derno, definida pelos códigos das
nações cultas e fartamente desenvolvida nas lições dos melhores publicistas”; 5~a Câmara Cível da Corte de
Apelação do Distrito Federal, 30 de abril de 1936, R. dos T., 114, 745; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Minas Gerais, 11 de maio de 1942, 143, 273; sem razão: 2.R Câmara da Corte de Apelação de São
Paulo, 15 de dezembro de 1934, R. dos T., 96, 419; 3.~ Câmara Civil, 8 de maio de 1936, 104, 525; 2.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de abril de 1949, 180, 629). O que importa saber-se é se há
contrariedade a direito no ato da administração pública e conseqtiente ofensa à posse. Se há tal contrariedade
(Tratado de Direito Privado, II, ~ §182, 2, 188-190), há proteção possessória contra o Estado (União, Estado-
membro, Distrito Federal, Território, Município), sem ter pertinência a distinção entre atos iure imperii e atos
não exercidos ratione imperii, porque tanto uns quanto outros podem ser no exercício contrários a direito e
ofensivos à posse. Nem é de admitir-se que se permita a regulamentos, decretos e leis preexcluir-se a proteção
possesória em matéria de atos administrativos, tese que revela leituras de países insuficientemente desenvolvidos
na técnica constitucional, nem preexcluir-se a proteção possessória, nas espécies que se apontem. Primeiro, é
preciso, que a lei nunca o decreto, o regulamento, a portaria possa permitir, diante da Constituição de 1967, com
a Emenda n. 1, a incursão do Estado na esfera jurídica alheia. Segundo, se tal incursão é compatível com os
princípios constitucionals, é de mister que se tenham respeitado, na incursão, os limites que a lei traçou (= não
haja exercício irregular de direito). Terceiro, que se não pretenda elidir a tutela jurídica assegurada no art. 153, §
4~o, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1. Não basta a alegação de interesse público, ou de utilidade
comum, tais argumentos servem à desapropriação por utilidade pública, segundo o art. 153, § 22, 1~a parte, da
Constituição de 1967, com a Emenda n. 1 e as leis, e não para a usurpação ou a turbação. Fez bem a 2.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 4 de fevereiro de 1949 (R. dos T., 179, 821), em afirmar a proteção
possessória contra atos policiais: “O possuidor injustamente desapossado, pela polícia judiciária, de objeto que
diz ser de sua propriedade e que fora apreendido sob a alegação de ter sido furtado, tem ação de esbulho contra o
poder público e o suposto proprietário, conjuntamente”. Também é protegível, possessoriamente, a posse
ofendida pelo Estado, que toma posse, a seu líbito, do terreno em desapropriação (2.a Câmara Civil da Corte de
Apelação de São Paulo, 21 de agosto de 1936, 104; 469; 2Y~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo,
8 de junho de 1948, 175, 654). A 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 27 de agosto de 1946
(166, 215), julgou que o desvio ou modificação do trecho da estrada municipal, por ato discricionário (1) do
poder público, não pode ser obstado pelos particulares por meio de ações possessórias, mas tal acórdão foi
contra direito, em princípio e in casu.
Os remédios jurídicos possessórios são exerciveis contra a União e as entidades estatais, paraestatais e
autárquicas. Não se pode exigir, que, para deles se valer o possuidor turbado ou esbulhado, tenha de ser
“manifestamente inconstitucional ou francamente transgressor da lei” o ato ofensivo (e. g., Supremo Tribunal
Federal, 6 de junho de 1930, R. E., 55, 315, e 28 de agosto de 1936, A. J., 43, 194). N~ há ato mais
inconstitucional, ou menos inconstitucional. Os adjetivos “manifestamente” e “francamente”, que aparecem em
certos julgados, mostram que a incerteza é subjetiva. O ato ou é inconstitucional, ou não no é. Ou é legal, ou não
é legal. Tais questões são quaestiones juris.
A manutenção e a reintegração contra a União, o Estado-membro, o Distrito Federal, o Território e o Município e
mais pessoas jurídicas de direito público não podem ser em límine da lide, sem prévia audiência (Código de
Processo Civil de 1939, art. 371, parágrafo único, que passou ao Código de 1973, art. 928, parágrafo único; 2.~
Turma do Supremo Tribunal Federal, 17 de setembro de 1948, R. E., 125, 438; Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Santa Catarina, 28 de setembro de 1944, J. do T. de A. de S. C., 1945, 78; Tribunal de Apelação do
Rio Grande do Sul, 15 de outubro de 1947, R. F., 120, 202). Está explícito, hoje, no art. 928, parágrafo único,
como antes já estava.

7)POSSE E ATO5 JUDICIAIS. Atentos a sistemas j uridicos estrangeiros, que ora admitem a proteção
possessória contra atos das autoridades públicas, inclusive judiciais, ora não no admitem, a jurisprudência tem
posto o problema como seria de pôr-se noutros sistemas jurídicos. Para a tese da admissibilidade, vem à tona, de
regra, J. P. Moi~n’oii (La PossesMon, 2.a ed., 205 5.) e EMIL RAVIART (Traité théorique et pratique des
Actions possessoires, 3.a ed., 114 5.; 5.~ ed., n. 125); para a antítese da inadmissibilidade, o que escreveu,
a propósito de julgado português (Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, 15 de dezembro de 1922), Luis DA
CUNHA GONÇALVES (Tratado, III, 589 5.). O Supremo Tribunal Federal, a 20 de julho de 1916 (R. de D., 44,
78), ficou com a antítese; e, a 19 de julho de 1936, reafirmou-o, mas o argumento de que lançou mão o relator
(ministro CARLos MAXIMILIANO) foi de nenhum valor: citou ele a CARL CROME (System, III, § 352, nota
32), mas aí não se disse (III, 70) que não se admite procedimento possessório contra ato judicial, apenas se disse
que não cabe contra execução forçada regular (ordnungsmãssige Zwangsvollstreckung). Tampouco estearia o
julgado da, Corte Suprema a citação de ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Da Posse e das Ações possessórias, 281
5.). O que escreveu o jurista citado só se referiu à penhora (nova edição, 281; 1.a ed., 265): “Não é, porém, lícito
à parte, que julga iminente uma penhora em seus bens, requerer a juiz diferente que lhe conceda mandado de
manutenção contra ela, por mais fundado que seja o seu direito de excluir da penhora a esses bens. E, conquanto
isso se tenha entre nós praticado algumas vezes, deve cessar esse absurdo processo, pelo qual um juiz se julga
autorizado para proibir a outro de igual categoria que exerça a sua atribuição de decretar penhoras, e de conhecer
de embargos a ela, como entender sob a sua responsabilidade. O meio jurídico a se empregar, em tais casos, é
outro; é deixar fazer a penhora, opor-lhe, segundo as hipóteses, embargos do executado, ou de terceiro senhor e
possuidor, ou finalmente de terceiro interessado”. Na ed. de São Paulo, de 1901, há prefácio dos editores, e não
do autor, e aparecem notas que não foram do punho do autor. Assim a nota j) à p. 282 que dá notícia de decisão
da Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, a 3 de março de 1898, que preexcluiu mandado de
manutenção de posse contra atos judiciais (R. de J., II, 423).
No que respeita às medidas constritivas, sejam de segurança sejam executivas, a ofensa à posse por ato judicial
de que caiba recurso, com eficácia para, provido, reintegrar a posse ou a manter, ou contra o qual caiba remédio
cuja sentença favorável tenha eficácia para a recuperação ou manutenção da posse, é evidente que no direito
brasileiro não cabe a ação possessória, nem outro remédio jurídico processual que saia da estruturação mesma
das ações e do processo. Se, porém, do ato judicial não cabe recurso com que se possa chegar à recuperação ou
manutenção da posse, ou remédio jurídico cuja sentença favorável aí chegue, não se pode deixar desprotegido o
possuidor turbado ou esbulhado pela Justiça. Não se precisa explicitar que, se o membro do Poder Judiciário, e.
g., o Presidente do Tribunal, pratica ato de administração que ofende a posse ameia, tal ato administrativo se trata
como o de qualquer outro administrador público, devendo-se, pois, invocar os mesmos princípios.
O mandado de segurança também não se admite, de regra, contra decisões judiciais para as quais haja recurso, ou
haja recurso que possa afastar a ofensa, ou não haja remédio cuja sentença tenha tal eficácia, ou não possa ser
corrigido por via de correção, eficazmente. (Lei n. 1.533, de 31 de dezembro de 1951, art. 5.0: “Não se dará
mandado de segurança quando se tratar: II, de despacho ou decisão judicial, quando haja recurso previsto nas leis
processuais, ou possa ser modificado por via de correição”.)
A propósito das medidas constritivas, de que acima se falou (e. g., arresto, seqüestro, penhora), cumpre observar-
se que só se não admitem as ações possessórias, de que estamos tratando, porque o sistema jurídico previu ações
possessórias especificas, como são os embargos de terceiro possuidor (artigos 1.046-1.054). Esses embargos
podem ser de senhor e possuidor, ou de titular de algum outro direito que não seja o de proprietário e possuidor,
ou somente de possuidor. Os embargos de terceiro possuidor são possessória específica. Nos embargos de
terceiro senhor e possuidor, há cumulação de ações.
8)PossE, PRÉ-CONTRATO E CONTRATO. Os pré-contratos de compra-e-venda têm dado ensejo a questões
de posse, sem que se haja aprofundado convenientemente o estudo da matéria. Vimos, por exemplo, o Juiz da
6.R Vara Cível do Distrito Federal, a 3 de julho de 1946 (R. de J. B., 72, 85), dizer que o pré-contraente
comprador comete esbulho desde o momento em que deve devolver a coisa, embora ainda não resolvido o pré-
contrato: “Deve-se ter como verdade jurídica assente que o esbulho começa no momento em que é infringido o
contrato, negando-se o possuidor direto a assinar a escritura definitiva e a pagar o restante do preço. Desde que se
nega a restituir o imóvel condicionalmente, claro que comete esbulho”. No mesmo sentido, a 2.~ Câmara Civil
do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 6 de julho de 1930 (R. dos T., 75, 98). Para a 3~a Câmara Civil, a 18 de
setembro de 1931, o esbulho “começa no momento em que é infringido o contrato, negando-se o possuidor direto
a receber a escritura definitiva, a pagar o restante do preço, bem como a restituir o imóvel condicionalmente”
(79, 539); idem a 12 de novembro de 1937 (112, 668). A Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, a 22
de maio de 1935, foi além, porque se tratava de contrato de compra-e-venda a prestações: “Rompido o contrato,
por falta de pagamento de prestações, é lícito ao proprietário que se julga esbulhado pedir reintegração na posse
da coisa entregue ao promitente-comprador” (98, 220). Em tudo isso, o que ressalta é meter-se na ação
possessória, que é ação executiva, nada menos que ação constitutiva negativa, para resolução do pré-contrato, o
que a 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 19 de abril de 1949
(R. dos T., 180, 629), não disfarçou.
Não há pré-contrato se o possuidor deu a outrem a tença da coisa por entender que o outorgado o compraria. Aí,
não há posse, mas tença por tolerância, ou cortesia. Então, se o outorgante não mais quer vender, ou se o
outorgado não mais quer adquirir, pode o outorgante revogar a dação de tença e reclamar o bem. Se o outorgado
o recusa, comete esbulho (l.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, 12 de setembro de 1947, R. dos T.,
181, 421).

A l.R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 9 de setembro de 1946 (R. dos T., 165, 761), a 2.R
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 20 de novembro de 1948 (178, 771), a 4~R Câmara Civil, a
27 de junho de 1949 (17, 327) e a 6.R Câmara Civil, a 18 de outubro de 1949 (183, 720), admitiram,
explicitamente, a reintegração da posse, independente da resolução do pré-contrato por inadimplemento, se o
outorgado reconheceu que deixou de pagar as prestações e a falta permite a resolução. Com isso inseriram em
ação possessória, especial, nada menos que ação de resolução por inadimplemento (Código Civil, art. 1.092,
parágrafo único). É preciso não se confundir o caso do pré-contrato de alienação com o caso do comodato. O
comodante pode pedir a restituição da coisa quando queira. Se o comodatário se recusa a entregar-lha, comete
esbulho, pela mutatio causae possessionis (cf. 2.R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 4 de
dezembro de 1945, R. dos T., 159, 787). Tal é também o caso do empregado doméstico que se recusa a desocupar
o cômodo que se lhe entregara por ser empregado e enquanto o fosse, desde que cessou a prestação de serviço
(4.a Câmara, 5 de dezembro de 1945, 161, 248). A 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 9 de
junho de 1950 (R. dos T., 188, 648), julgou o esbulho praticado por empregado doméstico do locatário que,
terminada a locação, pretendia continuar na casa; mas aí era evidente a ofensa à posse do locador. Aliter, se o
contrato foi por tempo determinado e o empregado não o deu como distratado. No pré-contrato de alienação, há
negócio jurídico que precisa ser distratado, ou resolvido, para que deixe de ser. Bem assim, tratando-se de
contrato de trabalho, quer industrial quer agrícola, que haja de ser resolvido, ou distratado (l.R Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de são Paulo, 4 de novembro de 1946, 166, 315). Se há locação, a ação adequada é a de
despejo.
Se há parceria agrícola ou parceria pecuária, há entrega de posse imediata, ficando ao parceiro inativo posse
mediata.
Se termina o contrato, ou se foi decretada a invalidade, a ação possessória cabe para haver o parceiro, possuidor
mediato, a posse imediata. A resolução por inadimplemento ou outra causa de terminar o contrato, que dependa
de sentença, não permite a ação possessória; essa somente seria de propor-se após o trânsito em julgado da
sentença. Aliás, com a ação de resolução, ou de denúncia vazia ou cheia, pode cumular
-se a ação de entrega da coisa, que é de restituição da posse imediata (petitória!). É irrecusável que, cessando a
parceria pela expiração do prazo (l.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 9 de setembro
de 1947, 1?. F., 125, 523), pode ser usada a ação possessória se o parceiro ativo se recusa, por esbulho, à entrega
da posse imediata (mutatio causae possessionis!).
A parceria agrícola concerne a regra jurídica, segundo a qual, se o parceiro outorgado não quer continuá-la, tem,
dentro do prazo legal, de avisar o parceiro outorgante, de modo que só se dá esbulho se transcorrido o prazo legal
atendido, se for o caso, ou a regra jurídica segundo a qual se, indeterminado o prazo, é ele de uma colheita. Por
isso mesmo “ao proprietário parceiro não é lícito, no correr do prazo de seis meses, dado para desocupação do
imóvel entregue por tempo indeterminado, propor ação de manutenção, com reintegração liminar, contra o
colono, sob a alegação de que estava plantando e preparando o terreno para novas plantações, dilatando assim o
prazo do contrato” (3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de julho de 1931, R. dos T., 80,
481).
Em geral, se há contrato, é preciso que tenha distratado, resolvido ou perdido toda a eficácia, para que se possa
caracterizar o esbulho (5.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 6 de setembro de 1933, R. dos T.,
90, 509). Tratando-se de parceria agrícola, a ação a ser usada é a de despejo, e não a possessória (Código Civil,
art. 1.414; 3~R Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de maio de 1948, R. dos T., 174, 656).
Tratando-se de parceria pecuária, a ação é possessória (Código Civil, art. 1.416). Todavia, se o parceiro agrícola
se diz possuidor próprio, em vez de apenas se recusar à entrega, pode ser proposta a ação possessória.
A 2.R Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo7 a 22 de fevereiro de 1949 (R. dos T., 180, 227), disse
que, “com a extinção da sociedade locatária, se resolve o contrato de locação, cabendo reintegração de posse
contra os que, como sucessores da pessoa jurídica extinta, permanecem no prédio
Se houve sucessão, pode haver alguma questão sobre continuação do contrato, ou renovação; de modo que, além
de poder ter havido prorrogação, é possível que se trate de locação, desaconselhando-se, portanto, salvo esbulho
que se possa provar, a ação possessória.
O que comprou, ou por outro modo contratou a aquisição da coisa, não tem ação possessória para havê-la.
Tratando-se de bem móvel, é preciso que já tenha havido a tradição, laclusive pela brevis manus, ou pelo
constituto promissório; tratando-se de bem imóvel, é de mister o acordo de transmissão da posse, que se há óbice
ao exercício do poder de fato dá a pretensão imitiva, ou, se sobrevém esbulho, ou turbação, a ação possessória.
A 4.a Câmara Civil da Corte de Apelação de São Paulo, a 19 de fevereiro de 1936 (R. dos T., 122, 521), decidiu:
“A ação possessória não compete ao proprietário e sim ao possuidor, não valendo alega~áo de posse pro
emptore, que se não adquire por simples efeito do titulo de transmissão”. A redação do julgado foi defi&ente e
defeituosa. Nas escrituras públicas de compra-e-venda de imóvel costuma-se juntar ao contrato consensual a
declaração de acordo de transmissão da propriedade e da posse, e isso nos vem de séculos de boa heuremática
portuguesa. Se a escritura pública examinada pela 4•ft Câmara Civil continha os dois acordos, o de transferência
da propriedade e o de transferência da posse, aquele depende, para a eficácia real, Je registro, porém não esse,
que é um dos “modos de aquisição em geral”. A 4~R Câmara Civil baralhou conceitos (contrato consensual de
compra-e-venda, acordo de transmissão da propriedade imobiliária, acordo de transmissão da posse).

9)AçÃo DE ESBULHO CONTRA TERCEIRO. A ação de esbulho é fusão do direito romano com o direito
canônico, que se entronca no pseudo-Isidoro. Temos, pois, de partir dos textos legais, sem lhes querer outra ajuda
histórica que aquela que cada filão romano e canônico pode dar. Não compete só ao possuidor próprio; compete
a qualquer possuidor que foi espoliado, trate-se de posse própria, ou não, seja mediata ou seja imediata.
MANUEL MENDES DE CA.srao (Practica Lusitana, II, 240) longe já se ia nesse caminho (e. g., a favor do
usufrutuário, do comodatário, do condutor, do cessionário).
A exceptio spolii do Decreto de Graciano era puramente processual. Fez-se ação, a actio redintegranda, a actio
srpolii. A essa altura há toda uma fusão de institutos, como se pode ver em GIovANNI FAvENTINO, à C. III, q.
1, em HuGúcIo, AzÃO e STEPHANUS DE TOURNAY (cf. F. MAASSEN, Zur Dogmengeschichte der
Spolienklage, Jahrbuch des gemeinem deu~tscheiz. Rechts, III, 229 s.; AzÃo, Quaestiones, 82). O que nos
interessa é a ação ex c. Saepe contingit, que não é a Redintegranda, e apenas serve de traço de união entre o
interdito unde vi e a Redintegranda. Havia todas as opiniões para a legitimação pass va da ação spolii. A chicana
e a falta de caráter dos clérigos, práticos e canonistas chegaram aos extremos. A ação era contra o terceiro, e não
só contra o sucessor.
“O possuidor”, diz o Código Civil, art. 504, “pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o
terceiro,que recebeu a coisa esbulhada, sabendo que o era”. Preliminarmente, advirta-se em que não se estabelece
no art. 504 alternativa. O possuidor pode intentar a ação de esbulho e a de indenização, ou qualquer das duas,
separadamente. Se o terceiro adquiriu a posse, sem saber que houvera esbulho, a sua posse é justa. Ao dono da
coisa ou ao que tem direito sobre ela somente resta o petitório, tratando-se de bem móvel. Tratando-se de bem
imóvel, a transcrição do acordo de transferência é que transferiria a propriedade e, se isso não foi feito, cabe a
reivindicação. O que se disse sobre bens imóveis também se entende a respeito de bens móveis cuja propriedade
só se transfere com registro.
A ação contra os terceiros, sucessores universais, ou sucessores singulares, ou apenas possuidores posteriores,
équanto ao que a eles foi, “in id quod ad eos pervenit” (ULPIANO, L. 1, § 48, D., devi et devi armata, 43, 16),
ou que, por seu dolo, não lhes foi, “dolove malo eorum factum est, quo núnus perveniret” (PAuLO, L. 2).
MANUEL GONÇALVES DA SILvA (Commentaria, II, 7 e 10), na esteira dos seus antecessores AGosTINHO
BARBOSA, TOMÉ VAZ, ANTÔNIO GOMES e MANUEL MENDES DE CASTRO, deu aos textos a
interpretação que mereciam. ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Da Posse e das Ações possessórias, 276), traduziu-
o mal ou repetiu-o de outrem que o traduzira mal. ULPIANO não aludiu, de modo nenhum, a locupletamento, e
sim ao que veio aos terceiros, ao que eles adquiriram, ao que a eles passou, “in id quod ad eos pervenit”; e
PAULO, ao que, por fato deles, a eles não veio. A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 3 de dezembro de
1946 (R. F., 110, 416), citou o trecho duplamente errado de ANTÔNIO JOAQUIM RiBAS, e nele se apoiou.
Não se distingue no sistema jurídico, ai, o sucessor universal, ou o singular; mas devemos entender que não se
cogita do sucessor mortis causa, porque a esse se refere outra regra juildica. O herdeiro e o legatário do
esbulhador, que recebe a posse, respondem pelo esbulho e pela indenização, embora
dentro das forças da herança. Assim, a regra jurídica romana caiu em sistema jurídico que a modificou. Aliás, já
antes a havia modificado, de frente, a interpolação justinianéia de “ceterosque successores” na L. 1, § 48: “Ex
causa huius interdicti in heredem et bonorum possessorem ceterosque successores in factum actio competit in id
quod ad eos pervenit”. Não se tratava de responder pelo enriquecimento injustificado. Para isso, havia a
condictio, que não era possessória, e na qual o réu podia alegar a propriedade (C. G. BRUNS, Das Recht des
Besitzes, 27; Die Besitzklagen, 185; A. BOLZE, Einige Quellenstellen zur Lehre von den Condictionem, Archiv
fiir die civilistiche Praxis, 79, 206).
No texto da L. 1, § 48, há interpolação de “ceterosque successores”, o que mostra a dilatação de legitimidade
passiva. ~Simples explicitação, ou extensão? A segunda solução é que é a verdadeira.
Quanto à extensão a que chegou o Código Civil, de 1916, que não empregou, sequer, a expressão “sucessor”,
mas “terceiro”, a ação não vai apenas contra o esbulhador e seus herdeiros, mas contra os terceiros que
conseguiram a coisa, sabendo do esbulho. Assim está, com raízes no falso Isidoro, no Concilio Lateranense
(1215) e em Inocêncio III (cap. 18, V, de rest. spol.) 2, 13: “Saepe contingit, ut quod spoliatus iniuste, por
spoliatorem in alium se transíata, dum adversus possessorem non subvenitur per restitutionis beneficium spoliato,
commodo possessionis amisso propter difficultatem probationum iuris proprietatis effectum. Unde, non obstante
iuris civilis rigore sancimus, ut si quis de cetero scienter rem talem receperit quum spoliatori quasi succedat in
vitium co quod non multum intersit, praesertim quoad periculum animae, iniustae detinere ac invadere alienum,
contra possessorem huiusmodi spoliato per restitutionis beneficium succurratur”. Discutiu-se se, pela ratio legis,
a ação podia ir contra o terceiro, que não houve a posse por ato do espoliadOr ou seu sucessor (contra, C. G.
BRUNS, Die Besit~klagen, 246; afirmativamente, K. ZIEBAR’rI!, Die Reallexelcution, 260 s., e B.
WIND5CHEID, Lehrbuch, 1, 9.~ ed., 834). A solução certa é a de se abstrair da derivatividade da posse pelo
terceiro. Não só se abstrai da sucessão. Só se exige que o terceiro seja de má-fé; e isso não interessa quanto aos
sucessores a causa de morte, legítimos ou testamentários, porque existe regra jurídica suficiente, de si só, para se
entender que o pressuposto da má-fé não se exige aos herdeiros e legatários, uma vez que a posse eles a recebem
com os seus caracteres.

Quanto à prova, a regra jurídica, que Inocêncio IV, nos comentários às Decretais, lançou, foi a de que, alegado e
provado pelo autor ter sido possuidor, incumbir ao réu alegar e provar que o é e ser possuidor de boa-fé,
permaneceu por muito tempo (cf. C. G. BEUNS, Der Besitz im Mittelalter, 223 5.); mas a doutrina hodierna
surgiu (C. G. BRUNS, Die Besitzklagen, 251; B. WIND•5CREID, Lehrbuch, 1, 9.~ ed., 834; contra, OTTO
BAnE, Urteile des Reichsgerichts, 47; HEINRICE DERNBURG> Pandekten, 1, 7.a ed., 440, 8.~ ed., 317).
Note-se a concordância entre o art. 504 do Código Civil brasileiro e o § 858 alínea 2.R do Código Civil alemão,
que se refere ao herdeiro e ao adquirente que conhece o vicio da posse do antecessor (Vorgãnger). A ação vai
contra o adquirente spolii conscius, e não só contra o sucessor spoiii conscius. A redação do texto brasileiro de
1916 foi melhor porque não permite dúvida.
MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, II, 10 e 9) deixou perceber que já se entendia legitimado
passivo o terceiro, posto que falasse, às vezes, e era de esperar-se que falasse, de sucessor. Mais claro, MANUEL
MENDES ~E CASTRO (Practica Lusitana, II, 241). J. H. A TELES (Doutrina das Ações, ed. 1918, 202) não
empregou a expressao sucessor Assim, a ação é de propor-se contra o terceiro, sucessor• ou não, se de má-fé (~
sabendo que a coisa fora esbulhada), e tem os pressupostos da ação de esbulho intentada contra o esbulhador.
Não se presume a boa-fé, nem se exige que seja evidente a boa-fé, como pretendeu o Supremo Tribunal Federal,
a 30 de dezembro de 1948 (R. F., 122, 418). Nada obsta a que se estenda ao terceiro a ação proposta contra o
esbulhador (cf. ~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 19 de novembro de 1940. R. de J.
B., 49, 293).
O ônus da prova da boa-fé cabe ao réu, terceiro, porque ao autor incumbe alegar e provar a posse, que tinha, e o
esbulho. A afirmação do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, a 27 de agosto de 1947 (R. F., 117, 514),
sobre caber a prova do esbulho ao autor, está certa, porém não há a favor do terceiro, que tem consigo a coisa
esbulhada, a presunção de boa-fé Q,onde está isso no direito brasileiro?), e tem ele de provar que adquiriu a
posse, de boa-fé. O autor já alegou e provou a sua posse e o esbulho. Se o terceiro recebeu a coisa esbulhada,
havendo razão para ignorar o esbulho, então, sim, é improcedente a ação (3.a Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 25 de março de 1931, .1?. dos T., 78, 250; Câmaras Civis Conjuntas da Corte de Apelação
de São Paulo, 25 de novembro de 1935, 104, 317: “O art. 504 do Código Civil (de 1916) faculta ao possuidor
intentar a ação de esbulho ou de reintegração de posse, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa
esbulhada, sabendo que o era. Tudo, nesse assunto, se resume, pois, em última análise, em mera questão de fato:
verificar se o terceiro sabia que a coisa era esbulhada. O acórdão recorrido e os apontados como divergentes não
firmaram, nem podiam firmar, tese contrária à do mencionado dispostivo legal; o que eles fizeram foi,
justamente, aplicando esse dispositivo, examinar o fato da existência de má-fé do terceiro adquirente. E, para este
efeito, recorreram aos diversos meios regulares de prova, entre os quais figuram as presunções comuns”). Quem
foi esbulhado tem de alegar e provar a posse, que tinha, e o esbulho; ao réu alegar e provar que a proteção
possessória contra ele não cabe (LEO ROSENBERG, Sachenrecht, 69). A boa-fé tem de ser verificada no
momento da aquisição da posse; a má-fé posterior não prejudica (G. PLANCX, Kommentar, III, 1, 4Y ed., 59).
Se não há relação jurídica de locação, como se a casa era ocupada pelo empregado, em razão do emprego (6.a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de junho de 1950, R. dos T., 188, 648; 4•ft Câmara Civil,
1.0 de fevereiro de 1951, 192, 660), cabe a ação possessória, e não a de despejo. A relação jurídica entre o dono
da casa ou o possuidor e o empregado é ou a de emprego ou trabalho, se o alojamento é compreendido no
ordenado ou salário, ou é a de comodato, se não é compreendido no ordenado ou salário, e sim gratuita a dação
(6.a Câmara Civil, 7 de dezembro de 1951, 198, 136; R. de D., 15, 83; cf. 18 de abril de 1952, R. dos T., 202,
201; LR Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 2 de setembro de 1952, R. F., 146, 375).
Contra o comodatário, a ação, que há de propor o comodante, se aquele não restitui o bem comodado, é a de
reintegração de posse (cf. 4~R Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 26 de maio de 1950, R. dos T.,
181, 387; 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 30 de março de 1950, R. F., 132, 471), e não
a de despejo; ou é a ação de comodato (actio commodati).
Se o locador impede atos do locatário, no tocante à posse imediata do bem, como se tenta restringir ou restringe o
uso, cabe ao locatário a ação possessória (8.R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 17 de
março de 1951, D. da J. de 12 de setembro). E o locador tem-na contra o locatário que, sem o seu consentimento,
realiza ou vai realizar obras (1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 10 de julho de 1950).
Contra quem se diz sublocatário, a despeito de haver proibição, legal ou negocial, de sublocação, cabe a ação de
reintegração de posse, porque o locatário, que não pode sublocar, não pode dar posse imediata a outrem, e
mediatizou, assim, a sua posse. No mesmo sentido, a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 2 de junho de
1950, a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, a 12 de abril de 1943 (J. e D., VII, 18), a 1.a Turma, a 17
de junho de 1950 (R. F., 135, 436), a ~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 23 de março de 1950
(R. dos T., 186, 96), a 2.R Câmara Civil, a 27 de junho de 1950 (188, 289), e a 6.a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal, a 6 de abril de 1951 (D. da J. de 8 de dezembro de 1951). Sem razão a 5.~ Câmara
Civil do Tribu-. nal de Justiça de São Paulo, a 3 de março de 1950 (R. dos T., 185, 792), que permitiu cessão do
contrato de locação, sem declaração de vontade do locador, e negou a reintegração pedida pelo locador. O
sublocatário, ameaçado ou esbulhado pelo sublocador, tem a ação possessória contra esse (2.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 1.0 de agosto de 1950, R. dos T., 188, 767).
É inegável a existência da ação possessória por ameaça de ofensa às servidões de trânsito, se o título proveio do
possuidor do prédio serviente, ou da pessoa de que o possuidor o obteve, entendendo-se que a servidão não
aparente, descontínua, se faz aparente com obras visíveis e permanentes, que a exprimam ou provem a sua
existência (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 11 de abril de 1950, R. dos T., 186, 756; 5~R
Câmara Civil, 15 de setembro de 1950, 189, 411, por existir estrada carroçável; 2.~ Câmara Civil, 7 de agosto de
1951, 194, 829, que, aliás, erradamente, preexclui a possibilidade de esbulho de servidão; Câmaras Reunidas do
Tribunal de Alçada de são Paulo, 22 de outubro de 1952, 207, 383; 1.a Câmara, 17 de junho de 1952, 204, 510).
Se pré-contraente comprador adquiriu pode, porém incorre em mora, e, pois, em resolução do pré-contrato, o que
dá ensejo a ação de restituição, tem o pré-contraente alienante, após o cancelamento do registro do pré-contrato
(em se tratando, por exemplo, de lotes, após O Cancelamento da averbação, Decreto-lei n. 58, de 10 de
dezembro de 1937, art. 14, ~ 3.0), pretensão a haver a posse do bem. Pergunta-se:
cabe-1he a ação possessória de reintegração de posse se o pré-contraente moroso não entrega o bem de que
conseguira a posse? Sim, se houve a resolução de que cogita o art. 14, ~ 3.<~>, do Decreto-lei n. 58, ou se
transitou em julgado a sentença na ação de resolução e se procedeu à formalidade registrária. Antes, não. A
jurisprudência que não diz isso, ex;licitamente, é perigosa, pelos erros a que pode levar (e. g., 1.a Câmara Civil
do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de maio de 1950, R. dos T., 187, 704; 3•~ Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, 1.0 de junho de 1950; 2.~ Câmara Cível, 19 de janeiro de 1951).

10)SERVIDOR DA POSSE, LEGITIMADO PASSIVO. O poder láctico que exerce o servidor da posse não é
posse, isto é, não é o poder fáctico, a que se chama posse. Há o alter, que é o possuidor. Todavia, esse poder
fáctico para outrem aparece como posse sem no ser, porque, de regra, consiste em exercício da posse (cf. WILLY
HESS, Der Besitzdiener des ~ 885 BGB., 29; BRUNO OPPENHEIM, Begrifi und Stellung des Besitzdieners, 18
s.); mas a concepção social do poder fáctico atende ao que em verdade é, e não à aparência, de modo que se
limita o conceito, atendendose à relação fáctica entre duas ou mais pessoas que se distribuem o poder fáctico em
posse e serviço da posse. Não há uma só espécie de serviço de posse, de modo que o próprio poder fáctico que se
deixa ao servidor da posse varia (cf. M. UNGERER, Der Schutz des Besitzes, 23, sobre governante>. A posição
do servidor da posse cria-lhe deveres, que podem ser invocados pelo reivindicante, ou pelo vindicante da posse.
Há o direito de reapoderamento (Wiederbemiichtigungsrecnt, WILLY SCHMELZER, Selbstchutz des Besitzers,
3), por parte do proprietário, ou possuidor, a que se tirou a posse, direito que se pode exercer em justiça de mão
própria, se se observa o Código Civil, art. 502, ou judicialmente. Na L. 3, § 9, D., de vi et de vi armata, 43, 16,
IJLPIANO não se refere a qualquer moto próprio ou alheio do ofensor. Há o direito à reintegração. Há os meios
petitórios da posse (e. g., de quem perdeu, e a quem foi furtado o bem smóvel, cf. FRANZ ScHIMANsICI, Die
Anspriiche aus friiheren Besitze, 53 s.; WILHELM GIESE, Besitzrechtsschutz, 20 s.) e da propriedade.

11) CoMPassE E DEFESA. Na com possessio pro indiviso, a defesa dos réus ou. vai contra todos os que se
dizem com-possuidores, ou contra o autor que não é compossuidor, ou consiste em afirmar-se que o réu é
compossuidor e for tratado como se não fora, ou que é compossuidor e não ofendem a composse dos autores ou
do autor. Pode também consistir na afirmação de que não há compossessio pro indiviso, mas sim com possessio
pro diviso; ou diferentes graus de posse (posse mediata, posse imediata), e não compossessio (na mediatidade e
na imediatidade da posse nenhuma composse há, mas gradação, cf. R. EHLERT, Der Mitbesitz, 4; confusão em
SIEGMUND KLEIN, Der mittelbare Besit~, 41, e outros, antes de se precisarem os conceitos, o que levou a
erros graves).
A composse teve, no direito romano e no direito germânico, outros fundamentos que a concepção das posses
graduadas (e. g., Gewere comum, OTro VON GIERKE, Das deutsche tGenossenschaftsrecht II, 951, “pão e sal”
communiter sine divisione). A certo momento pensou-se em “partir-se” a vontade (?), e não a tença (cf.
GUSTAV RÚMELLIN, Die Teilung der Rechte, 104; ANTON RANDA, Der Besitz, 304; P. STEINLEÇBNER,
Das Wesen der juris communio, II, 12), o que era inadmissível subjetivismo.
Toda quota diz respeito à relação jurídica interna entre compossuidores, e depende de ser fáctica para se tratar
como posse, isto é, no plano fáctico (vindicatio partis, vindicação de posse de partes). Pode bem ser, por
exemplo, que haja chave com ou sem haver composse (e. g., o possuidor e o servi dor da posse). Se há poder
fáctico igual, que se tenha como posse, e duas ou mais pessoas o têm, com a mesma chave ou~ chaves iguais, há
composse (RIESSER, Das Bankdepotgesetz, 17; P. ADLER, Die Banlcdepotgeschdfte, 30 5.). O art. 488 do
Código Civil pôs fim à controvérsia sobre a proteção da posse dos compossuidores entre si (cf. HEINRICH
WILKE, Die Klagen der Mitbesitzer gegen einander, 1 5.).
A proteção possessória aos condôminos ou comuneiros (co-proprietários, co-usuários, co-usufrutuários, co-
enfiteutas, co-titulares de direito de penhor ou de anticrese) não diz respeito apenas à comunhão pro diviso da
posse. A exigência de se tratar, sempre, de posse de parte divisa possuída (e. g.~ 1.a Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 19 de junho de 1951, R. dos T., 194, 223), “individuada e de uso exclusivo” (3.a Câmara
Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 12 de janeiro de 1952, Paraná J., 55, 32), “parte certa e precisa”, “em
locais distintos da coisa comum” (3.a Câmara Cível, 13 de dezembro de 1952, 57, 320; cf. 2.0 Grupo de Câmaras
Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, 10 d’~ agosto de 1950, e 3•R Câmara Civil, 17 de novembro de 1949,
R. dos T., 185, 203), foram dizeres que não têm fundamento. Se o caso é de sociedade personificada, os sócios, a
que não se atribui posse dos bens sociais, não se podem ter por esbulhados pelos outros (3.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 10 de fevereiro de 1949, 1?. F., 123, 479).

Art. 925. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor, provisoriamente mantido ou reintegrado na posse,
carece de idoneidade financeira para, no caso de decair da ação, responder por perdas e danos, o juiz assinar-
lhe-á o prazo de cinco (5) dias para requerer caução ‘) sob pena de ser depositada a coisa litigiosa 2) 3)
1) CAUÇÃO. O art. 925 estabelece a caução ao preceitado ou destituído da posse quando contesta, está,
entendido (art. 930) ‘ se falta idoneidade financeira ao manutenido, ou reintegrado, para responder pelos
prejuízos que a ação possessória, em que o autor for vencido, der causa. É a caução para evitar o seqüestro da
coisa, de que se trata, por exemplo, no caso de serem duvidosas todas as pessoas, e compreende outros casos,
como o se o prédio emprazado vier pertencer a duas ou mais pessoas, como substitutiva do seqüestro, ou não. O
juiz pode seqúestrar a posse: a) se há risco de rixa grave, antes de se decidir definitivamente a ação possessória
(ob timorem seandali); b) no caso de serem duvidosas todas as pessoas; e) se houve resolução judicial, a respeito
da mesma posse, que penda de conflito de jurisdição entre o seu prolator e o juízo que concedeu o mandado de
manutenção ou de integração “provisória” (cf.ANTóNIO DE SOUSA DE MAcEDO, Decisiones, 164). Os
velhos juristas, para aludirem à substituibilidade do seqüestro pela caução, diziam que era “a medicina do
seqüestro” somente executada onde a lei manda fazê-la por interesse de outrem que o caucionando. Resta saber
se cabe o seqüestro quando o autor não pode prestar a caução. A resposta está no artigo 925, mas somente para a
espécie de que trata.
Na fase de elaboração do Projeto do Código de 1939, ALVARO MENDES PI1~ENTEL (Observações, 100)
notou, e bem, que a regra jurídica de então, que está, hoje, no art. 925, contém restrição de classe: “somente os
abastados poderão gozar da reintegração initio litis”.

2)SEQÍ.YE5TRO E CAUÇÃO. O juiz não é adstrito a deferir, sempre, o pedido de caução, porque a caução
depende de ser duvidosa a sorte da coisa em mãos do manutenido ou esbulhado e do êxito da demanda. Aliás,
sempre que há perplexidade do juízo, ou se só em obediência ao dever de decidir penderia para o deferimento
(art. 930), se usa, desde séculos, o seqüestro e, pois, em substituição a ele, a caução, ou vice-versa (MANUEL
DE ALMEIDA E SoUsA, Tratado dos Interditos, 146). Caução ou seqüestro só se levanta depois de ter a decisão
passado, formalmente, em julgado.

3)SEQÚE5TRO CONVENCIONAL. Se autor e réu convencionaram seqüestro (seqüestro convencional, que é


negócio cumulativo de guarda + obrigação de entregar a quem vença a demanda), vale. A apresentação dele
torna sem aplicação o requerimento ou o deferimento da caução, ou o seqüestro judicial, que é o depósito da
coisa. Tem os mesmos efeitos o depósito cumulativo, que é o negócio convencional de guarda para entrega
posterior a um dos depositantes ou a todos. Se a entrega devia ser a um deles, que ocorreu perder a questão
contra ele, após a entrega, se executa o mandado do art. 924. Se tal convenção foi anterior à ação, não exclui a
ação ou as exceções, por ser inválida a cláusula Solve e repete em que importaria tal eficácia do negócio
plurilateral de depósito ou de seqüestro.
O mesmo raciocínio tem cabimento no caso dos arts. 932 e 933 (interdito proibitório) -

SEÇAO II
Da manutenção e da reintegração de posse 1)~8)

1) PROTEÇÃO INTERDITAL. A origem dos interditos romanos prende-se à paz quanto à terra, à proteção da
pessoa ou das coisas contra a violência e o arbítrio. São marcos, que o historiador ainda vê, da ascensão do povo
romano, antes de chegar à curva que o levou ao artifício, à depravação, antes de demonstrar a sua impotência
para resolver os problemas humanos que lhe competiam. Dois milênios mais tarde, pôde o homem tentar outras
fórmulas da vida, com o habeas-corpus inglês e as doutrinas sociais dos séculos XVIII e XIX. Longe já se estava
dos interditos para a proteção da liberdade e dos status familiae, da democracia grega e do movimento igualitário
cristão. A. STÕLZEL (Jahr~nicher flir die Dogmatik, VIII, 147) tentou provar que todos os interditos protegiam,
na origem, a pessoa, e só indiretamente a coisa; mas incorria no erro de cindir a pessoa e as suas necessidades,
para acentuar essas, tal como outros exageraram a proteção às coisas. Os interditos, no fundo, serviam à vida, à
vida tal como exsurgia, sem as peias das combinaçôes conceptuais. Nem viam eles a diferença entre res nuilius e
res quae alicuius sunt (L. 1, pr., D., de interdwtis sive extraordinariis actionibus, quae pro his com petunt, 43, 1).
No intuito de protegê-lo, tratavam o próprio homem livre como se fosse coisa, res nuilius. Esse vigor juvenil
perdeu-o o direito romano, à medida que a estrutura política se mostrou inábil para prosseguir em suas
transformações, continuando na linha que se iniciara com a democracia grega e as primeiras leis de ordem
econômica racional, tipicamente ocidentais. Quem quer que estude a ligação entre a proteção possessória e as
obras de irrigação compreende o esplendor a que teria chegado o direito romano se o despotismo oriental, os
germes de morte, não se tivessem encarregado de reduzir a civilização mediterrânea à vergonha dos séculos
posteriores, com o alento tardio, logo sufocado, da Renascença. Na ânsia de organizar, rente à vida, e inspirado
nos interesses comuns, o Romano pensou em usar de interditos, não só por motivo humano como também por
motivo de forças naturais a fim de regular, por exemplo, os movimentos de cada um por ocasião de inundação
do Tibre. O que importava era “resolver”, sem barreiras conceptuais, no plano dos fatos.

As ações possessórias, de que nos valemos hoje, perderam aquele caráter público, social, que tiveram ao nascer.

São puros interditos de direito privado, que acabaram por se adulterar e confundir nas regras jurídicas do
processo civiL Sobre isso, devem-se ler C. F. RO5SHIIRT (Zur Lehre vom Besitz und insbesondere von der
quasi possessio, Archiv fúr die civilistiche Pra~ris, VIII, 12 s.), e EsQumou DE PABIEU (Étucles historiques et
critiques, sur les actions possessoires, 251). Perdeu-se muito daquele cerne moral, daquela cooperação entre o
Estado e os homens livres, com que se preparou a grandeza romana; mas já então esses mesmos interditos
denunciavam que o povo percebia a inaptidão dos governantes, da estrutura política. Essa, desde algum tempo,
procurava apertar em suas garras os outros, gregos e romanos, da organização racional da vida. Quando
ULPIANO proclamou (L. 2, § 24, D., ne quid in loco publico veZ itinere fiat, 43, 8) que o interdito é só para os
campos, porque nos caminhos da cidade os empregados do governo, os funcionários, “vigiam”, já se estava no
Império. E o Império não é povo é a policia. Roma, que permitia a qualquer cidadão interferir, se a liberdade de
um cidadão estivesse ameaçada (L. 3, § 9, D., de homine libero exhzbendo, 43, 29), vai ter os prêmios de
denúncia, o processo inquisitorial e a delação. Através dos vinte e tantos séculos posteriores, os tempos foram
marcados, ora pelos mesmos esforços para a liberdade e o bem, ora pela libertinagem, pela rapacidade e pela
violência.
As ações possessórias de que vamos tratar tem aquela fonte insigne. Mas são apenas sombras do que foram
soihbras úteis, que ainda amparam o colono pobre das distantes terras do Brasil, se o juiz conserva dentro do seu
caráter a visão política do Pretor. Elas e o habeas-corpus, em parte de origem inglesa, e o mandado de segurança,
que proveio da “apelação extrajudicial”, são o que lhe resta do século, dentro da obscura instabilidade do tempo
presente.

No direito germânico, que não se forrava a confusões entre petitório e possessório, a questão possessória surgia
como questão prêvia, para se saber quem assumiria, na ação de propriedade, o papel de autor e o de réu. A posse
era, então, ~objeto de discussão preparatória, se havia dúvida sobre a Gewere e em caso de esbulho por violência.
inquiria-se do tempo em que haviam começado os atos de cada um. Se não se podia chegar a conclusão segura,
cabia a júri de vizinhos .a determinação do possuidor. Se houve posse violenta da tomada, a deiectio, o possuidor
esbulhado podia postular sobre .a posse e assegurar-se a posição de réu, se o fazia no prazo de ano e dia, a partir
da dejectio.
Segundo o antigo direito germânico, se havia esbulho (vi aut clam), o deiectus não era tido por imediatamente
esbulhado, nem o esbulhador tinha a posse. O esbulhador do móvel só obtinha a Gewere após ano e dia, se não
sofrera ataque durante esse tempo. Após ano e dia, tinha ele a posição do réu, isto é, de parte contra a qual se
havia de alegar e provar a propriedade. Os sistemas jurídicos que se prendem a prazo legal para que se possa
proteger a posse muito se inspiraram no direito germânico, através do direito francês.

2)“INTERDICTA RETINENDAE POSSEsSIONIS”. Os interdicta retinendae possessionis, assim chamados,


em conjunto, desde a época imperial, não tinham a pureza de reter, de manter, que hoje lhe atribuímos. A ganga
dos interditos ainda conserva, nos remédios jurídicos interditais, algo do elemento recuperatório. Esses sentidos
precisos, distintos, não vieram nem vêm cedo; são obra de técnica. Não eram eles ações de delito, como pensara
o jovem F. O. VON SAvIGNY, em Das Recht des Besit~es, § 37. Provaram-no F. L. voN KELLER,
A. D. voN VANGEROW, especialmente, HERMANN WITTE (Das interdictum ut possidetis, 40) e K. A.
ScmvnDT (Das .Interdiktenverfahren, 196), RUDOLE vON JHERING (tiber den Grund des Besitzschutzes, 2Y~
ed., 17) e O. G. BRUNS (Die Besitzkiagen, 46). F. O. vo~ SAvIGNY não distinguia o símbolo vivo e ~o símbolo
morto, a que a psicologia contemporânea dedicou São puros interditos de direito privado, que acabaram por se-
adulterar e confundir nas regras jurídicas do processo civiL Sobre isso, devem-se ler O. F. ROS5HLRT (Zur
Lehre vom Besitz und insbesondere von der quasi possessio, Archiv flir die civilistiche Praxis, VIII, 12 5.), e
EsQuniou DE PABIEU (Études historiques et critiques, sur les actions possessoires, 251). Perdeu-se muito
daquele cerne moral, daquela cooperação entre o Estado e os homens livres, com que se preparou a grandeza
romana; mas já então esses mesmos interditos denunciavam que o povo percebia a inaptidão dos governantes, da
estrutura política. Essa, desde algum tempo, procurava apertar em suas garras os outros, gregos e romanos, da
organização racional da vida. Quando ULPIANO proclamou (L. 2, § 24, D., ne quid in loco publico veZ itinere
fiat, 43, 8) que o interdito é só para os campos, porque nos caminhos da cidade os empregados do governo, os
funcionários, “vigiam”, já se estava no Império. E o Império não é povo é a polícia. Roma, que permitia a
qualquer cidadão interferir, se a liberdade de um cidadão estivesse ameaçada (L. 3, § 9, D., de homine libero
exhibendo, 43, 29), vai ter os prêmios de denúncia, o processo inquisitorial e a delação. Atravês dos vinte e
tantos séculos posteriores, os tempos foram marcados, ora pelos mesmos esforços para a liberdade e o bem, ora
pela libertinagem, pela rapacidade e pela violência.
As ações possessórias de que vamos tratar tem aquela fonte insigne. Mas são apenas sombras do que foram
sodabras úteis, que ainda amparam o colono pobre das distantes terras do Brasil, se o juiz conserva dentro do seu
caráter a visão política do Pretor. Elas e o habeas-corpus, em parte de origem inglesa, e o mandado de segurança,
que proveio da “apelação extrajudicial”, são o que lhe resta do século, dentro da obscura instabilidade do tempo
presente.
No direito germânico, que não se forrava a confusões entre petitório e possessório, a questão possessória surgia
como .questão prévia, para se saber quem assumiria, na ação de propriedade, o papel de autor e o de réu. A
posse era, então, ~objeto de discussão preparatória, se havia dúvida sobre a Gewere e em caso de esbulho por
violência. Inquiria-se do tempo em que haviam começado os atos de cada um. Se não se podia chegar a
conclusão segura, cabia a júri de vizinhos ~a determinação do possuidor. Se houve posse violenta da tomada, a
deiectio, o possuidor esbulhado podia postular sobre a posse e assegurar-se a posição de réu, se o fazia no prazo
de ano e dia, a partir da deiectio.
Segundo o antigo direito germânico, se havia esbulho (vi aut clam), o deiectus não era tido por imediatamente
esbulhado, nem o esbulhador tinha a posse. O esbulhador do móvel só obtinha a Ge-were após ano e dia, se não
sofrera ataque durante esse tempo. Apos ano e dia, tinha ele a posição do réu, isto é, de parte contra a qual se
havia de ale:gar e provar a propriedade. Os sistemas jurídicos que se prendem a prazo legal para que se possa
proteger a posse muito se inspiraram no direito germânico, através do direito francês.

2)“INTERDICTA RETINENDAE POSSEsSIONIS”. Os interdicta retinendae possessionis, assim chamados,


em conjunto, desde a época imperial, não tinham a pureza de reter, de manter, que hoje lhe atribuímos. A ganga
dos interditos ainda conserva, nos remédios jurídicos interditais, algo do elemento recuperatório. Esses sentidos
precisos, distintos, não vieram nem vêm cedo; são obra de técnica. Não eram eles ações de delito, como pensara
o jovem F. O. VON SAvIGNY, em Das Recht des Besitzes, § 37. Provaram-no F. L. voN KELLER,
A. D. voN VANGEROW, especialmente, HERMANN WITTE (Das interdictum ut possidetis, 40) e K. A.
Sc~IIMm’r (Das interdiktenverfahren, 196), RUDOLF VON JHERING (tJber den Grund des Besitzschut2es,
2.~- ed., 17) e O. G. Bauxs (Die Besitzklctgen, 46). F. O. VON SAVIGNY não distinguia o símbolo vivo e
osímbolo morto, a que a psicologia contemporânea dedicou estudos diretos. Mas A. EXNER, antes dela e dos
psicopatologistas, pesquisara, a respeito da posse, a “violência imaginária” (Die imagináre Gewalt, Zeitschrift
der Savigny-Stiftung, Parte romanística, VIII, 167).

3)REINTEGRAÇÃO, RECUPERAÇÃO. Reintegrar na possa é expressão com que nos referimos, hoje, à
recuperação. Recuperar é recaptar, é re-ci pio, re-ca pio (KA1u~ BRUGMANN, Grunclriss der vergl.
Grammatik, 2.~ ed., 1, 224; W. M. LINDs&i~, Die lateinische Sprache, trad. Iloin,, 561); não, do mes ino étimo,
que “reparar”, como pretendiam MEUNIER (Mémoires, 1, 412) e M. BRÉAL (Mémoires, V, 27), menos ainda
de re-cupro, cupio (VANICEX, Etymologisches Worterbuch, 50). Reintegrar alude, nos textos legais, à actio
spolii, aosredintegranda do direito canônico. O remedium ex canane redintegranda vem do (falso) trecho de
IsIDoRo, que Graciano metera na Decretal, sobre a exceptio dou, e lido pelos j u ristas como referente à actio. De
modo que a falsificação jurídica foi além do falsificador. A O. G. BRUNS (Das Recht des’ Besitzes, 163 s.)
deve-se o esclarecimento do direito que com tal fonte se formou. Seja como for, a ação passou a ser usada contra
o terceiro que fosse conhecedor da espoliação (Ru DOLF VON JHERING, Der Besitzwille, 459).

4)FORMA DO PROCESSO. A lei processual regula a for ma de processo da ação de manutenção ou da ação de
reintegração, se proposta dentro do prazo legal, a contar da turbação, incluido o dia a quo. É isso que significa o
procedimento “quando intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho”. É a força nova, a violência
ainda recente. As Ordenações Filipinas, Livro III, Título 48, pr., diziam: “quando as tais demandas se começarem
antes de ano e dia, do dia, que a força se disser ser feita”. E o § 1: “que se diga ter feita, antes que passe ano e
dia, depois que foi feita”. É o “intra annum” ou o “annus in hoc interdicto utilis est”, não contado o dies a quo (L.
1, pr., e § 39, D., de vi et de vi armata, 43, 16). PABco~ JosÉ DE MELO FREIRE (Institutiones, IV, 77) pôs
claro que a Ordenação do Livro III, Título 48, pr., e § 1, se aplicava à ação de manutenção e à de recuperação. O
Código Civil de 1916, art. 523, considerou de direito materia[ a regra jurídica sobre o ano e dia. Isso ao tempo da
pluralidade de legislação processual. Depois, o Código de Processo Civil de 1939 repetiu-o. Estudos posteriores,
que fizemos,, convenceram-nos, ainda mais, de que o prazo é de direito material, e não processual, confirmando-
se o que disséramos. em 1918 (ed. de J. H. CORREIA TELEs, Doutrina das Ações, 210). Se é certo que o
interdito recuperatório nasceu com o prazo, de que o interdictum de vi armata prescindia, e só a. evolução
posterior os fundiu, e que o prazo passou às ações de manutenção, isso não basta para nos persuadir de que o~
prazo concernente à manutenção e à reintegração seja de direito formal.
No Código Civil de 1916, art. 523, disse-se que “as ações.. de manutenção e as de esbulho serão sumárias,
quando intentadas dentro em ano e dia da turbação ou esbulho; e, passado esse prazo, ordinárias, não perdendo,
contudo, o caráter possessório~~. No parágrafo único explicitou-se: “O prazo. de ano e dia não corre enquanto o
possuidor defende a posse, restabelecendo a situação de fato anterior à turbação, ou ao esbulho”. No Código de
Processo Civil de 1939, o art. 371 apenas enunciou: “Se a turbação ou violência datar de me nos de ano e dia, o
autor poderá requerer mandado de manutenção ou de reintegração initio litis’~. No Código de Processo Civil de
1973, art. 924: “Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da seção seguinte,
quando intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho; passado esse prazo, será ordinário, não per
dendo, contudo, o caráter possessório”.
Os remédios jurídicos processuais nascem, por vezes, como complexos de incidência (regras jurídicas criadas) e
de aplicação (processo), de modo que ao tempo posterior cabe distingui-las.

(a) Tudo gira em torno da natureza da ação ordinária. Ora, F. C. voN SAVIGNY considerava-a delitual e a sua
opinião foi repelida; C. G. BRUNS (Die Besitzklagen, 50) manteve a concepção de ser a mesma ação de
turbação; RUDOLY VON JHERING (tiber den Grund des Besitzschutzes, 2.~ ed., 93) pôs em foco, com certo
exagero, a declaratividade, a prejudicialidade da ação ordinária. Houve quem visse a diferença antes de
RUDOLF vON JHERING: o jurisconsulto JoÃo RODRIGUES CORLEIRO, em 1713, nas suas Dubitationes
luris (d. 40, ns. 33 5.). Tocou o cerne do assunto ao mostrar que a pretensão mesma estava interessada, e não só a
forma de processo, tanto que o foro havia de ser o do réu, e não o da coisa, como se dá com as ações de
manutenção e de reintegração. Mais:
JoÃo RODRIGUES CORDEIRO sustentou, antes de F. C. VON SAvIGNY, que o ordinarium (denominação
medieval) era a pretensão possessória romana, porém observou ter havido a evoIlução posterior, germânico-
canônica com a exatidão, a ponto de ter feito enumeração das diferenças entre a força nova e a força velha. Em
MANUEL ALvARES PÊGAs (Resolutiones Forenses, VII, 10) fala-se de julgado de ação velha em 1660, e o
jurista discorre sobre distinções de ordem materíal. Percebeu não o que havia de petitório na ação de força velha
(tese falsa de B. DELBRUCX, em 1857), porém - como RUDOLF vON JHERING, depois a declaratividade.
o processualista, na determinação da forma, pode satisfazer-se com a simples distinção entre ano e dia e ano e
dois Ou mais dias. O civilista, não. Nem o próprio processualista atendeu aos dois momentos mais graves da
cognição: o -determinar a competência e o de sentenciar. Porque não Se há de propor a ação de força velha fora
das regras jurídicas da competência pelo domicílio, ou, na falta desse, pela resi~c1ência, o próprio esbulhador
tem direito a ser mantido, até ser convencido pelos meios ordinários, o que supõe ação de cognição completa,
executivo-condenatória, com elemento declarativo, não tanto, é verdade, como pretendia RUDOLF voi~
JHERING.
Os arts. 508 e 523 do Código Civil de 1916 foram obra posterior ao Projeto primitivo, estranhos ao pensamento
de CLóvIs BEVILÁQUA. Vieram do Projeto revisto. A diferença do Código Civil português, art. 489 (e é típica
a discrepância), que remeteu o possuidor ofendido, que perder o prazo, para o petitório, os arts. 508 e 523
entenderam que a pretensão continuava de natureza possessória. As ações possessórias são processadas durante
as férias iniciais, de lege ferenda (cp. artigo 173); mas a regra, que a legislação sobre organização judiciária
contenha, somente se entende para as ações interditais, e não para as de força velha.
Quanto à ação e à sentença na ação ordinária, são ambas de forte elemento executivo, tal como o das ações e
sentenças de manutenção e de reintegração, mas compensado pelo elemento declarativo que cresce a ponto de,
em certos casos, ter eficácia material de coisa julgada a sentença. A diferença técnica está na deslocação da
execução, que se adianta, nas ações sumárias, e depende da cognição completa, na ação ordinária.
O seqüestro, a que se refere o art. 507, parágrafo único, 2.~ parte, in une, do Código Civil de 1916, tem por
pressupostos: a) não estar em exame posse de, pelo menos, ano e dia; b) haver dúvida para todas as postulações
de posse (= inexistência ou dúvida sobre os títulos ou título, dúvida sobre qual a mais antiga das posses, dúvida
sobre existência de posse atual ou sobre qual seja a posse atual). Tal seqüestro dura enquanto não se decide haver
“melhor” posse, ou não se mantém ou reintegra, em remédio jurídico adequado, o possuidor. Aí, a lei criou o
seqüestro, sem substituibilidade, pela caução. Para se relaxar o seqüestro, tem de ser respeitada a competência do
juiz que o decretou, ou provir de via recursal a decisão. Também pode ser decretado o seqüestro se,. antes da
decisão, for provável a ocorrência de atos que possam causar lesões, de difícil e incerta reparação, ao direito de
uma das partes (Código de Processo Civil, art. 798). Tal seqüestro nada tem com o seqüestro que a lei determina
fazer-se com fundamento no art. 507, parágrafo único, 2.~ par.. te, in une, do Código Civil. Ambos são medidas
cautelares, mas aquele provê à necessidade de prevenção devido à perplexidade do juiz, e esse, a outros dados da
vida que a perplexidade.

(b)Além dessas ações, existe a ação de declaração da posse, ação declaratória típica (KoxitAI HELLWIG,
Lehrbuch, 206, II, 239). Essa não tem a preponderância do elemento condenatório, nem o elemento executivo
suficiente aparece. Daí depender de ulterior ação de condenação a execução, ou de alguma ação possessória
(executiva lato sensu), ou do exercício da preceitação na ação condenatória cominatória.

(c)A ação de manutenção provisória se duas ou mais pessoas se dizem possuidoras é a do possessorium
summariis simum medieval, nascido na Itália, na Espanha, Portugal, França e Alemanha, no século XIII. Ação de
cognição in~ completa, superficial, com intuitos de paz imediata, pela manutenção da momentanea possessio.
Quanto à existência desse remédio jurídico no direito anterior ao Código Civil de 1916, estava a favor MANUEL
DE ALMEIDA E SousA (Tratado dos Interditos, 109-120); contra, ANTôNIo JOAQUIM RIBAS (Da. Posse,
251-257). Não há dúvida que o prático de Lobão prestou grande serviço em mostrar que advogados e juizes
estavam a confundir os dois institutos de proteção à posse e a aplicar a um o que concernia a outro. Diríamos
hoje: confundindo a cognição superficial das ações de manutenção ou-de reintegração com a interina. Aliás,
certo fora o julgado de ANTÔNIO DE SousA DE MAc~o (Decisiones, 163-166), no caso
de duas partes que se diziam possuidoras por adição da herança, sem se poder determinar “quem primeiro tomou
posse”. ANTÔNIO DE SOUSA DE MAcRDo entendeu que se devia ou manter quem corporalmente possuísse,
ou sequestrar a posse. Assim, estariam evitados a rixa e o escândalo. Parece que havia causa criminal, e
ANTÔNIO DE SOUSA DE MACEDO anotou que nenhuma influência tinha na causa cível. Não eram, portanto,
só doutores estranhos que cogitavam do possessonum summariissimum, como parecia a ANTÔNIO JOAQUIM
RIBAS e J. H. CORREIA TELES. Que se não usava mas era outra • questão. Hoje, está no sistema jurídico, com
explicitude; e pode ser usada a forma sumária, porque a diferença é de cognição, superficial naquela e interina no
possessorium summariissimum: o pedido dirá de qual ação se trata. “Sunimatim cognoscere”, dizia ALVARO
VALASCo (Decisionum ao Consultationum, II, 461 5.); tal o que ocorria em tal remédio, chamado interim em
Espanha; apenas em Portugal se preferia seqUestrar, por ser o seqüestro mais eficaz, no aplacar as rixas, do que a
posse interina.

(d)Nas Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 3, § 6, • Livro II, Título 10, e Livro III, Título 85, § 1, falava-se das
cartas tuitivas, bem assim no Regimento do Desembargo do Paço, ~ 116. Dizia o Livro 1, Titulo 3, § 6:
“Outrossim darão (os Desembargadores do Paço) cartas tuitivas e cartas de manterem em posse os apelantes, ou
tornarem a ela, se depois da apelação forem esbulhados. E cartas restitutórias de quaisquer possuintes e
esbulhados, posto que apelantes não sejam”. Nas Ordenações Afonsinas, Livro 1, Titulo 4, § 27, já se atribuia aos
Desembargadores do Paço a decisão sobre manterem em posse “quaisquer possuintes, e esbulhados”.
Na tutela jurídica quando duas ou mais pessoas se dizem possuidoras está o mais avançado princípio com que o
direito protege o status quo, a paz pública. O Quieta non moverc veda, aí, que se use da força, ainda que o
tenedor da coisa não tenha posse, se já não cabe a legitima defesa, ou a justiça de mão própria. É o
summariissimum possessorium, que se tornou espécie de interdito possessório retinendae. Enquanto a
manutenção em límine, ou a restituição em límine, supóe que, posteriormente, se examine a espécie, no mesmo
processo, o sumaríssimo, ou simplesmente sumário (porque o outro, o ordinário, já era sumário), é dado com
cessação do processo, para que, noutro processo, e não no que se instaurou, se decida definitivamente. Era
dúplice, e é dúplice ainda hoje. A manutenção é possessória.
Se os pressupostos legais se compõem, não é preciso que qualquer dos que se dizem possuidores peça o interdito
sumarissimo. O juiz pode dá-lo, de ofício: “Possessorium summariissimum est remedium extraordinarium
retinendae nossessionis, quo iudex vel proprio motu, vel ad petitionem partIs, in causa armorum de utriusque
partis possessione, vel quasi dubia summatim cognoscit, et interloquitur, quoad iustus
possessor in possessorio ordinario, vel petitorio declaretur”
(J.H. BOEHMER, Exercitationes ad Pandectas, ex. 90, c. 3, § 3). Também L. PosTíus (Tractatus mandati de
manu tenendo, obs. 2, n. 27) frisava que se atendia, pelo sumaríssimo, ao autor e ao réu, de oficio ou não
(huiusmodi manutentio expeditur iudicis olficio, non autem iure actionis, vel interdicti; et quidem, vel ipsius
iudicis motu proprio, vel ad partis petitionem). Não há necessidade de se pedir, nem de se observar ordem de
juízo. Pode bem ser que nenhum dos interessados (= dos que se dizem possuidores) seja possuidor; não é à
justiça ou injustiça que se dá atenção, mas ao fato nu da posse (Nec attenditur iustitia, vel iniustitia, seci nudum
possessionis factum). Não havia de pensar-se, em tal remédio jurídico possessório, em perdas e danos e
indenizações (Neque in hac manutentione agitur de damnis et interesse). Veja-se, também, MANUEL
ALVARES P~GA5 (Opusculum de Maioratus possessorio interdicto, n. 111). Tudo se passava rente ao mundo
fáctico. Mais se policiava que se tutelava; mais se exigia respeito ao Quieta non movere que ao.“A cada um o
que é seu”, lus suum cuique tribuere.
As cartas tuitivas do direito luso-brasileiro eram o interdito sumaríssimo, embora com limitação sobre
competência, e isto L. PosTíus viu (obs. 3, n. 16): “Interdum huiusmodi remedium dicitur iudicium
conservatorium possessionis summariissimum, conservatiorium interium. In Lusitania dicitur remedium
possessonis Cartae Tuitivae”.
Na prática lusitana, ALVARO VALASGO (Decissionum Consultationum, 1, 178) frisou que a carta tuitiva era
outro remédio que o uti possidetis e citou a cláusula com que se deferia ou se expedia: “Se presentes as partes a
que tocar achardes que he assi o que elle diz, vós o sustentai na posse do dito beneficio, e não consintais que o
dito N, nem outra alguma pessoa, de qualquer qualidade, e condição que seja, lhe faça mal, nem força, sobre a
dita posse, e querendo-lha fazer vós-não consintais, e lhe levantai logo, e tomai a dita posse, e sustentai nela. E se
o dito N, ou outra alguma pessoa contra ele pretender haver algum direito sobre a posse do dito benefício, que o
demande como, e por onde deve, e le faça de’ si direito’~. E isto cumpri, salvo se da outra parte vos fôr mostrada
tal razão porque com direito o não devais fazer, e isto lhe faço se a parte aqui conteúda é aquelude de que se
elleverdadeiramente teme, e se esta não é, a carta lhe não valerá”. Era o interdito interim (1, 179), contra intrusos,
ainda a favor de tenedores, no que se distinguia, nitidamente, dos outros interditos (1, 180): “Sed quamvis haec
ita vera sint, quoad remedium retinendae uti possidetis, et in reme -dio recuperandae undi vi, quod etiam non
datur, nisi possessoribus, et non detentatoribus, non idem puto remedio tuitivae Regalis, de qua agimus, quia cum
sit inductum ad tollendas violentias, ne inferantur, et ilíatas restituendas, licet iure communi, cessent remedia
ordinaria interdictorum quoad detentatores non cessabit istud remedium tuitivae Regalis, ad instar remedii officii
iudicis, quod iure communi insubsidium datur huiusmodi detentatoribus, pro tuendo, seu recuperando statu, in o
erant, ..., quod ibi non ius habitationis fuit concessum, sed nuda facultas habitandi”. O que importa é manter-se a
tranquilidade no mundo fáctico, razão por que de ofício se aplica a regra jurídica do art. 932 do Código de
Processo Civil: “praeditum remedium officii ludicis praestandum nudis detentatoribus, ex iusta causa, si
inquietentur, aut deturbentur ab eo statu”. Nem se poderia -admitir que o rei (ou o Desembargo do Paço) deixasse
de amparar os que por direito comum hão de ser amparados, embora simples detentores. Assim também se
entendia quanto ao sumarissimo de Castela, chamado “entretanto”, ou ínterim. No interdito uti possidetis, tem-se
de provar plenamente a posse. No possessório sumarissimo, não.
A eficácia da sentença no possessório sumaríssimo é erga omnes (AI.vARO VAI~sco, Decisionum
Consuitationum, 1, 181:
..... contra quem detur hoc auxilium tuitivae Regalis, et ex forma cartae Regiae planum est, quod datur, non
solum contra personan nominatam in supplica, quae dicitur molestare vel turbare in possessione, sed etiam contra
quamlibet aliam personam molestantem, et perturbantem, ut patet ibi:
“Nan consintaes que o dito N. nem outra alguma pessoa de qualquer qualidade que seja lhe faça mal nem força
sobre dita posse, e querendo-lha fazer vós o nam consintaes”. Et hic est generale remedium contra quascunque
perturbationes, et ita non est necessum contra quemlibet novum perturbatorem nc-~am cartam impetrare: sed illa
contra omnes proficiet, ut quilibet iudex causa cognita virtute illius possessorem tueatur”.

A sentença que sumarissimamente mantém atende ao princípio geral Quieta non movere, de modo que o
amparado por ela somente por meio judicial pode ser posto fora, ou turbado na posse quer seja o ofensor aquele
que ao juízo se disse possuidor quer qualquer outra pessoa.
O possessório sumarissimo, que ANTÔNIO JOAQUIM Ris~s (Da Posse e das Ações Possessá-rias, 252)
considerava monstrum iuridicum, está no sistema juridico brasileiro. O jurista-professor distinguia-o da carta
tuitiva, por serem, essas, “graças” emanadas do poder real, o que não era verdade, pois o rei ou o Desembargo do
Paço se havia de ater ao direito comum a respeito, e ALvARo VALAsco o disse. Acrescentou ANTÔNIO
JOAQUIM Rre~s (255): “Essa intrusão arbitrária da autoridade pública nas questões possessórias, repugna, pois,
ás nossas instituições políticas; além de que, pela abolição de Desembargo do Paço, não se passou esta atribuição
para alguma outra autoridade”. Sem razão; quando se torna, com o tempo e as transformações jurídicas, obsoleta
ou contrária a direito alguma competência, não desaparece a pretensão à tutela jurídica. Se a Lei de 22 de
setembro de 1828, que aboliu o Desembargo do Paço, não cogitou dos juizes a que havia de passar a cognição do
possessório sumaríssimo, a questão era de interpretação da lei de competência, e não de extinção ou não-extinção
da pretensão à tutela jurídica. A Lei de 22 de setembro de 1828, que se seguiu à criação do Supremo Tribunal de
Justiça (Lei de 18 de setembro de 1828), extinguiu os Tribunais das Mesas do Desembargo do Paço e da
Consciência e Ordens (artigo 1.0) e distribuiu as matérias da competência de tais tribunais, sem que se pudesse
ver nas regras jurídicas elaboradas principios taxativos: eram exemplificativos, tanto mais quanto, no art. 2.0, se
falou de “negócios, que eram da competência de ambos os tribunais extintos, e que ficam subsistindo”. O engano
de MANUEL DE ALMEIDA E SousA (Tratado enciclopédico, com pendiário, prático e sistemático dos
Interditos, 109 5.) consistiu em não ver que as cartas tuitivas, insuficientemente judicializadas, por se
conservarem da competência do Desembargo do Paço, eram o interdito possessório sumaríssimo.

Não há plena cognição, mas cognição interina, sumária, o que significa: não se conhece, ainda, incompletamente,
da questão da posse; conhece-se da questão da perturbação à tença, alegando os interessados posse. Posto que se
prolongassem os processos, no velho direito.

5)AçÃo DE DEMARCAÇÃO E POSSE. Não é óbice à propositura da ação possessória (= não há eficácia de
litispendência) existir ação de demarcação entre os contendores.
A 3~R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 22 de março de 1939 (R.F., 78, 522), aventurou
que, pendente ação de demarcação, petitória, não pode qualquer das partes intentar ação possessória, mas sim
oferecer artigos de atentado. Sem razão: a demarcação é, ex hypothesi, quanto à propriedade, e o que ocorre entre
os possuidores limítrofes não importa à solução da causa, salvo se ocorre a espécie do art. 570, 1.a parte, do
Código Civil de 1916. Nessa espécie, os artigos de atentado cabem, porém não se exclui a ação possessória, nem,
sequer, a invocação do art. 502 (legitima defesa e justiça de mão própria).

6) CONFUSÃO DE LIMITES. O fato de se acharem confusos os limites de dois ou mais prédios não obsta a
que o possuidor de um deles proponha ação possessória contra o outro possuidor, alguns, ou todos os outros
possuidores (cf.~ ~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de abril de 1931, R. dos T., 79, 351).

7) JUSTIVICAÇÃO ADMINISTRATIVA DA POSSE. O fato de ter sido o imóvel considerado terra devoluta e
estar o possuidor justificando, administrativamente, a posse, não é óbice a, em caso de esbulho, ou turbação,
defender-se em juízo (3.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, 24 de outubro de 1947,
R. dos T., 171, 197, ou de acordo com o art. 502 do Código Civil de 1916.
8) CONCORBÉNCIA DE PRETENSOES E PRETENSÃO A TUTELA DA POSSE. A concorrência de
pretensões não cancela uma ou algumas delas. Todas subsistem, se não há alternatividade, ou
incompossessibilidade.
Alguns julgados (e.g., Supremo Tribunal Federal, 12 de maio de 1943, R . F., 99, 76) excluem as ações
possessórias se pode ser, na espécie, usado o mandado de segurança. Se há turbação ou esbulho da posse, não se
justifica que se negue a ação possessória.

Art. 926. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação 1) e reintegrado no de esbulho2).
1) MANUTENÇÃO. Quem está na posse, sem que a houvesse tirado de quem a vem turbar, tem o direito de ser
mantido. Manter é manum tenere, ter mão, como em manobrar, manipular; e, até, na língua francesa, para se
agarrar o presente, se usou e se usa “maintenant”. Já tratamos do conceito da ação de manutenção e da sua
natureza. Aqui, o Código de 1973, art. 926, apenas teve por fito frisar o direito e a ação, a ação, de direito
material, a que se vai seguir, nos arts. 929-931, o procedimento, a “ação”, em sentido de direito formal.

2)REINTEGRAÇÃO. Quem esbulha desintegra um patrimônio e tem de ser réu na ação possessória de
reintegração, porque o direito processual civil apenas estatui sobre o procedimento. Temos, hoje, com o Código
de 1973, de evitar confusões entre a ação de direito material e “ação”, o remédio jurídico processual, com que se
reintegra a posse no patrimônio de quem sofreu o esbulho.
Já falamos anteriormente da legitimação ativa e da legitimação passiva (Seção 1). Legitimado ativo é a pessoa

MANUTENÇÃO E REINTEGRAÇÃO DE POSSE (ARTS. 927 E 928)277


a que se retira a posse própria, mediata ou imediata, a posse imediata ou a posse mediata, ou a própria pessoa a
que se entregou a tença da coisa, pois está ai, em vez do possuidor, cuja posse se alega. Tanto isso concerne à
manutenção quanto à reintegração da posse. Se a posse é de A, que fez detentor C, B, que turba ou esbulha a
posse, é legitimado passivo.

Art. 927. Incumbe ao autor provar2):


1 a sua posse 1);
II a turbação ou o esbulho praticado r.~1o r~$u3);
III a data da turbação ou do esbuifio 4);
1V a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de
reintegração 5) 6)~

Art. 928. Estando a petição inicial devida.mente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu 8), a expedição do
mandado liminar de manutenção ou de reintegração; no caso contrário, determinará que o autor justifique
previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada 7) 9) 10) 11)

Parágrafo unico. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a
reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais 12)

1) PossE, TURBAçÂO E ESBULHO. Com a turbação, ou com o esbulho, apesar da posse poder só estar no
mundo fáctico, nasceu ao possuidor o direito, a pretensão e ação a ser mantido, ou reintegrado na posse. Turbar
não é só perturbar, ou conturbar, é praticar qualquer ato, ou deixar que ocorra qualquer fato, que retire à posse a
extensão, ou interesse ou a eficiência ou a tranquilidade. Esbulhar é espoliar, tirar, no todo ou em parte, o que
outrem possui.

2) POSTULAçÃO E PROVA. O autor alega e prova a sua posse a que tem, e é turbada, ou a que tinha, e lhe foi
tirada (art. 927, 1). (a) Se possuidor, sem existir distincão entre posse indireta ou mediata e posse direta ou
imediata, tem de alegar e provar que lhe turbaram ou tiraram a posse, poder efetivo sobre a coisa. (b) Se existem,
a respeito do objeto, posse direta e posse indireta (melhor se diz posse imediata e posse mediata), ou ele é
possuidor indireto e a turbação, ou perda involuntária da posse, provém do possuidor direto, que também quer a
posse do possuidor indireto, para si ou para outrem, ou a turbação ou perda provém de terceiro que se oponha aos
dois ou só ao possuidor indireto. (c) Se possuidor direto, a sua ação é contra o possuidor indireto, que lha turbou,
ou tomou, ou contra terceiro. A ação do possuidor direto contra o indireto é pouco usada, por serem mais
completos os meios petitórios e a defesa própria. Mas está na lei. A concepção da vida, alicerçada pelas
circunstâncias econômicas, fez posse algumas espécies de tença que o direito romano só reputava detenções (cf.
RUDOLE VON JHERING, Der Besitz, Jherings Jahrbúcher, 32, 93; L. BARTEL5, Ausfúhrungen zur
Besitzlehre, Gruchots Beitrãge, 42, 648). Criaram-se, pois, novas relações (fácticas) de posse. A vida mesma, lá
fora, mudou.
As posses mediatas e a imediata ficaram em relação na qual pode não existir, sub jetivamente, um dos termos,
porque só é de exigir-se que a posse esteja em relação com o que resta. Esse é um dos pontos delicados da
concepção das duas posses: a posse mediata está em contraposição àposse imediata, sem se exigir que a posse
imediata seja aquela em que o possuidor mediato crê; e a posse imediata está em contraposição à posse mediata,
sem que se exija que essa seja a posse mediata em que o possuidor imediato crê. Possui imediatamente quem
possui, por exemplo, como locatário, ainda que não exista relação jurídica de locação e ainda que a pessoa de
quem se crê ter provindo a locação n~o seja o dono, ou, até, não exista.
Nem a expressão “imediata”, “mittelbarer Besitz”, nem a expressão “indireta”, “mediata”, dizem o que se lhes
atribui: a posse mediata pode existir sem a imediata; e a posse direta do que é dono, ou, só, tem a posse própria,
enche o todo da posse. O que tem a posse direta, sendo dono ou como dono, sem outros possuidores mediatos,
tem o todo da posse (cf. FRIEDRICH ENDEMANN, Einfiihrung, II, 1, 4. ed., 125; WALTIIER WEIDEMANN,
Der mittelbare Besitz, 121). Fora daí, as expressões “imediata” e “mediata” traduzem bem o que se passa.
As posses podem pôr-se em ordem, a partir da posse imediata, que é em uma só classe. Por exemplo: a) Posse
imediata (posse do sublocatário). b) Posse mediata (posse de locatário). c) Posse mediata (posse de usufrutuário).
d) Posse mediata (posse de dono ou posse própria). Se o possuidor como dono foi quem tomou em sublocação a
coisa, tem ele a posse própria e a posse imediata, sem ser possuidor pleno. Se é o usufrutuário que a subloca, tem
ele a posse mediata não-própria e a posse imediata. Se o possuidor como dono tomou em locação a coisa
usufruida, é ele possuidor próprio e tem posse direta não-própria. O que herda a casa que lhe está locada tem
enquanto não se procede àpartilha e não transita em julgado a sentença composse mediata própria e posse
imediata. O que sucede, sendo possuidor próprio, hereditariamente, ao locatário, como um dos herdeiros, tem
composse imediata e posse própria.
Pode dar-se que a posse imediata seja composse e a posse mediata mais próxima, ou outra posse mediata, ou
todas as posses mediatas não no sejam, ou vice-versa; ou que algumas posses sejam pro diviso, e outras não, ou
todas o sejam, ou não; ou que alguma posse mediata pro diviso corresponda posse imediata pro diviso, ou não
corresponda.
Nos centros mais povoados e civilizados, a ação possessória perde em número de casos. Basta a defesa própria,
civilizada a seu turno, para que cada um proteja o que é seu. Por outro lado, o respeito à posse dos outros cresce.
O exemplo clássico é o do jornal que se compra nas bancas, sem que o vendedor esteja presente. Além disso,
meios petitórios, rápidos, são utilizados a cada momento. A ação penal completa o quadro. Com o
reconhecimento da posse imediata, com a defesa própria e a proteção possessória, as ações de posse, usadas pelo
possuidor imediato, seriam importantes se, como é a regra, não fossem suficientes à defesa própria e à polícia. Se
ele, repelindo o proprietário intruso, pratica algum ato que estaria na lista dos crimes, mas em legítima defesa, a
lei penal não incide (PAUL SOKOLOWSKI, Die Philosophie im Privatrecht, II, 272 5.).
O Tribunal de Apelação do Piauí, a 4 de maio de 1939 (Acórdãos 192), exigiu ao autor da ação possessória
apresentar título legítimo pelo qual o bem se lhe incorporou ao patrimônio. Escusado é dizer-se que
absurdamente o exigiu. A posse pode ser adquirida por ato-fato jurídico; e na ação possessória só se alega posse,
e não domínio, ou outro direito real, ou pessoal: o próprio possuidor imediato da casa, que a possui como
locatário, não precisa exibir o título da locação. O que se está a discutir é posse, e não direito. Tão essencial é
isso ao sistema jurídico que, ainda em se tratando de servidão, para cuja aquisição se exige titulo e, às vezes,
registro, o esbulhado da posse tem a proteção possessória (2.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio
Grande do Sul, 26 de agosto de 1937, Decisões, 1937, 2, 948).

A propósito de servidões, convém precatarmo-nos contra trecho de LAFAIETE RODRIGUES PEREIRA


(Direito das Coisas, 1, 367), que aparece, às vezes, em julgados, com grave dano ao sistema jurídico do Código
Civil (e. g., 1.a Câmara do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 2 de janeiro de 1939, R. dos T., 119,
334). O jurista, que escrevia para o direito anterior, preexcluía o interdito recuperatório ou de força espoliativa
para a proteção da posse das servidões, e achava que o interdito uti possidetis era suficiente para proteger a posse
das servidões, qualquer que fosse a sua natureza, continuas ou descontinuas, afirmativas ou negativas. MANUEL
DE ALMEIDA E SousA (Tratado dos Interditos, 69) deu noticia da disputa. Hoje, como ao tempo do Código
anterior, não há razão para se aludir à continuidade da posse do prédio dominante para se proteger a posse da
servidão; e corresponde mais à realidade dizer-se que se pode perder a posse da servidão sem se perder a posse
do prédio, e, perdendo-se a posse da servidão, o que se pede é a reintegração da posse.

3) FATO DO REU. O autor tem de provar o Fato do réu, isto é, a turbação ou esbulho praticado por ele (art.
927, II), fato que lhe dê a ação possessória. As ações possessórias não são ações declarativas, são ações com
certo elemento de condenação, e fortíssimo elemento de executividade, nas ações de reintegração da posse, o que
nos levou a classificá-las como ações executivas lato sensu. A ação declaratória da relação possessória é outra
coisa; antes nota 4) a esse Capitulo V. A ação de manutenção é mandamental.
4)DATA DA OFENSA. A data da turbação ou violência é pressuposto essencial para que caiba o processo
especial (art. 927, III), correspondente à pretensão de direito material a manter-se; ou a reintegrar-se na posse,
executiva-mente (lato sensu), por adiantamento da prestação jurisdicional. Alguns comentadores (e. g.
ANTÔNIO Luis DA CÂMARA
LEAL, Comentários, V. 20, 21) entenderam que o Código de 1939 rompera, nesse ponto, com o Código Civil de
1916, artigo 523. Sem razão, a sumaridade, a que se alude na lei material, é a da primeira fase do processo, e não
a da segunda. Desde que se põe antes da sentença final a execução, o processo é especial; desde que se não
exigiu rito ordinário àprimeira fase, especial é. Ou se lance o princípio de amplius non turbando, um dos
conteúdos do “manter”, que se pede de acordo com os arts. 926-929, ou se reintegre na posse o autor, com o
simples curso célere dos arts. 926-929, já ordinário não é o processo. (No começo do século XVIII,
FRANCISCO DE CALDAS achava inútil a referência ao tempo; mas MANUEL ALVARES PÉGAS continuou
de exigi-lo, em Resolutiones Forenses, II, 840.)

5) Só SE MANTÉM, SEGUNDO OS PRINCÍPIOS, QUEM TEM POSSE. Quem pede manutenção afirma que
tem a posse, a continuação da posse, de que fala o art. 927, IV, 1.a parte. Se houve perturbação pelo réu, sem
espoliação, e o autor, ao tempo da propositura da ação, não tem a posse que outrem lhe tirou, a pretensão cessou
de existir: não pode ser exercida. Existe a pretensão à recuperação contra a outra pessoa, o esbulhador. Se o
esbulho por outrem se deu depois da propositura, nada obsta ao mandado de amplius non turbando, porque o
autor pode readquirir a posse e o mandado é útil. Se foi o próprio réu o esbulhador, antes da concessão do
mandado (art. 930), converte-se a ação (art. 920); se depois, dá-se o atentado (arts. 879-881), pela infração do
preceito.
Nunca nos esqueça o étimo de “manter”: manum -1--tenere, ter mão, como em manobrar, em manipular e no
expressivo francês “maintenant”, agarrando o presente.

6) ESBULHO E POSSE PERDIDA. O esbulhado alega ter perdido, por ato do esbulhador, a posse. Teve de
alegar e provar a sua posse, ora perdida (art. 927, 1), a ofensa, que fez o réu à sua posse (art. 927, II): e a data da
ofensa (artigo 927, III) alega e prova, aqui, ter sido tal a ofensa que lhe tirou a posse (art. 927, ~v, 2Y~ parte).
A tradição do direito brasileiro é no sentido de caber a ação de esbulho contra o terceiro de má-fé (Código Civil,
art. 504). Assim, ALVARo VALAsco (Decisiouum Consultationum, 1, 214: “... est correctus iure canonico, quo
inventunl est saluberrimum illud possessorum remedium, ut conveniri possit etiam tertium possessor singularis,
si sciens de spolio habuerit rem ab filo primo spoliatore...”).
Temos de examinar, a posteriori, o que se passa sob o Código de 1973. No art. 924, somente submeteu aos
artigos 926-93 1 (Seção II, dita, no art. 924, “seção seguinte”), o procedimento das ações possessórias “de
manutenção e de reintegração de posse~~, “quando intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho”.
Abstraiu-se de qualquer duração da posse. Quem é possuidor há um dia ou mais e foi turbado ou esbulhado, se
não deixa passar o prazo de ano e dia, contado da turbação ou do esbulho, pode propor a ação possessória, de
manutenção ou de reintegração, com o rito processual dos arts. 926-931. Nenhuma distinção entre a ação de
manutenção e a de reintegração. O tempo em que foi adquirida a posse de modo nenhum interessa ao direito
processual. Se a turbação ou o esbulho foi quanto à posse de ano e dia, ou a de menos disso, ou de mais de ano e
dia, não importa. Só importa que alegue e prove que tem posse, qual a data da turbação ou do esbulho. O art. 927
de modo nenhum se referiu ao tempo da posse, salvo, em caso de turbação, o tempo posterior a isso (“a
continuação da posse, embora turbada”), ou, em caso de esbulho, quando perdeu a posse.

7) JUSTIFICAÇÃO PE] VIA. A justificação prévia segundo os arts. 928, 2.~’ parte, e 929 é para incompleta
cognição. Se, na contestação, não se ataca o que ela enuncia, nem o despacho que atendeu ao pedido de
manutenção ou de reintegração liminar, a regra jurídica é a de ter-se como verdade (cf. 3~O Grupo de Câmaras
Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, 13 de abril de 1951, R. dos T., 192 603). Se foi atingida pela
contestação, tendo-se como parte da contestação o que foi alegado pelo réu, somente na sentença final pode ser
completado, ou retirado o adiantamento de executividade. ~ assim que se hão de entender certos acórdãos como
o da 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são Paulo, a 8 de junho de 1951 (R. dos T., 193, 730) e o do 3~O
Grupo de Câmaras Civis, a 9 de novembro de 1951 (197, 166).
Se houve justificação prévia, com a citação pedida, inicialmente, ou após a justificação, para ser sobre ela ouvido
oofensor, ou determinada pelo juiz, na espécie do art. 928,2.~ parte, a angularidade da relação jurídica processual
estabeleceu-se, e a citação produziu todos os efeitos, inclusive o de dar começo ao prazo para a contestação (cf.
j•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 27 de janeiro de 1953, R. dos T., 210, 242).
A respeito da justificação para manutenção ou reintegração in limine, a jurisprudência tem frisado que ela não
previne a jurisdição (Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 12 de maio de 1950,
R.F., 133, 181, e 14 de setembro de 1951, 142, 315; Tribunal de Justiça do Espírito Santo, 2 de março de 1950,
R.F., 144, 381; 3~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 12 de julho de 1951, 141, 350;
5•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 30 de maio de 1952, R. dos T., 203, 130). Cumpre
distinguir-se: a) a justificação a que se procedeu inaudita altera parte; b) a justificação em que houve citação do
réu, quer determinada pelo juiz quer pedida pelo autor. O que previne a jurisdição é a citação (artigo 219). A
relação jurídica processual angularizou-se.
A audiência do réu, para a justificação, era facultativa:
ao juiz tocava decidir se havia de o ouvir, ou não (Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justiça do Espírito
Santo, 13 de abril de 1950, R. dos T., 194, 356). No Código de 1973, art. 928, 2.~ parte; diz-se que, se o juiz não
deferir, in limine, a expedição do mandado de manutenção, ou de reintegração, “determinará que o autor
justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que foi designada”. Não há a
alternativa, o que pode acontecer é que tenha havido indeferimento da petição inicial, o que é outro assunto.
Segundo o direito material, quando o possuidor tiver sido esbulhado, será reintegrado na posse, desde que o
requeira, sem ser ouvido o autor do esbulho antes da reintegração. O art. 924 do Código de Processo Civil
explicitou-o. Há prova da posse e do esbulho e já assim era antes do Código de 1939 (e. g., Câmara Cível do
Tribunal da Relação de Minas Gerais, 24 de maio de 1933, R.F., 61, 24); porém os julgados caíram, por vezes,
em confusão, por não atinarem os juizes em que a cognição, para o deferimento inicial, é incompleta, superficial
(e.g., Supremo Tribunal Federal, 18 de julho de 1921, R. dos T., 44, 642; 5~R Câmara Cível da Corte de
Apelação do Distrito Federal, 12 de novembro de 1936; A. J., 41, 67; 3.~ Câmara Civil da Corte de Apelação de
São Paulo, 4 de setembro de 1936, R. dos T., 104, 441); mas, ainda que haja documentos, o juiz não está
obrigado a deferir sem audiência, porque o que importa é que a petição esteja devidamente instruída (arts. 928,
l.a parte, e 927); se não está, tem o juiz de ouvir o réu. Hoje, é preciso citar-se o réu para os atos probatórios
(antes, a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 24 de novembro de 1937, R.F., 73, 364). Se
o juiz exige prévia justificação com citação do réu, então usou ele do poder de não deferir desde logo a
reintegração, de acordo com o Código de Processo Civil, art. 928, 2.~ parte, e dele depende, respeitando os arts.
927 e 928, ordenar que se cite, ou não cite, o esbulhador; se não há citação, é que lhe parece que a instrução
bastou à medida, sem audiência do réu; se há deferimento no tocante àjustificação, é da citação, nos cinco dias
após o julgamento,que se conta o prazo para a contestação pelo réu. Assim éque se hão de interpretar os arts.
928, 929 e 930 do Código de Processo Civil. O juiz não tem o arbítrio de ouvir ou não ouvir o esbulhador, se não
reputa devidamente instruída a petição inicial.
A jurisprudência que restringia a reintegração em li-mine à retirada violenta, a que chamava esbulho violento, era
errada, e continua errada, por atribuir à expressão “violência” sentido estrito, já superado (e. g., Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de agosto de 1927, R. dos T., 63, 307; com razão, a 3•R Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de março de 1930, 74, 496: “O Código não distingue, como faz o
português; e, portanto, tanto pode ser o violento como o clandestino; em um e outro, dá-se a violência privada
contra a qual reage a ação social para reintegrar a ordem jurídica perturbada e plantar a paz de direito”, e a 3•~
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 17 de abril de 1939, A.J., 50, 421, R. dos T., 120, 161:
“O ad. 506 do Código Civil (de 1916), não se presta, de fato, a essa arbitrária distinção. Pretende-se apadrinhá-la
com o art. 487 do Código Civil português. Mas a doutrina deste artigo só em parte foi aceita pelo nosso
legislador. O Dr. BARRADAS propós se limitasse a medida apenas ao esbulho violento. Tal restrição, porém,
não foi aceita, segundo mostra

8) “INAUDITA ALTERA PARTE”. Se as provas do artigo 928 são suficientes (“petição inicial devidamente
instruída”), o processo é sem se ouvir o réu, até se iniciar a outra fase (art. 930).

9). O art. 523 do Código Civil de 1916 não foi revogado pelo Código de Processo Civil de 1939, art. 371, que
apenas, no plano do direito formal, atendeu ao direito material.
Se há atos turbativos separados, a cada um corresponde uma ação de esbulho ou de turbação (Câmara Cível do
Tribunal da Relação de Minas Gerais, 8 de abril de 1931, A. J.. 18, 261). Se a posse esbulhada não foi retomada,
não se pode pensar em reiteração da ofensa. Se a turbação é continua, sem defesa pelo possuidor, o dia que se
iniciou é o dia para que corre o prazo do artigo 924, correspondente ao artigo 523 do Código Civil, que é
preclusivo (Supremo Tribunal Federal, 5 de abril de 1932, R. dos T., 85, 690; 5•a Câmara Cível da Corte de
Apelação do Distrito Federal, 17 de novembro de 1925, R. de D., 81, 583; com terminologia imprópria, 3•~
Câmara, 5 de agosto de 1937, A. .1., 44,193; Câmaras Conjuntas do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de maio
de 1928, R. dos T., 68, 333; 5~R Câmara Civil, 20 de março de 1931, 78, 254; Câmara Civis Reunidas do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 8 de novembro de 1940, 132, 242; 3~a Câmara Civil, 29 de maio de 1940, R.
F., 84, 375. e 7 de junho de 1941, R. dos T., 133, 518).
A ação a que corresponde o rito ordinário, essa prescreve (não preclui!), conforme a Lei n. 2.437, de 7 de março
de 1955, artigo 1.0, em dez anos, entre presentes, e quinze entre ausentes (antes, cf. Câmaras Civis Reunidas do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 8 de novembro de 1940, R. dos T., 132, 242; 1.a Câmara do Tribunal de
Apelação do Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1937, A. J., 44, 464; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Paraná, 18 de setembro de 1948, Paraná J., 48, 284; Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Espírito Santo,
13 de maio de 1942, Acórdãos, 1942, 109).
A aparição do Código Civil surgiram interpretações erradas, levianas, da lei, tais como não mais se teria a ação
de força velha, pois que o art. 523 do Código Civil, somente cogitara da ação de força nova (lá está “quando
intentadas dentro de ano e dia”) e o próprio Supremo Tribunal Federal, certa vez (6 de abril de 1934, R. F., 67,
75), pretendia que a ação de força velha não prescreveria o que orçou e orça por absurdo.
Tratando-se de prazo preclusivo, se intentada dentro do prazo a ação de força, não mais há de cogitar-se de
prescrição ou preclusão da ação (veja Tratado de Direito Privado, Tomo VI, §~ 675; 667, 4; 674, 1; 679, 2; 702,
3; 726, 2; Supremo Tribunal Federal, 6 de abril de 1934, R. F., 67, 75; Câmaras Conjuntas do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 16 de maio de 1928; R. dos T., 68, 333; 5.a Câmara, 20 de março de 1931; 78, 254; errado, o
acórdão da 3.~ Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 22 de agosto de 1931, 80, 451).

Temos de frisar que há a ação (de direito material) que prescreve, e a ação” (de direito processual), que, se
proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho, é ação de rito sumário (~ não ordinário). O art. 924, 1.a
parte, rege o procedimento dessa ação. Há preclusão da proponibiidade da “ação” (de direito processual), e não
da ação (de direito material), que persiste e prescreve. A “ação” (de direito processual) precluiu.
A ação de força velha passa a ter rito ordinário, e não mais há a cognição única em que se fundaria a decisão do
juiz para manter ou para reintegrar. Não há qualquer adiantamento de execução. Em todo caso a diferença e só no
plano do direito processual; no plano do direito material, a ação continua mandamental, se ação de manutenção,
ou executiva, se de reintegração. A decisão, que se profere após o procedimento ordinário ou mantém, e o
mandado supõe assente a situação jurídica do autor e a do réu; ou reintegra e só então sai o mandado de
reintegração (executividade da ação).
O que acima dissemos tem grande importância para o recurso. Ação executiva real, a eficácia da sentença do art.
931, na ação de reintegração, fica suspensa pela interposição do recurso, mas já houve, talvez, a reintegração
liminar que foi in limine. Dá-se o mesmo com a sentença, no procedimento ordinário (art. 931) na ação de
manutencão: favorável ou desfavorável, só o trânsito em julgado vai ao passado, para retirar o efeito do mandado
liminar de manutenção.

10) POSSE DE MENOS DE ANO E DIA. No art. 507, o Código Civil de 1916 estabeleceu: “Na posse de
menos de ano e dia, nenhum possuidor será manutenido, ou reintegrado judicialmente, senão contra os que não
tiverem melhor posse”. Se a posse é de ano e dia ou de mais, têm-se por melhores as suas provas do que as que
poderia apresentar o réu, até que se prove o contrário, e para isso há a manutenção e a reintegração em límine; se
não há o tempo, que pese a favor do que foi turbado, ou esbulhado, pode ser melhor a posse do réu e convém que
seja ouvido antes de qualquer medida judicial constritiva. Por isso mesmo, se a turbação ou o esbulho data de ano
e dia, já se não dá manutenção ou reintegração em limine da lide, no que bem se percebia a concordância do art.
507 do Código Civil com o art. 371 do Código de 1939; aquele diz que, na posse de menos de ano e dia, não se
dá a manutenção, ou a reintegração, sem se apurar qual a melhor posse (= qual a posse que deve, após exame dos
fatos, das provas e das datas, ser manutenida, ou reintegrada
após cognição completa); esse dizia que se a turbação data de menos de ano e dia pode ser manutenida ou
reintegrada em límine a posse (cognição incompleta). Não se enuncie, porém, que, na posse velha, já esteja
firmada definitivamente (?) a relação possessória, como fez a 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 6 de
junho de 1947 (R. dos T., da Bahia, 39, 286), levada pela linguagem atécnica de TITO FULGÊNCIO: não há
definitividade após o ano e dia, há maior eficácia da posse, devido exatamente às regras jurídicas do Código
Civil, arts. 507 e 523, e do Código de Processo Civil de 1973, art. 924, como a do Código de 1939, art. 371.
O Código de 1973 manteve muito do que estava no Código de 1939. No art. 924 diz-se que “regem o
procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da seção seguinte, quando intentado dentro de
ano e dia da turbação ou do esbulho; passado esse prazo, será ordinário, não perdendo, contudo, o caráter
possessório”. Tudo que se regula nos arts. 928-930 somente concerne à medida liminar, que é fora do
procedimento ordinário. Se a turbação ou o esbulho foi fora do ano e dia, o rito processual é só o ordinário.
No Código Civil de 1916, art. 507, parágrafo único, está .a regra sobre peso das provas para se apurar, em plena
cognitio, qual a melhor posse: “Entende-se melhor a posse que se fundar em justo titulo; na falta de título, ou
sendo os títulos iguais, a mais antiga; se da mesma data, a posse atual. Mas, se todas forem duvidosas, será
seqúestrada a coisa, enquanto não se apurar a quem toque”. No art. 500 do mesmo Código Civil, diz-se que,
sendo muitas as pessoas que se dizem possuidoras, se mantém a que detenha a coisa. Se há prova das posses,
incide o art. 499, ou o art. 502, ou o art. 506, ou o art. 507, ou o art. 508; não o art. 500, onde ainda não se entrou
na cognição das posses. Se o juiz ainda não examinou as provas da posse, ou das posses, ou não as há, salvo o
fato de tomada do poder fáctico, ou de turbação, não pode sequestrar o seqüestro da posse (art. 822 do Código
de 1973) somente pode ser decretado se o juiz não chegou a alguma conclusão depois da pesagem dos elementos
das posses (titulus e tempus) e ocorre algum dos casos do art. 822. E como ato provisório de desespero ante a
inconclusividade da apreciação das posses, pelas provas dadas e pela discussão. O seqüestro somente é
permitido, disse o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, a 10 de maio de 1929 (A.J., 13, 172), no começo das
demandas, cumprindo ao juiz reconhecer qual o verdadeiro titular do direito nas sentenças definitivas. A decisão,
que devera ser a favor de A ou B, faz-se constritiva cautelar, envolvendo passageiro “non possumus”. A 5.a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 24 de setembro de 1948 (R. dos T., 177, 790), argumentou:
“O seqüestro supõe a litigiosidade da coisa, ou, por outras expressões, a incerteza subjetiva em relação a ela e,
quando surge o seu ensejo, deposita-se a coisa, porque há dúvida quanto ao termo de relação (sujeito) a que ela
se prende. Em se tratando de posse, tão-só se admite o seqüestro quando se apresenta duvidosa. Só assim haverá
possibilidade do dano jurídico, no caso de não ser decretada a medida. Não basta um dano provável; há mister
que seja um dano ao direito da parte”. Em vez “ao de direito da parte” diga-se “à posse Convém salientarmos que
há um pressuposto necessário, que é um dos que aponta o art. 822.
Se a turbação ou o esbulho ocorreu há menos de ano e dia, há a possibilidade da manutenção ou a reintegração
mi-tio litis. Tal manutenção ou tal reintegração é adiantamento de decisão. Tem-se, pois, de provar o fato e o
tempo. Se esse passou de ano e dia (= se no dia posterior ao ano não se propôs a ação), não há pensar-se em
manutenção ou reintegração liminar. Na ação de reintegração, adianta-se execução; na de manutenção, adianta-se
mandamento.
A manutenção de posse, de que se trata no art. 928, é caso de cognição superficial (Câmara Cível da Corte de
Apelação de Minas Gerais, 2 de setembro de 1933 e 21 de outubro~ de 1936, R. F., 61, 145, e 69, 119; Câmara
Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 7 de maio de 1938 e 3 de julho de 1939, 75, 156, e 79, 486;
Corte de Apelação do Rio Grande do Norte, 10 de julho de 1937, R. do T. de A., 1, 303; 1.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 1.0 de agosto de 1950). Não há confundir-se com a espécie do art. 50& do
Código Civil.
A cognição superficial, o adiantamento de cognição, foi permitido para se dar solução em límine, em processo
especial, conforme já dissemos, há pouco, a tutela jurídica à posse’ não cessa com o esgotar-se o tempo de que
fala o artigo 924: no plano do direito material, tudo continua; a ação possessória persiste a mesma.
mandamental, a de manutenção, executiva, a de reintegração. Não há, então, decisão em límine, porque não se
atribui ao juiz non plena cognitio. Uma vez que se não adianta cognição, não há pensar-se em decisão liminar
que defira o pedido.
Já no direito romano se distinguiram as posses segundo o modo por que se adquiriam. Dai desciam ao exame das
tenças que não eram posses (e.g., custódia), que não geravam propriedade, nem davam a ação publiciana, nem
sequer, a actio noxalis. PAULO, na L. 3, § 21, D., de adquirenda vel amittenda possessione, 41, 2, disse que há
tantos gêneros de posse quantas causas de adquirir o que não é nosso; por exemplo, a título de comprador, de
doação, de legado, de dote, de herdeiro, de doação por nossa, de coisa sua, assim como a respeito das coisas que
apanhamos na terra e no mar, ou aos inimigos, ou que nós mesmos fizemos existirem na natureza (in rerum
natura essent fecimus) e, em suma, há um só gênero de possuir e infinitas espécies.
Causa possessionis é a causa da posse, o seu titulo; e.g., causa traditionis, causa de constituto possessório, titulo
pro derelicto. A expressão “titulus” é posterior (iusti tituli ou veri tituli; iniusti tituli): e. g., L. 4, O., si quis
ignorans rem minoris esse sine decreto com paravit, 5, 73 (iusto titulo), e L.5, C., de praescriptione longi tem
poris decem veZ viginti annorum, 7, 33 (vero titulo). O titulo pode ser só pro possessore. Na L. 13, § 1, D., de
hereditatis petitione, 5, 3, ULPIANO explica que a todos os títulos está unido como inserto o titulo “pro
possessore” (Omnibus etiam titulis hic pro possessore haeret et quasi iniunctus est). O título é o fato pelo qual se
adquiriu a posse, no que pode ele ter relevância para o direito: é justo ou injusto conforme está de acordo, ou não,
com os princípios do sistema jurídico (FRANZ BERNHÕFT, Der Besitztitel, 12) ainda que só eventualmente
(posse justa e posse injusta).
11) PossE DE MAIS DE ANO E DIA. A posse de mais de ano e dia adquire certa consistência aos olhos do juiz,
consistência que a lei atribui, embora a posse de mais de ano e dia possa não ser a melhor. “Se a posse for de ano
e dia, o possuidor será mantido sumariamente, até ser convencido pelos meios ordinários”, diz o Código Civil de
1916, art. 508. Aliter, se a turbação ou o esbulho data de ano e dia ou de mais, porque, então, pode haver posse
que seja de ano e dia. ~ assim que se hão de conciliar o art. 924 do Código de Processo Civil e o art. 508 do
Código Civil (cf. quanto ao Código de 1939, a 6.~’ Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 31
de julho de 1934, A.J., 32, 432). O art. 508, advirta-se, nada tem com textos estrangeiros, que
desarrazoadamente, se referia à questão petitória (e. g., “será o possuidor sumariamente mantido ou restituido,
enquanto não for convencido na questão da propriedade”). O art. 508 do Código Civil de 1916 só se refere à
ordinariedade do processo possessório (verbis “o possuidor será mantido sumariamente, até ser convencido pelos
meios ordinários”). ~ de evitar-se a consulta a direito estrangeiro, radicalmente diferente (2.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de dezembro de 1947, R. dos T., 173, 245). O remédio jurídico processual
do possessorium summariissimum já se excluia ao possuidor injusto, porque a sua posse desaparecia,
relativamente, como é, à viciosidade, perante alguém a que foi tirada, viciosamente. O fim era policial,
preventivo, o de evitar crimes e rixas, a que a justiça de mão própria e a legitima defesa davam ensejo. Usou-se
com seqüestro da posse pelo juiz, e posterior mas imediata decisão sobre quem ficaria provisoriamente mantido.
A ratio iuris era e é a paz pública, o evitamento de lutas e de violência privada (cf. H. vON BAYER, Theorie
der summarischen Prozesse, 178). Nada tem com o interdito ou ação de manutenção, e o nome summarium ou
summariissimum, que se lhe deu, revela pouca ciência dos que o empregavam, pois summarium já era o in
~terdito uti possidetis (sobre isso, F. C. voi’~ SAVIGNY, Da3 Recht des Besitzes, § 51). Em PAULO DE
CAsrao está o princípio “Omnis possessor lite pendente in possessione manuteneri debet”. Só depois se limitou
ao caso de timor armorum proximus, mas posteriormente se afastou isso por estranho ao instituto. O fundamento
de se evitar, com o possessorium summariissimum, a procrastinação dos feitos possessórios, que tantos
sustentaram, foi posto de lado.

O art. 508 do Código Civil não foi revogado pelo Código de Processo Civil de 1939, nem pelo de 1973. A
sentença conforme o art. 508 é de cognição incompleta, superficial, e conteste ou não o réu a ação é
indispensável a sentença definitiva, que complete a cognição. A sentença conforme o art. 508 (Código de
Processo Civil, de 1973, art. 929) não faz coisa julgada, formal ou material; e seria absurdo emprestar-lhe
decisão sobre petitório (2. Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 22 de fevereiro de 1943, R .
F., 120), porque a respeito desse não faz coisa julgada material a própria sentença do art. 932 do Código de
Processo Civil, que é aquela com que se completa a cognição.

Não há contradição entre o art. 924 do Código de Processo Civil, que exige ter sido a turbação ou o esbulho
dentro de ano e dia, e o art. 508 do Código Civil de 1916, que exige à posse mesma ser de mais de ano e dia:
aquele requisito é de direito processual; esse, de direito material. Antes do Código de Processo Civil, a Câmara
Cível do Tribunal de Apelação de Pernambuco, a 8 de abril de 1936 (R. de D., 130, 305), havia chegado à mesma
conclusão: “Contra uma posse maior de ano e dia não é admissível mandado de reintegração prévia ou de
seqüestro. Na posse de menos de ano e dia o possuidor só não será mantido ou reintegrado em face de quem tiver
melhor posse, como tal a titulada, ou, não sendo titulada, ou sendo iguais os títulos a mais antiga; se da mesma
data, a atual”.

No art. 507 do Código Civil, diz-se: “Na posse de menos de ano e dia “nenhum possuidor será manutenido ou
reingrado judicialmente, senão contra os que não tiverem melhor posse”. Melhor posse. Não se trata de melhor
posse existente ao mesmo tempo, mas de melhor posse dentro do lapso menor de ano e dia, como se A possuísse
de janeiro a março, B de abril a maio, por justo título, C de junho a agosto, e D por exatamente o mesmo tempo
que A, com título igual ao de B. O juiz tem de preferir B, porque tem justo título e é possuidor mais antigo que
D, sem ter D havido de B o titulo da posse. Se E e D não tivessem justo título, teria de preferir A, possuidor mais
antigo. Se todos da mesma data, o atual. ~ preciso compreender o art. 507, sob pena de se incorrer em graves
erros dos juizes e dos intérpretes. O Código Civil, art. 507, não alude à pluralidade de posses (mediatas,
imediatas), nem permite que haja duas ou mais posses imediatas ou duas ou mais posses mediatas do mesmo
grau. O art. 445 (antigo!) do Código Civil espanhol, de onde houvemos o art. 507, começava exatamente por
enunciado peremptório: “La posesión, como hecho, no puede reconoscerse en dos personalidades distintas, fuera
de los casos de indivisión”. Mas pode haver dúvida sobre a posse, dúvida que alcança o máximo ponto quando os
litigantes pretendem que têm posse iniciada na mesma data. “Si las fechas de la posesión fueran las mismas...”;
isto é, se o litigante pretende que a sua posse começa no mesmo dia em que o outro diz que começou a sua. No
art. 445 (antigo!), do Código Civil espanhol, dizia-se: “La posesión, como hecho, no puede reconocerse en dos
personalidades distintas, fuera de los casos de indivisión. Si surgiere contienda sobre cl hecho de la posesión,
será preferido cl poseedor actual; si resultaren dos poseedores, el mas antiguo; si las fechas de las posesiones
fueren las mismas, el que presente titulo; y’ si todas estas condiciones fuesen iguales, se constituirá en de-
pósito ó guarda judicial la cosa, mientras se decide sobre su posesión ó propriedade por los trámites
correspondientes.”
Mergulhando no sistema jurídico do Código Civil, o artigo 507 só exprime regra jurídica de julgar: se o juiz não
está convencido de que determinada pessoa há de ser mantida na posse, ou reintegrada (e não pode, segundo o
direito, acobertar-se com Non possumus), o art. 507, parágrafo único, dá-lhe as indicações para obviar à dúvida;
porém, ainda ai, admite que os critérios não bastem, e aponta-lhe a solução do seqüestro, que de certo modo é
conservação daquela dúvida temporariamente invencível. Não se aludiu ao temor de rixa, como antes do Código
Civil se fazia, na composição dos pressupostos do seqüestro. Hoje, porém, o artigo 822, 1, do Código de 1973
fala do seqüestro “de bens móveis, semoventes ou imóveis, quando lhes for disputada a propriedade ou a posse,
havendo fundado receio de rixas ou danificações”. Surge o problema de se saber se o art. 822, 1, do Código de
1973, criou limitação maior. Ora, o art. 822, IV, refere-se a “demais casos expressos em lei”. O art. 507,
parágrafo único, do Código Civil contém um desses casos, pois é explícito: “Entende-se melhor a posse que se
fundar em justo titulo; na falta de título, ou sendo os títulos iguais, a mais antiga; se da mesma data, a posse
atual. Mas, se todas forem duvidosas, será seqúestrada a coisa, enquanto se não apurar a quem toque”.
Se há dúvida sobre títulos, sobre idade e atualidade das posses, o seqüestro é permitido e indicado: “mas, se todas
(as posses) forem duvidosas, será seqúestrada a coisa, enquanto se não apurar a quem toque.

O art. 508 do Código Civil disse: “Se a posse for de mais de ano e dia, o possuidor será mantido sumariamente,
até ser convencido pelos meios ordinários”. No art. 924 do Código de Processo Civil de 1973 formulou-se:
“Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da seção seguinte, quando
intentado dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho; passado esse prazo, será ordinário, não perdendo,
contudo, o caráter possessório”. A divergência, que pudesse existir, seria entre o art. 508 do Código Civil e o art.
924, í.a parte, do Código de 1973, no tocante à manutenção, porque somente à manutenção se refere o ar-tigo
508, verbo “mantido”.
Em direito material, se a posse não fosse de ano e dia, ou mais, não podia o possuidor pretender manutenção
sumária. Em direito processual, se a turbação tivesse sido a mais de ano, não havia manutenção no inicio da lide.
O juiz tinha de atender a regra de direito material, negando a tutela sumária de manutenção a quem só tivesse
posse de menos de ano e dia; o autor que pedia a manutenção, embora já a posse fosse de ano e dia ou mais, não
tinha pretensão à tutela jurídica, sumária, se já se haviam passado ano e dia após a turbação. Tinha-se, assim,
claramente: a) Se a posse era de ano e dia, ou de mais de ano e dia, e a turbação ou esbulho datava de menos de
ano e dia, havia manutenibilidade liminar ou reintegrabilidade liminar. b) Se a posse era de ano e dia, ou de inais
de ano e dia, e a turbação ou esbulho foi há ano e dia ou mais, não havia manutenibilidade liminar ou
reintegrabilidade liminar. c) Se a posse era de menos de ano e dia, e a turbação ou esbulho datava de menos,
havia manutenibilidade liminar ou reintegrabilidade liminar, devido ao art. 371 do Código de Processo Civil de
1939, que deu mais do que o art. 508 do Código Civil de 1916. cl) Se a posse era de menos de ano e dia e a
turbação ou esbulho datava de mais, não havia manutenibilidade liminar, ou reintegrabilidade liminar.
No plano do direito processual, de modo nenhum se pode descer ao exame de ser a posse de mais de ano e dia, o
que estava no Código Civil de 1916, art. 508. A posse podia ter sido de um dia ou poucos mais e ter havido a
turbação,. ou o esbulho. O prazo de ano e dia é para a propositura da ação de manutenção, ou de esbulho. O
direito processual abstraiu do tempo da posse; só se preocupa com o tempo que correu após a turbação ou o
esbulho.

12)MANUTENÇÃO OU REINTEGRAÇÃO CONTRA PESSOAS JITRDICAS DE DIREITO PÚBLICO. O


Código de 1973, no art. 928,. parágrafo único, exigiu que se não deferisse manutenção ou reintegração liminar
contra pessoas jurídicas de direito público sem prévia audiência dos “respectivos representantes judiciais”. As
pessoas jurídicas de direito público, em primeira plana, as entidades estatais brasileiras, as entidades supra-
estatais, como a Organização das Nações Unidas, e as entidades estatais estrangeiras, como a Santa Sé
(Vaticano). As chamadas pessoas jurídicas internas são: a União, os Estados-membros, o Distrito Federal, os
Territórios e os Municípios; as autarquias, os partidos políticos e as sociedades para-estatais, que se não
confundem com as autarquias.
Desde que a capacidade de direito se impôs, supra-estatal e estatalmente, as pessoas jurídicas, criadas em
sistemas diferentes, passaram a ser, pelo menos, referidas em cada legislação, se bem que os princípios não sejam
os mesmos que apanham as pessoas físicas. A qualificação, pessoas de direito público ou pessoas de direito
privado, é dada pelo sistema que as personifica, e não pelo que as importa. De ordinário, porém não sempre, o
que as faz de direito público é estarem elas adstritas ao seu objeto, como dever diante do Estado (H. RO5IN, Das
Recht der õffentlichen Genossenschaft, 18). Isso não exclui a publicização da personalidade segundo outro
critério que tenha o direito, em que se cria e personifica a entidade, ou só se personifica, ou que a importe. O fim,
de regra, não basta: há sociedades e fundações de intuitos políticos, sociais, religiosos, ou morais, e de interesse
geral, que são pessoas de direito privado. Nem a liberdade de associação caracteriza as de direito privado e a
associação compulsória as de direito público. Nem, ainda, a origem delas, porque a publicização pode ser
posterior à criação e, até, à personificação. O que se pode extrair da observação dos sistemas jurídicos é apenas o
seguinte: as pessoas jurídicas, que o direito público cria, por lei, ou por ato administrativo legal, são de direito
público, se o próprio sistema jurídico não as privatiza desde logo, ou mais tarde; as pessoas jurídicas, que,
oriundas de direito privado, são, por lei ou ato administrativo legal, tomadas de direito público, são de direito
público, enquanto não se lhes tira esse caráter. Tudo se reduz a certo arbítrio do legislador, dentro dos princípios
constitucionais.
Tais personalidades são estranhas ao direito privado e ao direito administrativo. Nem toda pessoa jurídica de
direito público é pessoa de direito constitucional, ou pessoa jurídica de direito administrativo. Noutros termos:
União, Estado-membro, Distrito Federal, Território, Município, ou autarquia. Os sindicatos profissionais
(distritais, municipais, intermunicipais, estaduais e interestaduais e nacionais)
são pessoas de direito público (Consolidação das Leis do Trabalho, arts. 511-625).

Art. 929. Julgada procedente a justificação, o juiz fará logo expedir’) mandado de manutenção ou de
reintegração 2)•

1)EXPEDIÇÃO IMEDIATA DO MANDADO DE MANUTENÇÃO OU DE REINTEGRAÇÃO. No próprio


julgamento da judificação , se aí se diz procedente o que se justificou, tem o juiz de “fazer expedir”, não se diga
“tem de ordenar” a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração. A mandamentalidade
suficiente já se irradia da sentença na ação de manutenção, porque, seja liminar ou definitiva a manutenção, a
sentença é mandamental; na ação de reintegração de posse, seja liminar ou difinitiva a reintegração, a força da
sentença é executiva, com eficácia mandamental imediata.

2) FAlTA DA EXPEDIÇÃO. Se, a despeito da sentença favorável, o mandado não foi expedido, responsável, no
plano do direito de organização judiciária, ou do direito processual civil, ou mesmo do direito penal, se a figura
criminal se compõe, é o escrivão ou o juiz. O oficial de justiça só é responsável após a expedição.

Art. 930. Concedido ou não o mandado liminar 1) de manutenção ou de reintegração, o autor promoverá, nos
cinco (5) dias subseqüentes , a citação do réu para contestar a ação2).
Parágrafo único. Quando for ordenada a justificação prévia (art. 928), o prazo para contestar contar-se-á da
intimação do despacho que deferir ou não a medida liminar3).

1) DECIsÃo LIMINAR. Não concedida, inicialmente,a manutenção, ou a reintegração, a resolução não é final, é
apenas sobre oportunidade. Concedida, a decisão é parte integrante do processo, e apenas defere o pedido de
manutenção ou reintegração inicial. ~ de observar-se, então, que a ação sofre deslocamento do elemento
decisional, que seria agora, e passa a ser contemporâneo da sentença final. Mas a ação continua executiva lato
sensu.
A ação de manutenção só terá o mandado definitivo a final.
Não havendo adiantamento de execução, toda a executividade provém da sentença.
Se o proprietário da coisa prova a sua propriedade, a posse presume-se sua, se a coisa está com ele; e então ao
réu compete afirmar e provar os fatos que direta ou indiretamente negam a posse do proprietário (KoNRAD
HELLWIG,, Lehrbuch, 1, 208).

2)CITAÇÃO. Quando tiver havido justificação, prévia e deferimento do mandado, ou não, com intimação do réu
para ciência do despacho que concedeu, ou não, o mandado preliminar, isto é, para contestação, faz-se citação
(está dito no art. 930, parágrafo único: “o prazo para contestar contar-se-á da intimação do despacho que deferir
ou não a medida liminar”).
3)COMINAÇÃO DA PENA. O art. 924 não exclui a pena cominada ao réu que perturbe, ou esbulhe. Tal
cominação, que a prática portuguesa criou no século XV, suscetível de ser explicada como reminiscência da
proibitividade do uti possidetis romano, mas, a nosso ver, erradamente, veio até nós, a despeito das Ordenações
Filipinas, Livro IV, Título 48, pr., que dela não cogitaram. A caução, ao que nos conste, nunca se usou em
Portugal; e a concepção portuguesa permaneceu através de J. H. COREEIA TELES (Doutrina das Ações, 209) e
de ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Consolidação, art. 757). Aliás, sem a exigência da caução, ou da pena, o
mandado do juiz cairia no vácuo. O Código de 1939, nos arts. 712-716, disciplinou o atentado e conservou, no
art. 716, a referência à“multa”. A lei processual de 1939 entendeu, e bem, que os juizes não podem expedir
mandados inúteis e que todos eles se supõem com a respectiva pena. Não valia o argumento de ser explicito o art.
378 do Código de 1939, hoje art. 932 do Código de 1973, a respeito do interdito proibitório, porque, aí, a pena é
inerente ao remédio jurídico processual, que de outro modo ficaria inútil, em caso de continuar a ameaça, se não
houvesse perdas e danos. Quanto ao atentado, confiram-se, hoje, os arts. 879-88 1.
Art. 931. Aplica-se, quanto ao mais, o procedimento ordinário’) 2)•

1) OBDINARIEDADE EVENTUAL. Contestada a ação, o rito é o ordinário. Da sentença cabe apelação, com
“efeito” Variável. Entenda-se: suspensivo ou não suspensivo da nova eficácia (completante) da sentença.
A ação de manutenção de posse é mandamental; os elementos executivo e condenatório são infimos. A ação de
reintegração é executiva-mandamental, com forte dose de condenatoriedade.
Ação executiva a de reintegração, é lógico que o “efeito” da apelação seja apenas o devolutivo. De modo que o
conhecimento do verdadeiro lugar dessa ação na classificação das ações vem coincidir com os resultados das
argumentações retóricas, ou tendenciosas, com que se procurava fundamentar o princípio, revelado às boas
inteligências, de que o efeito da apelação da sentença favorável nas ações de reintegração seria só devolutivo. A
sentença desfavorável é declarativa, de modo que não cabe falar-se de insuspensão.

A ação de manutenção é mandamental, e não há, na sentença, se favorável, incursão na esfera jurídica de outrem:
manda-se, declarando-se, e não executando, ou condenando. A apelação exclui o efeito do mandado com
pletativo, não o do mandado inicial, provisório, que continua intacto, uma vez que a sentença favorável dá (plus)
e o efeito suspensivo da apelação tira (minus); consequência: zero. Se a sentença édesfavorável, não tendo
havido manutenção initio litis, a eficácia de suspensividade da apelação é sem alcance: suspensão de não-
eficácia! Se houve mandado initio litis, a sentença desfavorável, que determina a sua cassação, é de eficácia
mandamental negativa e a apelação a apanha com o efeito suspensivo: o autor é mantido na posse que tem, em
virtude do mandado initio litis. Para se chegar a esses resultados, bem tortuosos foram os caminhos tomados pela
doutrina. Veja comentário ao art. 520.

(a)J. H. BOEHMER, nas Exercitationes ad Pandectas, exc. 90, 1, § § 8 e 9, entendia que a L. un., C., si de
momentarja possession.e fuerit appellatum, 7, 69, somente se referia aos interditos recuperandae possessionis,
para excluir a apelação. Na doutrina portuguesa, ALVARO VALASCO (Decisionum ac Consultationum, 1, 92)
adotou (a), e não tergiversou:“sententia lata in possessorio non admititur appellatio, sive sit possessorium
recuperandae, sive retinendae, sive adipiscendae”. Influência de BÁRTOLO DE SAXOFEBRATO, que ele’ cita.

(b)JORGE DE CABEDO (Practicarum Observationum sive Decisionum Supremi Regni Lusitaniae Senatus), na
dec. 66, n. 5, e ANTÔNIO DE SoUsA DE MACEDO (Decisiones, 164) representaram a boa corrente, que
admitia a apelação com o só efeito devolutivo.

Se o autor foi esbulhado, a sentença favorável é exocutiva: o recurso não podia ter efeito suspensivo. Não assim,.
se lhe é desfavorável. fl verdade que MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, II, 26 5.) lançou a
proposição * “Respectu possessionis non est admittenda appellatio suspensiva”, mas ele mesmo antes, restringiu
o assunto ao caso “quo ipsi spoliati appellant”. “Primus casus est quando lata fuit sententia contra actorem
spoliatum; quia is potest appellare suspensive, prout colligitur ex nostro textu”, referindo-se às Ordenações
Filipinas, Livro III, Titulo 48, § 3, “ubi supponens, quod de iure communi non datur appellatio, eam. concedit,
quia talís denegatio esset spoliato praeiudicialis,, quod praeiudicium considerari non potest, quando appellatio
denegatur reo spoliatori’. MANUEL GONÇALVES DA SILVA não distinguira as duas sentenças pela natureza
da eficácia (força executiva, força declarativa): no seu empirismo, com certa perspicácia, frisara o prejuízo e o
não-prejuízo, separando o que as Ordenações Filipinas não haviam separado:
“E posto que segundo Direito em estes efeitos de forças novas. não se haja de receber apelação” (influência de
BÁRTOLO DE SAXOFERRATO), “porque isto poderia ser em prejuízo dos esbulhados”, “havemos por bem
que as partes em eles possam apelar nos casos em que segundo nossas Ordenações se pode apelar”. A Ordenação
nada dizia sobre o efeito; e foi a doutrina que introduziu a regra da só devolutividade. Suspensivo seria se contra
o esbulhado ou quem se queixasse de esbulho.
ANTÔNIO JOAQUIM RrsAB (Da Posse e das Ações Possessórias, 271 5., e 290) reproduziu a regra jurídica da
não-suspensividade, exceto se desfavorável ao autor a sentença, quer em relação à ação de força espoliativa, quer
em relação àação de força turbativa. Não foi menos feliz TEIXEIRA DE FREITAs (Primeiras Linhas de
PEREIRA E SoUsA, II, 51), que só se referiu à ação de esbulho.

Foi PAULA BATISTA (Teoria e Prática, 3.a ed., 227) quem mais concorreu para se aproximar da solução: o
recurso é suspensivo “nas ações executivas, se a sentença for contra o autor”. Mas, assim, reduziu a eficácia, que
se não suspende, à sentença executiva.
Diz-se que a sentença desfavorável ao autor é suscetível de apelação, e o efeito dessa é suspensivo. Se não se
havia adiantado execução, suspender-se-ia nada, porque efeito executivo não houve. < Se houve adiantamento
de execução> isto é, reintegração liminar? O efeito suspensivo, diz-se, apanha esse efeito, mas esse efeito é
anterior, e não da sentença.
Assim, se a lei processual permitiu adiantamento de execução, esse adiantamento de execução é inatingível pela
eficácia suspensiva da apelação. ~ o que se passa com as ações de força nova, pois que se permite, aí, a
manutenção liminar ou a reintegração liminar. Resta saber se, não sendo manutenido, ou reintegrado,
inicialmente, o autor,pode o juiz fazê-lo depois, inclusive por ocasião da sentença final, preexcluindo, assim, o
efeito suspensivo da apelação. A jurisprudência, na esteira de opinião nossa, assim entende (Tribunal de Justiça
do Distrito Federal, 16 de março de 1950, A.J., 102, 93: “julgada procedente a ação de força nova espoliativa,
deve o autor, se não o foi liminarmente, ser desde logo reintegrado na posse cujo esbulho foi reconhecido na
sentença final, apesar de pender de recurso cujo recebimento deverá operar-se em ambos os feitos na
conformidade do art. 830, § 2.0, do Código de Processo Civil (de 1939). Ato meramente administrativo, decisão
graciosa do Juiz, medida extraordinária de restituição contra o espoliador, a reintegração possessória na ação de
força nova espoliativa, após concluído o processo de cognição, não se confunde, pois, com o processo de
execução de sentença, devendo ser realizada a qualquer tempo, mediante mandado do Juiz, não obstante o
recebimento em ambos os efeitos da apelação”; Conselho de Justiça do Tribunal de Justiça do Distrito Federal,
29 de agosto de 1950, D. da J. de 29 de agosto de 1951; contra a 8.a Câmara Cível, 29 de junho de 1951, D. da
J., de 9 de abril de 1952).
Há argumento maior: a ação possessória de reintegração é ação executiva. O principio apanha as ações
executivas lato sensu, que não estão sujeitas a embargos do devedor. A propósito da ação de manutenção o efeito
mandamental de manter-se a posse é ligado ao Quieta non movere para cujo respeito se tem o próprio art. 500 do
Código Civil de 1916 (possessorium summariissimum).
A propósito das ações de reintegração não há efeito suspensivo da apelação.
Surge questão relativa à sentença que julga improcedente a ação, tendo havido, antes, manutenção liminar ou
reintegração liminar. Esperava-se + 1/2; e ocorreu 1/2. Portanto 0. Sendo suspensivo o efeito da apelação, não
poderia ser eliminado o + 1/2, deferido ab initio. Nesse sentido, as Câmaras Reunidas do Tribunal de Justiça do
Rio de .Janeiro, a 18 de outubro de 1950 (R. F., 135, 197). Mas sem razão, porque a medida liminar dependeu de
decisão irrecorrível do juiz, decisão com que se adiantou execução e esse adiantamento cessa com a cognição
final contrária. Na sentença desfavorável há implícita a cassação do mandado, o que não se opera, posto que
suspensiva a apelação, com a res iudicata. Ela só suspende a eficácia da cognição completa.
A manutenção ou a reintegração devia ter sido de inicio,e não no foi. Se a sentença julga procedente a ação e
mandamanter ou reintegrar, tem-se de entender que a apelação é só quanto à parte da sentença que julga
procedente o pedido, e não do tardio mandado de manutenção ou de reintegração.
A manutenção liminar não permite ao apelante molestar o apelado: há o principio Quieta non movere que leva a
Invocar-se o próprio art. 500 do Código Civil de 1916.
Se a sentença resolve sobre qualquer questão de propriedade, a apelação tem efeito suspensivo. A ligação obriga
a que se tratem como sentenças diferentes, se possível, as duas partes da sentença, só formalmente una.
Se há qualquer condenação, dá-se o mesmo, e aqui a solução vem através de toda a doutrina portuguesa, com
ANTÔNIO GOMEs e outros, até MANUEL GONÇALVES DA SILVA. ‘O problema fora meditado.

2)COMPLETAMENTO DA COGNIÇAO. Se não foi contestada a ação, os autos são conclusos. A sentença é
daquelas a que se chama sentença no estado em que se acham os autos. As afirmações do autor têm de ser
tratadas segundo o .art. 334, II. Se o réu contesta e não comparece, o art. 453, II, é aplicável. Ainda que não tenha
havido contestação, a sentença é indispensável para se fazer completa a cognição, que fora superficial.
No art. 830, II, do Código de Processo Civil de 1939~ dizia-se que as apelações seriam recebidas no efeito
somente devolutivo se interpostas das sentenças que julgarem procedentes as ações executivas. Às ações
executivas de títulos judiciais apenas eram oponiveis embargos do executado, cuja suspensividade era assaz
limitada a espécies de alegações (art. 1.010), a que hoje se assemelha o art. 741 do Código de 1973. A execução
de títulos extrajudiciais era em ação diferente, com a contestabilidade, e não a embargabilidade.
Isso acabou e os embargos do devedor, a ação seja executiva de título judicial (Código de 1973, arts. 584 e 741-
744), ou seja de título extrajudicial (arts. 585 e 745), só excepcionalmente tem eficácia suspensiva (arts. 741 e
745, l.a parte). Portanto, se a alegação é de falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento, se ação
corre à revelia do ora embargante (art. 741, 1), se é da inexigibilidade do titulo (art. 741, II), se é de ilegitimidade
das partes (art. 741, III), se é de cumulação indevida de execuções (art. 741, IV),. se é de excesso de execução,
ou de nulidade dessa até a penhora (art. 741, V), se é de a haver qualquer causa impeditiva, modificativa ou
extintiva da obrigação, desde que superveniente a sentença (art. 741, VI), ou se é de incom petência do juízo da
execução, bem como se é de suspeição ou impedimento do juiz (arts. 741, VII, e 742).
Se a ação de que cogita o art. 931 foi de força declarativa e houve apelação, não se pode pensar em suspensão,
porque ainda não houve eficácia. Não houve execução e nada havia para se suspender. Se houve reintegração
liminar, a apelação é da sentença, e não, se o efeito foi anterior à sentença de que se apela.

SEÇÃO III

Do interdito o proibitório 1)2)

1) INTERDITO PROIBITÓRIO, ORIGENS. Ordens do magistrado, como todos os interditos, ordens entre duas
pessoas, razão de Justiniano, assim lhes querer explicar o étimo (§ 1, 1., de interdictis, 4, 15), os interditos
proibitivos eram os interditos no sentido estrito (GAIO, IV, 140). A proibição constituía, e constitui, simples
preponderância da negatividade, da abstenção, em vez da positividade do ato que o Estado ordena parta de uma
das pessoas. Em verdade, não havia, nem há, divisão dos interditos em retinendae, recuperandae, prohibitoria;
houve, e há, classificação em decreta (recuperandae, exhibitoria) e interdicta (prohibitoria). Os interditos
atuaram na concepção dos decreta, donde a distinção interditos proibitórios (uti possidetis, utrubi) e interditos
restitutórios. A chamada ação de manutenção contém o elemento proibitivo, porque interdiz que uma das partes,
a que turbou, continue de turbar, ou turbe de novo.
O interdito proibitório concorreu para a concepção de remédios jurídicos processuaís relativamente recentes,
porque, em verdade, trazia em si o elemento inibente de que se serviram ações de nascimento medieval e dos
nossos tempos. Ele mesmo ganhou, já nos séculos XIX e XX, com a investigação científica da sua influência e
do seu verbo característico: “Veto!”
ULPIANO, na L. 1, pr., D., ne quid in Ilumine publico fiat, quo aliter aqua fluat, atque uti priore aestate fluxit,
43, 13, lembrou palavras do Pretor: “Disse o pretor: Vedo fazer em rio público, ou em sua riba, ou pôr nesse rio,
ou em sua riba, algo que faça correr a água de outro modo em que aquele como corria” (Ait praetor: In flumine
publico inve ripa eius facere aut in id flumen ripamve eius immittere,que aliter aqua fluat, quam priore aestate
fluxit, veto). Com esse interdito, esclareceu ULPIAINO, o Pretor proveu a que não míngúem os rios com
derivações não concedidas (ne derivationibus minus concessis flumina excrescant), ou a que, mudando o álveo,
não se cause algum prejuízo aos vizinhos (vel mutatus alveus vicinis iniuriam aliquam adferat).
Se o dano foi maior do que o previsto, que se alegou para o exe~rcício da pretensão ao interdito proibitório, cabe
o interdito restitutório, para que se restabeleça o estado anterior (L. 1, § 11). o interdito proibitório só se refere
ao que ainda não se fez (prohibitorium est et pertinet ad ea, quae nondum facta sunt). Se algo já ocorreu, pelo
interdito restitutório restitui-se ao estado anterior (si quid igitur iam factum est, per hoc interdictum restituetur).
Assim está na Já no direito luso-brasileiro se pôs claro, quanto às obras feitas em rio, com autoridade do príncipe,
que se subentende só ter havido autorização ressalvado o prejuízo de terceiro (A~róNIo MENDES AROUCA,
Allegationes luris, 88; JORGE DE C~o, Decisiones Senatus Regni Lusitaniae, Pars II, d. 18, n. 9).
Os usos e costumes do lugar são assaz relevantes para se saber quais as atividades que podem ser exercidas pelos
vizinhos, na exploração das terras e das instalações, mesmo se há contratos quanto à posse e não há referência a
eles (Casa do Porto, 3 de novembro de 1691: “... o Direito manda observar os costumes das Províncias em que se
celebram ainda deles se não faça menção alguma”).
O interdito proibitório é ação possessória. Pode ser pedido mesmo pelo possuidor impróprio como, por exemplo,
O locatário, contra terceiros ou contra o locador e assim se entendeu, quanto à elevação de nível de água, com
freqUência, no direito luso-português (e . g., Desembargo da Casa do Porto, 3 de novembro de 1691, cf.
MANUEL ALVARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, VII, 127).

A diferenciação entre a ameaça e a turbação ou o esbulho, que fez as três categorias ação de manutenção, ação
de reintegração, ou interdito proibitório, é de elaboração postenor. O vim fieri veto (proibo fazer violência) está
no interdito de manutenção, como o veto no interdito proibitório. Não há facias na manutenção, como há na
reintegração, nem mitas, como há na ação de imissão: há ....... facias”, “veto”. A caracterização de dois interditos
conservativos, o de manutenção e o de prevenção do ato turbativo futuro, não apagou todo o elemento proibitivo
daquele, que ULPIANO dizia “prohibitorium ad retinendam possessionem”. Trata-
-se, também, de aplicação especializada do interdito proibitório à força iminente, como terceiro caso de força,
depois dos dois de força realizada (força nova, força velha). O mandado de non amplius turbando abrange a
força iminente e a nova.
A sentença, no interdito proibitório, mostra tanto ele~ mento executivo quanto na própria sentença de
manute.nçáo, e de nenhum modo se parece com a sentença (executiva) da ação de reintegração. Por outro lado, o
veto do interdito proibitório, que é como o da ação de manutenção, possui, àsua base, menor dose de condenação
que a da ação de manutenção e, a fortiori, da ação de reintegração. O elemento mandamental prepondera como
se passa com a própria sentença na ação de manutenção.
Embora se fale de que “o juiz segure da violência”, não se trata de ação similar às ações cautelares; mais se
aproxima das ações cominatórias.
A pretensão ao interdito proibitório pode existir, seja, ou não, corpóreo o bem (sem razão, o Juízo de Direito da
2•a Vara da Fazenda Pública, a 26 de março de 1956, D. da J. de 4 de abril). O interdito de que se fala é
possessório; e objeto da posse tanto pode ser bem corpóreo quanto incorpóreo (obra intelectual, invenção,
desenho de utilidade ou modelo industrial, marca de indústria e de comércio, sinal de propaganda, indicação de
proveniência). Onde quer que possa ser objeto de propriedade o bem, pode haver posse. Se pode haver posse,
pode haver tutela jurídica possessória. Tanto é protegível, possessoriamente, por exemplo, a posse do bem
corpóreo da tela, ou do exemplar do livro, quanto a do bem Incorpóreo do autor da pintura ou do livro. Assim, se
C reproduziu a tela feita por A e vendida a B, com indicação de ser único exemplar, C ofendeu a posse da obra
de arte (bem incorpóreo) e a posse da tela em que ela se fez (bem corpóreo). Se foi A que fez a reprodução,
ofendeu a posse de B.E o direito. Se C apenas furtou a tela, só ofendeu a B, e não a A.

2) PossE E INTERDITO PROIBITÓRIO. O interdito proibitório não se restringe à posse. Tem outras
reminiscências históricas, mesclado a elementos germânicos e canônicos. Mas, a ação de que aqui tratamos é só
possessória. Tudo que se disse em relação ao objeto das outras ações possessórias lhe é aplicável. N~ se lhe há
de exigir qualquer direito à posse, como seria a regra em qualquer caso de ação de imissão de posse.
O interdito proibitório não se exerce sem satisfação de pressupostos. Basta que se leia o art. 932. Daí ter sido
contra a lei o acórdão da 1.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 26 de novembro de 1945 (R.
dos T., 162, 121), que dispensou prova da posse e do receio da ameaça para a cominação da pena. Tal cognição é
superficial, mas a atribuição de automaticidade ao despacho abusa dos principios.
Se a sentença, na ação de interdito proibitório, ordena que o réu afaste turbação já ocorrida, implicitamente o
condenou a renovar as obras ou instalações (3.a Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de outubro de
1929, R. dos T., 75, 477), porque os mandados judiciais são aos oficiais de justiça e às pessoas a que o juiz pode
mandar, e é a condenação o elemento de eficácia que se dirige às partes não-subordinadas a mandado judicial não
alternativo. Os mandados “pague ou sofra execução” são mandados de execução em que se torna resolutiva a
condição de pagamento. Demais, a medida que se pede ao juiz, para que se segure contra a violência iminente, é
interdital e, se aprecia o passado, tem de condenar. Note-se aí que a carga de eficácia da sentença se modifica,
porque em verdade há duas ações: a que se refere ao receio de moléstia à posse e a que aprecia e dano ocorrido,
ou, pelo menos, a mudança de estado de coisas.

A medida liminar, na ação de manutenção, e o preceito,•no interdito proibitório, não retiram posse ao
demandado (2.0 Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de agosto de 1952, R. dos T.,
205, 125). Aliter, em se tratando de ação de esbulho, em que o possuidor reassuma
a posse.

A ação de interdito proibitório nada tem com o domínio, nem com os limites dominicais. Os limites de
propriedade podem estar confusos, e os da posse, não. Se a prova da posse é insuficiente, a ação terá de ser
julgada improcedente; não se pode, porém, enviar as partes ao juízo demarcatório, como fez a 2.~ Câmara Cível
do Tribunal de Justiça da Bahia, a 2 de maio de 1951 (R. dos T., da Bahia, 44, 141). Certamente, há a ação de
demarcação da posse, mas, se posse há, e é isso o que se apura nas ações possessórias, e dela há prova, sabe-se
que a posse começa da linha a e acaba na linha b, com as duas outras linhas c e d, posto que, nos limites, possa
haver compenetração de atos possessórios dos confinantes. Nem por isso eles deixam de ser, aí, possuidores,
com pretensão à proteção possessória.
Em principio, a ação de interdito proibitório, por haver ameaça de turbação ou esbulho, tem de ser proposta no
foro da situação do imóvel. Se o demandado é a União, a ação tem de ser proposta na capital do Estado-membro,
em que está situado o bem imóvel, ou no Distrito Federal. Se a União não é demandada, a ação pode ser proposta
no foro da situação do imóvel, mas se tem de ser assistente ou apoente a União a competência é dos juizes da
capital -Nesse último caso, com a lide instaurada na capital do Estado-membro, pode ocorrer que a União
confirme a suposição de haver o seu interesse de assistência, ou o negue, como se ela entende que o autor tem
razão no exercício da pretensão à tutela jurídica, ou se não encontra razão para intervir como assistente.
Se a causa é proposta no foro da situação do imóvel, sem se caracterizar o interesse da União, a ulterior revelação
do interesse da União tem como conseqUência ser necessário que se suscite a intervenção da União, ou ela
mesma, sem qualquer ato de qualquer das partes, intervém como assistente ou entra no processo como
litisconsorte. Qual a função do juiz, em tais casos, depende de ser necessário, ou não, o litisconsórcio.
A intervenção da União pode ser por ato da União, ou por ato de parte, que considere necessária a assistência da
União, ou, a fortiori, litisconsorte necessário.

Art. 932. O possuidor direto ou indireto, que tenha justo 6) receio 2) de ser molestado5) na posse 4), poderá
impetrar ao juiz que o segure da turbação ou esbulho3) eminente, mediante 7) mandado proibitório 1) 9), em
que se comine ao réu determinada pena pecuniaria, caso transgrida o preceito 8)

1) AçÃo DE FORÇA IMINENTE. No direito reinícola, a ação de força iminente aparecia nas Ordenações
Filipinas,Livro III, Título 78, § 5: “Se alguém se temer de outro que o. queira ofender na pessoa, ou lhe queira,
sem razão, ocupar e tomar suas coisas, poderá requerer ao juiz que segure a ele e as suas coisas do outro que o
quiser ofender” - A parte grifada corresponde à tentativa peninsular, estrangulada no nascedouro, de criar, com
toda eficácia, o habeas-corpus - O texto filipino tinha raízes insignes (Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 80,
§ § 6-9; Ordenações Manuelinas, Livro III, Título 62, § § 5-7). Diziam as Ordenações Afonsinas, Livro III,
Titulo 80, § 6: “No Terceiro caso, honde tratamos dos autos nom começados, mais cominatórios, Dizemos que a
parte, que se teme ou recea ser aggravada, se pode socorrer aos Juizes da terra, improrando seu Officio, per que
mandem prover como lhe nom seja feito tal aggravo” - No § 7:“E ainda Dizemos, que poderá fora do Juízo
apelar de tal comminaçam, a saber, poendo-se sob poderio do Juiz, requerendo, e protestando da sua parte a
aquelie, de que se teme ser aggravado, que tal aggravo lhe nom faça. E se depois do dito requerimento, e
protestaçam assy feita, for alguúa novidade cometida, ou atentada, e o Juiz depois for requerido pera elio,
mandará todo tornar, a restituir ao primeiro estado”. No § 8: “E em tal apelaçam, ou protestaçam assy feita deve
ser inserta, e declarada a causa verisimil e resoada, por que assy apelou, ou protestou, como dito he nas outras.
apelaçoens. Pode-se poer exemplo. Eu me temo de alguum, que me queira ofender na pessoa, ou me queira sem
rezam ocupar, e tomar minhas cousas; se eu quero, posso requerer ao Juiz, que segure mim, e minhas cousas
delle, a qual segurança me deve dar; e se depois della eu receber ofença do que fuy seguro, o Juiz deve hy tornar,
e restituir todo o que for cometido, e atentado depois da dita segurança dada, e mais proceder contra aquelle que
a quebrantou, e menos presou seu poderio”. E no § 9: “E se nam quero, ou nam posso direitamente hir ao Juiz,
posso fora do Juizo apelar, ou protestar a aquelle, de que me areceo ser ofendido na pessoa, ou beens,
sometendo-me, e poendo-me sôo o poderio do juiz, e requerendo da sua parte, que me nam faça tal ofença,
declarando alguuma justa, e verisimil rezam, em que me -funde fazer a dita apelaçam, ou protestaçam; e se
depois que ella assy foi feita, eu delle receber alguuma ofença em meus beens, o Juiz da terra requerido por mim,
e informado soomente da dita appellaçom, ou protestaçom, mandará loguo todo tornar ao primeiro estado, em
que ante estava; e se me for feita ofença na pessoa, procederá contra elle asperamente, assy como aquelle, que
cometeo cousa grave, e desprezou o requerimento, que lhe foi feito por parte da Justiça.”
Havia a ação de interdito proibitório e a ação de preceito cominatório, em relação jurídica processual angular,
desde o início, e a ação de interdito proibitório e a de preceito cominatório com duas faces, uma, em linha reta
(justiça de mão próprio interditiva ou cominatória), e outra, em ângulo (a partir da cognição pelo juiz).
O possuidor, que tem justo receio de ser molestado na posse, pode impetrar ao juiz que o segure da violência
iminente, cominando pena a quem lhe transgredir o preceito. Não é preciso que já tenha havido turbação ou
esbulho; basta que haja “justo receio” - A inserção da regra jurídica do art. 501 no Código Civil de 1916 fez
nascer ao ameaçado pretensão ao interdito proibitório; de modo que a sua posse, como a ameaça e o pedido de
cominação, entra no mundo jurídico.

Contra o interdito proibitório articulou-se que é regressivo ao direito romano. Mas, tal argüição provém de
pessoas que, não encontrando em livros franceses, ou de outros povos, o instituto, logo ferreteiam como
regressivo ou desacertado o que está no sistema jurídico brasileiro, herança das melhores em todo o mundo e
guardada, a despeito de vicissitudes políticas desvíadoras das trilhas do destino do povo, por espíritos de escol. ~
pena que em julgados se repitam tais leviandades (e. g., Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de
agosto de 1931, R. dos T., 80, 168).

O interdito proibitório tem por fito afastar, com a proibição, a ameaça de turbação, ou de esbulho - Alega-se e
prova-se o receio. A negação da posse, embora não dê ensejo à manutenção, pode dar à proibição, máxime se há
notificação para o possuidor sair da posse (Câmaras Conjuntas da Corte de Apelação do Distrito Federal, 11 de
dezembro de 1934, • A. J., 34, 243), ou se é de concluir-se das circunstâncias. Não é preciso que já tenha havido
atos (Corte de Apelação, 30 de outubro de 1935, R. F., 66, 509). Cabe contra a administração pública e a justiça
(Câmara Cível do Tribunal da Relação de Minas Gerais, 22 de fevereiro de 1930, R. F -, 54, 272; Câmara Civil
do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de julho de 1923, 1?. dos T., 47, 121), nas mesmas espécies em que
caberia a ação de manutenção ou a de esbulho. Não importa se a posse que se quer seja protegida é imediata ou
mediata (e . g., toca ao depositário de bens penhorados, Câmara Cível da Corte de Apelação de Minas Gerais, 15
de janeiro de 1936, R. dos T., 66, 304). Não revela propósito de ofensa à posse quem pede à justiça tutela aos
seus direitos à posse, ou à posse; mas revela-o quem procura a autoridade policial, tratando-se de bem imóvel,
ou, tratando-se de bem móvel, sem dar previamente queixa criminal. O protesto judicial não é ofensa à posse (2.a
Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 27 de agosto de 1941,R. F., 89, 222); não dá base
a interdito proibitório, nem a pode dar a ação declaratória da posse. O fato de alguém, possuidor imediato, colher
frutos ou fazer benfeitorias, contra a posse mediata, é turbação, ou ameaça de turbação. Tem o possuidor
mediato, o protesto, medida de segurança, a ação declaratória da relação jurídica ou do conteúdo da posse
mediata, e as ações possessórias, inclusive o interdito proibitório (sem razão, a í.a Câmara Cível do Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Sul, a 7 de novembro de 1944, R. F. 101, 543).
Acima dissemos que há ofensa em se procurar a autoridade policial, sem se dar queixa criminal; mas isso não
quer dizer que se não possa preferir a advertência, o aviso de queixa criminal com intuito de paz - Todavia, se
injusta a alegação, há implícita a ameaça de ato contrário, o que permite o advertido desde logo se tema da
ofensa e requeira o interdito proibitório, se é o caso dele.
Tem-se excluído da pertinência do interdito proibitório a ameaça oral ou escrita, sem outros atos (3.a Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de dezembro de 1933, 1?. dos T., 93, 72; 2.~ Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Paraná, 25 de junho de 1947, Paraná J., 46, 175; 5~ a Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 28 de maio de 1948, R. dos T., 175, 259). Ora, distinguir o juiz entre o que é ameaça oral ou escrita
e o que não é ameaça oral ou escrita orça por sutileza imprópria da austeridade da justiça. Ameaça é fato ou
houve ou não houve. Por outro lado, a ofensa iminente não é só a que deva acontecer, inevitavelmente, em
determinado tempo, mas a que se pode prever, em tempo incerto, ou a que é provável que se dê (2.a Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de dezembro de 1948, R. dos T., 179, 190).

2) RECEIO. “Receio”, isto é, ter conhecimento de fatos ou circunstâncias que lhe façam suspeitar de que o réu o
vai molestar na posse. Quem receia tem de encobrir-se (re-celare), porque teme.

3)TURBAÇÃO OU ESBULHO IMINENTE. A ocorrência turbativa ou esbulhante tem de ser futura, iminente;
porém a iminência da turbação não supõe a imediatidade. Não é preciso, pois, que se trate de ameaça de ação
imediata, próxima. Iminente está, aí, por futura. O que se há de exigir é que a distância, no tempo, não seja tal
que o interesse se apague.
4) PossE - Posse, tal como se exige ao autor da ação de manutenção, é atual. Quem perde a posse, e. g -, se foi
.esbulhado, nenhuma legitimação tem para o uso do interdito proibitório: o “veto” cairia no vácuo. Quem quer
reintegração precisa de mais do que o preceito.

5) OFENSA. Não importa qual a extensão da ofensa com que está ameaçada a posse, pode ser temor de esbulho
ou da mais leve e passageira turbação na posse.
Danos previstos, que dêem ensejo à propositura de ação de interdito proibitório, podem resultar de exercício de
qualquer atividade em terras vizinhas, ou mesmo em terras em que tenha havido permissão de vizinho para obras
ou outros atos, ou exercício de imissão provisória de posse.
Para que seja exercida a ação de interdito proibitório, não é preciso que se preveja o que há de acontecer, mas
apenas que se tema que aconteça. Basta que se receie e haja fundamento para esse receio. Daí falar-se de “justo
receio” - Não se exige a inevitabilidade, tanto assim que se quer o evitamento. Nem que se diga quando pode
ocorrer, tanto assim que só se alude à iminência, que resulta de ser justo o receio -Aliás, a iminência não é, ai,
nem no é no étimo, sinônimo de imediatidade. O que é imminens é ameaçante, sem que tenha de ser logo após,
ou em breve tempo. Por isso, fez bem a jurisprudência em abstrair do tempo em que se pode dar o que se teme -
O pressuposto é o justo receio. Por outro lado, tanto se pode recear o que vai acontecer como o que pode
acontecer.

6)“JusTo RECEIO”. “Justo receio” é o receio que se não reduz a simples suspeita, a simples temor subjetivo -
~ preciso que exista alguma fundamentação dele. Quem receia, sem razão para recear, receia injustamente -
7) PRESSUPOSTOS. Os pressupostos devem concorrer. A prova é feita sem forma solene, com os elementos
que• as circunstâncias permitam. A cominação é de pena pecuniária, fixada pelo juiz, que para isso deve atender
ao valor do• prejuízo que a ofensa temida causaria. A transcrição da petição e do despacho é essencial; a falta
constitui nulidade -Alguns juizes tinham sustentado (e. g., o Juízo de Direito da 2.~ Vara da Fazenda Pública do
Distrito Federal, a 26 de março de 1956, D. da J., de 4 de abril de 1956) que não se precisa dar qualquer prova
dos “requisitos” legais; para a manutenção e a reintegração, sim. Toda prova seria após, se o réu não comparecer
ou não contestar o pedido. Sem razão .
O deferimento do pedido de preceito supõe non plena cognitio, para que, não comparecendo o réu, ou não
contestando, se dê quanto à parte declaratória da ação e, pois,. da sentença a coisa julgada, porque, se não há
essa eficácia de coisa julgada, não se pode pensar em aplicação da pena. Sn~vEs~E GOMES DE MORAIS
(Tractatus de E.xecutionibus, 1, 108) entrou em indagações que o levaram a distinguir o mandado quando houve
a plena cognitio, o mandado em matéria sobre a qual não possa haver dúvida (in qua multa potest esse
dísceptatio) e o mandado em que o juiz, etiam inmta parte, podia decretar o preceito. Há preceito com cláusula,
portanto, de non plena cognitio, para que se possa dar sentença sem rito ordinário; portanto, é preciso que o’ juiz
diga, ainda que implicitamente, estarem juntos os pressupostos fáctícos: posse, ameaça, justo receio. Para
indeferir, basta que um deles falte; para deferir, é preciso que concorram - A cognição não é plena porque se
permitem a contestação e a prova contrária à inicial afirmação dos três requisitos. A respeito deles, há três
enunciados de fato por parte do juiz, que preceita o réu.
Se o despacho, intempestivo, é de indeferimento da petição inicial por não haver posse ou outro requisito, entrou
no mérito, e o recurso é o de apelação (2.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, 30 de maio de 1951,
1?. dos T., da Bahia, 44, 37).
Se foi cominada a pena, ~,no ventre dos autos da própria ação possessória processa-se a ação de atentado? Parece
que assim julgou a 3•~ Câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 17 de novembro de 1947 (1?. F., 125,
203); mas tal solução feriria o art. 880, verbis “autuada em separado”.

8) INFRAÇÃO 1O PRECEITO. Se, no curso da ação, se efetivar o esbulho, ou a turbação, qualquer que tenha
sido a ofensa temida pelo autor, portanto tendo ocorrido mais ou menos do que esperava, as consequências são a
da infração. do preceito, sem distinção. Infringe o preceito o que, proibido de perturbar a posse, esbulhou, ou
que, proibido de esbulhar, perturbou. O mesmo princípio vige quanto à extração do mandado contra turbação
esbulho iminente.

9)MANDADO DE MANUTENÇÃO, EVENTUAL. Se foi pedida a proibição de esbulho e o réu perturbou a


posse, além. de se lhe aplicar a pena cominada, expede-se contra ele o~ mandado de manutenção. Se foi pedida a
proibição de turbação e o réu esbulhou, além de se lhe aplicar a pena co-minada, por infração do preceito,
expede-se contra ele o mandado de reintegração, liquidando-se na execução as perdas e danos em que for então
condenado, ainda que acima da pena cominada, mas independente dela. Aliás, o mesmo ocorre no. caso de
atentado sem esbulho.
O Conselho de Justiça do Distrito Federal, a 26 de dezembro de 1950 (D. da .1. de 14 de setembro de 195.1),
falou de deferimento liminar de medida protetiva, em se tratando de~ interdito proibitório; mas é lamentável e
grave a confusão. com a manutenção liminar ou a reintegração liminar nas~ ações de manutenção ou de
reintegração. No interdito proibitório, liminar é o preceito, sempre: não há qualquer alternativa em se deferir
medida liminar, ou não.
A 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 1.0 de fevereiro de 1951 (D. da J. de 18 de
março de 1952), referiu-se à regra jurídica sobre esbulho ou turbação no recurso do processo, como se o esbulho
ou a turbação ~fosse, aí, atentado. O que, rigorosamente, há é a infração do preceito. Por isso mesmo, o juiz,
tomando conhecimento do esbulho, violador do preceito, ou da turbaç ão, violadora do preceito, ordenará que se
expeça mandado de reintegração ou •de manutenção (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de
fevereiro de 1950, R. dos T., 185, 301; 2Y- Tur-. rua do Supremo Tribunal Federal, 12 de setembro de 1950,
R. F., 133, 424; ~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de ‘São Paulo, 30 de março de 1950, R. dos T., 186, 807;
1.a Câmara Civil, 30 de janeiro de 1951, 191, 679). (A palavra “atentado” tinha, e tem, na linguagem técnica,
sentido largo: mas, tendo-se cogitado de tal instituto com especialidade, é de toda a conveniência que só se
empregue a palavra no sentido técnico e preciso.)
A pena que se comina nada tem com a indenização em ação intentada no tocante a manutenção ou reintegração.
Nem nas ações possessórias de manutenção ou de esbulho há preceitação (cf. 1.a Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 29 de agosto de 1950, R. dos T., 189, 186, e 6 de fevereiro de 1952, 199, 516). A prática de
ato que infrinja o mandado de manutenção é prática de ato contra mandado judicial, e não contra o preceito. Não
se disse: “Não faça ou sofra”; disse-se: “Não faça”. O demandado que desobedece ofende a Justiça que protegera
a posse. Aí, atenta-se contra o status litis, ou contra a sentença.

Art. 933. Aplica-se ao interdito proibitório 1) o disposto na secção anterior2) 3)•

1)DIREITO AO INTERDITO PROIBITÓRIO E EXERCÍCIO DA AÇAO.


Urna vez que o possuidor, seja imediata ou mediata a posse, tem justo receio de ser molestado nela, pede ao juiz
o mandado proibitório, com a cominação da pena pecuniária, caso não atenda ao preceito. Tem o autor de provar
a sua posse,
o justo receio de ser ofendida a sua posse. Devidamente instruida a petição inicial, pode o juiz, sem ouvir o réu,
deferir a expedição do mandado, liminarmente. Se não se convence da necessidade de tal medida imediata,
determina que o autor justifique o que alegou, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada.
Julgada procedente a justificação, o juiz faz expedir-se, desde logo, o mandado proibitório.
Tendo ocorrido, ou não, a expedição do mandado liminar, tem o autor de, nos cinco dias subseqüentes ,
promover a citação do réu para contestar a ação. Se houve justificação prévia, o prazo para a contestação conta-se
da intimação do despacho que deferiu ou não a medida liminar. Após, o procedimento é o ordinário.

2)PEssoAs JURIDICAS DE DIREITO PUBLICO. O art. 933 estabelece que se aplica ao interdito proibitório o
que se estatui na Seção anterior, que é dos arts. 926-93 1. Apenas surge a questão de se saber se o art. 928,
parágrafo único, em que se cogita das medidas contra as pessoas jurídicas de direito público tanto concerne à
manutenção e à reintegração da posse quanto ao interdito proibitório. Não há razão para as dúvidas, porque o art.
933 foi claro: ao interdito proibitório aplica-se tudo que constar da seção anterior.

3)REDUÇÃO DA COMINAÇÃO. No Código de 1939, o art. 380, que o Código de 1973 eliminou, dizia: Se o
réu não comparecer, ou não contestar o preceito, o juiz julgará por sentença a pena cominada, podendo reduzi-
la”. Hoje, como antes de incidir o Código de 1973, tem o juiz de julgar a ação,porque o art. 931 (que incide por
força do art. 933) não distingue se houve ou se não houve contestação para que seja ordinário o procedimento. O
juiz já cominara a pena pecuniaria e, ex hypothesi, ocorreu a transgressão do preceito. O que pode acontecer, e.
g., é que o juiz invoque os arts. 319 e 320, ou o art. 324, ou o art. 387. Aliás, pode o juiz, a despeito da revelia do
réu, proceder a inspeção judicial (arts. 440-443). Demais, o juiz, ao julgar, tem por si o art. 459, e o art. 460, 2.a
parte. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influi no j
ulgamento da lide, pode o juiz, de ofício, levá-lo em consideração (art. 462), no momento de proferir a sentença.
Era o que sempre sustentáramos e está hoje no Código de 1973.

CAPÍTULO VI

DA AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA 1)2)3)

1) “OPERIs NovI NUNTIATIO”. A fonte psicológica da nunciação de obra nova está no desforçamento na
defesa contra o ato de outrem. Nesse ponto, é um dos mais velhos institutos do homem o de jogar pedras à obra
que prejudica. A fonte material está no protesto contra a atividade inovante (operis novi nuntiatio). Não
importava (nem importa hoje) que o trabalho consista em edificar, ou em demolir. Dirigia-se à pessoa presente,
mesmo o proprietário do prédio, se partia do enfiteuta, do superficiário, do usufrutuário (H. BUECKIIA.RD, fie
operis novi nuntiatio, 86), ou do credor pignoraticio (não, diz-se entre co-proprietários). A pretensão, a que
correspondia, era a do uso exclusivo da propriedade, ou a da servidão negativa (servitus non altius aedzficandi.
servztus ne luminibus, ne prospectui officiatur, servitus oneris fere ndi; porém não servitutes viae). O símbolo do
iactum lapilli, o lançar das pedrinhas. Discute-se ainda a realidade a que correspondeu se o jogar a pedra (a) em
protesto, se tirar as pedras do edifício e lançar fora (b), ou ambos (e). A primeira explicação tem por si a opinião
de J. CujÁcIo; a segunda está em CHARLES MAINZ (Cours de Droit romain, II, 527, nota 31); a terceira é a
que nos parece a mais razoável, porque o conteúdo material do protesto, psicologicamente indiferente, jogar a
pedra ou destroçar as pedras, importava menos que o conteúdo psíquico. A prova disso, que sustentamos contra
(a) e contra (b), está em que as fontes se prestam a dois conteúdos materiais: dilapidar e dispersar as pedras. Per
manum, dizia a L. 5, § 10, D., de operis novi nuntiatione, 39, 1; isto é, acrescentava, lapilli lactum.
A defesa própria veio até os nossos tempos, conservando-se a nunciação per iactum lapilhi, como desforçamento
extrajudicial até o § 4 das Ordenações Filipinas, Livro III, Título 78 (verbis “denunciar ao edificante lançando
certas pedras na obra, segundo direito e uso da terra”), ato repentino (Livro IV, Titulo 58, § 2). À nunciação sem
ser com pedras, ou verbal, atribuiam os juristas portugueses demissão da posse do nunciado, em vez do ato
conservativo da nunciação com pedras. Porém seria inútil tal distinção, quanto àposse, entre a nunciação per
manum seu lapilhi iactum e a nunciação sohis verbis. Seja como for, a prática tinha a nunciação de obra nova por
jato de pedras como subsidiária, isto é, quando o magistrado não pudesse atuar a tempo, e isso mesmo nas
aldeias. Em geral, essa antiqualha processual já está a desaparecer dos códigos civis.

Quanto ao sócio e ao comuneiro, diz-se que o direito romano excluia a ação de nunciação de obra nova entre
eles; e isso foi repetido através dos séculos. Parece que se deve a ANTÔNIO DO AMARAL ter sido o primeiro,
em Portugal, a advertir em que a regra jurídica tinha de ser repensada. No caso de construção (ou demolição) que
exceda o uso conforme o destino do bem e compat!vel com a indivisão, sc é o caso, não temos dúvida em aceitá-
la, proposta, pelo sócio ou pelo comuneiro, se a destinação do prédio é para vivcnda ou partes de indústria. Aqui
vai conselho, ainda útil, de MANUEL DE ALMEIDA E SousA (Tratado dos Interditos, 95): “Quanto a mim, a
melhor precaução de que deve usar aquele que pretende fazer uma nova obra, e teme que lha
embarguem, é fazer duas uniformes plantas da obra futura; requerer com elas ao juiz, que se citem os que teme se
lhe oponham (a que se comunica uma das plantas, ficando 0w-tra na mão do escrivão), para que declarem em tal
termo, que lhe fique assinado, as objeções que têm, ou em que parte, a que se execute a obra na forma da planta:
com a cominação de que, nada objetando, serem lançados, e se lhe pôr perpétuo silêncio, e não poderem mais
embargar a obra”. O caminho, que hoje se tem, é o da ação com preceito cominatório, pois aí é que se há de
basear a provocatio.

2)CUMULAÇÃO OBJETIVA. Na ação de nunciacão de obra nova há cumulação objetiva: a ação de embargo
da obra, que é mandamental; a de demolicão à custa do nunciado, que é executiva-condenatória; a de cominação
da pena para o caso de infração do preceito, que é condenatória eventual; a de indenização, que é condenatória,
ou, de regra, executiva.

3) “Opus”. Obra nova não é só a construção, mas todo facere (Ciu~. A. HESSE, Die Rechtsverhaltnisse
zwischen. Grundstiicksnachbarn, 49; AE:BLI, Cautio damni infecti, 11). A L. 15, D., ad exhibendum, 10, 4, fala
de busca de tesouro; a L. 17, § 2, D., si servitus vinchicetur vel ad ahium pertinere negetur, 8, 5, de vicinidade; a
L. 18, de condução de água. O dano pode ser causado por ato no espaço que corresponde à propriedade alheia, ou
por ato em outro espaço. O que é preciso, para se caracterizar a imissão contrária a direito, éque se exceda, no
exercício de direito, ou não, o que se poderia fazer em terreno próprio: invade-se com o ato mesmo, ou com os
efeitos do ato; há, numa e noutra espécie, ultrapassar de senhoria (CHi~. A. HESSE, Die Rechtsverhaltnisse
zwischen Grundstucksnachbarn, 2.~ ed. 264; JOSEPII WERR, Das Recht des Eigentiimers zur Vertiefung seines
Grundstucks, 12).

Art. 934. Compete1) esta ação2):


1 ao proprietário ou possuidor, a fim de impedir que a edificação de obra nova3) em imóvel vizinho4) lhe
prejudique o prédio, suas servidões ou fins a que é destinado5);
11 ao condómino, para impedir que o
co-proprietário execute alguma obra com prejuízo ou alteração da coisa comum 6);
111 ao Município, a fim de impedir que o particular construa em contravenção da lei, do regulamento ou de
postura 7)~

1) PRETENSÃO DE NUNCIAR. A ação de nunciação de obra nova é uma das ações de que pode usar o que
tem pretensão a que se lhe respeite a situação jurídica, ou mesmo possessória, quando se quer construir ou
demolir. A ação supõe a pretensão de nunciar, de protestar, que é espécie daquela. Espécie primária, porque vem
do iactum lapifli, das pedrinhas que se lançavam, ou se atiravam, sendo de crer que o diminutivo pertence à fase
em que já era simbólico o jato. Essa pretensão de protestar, nunciando, desaparece com a terminação da obra.
Não se diga que renasce ao serem feitos consertos, ou retoques, ou acréscimos, ou remendos. Nasce outra. É
porque a pretensão se apaga que a ação não pode existir. Surgindo de novo pretensão de nunciar, a ação ressurge.
São pressupostos da ação de nunciação de obra nova ter-se iniciado obra e não estar terminada.
Assim como o titular do domínio e o de direito de enfiteuse, usufruto, uso, habitação e anticrese, como o
possuidor, próprio ou impróprio, podem nunciar a obra o comuneiro e o sócio. A Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Ceará, a 15 de maio de 1952 (J. e D., VI, 76), negou ao condômino a ação de nunciação de obra nova.
Absurdo! O próprio sócio pode nunciar a obra que o outro sócio intenta na coisa comum (J. H. CORREIA
TELES, Doutrina das Ações, § 208, nota 1) que corrigiu a MANUEL GONçALVE5 DA SILVA, Commen tarja,
III, 158, e FELICIANO DA FRANÇA, Additiones aureae que lílustrationes, II, 320). Na L. 28, D., de communi
dividundo, 10, 3, foi claro: “Disse Sabino que nenhum dos donos pode fazer de direito, o que seja, contra a
vontade do outro. Donde ser evidente que há direito de proibir: porque se sabe que, em igualdade de
circunstâncias, melhor causa é a do que proibe. Mas, ainda em coisa comum, pode proibir um sócio ao outro
sócio que algo faça, posto que não possa obrigar a que destrua a obra feita se, quando a podia proibir, deixou de
fazê-lo: e por isso poderá ressarcir-se do dano pela ação de divisão de coisa comum. Mas, se consentiu em que
fizesse, não tem, sequer, a ação pelo dano. Todavia, se, ausente o sócio, fez (obra) em prejuízo dele, então
também é obrigado a demoli-la”. In re communi neminem domino-rum iure facere quicquam invito altero posse.
Certo, JOHANN VOET (Commentarius ad Pandectas, II, 546: “... cum utique socius in re communi quid
faciens, etiam in alieno facere dicendus sit, dum res communis pro parte aliena est, et id, quod re communi fit,
non alia ratione illicite fieri videatur, quam quia et quatenus res communis non ad facientem opus novum, sed ad
alterum socium pertinet”).
Interesse na nunciação tem quem quer que possa ser prejudicado pela obra.

2)EM QUE SE BASEIA A PRETENSAO DE NUNCIAR. A pretensão de nunciar não se baseia na posse, posto
que também a tenha possuidor. O Código, seguindo o exemplo de alguns Códigos estaduais (Distrito Federal, art.
549; São Paulo, art. 630; Pernambuco, art. 576; Paraná, art. 373; Rio de Janeiro, art. 1.370; Sergipe, art. 312),
excluiu a ação do rol das ações possessórias (ahiter, Minas Gerais, art. 696; Rio Grande do Sul, art. 538; Bahia,
art. 419). Não se trata de ação possessória: considerar possessória a tal ação seria confundir a causa de pedir com
a legitimação ativa ocasional:
algumas vezes dela usa o possuidor. O relator do Recurso extraordinário n. 8.696, Ministro NONATO, em 19 de
maio de 1950 (D. da J., 20 de março de 1952), em voto unanimemente adotado, disse: “Quanto ao art. 573 do
Có-’digo Civil, ... Trouxe à balha o M . M. Juiz, para argumentar que de sua exegese conjugada com o art. 384
do Código de Processo Civil se dessume caber a nunciação também ao possuidor. De mim tenho, forte em
PONTES DE MIXANDA, que a pretensão de nunciar não se funda na posse, posto que também a tenha o
possuidor. Considerar possessória a ação, ensina ainda PONTES DE MIRANDA, é confundir a causa de pedir
com a legitimação ativa ocasional: algumas vezes autor dela será o possuidor”. O art. 384 do Código de 1939 é,
hoje, o art. 934 do Código de 1973.
Pertence a ação a quem “pretenda impedir” que o prÉdio de sua propriedade ou posse seja “prejudicado” pela
obra nova. Portanto, supõe ainda não ultimada a obra. Porque não se impede o concluído. Tal sempre fora a
linha histórica do instituto. A obra, desde que se estão a preparar os materiais, pode ser embargada, como frisava
ANTÔNIO MENDES AROUCA, Adnotationes Practicae, à L. 2, § 1, D., 1, 8, n. 21); não, porém se já ultimada,
conforme a lição romana, mas ANTÔNIO MENDES AROUCA explicava noutro livro (Alie gationes Iurzs, 24)
que os acréscimos e retoques faziam nova a obra (“quia qualitas de novo adveniens novam facit
aedificationem”), explicação que ANTÔNIO MENDES AROUCA tirou de MIGUEL DE REINOSO
(Observationes Practicae, 341), sem pedinência: não se trata de mudança da coisa, mas de novo por si. Se há
acréscimo, ou retoque, é o acréscimo ou retoque que se há de impedir. Fora daí, a afirmação de AN¶róNIo
MENDES AROUCA fora e é falsa.
Na jurisprudência há julgados que concluíram pela improcedência da ação se a invasão do terreno foi mínima
(e.g., 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal,25 de julho de 1950), o que dá a indenização.
Mas a solução é julgar-se procedente a ação e, reputando-se mínimo o prejuízo, indenizar-se (ainda que se não
haja, aí, pedido indenização).
3) OBRA NOVA. Por obra nova havemos de entender, como o próprio direito romano, a edificação (no sentido
lato) e a demolição: “aut aedificando aut detrahendo”. O que importa é que se mude o status quo. Não o status
quo possessório, a despeito das parecenças. Reparação é “obra nova~’, desde que o prejuízo resulte dela.

4)RELAÇÃO DE VIZINHANÇA. A referência a prédio vizinho bem mostra que a pretensão a nunciar se liga à
relação de vizinhança. Está por trás direito de vizinho. Aliás, a L. 8, D., de operis novi nuntiatione, 39, 1, punha-
o em relevo. Qualquer vizinho, do lado, da frente, do fundo, de cima, de baixo; ainda o do prédio de longe, sobre
que se haja servidão. Pode dar-se que o prejuízo seja a prédio distante: não se pode preexcluir a tutela jurídica à
pretensão nunciativa. Onde quer que se possa ter, concluída a obra, ação de indenização ou de restituição ao
estado anterior, há a ação de nunciacão de obra nova, se ainda não se concluiu.

5)SERVIDÃO E OBRA NOVA. Alguns comentadores criticaram o Código Civil brasileiro de 1916 por haver
omitido (!) a alusão à obra nova que tende a constituir servidão. Sem razão, porque isso se inclui no conceito de
“prejuízo”. A ação negatória de servidão é outra ação que a de nunciação de obra nova.
O titular de servidão tem a ação de nunciação de obra nova (6.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, 1.0 de novembro de 1949, D. da J. de 18 de setembro de 1952), inclusive em se tratando de servidão
tigni immittendi (3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 31 de agosto de 1950, R. dos T., 189,
299).
As escavações, extrações de minerais e as sondagens podem ser nunciadas (cf. Câmara Cível do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, 16 de abril de 1951, J. de 1951, 230).

6)CoNDoMimo E OBRA NOVA. No art. 934, II, atende-se a que um condômino tenha interesse em impedir
que outro condômino ou outros condôminos executem alguma obra. Primeiro, havemos de frisar que a
legitimação ativa não é só de condôminos; pode tratar-se de outra espécie de comunhão. Todos são legitimados
ativos desde que haja prejuízo com a alteração da coisa comum. Qualquer deles ou alguns deles ou todos podem
propor a ação de nunciação de obra nova. Se se chega à indenização, o quanto é relativo a quem propôs, se o
prejuízo é só a ele; ou relativo aos que foram lesados, mesmo que um só haja proposto a ação; ou a todos se a
ofensa a todos atingiu, mesmo se só um ou alguns foram autores. Há o princípio da solidariedade. Mas, se houve
a prestação pelo réu, ou pelos réus, o levantamento somente há de ser conforme o que a cada um deles couber, e
pode acontecer que o dano seja igual ou diferente, razão por que, no direito anterior, havia a regra jurídica
explícita segundo a qual se havia de fazer o levantamento da importância que ao autor ou aos autores e demais
interessados coubesse.

7)MUNICÍPIO E OUTRA ENTIDADE ESTATAL. A lei processual somente se referiu ao Município. Mas pode
dar-se que haja interesse federal no planejamento e promoção da segurança nacional (Constituição de 1967, com
a Emenda n. 1, art. 8.0, 1, V), no tocante a edifício ou edifícios ou região; ou no que se refere à aviação (plano
nacional, art. 8.0, XI), ou à defesa permanente contra calamidades públicas, como seca e inundação (art. 8.0,
XIII), ou outros serviços (artigo 3~o, XIV e XV); ou à atividade legislativa (art. 8.0, V1I, especialmente c), in
fine, h), i), m), e n). Pense-se também em que à União cabe legislar quanto ao Distrito Federal e a Territórios
(arts. 8.0, XVII, t), e 17 e § 1.0). Quanto aos Estados-membros, art. 13, §§ 2.0 e 3•O~ O que importa é verificar-
-se, in casu, se há o interesse da entidade estatal, que pode não ser o Município.
O Código de 1973 não inclui no seu texto o art. 392 e parágrafo único do Código de 1939, que se referiam,
respectivamente, ao condômino e ao co-possuidor (“condomínio ou composse do prédio prejudicado”), e ao
levantamento da importância da indenização. Havemos de entender que o co-possuidor pode ser legitimado à
nunciação de obra nova, quer quanto a vizinho, proprietário ou possuidor, quer quanto a outro ou outros co-
possuidores do mesmo imóvel. No tocante ~o levantamento, quem foi legitimado a ter a indenização éque pode
levantar a importância. Se são dois ou mais legitimados ao todo, tem-se de atender à distribuição.

Art. 935. Ao prejudicado também é lícito, se o caso for urgente 1), fazer o embargo extra judicial, notificando
verbalmente, perante duas (2) testemunhas, o proprietário 2) ou, em sua falta, o construtor, para não continuar
a obra.
Parágrafo único. Dentro de três (3)dias requererá o nunciante a ratificação3) em juízo, sob pena de cessar o
efeito do embargo

1) EMBARGO EXTRAJUDICIAL. Trata-se de justiça de mão própria que lembra o iactum lapilli. Em vez das
pedrinhas, há o iactum de palavras: o prejudicado entenda-se a pessoa já prejudicada, ou que vai ser prejudicada,
uma vez que a obra já se iniciou, ou vai se iniciar notifica verbalmente o prejudicante, seja o dono da obra, ou
seja o construtor, que ai o representa, para que não continue na iniciativa ou na obra. Quatro são os pressupostos:
a) o que já se iniciou ou o que vai se iniciar já começou a causar danos ou pode causar danos ao município; b) é
urgente tal medida; e) a notificação é verbal, escrita ou não-escrita, perante duas testemunhas; d) notificado é o
responsável pela obra (proprietário, usufrutuário, usuário, o titular de direito de enfiteuse, habitação ou de
anticrese, o locatário), ou em caso de construções, responsável pela obra ou simples encarregado presente.
Temos de atender a que apenas se antecipa, extrajudicialmente, o embargo para cuja existência é indispensável a
notificação do proprietário (ou outro legitimado passivo, conforme antes expusemos), ou, se não está presente,
ou, se procurá-lo seria nocivo à urgência, ou mesmo seria inadequado à notificação oral, a do construtor. Tem de
haver a ratificação, que é a judicialização do embargo, que passa a submeter-se às exigências dos arts. 936
(inclusive, conforme sob o art. 936 dizemos, a da citação), 938, no concernente à lavratura do auto de embargo,
descrevendo-se o estado em que se encontra a obra, e à intimação do construtor e dos operários a que não
continuem a obra sob pena de desobediência. Após é que se cita o legitimado passivo, que então tem o prazo de
cinco dias para contestar.

2)PLURALIDADE DE NUNCIADOS. Se duas ou mais são as pessoas que estão prejudicando ou vão
prejudicar, tem-se de verificar se a obra é uma só, caso em que basta o embargo extrajudicial a qualquer delas, ou
se as obras são separadas, e então a notificação verbal tem de ser a todas, para que, com a ciência do ato, se
abstenham dos atos embargados.

3)RATIFICAÇÃO. Notificação houve, extrajudicial, com os pressupostos legais. Tem o nunciante extrajudicial
de, dentro de três dias, requerer a ratificação em juízo, sob pena de cessar o efeito do embargo extrajudicial.
Basta a entrada em juizo, dentro do prazo, para que tenha o notificado, ou tenham os notificados, de atender ao
embargo. Se o juiz demorou o despacho, e não houve culpa do requeiente, a eficácia continua.

4)LEGITIMAÇÃO ATIVA PELO DIREITO REAL OU A POSSE. Se o direito real, o domínio ou o direito real
limitado ou a posse, é atingido pela edificação, por outrem, em imóvel vizinho, existe, o titular é legitimado
ativo. Idem, quem não é dono do imóvel, nem tem direito real com posse, mas tem posse. O prejuízo pode ser às
terras, às construções, a represas, a cercas ou muros, a instalações elétricas ou telefônicas e a servidões, ou
mesmo a algum fim a que o imóvel é destinado.
Pergunta-se: ~.é legitimado ativo quem tem posse medieta, mesmo se não é posse própria? A resposta há de ser
afirmativa, porque o seu interesse é de quem possui e semefiante ao de quem é dono e não tem posse imediata.
Outra pergunta: ~,o pré-contraente comprador, que registrou o negócio jurídico, é legitimado ativo? Uma vez que
a eficácia é erga omnes, não se lhe pode negar a legitimação ativa. Dá-se o mesmo se o pré-contrato é de locação
e já foi registrado. Há promessa de posse com eficácia quanto a todos e, pois, quanto a vizinhos.

5)CONDOMÍNIO OU OUTRA CO-PROPRIEDADE. Em caso de condominio, ou de co-uso, ou de co-usufruto,


ou de co-enfiteuse, ou outra comunhão de direito real, o comunheiro pode ir à nunciação de obra nova para
impedir que outro, ou outros, ou os outros prejudiquem o que é comum a todos ou à parte divisa, O prejuízo pode
ser às partes indivisas ou a parte divisa ou partes divisas.

6)MURICÍPIO OU OUTRA ENTIDADE ESTATAL. Se algum particular, pessoa física ou jurídica, vai
construir ou destruir, com contravenção da lei, ou de regulamento, ou de postura, cabe a ação de nunciação de
obra nova exercível pelo Município, mesmo se a nunciada é a União, Estado-membro, o Distrito Federal,
Território ou outro Município. Já falamos do interesse de outras entidades estatais.

Art. 936. Na petição inicial, elaborada com observância dos requisitos do art. 282, requererá o nunciante:
1 o embargo para que fique suspensa a obra e se mande afinal reconstituir, modificar ou demolir o que estiver
feito em seu detrimento ~) 2);
Ii a cominação de pena para o caso de inobservância do preceito3);
Iii a condenação em perdas e danos. Parágrafo unico. Tratando-se de demolição, colheita, corte de madeiras,
extração de minérios e obras semelhantes, pode incluir-se o pedido de apreensão e depósito dos materiais e
produtos já retirados4).

Art. 937. É lícito ao juiz conceder o embargo liminarmente ou após justificação prévia5).

1)EMBARGO DA OBRA. O embargo é para se não continuar na construção, ou na demolição, porque o


edictum nuntiationis novi operis est prohibitio, ne quid in futurum in re praesenti fiat, como se veio sempre a
repetir, desde os mais velhos juristas, através de ANTÔNIO CARDoSo DO AMARAL (Suníma seu Pra.xis
ludicum, verbo “Nunciatio”, n. 1) e MANUEL ALVARES FERREIRA (De Novorum Operarum
Aedilicationibus Nuntiationibus, II, L. 4, d. 1, n. 4). Não importa que o autor não tenha razão: ao nunciado cabe
atender ao mandado do juiz. Não se precisa recorrer a argumentos para fundamentar esse dever, não estando
completa a cognição do juiz; supérfluo, pois, estar-se a dizer, com os velhos juristas, que “In dubio praesumitur
nuntiatio juste, riteque facta”, e falso, porque, se a presunção fosse a base, se cairia na afirmação de se poder
prosseguir, sabendo-se ser injusta: se se prossegue, obra-se a risco próprio. E assim é que se hão de entender as
frases de AoosTnu~o BARBOSA e do padre BATISTA FRAGOSO, no século XVII (Regiminis Reip~ublicae, 1.
L. 7, d. 21, n. 18).
Embargada a obra, só mandado judicial do mesmo juiz ou da instância ad quem pode levantar o embargo. A
evidência da sem-razão somente pode ser apreciada a final. A caução não é suspensão do embargo; é substituto
do seu efeito.
Temos de entrar em exame minucioso do art. 936, que faz remissão ao art. 282. No art. 282, VII, fala-se, como
um dos pressupostos necessários da petição inicial, do “requerimento para a citação do réu”. Se o embargo é
extrajudicial (art. 935), há a notificação, a que se segue a ratificação em juízo , sob pena de cessar o efeito do
embargo (art. 935, parágrafo único). Nessa ratificação de certo modo se insere a citação, mas havemos de
entender que, se ele não se satisfez com o embargo, tem de acrescentar o que deseja a cominação de pena para o
caso de inobservância do preceito, e a condenação em perdas e danos. É possível que, na notificação verbal, haja
posto esses elementos, mas, então, há de ser conteúdo da ratificação. Assim, a citação, na espécie do art. 935,
parágrafo único, é indispensável, como o é se não houve embargo extrajudicial.
Advirta-se que pode o prejuízo ser apenas por fato futuro, que se teme (e. g., sabe-se que o vizinho já contratou
alguém para o projeto de obras, ou já está pronto o projeto), então a ação tem de ser cautelar e não a ação de
nunciação de obra nova. É caso para protesto, interpelação ou notificação (Código de Processo Civil de 1973,
arts. 867-875).
O protesto comunica a vontade de alguém ir exercer a ação de nunciação de obra nova. A notificação comunica
conhecimento do que se está a passar, e o notificado pode defender-se, ao contrário da pessoa a quem se dirigiu o
protesto ou a interpelação (Código de Processo Civil, art. 871).

2)AUTO DE EMBARGO. No auto de embargo tem-se de pedir que seja demolido o que se nuncia, ou
reconstruido. A obra nova compreende a edificação e a demolição, toda mudança de status quo.

3)PEDIDOS DO NUNCIANTE. Os pedidos podem ser quatro: (a) o específico da ação de nunciação de obra
nova, que é o embargo da obra (ação de mandamento); (b) o de demolição, ou reconstrução, que faz parte da
ação de nunciação de obra nova, como ação executiva sem adiantamento da prestação jurisdicional; (c) o de
cominação de pena, no caso de transgressão do preceito; (d) o de indenização das perdas e danos que a obra
embargada causara. O pedido (c) é sanção normal do pedido (a). Os pedidos (c) e (d) podem ser cumulados. O
art. 936, 1, misturou o embargo, que antes pusemos na letra (a), por sua especificidade, e a decisão final quanto à
reconstrução, a modificação, ou a demolição, assunto da letra (b). Depois frisou os dois outros pedidos, que são
(e) e (d).
O pedido de indenização é cumulado. Não se entende implícito no pedido de cominação de pena. A ação de
nunciação de obra pode ser julgada improcedente, sem que o seja a de indenização (Câmara Cível do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, 16 de abril de 1951, J. de 1951, 230), e vice-versa.
Se a obra foi contratada por administração, a responsabilidade do dono da obra é solidária com a do construtor
(Supremo Tribunal Federal, 25 de janeiro de 1951, R . 146, 126).

4)APREENSÃO E DEPOSITO DE MATERIAIS E PRODUTOS RETIRADOS. Se vai haver demolição, ou


corte de madeiras, ou extração de minérios, ou algo semelhante, pode o autor incluir no pedido a apreensão e
depósito dos materiais e produtos retirados. Não importa a quem pertencem esses materiais ou produtos, porque
se incluem na avaliação das indenizações, quer para se saber qual o prejuízo que ao nunciante adviera, ou adveio,
ou qual o quanto que se há de abater ao que o nunciado há de prestar como indenização.
5)EMBARGO LIMINAR, OU APÓS JUSTIFICAÇÃO PREVIA, EM AÇAO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA
NOVA. Em vez de se começar com o embargo extrajudicial, a que se segue a ratificação(art. 935 e parágrafo
único), ou de aguardar o julgamento da ação de nunciação de obra nova, para que se proceda ao embargo judicial
(arts. 934, 936-939) pode-se, na petição inicial da ação de nunciação de obra nova, pedir que o juiz conceda
liminarmente, ou após justificação prévia, o embargo. O art. 937 não diz como se há de proceder à justificação
prévia. Perguntar-se-á se a) há de ser conforme se estabelece para a justificação cautelar (arts. 861-866), ou b) à
semelhança do que ocorre com a ação de manutenção e de reintegração da posse (arts. 928-930) e com o interdito
proibitório (art. 933). A solução b) é que é acertada. Se a petição inicial está devidamente instruída, pode o juiz,
sem ouvir o réu, deferir o embargo liminar, ou, em vez disso, determinar que o autor, previamente, justifique o
alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. Deferido o embargo, observa-se o art.
933.
Art. 938. Deferido o embargo 3), o oficial de justiça, encarregado de seu cumprimento, lavrará auto
circunstanciado4), descrevendo o estado 5) em que se encontra a obra2); e, ato contínuo, intimará 1) o
construtor e os operários a que não continuem a obra sob pena
de desobediência e citará o proprietário a contestar em cinco (5) dias a ação 6) 7) 8) 9) 10).

1)NOTIFICAÇõES E INTIMAÇÕES. O construtor que foi notificado (art. 935) tem de ser intimado pelo oficial
de justiça, porque assim se vai à ratificação da notificação. Os operários também intimados (cf. L. 1, § 5, D., de
operis novi nuntiatiane, 39, 1; outrossim, L. 5, L. 10 e L. 11). No Código de 1939, falava-se de notificação ao
dono da obra e construtor, se presentes, e de “ciência aos operários encontrados”, no que o exprobrávamos.
Tinha-se de notificar ou de intimar. O Código de 1973, preferiu: intimação; porque notificação já houvera quanto
ao nunciado, ou, na sua falta, a do construtor. No estado atual, há a notificação seguida do auto do art. 938,
eventualmente a troca de fotografias, e depois a citação do dono da obra, que pode estar ou não estar presente.
Não importa: a origem do instituto só exige a nunciação, in re praesenti, na presença da coisa. A citaç~5ij
obedece aos princípios comuns.
O “proprietário”, a que se refere o art. 938, in une, équalquer legitimado passivo à nunciação. Proprietário, dono
ou titular de direito real limitado, ou possuidor, o que melhor se diz no art. 934. Tem de ser citado para contestar,
mesmo se foi notificado.

2)ESTADO DA OBRA EMBARGADA. O estado da obra embargada tem importância: a) porque é preciso
haver começado e não estar terminada; b) porque por seu estado é que se sabe se houve ou se pode haver prejuízo
ao autor; c) porque, se é reedificação de obra antiga sem lhe mudar a forma (secundum pristinum statum), não
cabe a nunciação de obra nova (ANTÔNIO CAIuoso no AMARAL, Summa seu Pra-xis ludicum, verbo,
“Nunciatio”, n. 3; MANUEL GONÇALVES DA SILVA, Commentaria, III, 159; Repertório das Ordena ções
verbis “Obra nova”, III, 392); d) porque o réu mesmo pode precisar de alegar o estado em que se achava a obra
quando foi embargada. Exemplo do caso c) está nas reconstruções de cercas divisórias (3.a Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 12 de junho de 1941, O D., 10, 423).

3)JUSTIÇA OU INJUSTIÇA DA NUNCIAçÃo. O primeiro momento em que o juiz tem de verificar a justiça
ou injustiça da nunciação é o momento da diligência, a que o juiz pode estar presente (é, historicamente, o
substituto da parte). Quando se lê em MANUEL ALVARES FERREIRA (L. V, d. 2, n. 44; VI, d. 5, n. 14) e no
próprio MANUEL GoNÇALXTES DA SILVA (Connnentarza, III, 163) que a contestação cria situacão nova,
isso resulta de não ter sido pedida, antes, a demolição; e persiste na mente dos dois juristas a época em que o
nunciado, recebendo a pedra, podia atentar, se imediatamente (reminiscência das duas defesas próprias) Assini_
até o momento de se assinar o auto, podem os notificados expor o seu direito, inclusive oferecendo documentos,
que devem constar, em menção, do auto; e intervir para que dele também constem pormenores do estado da obra,
que lhes interessem.
As duas cognições a provisória e a completa são típicas da nunciação de obra nova. O antigo direito limitava
aquela a três meses, ligando a ela a caução de opere demoliendo, e sem razão plausível. Aliás, o Desembargo do
Paço já admitia a caução dentro dos três meses, atendendo em parte, às reclamações, pois que MANUEL
ALVARES FEBREIRA(L.V, d. 2, n. 25) já pretendia introduzi-la em muitos casos. MANUEL DE ALMEIDA E
SOUSA (Tratado dos Interditos, 95), sempre prático, advertia: “A melhor providência que podem ter os
nunciados (deixando de recorrer ao tribunal, que manda informar, ou vida a parte, e em tanto passam 05 três
meses) é deixando-se de cotas, contestar logo os artigos de nunciação e requerer que o nunciante em três meses
faça certo o seu direito, sob pena de prosseguir a obra com caução”.
4) AUTO CIRCUNSTANCIADO. A exigência desse auto circunstanciado, em que se concretizam o exame e a
medição da obra, formando-se a prova em que se baseia a primeira cognição do juiz, provém de COELHO DA
ROCHA (Instituições, II, § 606, 475).
Passada a diligência e lavrado o auto para que foram notificadas ou intimadas as pessoas, o juiz somente pode
cassar o seu mandado na sentença final, com a cognição completa contrária ao nunciante. Pode haver a caução
(art. 940).

5)ESTADO DA OBRA. Realizada a diligência, o auto prova o estado da obra. Já existe o processo, a relação
jurídica processual; não se estabeleceu, ainda, a relação jurídica processual em ângulo, se não foi o sujeito
passivo (e. g., foi o construtor, e não o dono da obra). Essa relação nasce com a citação do dono da obra. Dono
da obra não é sempre o proprietario; pode ser, e. g., o usufrutuário, o locatário. A legitimação passiva depende da
fonte das instruções para fazer a obra. Naturalmente, a regra jurídica sobre nomeação da autoria (nominatio
auctoris) é aplicável.

6)RITO PROCESSUAL DA NUNCIAÇÃO. A conseqúência dos arts. 935 ou 936, 937 e 938, in fine, é que,
feita a diligência da verificação do estado da obra e citado o réu, a relação jurídica processual em ângulo está
formada, com os efeitos que foram estudados sob os arts. 266, 219, § 1.0, e 264. É então que se produz a
litispendência. Nenhum poder, até a sentença, tem o juiz para suspender o embargo (caução é substituição do
efeito).
No direito anterior a 1939, o processo era sumário e devia terminar em três meses.
7)PRETENSÃO A AFIRMAR O CONTRARIO ser citado para contestar. Não pretensão a afirmar o contrário..
O réu tem de há, portanto, preclusão da Pode haver aplicação do artigo 453 e §§ 1.0, 2.0 e 3
8) PLURALIDADES DE LEGITIMADOS PASSIVOS. Se a obra é de duas ou mais pessoas, que são
legitimados passivos, a propositura da ação contra uma atinge as outras, posto que não se haja inserto no Código
de 1973 o que estava no artigo 391 do Código de 1939. Salvo, compreende-se, se uma das obras é separável,
porque então há, para a nunciação, pluralidade das obras, e seria necessária a relação jurídica de
responsabilidade, que, na hipótese, não existe. Se a obra é uma só, a despeito de cada um dos legitimados
passivos ter chamado a si a execução, ou ter-se encarregado dela, então a notificação ou a citação de um basta.

Feita a diligência de verificação do estado da obra, citado o demandado e findo o prazo legal, quer haja
contestação, quer não, o processo com a relação jurídica processual em ângulo, tem o rito ordinário, e nenhum
poder tem o juiz, até a sentença, para suspender o embargo (a caução, se ocorreu, substituiu o efeito).

Não nos escape que a legitimação passiva, como a ativa, pode ser de co-proprietários e de compossuidores,
ocorrendo, às vezes, que a legitimação ativa seja de proprietário ou de proprietários e a legitimação passiva seja
de possuidor ou de possuidores, ou vice-versa. O que importa é verificarem o interesse e o direito do legitimado
ativo, ou dos legitimados ativos, e o dever e obrigação do legitimado passivo ou dos legitimados passivos. Certa
vez, o locatário de um prédio, cujo proprietário e locador estava a construir no terreno próximo outro edifício,
teve de propor ação de nunciação de obra nova contra o vizinho que lhe ofendia a posse, que era o proprietário e
o locador do prédio ofendido. Tinha-
-se de levar em consideração o prazo restante da locação, inclusive para se conhecer o cômputo da indenização.

9) EFICÁCIA SENTENCIAL. A eficácia preponderante da sentença favorável na ação de nunciação de obra


nova, se só se manda que pare a obra, ou não se inicie, é mandamental; se se decreta a demolição do que se
edificou, ou a restauração do que se destruiu, a eficácia executiva é que prepondera, vindo depois a condenatória
(4) e a mandamental (3). Atenda-se a que, uma vez feita a cominação do preceito, a sentença é condenatória
eventual e, quanto à indenização, executiva-condenatória.

Há a solidariedade processual, ainda que não exista em direito material. É preciso, porém, que se trate de obra
pro indiviso conceito diferente de comunhão pro diviso do futuro prédio. Na feitura da casa de apartamentos, a
obra é comum e pro indiviso (há donos da mesma obra), posto que os donos da obra venham a ser, depois, donos
de apartamentos. Ainda depois da comunhão pro diviso dos apartamentos, há parte pro indiviso do prédio que
permite a solidariedade processual. O direito de regresso há de existir quanto ao que o réu pagou, em virtude de
condenação, de despesas e de custas. Cabe-lhe esse direito, ainda que seja vencedor, pelas despesas que sofreu.
O nunciado pode deixar de litisdenunciar, mas a omissão não lhe atinge o direito de regresso. Só esse direito
independe da litisdenunciação. Sem essa, o que deveria ser litisdenunciado e não foi, não está obrigado a admitir
como eficaz a sentença em tudo mais que se refere às suas relações com a parte. O Código de 1973 não possui as
regras jurídicas
do Código de 1939, art. 391 e parágrafo único; mas tem-se de extrair dos princípios.

10)PLURALIDADE SUBJETIVA ATIVA. A pluralidade subJetiva ativa estabelece solidariedade, atenuada


pela limitação do quanto levantável. A cumulação subjetiva (litisconsórcio ativo), aí é como em demanda
comum, devendo seguir o mesmo curso os processos incoados, o litisconsórcio é necessário, com a
representação eventual de todos (menos um) por um.

O requerimento para que se levantem as quotas é ato de comunicação de vontade de cada um, e não constitui
ação de execução de sentença, mas apenas expediente do juiz da sentença que condenou à multa ou à
indenização.
A própria sentença, na ação de perdas e danos, é de força executiva, e não só de efeito, de modo que não se
precisa de actio iudzcati.

Art. 939. Aplica-se 1) a esta ação o disposto no art. 8032).

1 SE NAO FOI CONTESTADO O PEDIDO. Na ação de nunciação de obra nova, se o demandado não contesta,
presumem-se admitidos por ele os fatos alegados pelo autor, sem ser preciso que conste do mandado essa
presunção para o caso de não advir contestação (art. 285), nem que haja revelia (art. 319). O juiz julga no prazo
de cinco dias (artigo 803).

2)RELEVÂNCIA DA REMISSAO. A remissão do art. 803 estabelece a presunção da veridicidade dos fatos
alegados pelo autor se não houve contestação. Nenhum outro pressuposto se exige. o que se teve por fato foi o
igual tratamento na ação de nunciação de obra nova e nas ações de medida cautelar.

CÓDIGO DE PRocESSO CIVIL (ARTS. 934-940)

Art. 940. O nunciado poderá, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, requerer o prosseguimento da
obra, desde que preste caução 1) 2) e demonstre prejuízo 3) resultante da suspensão dela.
§ 19 A caução será prestada no juízo de origem, embora a causa se encontre no tribunal4).
§ 29 Em nenhuma hipótese terá lugar
o prosseguimento, tratando-se de obra nova levantada contra determinação de regulamentos administrativos
5)~

1) CAUÇÃO PELO NUNCIADO. A caução não depende, hoje, de ter transcorrido determinado tempo, como
seria antes de 1939. Permite-se, a qualquer tempo, o requerimento de continuação da obra, prestada a caução.
Portanto, no momento mesmo em que se ultima o auto (não durante, nem antes). Não importa o grau de
jurisdição, ainda se já procedente recurso extraordinário. Mas, ~ a própria sentença favorável, recorrida, da ação
rescisória não lho permite, porque seria fora da causa? A resposta tem de ser a permissiva da caução, não porque
a sentença rescindida já esteja desconstituida, e sim porque a falta de completitude de cognição, nos casos de se
querer a continuação da obra e no caso da sentença rescindente ainda sujeita a recurso, se equivalem.

2) OBJETO DA CAUÇÃO. A caução é de demolir, ou de construir, devendo abranger os gastos de demolição e


de construção, os prejuízos desde a obra nova até à ultimação dos trabalhos demolitórios ou construtivos.

3)PREJUIZO CAUSADO E CAUÇÃO. Na apreciação de prejuízo, de modo nenhum se levam em conta


alegação e prova da “injustiça da nunciação”, erro em que incorreu ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Da Posse,
305, nota 27). Citou ele o Alvará de 24 de julho de 1713, que não diz isso (10: “Licença para se continuarem
algumas obras, que fossem embargadas, com a caução de opere demoliendo”). Nem o Repertório das Ordena
ções (1, 80) o poderia ajudar. O Repertório fala de não se aplicar a pena “si constiterit evidenter de iniustitia et
malitia nuntiantis”, mas isso, que o Repertório tirou de GRACIANO e de MANUEL MENDES DE CAS¶rRo,
nada tem com a caução; refere-se à cognição final. Ao próprio ANTÔNIO JOAQUIM RIBAs, que cita
PASCOAL JOSÉ DE MEIO FREIRE, bastaria ler a esse (Institutiones, II, 80). ~,Donde vem o erro de
ANTÔNIO JOAQUIM RIBAs? De confundir a suspensão da diligência do embargo, se o notificado faz, ali
mesmo, a prova da injustiça, e a suspensão do efeito do embargo, mediante o substitutivo da caução. É isso o que
está em ANTÔNIO CAIuoso no AMARAL e em MANUEL GONçALVES DA SILVA (Commentaria, III, 161)
4)CONTINUAÇÃO DA OBRA E DO PROCESSO. Tomada a caução, a obra pode continuar, e o processo
prossegue.JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Praxe Brasileira, 447) disse que “pode o nunciado, antes de
contestar ou contrariar, requerer vistoria na obra para ser logo desembargada; e, se pelo exame for evidente que
se requereu o embargo por emulação, manda-se passar mandado de levantamento, julgando-
-se por sentença a vistoria; sendo-lhe, porém, duvidosa a justiça, manda-se continuar o processo”. Citou
ANTÔNIO GOMES e MANUEL GONÇALVES DA SILVA (Commentaría, III, 161, 162). Porém essa
interpretação do texto de MANUEL GONÇALVES DA SILVA (que está no Livro III, Título 78, § 4, ns. 42-46)
já perdeu qualquer valor: primeiro, porque a caução, hoje, se pode prestar a qualquer tempo, não havendo mais o
interstício de três meses; segundo, a diligência do embargo da obra nova compreende, no art. 938, lavrar o auto,
com força probatória material, que só a cognição em processo ordinário pode destruir, razão por que se faz
ordinário o processo. É verdade que ANTONIO GOMES, O jurista português, professor em Salamanca, atacou o
velho direito que fechava a porta à caução nesses três meses, e rompeu-a (Opus super legibus Tauri, L. 46, ns. 34
e 36) com o ataque à prova, que nos três meses (cp. ANTÔNIO CARDOso no AMARAL, Summa seu Praxis
Iudicu~n, n. 8, e MANUEL GONÇALVES DA SILvA, Commentaria, III, 161: “si vero qui aedificat, vult
satisdare, et nunciator non vult recipere satisdationem, nec se offert aliquid probare, per quod opus bene
impeditum fuisse demonstret; tunc statim nuntiatus poderit aedificare, non elapsis tribus mensibus; et ín istis
casibus iura antiqua manent incorrecta”). Como se vê, a tal vistoria, antes de contestar, foi engano de JOAQUIM
INÁCIO RAMALHO, sem base em MANUEL GONÇALVES DA SILVA; menos ainda em ANTÔNIO
GOMEs. O “non elapso tempore trium mensium” significava não-terminado o prazo de três meses (Ordenações
Fiipinas, Livro 1, Título 68, § 42: “... sem seguir a demanda”, ou “deixar de falar a ela três meses inteiros”). O
que escusava de demolir ou de construir era algum ato de contraditório (MANUEL GONÇALVES DA SILVA,
Commentaria, III, 162): “si constet de malo iure nuntíantís, et bono iure nunciati notorie, et clare per
instrumentum indubitabile, vel confessionem partis in iudicio factam, aut rem iudicatam, vel per accessum ad
locum, et per evidentiam facti”. A lição era de ANTÔNIO Goiwrs, porém nada tinha com a permissão de se
atender ao réu antes de o autor prosseguir. Tanto assim que, ainda nos casos de notoriedade da injustiça na
nunciação, sobre esse ponto devia decidir o juiz, citada a parte, conforme explicou MANUEL GONçALVES
DA SILVA: “et super ilio debet procedere íudicis declaratio, citata parte, qui attento malo iure nuntiantís notorio
et claro, remittat nuntiationem”.
administrativo, ou de alguma redação legal de direito privado, a caução há de ser afastada, porque haveria
infringência de lei no próprio ato do juiz que permitisse o prosseguimento, mediante caução. Dá-se o mesmo se a
obra era demolitória ou modificativa, e com isso se ofenderia regulamento administrativo ou outra regra juridica
cogente.
5)REGULAMENTOS ADMINISTRATIVOS. Se a nunciação coincide com a proibição de obra em virtude de
lei de direito.
1) USUCAPIÃO. A usucapião supõe, em vez de sucessão de direitos, seqUência, posterioridade de um direito a
outro, de jeito que entra na classe dos modos originários de adquirir. Adquire-se, porém, não se adquire de
alguém. O novo direito já começou a formar-se antes que o velho se extinguisse. Chega o momento em que esse
não mais pode subsistir, suplantado por aquele. Dá-se a impossibilidade de coexistência, e não sucessão, não o
nascer um do outro. Nenhum ponto entre os dois marca a continuidade. Nenhuma relação, a fortiori, entre o
perdente do direito de propriedade e o usucapiente. Não há pensar-se em modo derivado de aquisição (ALOIs
BRINZ, Lehrbuch, 2Y~ ed., 1, 563 5., FERDINAND REGELSBERGER, Pandekten, 1, 244; E. CUQ, Insti
tutions Juridiques, 1, 223; EDUARD HÓLDER, Pandekten, 186; certos, E. WINDSCHEID, Lehrbuch, 9.~ ed.,
1, 913; OTTO VON GIERNE, Deutsches Privatrecht, 1, 279, nota 2); K. R. VON CZYIILAEZ, em GLÚCK,
Pandelcten, 1, 24 s.). Não colhe o argumento de sempre se usucapir com a carga das servidões prediais que
existem, porque também pela ocupação se adquire com tais servidões. O usucapiente adquire, abstraindo-se de
quem tenha sido proprietário; o ocupante, supondo-se que não o tenha havido.
A respeito das servidões, temos de admitir que o ocupante, que se apossou do imóvel e chega ao ponto temporal
de o usucapir, pode ter sabido que, o vizinho exercia, por exemplo, a servidão de passagem. Aí, o titular da
servidão, que do terreno ocupado se servia, tem dois caminhos para resguardar o seu direito: provar que foi
registrada, antes da ocupação, a servidão, ou que o ocupante sempre lhe conheceu tal direito. O título de servidão
que proveio de quem fora proprietário somente serve à prova da sua servidão; esgotado o prazo para a usucapião,
o usucapiente, que sempre respeitou a servidão, apenas usucapiu o terreno, deducta a servidão. Tais
circunstâncias raramente acontecem, porque, de ordinário, as terras usucapíveis são ocupadas sem se respeitarem
direitos reais limitados.
Uma vez que aludimos a direitos reais limitados, com a usucapião pode ter ocorrido a extinção, mas a própria
extinção pode ter sido anterior. Por exemplo: não foi usada a servidão durante dez anos contínuos e a usucapião
adveio~ pois seu prazo é maior; faltavam meses, semanas ou dias para se extinguir a servidão e iniciara-se a
ocupação que levou à usucapião. Se o ocupante já encontrara com desuso de mais de dez anos a servidão, o que
ele usucapiu nenhuma servidão atingira a sua posse. Se o usufruto chegar ao final do seu prazo de duração, antes
ou durante a posse do usucapiente, não mais há o direito real limitado. Dá-se o mesmo com o uso e a habitação.
Se ocorreu antes da ocupação, ou durante ela, a extinção do direito real da hipoteca, pela prescríçao, não se pode
pensar em estar gravado o imóvel usucapido.
Se o usucapiente adquire o imóvel ainda gravado de direito real limitado ou de direito real de garantia, os prazos
que se haviam iniciado para a extinção do gravame correm sob a nova titularidade do domínio e pode acontecer
que O direito real limitado acabe.

2)AçÃo DE USUCAPIÃO E AÇÃO PUBLICIANA. A ação de usucapião, que se não confunde com a
Publiciana actio, é ação declarativa, com o elemento eventual (necessário, em se tratando de usucapir imóvel) do
registro da sentença, efeito mandamental que erradamente se tem querido exagerar. O seu procedimento é
pessoal (art. 942, II, 1.~ parte), ou edital (art. 942, II 2.~ parte), qualquer que ela seja.
O registro da sentença é efeito mandamental, que não basta para a classificação da sentença.
Os que pensam ser constitutiva a ação de usucapião, esses cometem, de uma vez, dois erros: a) julgam que só se
usucape no momento da sentença e, preocupados com os dois conceitos de declaratividade e de constitutividade
segundo o direito material, têm o pretenso efeito ex nunc por sinal necessário e suficiente de constitutividade da
ação (conceito de direito processual, na classificação das ações; b) têm a eficácia sentencial de registro, segundo
o art. 945, como eficácia constitutiva, quando, em verdade, é mandamental. Por onde se vê que, se esse elemento
fosse preponderante, a ação e a sentença seriam mandamentais, e não constitutivas. Não é mandamental,
ademais, porque se sentencia que existe a relação jurídica da propriedade usucapida.
A sentença diz, na ação de usucapião, que a certo momento se usucapiu. É isso o que se declara. O registro sú
tem efeitos que concernem ao próprio registro ou à publicidade. Não é a partir dele que começa a nova
propriedade. A nova propriedade entenda-se a titularidade, ou no tempo, a única titularidade, porque se pode dar
que se haja usucapido res nuilius imobiliária é anterior à sentença, e a sentença declara-a.

Art. 941. Compete a ação de usucapião 1) 4) ao possuidor para que se lhe declare3) 6) 7), nos termos da lei2), o
domínio do imóvel ou a servidão predial 5)~

1)Usucapião O art. 941 remete, implicitamentc, ao direito material, a que cabe dizer quais os pressupostos da
pretensão de usucapir o imóvel (Código Civil de 1916, arts. 550-553).

2)PRAzos DA USUCAPIAO . A usucapião de imóveis, ainda vigente no Brasil pela condição econômica das
suas terras, rege-se pelos arts. 550-553 do Código Civil. Há a usucapião vintenária do imóvel, posta pelo Código
Civil, acertadamente, em primeiro lugar, porque a verdadeira história do instituto mostra que, a despeito de
parecer excepcional a usucapião sem exigência de boa-fé, a usucapio se fundava, desde as origens, na posse (J.
T. SORIRMER, Die Grundidee der Usucapion, 39; R. STINTZING, Das Wesen von bona fides, 6; RUDOLPH
SOHM, Institutionen, 16.~ ed., 397), sem se cogitar de justo título e boa-fé. Depois foi que se aboliu a usucapião;
mas a vida reinstalou, através da longi temporis possessio, a instituição mais acorde com ela. No ano 531,
Justiniano fundiu as duas. A rigor, a usucapião do art. 550 do Código Civil é que é “ordinária”.
Devem-se interpretar os arts. 550-553 como sendo o art. 551 abreviativo do tempo para usucapir; e não o art. 550
como dilatante. Uma das conseqUências é que vale a regra jurídica de que a boa-fé pode suceder à má-fé (crendo
ter adquirido o que possuíra de má-fé, ao usucapiente é dado invocar o art. 551). Quanto à boa-fé, antes do
direito filipino, prevalecia a regra: *Mala lides superveniens non nocet. Depois veio a Lei portuguesa de 4 de
fevereiro de 1534, que influiu na feitura das Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 3, § 1, e fora ditada pelas
causas econômicas que haviam produzido a deturpação do velho instituto das XII Tábuas. (Aliás, limitada aos
Romanos, a usucapio passara a ameaçar direitos dos proprietários negligentes, dentro do mesmo grupo
populacional, “Romanos”~ e a parte mais poderosa exigiu a boa-fé. Em Portugal, a Lei de 1534 coincidiu com os
estremecimentos econômicos do século XVI). No sistema do Código Civil de 1916, levantou-se a questão de ser
aplicá<el a regra jurídica romana sobre a Mala lides ou a regra juridica, também romana, depois canônica, Mala
lides superveniens nocet (exige-se a boa-fé durante os dez anos). CLóvIs BEvILÁQUA (Código Civil
Comentado, 3, 84) entendia que a boa-fé há de existir em todo o curso da usucapião.
Com razão; advirta-se, porém, em que não é pressuposto ter começado de boa-fé: a boa-fé pode sobrevir. Além
disso, presume-se, o que inverte o ônus da prova.

O Código de Processo Civil de 1939, não falou da ação ~e usucapião de móveis, por lhe parecer pouco usada.
Igualmente, o Código de 1973, art. 941, verbis “o domínio do imóvel ou a servidão predial”. O rito é o mesmo
dos arts. 550-553 do Código Civil de 1916.
Não importa que as leis processuais não falem de usucapião de bens móveis. Entendamos: móveis, stricto sen.su,
e semoventes, O art. 618 do Código Civil de 1916 foi explícito:
“Adquirirá o domínio da coisa móvel o que possuir como sua, sem interrupção, nem oposição, durante três anos”.
E o parágrafo único: “Não gera usucapião a posse, que se não firme em justo título, bem como a inquinada,
original ou suvervenientemente, de má-fé”. Ainda o art. 619, que tem a redação que lhe deu a Lei n. 2.437, de 7
de março de 1955: “Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião
independentemente de título ou boa-fé”. E o parágrafo único: “As disposições dos arts. 552 e 553 são aplicáveis
à usucapião das coisas móveis
A questão da imprescritibilidade da pretensão à demarcação, posto que, se ocorre usucapião, não possa mais
exercer-se, tornou-se para os juristas uma das mais perturbantes. A ação de demarcação pertence a proprietários,
e é imprescritível a pretensão, enquanto haja o direito; se o direito morre, a pretensão não prescreve: morre
também. Toda a literatura em que se discutiu o famoso quebra-cabeças cai diante de explicação tão simples,
baseada na distinção entre direito, pretensão e ação.

3)NATUREZA DA SENTENÇA. Cf. Código Civil, arts. 697, 698, 676 e 856, III. Sentença declarativa, com
efeito forte de mandamento, devido ao art. 945 (antes, já assim no Código de 1939, art. 454, § 2.~, e nos Códigos
do Distrito Federal, art. 566, e do Espírito Santo, art. 464). Nos demais, a sentença era apenas título hábil para a
transcrição (cf. Santa Catarina, art. 1.027, e Minas Gerais, art. 829). A diferença está em que não depende de
requerimento da parte, nem de ato dela, o proceder o oficial à transcrição. Já dissemos que a ação é declarativa.
Regularmente, a eficácia da sentença é declarativa, mais o efeito de mandamento, por força do art. 945. Como
sentença declarativa, passa em julgado materialmente. Toda força de coisa julgada material é inter partes, mas,
se houve procedimento edital, a respeito de todos aqueles que foram compreendidos na citação por éditos. Daí a
conveniência de se pedir sejam citados os interessados desconhecidos (art. 942, II, 2Y~ parte). Compare-Se-lhe a
eficácia com a das sentenças constitutivas.
A sentença, na ação de usucapião, não tem eficácia erga omnes, salvo se houve citação edital de todos os
interessados. A eficácia real, só se tem com o registro. Mas o registro depende de ter havido procedimento edital.
A carga de eficácia da sentença favorável, na ação de usucapião, é de 5 de declaração, 4 de mandamentalidade e
3 de constitutividade. Por isso, não há registro imobiliário de aquisição por usucapião sem a sentença (elemento
sentencial constitutivo); nem se precisa de requerer o mandado , a sentença já deve mandar que se retire.
Reclama-se o mandado, não se pede. Se a sentença foi de eficácia só entre partes, ainda que se haja registrado, a
ação de reivindicação
que teriam terceiros não citados não preclui: podem eles pleitear a reivindicação (cf. 3•R Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de junho de 1952, R. dos T., 203, 218). O registro é cancelável.

4) CoRREçÃO ACERTADA. A regra jurídica do Código de 1939, art. 454, 2.~ parte (verbis “título hábil para a
transcrição no registro será a sentença”), foi reminiscência do direito anterior, excetuados os Códigos estaduais
citados ànota 3). Não era a sentença o título hábil, a rigor; a sentença havia de ser título para a transcrição, mas o
que prevalecia era a concepção do art. 454, § 2iX (“A sentença que julgar procedente a ação será transcrita no
registro de imóveis, mediante mandado”). O Código podia ter feito (a) insertos, explicitamente, na sentença o
mandamento e o seu instrumento, de modo que o simples “registre-se” levaria consigo aos dois, intimando-se o
oficial do registro ou oficiando-se a ele; ou (b) inserto na sentença o mandamento, implícita ou explicitamente, e
posterior, necessário, o instrumento mandamental (mandado); ou, ainda (c), inserto o
mandamento, implícita ou explicitamente, na sentença, e posterior, a líbito da parte, o mandado. A solução (b)
foi adotada pelo Código de 1939. O Código de 1973, acertadamente, na esteira do que criticamos ao Código de
1939 (Comentários, Tomo VI, 2.~ ed., 363 s.), riscou o que, obsoleto, estava no art. 454, 2.~ parte. O que se tem
hoje é o art. 945, com a sua indiscutível cogência: “A sentença, que julgar procedente a açao , será transcrita,
mediante mandado, no registro de imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais”.

5)SERVIDÕS, AQUISIÇÃO PELA POSSE. O Código estende o processo da ação de usucapião às servidões.
Aliás, a pretensão mesma, que está à base de tal ação, é a de usucapir a servidão. Tanto dela se abusou que uma
iex ScribOflWL a teve de abolir. É de crer-se que existisse a favor das servidões prediais. E a lei citada pecou
pelo excesso oposto e introduziu-se a longa possessio, também extensiva a todas as servidões (sem razão, os que
excetuavam as descontínuas. desde a Glosa até B. W. PYEIFFER Praktische Ausfiihrungen, II, 116, certo, F. C.
voN SAVIGNY, System, IV, 480; ou as pessoais, certo B. WINDSCHEID, Lehrbuch, 1, 1091, ou as negativas,
como LUDWIG BE5SELL, Uber die Lehre von der Erwerbung, Archiv fiir die civilistische Praxis, 13, 410, tais
como a altius non toliendi, a luminibus, a prospectia non 01 ficiendi, a stillicidium non avertendi).
A ação de usucapião não se confunde com as ações correspondentes à pretensão dos arts. 580, 579, in tine, 559-
562, 563-568 do Código Civil de 1916, que são ações diferentes. Nem mesmo se refere o art. 941, às servidões
que se constituem em ações divisórias (communi dividundo, familiae erciscundae), ou na demarcação, se, por
exemplo, a área confundida tem uso que, partida a área, tenha de ser construído como servidão (“si iudex alii
proprietatem adiudicavit”, como dizia GAIO, Livro 7, ad Edictum provinciale). O efeito da sentença, a esse
respeito, é constitutivo.

6)MANDAMENTALIDADE E TRANSCRIÇAO . Na técnica legislativa, a lei (a) deixa a transcrição ao


alvedrio do autor (caso do direito anterior da maioria dos Estados-membros, para as usucapiões em geral); ou (b)
estabelece dever do juiz. Devemos entender que a sentença declarativa tem o efeito necessário de mandamento,
segundo o art. 945. Portanto, a solução é a que se figura em (b).

7)EFEITO DO MANDAMENTO. No final da decisão, deve o juiz acrescentar ao “declaro...” o “transcreva-se”,


de modo que, extraído o mandado, o próprio executor dele pode provocar o oficial do registro. D’e lege ferenda,
a construção teria sido mais pura dispensando-se o “mandado”, porém mantendo-se o efeito necessário de
mandamento.
As relações com o oficial do registro, a respeito dessa transcrição, são entre ele e o juiz; e não entre ele e a parte,
como seriam quanto a outros títulos, ou mesmo outras sentenças transcritíveis, porém sem que a lei lhes confira o
efeito necessário mandamental, que há na sentença declarativa da usucapiao.
A ação de usucapião é declarativa. Não tem carga de eficácia de executividade que permita requerer-se mandado
executivo, com base no julgado (cf. 1.a Cámara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de abril de 1948, R.
dos T., 174, 306, 1?. F., 120, 480). A parte pode reclamar ao juízo,a que cumpre o dever de mandar transcrever a
sentença.

Art. 942. O autor 3), expondo na petição inicial o fundamento do pedido e juntando planta do imóvel, requererá
1):
1 a designação de audiência preliminar a fim de justificar 10) a posse 2);
Ii a citação 4) “) pessoal daquele em cujo nome esteja transcrito o imóvel usucapiendo 13), bem como dos
confinantes 8) e, por edital, dos réus ausentes 9), incertos e desconhecidos 5), observado quanto ao prazo 6) o
disposto no art. 232, item IV.
§ 1.0 A citação prevista no número II deste artigo valerá para todos os atos do processo
§ 2.0 Serão cientificados por carta, para que manifestem interesse na causa, os representantes da Fazenda
Pública da União, do Estado, do Distrito Federal, do Território e do Município 14)

1)REQUISITOS DA Usucapião (DIREITO MATERIAL). Requisitos da usucapião, nas espécies em que não é
de alegar-se a existência de justo título e boa-fé: (a) posse de vinte anos; (b) prédio suscetível de ser usucapido.
Só há usucapião, independente de titulo e boa-fé, findos os vinte anos. No artigo 177, o Código Civil estabeleceu
que a ação real prescreve em de.z anos entre presentes e quinze entre ausentes (Lei n. 2.437, de 7 de março de
1955, art. 1.0). Os comentadores espantaram-se com o fato de prescrever a ação de reivindicação antes de
alguém usucapir. “Seria uma pura impossibilidade lógica”, escreveu um deles (VIRGÍLIO DE SÃ PEREIRA,
Manual, VIII, 213), “conceber o domínio sem a faculdade implícita de reivindicar a coisa sobre a qual ele se
exerce”. De modo nenhum. Cessou a ação real que se liga à pretensão à restituição, tanto que as outras ações e
exceções não cessam, inclusive esse proprietário, com pretensão à restituição e sem ação real (um dos casos de
pretensão sem ação, lclagloser Anspruch ‘ raros, mas, encontráveis, cf. ANDREAS vo~ TiraR, Der Ali gemeine
Teu, 1, 258-261), pode impedir que se profira a sentença declarativa da usucapião. No direito anterior ao Código
Civil, PAsCOAL JOSE DE MELO FREIRE viu o problema e sofismou com evidente postergação do texto
expresso das Ordenacões Filipinas sobre a ação pessoal do vendedor, que ficava (Livro IV, Título 3, § 1, verbis
“até trinta anos cumpridos”).
(A fim de não estabelecermos confusão, devido à mudança dos prazos operada pela Lei n. 2.437, de 7 de março
de 1955, art. 1.0, raciocinamos com os prazos atuais. Os problemas foram postos em tempo em que os prazos
eram outros; mas nenhuma diferença há para o desenvolvimento lógico dos argumentos.)
A construção, em bom método de interpretação, teria sido: usucapião, vinte anos; pretensão à restituição, vinte
anos; ação de reivindicação ou outra ação real, entre ausentes, quinze, ou, entre presentes, dez anos. Não viram
os juristas a diferença entre pretensão e ação, e só ficaram atentos ao problema da usucapião de curta e longa
posse e à ação real (PASCOAL JosÉ DE MELO FREIRE, Institutiones, III, 30;Legem scriptam, quam sciam,
nuíla habemus, quae tempus, in mobilium rerum prescriptione definiat... In rerum quoque immobilium
usucapione tempus definitum expresse non est; definitum autem exstat ab Alfonso V, in praescriptione actionum
in rem, Ord., Lib. 4, Tít. 49... Et ex hac Ordinatione... actiones, cum ex iure in re nascantur, iura rerum sequuntur
ad invícem et, eo durante, durant, et, exstincto, extinguuntur”). O jurista português estava certo em afirmar que,
nascendo o direito do usucapiente, se extinguia o do proprietário (Duorum in solidum dominium esse non posse);
mas errava em exigir que, extinguindo-se a ação real, ou o próprio direito, tivesse alguém de usucapir.
LAFAIETE RODxuGuEs PEREIRA (Direito das Coisas, 1, 175) tratou, separadamente, dos dois institutos, sem
descobrir a diferença causada na situação jurídica do proprietário entre a prescrição da ação real e a aquisição
originária por outrem (usucapião). Apenas à pág. 209, nota 1, sentiu-se “intrigado” com o assunto.
Quanto à usucapião com justo título e boa-fé, os pressupostos são: (a) posse contínua e incontestada (tranqúila, e
não “incontestável”, pois o termo no art. 551 do Código Civil de 1916, significa “mansa e pacifica”); (b) justo
titulo, quer dizer, título de direito, como o contrato de compra--e-venda, o testamento, a sentença, a compra-e-
venda dos direitos possessórios, como possuidor-dono, a ocupação putativa (LAFAIETE RÚDRIGUES
PEREIRA, Direito das Coisas, 1, 185).
Quanto aos móveis, há no Código Civil os arts. 618 e 619, onde se vê que os prazos para a usucapião são com
justo título e boa-fé e para a usucapião sem justo título e sem boa-fé: três anos, cinco anos.
A aquisição da propriedade imobiliária por usucapião não importa se as terras tinham dono, ou se eram nuilius,
ou se os títulos registrados mostravam perfeita continuidade, ou se podiam ser registrados até chegar-se à posse
do usucapiente, com inteiro encadeamento, ou se não podiam ser registrados, ou se algum título ou todos os
títulos, ainda após a posse pelo usucapiente, podiam ser registrados. Nenhum obstáculo exsurge à usucapião pelo
fato de ser exato o registro, em perfeito seguimento e juridicidade de títulos. O registro do título de propriedade
de imóvel que tem data anterior de muitos anos, havendo, depois, morte dos titulares referidos no título, não é
óbice à aquisição da propriedade por usucapião, nem o é o próprio registro de título recente, durante ou posterior
à posse ad usucapionem. O registra nunca é objeto à ação de usucapião, porque se usucape por se ter posse, e não
por se ter direito, nem, sequer, direito à posse.
Se o bem estava em condomínio, ou em composse, é preciso que à composse haja sucedido posse própria de uma
só pessoa, ou composse de menos ou mais pessoas do que eram os condôminos, ou compossuidores, para que se
possa pensar, na usucapião de toda a propriedade, ou na usucapião da parte indivisa, ou divisa, por se ter
completado o tempo necessário de posse para a aquisição do todo, ou da parte. A jurisprudência que preexclui a
possibilidade de usucapião da parte indivisa (e. g., 3~R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, 3 de julho de 1947, J., 29, 410), ou da parte divisa, é de repelir-se.
Se os usucapientes foram x pessoas e o terreno era de uma pessoa, ou de duas ou mais, ou era sem dono, a
usucapião pode ser de uma parte por uma pessoa, ou por duas ou mais (aquisição pro indiviso), ou se duas ou
mais partes, separadamente (aquisição pro diviso), por uma só pessoa (cada parte é objeto de usucapião) ou por
duas ou mais pessoas quanto a uma parte, ou duas ou mais, o que leva à co-
-propriedade ou às co-propriedades, ou quanto a algumas ou todas as partes. O que se há de levar em
consideração é a posse ou a composse, porque, qualquer que tenha sido a extensão do terreno tido como de
propriedade de alguém ou mesmo res nuilius, o que importa é a posse pelo usucapiente ou pelos usucapientes até
esgotar-se o prazo para a captação do direito de propriedade.
Uma vez operada a usucapião, só se pode alegar direito de domínio invocando-se outro titulo de aquisição, e não
o título ou os títulos que a usucapião superou. Enquanto não se transcreve a sentença declarativa de usucapião
pode ser transcrito algum título referente às terras. Mas, é preciso que haja legitimados ao registro. Se alguém era
adquirente de imóvel, sem se ter registrado o título, não é qualquer pessoa que pode ir registrá-lo. Se os
figurantes do título estão mortos, legitimados são os herdeiros; porém isso não obsta à eficácia da usucapião já
operada.
A usucapião opera-se ipso iure. A sentença, que se profere, é declarativa. O registro apenas dá à sentença a
publicidade registrária que se passa no plano da eficácia (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 6 de junho de
1947, R. F., 116, 121: “... para o exercício do direito de dispor, com o objetivo de sanear o registro e assegurar o
histórico do direito de propriedade, através das sucessões ”, devendo-se entender, aliás, “poder de dispor com
registro”, porque se pode dispor do que se adquiriu por usucapião antes do registro; 2.~ Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 29 de outubro de 1941, J., 19, 644; 1.R Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul, 25 de maio de 1948, R. F., 119, 497). Por isso mesmo que a sentença é
declaratória, a usucapião preexiste e pode ser alegada como objeção (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 6
de julho de 1948, 122, 116: “A usucapião pode ser oposta como defesa (é o caso), independentemente de
sentença anterior que o declare e que, registrada, sirva de titulo ao dominus. A usucapião é, como a transcrição,
modo de adquirir domínio. É modo originário de adquirir domínio, com a perda do antigo dono, cujo direito
sucumbe em face da aquisição”).
Se, ao se pedir a transcrição da sentença de usucapião,o nome de outrem consta do registro, nem por isso se não
transcreve a sentença.
Enquanto não se transcreve a sentença de usucapião, o Oficial de Registro pode transcrever títulos que se liguem
aos anteriores; porém isso não atinge os direitos dos que usucapiram, nem, sequer, dos que estão em via de
usucapir. O registro de jeito nenhum interrompe o tempo de usucapião, porque registro não interrompe posse.
Se o que usucapiu ainda não propôs a ação de usucapião e alguém vem contra o seu direito, pode ele repelir esse
demandante com a alegação de ter usucapido. A sentença, que então se proferir, ~, é declaratória, isto é,
sentença prevista no art. 4•O do Código de Processo Civil, ou decisão de questão prévia? Numa e noutra espécie,
falta à decisão eficácia erga omnes, com que se possa pedir a transcrição. Não se transcrevem no registro de
imóveis decisões que, em se tratando de usucapião, não se processaram segundo os arts. 941--945do Código de
Processo Civil, especialmente o art. 942, II. Acima falamos de questão prévia, pois há previedade,
em relação à sentença de usucapião, se ocorreu a ação incidental declarativa. No art. 5~0, permite-se que, se, no
curso do processo, se torna litigiosa a relação jurídica de cuja existência ou inexistência depende o julgamento da
lide, qualquer das partes pode requerer que o juiz o declare por sentença. No art. 325 apenas se referiu à
contestação pelo réu do direito que constitui fundamento do pedido, caso em que o autor pode requerer, no prazo
de dez dias, que o juiz profira sentença incidente, se da declaração da existência ou da inexistência do direito
depende, no todo ou em parte, o julgamento da lide. Nem a regra jurídica do art. 5•o nem a do art. 325, tiveram
texto igual no Código de 1939. A arguição de falsidade é assunto dos arts. 390-395 (cf. Código de 1939, arts.
717-719).
Se quem tem a posse que levou à usucapião, sem que ainda se havia proferído sentença em ação de usucapião, ou
sem que tal sentença haja transitado em julgado, j, como há de proceder o réu, em ação de reivindicação, ou ação
de vindicação da posse, ou em ação possessória, se ele entende que já usucapiu? O emprego da ação incidental
teria a inconveniência de ser a sentença favorável ao réu com o julgamento do incidente (arts. 5~0 e 325), porque
não teria a sentença eficácia erga omnes que serviu ao que colima a sentença favorável na ação de usucapião,
principalmente para o mandado de transcrição no registro de imóveis. Nas espécies que acima apontamos, não
seria de dispensar-se a sentença em ação de usucapião, em que se teriam de observar as regras jurídicas dos arts.
941-945, para que se obtivesse a eficácia necessária. Surge apenas um problema: j. poderia, então, o réu, em vez
de se satisfazer com a contestação na ação de vindicação de propriedade e de posse, ou só de propriedade ou só
de posse, ou na ação possessória, reconvir ao autor (arts. 315-318)? A resposta há de ser afirmativa, salvo se, in
casu, a açáo pendente é de procedimento sumaríssimo (art. 315, ~ 2.0). Mas, além da intimação do autor
recouvindo, de que trata o art. 316, teriam de ser feitas as citações
(art. 942, 1, e ~ LO) e as comunicações por meio de cartas aos representantes da Fazenda Pública da União, do
Estado-membro, do Distrito Federal, do Território e do Município, e o prazo para a contestação (que é o mesmo,
conforme os arts. 216, 232, IV, e 942, II, 297), aí começa da intimação da decisão que declare justificada a posse
(art. 943). O que é de toda a relevância é que na reconvenção não se deixe de observar o que está nos arts. 941-
945, uma vez que se cumulou a contra-ação (reivindicação) com a ação de declaração da usucapião.
~, Que há de fazer o oficial do registro de imóveis se lhe apresentam sentença em ação de usucapião a que faltou
o requisito da vocatio in ius edital? A sentença não é nula; posto que possa ser rescindida por infração do art. 942
e ~ § 1/” e 2.0 do Código de Processo Civil (art. 485, V). A sentença falta a eficácia erga omnes, que é
pressuposto para o registro. Trata-se, portanto, de ineficácia relativa da sentença. Também se falta alguma
citação que a lei reputou indispensável, produzindo nulidade ou ineficácia do processo, o oficial não pode recusar
o registro. Houve o trânsito em julgado.

2)PRODUÇAO DE PROVAS DA POSSE E PROCEDIMENTO EDITAL.


A produção de prova da posse, a que se procede antes da contestação da ação de usucapião, tem a eficácia
necessária para se determinar a citação dos interessados, dos confinantes e da pessoa em cujo nome está
registrado o imóvel. A contestação impugna-a, de modo que o juiz não fica vinculado à prova feita (cf. 4~R
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de fevereiro de 1948, 1?. dos T., 172, 173).
A contestação pode ser apenas quanto a parte da área (3.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, 21 de setembro de 1944, D. da J., de 21 de julho de 1947), ou quanto à existência de algum direito que
grave o imóvel, ou ali mesmo ter o réu usucapido com o autor pro indiviso.
A citação de que se trata no art. 942, II, pode ser por edital por ocorrer alguns dos casos do Código de Processo
Civil, art. 231, 1 e II: “quando desconhecido ou incerto o réu” ou “ignorado, incerto ou inacessível o lugar em
que se encontrar”; ou porque a lei o exige (art. 231, III) notada-mente por se tratar de procedimento edital,
procedimento em que os interessados são citados para que a sentença, que se profira, possa ter força e eficácia
contra eles. Assim, a favor e contra todos os que são determináveis pelo conteúdo do edital há coisa julgada
formal e material se há a carga suficiente, na sentença, de declaratividade.
Referimos ao art. 231, II, porque há certa diferença entre o art. 942, II, e o art. 231, II (“quando ignorado, incer
te ou inacessível o lugar em que se encontrar”); e não se pode desatender a regra jurídica geral.
No art. 942, II, 1.~ parte, diz-se que tem de ser requerida “a citação pessoal daquele em cujo nome esteja
transcrito o imóvel usucapiendo”. Portanto, se incerto ou inacessível o lugar em que encontra, a citação é por
edital, do qual constará o nome da pessoa cujo nome esteja no edital. Aliás, pode ser incerta ou desconhecida a
pessoa cujo nome consta da transcrição. Se tal pessoa faleceu e se conhecem os herdeiros, ou não se sabe quais
foram, o art. 942, II, e o art. 231, II, têm de ser observados. Dá-se o mesmo, aliás, quanto aos donos dos terrenos
confinantes. Pode mesmo acontecer que não haja proprietários, ou haja apenas possuidores. Se não se sabe quem
são os donos, nem os possuidores, o edital há de conter a descrição suficiente dos terrenos confinantes, com o
informe de que não se sabe quem é proprietário ou possuidor de cada um.
O procedimento tem de ser edital, se se trata de ação declarativa, constitutiva, ou outra, em que se tenham por
fito efeitos contra todos. Sempre que se tem de declarar direito real, inclusive o dominio, ou qualquer direito
erga omnes, e a decisão sirva para a criação dessa eficácia, ou a sua declaração, o procedimento edital é exigido.
O procedimento edital é o próprio para todas as ações em que os demandados sejam todos os interessados, ou
não se sabe quem seja, dentre todos. Não se confunde, portanto. com o ato processual citatório, notificatório,
interpelatório, ou outro, em que se tem de lançar mão do edital, por não se saber quem seja a pessoa nomeada, ou
em que lugar se acha (“ignorado ou incerto” o lugar), ou se ela se encontra em lugar inacessível.
O procedimento edital dirige-se, portanto, contra todos, ou contra o adverso desconhecido do demandante. De
regra, a sua finalidade é a eficácia desfavorável ao aliter, todos ou o desconhecido. Mediante essa angularidade
com o sujeito passivo total, ou ignoto, obtém-se, por exemplo, a declaração de ineficácia (amortização) de
documentos perdidos (e. g., Código de 1973, art. 909, cf. Lei n. 891, de 24 de outubro de 1949, art. 2.0), a
declaração de usucapião (art. 945), a declaração de irresponsabilidade ou responsabilidade restrita do patrimônio
em relação a créditos não apresentados ou não denunciados, ou a declaração com eficácia, contra todos, da
falsidade de documento (e. g., letra de câmbio)

A citação edital, nos casos em que se ignora quem seja a pessoa de quem só se tem o nome, ou não se sabe se
existe (e. g., herdeiros, que podem existir), ou está em lugar ignorado, incerto ou inacessível, é acidental. A
citação, nos procedimentos editais, em que os réus são todos, ou não é possível, a posteriori, saber-se quem
sejam, é essencial. Daí a lei exigir o edital, sem necessidade de se invocar o art. 231, III, do Código.

A dúvida quanto a ser o procedimento edital contencioso ou voluntário, somente pode provir de pouca
investigação dos fatos: a) a angularidade da relação jurídica processual opera-se: autor, Estado (juiz); Estado
(juiz), réus citados em edital, sem ou com menção de nomes; b) ou a contestação ocorre; ou c) se tem base no
silêncio para a decisão (daí a incidência das regras jurídicas sobre o processo comum).

Se algum interessado comparece ou contesta todo o petitum, ou só o contesta em parte (e . g., na ação de
usucapião, um dos interessados alega que tem hipoteca sobre o imóvel). Na segunda espécie, o juiz profere
sentença favorável, com reserva do direito do interessado comparecente, ou sem ela.
Uma vez que o procedimento edital supõe a citação dos interessados, segundo os caracteres que sirvam para
chamá-los, o que devia ter sido chamado regularmente, e não foi, pode argüir omissão do edital ou dos seus
requisitos de fundo e de forma, e o chamado regulamento pode opor a inadmissibilidade do procedimento edital,
falta ou ineficiência de prazo, exceções processuaís, desatendimento do direito do citado por edital, e ato punível
que dê ensejo à restituicão ou reparação.

3) AçÃo DEcLARATóRIA. A ação de usucapião é ação declaratória, em que demandados são quaisquer
interessados e os confinantes. A citação dos confinantes tem razão de ser que não é a dos outros interessados. O
confinante é interessado na demarcação, na fixação dos limites. Pode ser interessado, também, na res in iudicium
deducta, que é a posse ad usucapionem, com a consequência, que o autor afirma, de ter usucapido. O confinante
é demandado, necessariamente, como confinante, que é, e pode comparecer, também, como interessado na
contestação do pedido de declaração de direito de propriedade, que fez o autor
Oque mais importa, por conseguinte, para a ação de usucapião, é a citação edital. Sem ela, a força declarativa só
seria entre as mencionadas partes. Trata-se de ação declaratória, com eficácia mandamental. Mas, o que se
declara é o direito real da propriedade, que é direito com sujeito passivo total, direito contra todos, por ser direito
real (Tratado de Direito Privado, Tomo V, § § 609, 610 e 613, e XII, § 1.292).
O procedimento edital é pressuposto necessário da relação jurídica processual da ação de usucapião: somente por
ele se pode completar a angularidade da relação jurídica processual: autor, Estado; Estado, todos os interessados.
A propriedade é direito com sujeito passivo total; as ações declaratórias somente podem ter eficácia sentencial
entre as partes. As partes são, pela natureza do direito, todos. Sem isso, não se pode obter sentença que passa ser
transcrita no registro de imóveis. Daí as concisas e precisas regras jurídicas do art. 942 e § § 1.0 e 2.~.
1-lá muito de provocatório no procedimento edital, de que o do art. 942 do Código de Processo Civil é exemplo:
com a declaração da aquisição da propriedade pelo autor, os terceiros, que foram chamados a juízo, compareçam,
ou não, ficam sem os direitos que acaso tinham sobre o bem. Por isso, são partes necessárias, litisconsortes
imprescindíveis, todos, mais os confinantes e mais os que tenham direitos reais sobre o bem, conforme registro.
Se algum interessado comparece e alega domínio, ou outro direito real, a ação de quem afirma ter usucapido, ou
usucapido bem livre e desembaraçado, sofre contestação.
Por ser dirigida ao alter, a todos, a ação de usucapião, se foram citados todos os que se sabe serem interessados,
e não foram citados os outros, não houve citação suficiente. O juiz, no procedimento edital, não tem poder para
discernir quem é interessado e quem não no é. A citação é de todos os interessados, “certos ou incertos”. Os
certos, citam-se pessoalmente e estão citados no edital; os incertos, por edital. Incertos, no art. 942, II, do Código
de Processo Civil, são os interessados que se não conhecem, os interessados “desconhecidos”, de que se fala no
art. 231, 1, do Código. Os conhecidos são certos, no sentido do art. 942, porém não no sentido do art. 231, 1,
pois, no art. 231, 1, se distingue do citando “desconhecido” o “incerto” (verbis “quando desconhecido ou incerto
o réu”). Por isso mesmo, interessado certo (no sentido do art. 942), como é a pessoa em cujo nome está transcrito
o imóvel (art. 942, II, í.~- parte), pode ser incerto, no sentido do art. 231, 1 (conhece-se o nome, não se sabe
quem é).
Todos os bens imóveis que se diz foram usucapidos têm limites, que são os limites da posse ad usucapionem.
Quem alude a limites alude a terrenos para lá dos limites, que podem pertencer e é provável que pertençam a
outras pessoas. Essas pessoas, ditas confinantes, têm de ser citadas porque são tão interessadas na limitação da
posse quanto quaisquer outros possuidores.
4)LEGITIMAÇÃO PASSIVA. Na ação de usucapião, as partes são o autor e todos. Em todos estão incluídos os
que têm ou teriam direitos reais sobre os bens e são conhecidos ou não.
A citação de todos é, portanto, essencial à angularização da relação jurídica processual. Se o edital não foi de
acordo com a lei, ou não se fez, citação não houve. Se foram citados todos os confinantes e não se fez o edital,
citação não houve: porque o interesse de quem é dono do prédio que confina com o prédio objeto da ação não é o
mesmo interesse de quem pode contestar a ação de usucapião e até mesmo contestar o direito do confinante.
Se o edital concernente a todos não se fez, somente contra quem foi citado pessoalmente, e contra quem
compareceu, pode ter eficácia a sentença. Pode dar-se que o edital tenha existido, mas tenha sido edital nulo.
Edital nulo, citação não feita, porque não se fez, ou foi nulamente feita.
Se o cônjuge é meeiro, ou não, tem de ser citado na ação de usucapião em que o foi o outro cônjuge. Se meeiro,
porque é sujeito passivo na relação jurídica processual; se não o é, porque teria de assentir.

5)PUBLICAÇÃO. No Código, art. 232, III, a publicação que se exige ao edital de citação é no órgão oficial do
Estado-membro e, pelo menos, duas vezes, em jornal local, se houver. Diferente era o que a lei anterior
considerou indispensável à publicidade do edital de citação, nas ações de usucapião (Código de 1939, art. 455, §
1.0): a citação dos interessados, sujeitos passivos da relação jurídica processual, para que se desse a angularidade
(autor, Estado; Estado, todos), era com o prazo de trinta dias, publicação por três vezes em jornal da comarca, ou,
se essa não tivesse jornal, da comarca mais próxima, e uma vez no órgão oficial do Estado-membro. Se o prazo
fosse de menos de trinta dias, nula seria a citação. Se a publicação só se fez três vezes no jornal da comarca, e
não no órgão oficial do Estado-membro, era nula a citação. Se a publicação só se fez duas vezes, ou uma vez, no
jornal da comarca, e uma no órgão oficial do Estado-membro, havia nulidade da citação. Se a publicação se fez
no órgão oficial do Estado-membro e não se fez no jornal da comarca, nem, se aí não havia jornal, no jornal da
comarca mais próxima, era nula a citação. A citação, na ação de usucapião, conforme o Código de 1939, art. 455,
§ 1.0, era ato unitário, de modo que, se faltava qualquer dos elementos, havia nulidade.
Temos de atender, rigorosamente, ao que hoje se passa no Código de 1973. Não se repetiu o que estava no
direito anterior, O art. 942, II, só se referiu ao edital, sem qualquer alusão ao lugar para a publicação. Assim,
além da afixação do edital na sede do juízo, certificada pelo escrivão, há a publicação no prazo máximo de
quinze dias, uma vez no órgão oficial e pelo menos duas vezes no jornal local, onde houver (art. 232, III) e a
determinação, pelo juiz, do prazo, entre vinte e sessenta dias, correndo da data da primeira publicação (art. 232,
IV). Junta-se aos autos um exemplar de cada publicação, bem como o anúncio afixado na sede (art. 232,
parágrafo único).
6)Pi~zos. É preciso que se não confunda o prazo a contar-se da intimação da decisão que declara justificada a
posse (art. 943), que é o prazo para a contestação, com o prazo contado da citação do art. 942, II, que se rege
pelo art. 232, IV. Não pode o escrivão certificar que expirou o prazo para a contestação antes de esgotado o
prazo da citação, e, após ele, o prazo para a contestação.
O prazo para recurso somente corre contra os que foram citados. Contra quem não foi citado não corre prazo para
recurso. Idem, contra quem foi nulamente citado. Ainda se houve sentença, se alguém que tinha de ser citado não
no foi, ou se o foi nulamente, a sentença é nula. Às vezes, relativamente ineficaz.

7)INEFICÁCIA E NULIDADE. ~ Se quem tinha de ser citado não no foi, ou o foi nulamente, e não compareceu,
há angularidade da relação jurídica processual até ele: a sentença é nula (nulidade da sentença), e não só
rescindivel.
Por exemplo: a) a ação do art. 4~O é declarativa (trata. -se da ação declaratória típica), com eficácia
mandamental, que é a de preceitação. Se não foi citado quem havia de ser parte, sozinho, ou com outra pessoa,
ou com outras pessoas, pode ao preceito objetar o preceitado que a sentença é nula, por ter sido incompletada a
angularidade da relação juridica processual, que teria de ser em ângulo (autor, Estado; Estado, réu). Não se
precisaria de rescisão de tal sentença. Se o interessado passivo não foi citado, ou só o foi nulamente, e nao
compareceu, não se pode pensar em suprimento 011 sanação .
b) A ação de interdição é constitutiva~declarativa, em que o próprio interditando pode recorrer, a despeito de,
sendo absolutamente incapaz, se ter de nomear curador à lide. Tem de ser feito o registro, que é de requerer-se.
Feito o registro, a falta de nomeação de curador à lide, que se insira, como representante do demandado, ou de
citação, nas interdições que não sejam de absolutamente incapaz, ou a nomeação nula, ou à investidura nula, ou
a citação nula teve a conseqilência de fazer nula a sentença. A não -comparencia de quem devera funcionar, ou
ser citado, impede suprimento de sanação.
c)Se a sentença foi condenatória e o não-citado ou citado nulamente não compareceu, a sentença é nula, porque
condenou quem não estava na relação jurídica processual. Na execução, pode alegá-lo o condenado que não foi
parte, em embargos do devedor.

d) Se a ação é mandamental, como a ação de retificação do registro ou a de arresto, o que teria de ser citado e não
no foi, ou foi citado nulamente, pode alegar a nulidade da sentença e, em consequência, a retificação do registro,
ou da constrição dos bens.
e) Finalmente, quem não foi citado, ou o foi nulamente, em ação executiva, e não compareceu, ou não foi
intimado, na forma devida, pode alegar, a todo tempo, que não entrou na relação jurídica processual: toda decisão
contra ele é nula.
Na ação de usucapião da propriedade imobiliária, a sentença favorável ao autor (= que julga procedente a ação) é
transcrita no registro de imóveis, mediante mandado. Se não foi citado algum interessado, que o devera ser, ou se
não foram citados todos os interessados, ou se a citação edital foi nula por defeito de fundo ou de forma, a
sentença éineficaz ou é nula. Pode levantar dúvida o oficial de registro.
Acertadamente foi julgado pelas Câmaras Civis Conjuntas do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de abril de
1948 (R.dos T., 175, 372), que a infração do art. 942, II, 1.~ e 2.~ partes, dá ensejo à ação rescisória da sentença.

8)CITAÇÃO DE CONFINANTES. Se alguém, na ação de usucapião, há de ser citado, por ser confinante, ou é
conhecido e certo, no sentido do art. 231 do Código de Processo Civil, e está em lugar conhecido, certo e
acessível, ou não é conhecido, ou é incerto, ou está em lugar ignorado, incerto, ou inacessível: a citação há de ser
feita, ali, pessoalmente, aqui, por edital.
Tratando-se de pessoa casada, sob regime que não é o da comunhão de bens, o outro cônjuge tem de ser citado
porque há de prestar assentimento. Tratando-se de pessoa casada sob regime da comunhão universal de bens, ou
de comunhão limitada, ou em que o bem comum seja atingido, a citação do outro cônjuge não é só para
assentimento do outro, é para se inserir na relação jurídica processual como demandado. O cônjuge que somente
presta assentimento não é réu; réu é o que é dono ou possuidor do bem, ou o que é meeiro no bem.
No sentido da nulidade do processo da ação de usucapião por falta de citação dos confinantes, a ~•a Câmara
Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 11 de julho de 1944 (D. da J. de 15 de janeiro de 1945), e a
í.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 25 de setembro de 1947 e a 5 de julho de 1948 (B.
J., 37, 224).
A citação da Municipalidade, se o bem público é municipal, ou da União, se federal, ou do Estado-membro, se
estadual, é sempre necessária, nas ações de usucapião, se o bem cuja propriedade se diz usucapida é confinante,
fora de qualquer legitimação passiva que decorra de outras circunstâncias. A falta ou nulidade da citação dos réus
tem consequências a que se equipara a falta ou nulidade de citação de confinante.

As vezes acontece que à sentença falta elemento que lhe dê validade (portanto é nula); se isso ocorre, em ação de
usucapião, a validade que é precípua em confronto com a própria publicação no órgão oficial, que há de ser feita
conforme a lei, a relação jurídica processual não se estendeu, em ângulo, até os interessados. Em consequência
disso, quando se fez a transcrição da sentença no registro de imóveis, tentou-se atribuir efeitos contra todos a
sentença que somente poderia tê-los contra quem foi regularmente citado, ou espontâneamente compareceu. Se
havia menores ou incapazes, ou era interessada a Municipalidade, ou o Estado-membro, ou a União, o fato
apenas agrava a repelibilidade da sentença, contra a qual há duas ações: a de nulidade, por pretender estender-se
a quem não foi citado, e a ação rescisória, que nasceu da infração do art. 942, II.

9) CITAÇÃO DE TODOS. Se, na ação de usucapião, não houve a citação edital de “todos” os interessados, ou
se nulamente foi feita, pois não pode o juiz saber quais são, pode não haver contestação, e não se há de ter o
silêncio como justificativa para o juiz julgar procedente, de imediato, a ação (Código de Processo Civil, arts. 319
e 330). Tal sentença é nula.
A citação de outro cônjuge só se dispensa, como meeiro, se já foi dissolvida a sociedade conjugal e nenhum
direito tem sobre o bem cuja propriedade articula o outro que adquiriu.
Não há citação do cônjuge que teria de assentir se já houve desquite ou divórcio. Se o cônjuge está separado,
somente de fato, e é meeiro, tem de ser citado para que se insira, como parte, na relação jurídica processual. Se o
cônjuge está separado, somente de fato, e não é meeiro, tem de ser citado para que assinta, isto é, preste
assentimento a lide do outro cônjuge a propósito de propriedade imobiliária.
Os sujeitos passivos, na relação jurídica processual, em que se pede declaração de aquisição por usucapião, são
quaisquer interessados: os que se consideram donos, os possuidores, os titulares de direitos reais ou de
constrições cautelares sobre o bem, os que são feridos pela declaração nos termos em que se quer quanto à
extensão do bem, os compossuidores, e qualquer pessoa, que tenha interesse em se não declarar a propriedade. O
direito real tem sujeito passivo total. A diferença entre a concepção do direito material e a do direito pré-
processual está em que todos são sujeitos passivos, na relação de direito material; ao passo que o Estado somente
admite que litigue (aí, conteste) quem tinha interesse legitimo (Código Civil, art. 76; Código de Processo Civil,
arts. 3•O e 4.0). Daí a citação ser a todos os interessados. Há necessidade da citação edital porque, sem ela, a
sentença declaratória só teria eficácia entre as partes, e não bastaria para se permitir a transcrição, que é,
exatamente, para a eficácia perante todos, aí interessados ou não .
Na ação de usucapião, se a publicação não se faz no órgão oficial, e no jornal local, se o há, e o réu citando não
compareceu (arts. 214 e § ~ 1.~ e 2.0), a citação foi nula.
A sentença também o é, porque a falta da citação, ou a nulidade da citação, não comparecendo o citando, importa
nulidade ipso jure da sentença (cf. nosso Tratado da Ação rescisória, 3.a ed., 253 e 257; 5~a ed., 453 s. e 460 s.).
Há razões para se pedir a decreta ção da nulidade da sentença, por ter sido nula a citação, no juízo em que se
proferiu a sentença, com recurso para o tribunal superior, e para se pedir a rescisão, no tribunal superior, por
violação do art. 942, II.
A citação edital, na ação de usucapião, não é acidental,por fato subjetivo ou objetivo ligado à pessoa do citando.
É pressuposto pré-processual da ação de usucapião, devido à natureza do direito de que se pede a declaração:
direito de propriedade, direito real, ou outro direito erga omnes; portanto, com sujeito passivo total.
A função do órgão do Ministério Público, quando lhe toca a matéria de menores, órfãos ou não, é a de fiscal do
processo, ou, se o incapaz não tem representante legal, ou se colidirem os interesses de um contra os do outro, a
de curador à lide, se lhe foi atribuida a representação judicial de incapazes. Se os menores têm pais, nenhuma
representação pode caber ao órgão do ministério Público a sua função seria apenas fiscal.

10)JUsTIFIcAÇÃo DA POSSE. A justificação da posse de que se fala no art. 942, 1, é para instruir a petição
inicial. Não há citação para a justificação prévia (Turma Julgadora do Tribunal de Justiça de Alagoas, 7 de
novembro de 1952, D .0. de 3 de janeiro de 1953; 1.a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, 19 de
novembro de 1952, R. dos T 207, 430).
Discute-se se o fato de ter o juiz tomado a justificação, de que se fala nos arts. 942, 1, e 943, o vincula à causa,
isto é, se a justificação é instrução que o ligue ao feito. A resposta. é negativa, porque se trata de instrução
tomada em audiência preliminar (art. 942, 1). Daí após ela vir o prazo para a contestação.
11)PLURALIDADE DE REUS E CITAÇAO. Se forem dois. ou mais os réus, o art. 241, II, é aplicável. Se
foram citados. alguns individualmente, outros por edital, o prazo tem de ser contado segundo a mesma regra
jurídica quanto aos. citados por mandado, pois o edital tem o seu prazo (artigo.232, IV).
Posto que, no art. 942, II, se fale de citação pessoal da que em cujo nome está transcrito o imóvel, ou dos
confinantes, pode acontecer que não haja a transcrição, ou se desconheça ou seja incerto quem é a pessoa cujo
nome figura na transcrição, ou quem é ou quem são os confinantes. Sempre que se sabe o nome, tem ele de
constar do edital; se não ~ se sabe, o que é necessário é que se dêem os elementos para que o citado por edital se
possa identificar. A expressão “pessoal” no art. 942, II, alude ao quod plerum que fit. Se não se pode dizer o
nome da pessoa citanda, o edital é a solução. Aliás, pode saber-se qual o nome da pessoa, ou quais os nomes das
pessoas, e ser ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontra (art. 231, II).

12) PUBLICAÇÃO. O art. 942, II, 2Y~ parte, constitui regra jurídica especial. Não é preciso fazer-se a
justificação da ausência ou do desconhecimento dos réus pela natureza da ação de usucapião, em que
freqüentemente são interessados desconhecidos ou pessoas incertas. A publicação é feita de~ acordo com a lei.
O prazo é variável, em vez de fixo.
13) PESSOA EM NOME DE QUEM ESTÁ O IMóVEL. Se em nome de alguém está transcrito o imóvel, ainda
que se discuta a transcrição e tenha havido sentença desconstituido-a, porém não passada em julgado, é
formalidade essencial a citação pessoal.
A citação pessoal daquele em cujo nome está transcrito o imóvel é exigida pela lei. Mas, advirta-se em que, se,
ex hypothesi, se sabe o nome do adquirente, pelo registro, pode ocorrer que não se saiba quem é, ou se ignore,
seja incerto, ou inacessível o lugar em que se encontra. ~, Que se poderia fazer, em tal conjuntura? A citação
edital tem de ser feita, sem que se trate de citação edital dos interessados incertos. No fundo, o art. 942, II, 1.a
parte, apenas explicita que a pessoa que consta do registro de imóveis como dono, ou titular de algum direito,
que a petição de usucapião quer que seja atingido pela sentença, é interessado certo.
A falta de citação tem como consequência a ineficácia da sentença contra a pessoa que do registro constava.
O art. 942, II, 1.~ parte, somente se refere àquele em. cujo nome esteja transcrito o imóvel; mas havemos de
entender que se devem citar todos os titulares de direitos, segundo o registro imobiliário, que teriam de ser
atingidos pela sentença. Se o autor afirma que usucapiu sem que existisse direito real limitado, tem de ser citado
quem quer que seja enfiteuta, usufrutuário, usuário, habitador, titular de direito de hipoteca ou de anticrese,
inclusive, pessoalmente ou por edital, conforme a espécie, os portadores de letras hipotecárias ou de cédulas
rurais hipotecárias.

A 5•R Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 16 de junho de 1950 (R. dos T., 188, 245), e 2.~
Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, a 16 de abril de 1952 (202, 446), disseram ser imprescindível a
juntada de certidão positiva ou negativa do registro de imóveis, sob pena de nulidade do processo. Não está na
lei. Na lei está a exigência da citação da pessoa que consta do registro (aliás, como titular de direito que a
sentença tenha de atingir).
No sentido da nulidade do processo da ação de usucapião por falta de citação da pessoa que consta, como dono,
do registro, a 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 27 de fevereiro de 1945 (R. dos T., 159,
609); com lamentável confusão entre ação de usucapião e ação Publiciana, a Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Sergipe, a 18 de junho de 1946.
Se a sentença é apresentada ao registro de imóveis e dele consta o nome de outrem como dono do imóvel, sem
que tenha sido citado na ação de usucapião, o oficial de Justiça tem de opor dúvida, pois que se trata de sentença
nula.
A ação de usucapião, sabendo-se quem figura como proprietário, no registro de imóveis, pode ser exercida
contra esse. Ação declarativa, tem força material de coisa julgada como a ação declaratória do art. 4•O• O
Código não exige que o procedimento seja edital, salvo nos casos em que haja réu a ser citado segundo a lei.
Faculta-o nos outros casos; como que o indica. Sobre os efeitos da coisa julgada material, nota 3) ao art. 941.
Note-se, pelo que aí foi dito, não se tratar de ação constitutiva, de eficácia erga omnes, ainda quando haja
procedimento edital. O edital cita, os citados são partes, de modo que a eficácia é a de coisa julgada material, só
inter partes. Ação declarativa, a de usucapião apenas oferece, a mais, o efeito mandamental, que não lhe é
essencial, pois, além das possíveis três soluções legislativas da nota 4) ao art. 941, de que antes falamos seria
imaginável a ação de cumprimento da sentença declarativa, de natureza então mandamental.
Se ocorre ter a função de parte, por ser entidade estatal o dono, ou um dos citados, o Ministério Público não
acumula as duas. Passemos ao exame do direito anterior.
O Decreto-lei n. 710, de 17 de setembro de 1938, art. 12, estatuira: “É obrigatória a citação da Diretoria do
Domínio da União em todas as ações de usucapião, bem como dos representantes do Estado, ou do Distrito
Federal, sob pena de nulidade do processo”. Discutiu-se se o Código de 1939, art. 455, derrogara o Decreto-lei n.
710, isto é, se bastaria a citação edital dos interessados. A princípio, a jurisprudêneia foi afirmativa: estaria
derrogado o art. 12. do Decreto-lei n. 710 (R. F., 89, 541; 94, 530; 95, 138); e. g., 2.~ Câmara Cível do Tribunal
de Apelação do Rio de Janeiro, 29 de fevereiro de 1944 (R. F., 98, 132), Turma Julgadora do Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Norte, 17 de fevereiro de 1943 (R. dos T., 146, 758; O D. 23, 43), Câmaras Cíveis
Reunidas do Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro, 28 de novembro de 1945. A decisão da 1.~ Turma do
Supremo Tribunal Federal, a 13 de agosto de 1945 (A.J., 77, 442, e 78, 99), exigiu a citação do Estado, em caso
de interesse manifesto. Idem, a 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 2 de janeiro
de 1946 (J., 28, 46). No Recurso extraordinário n. 8.410, a 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 20 de
setembro de 1945 (A.J., 80, 46; R. de D.A., VI, 89), decidiu não estar derrogado o art. 12 do Decreto-lei n. 710, e
assim reformou o acórdão da 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio de Janeiro. De novo, a 22 de
abril de 1946 (R.F., 107, 275). No mesmo sentido, as Câmaras Civeis Reunidas do Tribunal de Justiça de Santa
Catarina, a 30 de outubro de 1946 (J. de 1946, 207), e a 3.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo,
a 29 de agosto de 1945 (R. dos T., 158, 203). De lege ferenda, dissemos então, em tudo isso, havia lamentável
erro de ciência jurídica. A citação da Diretoria do Domínio da União, bem como dos órgãos dos Estados-
membros e do Distrito Federal, é necessária, mas a falta não induziria só nulidade, e sim ineficácia. A União, o
Estado-membro e o Distrito Federal a qualquer tempo poderiam alegar a ineficácia relativa, porque quando
foram citados nas pessoas dos seus órgãos. Não haveria, porém, nulidade do processo da ação de usucapião.
Falta de citação, aí, não era causa de nulidade: era causa de ineficácia. A respeito de quem não foi citado não
teria efeitos a sentença, pois a pessoa não entrara na relação ~ jurídica processual. De regra, citados, por edital,
os interessados desconhecidos ou incertos, entram todos na relação ~ jurídica processual. O que estabeleceu o
Decreto-lei n. 710, art. 12, foi a necessidade de ser a citação, pessoal, a determinado órgão da União, ou aos
órgãos competentes dos Estados-membros ou do Distrito Federal, a citação, nas ações de usucapião. A União, o
Estado-membro e o Distrito Federal são possivelmente, interessados: não se tem certeza. sobre isso. Poderiam ser
citados por edital, O Decreto-lei n. 710, art. 12, exigiu que, ainda quando nada se saiba do interesse da União, ou
do Estado-membro, ou do Distrito Federal, nas ações de usucapião, se faça a citação pessoal. Se é sabido ser
interessada algumas daquelas entidades estatais, a citação é em virtude dos princípios gerais, e não em virtude de
exceção ao princípio da citação edital. O art. 12 do Decreto-lei n. 710 fala de “nulidade do processo”, e houve
impropriedade de técnica: a sentença, em cujo processo teria de ser parte a União, ou o Estado-membro, ou o
Distrito Federal, o Território ou o Município e não o foi, ou em que teria de ser assistente equiparado a
litisconsorte, e não o foi, não seria nula; mas relativamente ineficaz. A entidade estatal ficaria com todas as ações
que tinha e está incólume a qualquer efeito sentencial. A sanção da nulidade seria mais grave. As leis estaduais e
a do Distrito Federal, provavelmente a lei orgânica, dizem quais os órgãos da pessoa juridica de direito
constitucional para o recebimento da citação, nas ações de usucapião. A citação de que cogitou o art. 12 ~do
Decreto-lei n. 710 nada tinha com a audiência do órgão do Ministério Público, de acordo com o art. 455, § 3,0,
do Código de 1939. Essa pode faltar, sem que haja faltado aquela; ou ter havido aquela, sem se proceder a essa.
De lege lata, o Decreto-lei n. 710, de 17 de setembro de 1938, art. 12, tornou obrigatória a citação da Diretoria
do Domínio da União em todas as ações de usucapião, sob pena de nulidade. Outrossim, a citação dos
representantes dos Estados-membros e do Distrito Federal. No § 3,0 estatui que das sentenças proferidas nas
ações de usucapião processadas até à data da entrada em vigor do decreto poderia o representante da entidade
estatal “apelar em qualquer época, ou dentro de dez dias, a contar da sua intimação por iniciativa da parte
interessada”.
Assim:a) A sentença proferida em ação de usucapião em que não foi citada a União, por um órgáo especial, que
passou a ser chamado, em virtude do Decreto-lei n. 6.871, de 15 de setembro de 1944, art. 1.0, Serviço do
Patrimônio da união, ou o órgão dos Estados-membros ou do Distrito Federal, é nula, por ser nulo todo o
processo, b) Se não houve as citações a que alude o art. 12 do Decreto n. 710, é preciso que transite em julgado,
quanto às entidades estatais, para que não possam recorrer e alegar a nulidade. c) Se houve, pode o órgáo da
entidade estatal recorrer enquanto corre o prazo, contra ela, para o trânsito em julgado.

14)UNiÃo E OUTRAS UNIDADES INTRA-ESTATAIS. Em país de vasto território, com terras ainda não
ocupadas, ou devolutas, ou de domínio do Estado, o quod plerum que fit é~ interesse do Estado nas ações de
usucapião.
No sentido de nulidade do processo da ação de usucapião por falta de citação do órgão da União, ou do Estado-
mem
bro, ou do Distrito Federal, foram a 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 5 de julho de
1943 (B . J., 37, 224), a 3•R Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 29 de agosto de 1945, e a 2.~
Câmara, a 10 de agosto de 1948 (R. dos T., 176, 602). Sem razão, a l.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 24
de abril de 1945 (D. da J., de 22 de setembro de 1945), que apenas argumentou com o fato de não ter
reproduzido o Código de Processo Civil o art. 12 do Decreto-lei n. 710, e a 2.~ Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, a 16 de maio de 1944 (R. dos T., 155, 591). A atitude da 1.a Turma foi perigosa e já
anteriormente tivera de apontar, in concreto, interesse de Estado-membro na ação de usucapião (cf. 1.a Turma,
13 de agosto de 1945, A. J., 77, 441).

A alegação da União de que o prédio lhe pertencia ou não era usucapível, por lei federal, ou em que de algum
modo ela assuma a posição jurídica de assistente ou opoente, faz da competência de juiz da capital do Estado-
membro ou do Território a ação (Constituição de 1946, art. 201, § 1.~, cf. § 2.0).

A simples citação, em virtude do art. 12 do Decreto-lei n. 710, de 17 de setembro de 1938, não desaforava a
ação.

Ad. 943. O prazo para contestar 2) a ação 1) correrá da intimação da decisão, qu~ declarar justificada a posse.
Parágrafo único. Observar-se-á o procedimento ordinário 3) 4)•

1)PRAZO PARA CONTESTAR A AÇÃO. Declarada a justificação da posse, a que se procedeu na audiência
preliminar, conforme o art. 942, 1, e quando já feita a citação, há a intimação de que cogita o art. 943, desde
quando se conta o prazo para a contestação. Observe-se que a citação
precedeu a tudo isso e sobrevém a intimação. Só então o demandado, que fora citado pessoalmente, por estar no
seu nome a transcrição do imóvel, ou por edital, se ausente, incerto ou desconhecido, tem o prazo para contestar,
se intimacio. Tem ele de atender aos arts. 300-303. O prazo é o do art. 297: de quinze dias. Se foram intimados
dois ou mais réus, o prazo e comum, salvo se, litisconsortes, tiverem diferentes procuradores, caso em que se lhes
conta em dobro o prazo (arts. 298 e 191).

A intimação de ter sido justificada a posse é dos que foram citados pessoalmente (art. 942, 1). Se houve citação
edital, embora ela valha para todos os atos do processo (artigo 942, § 1.0), pergunta-se se têm de ser intimados
por edital os que foram citados. Temos de entender que é necessário, pois só assim se justificaria ocorrer o prazo
para a contestação.

2)FALTA DE CONTESTAÇÃO PELO INTERESSADO OU PELOS INTERESSADOS. Se nenhum


interessado contesta, cumpre atender-se que a falta de comparecimento para contestar é não-exercicio da
pretensão processual ao contraditório e não de declaração de vontade pelo silêncio. Se a posse, que é o elemento
precipuo, ainda quando se tenha de exigir o pressuposto da boa-fé e do justo título, está provada, de modo
convincente, o juiz lança a sentença, em julgamento antecipado da lide, conforme o art. 330, 1 e II, e tal sentença
tem força declarativa como se tivesse havido contestação. Não há necessidade de qualquer outra diligência. Isso
não impede que, entre a expiração do prazo e a sentença, o juiz aplique o art. 130.

O juiz, se não há contestação e a posse está justificada (= nada ocorreu que bastasse para se ter por inveraz a
justificação), julga a ação de usucapião, sem outras indagações, inclusive quanto à existência de interessados (4.a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são Paulo, 22 de junho de 1950, R. dos T., 188, 685.

3)RITO PROCESSUAL ORDINÁRIO. Se a posse não foi provada antes, em justificação, ou não consta de
sentença, •ou de documentos que o juiz entenda provam, devidamente, a posse, ou se, a despeito da prova
oferecida, houve contestação, a ação prossegue com rito ordinário.
Da sentença cabe o recurso de apelação.

4)OBSERVÂNcIA DO PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. O art. 943, parágrafo único, estatui que se observará,
na ação 4e usucapião, o procedimento ordinário. Portanto, há a contestação , a exceção, ou a reconvenção, no
prazo de quinze ~dias (art. 297), mas contado da intimação da decisão que declarou justificada a posse (art. 943).
Trata-se de simples decisão sobre a justificação da posse. Os arts. 297-302 são invocáveis. Bem assim, quanto às
exceções, os arts. 304-306, quanto a incompetência, os arts. 307-311, quanto ao impedimento e a suspeição, os
arts. 312-314, e quanto à reconvenção, os arts. 315-318. Se os citados não contestam a ação, têm-se por
verdadeiros os fatos afirmados pelo autor (artigo
:319), observados os arts. 320-322. Se não há contestação, porém o juiz verifica que não houve efeito de revelia,
tem de mandar que o autor especifique as provas que pretende produzir na audiência (art. 324). Se houve
contestação que atinge o direito que foi o fundamento do pedido (e. g., o autor teria proposto a quem seria o
proprietário anterior a compra do imóvel usucapiendo), pode o autor da ação de usucapião requerer que o juiz
prof ira sentença incidental, se da declaração do direito de usucapião depende, no todo ou em parte, o julgamento
da lide (arts. 325 e 5.0). Se o réu reconhece a posse contínua do autor da ação de usucapião, mas pode opor fato
impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, este é ouvido no prazo de dez dias, facultando-lhe o
juiz a produção da prova documental (art. 326). Os arts. 327-461 incidem, conforme os pressupostos que se
componham.

Art. 944. Intervirá obrigatoriamente 1) em todos os atos do processo 2) o Ministério Público.

1)INTERVENÇAO OBRIGATóRIA. No art. 944 pós-se claro que o Ministério Público intervém
obrigatoriamente, em todos os atos do processo.
O que o Código, no art. 944, chama intervir, obrigatoriamente, nos atos do processo de ação de usucapião é
aquela função, de órgão estatal, de que tratamos sob os arts. 82, III, 83-85.
A regra jurídica da intervenção do órgão do Ministério Público no processo das ações de usucapião (art. 944) é
independente da intervenção, que haja de ser em caso de haver incapazes (art. 82, II, cf. Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Ceará, 18 de novembro de 1946, R. F., 114, 471; 2.R Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 27 de abril de 1948, R. dos T., 174, 122). É exigência ligada ao procedimento edital. Ai, é que pesa
como ratio legis, é a necessidade da tutela jurídica de todos, pois que se trata de declarar a titularidade de direito
real; e pode ter havido o atingimento pelo edital do art. 942, II.
~,Em todos os casos em que o órgão do Ministério Público não pode propor ação, a figura processual que
assume, intervindo, é semelhante à do art. 49, pela influência que o julgado tem na relação jurídica entre o Estado
e a parte ré? Aqui, não é possível dizer-se a priori se assiste ao autor, ou se assiste ao réu, porque é demasiado
privado o interesse do que obteve o registro para se supor interesse público do Estado. A expressão “fiscal da lei”
apenas evita o trabalho mental de se precisar qual a figura, e devemos riscá-la de toda exposição científica. Nem
resolve a questão falar-se de “parte pública” (!), como OTTO MAYER (Deutsches Verwaltungsrecht, 1, 3.~ ed.,
152 5.); ou de “partie jointe”, à maneira dos juristas franceses; ou de “representante de público interesse”, como
JAiVIES GOLDSCHMIDT (Das Verwaltungsstrafrecht, 537), pois o juiz às vezes o é e, não raro, a parte; ou de
pessoa que dá parecer no processo sem ser parte (unparteiischer Gutachter); ou de ônus, ao lado ou diferente do
interesse (cp. KONRAD HELLWIG, System, § 139, IV). O Ministério Público representa, aí, o Estado fora da
demanda, acima do interesse das partes, fora, portanto, de qualquer posição definida, ora do lado do réu, ora do
lado do autor, ora contra ambos, e o seu interesse é apenas ligado ao fato de ter o Estado prometido “julgar”
(entregar prestação jurisdicional) e a gravidade da espécie tê-lo posto do lado do juiz e quase à semelhança do
juiz, auxiliando-o a dar decisão “justa”. Essa função, de ajuda ao juiz mais do que às partes, se vê bem
diferenciada entre o órgão do Ministério Público nas ações de nulidade de casamento e o defensor matrimonii,
que é parte. Em tais casos, o órgão do Ministério Público nem faz afirmações (não postula), nem produz prova,
tem o dever de imparcialidade desde o início até a coisa julgada, relembrando ainda os temores de defeitos do
processo de inquisicão (ALEXANDER LOFFLER, Organisation der Justiz, 35). Não raro, escorrega para o
passado de onde veio, e dá-nos a miniatura contemporânea do “promotor inquisitionis”, depravação da missão do
Estado. No caso dessa nota, o órgão do Estado auailia o juiz a pro ferir sentença justa. Temos ensejo de apontar
outros casos no Código.

2)TODOS OS ATOS DO PROCESSO. Não se pode deixar de ouvir o Ministério Público em todos os atos do
processo, seja na primeira fase, seja em fase posterior à justificação.
Art. 945. A sentença, que julgar procedente a ação 1), será transcrita, mediante mandado, no registro de
imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais2).

1)JULGAMENTO DA AÇÃO. Ou o juiz julga improcedente a ação de usucapião, caso em que nenhum direito
resta ao autor, que o de recorrer. Se perde e se não recorre, ou se perde na via recursal, nada lhe pode caber que a
ação rescisória, se algum dos fundamentos há. Se é julgada procedente, há o recurso para a parte contrária, e,
perdido esse, ou extinto o prazo recursal, a usucapião está plenamente declarada, só se podendo supor a
possibilidade de ação rescisória.
2)TRANSITO EM JULGADO E TRANSCRIÇÃO. Trânsita em julgado a sentença de usucapião, expede-se o
mandado de transcrição. Se alguém não foi citado e também não compareceu, a sentença não transita em julgado
quanto a essa pessoa. Se houve citação edital dos “interessados” (pessoas ausentes, ignoradas ou incertas), ou a
alguém que se achava em lugar ignorado, incerto ou inacessível, e as circunstâncias não mudaram, têm de ser
intimadas da sentença por edital. Sem isso, a sentença não passa em julgado, quanto a eles. Se, a despeito de não
ter transitado em julgado, quanto a alguém, a sentença, o juiz mandou transcrevê-la, ao citad3 cabe apelar: na
apelação pode-se reformar a sentença e mandar cancelar a transcrição. Tal cancelamento somente não se pode
operar se terceiro (Código Civil, art. 530, 1), depois da transcrição, adquiriu o imóvel ao usucapiente, ou já o
adquiriu ao sucessor desse. Também os direitos reais limitados, constituídos depois, estariam incólumes. Por isso
mesmo, é aconselhável que a apelante requeira a inscrição vista pelo apelado (Código de Processo Civil, art. 518)
no registro de imóveis (Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939, artigo 178, a), VII, e art. 277), e a simples
averbação (Decreto n. 4.857, art. 281, verbis “averbando-se as decisões, recursos e seus efeitos”), para evitar
aquisições pela transcrição (Código Civil, art. 530, 1). O julgado da 3.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, a 7 de dezembro de 1950 (R. dos T., 190, 753), confundiu espécies diferentes. Não só o citado
pessoalmente tem de ser intimado da sentença;
todos os citados, por edital, ou não, têm de ser intimados. Quem foi citado não é terceiro.

CAPÍTULO VIII

DA AÇÃO DE DIVISÃO E DA DEMARCAÇÃO DE TERRAS PARTICULARES 1)-5)

1) Divisão DE TERRAS E AÇÃO DE DIVISÃO. Quando a coisa é comum e pode ser dividida, sem sacrifício
do seu destino, têm os condôminos a pretensão à divisão. Cada um deles tem a sua. Todas as pretensões
concorrem com o mesmo fim abstrato (“dividir”), que cada condômino enche com afirmações (de fato e de
direito), que podem ser diferentes. Por isso mesmo, se não acordam sobre a venda da coisa, que é, aí, partilha da
coisa pelo valor, nem sobre o discrime concreto, material, das partes indivisas, tocantes a cada um deles, surge a
ação de partilha ou de divisão, como surgiria, se a coisa fosse “indivisível” ou imprópria ao seu uso, se dividida,
a ação de venda da coisa comum. A ação divisória, actio com-muni dividundo, ou a de partilha (inter vivos),
somente cabe, no direito brasileiro, onde não cabe a de venda compulsória, e vice-versa. É verdade que podem as
partes ter combinado dividir a coisa, sacrificando-lhe o destino próprio (e. g., destruindo o palácio que lá está,
com o seu parque, para construir edifício de apartamentos ou casas para aluguel); mas, aí, a vontade das partes, o
negócio jurídico, destruiu, ante.9, o destino da coisa. Esse não é mais obstáculo à divisão. Também é possível
que a ação de divisão não se possa exercer, por ser a coisa “juridicamente indivisível”, como acontece se isso
resultou de ato de última vontade (Código Civil de 1916,art. 630) ou entre vivos (Código Civil, arts. 629,
parágrafo único e 630), ou de tombamento, ou de lei especial. Todas essas questões pertencem ao direito
material.
A indivisibilidade pode resultar de lei de proteção a monumentos históricos ou de valor artístico.
No Código de 1939, apenas se falava de “ações de divisão e demarcação de terras”. No Código de 1973,
acrescenta-se o adjetivo “particulares”. Com isso, volveu ao Decreto n. 720, de 5 de setembro de 1890. A Lei n.
3.081, de 22 de dezembro de 1956, arts. 1.O~11, regulou o processo nas ações discriminatórias de terras
públicas. No final do Capítulo VIII, de que tratamos, o art. 981 manda que se apliquem às divisões as regras
jurídicas dos arts. 952-955, concernentes às demarcações.
No Código Civil, art. 526, apenas se supõe que possa ser sem interesse para o proprietário de terreno que se
utilize o que está acima dele, ou sob ele. Mas, fora do direito civil, há regras jurídicas sobre jazidas, minas e
demais recursos minerais, e os potenciais de energia elétrica, que separam da propriedade o que convém à
exploração ou aproveitamento industrial (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, artigo 168 e ~§ 1.o~4.O).
A ação de divisão, examinada a fundo, é ação que entra na classe das ações executivas, lato sensu. O titulo, com
que se pede, é título executivo, art. 967, verbis “instruída com ~s títulos de domínio do promovente”. Na
ordinariedade dos casos, há nos arts. 967-981 iudicium duplex. Se todos pediram a divisão, apenas preferiram a
divisão “sem demanda”, em jurisdição dita voluntária, e os atos dos condôminos, que alterem a situação anterior
ou a afirmem, são negócios jurídicos de direito material processualmente tratados.
A ação de divisão, proposta por um só, ou por alguns, quando os outros não querem dividir, não é ação dúplice.
Os outros não estão a exercer a pretensão de dividir, que lhes compete. Nem se podem ter, indiferentemente,
como autor e réu. Repete-se, nos livros, que a ação é sempre dúplice, sem se atender ao que se passa no terreno
das realidades. Ação para separação das propriedades partibus indivisis, no caso do art. 959, é sempre iudicium
duplex; também o é a ação de demarcação ou divisão, quando a relação contratual entre os comuneiros se
extingue com a saída de um. A afirmativa de que há, sempre, juízo dúplice é simplismo que não olha os fatos. O
elemento condenatório às vezes aparece, mais do que o de adiudicatio. Voluntaria iurisdictio transiti in
contentiosam interventu iusti adversarii.
Os comuneiros, qualquer que seja a comunhão (de dominto, de pretensão pessoal, de direito real limitado, de
posse, ou do que for), têm obrigações de suportar a divisão, e a ação de partilha é o exercício da pretensão à
divisão e a “execução” da obrigação de suportar a divisão. Segundo, no direito material, a partilha tem efeitos ex
tune ou só ex nunc, os j uristas perturbaram-se com o que se passava no plano do direito material e foram levados
a pensar na eficácia declaratíva, ou na eficácia constitutiva, da ação de partilha. Ainda os desencaminhava a
errada concepção privatistica do processo e o fato de estarem, no direito processual, a pensar como se estivessem
no plano do direito material. Para que a ação de partilha fosse declarativa, teria de já ter havido partilha e estar-se
a declarar tal existência: não é isso o que se dá; o elemento declarativo existe, mas antes da parte típi ca da
sentença, que é p~rti7har, e tal elemento é restrito à existência da comunhão e à existência da pretensão à
partilha (cf. Código Civil de 1916, art. 630). Para que a ação de partilha fosse constitutiva, seria preciso que
houvesse outra construção, ajustável às leis, que a de se entregar e receber o partido, em troca do partívei oue
cabia a cada um dos comuneiros. Ora, a noção de constitutividade dificulta pensar -se em que não se alterou, a
de execução facilita-o. O juiz retira da esfera jurídica de B o que era de A e da esfera jurídica de A o que era de
B. Se a eficácia de direito material é ex tunc, ou ex nunc, depende desse direito, e não do direito processual. A
concepção da ação de partilha como ação constitutiva não passa de romanismo.
Qualquer dos condôminos pode pedir a divisão; e a venda da coisa comum, a despeito do se todos concordarem
em que se não venda do art. 635, § 1.~, que não há de servir para interpretação dos outros artigos do Código Civil
(cf. 1.a Câmara do Tribunal de Alçada de São Paulo, 30 de outubro de 1952, R. dos T. 208, 457: “A venda
judicial do imóvel comum não deve ser imposta, sobretudo se a parte ideal do requerente representa
insignificante minoria no condomínio e os demais condôminos não querem vender, preferindo adquirir-lhe o
quinhão”).
Há direito, pretensão e ação de divisão e de demarcação. Advirta-se que pode haver indivisibilidade, como se lei
permitisse ou exigiu que fosse indivisível o terreno que tivesse menos do que se fixou, ou mesmo se se trata, por
exemplo, de edifício de valor histórico, ou se negócio jurídico impôs a indivisibilidade. O Código Civil de 1916
teve de fixar prazo máximo para isso e para a própria prorrogação (arts. 630 e 629, parágrafo único). Durante
esse tempo, o que os condôminos ou compossuidores podem fazer, se é do interesse deles, éentrar em acordo
quanto ao uso e à fruição. Dir-se-á que com isso se prejudica algum dos comuneiros, ou alguns deles. Mas passa
à frente a vontade do doador ou do testador, que estabeleceu a indivisibilidade temporária, como o poderia fazer
a lei.
O princípio de ser juridicamente divisível, de regra, o bem imóvel, ou móvel, assenta em que têm de passar à
frente os interesses de cada comuneiro, principalmente porque podem advir divergências e conflitos. Quanto à
demarcação, não ocorre o mesmo, porque se supõe a pluralidade de objetos, de bens imóveis. O que se busca é o
traçar de limites, ou aviventá-los, ou corrigi-los. A ação de demarcação não é divisória; revela limites, o que
supõe nada haver de indiviso. Daí a diferença entre ela e a ação de divisão, mesmo se se trata de bem de
herança, que se teve de dividir entre os sucessores. Se o decujo deixou a A o bem a e a B o bem b, o que pode
acontecer é que A ou B ou A e B proponham a ação de demarcação, a finium regundorum. Ai, nada se há de
dividir, porque o doador ou o testador não deu coisa indivisa.
Outro ponto que se há de mencionar: o pedido de divisão pode ser parcial, bem assim o de demarcação.
Imaginemos que o terreno vai até o rio e continua depois: o comuneiro ou os comuneiros pedem a divisão do
terreno que está situado à esquerda do rio. Se, em vez de comunhão, há apenas vizinhança, e as propriedades se
estendem além do rio, pode um dos vizinhos ou podem os vizinhos pedir que se proceda à demarcação até o rio,
ou só da parte que está após ela. Ali, há divisão parcial; aqui, parcial demarcação.
Tudo de que acima tratamos é apenas objetivo. Se A e B são donos do terreno que vai até outro terreno que só
éde A, pode A ou podem A e B pedir a divisão do terreno em comunhão e a demarcação dos dois terrenos
limítrofes, pois que um é bem comum e o outro não o é. ~ possível que a demarcação seja concernente ao terreno
que era comum e ao que era só de um dos dois, ou a demarcação tenha de atingir terrenos vizinhos do terreno
dividido e do outro terreno, de modo que os sujeitos ativos ou passivos sejam os que foram partes na ação de
divisão e vizinhos deles.
A divisão e a demarcação podem não ser objeto de processo contencioso. O assunto do Capítulo VIII é restrito à
ação que se propõe. No litígio, o autor pode ser um só dos comuneiros ou dos vizinhos; na divisão e na
demarcação amigável, todos os interessados são figurantes do negócio jurídico. Ai, em vez de se ter litigiosidade,
tem-se apenas negociação. Com isso, evitam-se despesas e, talvez mesmo, longa demora. Ou eles escolhem o
arbitrador ou os arbitradores e o agrimensor ou os agrimensores, ou eles mesmos determinam
o traçado para a demarcação, ou acordam quanto às operações de divisão, sem que precisem de proceder a
avaliação de terras, ou outras medidas. A planta é que é essencial, com a descrição das linhas divisórias dos
quinhões, com a menção dos confinantes, e pode ocorrer que se precise de referência a benfeitorias e culturas do
próprio quinhoeiro e das que lhe foram atribuidas (com adjudicação por serem comuns, ou mediante
compensação). No negócio jurídico pode constar a instituição de servidões. O negócio jurídico tem de observar
as regras jurídicas sobre forma, mesmo se se trata de simples confirmação das linhas divisórias ou confinantes. A
referência à posse não basta à declaração da propriedade, posto que possa ocorrer que já se cogitou de usucapião.
Os tapumes existentes podem não corresponder aos limites, mas podem ser objeto de negócio jurídico que lhes
atribua tal eficácia. Se acontece que um dos interessados estabelece os traços lindeiros, isso não afasta a ação de
divisão ou a de demarcação, razão por que, para se preexcluir a acionabilidade, só se tem a solução pelo negócio
jurídico. Se a divisão ou a demarcação amigável foi por escritura pública, tem-se de levar ao registro para a sua
eficácia. Se por escritura particular, é necessária a homologação judicial.
O negócio jurídico pode ser de divisão e de demarcação. Se há pluralidade de interessados, todos têm de ser
figurantes. Se há incapacidade de algum deles, tem de ser judicial a demarcação ou a divisão, caso em que há de
intervir o Ministério Público (art. 82, 1), cabendo ao autor da ação pedir a sua intimação (art. 84). Óbvio é que,
para que figure o incapaz, é preciso que se satisfaçam todas as exigências de direito material e processual.
A sentença do juiz da acão de divisão ou de demarcação, mesmo se simplesmente homologatória, é suscetível,
após a coisa julgada, de ser rescindida. Quanto à sua eficácia preponderante, cumpre que se não caia no erro de
se dizer que ambas as sentenças, a de divisão e a de demarcação, são declarativas. A ação de demarcação tem
duas fases: a í.a, fora o item de acordo, tem 5 de declaratividade, 3 de constitutividade, 4 de condenatoriedade, 2
de mandamentalidade, 1 de executividade; a 2.~-, 4 de declaratividade, 2 de constitutividade, 1 de
condenatoriedade, 3 de mandamentalidade e 5 de executividade (cf. nosso Tratado das Ações, 1, 77, 185-209). A
ação de divisão é executiva: 5 de executividade, 4 de declaratividade (eventualmente menos), 3 de
constitutividade (eventualmente menos), 1 de condenatoriedade (eventualmente mais), 2 de mandamentabilidade.
Sobre o assunto, Tratado das Ações, Tomo VII. A ação de partilha também éexecutiva, assunto que teremos de
versar sob os artigos1. 022-1. 030.

2)DEMARCAÇÃO E AÇAO DE DEMARCAÇÃO . A ação de demarcação, aetio jinium regundorum, possui


elemento executivo e elemento constitutivo, assaz fortes, razão por que alguns escritores pensavam tratar-se de
ação constitutiva (e. g., RUDOLF POLLAK, System, 1025), como sustenta a maior parte dos juristas, lendo o
direito de hoje através de óculos romanizantes; e não de ação executiva (e. g., RUDOLF Soww Instituttonen,
16Y~ ed., 416, nota). Adiante, nota 2) ao artigo 946. A pretensão dirige-se no sentido de se dizerem quais os
limites, na acepção técnica, restrita, não só de se declarein, como aconteceria em pura ação declaratória (artigo
4:9. O art. 570 do Código Civil, que corresponde, em parte, ao ~ 920 do Código Civil alemão, de modo nenhum
ini~e de pensar-se em ação executiva. Pelo menos, dir-se-á não é fundamental que haja certeza objetiva e
somente desconhecimento (incerteza subjetiva). O argumento é falho; porque se supõe isso sempre, e a partilha
da área cujo título não se pode apurar é só expediente, expediente que serve à “execução”.
Nem, ainda, havemos de concebê-la como ação divisória. No próprio direito romano, a ação de demarcação
somente era divisória, se, faltando prova de domínio, quanto a alguma parte do prédio, essa se tinha de dividir
como se fosse comum (G. F. PUCHTA, Pandekten, § § 374, 557 e 558, “Por esse último resultado possível, é
ação divisória a de demarcação”). hoje, de modo nenhum é ação divisória (RUDOLPH SOHM, In~stitutionem,
16.a ed., 416 e 564). A declaratividade (no sentido do direito material) absorveu qualquer outro elemento
histórico.

(1)Lendo-se os juristas romanos, vê-se que as formas praeiudiciales e as em que havia adiudicatio omitiam a
condemnatio, em casos em que, perante a ciência de hoje, seria sem razão de ser tal omissão, e em casos em que
se menosprezava o elemento condenatório. Compreende-se bem que se não inserisse a condemnatio nas
controvérsias praeiudiciales, correspondentes a ações declarativas tipicasi (e. g., quando se discutia se “aliquis
libertus sít”, cf. GAIO, IV, 44). Tudo, ai, concernia, e tudo, ai, se limitava, à questão de existência, evidente na
fórmula: “An Numerius Negidius Libertus Auli Ageri sit” (LEOPOLD WENGER, Institutionen, 133).
Ações havia em que predominava, ou (quase) só estava a adiudicatio, de modo que se não aludia à condemnatio.
Também ai os juristas romanos negligenciavam a respeito do que lhes parecia negligenciável. GAIO (IV, 42)
definia a adiudicatio como aquela parte da fórmula (“ea pars formulae”) que permite ao juiz adjudicar a coisa a
algum dos litigantes (“qua permittitur iudici rem alícui ex litigatoribus adiudicare”) e dava exemplos (“velut”): a
ação familiae erc~iscundae inter coheredes, a inter socios communi dividundo, a inter viemos finium
regundorum. A despeito de não haver pesquisado a natureza das ações conforme a sua eficácia, dispondo dos
nossos recursos recentes, o jurista romano atendia à preponderância, como o próprio processo formular lhe
mostrava ser a trilha a seguir-se. A condernnatio ficava a todas as outras ações, em que aparecia, como elemento
prevalecente, o ter o réu de dar, de fazer, ou de prestar.
Oelemento condenatório eventual da ação finium regundorum não bastava para que o processo formular mudasse
a fórmula, nem, no plano sistemático, a classe de tal ação.

(2) Se pomos o problema da classificação das ações de demarcação como problema de direito material, na
dicotomia constitutividade e declaratividade, que então é apenas distinção entre eficácia ex tunc e eficácia ex
nuno, a ação de demarcação é declarativa. Porém, no plano do direito processual, em que esses momentos (tuno,
nune) não exercem função discriminativa, a ação de demarcação não é constitutiva, nem, sequer, é declarativa. O
elemento executivo prepondera. Não há enunciado preponderante de existência: há cumprimento de obrigação
entre os demarcantes. Hoje, temos de atender ao que se sabe no tocante à classificação quinária das ações e das
sentenças.
Não se confundam a sentença do art. 966, que é a sentença final do processo, com a sentença do art. 958,
acolhedora da ação, de natureza prejudicial.

(3) A distinção entre a ação de reivindicação e a de demarcação tem preocupado os juristas, quando os confins ou
limites são incertos. Desde o início de qualquer exame, devemos ter em vista que a distinção entre aposição de
marcos e fixação (ou retificação) de limites está nos próprios conceitos. A ação para se aporem marcos é pessoal,
ao passo que a de fixação (ou retificação) de limites é real. No Código, a distinção tem importância em matéria
de competência, porque o art. 95 fala de ações fundadas em direito real sobre imóveis. Mas o ser concernente a
direito real nem sempre faz real a ação.
A actio finium regundorum só abrangia a fixação de limites; não havia a de avivamento de marcos.
No direito romano, a actio finium regundorum era, pois, ação mista (condemnatio ± adiudicatio). A confusão
com as ações divisórias obscureceu o problema de classificação da actio finium regundorum, até que A. Fss~a
chamou a atenção para o fato de não haver comunhão na confusio finium. Dele aos contemporâneos fez longa
estrada a explicação da ação como ação real, na qual haveria sempre controvérsia sobre a propriedade.
No Código, fala-se, globalmente, da ação de demarcação para fixação de rumos novos, ou para aviventação dos
existentes, ou se trate de limites que devam ser fixados ou se trate de limites que devam ser aviventados (art.
946): “Cabe: 1 a ação de demarcação, ao proprietário para obrigar o seu confinante a estremar os respectivos
prédios, fixando-se novos limites entre eles ou aviventando-se os já apagados”.
A doutrina, querendo aproveitar a dicotomia petitório e possessório, às vezes alude à ação de regramento de
limites, (dita de fixação de limites), como petitória, e à de aPosição de marcos (dita de aviventação) , como
possessória. Mas falta rigor científico e valor prático a essa caracterização das duas ações. A ação de fixação
parece-se com a de reivindicação e é possível que envolva pedido claro de reivindicação, o que lhe acentua a
petitoriedade; mas es se catalogamento prejugana a questão da ação de demarcação em caso de posse.
A ação de fixação de limites tem por fito eliminar dúvidas sobre limites e, pois, suprimir a confusio finium, que
existia desde muito, ou desde todo o começo, porque desde muito deixaram de existir, ou nunca existiram
marcos, ou porque foram recentemente destruidos. Ação perpétua, imprescintível, posto que a posse não
prosmícua possa dar causa a ações possessórias e à usucapião de parte, ou de todo o terreno do vizinho. Isso é
responsável pela reconvenção de reivindicação por parte do que é réu na ação de usucapião, ou pela contestação,
e pela exceção de prescrição, quando o autor da ação de fixação de limites ou de avivamento de marcos incluiu
pedido que importa reivindicação.
O Código fala de ação de fixação de limites sem proceder à cisão entre a ação de fixação que estabelece os
limites e a ação de fixação que os retifica, distinção que tem suasraízes noutra, entre a actio finium regundorum
“simplex” e a actio finiu?n regundorum “qualificata”.
A quem tem o direito de propriedade e outrem lhe invade a esfera jurídica, apossando-se do que é seu, nasce-lhe
a ação de reivindicação, porque tem o proprietário a pretensão reivindicatónia. A quem, dono de terras, precisa
de aviventar rumos apagados, ou de renovar marcos destruidos ou arruinados, nasce-lhe a ação de demarcação,
porque ao proprietário assiste a pretensão demarcatória. Na ação de demarcação, pode surgir a questão da
confusão parcial do terreno, e tem de ser resolvida como questão prévia de mérito, que se decide diante de provas
(ANTÔNIO LOPES LEITÃO, Liber utilissimus iudicibus et advocatis ad praxim de ludicio Finium
Regunclorum, 177). Porém não é a invasão que se vai apreciar, é a confusão de limite.
A afirmativa de que a demarcação é adaptação da reivindicatória tem de ser repelida, energicamente.
Historicamente, são inconfundíveis a rei vindicatio e a actio finium regundorum: se é certo que, na L. 2, § 1, D.,
finium regundorum, 10, 1, ULPIANO permitia ao juiz da demanda, quando não pudesse determinar as lindes,
dirimir a controvérsia por meio de adjudicação; mais ainda: para fazer desaparecer a obscuridade das antigas
linhas (per aliam regionem fines dirigere), adjudicar e condenar (hoc facere per adiudicationem et
condemnationem), não se pensou em rei vindicatio.
No direito material estabelece-se que, no caso de confusão, os limites, em falta de outro meio, se determinam de
conformidade com a posse; e, não se achando ela provada, o terreno contestado se reparte proporcionalmente
entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudica a um deles, mediante indenização ao
proprietário prejudicado. Também aqui não há discussão, disputa; as partes estão diante de situação que lhes cria,
e ao juiz, perplexidade. Tem de ser vencida. Apresentou-se, assim, ao legislador o problema da técnica
legislativa. No direito anterior, propendia-se para certo arbítrio judicial, não somente em caso de confusão, como
em caso de ser necessário regularizar o terreno (J.H. CORREIA TELES, Doutrina das Ações, ed. de 1918, 281).
O Código Civil de 1916 não foi até aí. Só admite a função do juiz segundo o art. 570, em caso de confusão de
limites. No § 6, 1., de off icio iudiciis, 4, 17, no caso do rio que muda constantemente o curso, para estabelecer,
duravelmente, a paz entre os vizinhos, podia ele adotar limites mais oportunos. Também até aí não foi o Código
Civil. A mudança de curso, no caso de limites arcifinais, pode ser causa de confusão de limites; porém, então, é a
confusão de limites que se faz pressuposto suficiente.
Se o pedido se refere a aviventar rumos, ou a renovar marcos destruidos ou arruinados, ou a que existe confusão
de limites, a ação a propor-se é a ação de demarcação. Se, em vez disso, o pedido atribui ao réu ter invadido o
terreno, somente a ação de reivindicação poderia aproveitar ao autor, uma vez que, no processo da ação de
demarcação, não poderia o juiz, de modo nenhum, deferir pedido de reivindicação, porque tal pedido, ex
hypothesi, não foi feito. Se, na ação reivindicatória, o juiz decide que há confusão de limites, tal juiz julgou
improcedente a reivindicação: o que lhe foi pedido pelo autor foi a reivindicação, ele não lha deu; tanto importa
acrescentar que caberia a demarcatória (o juiz da ação de demarcação poderia pensar contrariamente) quanto
dizer que caberia a ação possessória, ou ação de indenização, ou alguma ação restitutória que não fosse a de
reivindicação.

(4) Outro ponto que merece estudo é o da existência de marcos, antigos ou novos, e de precisar o autor, não de
aviventá-los, mas de retificá-los. Note-se que, aqui, não se cogita de retificar limites, porém de retificar marcos.
Não há dúvida que se deve a MILLET (Traité du Bornage, 3.~ ed., 70) ter chamado a atenção para esse conceito;
e enunciou ele que a existência de marcos, seja antiga, seja recente, é obstáculo à ação de demarcação. Essa
proposição não falha se se acusam de mudados os marcos, porque então se nega a existência regular de marcos.
O adjetivo, que lhe faltou, melhoraria o enunciado: se o autor admite a existência regular de marcos, exclui ele
mesmo a ação de demarcação. Demarcar é “assinalar, determinar e pôr marcos” (Am’ôrno DE MoRAL1~ E
SILVA, Dicionário da Língua Portuguesa, 1, 542); não se pede que se assinalem marcos onde os há, nem se
determinam onde estão determinados, nem se põem onde já estão postos.
A 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 28 de julho de 1950 (R. de D., 11, 213), e a 1.~
Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 9 de agosto de 1951 (R. F., 142, 303), julgaram que,
havendo muro em toda a extensão do lado, não cabe ação demarcatória. Da posse, sim; mas com os limites
constantes dos títulos podem não coincidir os muros, como se foi vendida área, e não unidade cercada, ou se o
muro foi feito por pessoa que não era o dono. Por exemplo: os prédios, com duas construções, estavam alugados
a B, que, para maior comodidade, ou conveniência estética, destruiu o muro que existia e levantou outro que
dividisse por igual o terreno, ou que passasse pela linha que lhe fez feição.
A certeza objetiva de limites, de que falam alguns julgados (e. g., 8.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal, 21 de setembro de 1951, R.F., 147,226), é relativa, porque é fáctica. Só existe se houve, alguma
vez, certeza subjetiva, ou ato humano de divisão, e no mundo fáctico não se operou qualquer mudança. Ainda
mais. Pode haver interesse legítimo em que se substituam marcos ou sinais existentes por outros mais
duradouros, ou em que se renove o acordo dos confinantes sobre os marcos ou sinais existentes. Por isso, andou
bem a 1.a Turma do Tribunal Federal de Recursos, a 20 de março de 1951 (D. da J. de 4 de outubro),em frisar
que, a despeito de haver marcos, se o confinante não os acha claros e precisos, e os outros, algum ou alguns
deles, entendem que sim, há controvérsia sobre a demarcação (no mesmo sentido, acertadamente a 6.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 19 de dezembro de 1952, R. dos T. 211, 323).
A reivindicatória somente é de pedir-se, cumulativamente, se algum dos confinantes sustenta que tem mais posse
do que resultaria do direito à posse, constante do titulo.

3)DivisÃo E PARTILHA DE cOISAS MóVEIS. . O Código, como a Ordenação de Execuções austriaca, omitiu
o processo da ação de divisão e da ação de partilha das coisas móveis; mas a lacuna tem de ser preenchida por
meio de interpretação da lei (RUDOLF POLLAX, System, 1023).
A qualquer dos condôminos do bem imóvel compete a ação de divisão, se o bem móvel é divisível, o que
raramente acontece. Os condôminos residentes fora do termo, se em lugar certo e sabido, não podem ser citados
por edital, porque o artigo 953 atendeu à situação do imóvel, que é onde se afora a ação de divisão, e falta a ratio
legis, em se tratando do bem móvel.
A mulher e marido, em se tratando de bem móvel comum, são partes, salvo se a respeito do bem móvel o
cônjuge, que administra, tem poder de disposição.

4)DEFEITOS E CORREÇOES NA TECNICA LEGISLATIVA. A parte do Código de 1939, sobre divisão e


demarcação, dizíamos nós (Comentários, Tomo VI, 2.a ed., 270), é, talvez, a mais infeliz de todas, pela mistura
de assunto e pela falta de método. Não há, sequer, ordem material e temporal entre os diferentes momentos das
regras jurídicas. Restringiremos, acrescentáramos, os comentários ao direito processual, sacrificado pelos
pormenores da perícia agrimensural. Por intuitos práticos, os compêndios sobre divisão e demarcação incluiam
dissertação sobre medição de terras etc.; algumas leis processuais especiais escreveram em regras jurídicas
algumas máximas de experiência. A inserção no Código não se justifica; lei processual não é manual de
agrimensura, menos ainda de agrimensura do século XIX. O Código de 1973 discriminou as duas ações, a de
demarcação, (artigos 950-966) e a de divisão (arts. 967-981).

5)COMPETÊNcIA PARA A AçAO DE DIVI5AO E A DE DEMARCAÇÃO . O art. 89, 1, do Código de


Processo Civil foi explícito ao dizer, que compete à autoridade judiciária, com exclusão de qualquer outra
“conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil”. Depois, acentua (art. 90): “A ação intentada perante
tribunal estrangeiro não induz litispendência, nem obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da
mesma causa e das que lhe são conexas”. Na Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei n. 4.657, de 4 de
setembro de 1942) o art. 12, § 1.0, estatuiu: “Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações
relativas a imóveis situados no Brasil”. Não há homologabilidade de qualquer sentença estrangeira que julgou
ação relativa a imóveis situados no Brasil. Não se pode importar qualquer eficácia, de modo que se há de propor
no Brasil qualquer ação de demarcação ou de divisão. Quanto a qualquer ação para se cumprir no Brasil qualquer
obrigação relativa a imóvel situado no Brasil, dá-se o mesmo (art. 88, 1). Tratando-se de inventário e partilha de
bens situados no Brasil, ainda que o autor da ação seja estrangeiro e tenha residido fora do território nacional (art.
89, II). Advirta-se que, diante da generalidade do art. 89, II, em comparação com o art. 89, 1, a divisão e a
demarcação de bens móveis escapa ao artigo 89, 1, porém não ao art. 89, II, que se refere a “bens situados no
Brasil”.
Quanto à competência interna, há o art. 95, em que se diz que, nas ações fundadas em direito real sobre imóvel é
competente o foro da situação da coisa, mas pode o autor optar pelo foro do domicílio ou de eleição, se o litígio
não é sobre direito de propriedade, vizinhança, servidão, posse, divisão e demarcação de terras e nunciação de
obra nova. Assim, para a ação de divisão e demarcação de terras e renovação de obra nova, também, para a ação
de divisão e demarcação de terras é sempre, e necessariamente, o foro da situação do imóvel. Se o imóvel é
situado em duas ou mais comarcas, ou em dois ou mais Estados-membros, há a regra jurídica do art. 107, que
põe frente a prevenção (arts. 106 e 219), estendendo-se a competência à totalidade do imóvel.
Se há cumulação de ações de divisão e de demarcação tem de ser processada em primeiro lugar a demarcação
total ou parcial da coisa comum, citando-se os confinantes e os comuneiros (art. 947). Mas a regra jurídica
somente concerne à ordem dos processos, e não à competência. Se há pluralidade de foros, o autor das ações
cumuladas pode escolher qualquer deles. Se um dos foros competentes o é para a parte confinante do imóvel,
mesmo se pequena a parte, surge o problema de se saber se tal foro pode ser escolhido, diante de outros que
apanham a maior parte do imóvel, e o são para a divisão. A resposta seria positiva, uma vez que houve a
cumulação, mas seria de repelir-se que o foro, que só é competente para a ação de demarcação, o seja para ação
de divisão, que nada tem com a situação do imóvel dividendo. Ai, ou se propõe a ação de demarcação e de
divisão onde há conexão do pedido (arts. 102-107 e 947), à escolha do autor, ou primeiro se pede a demarcação,
para depois, em juízo competente, se pedir a demarcação e a divisão. Não se pode dispensar a conexidade;
portanto, não se há de pedir divisão a juízo que não seria competente. Se do que vai ser dividida parte mínima é
de foro competente com as outras partes, cabe a cumulação. Se a parte a dividir-se confina com o território do
outro juízo, porém nenhuma parte do que é objeto da divisão nele se situa, de modo nenhum se pode pensar em
cumulação, porque seria fazer-se competente comarca ou Estado-membro que nunca o seria para a divisão. O
que não importaria para a exclusão seria que a situação do terreno fosse, mesmo se de centímetros, no Estado-
membro ou na comarca. Com a demarcação, sabe-se até onde vai o terreno que se pretende dividir. Se o juízo da
ação de demarcação, que foi cumulada com a de divisão, conclui que toda a linha é na fronteira, nada tendo a
comarca ou o Estado-membro com o bem imóvel em comunhão, ao proferir a sentença de demarcação, tem ele
de dizer-se incompetente para a ação de divisão. A dúvida dos interessados poderia ter consistido em ser só
confinante com o terreno da outra comarca, ou do outro Estado-membro, o terreno comum, ou ser confinante, e
em parte, na outra comarca ou no outro Estado-membro, ser situado.
Se não houve a cumulação da ação de demarcação e da ação de divisão, mas a sentença na ação de divisão atinge
interesse de algum confinante, que não foi parte na ação de divisão, cabem-lhe os embargos de terceiro. Durante
o processo da ação de divisão, quem nela é parte como comuneiro, mas tem imóveis confinantes, pode pedir a
demarcação ao juízo da ação de divisão, o que levaria à cumulação, devendo primeiro demarcar-se o imóvel
comum, ou propor, separada-mente, a ação de demarcação, o que leva a julgamento prévio. com ou sem a
cumulação advinda.
Volveremos ao assunto, sob o art. 947.

SEÇÃO 1

Das disposições gerais

Art. 946. Cabe:


1 a ação de demarcação, ao proprietário 1) para obrigar o seu confinante a estremar

os respectivos prédios, fixando-se novos limites entre eles ou aviventando-se os já apagados3);


II a ação de divisão2), ao condómino para obrigar os demais consortes, a partilhar a coisa comum4).

1) AçÃo DE DEMARCAÇÃO . A ação de demarcação do domínio somente toca ao proprietário, ao titular do


domínio. Mas os compossuidores têm ação de demarcação do terreno possuído, portanto ação de demarcação da
posse, como têm a ação de divisão da composse. Supõe tal ação existir disputa sobre limites; ora, disputa sobre
limites, entre dois possuidores, é disputa possessória, e não de demarcação da propriedade. Têm-na os que são
titulares de direito real (o enfiteuta, o usufrutuário, usuário, o habitador, o credor anticrético, o titular da
servidão), sendo litisconsorte necessário o proprietário. Tem-na o possuidor, mas somente a ação de demarcação
da posse, contra o possuidor, ou contra o proprietário do prédio confinante (sem razão, a Corte de Apelação do
Paraná, a 30 de abril de 1935, Paraná J., 21, 473). Inicia-se a ação de demarcação, sempre, com a prova da
vizinhança. O título na ordinariedade dos casos, é o da propriedade. No caso da posse o instrumento, do negócio
jurídico, ou a justificação prévia, ou alguma sentença passada em julgado. A ação não é constitutiva, com
eventuais e acentuados elementos de declaratividade e de condenatoriedade (RUDOLF POLLAX, System, 1025);
seria declarativa, com elementos de condenação e constituição, mas, na fase final, vê-se bem que é
predominantemente executiva.
Pode dar-se que haja instrumento de negócio jurídico em que se tenham os limites de cada posse, em se tratando,
por exemplo, de lotes do mesmo terreno, de que tenham sido transferidas as posses a diferentes pessoas. Então, é
tal titulo suficiente para se instruir a petição de demarcação possessória. O mesmo acontece se há posses divisas
do terreno que, no plano da propriedade, seria uno, e talvez indivisível. Também a divisão amigável é base para o
julgamento.
As ações de divisão e de demarcação são cumuláveis (artigo 947), mas a cumulação é apenas facultativa (Turma
Julgadora do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, 6 de maio de 1949 e 9 de março de 1950; 2.~ Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Paraná, 13 de dezembro de 1951, Paraná J., 55, 451). As duas fases não podem ser
confundidas, razão por que, concluída a demarcação, os que não têm direitos sobre a área a ser dividida são
estranhos à relação jurídica processual, no tocante à ação de divisão (cf. 3.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul, 21 de setembro de 1951, R.F., 143, 346). Trata-se de cumulação objetiva, em que os
figurantes podem não ser os mesmos.

(a)Eventualmente, podem exercê-la o inventariante (FRANZ HOENIGEE, Die Grenzstreitigkeitefl, 951) e o


administrador de massas. Condômino pro indiviso não pode requerer demarcação contra os outros (Tribunal de
Justiça de São Paulo, 26 de novembro de 1918, R. dos T., 28, 100); mas pode citá-los como litisconsortes, pois
que o são necessários (artigo 47). O juiz mesmo deve ordenar que o autor promova a citação (art. 47, parágrafo
único). Para propor a ação, o condômino não precisa de mandato dos outros (errado, o Tribu~ nal de Justica de
São Paulo, 13 de agosto de 1926, R. dos T., 59, 345).
O que acima se disse tem toda invocabilidade se está em causa demarcação entre compossuidores pro diviso.

(b) O que prescreve é a pretensão; porque, prescrevendo, ela se torna sem eficácia, perde a sua executabilidade (li
ENNEcCERUS, Das Biirgerliche Recht, 1, 229; EDUAXD HÓLDER, Kommentar, 409; RUDOLF
LEONHAIRD, Der AU gemeine Teu, 225). A “ação” diz-se que prescreve, porque com a prescriçáo da
pretensão, se torna inexercível, a ação. Daí a confusão; aliás, só em casos especialíssimos suscita dúvidas e con
duz a erros. No direito contemporâneo, a prescrição é de direito material. Encobre a eficácia da pretensão de
direito material. Quando o direito assegurou a toda pretensão, ação que a faça valer (principio da coextensividade
entre pretensão e ação), tornou de menor importância prática a distincão entre pretensão e ação; mas ela existe, e
aparece a cada momento em que se têm de resolver certas dificuldades de construção.
A pretensão à demarcação é ligada à violação continuativa, algo como linha no tempo, em vez de corte; à
semelhança das pretensões de status. Daí não ser prescritivel. Se o confinante adquire a propriedade da orla do
terreno, 011 grande parte, ou todo o terreno vizinho, é outra questão.

A pretensão à partilha, à divisão, também o é. A razão, porém, é outra. Não se exaure em fazer ou em omitir dos
réus; apenas concerne ao ato unilateral volitivo daquele que deseja pôr termo à comunhão.

No Código de 1939, o art. 415, referia-se à legitimação em ação de demarcação “ao proprietário ou condômino
de um prédio contra os possuidores do prédio confinante, para a fixação dos rumos novos ou aviventação dos
existentes”. Na redação fora infeliz, porque só aludia à propriedade, tratando-se de legitimação ativa, e só à
posse, no tocante à legitimação passiva. Mesmo se a lei apenas se refere à propriedade, no que concerne quer à
legitimação ativa quer à legitimação passiva, não se pode retirar aos possuidores e a outros titulares de direitos
reais sobre imóveis o que se estatui quanto ao proprietário. O Código de 1973, no art. 946, 1, não falou de
possuidores, nem no art. 946, ao cogitar da ação de divisão. Mas o sistema jurídico não pode afastar a
demarcação possessória do imóvel possuído, nem a divisão em caso de composse. Se o locatário A do prédio a,
confinante com o prédio b, do locatário B, seria perturbante que se lhe vedasse exercer a ação possessória de
demarcação, ou outra ação possessória. Se, diante do interesse do locador, teria ele de figurar na causa,
fá-lo como litisconsorte, e pode dar-se que o possuidor, réu na ação de demarcação, nomeie à autoria o
proprietário, ou mesmo, se se trata de sublocação, o sublocador.
Sempre que há ação de demarcação em que autor ou réu é o proprietário, tem ele de providenciar quanto à
litisconsorciação de todas as pessoas que têm interesse comum, como o usuário, o usufrutuário e o enfiteuta. Se
no contrato de locação se diz quais são os limites do bem locado, o locatário é assistente, equiparado a
litisconsorte (art. 54), e, no caso de perda por parte do locador, tem esse de indenizar o locatário e pode haver
razão para resolução do contrato.
Na ação de demarcação entre A e B, pode acontecer que C intervenha como terceiro.
Se o bem imóvel é objeto de fideicomisso, não pode ser dispensada a presença dos dois titulares, quer como
autores quer como réus.
Pergunta-se: ~,o titular de direito real de garantia, como o credor hipotecário, pode ser considerado litisconsorte?
A resposta há de ser negativa, porém não se pode vedar ao credor hipotecário a legitimação a ser assistente no
processo (art. 50). Se advém revelia do assistido, tem de ser considerado seu gestor de negócios (art. 52,
parágrafo único). Não se vá ao ponto de dizer que o interesse do autor hipotecário não é interesse jurídico.
Qualquer fato que se altera alcança o suporte fáctico de regra jurídica, de cuja incidência resultou a relação
jurídica, é elemento de interesse jurídico.
Passemos à eficácia da sentença na ação de demarcação em que são figurantes titulares de direitos reais,
inclusive possuidores, a) Se a ação de demarcação foi só entre possuidores, portanto ação possessória de
demarcação, sem que figurassem proprietário ou outros titulares de direitos reais, a eficácia sentencial restringe-
se aos possuidores que nela estiveram. Não podem ir atê às propriedades. b) Se a ação de demarcação foi entre
proprietários com posse própria e nela não foram presentes nem intervieram possuidores que a receberam dos
figurantes da ação a posse imediata ou a mediata não-própria, recebem ou sofrem esses as consequências da
sentença trânsita em julgado, e a situação jurídica deles, diante do proprietário ou proprietários figurantes,
depende da relação jurídica entre possuidor e proprietário ou possuidores e propretários. c) Se a ação de
demarcação foi entre proprietário ou proprietários de um imóvel e o possuidor próprio ou os possuidores próprios
de outro, a eficácia não se estende ao proprietário ou aos proprietários sem posse própria, pois é possível que
tenham o que alegar e provar contra o confinante ou os confinantes, baseando-se nos seus títulos. A situacão
entre o titular ou os titulares de direito dominial e os que têm ou dizem ter posse própria nada têm com a situação
entre os figurantes da ação de demarcação.

Temos de advertir que podem ocorrer introduções na relação jurídica processual, com litisconsórcio, assistência
(arts. 50-55), oposição (arús. 56-61), nomeação à autoria (arts. 62-69), denunciação da lide (arts. 70-76). Então,
as situações são diferentes das que antes apontamos, ao termos de referir apenas a estraneidade de terceiros ao
processo.

2)AçÃo DE DIVISÃO . A ação de divisão do “bem” imóvel, isto é, da divisão da propriedade imóvel, claro que
somente compete ao proprietário. Mas onde quer que haja comunhão, ainda sem ser condomínio, pode haver
pretensão à divisão, se essa é praticável. Dois ou mais co-usufrutuários têm-na, se não há proibição de partir,
nem a divisão mudaria o destino da coisa; ou se a mudança naturalmente operada obriga à divisão para não se dar
a extinção do usufruto. Sempre que a comunhão é em elemento da propriedade e divisível o bem, a ação de
divisão pode ser proposta. Quanto à enfiteuse, o senhorio é interessado na causa, como litisconsorte necessário
(Código Civil, art. 681).
~, Pode o possuidor pedir a divisão da posse em comum (composse)? A doutrina, com base no direito romano,
excluia a relação obrigacional no caso de comunhão da posse (cf. GusTAv RúMELIN, Die Teilung der Recht,
143). ~, Não havia, portanto, a “pretensão a dividir”, na falta da qual a ação fosse sem base? A discussão parece-
nos sem razão de ser, devido à L. 7, pr., § 1, principalmente § 2, até § 13, do Digesto, communi dividendo, 10, 3.
O compossuidor ou os com-possuidores têm (Relação de Porto Alegre, 27 de abril de 1875; Supremo Tribunal
Federal, 16 de outubro de 1915) a ação de divisão, porque lhes cabe pretensão nascida da comunhão da posse. A
divisão da posse, isto é, a passagem do estado de composse a estado de posses parciais na mesma coisa, de modo
nenhum divide a propriedade da coisa. Entre os compossuidores, os pressupostos são possessórios. Regulam-se
(FERD. KRETZ5cHMAR, Das Sachenrecht, 35; LEO RoSENBERG, Sachenrechi, 108) pelos princípios que
regem o exercício de direitos. Como se vê, nada têm com a existência de relação jurídica obrigacional os
compossuidores, em qualquer ação que surja. Há-se de adotar o rito da Seção III, para a ação do compossuidor;
por interpretação da lei, adaptando-se à espécie os textos, à semelhança do que ocorre à divisão da coisa móvel,
quando têm de ser adaptados a essa espécie.
Assim como quem se diz condômino e pede divisão tem de produzir o título da sua propriedade, para que se
saiba qual é, quantitativamente, a sua quota, o compossuidor, que pede a divisão, há de instruir com o título da
sua posse a petição, ainda que se trate de justificação com eficácia para os outros compossuidores. As
divergências de ordem possessória impedem que se proceda à divisão. Têm de ser citados todos os
compossuidores, e o art. 953 incide em se tratando de bem imóvel.
Se alguma discordância surge quanto ao tamanho das quotas, tem o interessado de intentar a ação possessória,
para que a decisão, que se profira, lhe sirva de título. Se há título e a despeito dele surgiu divergência, pode o juiz
da ação de divisão apreciá-lo, em quaestio praeiudiciazis.
Contra os terceiros, que tenham ação possessória contra os compossuidores, a sentença não há eficácia.
O que importa para se determinar qual o espaço a que corresponde o bem imóvel é a dimensão do terreno. Por
isso, há a comunhão pro diviso para os apartamentos, mas, necessariamente, as quotas que são os núcleos para
todos eles, de per si. Se um terreno tem duas construções, o que acontece, por exemplo, quando há a casa dos
donos ou do dono e a casa do empregado, ou quando há a casa do dono e a que é alugada como se alugam
quartos ou apartamentos internos, a pluralidade de habitação não divide o terreno, que é o núcleo do bem imóvel.
Se o dono do terreno, ou o possuidor, constrói outra casa, ou fecha a porta interna que servia de união nos dois ou
até três apartamentos, ou faz da janela de um deles porta de entrada e de saída, não dividiu, com isso, o terreno,
O bem imóvel continuou um só.
Para que a divisão se dê, é preciso que, se há dois ou mais proprietários, um, alguns ou todos exerçam a ação de
divisão, ou a de divisão e a de demarcação.
Existe pretensão à divisão por parte de quem é o único proprietário, o Código de Processo Civil s~i se refere à
comunhão; mas a pretensão pode ser apenas administrativa, para a averbação do desmembramento, como se dá
com a transcrição da mudança de numeração, ou da construção, ou da demolição (cf. Decreto n. 4.857, de 9 de
novembro de 1939, ari. 178, c), VII). Qualquer averbação de construção no terreno, quer tenha havido outra, quer
tenham havido outras, ou seja uma só, ou sejam duas ou mais, de modo nenhum divide o bem imóvel. Só a
averbação do desmembramento tem efeito divisório, efeito igual ao que teria a transcrição
do julgado nas ações de divisão. O desmembramento em consequência de eficácia de julgado, que se
transcreveu, ou de negócio jurídico unilateral, ou bilateral, ou plurilateral, que se averbou, divide.

3)FINALIDADE DA AÇÃO DE DEMARCAÇÃO. A ação, aí, tem por fito, simplesmente, reavivar os rumos
existentes, ou fixar os que deveriam existir. Aliás, as linhas existentes têm de ser explicitadas.
Na ação demarcatória, a ação dúplice, os figurantes, quer tenham sido os promoventes, quer tenham sido os
promovidos, são autores e réus. Se algum deles reconvém, ou se alguns deles, ou todos, reconvêm, não se apaga
a figura da ação dúplice, porque cada reconvenção é outra ação, na qual o reconvinte é o autor e o reconvindo é o
réu.
A ação de demarcação é sempre ação real, porque, mesmo quando quer demarcar imóvel algum possuidor ou
alguns possuidores, o direito é real. Se o interessado em compra pede a demarcação do terreno há de ter outorga
de poderes pelo dono ou possuidor.

4)DivisÃo E DEMARCAÇÃO PARCIAIS E DIVISÃO E DEMARCAÇÃO POR ACORDO. A divisão e a


demarcação podem ser parciais; isto é, somente quanto à parte do imóvel. Por exemplo: A e B são condôminos
do terreno que é de x metros de largura e y de frente para o fundo, mas querem apenas dividir a metade de x ou a
metade de y, para que um quarto passe a ser de cada um, pro diviso. Quanto à demarcação, do terreno de A e E é
vizinho o terreno de C, e A e B, que não têm dúvida quanto ao início do limite, pois já havia o muro, a que as
escrituras se referem, propõem ação de demarcação para que se saiba com exatidão qual a linha que vai além do
muro.

Divisão E DEMARCAÇÃO DE TERRAS PARTICULARES (ART. 947)

Também havemos de advertir que, em vez da ação de divisão ou de demarcação, ou de ambas, os condôminos ou
vizinhos prefiram entrar em acordo: exercem os direitos e as pretensões, sem precisarem das ações. Têm de
figurar no negócio jurídico todos os condôminos ou todos os confrontantes, ou aqueles e esses, com as
formalidades de direito das coisas e de direito de família. A escritura há de ser escritura pública, porque, se
particular, é necessária a homologação judicial, a que antecede o termo de ratificação. Pode acontecer que
alguma regra jurídica afaste a escritura particular, como é o caso de algum dos condôminos ou algum dos
confinantes é absoluta ou relativamente incapaz. Se todos são capazes, mas um diverge das cláusulas ou de
alguma cláusula do acordo, a divisão ou a demarcação tem de ser judicial; portanto, em ação. Dá-se o mesmo se
é interessada alguma entidade estatal (União, Estado-membro, Território, Município)

Art. 947. É licita a cumulação’) destas ações4); caso em que deverá processar-se primeiramente a demarcação
total ou parcial da coisa comum, citando-se 2) os confinantes3) e condôminos.

1)CUMULAÇÃO OBJETIVA. A cumulação dos pedidos, no caso do art. 947, não estabelece simultaneidade
processual perfeita. Na primeira fase, os confrontantes, partes do juízo demarcante, estão presentes, em frente
aos comuneiros:
ultimada a demarcação, não saem da relação jurídica processual: como que se apagam, para que a divisão se faça.
No fundo, a lei falou de superposição temporal em vez de cumulação. Menos falou de concurso do que de
percurso até certo ponto. A sentença é uma só, a duplo caráter, declarativa, quanto à demarcação, a final
executiva, e executiva,
quanto à divisão. O elemento constitutivo é mínimo; mas pode, eventualmente, espontar.
A ação de demarcação é ação reipersecutória. A ação de divisão, como a ação de partilha, também o é.
Outrossim, a, de petição de herança. Se a ação é cumulada, há duas causas de rei persecutio.
Mesmo se apenas se propôs a ação de demarcação, há reipersecutoriedade. Pode dar-se que alguma das partes
aliene ou faça gravar-se o seu bem, com a referência a limites que invadem a terra alheia. A citação basta para a
me ficacização relativa do acordo de transmissão da propriedade, ou do acordo de constituição de direito real, ou
de outro direito que atinja o bem; não, porém, para fazer ineficazes os negócios jurídicos entre o adquirente e
terceiros. Daí a necessidade da inscrição da certidão de citação, sem a qual não se estabeleceria a ineficácia erga
omnes, a pré-eliminação da fé pública.
Dá-se o mesmo a respeito da ação de divisão.

2) CITAÇÕES. As citações fazem-se de uma só vez, por se terem fundido os processos num só. Em todo caso,
como a ação de divisão permite declarações de vontade, nada obsta a que, preestabelecendo-se, por acordo dos
condômimos, que uma parte concreta seja de algum deles, com quem ficaria, assim, toda a questão dos limites,
os outros condôminos lhe deixem a defesa, dando-se a representação processual deles pelo futuro proprietário da
parte confinante. Todas as manifestações a respeito são declarações de vontade; e não afirmações. A sentença
declarativa teria efeito constitutivo, conforme o conteúdo de tal negócio jurídico, concluído em processo.

3)CONFRONTANTES E PROCESSO DElVIARCATORIO. Os confrontantes retiram-se da relação jurídica


processual, porque se exauriu o processo demarcatório. A cumulação sucessiva de ações permite que se dê essa
entrada e saída de algumas das partes, para que se proceda à divisão, onde a presença dos confinantes seria
impertinente.
Os figurantes da ação de demarcação são, de ordinário, sujeitos diferentes. Dizemos “de ordinário”, porque pode
acontecer que os terrenos a, b e c limítrofes pertençam a A e B, mas a divisão haja de ser somente quanto a c que
é de A e de B, ou até mesmo isso ocorra com b e c, ou a, b e c. O que sempre é diverso é o objeto, porque, em
qualquer das hipóteses que referimos, demarcar e dividir não é o mesmo. Na ação de divisão só os co-
proprietários são sujeitos na relação jurídica processual e a sentença não atinge o direito que
teria algum dos co-proprietários, ou alguns deles, a pedir a demarcação, por serem confrontantes do terreno
comum. Se foi proposta, antes, a ação de demarcação, tem-se de respeitar a coisa julgada. Se foram propostas a
ação de demarcação e a de divisão, em separado ou cumuladas, tem-se de atender a que o demarcar há de vir em
primeiro lugar, se o terreno a ser dividido tem de ter os limites fixados pela sentença que se profira na ação de
demarcação. Desde que se profira a sentença homologatória da demarcação (art. 966), pode (cumpre advertir-se
que a sentença é suscetível de apelação com o efeito só devolutivo) ser exigido o respeito da sentença, mesmo
antes do trânsito em julgado. Os interessados na divisão do terreno podem prosseguir na ação divisória, a
despeito de ter havido a apelação. Se, antes do julgamento do recurso na ação de demarcação, os pedidos para a
constituição dos quinhões atendem à sentença que se proferia na ação de demarcação, não há problema se o
recurso é julgado desfavoravelmente. Se o recorrente vence e, no prosseguimento da ação de divisão, ressalva o
seu recurso, havemos de entender que a sentença na ação de divisão haja subordinado a sua eficácia à
desfavorabilidade do recurso. Em todo caso, para evitar disputas, convém que o figurante com ressalva
interponha da sentença, na ação de divisão, o recurso de apelação.
Trânsita em julgado a sentença homologatória da demarcação, não há problema, quer se hajam cumulado as duas
ações, a de demarcação e a de divisão, quer só após se proponha a de divisão.
Tudo é muito diferente se os autores da ação de demarcação nada têm com a ação de divisão. Por exemplo:
confinantes A, B, C e D e somente A é co-proprietário do terreno de B.
Temos de referir dois casos que são dignos de atenção:
a) Trânsita em julgado a sentença proferida na ação de divisão, cujos limites eram tidos como inatacáveis,
confinante ou confinantes propuseram ação de demarcação contra B que recebeu o quinhão limítrofe (o outro ou
os outros quinhões não o são). Tal autor ou tais autores da ação de demarcação, diante da coisa julgada da ação
de divisão, não têm de fazer réus o dono do terreno limítrofe e os outros, que ficaram fora da matéria. Nem o
quinhoeiro demandado pode fazer do autor ou dos autores quinhoeiros litisconsortes na ação de demarcação, pois
os marcos atingidos pela ação apenas são os de seu terreno. Se algum marco dos outros terrenos é objeto da ação
de demarcação, sim. b) O quinhoeiro propõe ação demarcatória contra o seu vizinho ou os seus vizinhos. Se os
limites nada têm com os terrenos dos anteriores condôminos, todo o interesse jurídico é só seu e, se já transitou
em julgado a ação de divisão, nada podem eles pretender. Se, admitindo-
-se, um ou alguns ou todos os quinhoeiros propuseram ação rescisória da sentença homologatória (não se trata de
sentença meramente homologatória, de que cogita o art. 486), que está pendente, pode ocorrer invocação do art.
50, não cio art. 46.

4)COMPETÊNCIA PARA AS AÇÕES CUMULADAS. Uma vez que, no plano interestatal, só é competente
para as ações relativas a imóveis situados no Brasil a Justiça brasileira (art. 89, 1), não há problemas senão para
os órgãos jurisdicionais brasileiros. A situação é que, no território nacional, determina a competência. Se
acontece que o imóvel que se quer dividir ou demarcar se situa em duas ou mais comarcas, a propositura da ação
numa delas previne a jurisdição . O art. 107 estatui que, “se o imóvel se achar situado em mais de um Estado ou
comarca, determinar-se-á o foro pela prevenção, estendendo-se a competência sobre a totalidade do imóvel”.
Tem-se, porém, de atender a eventualidade de alguns casos: a) o terreno de que só se quer divisão parcial está em
duas ou mais comarcas, porém a parte dividenda apenas se situa numa comarca, e aí competente é o juízo da
situação de tal parte; b) a linha demarcatória apenas atinge parte do confinante que é situada na mesma comarca
do autor ou dos autores da ação de demarcação, razão para se não propor a ação na comarca, em que a operação
não tocaria o seu território; c) a divisão seria de parte que está nas comarcas A e B, sem que as linhas divisórias
ou os limites da parte retirada para a divisão interessassem à comarca C, e então pode haver a escolha entre o
foro de A ou o de E, não ode C.
Se o condômino do imóvel é proprietário de imóvel confinante e se cumularam as ações de divisão e de
demarcação7 é figurante nas duas ações, como se fosse a mesma pessoa. Se, ao ser feita a divisão judicialmente,
como proprietário do imóvel vizinho se considera lesado, pode opor embargos de terceiro, mas tal legitimação
ativa não lhe exclui a de atuar como figurante da ação de divisão, para evitar que se invada a sua terra.
Quanto à ação de divisão, temos de supor a) que nada há a demarcar-se, ou b) que se tem de demarcar o terreno
dividendo, o que se há de fazer antes da divisão, ou c) que só se fez a divisão e a decisão na ação de divisão
invadiu terreno limítrofe ou terrenos limítrofes. Na espécie b), tem-se de citar os confinantes, que podem ser
ofendidos nos limites do que lhes pertence, ou não foram citados e a ofensa dá ensejo aos embargos de terceiro.
Na espécie c), os confinantes não foram partes e terceiros são, a que tocam os embargos de terceiro. Quando se
propõe ação demarcatória, não se pode omitir a participação de todos os confinantes interessados na demarcação.
Quase sempre a ação de demarcação é preliminar para a ação de divisão, porque não se pode dividir sem se saber
exatamente o que se vai dividir. Julgada aquela, a pessoa que é confinante ou as pessoas que são confinantes não
mais têm de atuar na ação de divisão, porque não são partes. Por isso, se a decisão na ação de divisão desrespeita
os limites dos confinantes, esses, como tais, podem opor embargos de terceiro. Aliás, cabe-lhes a ação de
reivindicação, bem como a de indenização pecuniária.
Se o confinante foi parte na ação de divisão e na de demarcação, que foram cumuladas, não é terceiro, porque
teve de concordar ou discordar do que se passava e a falta de impugnação fez presumir-se verdadeiro o que se
estabeleceu (cf. arts. 302 e 319). Cada confinante tem de impugnar o que lhe ofende a propriedade. Se o
confinante não se manifestou contra a demarcação, em que foi parte, não pode ir contra o que apenas divide o
que cabia no terreno demarcado. Apenas pode dar-se que a divisão não obedeça ao que se acentuou na ação de
demarcação. Aí, terceiro é ele contra a decisão infringente do julgado demarcatório (cf. art. 1 . 047, 1). Tal
proprietário ofendido, se houve invasão da posse, tem a ação possessória, como tem a ação de reivindicação, se a
propriedade em si é atingida. Quanto à ação declaratória, não há óbice, mas, em todos os casos, se o confinante
foi parte nas ações cumuladas ou na de divisão, tem de usar o que foi possível para evitar o trânsito em julgado
da decisão.
Sempre que o confiante pode propor a ação de reivindicação, o pedido pode ser alternativo: ou ser-lhe restituído
o que ofendeu a linha limítrofe, ou o equivalente ao valor do que foi invadido.

Art. 948. Fixados os marcos 1) da linha de demarcação, os confinantes 4) considerar-se-ão terceiros quanto ao
processo divisório; fica-lhes, porém, ressalvado o direito de vindicarem2) os terrenos de que se julguem
despojados por invasão das linhas limítrofes constitutivas do perimetro ou a reclamarem uma indenização
pecuniária correspondente ao seu valor3) 5> ~) ~)

Art. 949. Serão citados para a ação todos os condôminos, se ainda não transitou em julgado a sentença
homologatória da divisão; e todos os quinhoeiros dos terrenos vindicados, se proposta posteríormente9).
Parágrafo único. Neste último caso, a sentença que julga procedente a ação, condenando 7) a restituir os
terrenos ou a pagar a indenização, valerá como título executivo em favor dos quinhoeiros para haverem dos
outros condôminos, que forem parte na divisão, ou de seus sucessores por título universal, na proporção que
lhes tocar, a composição pecuniária do desfalque sofrido 10) 11) 12).

1) FIxAÇÃO DOS MARCOS. Com a linha da demarcação , o processo divisório já a isso não se prende, mas,
com a fixação dos marcos, não ficam privados os confinantes da ação de vindicação do que entendem que lhes
foi tirado, ou
da ação de indenização pecuniária que corresponda ao valor do que foi retirado.
O art. 948 cogita de mais do que da hipótese de ter sido demarcado o imóvel comum e de não terem sido trazidos
à relação jurídica processual os confinantes. Trata-se de vizinhos que não foram citados, porque a ação de
demarcação, a que se cumulou a de divisão, foi apenas preparatória. Quis-se demarcar para se dividir. Se foi
invocada a í.a parte do art. 948 (“considerar-se-ão terceiros quanto ao processo divisório”), o que realmente
aconteceu foi que a ofensa ao confinante ou aos confinantes estranhos à ação divisória foi derivada da sentença
na ação de divisão, e não na sentença da ação de demarcação. Se à cumulação de ações foram citados todos os
confinantes, não são eles estranhos à ação de demarcação, e a sentença na ação de divisão que atendeu ao que
naquela fora julgado de modo nenhum ofendeu aos confinantes, partes na outra ação. Se não atendeu, sim; ao art.
948, 1.a (“os confinantes considerar-se-ão terceiros”).

2)RESTITUIÇÃO DA ÁREA INVADIDA. Dando-se invasão pelo vizinho, condômino ou não, o invadido tem
a ação do vindicação da área invadida. Se houve ação de divisão e demarcação e os autores ou réus levam além
do que lhes pertence a pretensão de ocupar, ou dividir, ou demarcar, a demanda mesma, “executiva” ali e
“executiva” aqui, pode suscitar ou pôr à mostra a ação de reivindicação ou de vindicação (de posse ou de direito
real limitado) que têm os terceiros. A espécie já era prevista pelo Decreto n. 720, de 5 de setembro de 1890, arts.
55 e 56, e por alguns Códigos estaduais, e o Código de 1939, art. 417, estendeu a regra jurídica à demarcação.
Note-se bem, no terreno técnico, a finura da solução. Hoje, Código de 1973, arts. 948 e 974. A sentença passada
em julgado não tem efeito de coisa julgada material em relação a terceiros e o bem continua a ser tratado como
todo, principalmente no que concerne a fatos
1
ocorridos antes da divisão ou da demarcação. Segundo os princípios, tal sentença não pode prejudicar a terceiros,
e está certo o Código, como estavam o Decreto n. 720 e o Código de 1939; nem se, ao partirem ou demarcarem o
fundo, os condôminos entregam a um só dos comuneiros os frutos comuns anteriores à sentença de divisão ou de
demarcação. Mas, porque a sentença divisória é em ação executiva, lato sensu, e da demarcação também o é,
entende a lei que se há de levar em conta a nova situação entre os quinhoeiros, quanto à legitimação processual
passiva. Se o citado ou os citados têm o direito de ir contra os demais quinhoeiros é questão estranha ao art. 949,
porque se trata de eficácia da sentença entre eles, e não quanto a terceiros. Aliás, quem quer que discuta a
acessão ou outra aquisição da propriedade com o dono do prédio vizinho tem de pedir que se cite o dono atual da
parte do prédio, e não os antigos condôminos. (A afirmação de alguns comentadores do Código de 1939, de que
o então art. 417 era ofensivo ao princípio de direito sobre a coisa julgada, orça pelo completo desconhecimento
do instituto e da natureza da ação de demarcação.)

3)CONFINANTES TERCEIROS E OPOENTES, NA AÇAO DE DivisÃo. Confinantes terceiros, entenda-se, e


não os confinantes que são partes na ação de demarcação; ou opoentes, na ação de divisão. Contra esses, há o
efeito de condenação da sentença, ou o efeito constitutivo da sentença executiva lato sensu, de modo que a
reivindicação mesma está prejudicada. Explícito fora o Decreto n. 720, art. 55, ao dizer que os confrontantes do
imóvel comum são estranhos ao juízo divisório. O legislador do Código de 1973, art. 948, como do Código de
1939, art. 417, viu que o mesmo se poderia passar na ação de demarcação entre A, B e C contra D (confinante),
quando invadisse terreno de E ou de E e F. É a essa espécie, a E e F, ou somente E, que se refere o art. 948, ver-
bis “os confinantes”.
4)INVASÃO DE ÁREA DOS CONFINANTES. O Código se preocupou com o problema técnico, se houve
cumulação (art. 947) de constar da sentença sobre a demarcação, a invasão da área dos confinantes. A solução,
que deu a isso, tinha de restringir-se a ter ou não ter eficácia da coisa julgada a sentença que executou a
pretensão de constituir a demarcação. Se houve invasão, e não consta das linhas que aparecem na sentença, o art.
948 nenhuma aplicação tem. Dizer-se, por exemplo, que a ação de vindicação da área, invadida pelo prédio
vizinho, somente pode ser intentada antes da coisa julgada, é puro absurdo. O art. 948 regula a propositura
quando tenha havido a sentença, e não cerceia a propositura da reivindicatória antes, nem a propositura posterior
por invasão que não foi oriunda da demarcação. Nem exclui, ainda, os embargos do terceiro contra mandados
expedidos durante essa ação executiva.

Os que são partes no processo de divisão podem e estão sujeitos à executividade da divisão, após a declaração
dos quinhões ou das extensões. Pode ocorrer que a divisão lhes ofenda a posse, ou encontre posse própria, que
ofenda a sua posse; então, a ação que tem de intentar é a ação possessória ou a de reivindicação.
Se, ao proceder-se à divisão ou à demarcação, se penetra em terreno de terceiro, ou se lhe ofende algum direito
real, cabem embargos de terceiro, ou ação possessória, ou reivindicatória, que há de ser proposta contra os
figurantes ou contra aqueles a quem coube a parte do terceiro em que se deu a ofensa. É isso o que havemos de
entender: a ação de divisão ou de demarcação é inter alios, no que possa atingir terceiros.

O art. 948 cogita de marcos da linha de demarcação de confinantes. Supõe ter isso ocorrido; e, mais, a divisão,
ao que eles confinantes do terreno dividido são estranhos, e não sofreram qualquer eficácia da coisa julgada da
divisão. Aí, não são partes, pois que apenas são confinantes -Se houve a sentença de divisão e transitou em
julgado (claro, que só entre as partes da ação de divisão), o confinante que sofreu usurpação tem de propor ação
contra os figurantes da ação divisória, ou apenas contra aquele a que coube a parte das terras que seriam do
confinante, se já transitou em julgado a sentença homologatória da divisão.

5) FORO. O foro é o da área reclamada. No caso de prédio a cavalo sobre a linha de dois juízos, ficando a área
reclamada de um lado e do outro o juízo da ação a que alude o art. 948, o foro é o da sentença (art. 107). Se não
houve essa sentença e o processo da divisão ou da demarcação já invade o terreno do confinante, também. Nos
casos de invasão que nada tenham com o processo de divisão e demarcação, o foro é o do art. 95.

6)PARTILHA DE BENS RECEBIDOS HEREDITARIAMENTE.

O art. 948 é aplicável às partilhas de bens recebidos causa mortis por dois ou mais sucessores.

7)CONDENAÇÃO ALTERNATIVA. A sentença é de condenação alternativa se os pedidos foram alternativos:


ou restituir, indenizando, naturalmente, dos danos sofridos; ou ser indenizado do terreno perdido. No Decreto n.
720, art. 56, parágrafo único, já assim se dispunha. Se a ação de reivindicação correu contra os condôminos, por
ter sido proposta antes de transitar em julgado a sentença da ação de divisão ou de demarcação inter alios, foram
citados todos os condôminos e a restituição pode dar-se, de modo que o prejudicado em seu quinhão ainda tem o
recurso de apelação (aí, bem incompreensivel o ser só devolutivo o efeito, art. 520, 1). Se foi proposta depois de
passar formalmente em julgado, o quinhoeiro perdente é que responde pela restituição. Num e noutro caso, o
confinante vitorioso na ação de reivindicação tem a alternativa. Ao tempo do Decreto n. 720, interpretou-se a
regra jurídica como de alternativa a favor do confrontante vitorioso, o que levou os tribunais a reputá-lo
inconstitucional. Inconstitucional era a interpretação; não a regra jurídica. Devem ser evitadas as interpretações
que sejam inconstitucionais.
No Código de 1973, o art. 948 deixou ao confinante, que se diz despojado pela invasão das linhas limítrofes, ou
pedir a vindicação do que foi invadido, ou pedir a indenização pecuniária, ou deixar ao juízo a alternatividade da
condenação.

8)CONFINANTE TERCEIRO E INEFICÁCIA SENTENCIAL RELATIVA. O confinante terceiro não precisa


alegar a nulidade do feito (sem razão, o Tribunal de Justiça de São Paulo, a 11 de outubro de 1904, S.P.J., 6,
164). É estranho, e processa a sua ação de reivindicação, sem qualquer eficácia de-coisa julgada formal ou
material contra ele.

9) LEGITIMAÇÃO PASSIVA. O art. 949 trata da legitimação passiva. Supõe-se ter havido sentença de divisão.
Se ainda não transitou em julgado a sentença de homologação da divisão, direito não há, e o terceiro, confinante,
que sofreu nos terrenos a invasão, tem de fazer que sejam citados todos os comuneiros (condôminos, diz a lei;
mas pode ser ação de divisão proposta por usufrutuários, ou outros titulares de direito real pro indiviso e
suscetível de divisão), enquanto. não transita em julgado a sentença homologatória da divisão (pois, divisão
ainda não há, no plano da eficácia de coisa julgada); ou somente a citação do comuneiro, ou dos comuneiros, a
quem coube a parte em que está incluso o terreno que o terceiro, confinante, considera seu.
Segundo o Código Civil, art. 235, II, o marido não pode, sem consentimento da mulher, qualquer que seja o
regime de bens, pleitear, como autor ou como réu, acerca de bens imóveis. No art. 242, 1, faz-se a mesma
exigência à mulher. Cf. Código de Processo Civil de 1973, art. 10, parágrafo único, 1. Assim, o cônjuge do autor
tem de ingressar com ele, e o cônjuge do réu tem de ser citado. Se o imóvel é comum, a legitimação ativa e a
passiva são de quaisquer condôminos.

10)RAZÃO DE só HAVER UMA CITAÇÃO. A eficácia da citação inicial, nas ações, assim de divisão como de
demarcação, compreende todos os atos do processo, inclusive os de execução, porque, naquelas, a sentença é
“executiva” em “ação executiva”, lato sensu, e nessas é declarativa, com eficácia “executiva”, com possível forte
peso de constitutividade. Actio iudicati para a sentença da ação de divisão seria supérflua, ali; e aqui,
desbordante, porque, se entre titulares de domínio, a decisão não resolve sobre a posse; e, se entre possuidores, a
sentença é executiva, a despeito de forte dose constitutiva.
Compare-se isso com o que dizemos sob o art. 1.027 onde o legislador, que aludisse a execução, cairia em certa
superfluidade, por parecer que precisava da ação de execução de sentença em caso de sentença de partilha
(divisória de herança).

11)CONTINUAÇÃO DA EFICÁCIA EXECUTIvA DA SENTENÇA.

Se tiver havido declaração de vontade de algum dos condôminos, ou dos confinantes, autores ou réus, e a
sentença tiver de atribuir a uma das partes porção de terra que não caberia no seu quinhão, tendo sido feito o
depósito da quantia a ser entregue como preço, a sentença não perde o caráter que tem. Se o depósito não foi
feito, ou a) a sentença tem de ser concebida como condicional, ou b) como constitutiva de negócio jurídico
condicional, ou c) como constitutiva de negócio jurídico de compra-e-venda em que o vendedor anuiu em
receber, mais tarde, o preço. A sentença não perde o seu
caráter, dissemos, porque a executividade continua; mas o elemento constitutivo, novo, exerce o seu papel.

12)EFICÁCIA RELATIVA DA SENTENÇA. O condômino ou confinante que não foi citado, nem interveio,
espontaneamente, como litisconsorte, não sofre efeitos contrários da sentença. O confinante tem apenas de ater-
se aos arts. 947 e 948. O condômino prejudicado pode pedir de novo a divisão. Entre esse condômino e esse
confinante, ambos terceiros, não existe a situação jurídica que os outros previam.
Nada obsta, a despeito da redação do art. 948, que pa. rece pôr a alternativa (ou “vindicarem” ou “reclamarem
uma indenização”) a que, na ação que propunha, o confinante, que se considera lesado, ponha à escolha pelo
demandado atender à reivindicação ou indenizar. Fala-se, ai, de vindicarem os terrenos, e não foi imprópria a
expressão. A ação de demarcação tanto pode ser exercida pelos proprietários como pelos possuidores (e . g., A, B
e C têm contrato de locação dos terrenos a, b e c, e precisam conhecer, com exatidão, as linhas dos três terrenos).
Possuidores são confinantes, como seriam os proprietários, razão por que é de toda conveniência que, na ação de
demarcação da propriedade, os proprietários façam citar os possuidores, como na ação de demarcação dos
terrenos sob posse de A, B e C serem citados os proprietários. O que pode acontecer é que o proprietário tenha
locado mais do que era seu e, com a demarcação, entre proprietários, seja prejudicado o posuidor locatário,
espécie em que pode surgir ação desse contra o locador, se os limites e as extensões não foram o que consta do
contrato de locação. Os confinantes nada têm com isso. Se A locou a alguém e, feita a demarcação, o terreno que
seria o dele teve maior largura, o contrato de locação não pode ser atingido pela demarcação, salvo se, no
contrato, os limites que foram referidos pelo locador evidenciam que não foi aquilo que o proprietário locou, a
despeito de ignorar o que possuía. Se o locatário não anui em que se aumente o valor da locação, a solução é a de
só se considerar locado o terreno que se descreveu, com os limites, no contrato de locação. Se a diferença é
pequena, não tem ação o locador nem o locatário, e o que se há de entender é que foi locado o que a sentença de
demarcação declarou.

SEÇÃO II

Da demarcação

Art. 950. Na petição inicial, instruí da 1) com os títulos da propriedade, designar--se-á o imóvel pela situação e
denominação, descrever-se-ão os limites por constituir, av~ventar ou renovar e nomear-se-ão todos os
confinantes da linha demarcanda 2)

1)INSTRUÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL. a) Diz o art. 950 que a petição inicial há de ser instruída com os
títulos de propriedade. Não se falou da ação demarcatória de posse, mas havemos de aplicar os arts. 950-966 por
analogia. A ação demarcatória de domínio é essencialmente ação dominical. A ação demarcatória de posse é
essencialmente ação ligada à posse. ~ uma das espécies de demarcatória. Entre elas estão as ações demarcatórias
de enfiteuse, de usufruto, de uso, de direito de habitação e de anticrese, e as demarcatórias de direitos pessoais
consistentes em posse, como as dos locatários que locaram o mesmo bem e acordaram em comunhão pro diviso.
Nem a po3se é elemento necessário para a demarcação dominical, nem o domínio o é para a demarcação de
posses. Nem para a demarcação, em se tratando de direitos de enfiteuse, usufruto, uso, habitação, anticrese,.
ou outros que consistam em posse de extensão. A 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 30 de outubro de
1951 (R.F., 142, 93), negou a quem não fosse proprietário a ação de demarcação. <Que fariam, na conjuntura, os
enfiteutas, os usufrutuários, os usuários, os habitadores, os anticrecistas, pro diviso, ou em discordância com os
confinantes? ~ E os com-possuidores pro diviso e os possuidores confrontantes? A referência do art. 950 a
“títulos de propriedade” é exemplificativa. A ação demarcatória de domínio é id quod pleurumque fit. Sem razão,
e. g., a 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 27 de abril de 1950 (R.F., 142, 288) e a 28 de
janeiro de 1951 (J. M., V, 508). O que é preciso éque haja título concernente a limites; há posses, com limites
constantes de título.

Na L. 4, § 9, D., jinium regundorum, 10, 1, PAULO ~ã dizia, sem qualquer dúvida: “Finium regundorum actio et
in agris vectigalibus et inter eos qui usum fructum habent vel fructuarium et dominum proprietatis vicini fundi et
inter eos qui iure pignoris possident competere potest”. A ação de demarcação, actio finium regundorum,
também pode competir a respeito de campos vectigais e entre aqueles que têm usufruto, ou entre fructuários e
dono da propriedade vizinha, e entre aqueles que possuem por direito de prenda (= direito real de garantia). O réu
pode ser o próprio dono do prédio, se o usufruto, o uso ou a habitação é só de parte do bem.
b)o bem imóvel tem de ser designado pela situação (e . g., endereço), denominação ou outros elementos úteis, de
modo que se saiba de que bem imóvel se trata.

c) Também é necessário à petição inicial que se descrevam os limites, posto que a finalidade da ação de
demarcação seja a de fixá-los, e dizer quais os que espera que se dêem como assentes (“descrever-se-ão os
limites por constituir, aviventar ou renovar”).
d) O último requisito é o da nomeação de todos os confinantes da linha demarcada, ou demarcável. A nomeação
serve às citações (arts. 952-954). Um dos elementos apontados é a descrição minuciosa dos limites que devem
ser fixados ou aviventados. Não basta dizer quais são os confrontantes (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 11 de março de 1952, R. dos T., 200, 169; 4•~ Câmara Civil, 23 de novembro de 1950, 191, 286;
1.a Câmara do Tribunal de São Paulo, 19 de dezembro de 1951, 197, 404).
É inepta a petição inicial a que falta o requisito da designação dos limites (2.a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, 18 de julho de 1950, 1.a Câmara Cível, 28 de agosto de 1950). A descrição é dos
limites, não do terreno limitado (Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justiça do Paraná, 25 de janeiro de
1952, Paraná J., 55, 459). A descrição dos limites não precisa abranger toda a área, mas apenas os limites que
devem ser fixados ou aviventados. Em todo caso, se se trata de dois prédios que antes pertenceram à mesma área,
e a dúvida somente pode ser destruída pela verificação da área de cada um, tem-se de tomar por base a antiga
área, e proceder-se à rediscriminação como se tivesse de ser feita a divisão e a demarcação. Se a confusão de
limites só se deu entre o bem pertencente ao autor e o do confinante B, não precisam ser citados confinantes a
que a sentença não poderia atingir (2.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, 22 de novembro de 1950,
R. de D.I., 11, 222).
Além da juntada dos títulos de propriedade, da indicação da situação do imóvel e da denominação, seatem, o
autor ou os autores da ação de demarcação incumbe descrever, desde logo, os limites que se hão de constituir,
aviventar, ou renovar. Pode haver dúvidas para o próprio autor ou os autores, mas, de qualquer modo, é
necessário que se descreva a linha divisória que parece a mais acertada, de acordo com os títulos. Se não a
descreve, há inépcia da petição. Se a. descreve insuficientemente ou confusamente ou com defeitos, cabe ao juiz,
se inepta propriamente não é, determinar que o autor a emende, ou a complete, no prazo do art. 284 (dez dias). Se
não o cumpre o autor, indefere a petição (art. 284, parágrafo único).
Não há óbice a que o autor trace uma linha, conforme entender ser a certa, mas admita que possa haver outra
interpretação de alguns dados da escritura pública (e .quando o texto deu duas dimensões, a da frente e a do
fundo, porém não disse se a primeira medida era a de frente ou a do fundo). Tem de precisar uma linha divisória,
que lhe parece a mais pertinente, para que a contestação e os trabalhos do agrimensor e dos arbitradores se
refiram a ela. No caso de ser preciso interpretar o título, pode o juiz desde logo manifestar-se ou deixar para a sua
sentença.
O demandado ou os demandados podem contestar o que foi posto na petição como linha divisória, ou, aceitá-lo,
isto é, não contestando, presumidamente confirmar o que foi afirmado pelo autor ou pelos autores. Pergunta-se:
~,se o demandado ou os demandados entendem que a linha sobre a qual há a dúvida do demandante ou dos
demandantes, sem ser a que foi posta na petição como os limites descritos; entende-se que houve a aceitação
presumida de que fala o art. 285? Não devemos estender até aí o alcance da presunção, porque o autor ou os
autores afirmaram outra linha, a despeito de não ser definitiva e inalterável a convicção. O juiz tem de apreciar o
caso, porque se presumem aceitas as afirmações do autor ou dos autores, e não o que duvidosa-mente
enunciaram. Depois do que se colheu do agrimensor ou dos arbitradores é que o juiz profere a sentença
homologatória da demarcação; mas, diante da incerteza do autor ou dos autores, quer tenha havido a contestação,
quer a aceitação da linha duvidosa em vez da linha descrita, tem de haver a sentença do art. 958, que determina o
traçado da linha demarcanda, e não aguardar-se a sentença do art. 966,.que é sentença homologatória. Antes de
julgar procedente a ação e determinar o traçado da linha demarcatória, o juiz examina a petição e pode ser que a)
abstraia da dúvida do autor ou dos autores, ou b) diante da aceitação da linha duvidosa pelo réu ou pelos réus,
julgue procedente a ação no que foi contestado, ou e) no que foi aceito, determinando a linha demarcanda.
A contestação pode consistir em negar-se que o autor ou os autores tenham titulo, o direito à demarcação, que
exista título mas seja nulo ou ineficaz, ou quanto a legitimação ativa do autor ou dos autores. Porém, de
ordinário, mais consiste em enunciados quanto aos limites. Se houve queixa de esbulho ou de turbação, a
contestação pode afirmar que tais atos não ocorrem, ou que a incursão no terreno contíguo foi permitida pelo
autor ou pelos autores, ou por algum ou alguns dos seus antecessores.

2)REQUISITOs DA PETIÇÃO INICIAL. Exige-se à petição inicial o que é necessário, em geral, às petições
iniciais. O art. 282 vem à frente (juízo a que se dirige, qualificação das partes pelos nomes, prenomes, estado
civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu, o fato ou os fatos e o fundamento ou os fundamentos
jurídicos do pedido, o pedido com as suas especificações, o valor da causa, a prova ou as provas com que o autor
pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados, o requerimento da citação do réu ou dos réus). Também o
pedido do rateio das despesas da demarcação. Se há litisconsortes, têm de ser mencionados para que haja as
citações. Se foram cumuladas as duas ações, a de demarcação e a de divisão, há de atender-se ao art. 950 e ao art.
967, que trata dos requisitos da petição inicial da ação de divisão, Os documentos indispensáveis à propositura da
ação de demarcação têm de acompanhar a petição inicial. Mesmo que a ação demarcatória seja para constituir a
linha 4emarcanda, tem o promovendo de expor o que lhe parece que ela seja, ou que diante dos dados tenha
como justa. Em todo caso, pode o juiz mandar que o autor complete, esclareça ou emende a petição inicial (art.
284), e, sendo desatendido, indeferi-la (art. 284, parágrafo único). Diante da descrição, o réu ou os réus elaboram
a contestação ou acolhem o pedido do autor ou dos autores. Se não há contestação, os limites e os fatos alegados
pelo autor ou pelos autores têm-se como verídicos (arts. 302 e 319) e tem de ser julgada antecipadamente a lide
(art. 330).

Art. 951. O autor pode requerer a demarcação’) com queixa de esbulho ou turbação 2), formulando também3) o
pedido de restituição do terreno invadido com os rendimentos que deu, ou a indenização dos danos pela
usurpação verificada4).

1)CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. O art. 951 permite a cumulação da alegação de esbulho ou de turbação com o
pedido de demarcação. Há, pois, dois pedidos, duas ações. Daí a diferença em relação ao art. 421 do Código de
1939, que apenas ressalvava, superficialmente, o emprego dos interditos possessórios. Hoje, ou o autor da ação
de demarcação insere o pedido de restituição, ou de indenização, ou propõe outra ação.

No Código de 1939, o art. 421 dizia que a ação de divisão ou de demarcação não impedia a propositura, por ação
direta, dos interditos possessórios. O Decreto n. 720, de 5 de outubro de 1890, art. 67, falava de se poder
“adicionar ao pedido a restituição do terreno invadido, com os rendimentos percebidos, ou a indenização dos
danos desde a indevida ocupação ”. Na interpretação do texto de 1939, mostrávamos que pode haver a
cumulação, ou a propositura de outra ação.
2) POSSEsSÓRIOS. O Decreto n. 720, art. 67, parágrafo único, dizia: “Quando o autor acionar com queixa de
turbação ou esbulho poderá adicionar ao pedido a restituição do terreno invadido, com rendimentos percebidos,
ou indenização dos danos, desde o tempo da indevida ocupação, sendo esse objeto decidido conforme os
princípios de direito sobre a boa e má-fé do possuidor”. Aí está a fonte do art. 951 do Código de 1973. Era a
cumulação com a ação possessória. O Código de 1939 apenas previa que se pedisse a posse, fora da questão de
domínio e demarcação. A ação de demarcação não é ação possessória, mas a posse é uma das questões
prejudiciais que eventualmente surgem (Código Civil de 1916, art. 570, verbis “no caso de confusão, os limites,
em falta de outro meio, se determinarão de conformidade com a posse; e, não se achando ela provada...”). Se não
~ apresentara esta questão de posse a respeito da qual se manifestou a sentença, a propositura do interdito
possessório é de atender-se. Os limites foram determinados “por outros meios” que a posse. Se a questão de
posse veio à tona, ou porque a provocaram as partes, ou porque ao juiz não é dado dizer “Non liquet” (ci. art.
126), não há qualquer obstáculo dos pontos condenatórios da sentença sobre a posse à ação possessória. A
questão do domínio e dos limites é uma; a da posse, outra. A propositura de interdito possessório não cabe: a) se
foi decidido na ação de demarcação com a cumulação a quem tocava a posse, e, por ela, como meio,
determinados os limites; b) se foi decidido não haver posse provada, e o juiz concedeu a sua sentença segundo a
parte final do art. 570 do Código Civil (“... o terreno contestado se repartirá proporcionalmente entre os prédios,
ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao proprietário
prejudicado”).
Enquanto não há julgado, na ação de demarcação como na ação de divisão, em que se tenha atendido, à regra
jurídica de direito material, nenhuma questão de domínio, ou de posse, está preexcluída. Aliás, se já foi proposta
a ação de reivindicação, ou de posse, a sentença que se há de proferir, na ação da demarcação como na de
divisão, é somente para o caso de se confirmar, na sentença que se dê na ação de reivindicação ou de posse, o
status quo.
A situação que resulta da propositura do interdito possessório é uma das seguintes: a) Durante a ação de
demarcação, como na de divisão, os figurantes não puseram obstáculo à divisão ou à demarcação, porém exerceu
u~n deles, ou exerceram alguns deles ação de reivindicação, ou ação possessória, de modo que a sentença, que se
profira na ação de divisão ou de demarcação, perde toda a eficácia no que venha colidir com as sentenças na ação
de reivindicação ou na ação possessória. b) Na ação de demarcação, os figurantes, que tenham ação de
reivindicação ou ação possessória a ser proposta, hão de explicitar a ressalva dos seus direitos, pretensões ou
ações, para que se não atribua à sua atitude assentimento ou reconhecimento de direito, pretensões ou ações dos
outros figurantes; ou desde logo têm de cumular os pedidos. São pontos dignos de atenção.

O que dissemos nada tem com os terceiros (sem razão, a 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a
19 de setembro de 1950 (R. dos T., 189, 223). Esses não são partes da ação de demarcação: são sempre livres
para a propositura das ações possessórias, ou para a oposição de terceiro, ou para os embargos de terceiro, se há
ofensa à posse ou a algum direito deles.

Se a turbação ou o esbulho ocorre após a pendência da ação de demarcação, nada impede que o ofendido exerça
a ação possessória (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de fevereiro de 1952, R. dos T.,
200, 223).

A ação demarcatória é cumulável (e já era no direito anterior) à ação possessória, por terem ambas de tomar o
curso ordinário (1.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 12 de dezembro de 1949, D. da J., de 8 de novembro
de 1950). Se não foi cumulada essa àquela, nem a questão da posse é questão prejudicial, a ação possessória
pode ser proposta (2.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 20 de outubro de 1950, D. da J., de 7 de agosto de
1952, a respeito do Código de 1939: “... se não se apresenta essa questão de posse, ensina Pontes de Miranda, o
art. 421 (do Código de 1939), é de atender-se”).
Se houve cumulação, ou a inserção da questão de posse, há litispendência. A decisão faz coisa julgada material.

3)INTELIGÊNCIA DAS REGRAS JURÍDICAS . Nos casos em que houve a cumulação, a questão prejudicial
sobre a posse faz coisa julgada material. O Código tem seu sistema (artigos 468 e 470); é a esse sistema que se
tem de consultar. O elemento da cognição, aliás, de declaração, tem esse efeito. Se a ação de demarcação foi
entre dois possuidores próprios, ou entre possuidor pleno e proprietário do outro imóvel, a sentença não prejudica
ao que reivindica ao possuidor o fundo pleno; nem a que se proferiu entre locatários ou entre um locatário e o
proprietário vizinho prejudica o locador. Nem a que se proferiu entre locatários prejudica o enfiteuta.

A força enunciativa depende dos sistemas de regras jurídicas em que a proposição declarativa se encontra. Por
isso mesmo, diante de elemento declarativo das sentenças trânsitas em julgado e das resoluções que não têm
força de coisa julgada formal, duas atitudes surgiram entre os juristas:
(a) a dos que viram nisso a prova de haver eficácia declarativa fora e essencialmente distinta da eficácia de coisa
julgada material, pois aquelas resoluções que formalmente não passam em julgado e não têm, em consequência,
força ou efeito de coisa julgada, produzem eficácia declarativa; (b) a daqueles que revidam, com energia, que
falar-se de eficácia de declaração sem a coisa julgada material seria absurdo: a eficácia de declaração seria
apenas “lógica”, e não “jurídica’~ (ENluco ALLoRIo, La Cosa giudicata ris petto ai terzi, 39). A tese e à antítese
respondamos como síntese: o sistema de regras (falamos no sentido da lógica contemporânea), em que se coloca
a declaração contida nas resoluções judiciais que não passam formalmente em julgado, não é, como supóe a
atitude (b), sistema somente lógico; portanto, a antítese (b) é falsa.
No sistema lógico em que há resoluções judiciais que transitam, formalmente, em julgado, e resoluções judiciais
que não transitam, formalmente, em julgado, há regras jurídicas que se aplicam àquelas e a essas, de modo que o
sistema é jurídico, em toda a sua abrangência. O valor da resolução judicial que não passa, formalmente, em
julgado, é mais do que lógico: é jurídico; apenas, dentro do mesmo sistema de regras jurídicas, essa resolução e
esse valor não são regidos por um grupo de regras que somente regem as resoluções judiciais que transitam em
julgado. Quando tomamos em bloco eficácia declarativa e força formal de coisa julgada (preclusão) é que
podemos falar de eficácia de coisa julgada material, O elemento declarativo, como o constitutivo, o condenatório,
o mandamental e até o executivo, que se encontra nas resoluções judiciais que não passam formal-mente em
julgado, é o mesmo que aparece em resoluções judiciais que transitam em julgado. O plus está na força formal da
coisa julgada; que há aqui e ali não há! A distinção entre resoluções judiciais que têm força de coisa julgada
formal e resoluções judiciais que não têm força de coisa julgada formal nada tem com a classificação das
resoluções judiciais em declarativas, constitutivas, condenatórias, mandamentais e executivas. Quando dissemos
que a sentença declarativa tem força de coisa julgada material, referimo-nos à resolução judicial que entra na
classe das resoluções judiciais declarativas e na subclasse das resoluções judiciais declarativas que passam,
formalmente, em julgado: assim,a eficácia de coisa julgada material depende daquela conjunção de dois
elementos de classificação em duas classificações diferentes, o trânsito formal em julgado e o elemento
declarativo.

Se a antítese (b) é falsa, não o é menos a tese (a). Do fato de haver elemento declarativo nas resoluções judiciais
que não transitam formalmente em julgado não se há de tirar que uma coisa seja elemento declarativo e que
outra, essencíalmente diferente, seja a res iudicata. A água é outra coisa que o hidrogênio, porém não
essencialmente diferente:
o hidrogênio é e está na água, como o elemento declarativo e está na coisa julgada material. Se a resolução
judicial, que não tem força formal de coisa julgada, pode ter eficácia declarativa (aliás, também pode ter eficácia
constitutiva, condenatória, mandamental, ou executiva), é porque é declarativa ou tem suficiente elemento
declarativo: falta-lhe a força formal, oriunda da preclusão, para que pudesse ter eficácia de coisa julgada
material. Temos situação bem parecida nas sentenças condenatórias ainda não passadas formalmente em julgado
e já exeqüíveis (arts. 587, 2Y parte, e 588); têm a eficácia executiva das resoluções judiciais que não passam em
julgado enquanto lhes falta a força de coisa julgada formal.

O problema é, portanto, o mesmo, quer se pense na eficácia declarativa, quer na eficácia constitutiva, ou
condenatória, ou mandamental, ou executiva das resoluções judiciais que passam formalmente em julgado e das
que não passam formalmente em julgado. O que se pretendeu ver de diferente entre a eficácia declarativa
daquelas e a dessas está na presença e na ausência da preclusão, e nunca em diferença de declaratividade.
Algumas vezes, os juristas se esforçaram por apontar eficácia declarativa além das partes e assim distinguir a
eficácia declarativa comum a sentenças trânsitas em julgado e a sentenças que não passam em jul
gado, e a eficácia de coisa julgada material; porém ficavam no terreno de especulação pura, sem apoio em fatos,
ou lamentavelmente confundiam a eficácia constitutiva, ou a mandamental, ou a executiva, com a declarativa.

Em erro igualmente grave incorreram os que tentaram separar, como sendo ambos os conceitos fundamentais da
imperatividade e da imutabilidade das resoluções judiciais. Ora caíam na confusão entre elemento mandamental
e imperatividade, ora entre elemento declarativo e imperatividade. O conceito de imperatividade, nome, aliás,
impróprio, porque já usado noutras distinções diferentes, apenas alude a que o conceito de resolução judicial se
subsume no conceito de resolução jurídica e não só lógica. Nada tem com o conceito de eficácia da resolução
judicial, porque também possuem imperatividade a resolução administrativa e a legislativa, todas as três estatais.
Nada mais perigoso do que, discutindo-se problema de eficácia das resoluções judiciais, se deslocar a disputa
para o plano da Teoria Geral do Direito, ou da Teoria Geral do Estado; cai-se, aqui, em vaguidades e
superficialidades pseudocientíficas, ou confusão de planos de conhecimentos, como ocorreria a quem não sabe
em qual andar do prédio se acha a cada momento em que observa e fala.

A eficácia de coisa julgada material produz a vedação da contradição; não é a vedação da contradição. O direito
não costuma impedir, de modo absoluto, o bis in idem contraditante; o Ne bis in iclem está no principio da coisa
julgada formal: na coisa julgada material, resulta do elemento reforçante, posterior, logicamente, da preclusão,
como a declaratividade da res inclicata resulta do elemento logicamente anterior declarativo. Tanto assim é que,
se a coisa julgada material não é alegada e não se faz valer, o segundo julgado pode vir a prevalecer, pela
preclusão da pretensão àrescisão da sentença ofensiva da coisa julgada (art. 485, IV).

A coisa julgada formal, embora só se refira à vedação de se rediscutir no mesmo processo, repercute, somando-se
à declaratividade, de modo que se produza a eficácia específica da coisa julgada material, que não é todavia
aplicação no Ne bis in idem entre processos diferentes: a exceptio rei iuclicatae apenas produz o evitamento da
contradição, sem caráter ainda assim absoluto.
Esses pontos são extremamente importantes, assim na teoria como, com razão mais forte, na prática.
A ação de demarcação é imprescritível, como o é a ação de divisão. O interesse jurídico nasce com a relação
jurídica de propriedade e persiste. Mas temos de distinguir confusão de limites, ou mesmo incerteza quanto aos
limites, e posse além dos limites. Se A é dono do terreno a, com o qual confronta o terreno b, que é de B, e não se
puseram marcos para se saber onde acaba o terreno a e onde começa o terreno b, o que se há de propor é a ação
de demarcação. Todavia, pode ter acontecido que A haja tomado posse de parte do terreno b, tendo construído
em tal extensão, ou tendo posto cerca ou muro, por entender legitima a posse própria. Se E deixa que decorra o
prazo para a usucapião e só após ele é que propõe a ação de demarcação, A pode alegar e provar que usucapiu,
se, diante do titulo de B, os limites seriam os anteriores ao apossamento e à usucapião. A ação de usucapião tem
de ser proposta, salvo se B a reconhece na ação demarcatória. Se houve a posse própria de A e não se usucapiu a
área invadida, as benfeitorias, quaisquer que sejam, não dão ensejo a se deixar de respeitar o limite
correspondente aos títulos de A e de B.
Outro problema surge: o titulo de A refere-se a extensão que invadiria o terreno de B, ou vice-versa. Tem-se de
investigar a origem do título e a ocupação dos terrenos, para se saber se o erro foi do titulo de A ou se foi do
titulo de B. Se ocorre incompatibilidade entre o titulo de A e o de B, mesmo em suas origens, a solução há de ser
a de se verificar se algum dos dois ou dos anteriores tinha posse suficiente para usucapir, ou se não tinham. Se
nenhum tinha posse imediata, tem-se de decidir pela anterioridade do registro do imóvel. Isso não afasta que se
possa propor ação contra o registro anterior se ele não corresponde àquele de que proveio. Nada disso afasta que
alguém haja usucapido, se teve a posse própria pelo tempo suficiente.
No art. 951 prevê-se que o autor da ação demarcatória tenha sofrido esbulho ou turbação. Pode ele formular dois
pedidos, o de demarcação e o de restituição do terreno invadido. Primeiro se aprecia esse, porque só se demarca
o que se sabe que mostra a sua extensão. Além de restituir, o confinante invasor tem de prestar o que
correspondeu aos rendimentos e o que indeniza os prejuízos oriundos da usurpação . É assaz relevante atender-se
ao que acima expusemos: não há prescrição da ação de demarcação, mas pode ter ocorrido esbulho, com a
tomada da posse e ter acabado o prazo para se evitar que o invasor usucapisse. Se, quando A adquiriu o terreno a
e se pós no terreno b, o antecessor ou os antecessores já tinham essa posse, ao tempo da posse do antecessor ou
dos antecessores soma-se o tempo da posse de
A.Com o total de vinte anos tem ele a usucapião, que há de ser declarada por sentença. Se houve erro, pelo
excesso, no título do antecessor ou dos antecessores de A, e as posses se sucederam, a usucapião pode ser com o
tempo de dez anos de posse, pois, aí, há titulo e boa-fé. Contra o pedido de restituição e de demarcação tem A a
alegação de usucapião, que tem de ser declarada antes de se proceder à demarcação.
Também pode ocorrer que o autor da ação de demarcação tenha usucapido alguma parte do terreno ou dos
terrenos limítrofes e já o alegue na ação de demarcação, mas, aí, estariam duas ações, devendo a de usucapião,
que é declaratória, ser iniciada antes da outra.
Se houve sentença declarativa de usucapião, que deu causa à ação de demarcação, e advém sentença favorável na
ação rescisória contra a sentença que declarou ter o autor usucapido, a sentença que proferira na ação de
usucapião, rescindida como foi, esvazia a sentença de demarcação que fora julgada com base na usucapião, e a
solução é a propor-se outra ação de demarcação.
Quando alguns juristas dizem que a ação demarcatória, se houve invasão do terreno de um dos figurantes, faz as
vezes da ação de reivindicação erram palmarmente. Ou na declaração dos limites não se teve de apreciar arguição
de usucapião e a outra parte ou as outras partes abstrairam da posse que tinham; ou, havendo a ação de
usucapião, se teve de atender ao julgado. Não há, num caso ou no outro, reivindicação. Uma vez que se
demarcou a área e ocorreu o trânsito em julgado, só a ação rescisória poderia ir contra a sentença de demarcação.

Pode dar-se que o interessado na ação de demarcação também o seja quanto à tapagem (cerca, muro, vala, tapes).
Aí, o pedido estende-se a tais obras, cujas despesas são por conta do autor ou do réu, ou dos dois, conforme as
regras de direito material (Código Civil, art. 588 e § § 1.O~5.o). São obrigados a concorrer, em partes iguais,
para as despesas de construção e conservação, os confinantes, porque se presume comuns ou tapumes (art. 588, §
1.0). Se há obrigação de cercar a propriedade, por estarem no terreno animais, com tapumes especiais, cabe
apenas a quem é proprietário ou possuidor daquilo a que se há de evitar invadir o outro terreno (art. 588, § 3.0) .
Pode o juiz admitir tal obrigação, mesmo se não se trata de animais (e. g., chafariz).

4)CUMULAÇÃO INCIDENTAL, ALEGAÇÃO E PROPOSITURA DE INTERDITOS POSSESSóRIOs.


Enquanto o Código de 1939 apenas se referia à tutela jurídica com os interditos possessorios, o~ Código de 1973
atem-se à cumulação. A regra jurídica, de iuri condendo, tinha de aludir às duas situações: à cumulação e à
superveniência de interditos possessórios, à simultaneidade sem cumulação. No texto de 1939, art. 421, havia
erro de linguagem: em vez de “propositura”, falava-se de “recurso”. Daí as críticas que fizemos, porque a
terminologia é de máxima importância para qualquer ciência. Dissemos, na 2Y~ ed. dos Comentários ao Código
de 1939 (VI, 289):
“Em vez de “recurso”, leia-se “propositura”. “Recurso” está, aí, em sentido de linguagem vulgar. (2.a Turma do
Supremo Tribunal Federal, 20 de outubro de 1950: “Não esconde PONTES DE MIRANDA os reproches que o
dispositivo desperta pelo emprego das expressões “recurso” e “ação direta”.
Como escreve PONTES DE MIRANDA, o Código prevê que se peça a posse fora da questão de divisão e
demarcação. Acenas , o preceito não é absoluto, porque a questão de posse pode surgir como prejudicial”.)
Foi essa suposição da prejudicialidade que nos levou a dar relevo ao caso de cumulação, e agora o art. 951 do
Código de 1973 a ela foi dedicado. Mas há duas hipóteses que merecem atenção, além daquelas a que nos
referimos, como a propositura do interdito possessório antes da ação de demarcação: a) a ação de reivindicação
proposta pelo confinante citado; b) a ação declaratória incidental (art. 5.0). Uma vez que, na ação de demarcação
se fez litigiosa a relação jurídica de limites, cabe a ação declarativa incidental.

Art. 952. Qualquer condômino é parte legitima para promover a demarcação do imóvel comum’), citando-se os
demais como litisconsortes2).

1)CONDÔMINO AUTOR OU CONDOMINOS AUTORES. Já dissemos o que era de mister quanto à


legitimação ativa para a ação de demarcação. Qualquer condômino, ou qualquer compossuídor, ou comuneiro
titular de direito real, pode pedir a demarcação do bem comum, e então os demais são litisconsortes O
condômino está aí como elemento essencial à demarcação, se se trata de propriedade.
Nas ações de demarcação da posse, pode acontecer que os titulares não tenham qualquer direito, real ou pessoal.
Se foi possuidor que pediu a demarcação, os outros compossuidores são litisconsortes necessários.
Discutia-se sob o Código de 1939 se um condômino, por si só, podia propor a ação de demarcação, se não lhe
deram poderes os outros condôminos, ou se o outro não lhos deu. Mas já havia o art. 623, II, do Código Civil
onde se dava a qualquer dos condôminos a ação de reivindicação; a fortiori, a de demarcação. Nem mesmo de
texto expresso se havia de precisar, pois o condômino tem os direitos que o outro ou os outros condôminos
teriam.
A ação demarcatória pode ser cumulada à de divisão, divide-se após se saber o que se vai dividir, ou ser outra
ação, anteriormente exercível, porque seria absurdo que só se pudesse propor ação de demarcação do imóvel
comum se todos os titulares concordassem. Os condôminos são litisconsortes, pela comunhão de interesses (art
88), razão por que as partes não o podem dispensar (art. 88, parágrafo único) e há a citação de todos, a ponto de,
se a parte interessada não o promove, o réu é absolvido da instância (arts. 47 e 267, IV e XI). Qualquer dos
condôminos pode ingressar, porém o litisconsórcio é necessário. Pode acontecer que o pedido de algum ou de
alguns não seja idêntico ao de outro ou de outros (e. g., A sustenta que a linha divisória é a que ele descreveu, e
B, litisconsorte, apresenta outro traçado). Aí, o réu ou os réus podem contestar a descrição de outro demandante,
ou a de outros demandantes ou as de outros demandantes, como é possível que se aceite a de um deles e não a de
outro ou as de outros. Os pedidos podem ser diferentes e não o serem as conclusões da sentença que determina a
demarcação , São tidos como litigantes distintos os condôminos litisconsorciados, e os atos e omissões de um, ou
de alguns não beneficiam nem prejudicam os outros (artigo 48). Qualquer dos condôminos pode defender o
domínio (Código Civil, art. 623, II), o litisconsórcio é necessário. Se não foi citado, pode o condômino entrar no
processo como pode propor outra ação de demarcação, pedindo a citação dos condôminos mesmo se autor ou
autores de outra ação.

2)EFIcÁcIA DA SENTENÇA NA DEMARCAÇÃO . Se algum condômino, ou compossuidor, pediu a


demarcação, e não foi citado o outro, ou não foram citados os outros, há ineficácia quanto a esse, ou a esses. Se o
imóvel é possuído em usufruto, ou outro direito real ou pessoal com posse, tem de ser citado o usufrutuário ou o
titular do direito real com posse. Se foi o usufrutuário, ou outro titular de direito real, ou pessoal com posse, que
pediu a demarcação, é necessária a citação do proprietário, ou dos proprietários em comum.
A demarcação pode ser pedida ainda se o proprietário ou o titular de domínio ou de outro direito real sobre o imó
vel não tem posse (Câmaras Civis Reunidas do Tribunal de Justiça de São Paulo, 12 de novembro de 1951, R.
dos T., 198, 356; 4•R Câmara Civil, 29 de novembro de 1951, 198, 255). Nas ações de demarcação de posse, os
titulares podem não ter qualquer direito real ou pessoal sobre o imóvel, e ter posse.
Antes do Código Civil de 1916, discutia-se se algum condômino podia pedir a demarcação das terras comuns, ou
defende-las como réu, sem ter poderes de representação outorgados pelo outro condômino ou pelos outros
condôminos. Não havia razão para isso, nem seria preciso ter surgido o art. 623, II, do Código Civil, para se dar
resposta afirmativa da legitimação. Era errado falar-se de assistência. Trata-se
de litisconsórcio necessário, pela natureza da relação jurídica , razão por que a eficácia da sentença depende da
citação de todos os condôminos ou compossuidores e tem o juiz de decidir, de modo uniforme, a lide (art. 47). Se
o proponente da ação não promoveu a citação de todos os litisconsortes necessários, tem de ordenar o juiz que
providencie e, se, dentro do prazo que assinar, não o fizer, declara extinto o processo, porque tal é a pena que
consta do art. 47, parágrafo único.

Art. 953. Os réus que residirem na comarca serão citados pessoalmente 1) 3) 4); os demais, por edital2).

1)RESIDENTES NA MESMA COMARCA E CITAÇÕES. O artigo 953, que está na Seção II dedicada à ação
de demarcação, também concerne, em virtude do art. 968, à ação de divisão, e atua como exceção ao que se
instituiu, em geral, a respeito das citações. Não se afastam as regras jurídicas gerais. Se os réus, que residem na
comarca, estão ausentes, incide o art. 215, § 1.0, ou, se ocorre algum dos casos do art. 217, tal princípio tem de
ser observado. O art. 218, com os seus §§ 1.0, 20 e 30, ~ invocável, como são invocáveis os arts. 227, 928 e §§
1.0 e ~ Pergunta-se: a despeito do que está nos arts. 953 e 968, ~,pode ser feita a citação na comarca contígua, de
fácil comunicação, estando o citando próximo das divisas respectivas, ou não se pode deixar de aplicar a regra
jurídica sobre ter de ser edital a citação? Havemos de entender que a citação de quem é residente na comarca,
mas se acha em comarca contígua e nela se encontra o citando, é a melhor solução. Em todo caso, pode o autor
preferir a citação edital, mesmo porque, em algumas circunstâncias, pode ser mais difícil observar-se o art. 230.
O art. 953 diz que os réus que residirem na comarca são citados pessoalmente. O Decreto n. 720, de 5 de
setembro de 1890, nos arts. 1..~ e 4~0, só exigia a citação pessoal se os réus eram domiciliados na comarca (“que
tivessem domicílio real na comarca onde se tratasse o feito”) . No Código de 1939, art. 418, podiam ser citados
por edital para as ações de divisão e demarcação os condôminos “residentes” fora do termo, embora em lugar
certo e sabido. Note-se a diferença:
dizia-se “poderão ser citados”; ao passo que, hoje, no artigo 953, se lê “serão citados”. Nem no Código de 1973,
nem no anterior, se alude a domicílio. Basta a residência. Se o réu não tem residência na comarca e aí se acham,
têm de ser citados, por edital. As regras jurídicas do art. 953 estendem-se aos legitimados na ação de divisão (art.
968). Assim, o art. 216 é invocável se o citando reside na comarca, não se reside fora; porque se supõe que na
comarca reside o réu, pois o oficial de justiça está a procurá-lo e cita-o “onde o encontrar” (art. 216).
O que resulta do art. 953 e do art. 968 é que se dispensou, para a citação edital, ser desconhecido ou incerto o
citando, ou ignorado incerto ou inacessível o lugar em que se encontra. O caso do art. 953 é um dos casos
expressamente indicados em lei para a citação edital. Se se sabe quem é, por ser residente na comarca e está em
lugar ignorado, incerto ou inacessível, cabe a citação edital (art. 231, 1). O art. 953, como o art. 968, dispensa a
citação por precatória ou rogatória (arts. 202-212); mas isso não afasta da hipótese de o autor ou de os autores da
ação de demarcação ou de divisão preferirem a citação mediante a carta precatória ou rogatória à citação edital.

2)CITAÇÃO EXCEPCIONAL POR EDITAL. Os pressupostos para que se admita a citação edital, no caso do
art. 953, ou no caso do art. 968, sem ser preciso que concorram as do artigo 231, são só os seguintes: a) ser de
divisão ou de demarcação a ação, que se propõe; b) ser réu o citando. A regra jurídica vem do Decreto n. 720, art.
4~o, que aliás, a concebia como direito cogente (“a primeira citação se fará creditos”, em vez do “poderá” do art.
418 do Código de 1939, com que se dava o caráter de procedimento edital, no interesse dos possuidores e
proprietários desconhecidos ou omitidos, para ser cômodo ao autor ou aos autores). O Código de 1973 volveu à
acertada solução legislativa de 1890.

3)CONDÔMINOS E 05 CONFRONTANTES. Os condôminos têm de ser citados conforme o art. 953. Os


confrontantes também (art. 968). No Código de 1939 falava-se apenas de “condôminos”.

4)FORA DA COMARCA. Fora da comarca não está, nesse passo, por fora da jurisdição territorial do juiz, que
seria menos do que “comarca”. Sob o Código de 1939, se os citandos estavam em lugar sabido, fora do termo,
isto é, noutro termo da comarca, ou fora da comarca, mas eram residentes no termo, tinha de ser requerida e
expedida a precatória (diferente era o Decreto n. 720, art. 10, que a fazia aliás sem razão, de lege ferenda
facultativa). Com o Código de 1973, deu exceção as regras jurídicas comuns quanto à citação da pessoa que não
reside na comarca: se a residência é alhures, basta o edital. Surge o problema de se saber se pode o autor preferir
a carta precatória, ou a rogatória, ou a aplicação do art. 230, a respeito de comarca contígua. Temos de dar
resposta positiva, a despeito de se tratar de citação edital por indicação legal (art. 231, III).
O Código deu à ação de demarcação, seja proposta pelo único proprietário seja por algum dos condôminos (os.
outros têm de ser litisconsortes), o procedimento especial (artigos 954-966). Dá-se o mesmo com a ação de
divisão (artigos 968, 954 e 955, 970-980). Aqui, há a citação dos outros condôminos (art. 958) se só um ou
alguns assinaram a petição inicial. Se todos assinaram a petição inicial da ação de divisão, o que ocorre é a
intimação a apresentarem, dentro de dez dias, os seus títulos, se ainda não o fizeram, e formularem os seus
pedidos sobre a constituição dos quinhões (artigo 970). O procedimento é o dos arts. 971-981.
Quando, na ação de demarcação, não há outros condôminos, os demandados são os confinantes; mas pode
acontecer que peçam a demarcação todos os interessados na constituição, aviventação e renovação. Aí, os
confinantes põem-se em situação parecida com a dos condôminos que assinaram, sem exclusão de um, a petição
inicial. Se a petição não contém qualquer discordância, nem queixa de esbulho ou turbação, há voluntariedade da
jurisdição, posto que eventual. 0 que se tem de aplicar é o art. 330, 1, pois não houve contestação e também não
houve revelia, O juiz tem de nomear dois arbitradores e um agrimensor para levantarem o traçado da linha
demarcanda e a sentença, uma vez que foi procedente a ação, determinará o traçado da linha demarcanda (art.
958). Mas, como ao lado foram anexados a planta da legião e o memorial das operações e tudo junto aos autos, e
as partes tiveram dez dias para alegar o que julgaram conveniente, temos de entender que as partes tiveram de ser
ouvidas, e isso supõe que, antes de expirados os dez dias, não pode o juiz proferir a sentença.

Diante do art. 4,0 do Decreto n. 720, de 5 de setembro de 1890, a citação era por edital se os interessados
residiam fora da comarca. Sob o Código de 1939, art. 418, os condôminos residentes fora do termo, embora em
lugar certo e sabido, poderiam ser citados por edital para as ações de divisão e de demarcação. Hoje, retirou-se o
“poderão ser citados”, que se achava naquele texto. Pergunta-se: ~,a citação por edital é hoje imperativa? O art.
953 permitiu a citação por edital, a despeito da sua redação no tocante à parte inicial (“Os réus que residirem na
comarca serão citados pessoalmente; os demais por edital”). Se o autor prefere a citação pessoal porque, embora
o citando seja residente noutra comarca, essa é contígua, ou ele se encontra em lugar próximo das divisas
respectivas (art. 230), é de acolher-se.
Não seria razoável que, para efeito de caráter pessoal, não se preferisse, aí, ao edital a citação em pessoa. O dono
do terreno pode estar longe e não ter fácil conhecimento dos editais da comarca. Já tratamos do assunto na nota
1).

Art. 954. Feitas as citaçôes, terão os réus o prazo comum de vinte (20) dias para contestar 1)

Art. 955. Havendo Contestaçao2) 5), observar-se-a o procedimento ordina.rio 3); rido havendo 4) 6), aplica-se o
disposto no art. 330 número II.

1)CITAÇÃO E Contestação . Feitas as citações, quaisquer que tenham sido os réus, têm eles o prazo comum c~e
vinte dias para contestar.
O art 974 apenas supõe ter havido ação de divisão. os arts. 947-949, que estão na Seção 1 (Das disposições
gerais), referem-se à cumulação da ação de demarcação e da aÇo de divisão. Se a ação é apenas de demarcação,
há a citação de todos os confinantes, porque se trata de partes na ação, sendo autor quem a propôs, ou autores de
confinantes que a propuseram, e não se pode afastar que todos assinem a petição, ou que todos que exercem a
pretensão pré-processual e a pretensão processual se façam autores e réus. A petição, em que se apontam todos
os confinantes e todos a subscreveram, pode conter o pedido de serem dispensadas as citações, caso em que o
prazo para contestar começa do despacho favorável do juiz. Tudo se passa como se todos os confinantes, autores
da ação, tivessem sido citados.
Se só uma pessoa foi citada, o prazo começa da junta~~a aos autos do mandado de citação, que foi cumprido
conforme a lei. Se são duas ou mais, o prazo só se inicia quando se junta o último mandado (art. 241, 1 e II). Se a
citação foi por edital, quando finda a dilação assinada pelo juiz (artigo 241, III). Na ação de demarcação parcial,
movida apenas contra um confinante, o prazo é apenas de quinze dias, em virtude da regra jurídica geral do art.
297. O prazo de vinte dias é o prazo comum se foram dois ou mais os citados (artigo 954).
Pergunta-5e ~ desde quando se começa de contar o prazo para a contestação? De início, o prazo comum é prazo
para todos os citados (art. 298>. Mais: o art. 191 tem de ser respeitado: se os litisconsortes têm diferentes
procuradores, o prazo é contado em dobro. Não se diga que o art. 954 atinge o art. 191. Tem de ser interpretado
como regra jurídica especial que não afasta regras jurídicas gerais.
Se houve cumulação das ações de demarcação e de divisão, a contestação na ação de divisão e na ação de
demarcação é nos mesmos autos, dentro do prazo de vinte dias. Isso não impede que uma parte da contestação
seja apresentada num dia e a outra parte depois, uma vez que ambas dentro do prazo legal.
A defesa do réu ou as defesas dos réus que hão de ser feitas em escrito, como petição ao juiz, pode consistir em
exceção, ou em contestação, inclusive alegações de faltas processuais ou de atos processuais nulos ou ineficazes.
No plano da ação demarcatória pode ser argUido: que o autor ou os autores ou algum ou alguns deles não têm
domínio ou outro direito real sobre o imóvel demarcando; que não há contiguidade entre os imóveis cujos limites
é objeto da ação; que as linhas apontadas na petição inicial não são as que juridicamente existem; que não há
necessidade da ação demarca tória, pois os limites foram precisa e suficientemente traçados e não se precisa de
aviventação ou de correção; que houve usucapião do todo ou de parte.

Pode ser proposta a ação de reconvenção, mas há de ser respeitado o prazo legal. Pergunta-se: ~o prazo para a
reconvenção é o comum (art. 954) ou conta-se o prazo de cada citação e é de quinze dias? No art. 954 só se fala
de “vinte dias para contestar”, o que pode levar os intérpretes do artigo 954 a entenderem que o prazo para a
reconvenção e para as exceções é o de quinze dias, conforme o art. 297, e não o do art. 954. Trata-se de resposta
do citado e a mesma sentença tem de julgar a ação e a reconvenção (art. 318). Não seria de admitir-se que
corresse mais rapidamente o prazo para reconvir do que o prazo para contestar.
Advirta-se que também pode ocorrer que se tenha de julgar a declaração incidente (art. 5.0>; mas, aí, supõe -se
contestada a ação, e é o autor que pode fazer o pedido, contando-se o prazo de dez dias depois da contestação
para se declarar a existência ou a inexistência do direito, de que, no todo ou em parte, depende o julgamento da
lide (art. 325). Aqui, o prazo nada tem com o prazo do art. 954, nem com o prazo do art. 297.
Uma vez que a contestação e a reconvenção são oferecidas simultaneamente e em peças autônomas, seria
repelível que se tivesse de reconvir antes de se contestar, contado o prazo para a contestação em vinte dias e o
prazo para reconvir em quinze dias. Mais grave ainda seria, se, havendo pluralidade de citados, se iniciasse o
prazo para reconvir da citação do que seria reconvinte e da última citação para a contestação. Temos de ajustar os
textos à realidade e aos princípios. A reconvenção há de ser simultânea à contestação.
2)NÃO-ExERcíCIO DA PRETENSÃO AO CONTRADITÓRIO . Se a contestação não for oferecida, dá-se, na
espécie, não-exercicio da pretensão ao contraditório. Prossegue-se no processo, isto é, os autos vão inclusos ao
juiz para julgar o mérito da ação, conforme o art. 330, II. A sentença que julga pro
cedente a ação independe de ter havido, ou não, contestação; é sentença de cognição; ainda não está a atender à
pretensão de direito material das partes (executiva, na ação de divisão; executiva, com possível eficácia
constitutiva, na de demarcação>.

Se não há contestação, é invocável o art. 319; portanto, a eficácia da revelia. Não é preciso que os documentos
Laçam prova e as alegações coincidam com os dados constantes deles.
O que se tem como verídico é o fato alegado pelo autor.

O terceiro interessado, que não é citado, ou a) se litisconsorcia voluntariamente, se é caso de litisconsârcio


voluntário, ou b) se trata de litisconsórcio necessário, e ao juiz cabe ordenar que se integre a conteslação, ou c),
se apresenta como assistente equiparado a litisconsorte, ou d) como assistente simples. Não se pode dizer, como
fez a ~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a 24 de julho de 1952 (R.J., 1, 101>, que o
interessado, sem mais, pode contestar. É possível que o caso seja de oposição de terceiro, ou de embargos de
terceiro. Não há solução a priori.

3)CONTESTAÇÃO DE RITO PROCESSUAL. Se houve contestação, a causa toma o rito ordinário. A


propósito de demandado na ação de demarcação que entende ter usucapido, toca-lhe defender-se com a alegação
de usucapião (cf. Tratado de Direito Privado, Tomo XI, § 1.198, 4; cf. 5~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, 2 de março de 1951, 1?. dos T., 192, 166; 3Y~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, 28 de dezembro de 1951; 1?. dos 1’., 200, 583). Mas há de propor a parte, a ação de usucapião.

Se houve cumulação das ações de demarcação e de divisão, a contestação, para as duas ações, é no prazo do ar-
tigo 954 (3.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 28 de dezembro de 1951, R. dos T., 201,
461).
A segunda fase é somente após a sentença do art. 947 (cp. art. 970).

4)ACORDO DAS PARTES. Além dos dois casos (isto é, não ter havido e ter havido contestação), há terceiro,
que éo de ter havido acordo das partes; portanto, declaração de vontade em ato comum. Aqui, o juiz homologa o
acordo, com o seu papel limitado a essa função constitutiva integrativa. Não aprecia, de ordinário, afirmações.
Em todo caso, se dizem respeito a pontos de direito, ou interesses de terceiro, ou renúncia contra direito, ou se se
compõe a figura processual do art. 129, a função do juiz não é mecânica, de simples documentação fiscalizadora.
Salvo esses casos especiais, o acordo homologado trata-se apenas como declaração de vontade. O que resolverem
sobre domínio e posse, é como negócio jurídico feito por escritura pública; e como tal se trata. A eficácia entre as
partes é constitutiva; não de coisa julgada material.
A decisão do art. 958 pode ser puramente homologatória se houve acordo das partes (cf. ~ Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 28 de dezembro de 1951, R. dos T., 201, 461).

5) AFIRMAÇÕES. Tendo havido contestação, com o prosseguimento de rito ordinário, há na contestação,


como na petição afirmações. Raramente, propostas ou ofertas, que se tratassem como se tendessem a acordos
parciais ou acordos da espécie da nota 4). Uma só que seja a afirmação de algum dos citados, está contestada a
demanda. Não se pode passar à segunda fase do processo (Tribunal da Relação de Minas Gerais, 2 de fevereiro
de 1924, R . F., 42, 375) sem se decidir a questão, que há de versar sobre a legitimação, ativa ou passiva, ou
sobre os pressupostos objetivos da divisão ou da demarcação. Se as divisas estão marcadas, vivas, a petição é
inepta (o Tribunal de Justiça de São Paulo, a 16 de junho de 1933, R. dos T., 90, 395, falou de ser “inadmissível”
a demanda). Se a “contestação” é oca, isto é, nada contém de afirmação em contrário, tem-se como contestação
em geral, imprecisa, porém isso não obsta ao rito ordinário. Se, porém, o único “contestante”, em vez de
contestar, propõe, ou contesta e propõe, o juiz deve receber a resposta à citação como proposta de acordo e
mandar ouvir, antes, as outras partes de um e de outro lado. A sentença proferida sobre o acordo, na audiência, é
a mesma sentença sobre a prova das afirmações, se houve, e sobre a apuração das declarações de vontade. O art.
453, II, in une, aplica-se em caso de afirmações; não de declarações de vontade (propostas dos réus). De modo
que o rito é o mesmo, qualquer que tenha sido a resposta (cf. Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de maio de
1903, S.P.J., 2, 65); o trato, quanto ao fundo, é diferente.

6)FALTA DE CONTESTAÇÃO E ACORDO DAS PARTES. Alguns juristas leram a regra jurídica do Código
de 1939, artigo 426, hoje art. 970 do Código de 1973, como se, não tendo havido contestação, se haja de
presumir o acordo das partes (!). Nada mais oposto aos princípios de direito processual. Confusão entre efeitos da
não-contestação e efeitos da regra Quz tacet, ubi loqui potuit ac debuit, consentire videtur, que somente tem
acolhida quando se trata de declaração de vontade. Quando não entendiam o Código de 1939 (que correspondia
a direito processual mais evoluído), os anotadores emprestavam-lhes as mais perturbadoras erronias. Não-
-contes tar é não afirmar em contrário; declarar vontade é prestar vontade, emitir vontade. Não contestar é não
comunicar conhecimento; declarar vontade é emitir vontade: se em juízo, emitir vontade dentro de comunicação
de vontade (requerimento). As confusões resultam de falta de estudo inicial, científico, de pessoas que ousam
escrever sobre direito, como se ciência tão difícil se improvisasse. No art. SI~ diz-se: “Se o réu não contestar a
ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor”. A referência é exciu sivamente a comunicações
de enunciados de fatos, e não a. declaração de vontade.

Ad. 956. Em qualquer dos casos do artigo anterior, o juiz, antes de pro ferir a sentença definitiva, nomeará dois
(2) arbitradores e um (1) agrimensor para levantarem o traçado da linha demarcanda 1) 2).
Art. 957.concluidos os estudos 3),apresentarão os arbitradores minucioso laudo sobre o traçado da linha
demarcanda, tendo em conta os títulos, marcos, rumos, a fama da vizinhança, as informações de antigos
moradores do lugar e outros elementos que coligirem.

Parágrafo único. Ao laudo anexará4) o agrimensor a planta da região e o memorial das operações de campo, os
quais serão juntos aos autos, podendo as partes, no prazo comum de dez (10) dias, alegar 5) o que julgarem
convemente.

Art. 958. A sentença, que julgar procedente a ação 6), determinará o traçado da linha demarcanda 7)~

1)NOMEAÇÃO DE ARBITRADORES E AGRIMENSOR. Antes de proferir a sentença “definitiva”, como a do


art. 958 chama o art. 956, tem o juiz de nomear dois arbitradores e um agrimensor, para levantarem o traçado da
linha demarcanda. Acertadamente, o Código de 1973, arts. 956-958, menciona os estudos, o laudo minucioso
sobre o traçado da linha demarcanda, os informes da vizinhança e outros elementos.
No art. 955 estatui-se que, não havendo contestação, incide o art. 330, II, isto é, aquele artigo em que se diz que o
juiz conhecerá diretamente do pedido e proferirá a sentença quando ocorrer a revelia (arts. 319 e 324). Assim,
têm-se por verdadeiros os fatos afirmados pelo autor (art. 319) e há o juiz de ordenar que o autor especifique as
provas que pretenda produzir na audiência (art. 324). Observa-se que àpetição inicial já se fizeram exigências.
No art. 956, 2.~- parte, na falta de contestação, ou se houve contestação, tem o juiz
“antes de proferir a sentença definitiva” nomear arbitradores e um agrimensor para “levantarem o traçado da
linha demarcanda”. Ainda não se foi ao terreno para a demarcação: apenas se fez o laudo, a que se anexarão
planta e memorial das operações de campo. Tudo é junto aos autos e ainda podem as partes que antes
compareceram, ou não alegar o que julgarem conveniente. Não era assim no direito anterior; porém persiste o
que convinha que persistisse:
na sentença ainda apenas se determina o traçado da linha demarcanda; após vêm todas as operações dos arts.
959-964; e o juiz ainda pode determinar correções e retificações que tenha como necessárias (art. 965). Só depois
é que há a sentença homologatória da demarcação, isto é, das operações materiais (art. 966). Não se confunda
com a homologação da demarcação (art. 966) a homologação do acordo que ocorra entre os confinantes e que se
insere na sentença que julga procedente a ação e determina o traçado da linha demarcanda. Aquela é
homologação do laudo, que já concerne à linha demarcada. Não há audiência para que funcionem os
arbitradores. Teve-se de proceder a estudos e apresentar minucioso laudo sobre o traçado da linha demarcanda.
Nem há~ audiência para o agrimensor.
Para a fixação dos limites, ou a sua correção, ou a renovação, são de mister conhecimentos técnicos e científicos.
A sentença do art. 958 supõe que o juiz haja nomeado o agrimensor e os arbitradores para levantarem o traçado
da linha demarcanda. Os arbitradores e o agrimensor procedem a todas as operações necessárias ao traçamento
da linha demarcanda. Os arbitradores apresentam o laudo, conforme o art. 957 e o parágrafo único. Advirta-se
que podem as partes indicar assistente técnico e apresentar quesitos (cf. art. 42.1, ~ 1.0, 1 e II). O art. 957,
parágrafo único, não fala disso, mas as partes têm o prazo comum de dez dias para a alegação do que “julgarem
conveniente” (art. 957, parágrafo único, in fine). Uma das alegações que se podem prever é a de ser necessária a
assistência técnica; outra, a de apresentar quesitos, mesmo durante as diligências. O juiz defere ou não os
pedidos. O juiz, a fortiori, pode apresentá-los. O agrimensor e os arbitradores podem ser chamados à audiência
de instrução e julgamento, para que esclareçam alguma parte dos trabalhos e das conclusões.
Se não houve contestação, o juiz conhece diretamente do pedido e profere a sentença. Quer isso haja ocorrido,
quer tenha havido contestação, o juiz, antes da sentença, nomeia dois arbitradores e um agrimensor para
levantarem o traçado da linha demarcante. O juiz nomeia, sem ser preciso que sejam ouvidas as partes. Mas
podem elas ou alguma ou algumas argúir, em petição fundamentada, que é autônoma, a suspeição ou
impedimento da pessoa ou das pessoas nomeadas. Tal petição é autuada em apartado, sem efeito suspensivo, e
ouve-se o nomeado, dentro de cinco dias, facultada a prova, e o art. 138, III, e § 10 têm de ser atendidos.
Conforme o art. 421, § 1.0, 1, podem as partes, dentro de cinco dias, contados da intimação do despacho de
nomeação dos dois arbitradores e do agrimensor, indicar assistente técnico, se é o caso disso. Juiz e partes podem
apresentar quesitos (art. 421, § 1.0, II).
O Código de 1973 não fala dos honorários dos arbitradores e do agrimensor. No Código de 1939, art. 449, os
honorários do agrimensor eram fixados pelas partes e, na falta de convenção, o agrimensor apresentava em
cartório a proposta, eram ouvidos os interessados e o juiz decidia. Os peritos tinham a metade “dos emolumentos
taxados para os juizes por diligência e estada, e mais os atribuidos aos avaliadores e partidores pelos atos de
avaliação e partilha” (art. 450).
~Como se há de resolver, hoje, o problema? Ou há a convenção das partes, ou consta de regra jurídica de
organização judiciária o critério para a fixação dos valores a serem pegos pelos serviços, ou os arbitradores e o
agrimensor expõem o que desejam como prestações e, ouvidos os interessados, decide o juiz. Se não há acordos,
tem o juiz de nomear outra pessoa ou outras pessoas.
As informações do agrimensor são comunicações de fato.
As partes podem, no prazo comum de dez dias, alegar o que julgarem conveniente (art. 957, parágrafo único). As
alegações têm de ser atinentes ao lado dos arbitradores, à planta da região e ao memorial de operações de campo,
que foram anexados ao lado. Ainda se está no plano da demarcação; ainda não se está a demarcar. As alegações
das partes vão servir à fundamentação de sentença do art. 958, que irá determinar a linha demarcanda. Criticas
que se façam aos arbitradores ou ao agrimensor não são alegações que caibam no art. 957, parágrafo único. Seria
preciso que alguma das partes as acolhesse e postulasse.

2)DÚvIDAS SUPERVENIENTES. Há dúvidas que o agrimensor resolve por si, com o seu próprio
conhecimento e o seu esforço; outras, que dependem de exames dos arbitradores ou de resolução do juiz. Juiz
resolve, não dá parecer; os seus próprios enunciados de fato, as suas afirmações sobre ~os acontecimentos, são
julgamentos. o agrimensor comunica por escrito ao juiz as dúvidas, não só as que hão de ser objetos de parecer
dos arbitradores, como as que exijam despacho do juiz.

3) CoNcLusÃo DOS ESTUDOS. A apresentação do laudo e da planta da região, bem como do memorial, tem
que ser no prazo que o juiz exige, ou, se demorou a apresentação, o juiz que o fixe. A lei não cogitou da
determinação do prazo, ou dos prazos, tais as diferenças que podem surgir em tais serviços, de modo que rege o
art. 177, 2.~ parte: quando a lei é omissa, determina o juiz o prazo, “tendo em conta a complexidade da causa”.

4)AUTENTICAÇÃO E ANEXAÇõES . Planta da região e memorial das operações têm de ser autenticados. A
falta de anexação da planta e do memorial das operações autenticadas pelo agrimensor, assaz importantes, é
infração de forma; o serviço do agrimensor é nulo, se não puder ser satisfeita. a exigência, se requerido por um
dos interessados ou ordenado pelo juiz, de oficio.
A autenticação é em todas as páginas; ou na página final, se tudo foi feito do próprio punho do agrimensor. As
páginas em que só há desenhos têm de ter o nome ou a rubrica.

5) ALEGAÇÕES DAS PARTES. Tenha, ou não, havido contestação, há o prazo comum de dez dias para que as
partes aleguem o que julgarem conveniente. Mesmo a parte revel pode fazê-lo dentro do prazo. Pode acontecer
que se argúa defeito do laudo, ou da planta da região, ou do memorial das operações de campo. Tudo isso tem de
entrar nos autos, razão para não se admitir que os arbitradores façam correções ao laudo, ou o agrimensor à
planta ou ao memorial, salvo se o requereram ao juiz antes de ter começado de decorrer o prazo comum para as
partes, que é de dez dias. Se acaso o
juiz o admite, tem de dar às partes novo prazo comum. Se algum dos interessados alega falta que deva ser
corrigida, quer nos trabalhos do agrimensor, quer no dos arbitradores, têm esses de ser ouvidos pelo juiz, antes de
resolver sobre a reclamação. As criticas dos assistentes não são alegações eficazes; é preciso que a parte as adote
e postule.
As alegações de que fala o art. 957, parágrafo único, não podem ir além da execução dos trabalhos técnicos, ou
de dúvidas pertinentes à praticabilidade do traçado dos limites (cf. Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Ceará, 14 de julho de 1952, J. e D., VIII, 272).
6)SENTENÇA QUE JULGA PROCEDENTE A AÇAO E DETERMINA O TRAÇADO DA LINHA
DEMARcANDA. A sentença favoravel conforme o art. 958 ou é julgado de procedência da ação, ou é sentença
homologatória. Num e noutro caso, supõe-se que haja base para se saber como se tem de demarcar, O que se
declara é o que consta dos títulos, ou do acordo das partes homologado pelo juiz. A aplicação ao terreno é função
da segunda fase do processo. Dúvidas, se as há, são quanto a essa aplicação; não quanto aos limites, que a
sentença declara (declara, faz claros). Não pode haver obscuridade quanto aos limites; pode existir quanto à
praticabilidade dos enunciados do titulo. Se a área é x e os dois confinantes têm, segundo os titulos, 3x, não são
os títulos que são obscuros; eles são claros, e a sentença os declara: o que se dá é que, na demarcação , há
insuficiência de objeto dos direitos de propriedade, o que na fase última pode vir a ser descoberto. Mas a
sentença segundo o art 958 transitou em julgado. O itinerário fora traçado no papel; embora o traçado não se
possa fazer no mundo fáctico. O art. 959 exige o trânsito em julgado.
Se há impraticabilidade, é matéria que se discute na fase executiva, quando se abrir o prazo para o levante de
dúvidas (art. 965) ou das alegações. Impraticabiidade não é causa de nulidade da sentença do art. 958, porque a
impraticabilidade diz respeito ao declarado pela sentença, e não à declaração sentencial (cf. 1.a Turma do
Supremo Tribunal Federal, 16 de janeiro de 1950, D. da J. de 3 de janeiro de 1952: “Não deve ser invalidado o
trabalho do agrimensor, porque o ponto de partida não foi formalmente determinado pelo juiz, desde que ficou
tecnicamente demonstrada a impossibilidade de adotar-se o ponto antes escolhido. Seria ilógico invalidar a
demarcação, para reproduzir o mesmo trabalho e ter de partir do mesmo ponto que serviu de base à atual”).
A sentença há de ser dada, tenha ou não havido contestação (sem razão, a 4•R Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, a 28 de fevereiro de 1952, R. dos T., 200, 288).
O que se elimina é o procedimento ordinário da primeira fase, no tocante a audiência de instrução (no mesmo
sentido, a 2.R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 20 de novembro de 1951>. O art. 955,
2.~ parte, no caso de falta de contestação, remete ao art. 330, II.

7) EFIcÁcIA SENTENcIAL. A sentença do art. 953 é declarativa, ou de condenação, conforme a espécie e o


contraditório. Chamam alguns julgados a essa cognição para a demarcação “petitório” (e. g., 4.a Câmara Cível do
Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 29 de agosto de 1941, D., 13, 390); mas o termo é impróprio.
O art. 958 exige que no conteúdo da sentença esteja o traçado da linha demarcanda. Há decisões sobre o direito
da parte ou das partes e sobre qual a linha que separa os terrenos, o que é indispensável para se fixarem os pontos
por onde há de passar a linha. Com a sentença, tudo se resolveu, mas tem de ser materialmente feito o que só em
enunciado sentencial se estabeleceu.
A ação de demarcação é ação declaratória, na sua primeira fase: 5 de declaratividade, 3 de constitutividade, 4 de
condenatoriedade, 2 de mandamentalidade e 1 de executividade. Entenda-se, porém, que o acordo, que ocorrer,
pode mudar os pesos. Na segunda fase, há mudança das eficácias:
4 de declaratividade, 2 de constitutividade, 1 de condenatoriedade, 3 de mandamentalidade e 5 de executividacle
(cf. Tratado das Ações, Tomo 1, 77).

Art. 959. Tanto que passe em julgado a sentença ~), o agrimensor efetuará a demarcação, colocando os marcos
necessários. Todas as operações serão consignadas em planta e memorial descritivo com as referências
convenientes para a identificação, em qualquer tempo, dos pontos assinalados2).

1)TRÂNsITO EM JULGADO E DEMARcAÇAO . Primeiro houve os estudos, que levaram os arbitradores a


apresentar laudo minucioso quanto ao traçado da linha demarcanda ou das linhas demarcandas, com os
elementos a que se refere o art. 957. Ao laudo tem de ser anexada a planta da região e o memorial das operações
de campo.
Tudo é junto aos autos e, no prazo legal, podem as partes alegar o que lhes convenha (art. 957, parágrafo único).
A sentença, que tem de julgar se foi procedente ou improcedente a ação, no caso afirmativo determina o traçado
da linha demarcanda (art. 958). Com o trânsito em julgado da sentença, o agrimensor efetua a demarcação. A lei
foi explicita: tem ele de colocar os marcos que forem necessários, portanto não só de sua livre escolha. Além
disso, tem ele de expor a planta e o memorial descritivo de todas as operações que se realizaram, de modo que
seja suficiente para identificação, em qualquer tempo, dos pontos assinalados.

2)NEGócIo JURÍDIcO ENTRE AS PARTES. o Código de 1973 somente falou da propositura da ação, da
legitimação dos interessados, dos pedidos que podem ser insertos, das citações e de outros atos e situações
processuais. Não se referiu a acordo inicial dos interessados, nem de sentença homologatória. Temos, diante
disso, de perguntar: ~ assim como se supunha no Código de 1939, pode-se admitir que os interessados entrem
com o pedido, acompanhado do negócio jurídico, para que seja homologado o acordo? A resposta há de ser
afirmativa. Na petição inicial, que tem de ser instruída com os títulos de propriedade, hão de constar a designação
do imóvel pela situação e pela denominação e a descrição dos limites por constituir, aviventar ou renovar e os
nomes de todos os confinantes da linha demarcanda (art. 950). O pedido a que alude o art. 951 é impróprio para o
pedido de homologação de acordo.
Uma vez que todos os confiantes acordaram, dispensada está a citação. Tampouco pode haver contestação, nem
se pode falar de revelia. De ordinário, o acordo ocorre após o traçado da linha demarcanda e o laudo sobre o
traçado da linha demarcanda. Tem-se de exigir que ao laudo se anexe a planta da região e o memorial das
operações de campo. Nada obsta a que todos os interessados deixem ao juiz a nomeação dos arbitradores e do
agrimensor, caso em que há o prazo comum para que alegue qualquer dos acordantes o que julgarem conveniente
(arts. 956 e 957, com o parágrafo único). Numa e na outra espécie, há sentença homologatória, porque houve
acordo e não poderia haver contestação quanto ao que é conteúdo do art. 950.
Tais ações passam a ser ações de jurisdição voluntária, juclicium duplex, com que tanto se confundem as ações
de divisão, ou, melhor, de destacamento, e a de demarcação, que são ações de execução com elemento eventual
de condenação embora possam contar com a aquiescência dos citados; como faziam no século XIX, A. C. DE
MENESES (Prática aos Tombos, 2. a ed., 78) e ANTÔNIO JOAQUIM DE MACEDO SOARES (Medição e
Demarcação das Terras, 7). O Código de 1939, art. 440, andou bem em distingui-las; a regra jurídica do Código
de Minas Gerais, art. 2.262, a que se deveu a distinção, digna, no plano teórico e na prática, de todos os
aplausos.
A construção processual é a de ação executiva lato sensu, ou, melhor, execução de moto próprio, perante o juiz.
Ou a demarcação ou a divisão planejada seja a que seria executável em processo de ação executiva, lato sensu,
com elementos de condenação, ou seja a que, por vontade própria, adotaram as partes, a sentença é de execução.
Ou o juiz executa a demarcação, ou a transformação da comunhão pro indiviso em quinhões separados (a); ou
executa a propriedade separada de cada um, em substituição à comunhão pro indiviso

(b). A diferença entre essas duas espécies está em que, no caso (a), a sentença nada tem com a declaração de
vontade em ato comum, segundo o conceito de J. E. KUNTzE; ao passo que, no caso (b), a sua função é a de
agente do Estado na constituição de um negócio jurídico. Num e noutro caso, “execução”. A construção como
ação declarativa imitaria o direito material (Código Civil, art. 631>, porém não explicaria a transformação da
propriedade indivisa em propriedades autônomas. (Sobre a diferença de conceito entre declarativo e constitutivo,
no direito material, e declarativo e constitutivo na divisão qúinquária das ações nota 2 antes do art. 946.)
O acordo, de que se fala, é negócio jurídico em juízo, e rege-se pelo direito material, quanto ao fundo.
A divergência, ao serem ouvidos os interessados, não atinge o acordo básico, e tem-se como restrita à matéria de
fato, na execução do negócio jurídico. A sentença, que julga não provada alguma afirmação, tem efeito de
sentença sobre matéria de fato, e a que julga errada a interpretação do acordo, efeito de sentença em ação
declarativa.

No tocante à demarcação, que é o assunto do art. 959, somente pode haver acordo no que concerne a limites, se
esses limites são de bens imóveis que pertencem aos confinantes. A ação ou o acordo entre eles só diz respeito
aos seus terrenos ou águas dos limites. Os que, a respeito, não são confinantes não precisam ser citados ou
acordar porque não são partes e a eficácia sentencial não os atinge.

Art. 960. Nos trabalhos de campo2) observar-se-ão as seguintes regras 1):


1 a declinação magnética da agulha será determinada na estação inicial3);
li empregar-se-ão os instrumentos aconselhados pela técnica 4);
III quando se utilizarem fitas metálicas ou correntes, as medidas serão tomadas horizontalmente, em lances
determinados pelo declive, de vinte (20) metros no máximo 5);
IV as estações serão marcadas por pequenas estacas, fortemente cravadas, colocando-se ao lado estacas
maiores, numeradas 6);
V quando as estações não tiverem afastamento superior a cinqúenta (50) metros, as visadas 7) serão feitas sobre
balizas com o diâmetro máximo de doze (12) milímetros;
VI tomar-se-ão por aneróides ou por cotas obtidas mediante levantamento taqueométrico as altitudes dos pontos
mais acidentados 8)

1)DEFEITO DE TECNICA LEGISLATIVA. As regras jurídicas dos arts. 960 e 961 são impróprias à lei
processual. Recendem a época que passou, vindas do projeto (não-adotado) de JOÂO MONTErRO para São
Paulo, e repercussão em alguns Códigos estaduais (Rio Grande do Sul, art. 725; Ceará, art. 492; Bahia, arts. 513-
515; Minas Gerais, art. 430). São máximas de experiência de agrimensura, sujeitas à evolução da técnica.
Sob o Decreto n. 720, de 5 de setembro de 1890, art. 46, os exames eram feitos, bem como as conferências dos
títulos das partes, a verificação do ponto de partida para a medição do perímetro, o reconhecimento do marco
primordial, rumos e vestígios que servissem para a base da demarcação sempre em audiência, mediante
diligência, no lugar do imóvel. Exprobrou-se, aqui e ali, tal exigência, o que deu ensejo à atitude do Código de
Processo Civil de Minas Gerais, arts. 747 e 748, que passou ao Código de 1939.
Observe-se que os arbitradores e o agrimensor não entram na apreciação de questões de direito quanto à
titularidade das partes, mas podem apresentar dúvidas, quer quanto à propriedade quer quanto à posse.

2) EXIGENCIAS LEGAIS. O art. 960 entrou em campo da topografia. É evidente a necessidade de algumas
referências, que contribuem para a precisão dos dados indispensáveis, porém o art. 960 invade outra ciência e
outra técnica. Está-se na função de operação de planimetria, com as medidas das distâncias. Tem-se de usar a
cadeia do agrimensor, a fita de aço, a régua métrica e a trena. A cadeia do agrimensor é medida de comprimento
de dez ou vinte metros, composta com cinquenta ou cem fuzis de ferro, que argolas de metal ligam dois a dois, e
termina com dois argolões que se destinam a facilitar a tração pelos operadores.

3)DECLINAÇÃO MAGNETICA DA AGULHA. O art. 960, 1, diz que a declinação magnética da agulha há de
ser determinada na estação inicial.
4) TECNICA. Acertadamente, o art. 960, II, refere-se aos instrumentos que a técnica aconselha. A cada
momento, diante do surto evolutivo, ela mostra qual o instrumento ou quais os instrumentos que no momento são
recomendáveis.

5)FITAS METÁLICAS OU CORRENTES. Se o terreno é inclinado, tem-se de recorrer às fitas metálicas, que
terminam em cada extremidade por um punho dotado de eixo, o que contribui para a comodidade da manobra.

6) ESTAÇÕES E ESTACAS. A lei exige, para as estações, pequenas estacas, ao lado das quais hão de estar
estacas maiores, nas quais hão de constar os números. Vê-se nas maiores o que dá a posição no terreno às estacas
menores, fortemente cravadas.

7) VISADAS. O art. 960, V, diz como se hão de fazer as visadas, se as estações não têm afastamento superior a
cinqúenta metros.

8)ANERóIDES. Ao barômetro chamado aneróide, a que se refere o art. 960, VI, está sucedendo o
microbarômetro, de modo que a alusão é apenas exemplificativa. Lá se diz “por aneróides ou por cotas obtidas
mediante levantamento taqueométrico”; isto é, por esses ou outros meios. O barômetro aneróide destina-se a
nivelamentos dos itinerários, aos levantamentos rápidos. A vantagem do microbarômetro consiste em que nele
estão tripé e limbo graduado com fundo escuro.

Art. 961. A planta será orientada segundo o meridiano do marco primordial, determinada a declinação
magnética e conterá’):
1 as altitudes relativas de cada estação de instrumento e a conformação altimétrica ou orografica aproximativa
dos terrenos2);
II as construções existentes, com indicação dos seus fins, bem como os marcos, valos, cercas, muros divisórios e
outros quaisquer vestígios que possam servir ou tenham servido de base à demarcação;
III as águas principais, determinando--se, quanto possível, os volumes, de modo que se lhes possa calcular o
valor mecânico;
IV a indicação, por cores convencionais, das culturas existentes, pastos, campos, matas, capoeiras e divisas do
imóvel.

Parágrafo único. As escalas das plantas podem variar entre os limites de um (1) para quinhentos (500) a um (1)
para cinco mil (5.000), conforme a extensão das propriedades rurais, sendo admissível a de um (1) para dez mil
(10 . 000) nas propriedades de mais de cinco (5) quilômetros quadrados 3)•

1) PLANTA. Planta é a representação gráfica do terreno. Algumas das exigências são demasiadas, supérfluas, se
a questão se restringe, por exemplo, a se saber por onde passa uma linha de limite. Processualmente, o que
importa sabes se é que os arts. 960 e 961 são regras de forma, de cuja infração resulta, apenas, nulidade “não-
cominada”.

2) MEDIÇÃO DE ÁREA . O art. 961 estatui que a planta tem de ser orientada segundo o meridiano do marco
primordial, determinada a declinação magnética, dando conta o que lhe exige nos incisos 1, II, III e IV. Para que
se complete a planta de algum bem imóvel, é preciso de início, que ela contenha o perímetro (divisas) e a área
calculada.
Com a altimetria, há a representação de relevo sobre um plano, completando-se os dados planimétricos com
outros dados que mostrem os desníveis do solo e as formas do terreno. Têm-se de mostrar as altitudes relativas a
cada estação, ainda que aproximativa, dos termos.
No art. 961, II e III, a descrição é o que mais importa. Apontam-se as construções existentes, com a indicação
dos seus fins, os marcos, valos, cercas, muros divisórios e quaisquer outros dados que sirvam ou possam servir
ou tenham servido de base à demarcação, as águas principais, o seu volume (quanto possível).
No art. 961, IV, exige-se a indicação, por meio de cores convencionais, das culturas existentes, pastos, campos,
matas, capoeiras e divisas do imóvel.

3 DAS ESCALAS. O art. 961, parágrafo único, estabelece a variabilidade das escalas: limites de um para
quinhentos quilômetros a limites de um para cinco mil, conforme a extensão das propriedades rurais. Permite-se
que, nas propriedades de mais de cinco quilômetros quadrados, a variação seja de um para dez mil.

Art. 962. Acompanharão as plantas as cadernetas de operações 1) de campo e omemorial descritivo, que
conterá:

1 o ponto de partida, os rumos segui -dos e a aviventação dos antigos com os respectivos cálculos 2);

II os acidentes encontrados, as cercas, valos, marcos antigos, córregos, rios, lagoas e outros 4);

III a indicação minuciosa dos novos marcos cravados, das culturas existentes e sua produção anual5);
IV a composição geológica dos terrenos, bem como a qualidade e extensão dos campos, matas e capoeiras 3);
V as vias de comunicação6);
VI as distâncias à estação da estrada de ferro, ao porto de embarque e ao mercado mais próximo 7);

Vil a indicação de tudo o mais que foráti! para o levantamento da linha ou para identificação da linha já
levantada 8)~

1)CADERNETAS DE OPERAÇõES. A qualquer levantamento que se faça, planimétrico ou altimétrico, hão de


corresponder cadernetas de operações, isto é, cadernetas para registro das operações efetuadas. As operações
dependem do processo e dos instrumentos que foram usados e delas dependem as cadernetas. Não se fala no art.
962 em ser necessário que se insira a data do trabalho, a classe dos instrumentos, a assinatura do operador, o
nome do auxiliar ou os nomes dos auxiliares e o nome da região, mas está implícita no art. 962, VII.
Tem de ser clara, precisa e com as indicações que pareçam indispensáveis.

2)PONTO DE PARTIDA E OUTROS DADOS. O conteúdo do art. 962, 1, acertadamente vem em primeiro
lugar como pressupostos do memorial descritivo. Após o ponto de partida estão os rumos seguidos e a
aviventação dos rumos antigos, com os respectivos cálculos. As operações têm de atender ao que se encontrara,
(acidentes, cercas, valos, marcos antigos, córregos, rios, lagoas e outros). Uma vez que éessencial cravarem-se
novos marcos, bem como mencionar-se o que existe, no momento, de cultura e de produção anual.

3)COMPoSIÇÃo GEOLÓGICA DOS TERRENOS, QUALIDADE E EXTENSÃO DOS CAMPOS, MATAS E


CAPOEIRAS. Não se exige apenas a representação dos pormenores planimétricos e altimétricos, mas também o
informe sobre a composição geológica dos terrenos, a qualidade e a extensão dos campos, matas e capoeiras.

4)ACIDENTES ENCONTRADOS E OUTROS DADOS. Com a formação da litosfera, resultante da


solidificação da superfície pela condensação de matérias, a princípio gasosa e, depois, líquida, há modificacões
oriundas de elementos exteriores e
interiores, que levam a mudanças sucessivas na superfície topográfica. Por exemplo: desagregação de rochas por
influência térmica, ventos e águas que desagregam e transplantam materiais, agentes químicos, como ocorre com
a decomposição de vegetais e até agentes ígneos e agentes orgânicos. As águas são a causa de muitas mudanças
(erosão fluvial, erosão pluvial). Há a erosão pelos mares e a glacial, que é rara no território do Brasil.
O art. 962, II, misturou, na sua referência, os acidentes encontrados e o que se mostra ao exame sem ser
verdadeiramente acidental (cercas, valos, marcos antigos, córregos, rios, lagoas e outros).

5)Novos MARCOS E AS CULTURAS EXISTENTES. Têm-se de cravar marcos, porque para esse fim se
fizeram as operações (art. 962, III). Se existem culturas e se se pode contar com a sua produção anual, tem o
memorial descritivo de referir-se ao que no momento se pode observar e à probabilidade da produção anual.

6) VIA.s DE COMUNICAÇÃO. Cercados como têm de ser os terrenos por outros terrenos, é indispensável que
se diga por onde se entra e por onde se sai, ou por onde é aconselhável que se entre e por onde que se saia. Se já
está feita a via de comunicação, ou se já estão feitas as vias de comunicação, a referência é fácil e
necessariamente se há de fazer a descrição.

7)ESTRADA DE FERRO, PORTO DE EMBARQUE E MERCADO MAIS PROXIMO. O art. 962, VI, é
exemplificativo. Se há uma ou duas estações de estradas de ferro, o memorial tem de mencioná-las. Outrossim,
se há porto ou portos de embarque, seja junto ao mar, a rio, a lago, ou aeroporto. Mais ainda: se há mercado
próximo, tem de ser mostrado o lugar em que se situa; se há dois ou mais, o mais próximo.

8)LEVANTAMENTO DA LINHA E IDENTIFICAÇÃO DA LINHA JÁ LEVANTADA. Os dados a que alude


o art. 962, VII, são os ne2essários e os úteis para se levantar a linha e para a identificação da que já foi levantada.

Art. 963. É obrigatória a colocação de marcos assim na estação inicial marco primordial como nos vértices
dos .angulos 1), salvo se algum destes últimos pontos for assalariado por acidentes naturais de difícil remoção
ou destruição 2)•

1)MARCOS DE COLOCAÇÃO OBRIGATÓRIA. O art. 963 contém regra jurídica nova, que é a da
obrigatoriedade de marcos na estação inicial e nos vértices dos ângulos, o que dá para caracterizar o terreno.
Mas, é de advertir-se que, na estação inicial, não haja linha reta completa, o que exige marcos mais adequados, e
nos próprios ângulos o mesmo aconteça, o que não permite que apenas se marque nos vértices dos ângulos. Pode
dar-se que a linha ou as linhas não sejam retas.

2)EXCEÇÕES AO PRINCIPIO DA ExIGÊNCIA DOS MARCOS. Na 2.a parte do art. 963, prevê-se que algum
dos últimos pontos já esteja assinalado por acidentes naturais (e. g., num dos vértices parte da pedreira caiu, o
que não permite o marco, ou o torna inadequado). Exige-se que tal acidente natural seja de dificil remoção (e. g.,
pedras da terra vizinha ou água de rio tornou difícil a colocação de marco por. que é difícil a remoção das pedras,
ou o afastamento das águas), ou de difícil destruição.
Há, porém, outras hipóteses. Por exemplo: o terreno, de que se tem de demarcar, não é em quatro ângulos, mas
sim em linhas curvas, ou em extensão que acaba num rio. Ali, têm-se de pôr os marcos que sejam elucidativos;
aqui, não se precisa de marcos. Se a demarcação é em ilha cujos terrenos são todos até à água que os cerca,
somente se põem marcos no que concerne aos limites, pois a corrente da água por si mesma marca.
Se na demarcação se verifica que um dos limites foi observado pelo muro que um dos confrontantes já construiu,
ou mesmo pelo prédio, demarcado está nessa extensão o terreno. Se houver discordância, o assunto já foi
examinado, porque estava na petição inicial (art. 951), ou da contestação referida nos arts. 954 e 955.

Art. 964. A linha ser.~ percorrida pelos arbitradores 1), que examinarão os marcos e rumos, consignando em
relatório escrito a exatidão do memorial e planta apresentados pelo agrimensor ou as divergências porventura
encontradas 2)

1)LINHA PERCORRIDA PELOS ARBITRADORES. A linha é percorrida pelos arbitradores, que examinam os
marcos e rumos, e que têm de consignar em relatório escrito a exatidão do memorial e da planta, que o
agrimensor apresentou, ou as divergências encontradas, se tal ocorreu. (Não mais se atribui aos interessados, às
partes, percorrerem os limites e examinarem os marcos, o que estava no Código de 1939, art. 448.) O relatório
escrito, em que se hão de apreciar o memorial e a planta, é elemento essencial, como o memorial e a planta. Se
algum faltar, há nulidade não-cominada.

2) TERRAS JÁ DEMARCADAS. Se as terras estão com divisas e áreas certas, é preciso atender-se a que a ação
de demarcação tem duas fases, uma das quais, a primeira, tem sentença (art. 958) declarativa, com carga 5 de
declaratividade, 3 de constitutividade, 4 de condenatoriedade, 2 de mandamentalidade e 1 de executividade. Se a
sentença, na segunda fase (art. 966), julga que as divisas estão bem traçadas, reputa verdadeiros os marcos ou
sinais, aviventa-os e impõe-nos aos interessados. A ação é procedente, ainda que nada se precise fazer a mais:
porque é muito dizer que o que está, facticamente, no terreno demarcando está certo. Por isso mesmo, grave foi a
decisão da 2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 9 de maio de 1950 (D. da J., de 28 de fevereiro de 1952),
que achou ser caso de improcedência da ação se sinais materiais há e não há conclusão. O elemento constitutivo
da sentença, na segunda fase, é o de todas as sentenças; pequeno, mas ineliminável: a executividade é força da
sentença, ainda se as conclusões da sentença dizem que tudo estava bem, porque então juridica o que só era
láctico e de qualquer modo executa. A descrição é declarativa, quer se tenham posto marcos, ou traçados, quer
se achem bons os que estavam (a carga de declaração é 4, em qualquer espécie).

A própria existência de cercas divisórias e de muros não impede que se exerça a ação de demarcação (1.~
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 6 de maio de 1952, R. F, 147, 335). Nem sequer, a
existência de rio, ou outro dado geográfico, a preexclui (sem razão, a 3~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, a 25 de maio de 1950, R. F., 137, 472 e R. dos T., 187, 638, acórdão referido pelo 2.0 Grupo de
Câmaras Civis a 23 de novembro de 1950, R. F., 137, 487, e R. dos T., 190, 688: “Embora os limites de um
imóvel estivessem assinalados por acidentes geográficos perfeitamente identificados, tem cabimento a
demarcatória se existem dúvidas oriundas da bifurcação do ribeirão limítrofe entre cujos braços se situa o bem
imóvel”). É difÍcil que falte interesse legítimo ao confinante para exigir a demarcação. A espécie mais adequada
é a em que o confinante adquiriu do outro o bem, estando medida a área e constantes da escritura os limites e
marcos. Mas, ainda aí, é preciso que não se alegue temor de se terem alterado os sinais.

Art. 965. Junto aos autos o relatório dos arbitradores, determinará o juiz que as partes se manifestem 1) sobre
ele no prazo comum de dez (10) dias2). Em seguida, executadas as correções e retificações 3) que ao juiz
pareçam necessárias, lavrar-se-á o auto de demarcação em que os limites demarcandos serão minuciosamente
descritos de acordo com o memorial e a planta.

1) já houve a sentença, que, ex hypothesi, passou em julgado (art. 959) e deu ensejo a que se procedesse à
demarcação material. O que anteveio à coisa julgada não mais dá ensejo a qualquer alegação (passara, antes da
própria sentença, o prazo, art. 957, parágrafo único). Está-se apenas a executar, a aplicar, o que se decidiu. O
prazo do art. 965 é comum, e de dez dias, mas inconfundível com o do art. 957, parágrafo único.

2)MANIFESTAÇÕES DAS PARTES NO PRAZO COMUM. Junto aos autos o relatório dos arbitradores são
intimadas as partes para que se manifestem sobre ele no prazo comum de dez dias. Não se falou de intimações,
mas são de exigir-se; e o prazo começa a correr da juntada aos autos do último mandado de intimação (cp. art.
241, II).
A não-comparência de modo nenhum prejudica as partes.

3)Correções E RETIFICAÇÕES. Com os dois substantivos, “correções” e “retificações”, a lei teve por fito
aludir a quaisquer alterações que o juiz tenha por necessárias. Pode acontecer que nenhuma das partes se haja
manifestado contra o relatório. Isso não impede que ao próprio juiz pareçam necessárias. Se alguma das partes
está contra o que entendeu o juiz, deve manifestar-se; mas recurso só há após a homologação da demarcação.
O prazo comum tem de ser respeitado. Não há, a respeito da ação de demarcação, regra jurídica semelhante a
do art. 971, parágrafo único. Logo após a assinatura do auto pelo juiz, arbitradores e agrimensor, começa a correr
o prazo do art. 189, II, para a sentença homologatória, que é de dez dias.
Se não foi respeitada a regra jurídica sobre prazo comum para as partes, há nulidade (3.a Câmara Civil do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 3 de junho de 1942, R. dos T., 138, 618. Mas a nulidade é não-cominada (1.a
Câmara Civil, 17 de agosto de 1942, R. dos T., 130, 686).
Art. 966. Assinado o auto pelo juiz 1), arbitradores e agrimensor, será pro ferida a sentença homologatória da
demarcação 2) -

1)AUTO DA DEMARCAÇÃO . Se houve correções ou retificações, ou se não as houve, tem de ser lavrado o
auto de demarcação, em que os limites demarcandos são minuciosamente descritos conforme o memorial e a
planta.
2) SENTENçA. A sentença, se não houve negócio Jurídico entre as partes, para a demarcação, é sentença
homologatória, porém não “meramente homologatória”, de modo que a ação rescisória se tem de fundar no art.
485 e não no art. 486.
Se os arbitradores e o agrimensor não podem determinar os limites, rege o art. 570 do Código Civil (sem razão, a
2.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, a 10 de novembro de 1949, 1?. F., 130, 410, deixou a solução ao
“prudente arbítrio do juiz”, o que o legislador brasileiro radicalmente evitou). O juiz aplica o art. 570, de ofício,
em sendo o caso de falta de solução pericial.
Tem o juiz de julgar a divisão ou a demarcação. Se ninguém reclamou, há de o juiz homologar a partilha ou
divisão (Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 23 de agosto de 1951, J. e D., IV, 176), salvo se algo
ocorre que tenha de ser, de ofício, retificado pelo juiz.
Não se pode afirmar, a priori, que a decisão na demarcação impeça a reivindicação. Pode não se ter decidido
sobre o domínio. Se se decidiu, é essa parte sentencial que faz coisa julgada material e obsta no que foi julgado,
oposta a exceção, à ação de reivindicação. Só após o trânsito em julgado da sentença é que se pode determinar a
restituição em consequência da divisão ou da demarcação (1.R Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, 28 de agosto de 1950).
Da sentença que julga a demarcação ou a divisão, quer seja de atendimento a reclamações quer puramente
homologatória, cabe recurso de apelação. No mesmo sentido, a 2.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, a 4 de setembro de 1951 (R. dos T., 194, 642), e a 4.~ Câmara Civil, a 4 de dezembro de 1952 (208, 343).
Se a sentença proferida na ação demarcatória (3.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de
dezembro de 1950, R. dos T., 190, 737), ou na ação de divio, apenas homologou a demarcação ou a divisão
conforme acordo é rescindível conforme o art. 486 do Código de Processo Civil. A 2.R Câmara Civil, a 20 de
maio de 1952 (R. dos T., 202, 273), não soube distinguir a sentença que apreciou controvérsias e a puramente
homologatória.
Nem sempre essa sentença homologa a declaração das partes. Nem isso se quadra com a sua natureza; nem a lei
poderá meter numa só classe a sentença na ação de divisão e a sentença na ação de demarcação. Homologação,
nesse ponto, alude a plano de divisão ou de demarcação, e não de declaração de vontade.

SEÇÃO III

Da divisão
Art. 967. com observância instruída com os vente, conterá 1):
A petição inicial, elaborada
dos requisitos do art. 282 e títulos de domínio do promo
1 a indicação da origem da comunhão e a denominação, situação, limites e características do imóvel2);
II o nome, o estado civil, a profissão e a residência de todos os condôminos, especificando-se os estabelecidos
no imóvel com benfeitorias e culturas 3);
III as benfeitorias comuns4).

1)REQUISITOS DA PETIÇÃO INICIAL. Além dos requisitos de que cogita o art. 282, tem a petição inicial,
na ação de divisão, de ser instruída com os títulos de domínio do promovente (aí, só se promove em divisão de
domínio) e conter:a origem da comunhão (porque não se divide o que não é comum), a denominação e a situação
do imóvel, os seus limites e características; o nome, o estado civil, a profissão e a residência de todos os
condôminos, especificando-se o que há no imóvel e quais as benfeitorias e culturas; as benfeitorias comuns. Há
benfeitorias que o co-proprietário, que tem posse de uma parte, ou não a tem senão em comum, mas usa e frui
pro diviso razão por que há benfeitorias feitas por um condômino que não se podem considerar comuns. É raro
acontecer em pequenos terrenos, mas isto ocorre em grandes extensões de agricultura, ou de pecuária, ou mesmo
de construções.
O Código de 1939, no art. 441, IV, falava de “indicacão dos interesses estabelecidos com benfeitorias próprias
ou comuns”, e o Código de 1973, art. 967, diz que a petição indica os condôminos “especificando-se os
estabelecidos no imóvel com benfeitorias e culturas”. Um e outro se referem aos condôminos que se
estabeleceram no imóvel, porém o Código vigente retirou, aí, a alusão a benfeitorias comuns. Com razão, porque,
se são comuns as benfeitorias, de modo nenhum se há de pensar em terem de ser mencionados os condôminos
estabelecidos no imóvel. As benfeitorias comuns podem ser feitas por todos, alguns ou algum dos condôminos,
porque a finalidade é oue importa. Surge, porém, um problema: se algum dos condôminos, que não se
estabeleceu no terreno, fez benfeitorias próprias (e. g., preparou iu~ar para barcos e instrumentos, com que se
pesca no rio ou na baia), ~ tem-se de pôr isso na petição inicial? Quer se trate de outro condômino, que é o autor
da ação de divisão, quer do condômino que fez as benfeitorias, tem de ser inserta a referência, porque talvez se
possa discutir se são próprias ou comuns as benfeitorias, mesmo se quem as fez não se achava estabelecido no
terreno. A expressão “estabelecidos” no artigo 967, II, como no Código anterior, era a respeito dos condôminos
que de algum modo se instalaram no imóvel. Também é conveniente que o autor diga na petição inicial que há
benfeitorias feitas por estranhos, tenham sido ou não com permissão dos condôminos, de alguns ou de algum.
Têm-se de indicar a causa e a origem da comunhão, porque então se pode saber se existe a pretensão a destacar
ou dividir, se depende de algum ato gerador, se depende de alguma cláusula negocial, ou se está sujeita aos
efeitos de alguma disposição de última vontade.
A designação do bem comum, de modo que se tenham a sua situação, o nome (se há), dimensão, confrontações,
circunscrição judiciária, qualidade do direito (domínio, enfiteuse etc.) e outros requisitos.
A descrição dos limites não precisa ser tão rigorosa quanto na ação de demarcação, posto que as divisões exijam
indicações de limites para se conhecerem as dimensões exatas. Por isso mesmo, a lei prevê a ação do terceiro
(art. 974), cujo terreno foi invadido pela divisão.
A juntada da planta pode ser útil.

2)INDIcAÇÕEs QUANTO AOS CONDÔMINOS . Número e nomes dos condôminos, inclusive se há alguma
parte ideal, subordinada a regime, à parte, de comunhão (comunhão engatada noutra); se incapazes, também os
dos seus representantes; se incapazes por motivo de idade, as suas idades exatas; as residências dos condôminos,
incapazes, ou não, e dos representantes.
Durante o processo da ação de divisão, ou mesmo antes, pode qualquer condômino promover a demarcação do
bem comum. Se já foram apontados os quinhões, ou mesmo se ainda só se discriminaram partes que podem ser
elemento para a divisão, não se pode negar o interesse na demarcação, com a sua eficácia típica. Se ocorre que os
outros condôminos que têm de ser citados pessoalmente residem fora da comarca, a citação é por edital (art.
953). Há o prazo devinte dias para a contestação (art. 954). Trata-se de ação embutida, de modo que o
procedimento está previsto no art. 955.
3)INTEREsSADOS COM BENFEITORIAS E CULTURAS. Indicação há de ser dos interessados por terem
benfeitorias; dos titulares de usufrutos, ou de outros direitos reais; dos prédios que tenham servidões sobre o
prédio a ser dividido e das servidões que tenha o prédio.
4) BENFEITORIAS COMUNS. Há aparente divergência entre o texto de 1939 e o de 1973. Naquele, falando-se
de benfeitorias, aludia-se a interessados estabelecidos com benfeitorias próprias e comuns (art. 441, IV); no de.
hoje, o art. 967, II, refere-se aos “estabelecidos no imóvel com benfeitorias e culturas”, e, no inciso III, às
benfeitorias comuns. Aquelas é que são as que o Código anterior chamava próprias. No art. 967, II, exigem-se os
dados sobre os titulares (indicação subjetiva); no inciso III, só os dados sobre as benfeitorias comuns (indicação
objetiva), porque a subjetividade é plural.

Art. 968. Feitas as Citações’) como preceitua o art. 953, prosseguir-se-a na forma dos arts. 954 e 9552)

1) PARTE NA AçÃO . Supõe-se relação de comunhão entre os figurantes. Mas, a divisão pedida pode ser
apenas quanto a um ou a alguns.
Para a ação de divisão, têm de ser citados todos os condôminos, porque são os interessados. A 2.~ Câmara Cível
do Tribunal de Justiça da Bahia, a 7 de junho de 1952 (E. dos T., da Bahia, 45,401), dispensou, contra a lei, a
citação edital dos condôminos desconhecidos. Infringiu o art. 177, 1, do Código de 1939, hoje art. 231, 1, do
Código de 1973, evidentemente. O art. 953 é apenas caso, a mais, que se subsume no art. 231, III, com caráter
facultativo.
2)REMISSÃO E REGRAS JURÍDICAS ANTERIORES. É preciso ter-se sempre em vista o conteúdo do art.
953 (art. 968): tal regra jurídica somente permitiu que se citasse por edital, sem os pressupostos do art. 231, 1 e
II, o que reside fora da comarca. Os que residem dentro da comarca têm de ser citados, segundo as regras
jurídicas ordinárias, pessoalmente.
Se o bem a ser dividido está na posse própria de terceiro e há dificuldade fáctica para se proceder à divisão, ou
a), o terceiro permite a entrada no terreno para o processo divisório e, então, se os que pretendem a divisão se
julgam com posse própria, ele se desinveste da posse própria, ou se opõe facticamente (cf. 4~a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de abril de 1951, R. dos T., 192, 751; 3.~ Câmara Civil, 16 de outubro de
1952, 207, 173), ou b), perante o juízo, entra com embargos de terceiro; ou c), o interessado na divisão tem,
primeiro, de reivindicar. O art. 953 (cf. art. 968) faculta a citação edital, a despeito de o condômino, que reside
fora da comarca, não estar na posição do citando a que se refere o art. 231, 1 e II. A citação pode ser por edital
ainda que resida o citando em lugar certo e sabido. o pressuposto necessário é não residir na comarca.
O art. 968 somente cogita de “condôminos”; portanto, da ação de divisão. Não da ação de demarcação, porque aí
os figurantes são confrontantes (cf. 3•~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 28 de dezembro
de 1951, E. dos T., 201, 461).
Na ação de demarcação, são citados todos os confinantes.
No caso de haver terras devolutas em confinidade, tem de ser citada a entidade estatal (1.R Câmara Cível do
Tribunal de Justiça da Bahia, 15 de julho de 1952, R. dos T., da Bahia, 46, 123).

DivisÃo (ARTS. 969-971) Na ação de divisão, como na de demarcação, têm de ser citados os possuidores
próprios e os impróprios, porque to dos são interessados (Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 7 de
abril de 1952, J. e D., VI, 79).

O confrontante terceiro não precisa alegar a nulidade do feito (sem razão, o Tribunal de Justiça de São Paulo, a
11 de outubro de 1904, S.P.J. 6, 164). É estranho; e processa a sua ação de reivindicação, sem que haja qualquer
eficácia de coisa julgada formal ou material contra ele.

A ação de divisão tem um autor, o que pede; tem réus. No Código, como no direito austríaco, não é,
necessariamente, judicium duplex, pode-se proceder à divisão, destacando-se a parte de um ou de alguns, e
deixando-se indivisas as partes dos outros. 172 Commun:onem vel socwtatem nemo coinpellitur invitus detineri;
nem, além disso, a sair da comunhão, ou da sociedade, contra a sua vontade, se não resulta da lei. Aí está um
ponto em que a ação de partilha, por sucessão causa mortis, e a de divisão, por dissolução da sociedade, se
distinguem da ação de divisão. O condômino A tem a pretensão a dividir, isto é, a destacar o que é seu; não a
dividir por todos. Isso só se dá se os outros também exercem a sua pretensão a destacar.

Na ação de demarcação, proposta por alguém contra condômino, os outros condôminos são litisconsortes. Mas o
litisconsórcio nas duas ações pode resultar de outra causa que a comunhão.

Se a ação de divisão foi intentada entre compossuidores próprios , ou entre compossuidores mediatos, ou entre
com-possuidores imediatos, a coisa julgada é só no que concerne a essa categoria de posse. A ação de divisão
entre três arrendatários de uma fazenda em nada atinge o proprietário ou o usufrutuário que a arrendou.
Art. 969. los arbitradores pela medição do Prestado o compromisso pee agrimensor’), terão inicio, imóvel, as
operações de divisão2).

1)CoMpRoMIsso PELOS ARBITRADORES E PELO AGRIMENSOR. Os arbitradores têm de prestar


compromisso, bem assim o agrimensor. Assumem responsabilidade perante o Estado, a Justiça, e perante as
partes. Só após isso, pela medição do imóvel, começam as operações de divisão.

2)MEDIÇÕES ANTERIORMENTE FEITAS E OPERAÇÕES INICIADAS. Se, por acaso, antes do


compromisso, ou mesmo antes da propositura da ação, já se haviam medido as terras ou iniciada ou terminada
algumas operações, ou alguma delas, as assinaturas com as datas, bastam a que se admitam os atos anteriormente
praticados como atos suficientes e eficazes.

Art. 970. Todos os condôminos serão intimados’) a apresentar, dentro em dez (10) dias, os seus títulos, se ainda
não o tiverem feito; e a formular os seus pedidos sobre a constituição dos quinhões.
Art. 971. O juiz ouvirá as partes no prazo comum de dez (10) dias 2) 3)~

Parágrafo único. Não havendo impugnação , o juiz determinará a divisão geodésica do imóvel; se houver, pro
ferirá, no prazo de dez (10) dias, 5) sobre os pedidos e os titulos que devam ser atendidos na formação dos
quinhões6).
1)INTIMAÇÃO DOS CONDÔMINOS. Todos os condôminos são intimados para que apresentem, no prazo de
dez dias, os seus títulos, se já não os apresentaram. Os títulos são os que correspondem à sua aquisição e, se os
há, os de aquisição por seus antecessores.
Têm de formular os pedidos concernentes àquilo que do bem imóvel lhes convém, fundamentando-o conforme as
preferências que a lei lhe atribui (e. g., benfeitorias comuns, ou particulares, servidões).

2) Dois PRAZOS. Um prazo é para a apresentação dos títulos e os pedidos atinentes aos quinhões. Outro é o
prazo para que sobre os títulos e os pedidos se manifestem. Aquele é para cada condômino intimado; esse,
comum a todos, contado do despacho do juiz.

3)PREcLusIvIDADE . Não se tendo impugnado no prazo do art. 971, cessou qualquer direito a impugnar (1.~
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 17 de agosto de 1942, R. dos T., 139, 686).
A decisão, que se profere na ação de divisão, sem a abertura do prazo do art. 971 (decisão que é inconfundível e
necessariamente anterior à do art. 966), é eivada de nulidade não-cominada, e são invocáveis as regras jurídicas a
respeito (cf. 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás, 18 de agosto de 1947, R. de J. B., 87, 94).
A 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo. a 17 de março de 1950 (R. dos T., 181, 200), decidiu
que os erros e injustiças, que acaso ocorrerem, não ficam cobertos pela não-impugnação por parte dos que teriam
de falar no prazo legal, mas isso está em contradição com o art. 979, onde se dá prazo para a audiência dos
interessados.

4)RAzõEs DE DIVERGÊNCIA ENTRE 05 INTERESSADOS. São razões de divergência: inexata avaliação dos
arbitrado , ou quanto ao imóvel todo, ou quanto a algum ou alguns quinhões; cálculo errado da área ou das
glebas; não se ter levado em conta a comodidade dos condôminos, de alguns ou de algum deles; não se ter
aludido à situação da morada ou das moradas, ou à situação das benfeitorias, etc.

5) RECURSO. Da decisão que manda proceder-se a novo cálculo para a partilha dos quinhões, decisão
inconfundível com a do art. 980, cabe agravo de instrumento. Não se trata de despacho de mero expediente, nem
extinção do processo (arts. 267 e 269).

6)IMPUGNAÇÃO E NÃO-IMPUGNAÇÃO. Se há alguma ou algumas impugnações, tem o juiz o prazo de dez


dias para decidir quanto aos títulos apresentados, ou a falta de algum ou de alguns títulos, ou insuficiência deles,
e sobre os pedidos que foram feitos.
Se não houve impugnação, desde logo o juiz determina a divisão geodésica do imóvel.

Art. 972. A medição será efetuada na forma dos artigos 960 a 963 1)•

Art. 973. Se qualquer linha do perimetro atingir benfeitorias permanentes dos confinantes, feitas há mais de um
(1) ano, serão elas respeitadas, bem como os terrenos onde estiverem, os quais não se computarão na área
dividenda 2)
Parágrafo unico. Consideram-se benfeitorias, para os efeitos deste artigo, as edificações, muros, cercas,
culturas e pastos fechados, não abandonados há mais de dois (2) anos3).

1) MEDIÇÃO . Os arts. 960-963 é que regem a espécie. Com as medidas que aí se prevêem sabe-se qual a
classificação e a natureza do terreno, quais os marcos e os terrenos confrontantes. É possível que os condôminos
já tivessem procedido à demarcação, o que assaz simplifica as medidas de divisão. Se não a levaram a cabo,
podem surgir problemas, como os que o art. 974 prevê e os que resitam da incidência do art. 973.

2)BENFEITORIAS FEITAS PELOS CONFINANTES. O Código de 1973, no art. 973, criou incolumidade
processual que merece muita atenção e interpretação.
O art. 973 exige o respeito das benfeitorias feitas há mais de um ano, no terreno dividendo, que a linha dos
perimetros não as atinja, chegando ao ponto de retirar do bem comum a parte de que, com as benfeitorias, se
apossou o confinante. Pergunta-se: <,a) perderam, com isso, os condôminos a propriedade que lhes tocava
quanto à extensão em oue estão, há mais de um ano, as benfeitorias permanentes; ou b) apenas se deixou a
alguma ação de reivindicação, ou de vindicação da posse, ou ação possessória, a defesa dos direitos dos
condôminos? A solução a) seria a de interpretar-se o art. 972 como regra jurídica de direito civil, derrogativa do
art. 547 do Código Civil: “Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do
proprietário, as sementes, plantas e construções, mas tem direito à indenização. Não o terá, porém, se procedeu
de má-fé, caso em que poderá ser constrangido a repor as coisas no estado anterior e a pagar os prejuízos”. No
art. 548 está dito: “Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes, plantas e
construções, com encargo, porém, de ressarcir o valor das benfeitorias”. No parágrafo único: “Presume-se má-fé
no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura se fez em sua presença e sem impugnação sua”.
Oart. 973 como que considera de má-fé os condôminos que não se opuseram, dentro de um ano, às benfeitorias
feitas
pelo confinante, ou pelos confinantes, e dá a quem as fez o
direito de propriedade sobre a parte do terreno. Mas tal interpretação é de repelir-se. O que se evitou foi a
transformação da ação de divisão em ação dúplice, de divisão e de vindicaç ão. Se ainda não decorreu um ano,
em vez da impugnação, a lei permitiu que a divisão apanhe as benfeitorias e se compute na área dividenda o
terreno em que o confinante fez as benfeitorias. Com essa solução, que diremos c), deixamos no plano do direito
processual a regra jurídica do art. 973.
No final do art. 973 diz-se que se não computam na área dividenda os terrenos onde estiverem as benfeitorias.
Primeiramente, atenda-se a que se trata de benfeitorias permanentes dos confinantes, e não dos condóminos.
Estamos na Seção III (Da divisão). Condôminos, que pedem divisão, não s~o confinantes, posto que, se algum ou
alguns deles têm terreno vizinho, possam ser condôminos e confinantes. As benfeitorias permanentes que o
confinante, que também é condômino, fez no terreno dividendo, e a linha do perímetro as atingiu, ficam com a
proteção do art. 973.
Assim, os terrenos em que ocorreram há mais de um ano as benfeitorias passam ao confinante.

3)ESPÉCIES DE BENFEITORIAS. Para os efeitos do art. 973, o parágrafo único limitou o conceito de
benfeitoria permanente: edificações, muros, cercas, culturas e pastos fechados. Se quem as fez, há mais de um
ano, está incluido no art. 973, deixa de o ser se abandona a construção, o muro, a cerca, a cultura ou pastos
fechados, por mais de dois anos. As ações que se fundam nos arts. 547 e 548 do Código Civil podem ser
propostas. O critério é outro.
Quando se diz, no art. 973, que às benfeitorias a serem respeitadas se exige terem sido feitas há mais de um ano,
havemos de somente considerar inicio do prazo de mais de um ano a data em que se ultimou a edificação, o
muro, a cerca, a cultura e os pastos fechados. Isso não afasta que uma edificação, ou um muro, ou uma cultura,
ou um pasto fechado, se tenha levado a cabo, posto que outro edifício próximo, ou outro muro (ou continuação
do que se tivera como permanente e definitivo, ou outra cultura, ou outro pasto fechado), não se haja terminado.
Se as benfeitorias foram feitas na área vizinha há mais do que se exigiria para aplicação do art. 973, mas, após a
consumação delas, o confinante ou sucessor dele as abandonou há mais de dois anos, o que prevalece é a linha do
perimetro que se fixou na ação de divisão.

Art. 974. E licito aos confinantes do imóvel dividendo demandar a restituição dos terrenos que lhes tenham sido
usurpados 1)

§ 1.0 Serão citados para a ação todos os condôminos, se ainda não transitou em julgado a sentença
homologatória da divisão; e todos os quinhoeiros dos terrenos vindicados, se proposta posteriormente 2)

§ 29 Neste último caso terão os quinhoeiros o direito, pela mesma sentença que os obrigar à restituição, a haver
dos outros condôminos do processo divisório, ou de seus sucessores a título universal, a composição pecuniária
proporcional ao desfalque sofrido 3),

1)USURPAçÃO DE TERRENOS EM CASO DE AÇAO DE DIvIsÃo. Um dos elementos para a petição inicial
na ação de divisão é a indicação da situação e dos limites do imóvel. Depois, os arbitradores e agrimensores
procedem à medição do imóvel e às operações de divisão, O traçado dos limites pode basear--se em título de
propriedade, ou só de posse, pois compossuídores também podem propor ação de divisão. Se as linhas
invadem terreno do confinante ou dos confinantes (também eles podem ser condôminos), quem foi ofendido ou
os que foram ofendidos por isso têm a ação de restituição. Foi bom que se empregasse a expressão “restituição”
(Código de 1973, art. 974), em vez de “reivindicação”, que se achava no Código de 1939, art. 417. O próprio
confinante ou os próprios confinantes que são possuidores têm legitimação ativa, tendo de ser citado o
proprietário, ou de serem citados todos os co-proprietários, e também possuidor mediato ou possuidores
mediatos, se os há. Trata-se de litisconsórcio necessário (art. 47 e parágrafo único).
No Código de 1939, o texto era um só para os casos de vindicação na ação de demarcação e na de divisão. Só
havia o art. 417 e parágrafo único. No Código de 1973, o art. 948 referiu-se à ação de demarcação, que têm os
confinantes para “vindicarem os terrenos de que se julguem despojados”, e o art. 974 dedicou-se à usurpação aos
confinantes do imóvel dividendo. O art. 974, § 2.0, repetiu o art. 417, parágrafo único, do Código de 1939. Tem-
se, pois, de ler o que escrevemos sob o art. 948, por haver muito de comum aos arts. 948 e 974 do Código de
1973.

2)CITAÇÕES. Se ainda não transitou em julgado sentença na ação de divisão, têm de ser citados todos os
condôminos, porque os figurantes autores são titulares de partes indivisas. Falta a eficácia sentencial, que só a res
iudicata produz. Há pluralidade, aí, na mesma relação jurídica processual, de réus, e não só litisconsórcio. Se já
ocorreu o trânsito em julgado, o litisconsórcio é necessário: não há mais condomínio; cada um dos quinhoeiros é
citado. Pode ser que o terreno vindicado só esteja num quinhão, ou em alguns, ou em todos, razão por que foi
redigido o art. 974,2.0.

3)RESSARCIMENTO AOS ATINGIDOS PELA SENTENÇA DE RESTITUIÇÃO. Se só um ou alguns dos


réus foram atingidos pela sentença favorável ao confinante, ou aos confinantes, o outro quinhoeiro ou os outros
quinhoeiros, que não tiveram de restituir, são legitimados passivos a prestar em dinheiro o que receberam a mais.
No processo, tem-se de proceder à avaliação do desfalque sofrido, para que se determine, na mesma sentença, a
composição proporcional.

Podem os confinantes do imóvel pedir fora da ação de divisão, portanto em ação própria, a restituição de terrenos
que lhes foram usurpados (a usurpação pode ser de domínio, de direito real limitado que tem posse, ou de posse).
Se houve a decisão de restituição e, pelo exame dos fatos, se verifica que outro condômino ou outros
condôminos sofreram com a decisão, na mesma sentença tem o juiz de Obrigação os que receberam mais do que
deveriam receber no processo divisório a prestar aos quinhoeiros condenados ou ao quinhoeiro condenado a
quantia, em dinheiro, proporcional ao que sofreram com a decisão favorável ao demandante ou aos demandantes
da restituição
São réus na ação do art. 974: a) se já transitou a sentença do art. 979, os quinhoeiros dos terrenos a que se liga a
restituição; b) se ainda não transitou, todos os condôminos porque ainda o são. Se algum dos quinhões couber a
duas ou mais pessoas, têm de ser citados os condôminos do quinhão.

Art. 975. Concluídos os trabalhos de campo levantar~~ o agrimensor a planta do imóvel e organizará o
memorial descritivo das operações, observado o disposto nos arts. 961a 9631) 2) 3),

~1.~’ A planta assinalar.~ também:

1 as povoações e vias de comunicação existentes no imóvel;


Ii as construções e benfeitorias, com a indicação dos seus fins, proprietários e ocupantes;
III as águas principais que banham o o imóvel;
IV a composição geológica, qualidade e vestimenta dos terrenos, bem como o valor destes e das culturas.
§ 2.0 O memorial descritivo indicará mais:
1 a composição geológica, a qualidade e o valor dos terrenos, bem como a cultura e o destino a que melhor
possam adaptar-se;
li as águas que banham o imóvel, determinando-lhes, tanto quanto possível, o volume, de modo que se lhes possa
calcular o valor mecânico;
III a qualidade e a extensão aproximada de campos e matas;
1V as indústrias exploradas e as suscetíveis de exploração;
V as construções, benfeitorias e culturas existentes, mencionando-se os respectivos proprietários e ocupantes;
VI as vias de comunicação estabelecidas e as que devam ser abertas;
VII a distância aproximada à estação de transporte de mais fácil acesso;
Viii quaisquer outras informações que possam concorrer para facilitar a partilha.

1>CONCLUSÃO DOS TRABALHOS DE CAMPO, PLANTA DO IMóVEL E MEMORIAL. Concluídos os


trabalhos de campo, levanta o agrimensor a planta do imóvel e organiza o memorial
descritíveis das operações. A planta tem de satisfazer as exigências do art. 961 e têm de ser conhecidos os marcos
conforme o art. 963.
2)DIvisÃo GEOMÉTRICA E DIVISÃO ECONôMICA OU ESTÉTICA OU COM OUTRA RAZÃO. A divisão
do bem comum pro indi-viso nem sempre há de ser geométrica; pode ser econômica ou estética, como ocorre se
de uma parte se tem vista excelente e de outra ou de outras nada se pode ver que mereça escolha. Se as terras são
na fronteira do Brasil e de outro Estado, a distinção pode ser de caráter político (e. g ., B não quer ter domicilio
no estrangeiro, ou no estrangeiro não quer plantar ou instalar empresa). A divisão é, de ordinário, pelo valor. Há
bens de valor uniforme, mas há também bens comuns pro indiviso em que a diversidade de valor econômico,
estético, ou político, ou outro qualquer obriga a divisão que se afaste da garantia. Em se tratando de terras de
igual valor, há uniformidade pelo menos dentro das futuras glebas, dividem-se as quotas conforme as quotas dos
comuneiros, de acordo com o que dizemos na nota 3) ao art. 977.
Se as terras são de valor desigual, estudará o agrimensor o meio de caberem, nos quinhões geometricamente
determinados, terras de diferentes valores, ou alterando os tamanhos geométricos para que se atenda ao maior ou
menor valor das terras. A função do agrimensor é apenas de fixar áreas; e. g., se os quinhões são três de um
oitavo, dois de um quarto e dois de dezesseis avos, formar áreas de oitavos e dezesseis
avos ou de quartos. Os peritos é que dividem, atendendo à comodidade de cada parte. Com esses elementos
decide o juiz, determinando a quem devem pertencer as glebas.

Na divisão de terras, posto que seja função dos peritos classificar as glebas de valor diferente, dando-lhes o valor
que elas tenham por unidade de medida, é aos agrimensores que cabe calcular-lhes a dimensão e o valor total (cf.
2.~
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 1.0 de agosto de 1951, R. F., 141, 350).

O retalhamento de quinhões há de ser evitado, porque, além de ser contrário à comodidade dos proprietários,
reduz, quase sempre, a aproveitabilidade econômica. Mas pode ser inevitável se, sem ele, se quebraria a
igualdade na partilha (cf. 6.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de fevereiro de 1951, R. dos
T., 191, 739, R. F., 146, 324).

3) DECISÃO DO JUIZ. O juiz decide; não tem arbítrio na determinação do que deve ser adjudicado ao que
pediu o destacamento, ou aos que pediram e aquiesceram, ou a todos. Tem de atender àquela comodidade que se
recomendou ao perito, à situação das moradas e benfeitorias de cada condômino, além de evitar que ao mesmo
condômino se adjudiquem glebas separadas.

É possivel que se proceda à divisão, destacando-se a parte de um ou de alguns, e deixando-se, já dissemos,


indivisas as partes dos outros. Na ação de partilha, que se refere aos bens e dívidas que provieram do morto, o
que se entrega, definitivamente, a A pode ser a ou b. Alguns herdeiros podem ter, por testamento, determinados
bens, o que acontece com os legatários. Na divisão, um condômino pode, sozinho, pedir o que é seu; ou alguns o
que deles é; ou todos, pedirem o todo, o que leva à divisão do todo.

Art. 976. Durante os trabalhos de campo procederão os arbitradores ao exame, classificação e avaliação das
terras, culturas, edifícios e outras benfeitorias, entregando o laudo ao agrimensor 1)

Art. 977. O agrimensor2) avaliará o imóvel no seu todo, se os arbitradores reconhecerem que a homogeneidade
das terras não determina variedade de preços3); ou o classificará em áreas, se houver diversidade de valores.

1)ARBITRADORES E TRABALHOS DE CAMPO. Os arbitradores têm de proceder ao exame, à classificação


e à avaliação das terras. Nem todas as partes de bem em comum são sempre da mesma classe e do mesmo valor,
de modo que a discriminação ainda se faz em bem indiviso, porque as partes ideais em bem imóvel não só se
referem ao tamanho, mas sim à classe do bem, das partes materiais dos bens e do valor que lhes toca. Ainda não
se está a partir, mas apenas na fase de exame, classificação e avaliação da res indivisa e do que a perfaz.

2)FUNÇÕES DOS ARBITRADORES E DO AGRIMENSOR. Os

arbitradores examinam, classificam e avaliam as terras; o agrimensor calcula as áreas, elemento indispensável
àquela avaliação, se há diversidade de valores. O cálculo em separado só se refere aos quinhões a serem
destacados; a todos, se todos os comuneiros querem extinguir a relação jurídica de comunhão. O cálculo do
agrimensor pode ser da área toda e da área ou áreas a serem destacadas.

3)DívísÃo GEOMÉTRICA E DIVISÃO ECONOMICA. A divisão do bem comum pro indiviso não é sempre
geométrica; e sim econômica. Se assim não foi, ter-se-ia extinção da comunhão a respeito de bem comum pro
diviso, ou de bem de valor uniforme. É divisão segundo o valor, em vez de divisão geométrica. No caso de se
tratar de terras de valor igual, uniforme, pelo menos dentro das futuras glebas, não se tem
mais do que considerar (“avaliará” está em sentido abstrato) o imóvel todo, e dividi-lo em glebas conforme as
quotas dos comuneiros.

Art. 978. Em seguida os arbitradores e o agrimensor proporão, em laudo 1) fundamentado, a forma da divisão,
devendo consultar2), quanto possível, a comodidade das partes, respeitar, para adjudicação a cada condômino,
a preferência dos terrenos contíguos 3) às suas residências e benfeitorias e evitar o retalhamento dos quinhões
em glebas se paradas4).
§ 1.0 O cálculo será precedido do histórico 5) das diversas transmissões efetuadas a partir do ato ou fato
gerador da comunhão,atualizando-se os valores primitivos 6)~
§ 2.0 Seguir-se-ão, em títulos distintos, as contas de cada condômino, mencionadas todas as aquisições e
alterações em ordem cronológica, bem como as respectivas datas e as folhas dos autos onde se encontram os
documentos correspondentes.
§ 30 O plano de divisão será também consignado em um esquema gráfico7).

1)LAUDO . O laudo tem de ser fundamentado, com preciso atendimento dos arts. 960-963, 973, 975 e ~ § 1.0 e
2.0, 976-978.

2)RECOMENDAÇÕES AOS ARBITRADORES E AGRIMENSOR.


Devendo “consultar”, diz o art. 978, “quanto possível, a comodidade das partes”. Comodidade: localização da
morada e espécie do meio de vida; águas para a casa, ou aguadapara gado; lenha; queda de água. Algum ou
alguns dos comuneiros podem propor a comunidade de alguma cascata, ou rio, ou terreno em que vai construir
edifício. São apenas exemplos. Se todos acordam, há ato comum (declaração de vontade), a que o juiz deve
atender.
As vezes no interior do Brasil, freqüentemente os condôminos ou compossuidores já ocupam glebas, sem
caráter de divisão do bem ou da posse. Apenas cada um tomou a seu cargo uma parte divisa, como simples
solução tácita para o exercício dos direitos de comuneiros. Não houve acordo para a divisão do bem, nem a
referência a esse fato se há de interpretar como acordo em juízo, que se haja de homologar. Em todo caso,
atender a essa divisão puramente fáctica é uma das recomendações para se levar em conta a “comodidade” das
partes. Por vezes, o estado que existia é elemento para a boa interpretação das circunstâncias.

3)CONTIGUIDADE E QUINHÕES. O fato de ser parte do terreno contíguo a terreno, em que está a residência
de algum dos condôminos, faz nascer-lhe direito de preferência, de que se irradiam pretensão e ação. O art. 978,
in une, de algum modo cria direito de ordem material, e não só processual. Mas, é conveniente que se dê
interpretação mais larga à regra jurídica: o direito de preferência não somente concerne à contigúidade dos
terrenos, nem só a existência de benfeitorias que a comuneiro ou alguma pessoa a que se sucedeu fez na parte do
terreno em divisão. A preferência pode resultar de ser o lugar aquele em que o condômino não reside, mas onde
fez, por exemplo, plantações ou tem algum posto de gasolina, ou de vendas de frutas.

4)GLEBAS SEPARADAS. Em princípio, tem-se de atribuir a cada condômino quinhão de terra, que seja uma
só parte do terreno. A entrega de uma porção aqui e outra ali, ou outras ali, cuja soma perfaça o quinhão, é
desaconselhável e podem manifestar-se contra uns os outros condôminos ou o próprio condômino a que se quer
entregar quinhão retalhado em glebas.

5)HISTÓRICO DAS AQUISIÇÕES . Antes do cálculo tem--se de mencionar, com os documentos, as


transmissões ou única transmissão de que proveío a comunhão. Têm-se de atualizar os valores pelos quais houve
a aquisição pelos condôminos, separadamente ou juntos. O valor total há de ser o do momento do cálculo.

6)MENÇÕES. Têm de ser mencionados, em ordem cronológica, todos os títulos aquisitivos de cada condômino.
A referência há de ser às respectivas datas e às folhas dos autos a que foram juntos os documentos.
7)PLANO DE DIVISÃO . O plano de divisão, em esquema gráfico, é algo de punctaçáo . Ainda não se dividiu,
nem se está a dividir; planeja-se, para que as partes se manifestem.

Art. 979. Ouvidas as partes, no prazo comum de dez (10) dias, sobre o cálculo e o plano da divisão 1),
deliberará o juiz a partilha. Em cumprimento desta decisão, procederá o agrimensor, assistido pelos
arbitradores, à demarcação dos quinhões, observando, além do disposto nos arts. 963 e 964, as seguintes
regras:

1 as benfeitorias comuns2), que não comportarem divisão cômoda, serão adjudicadas a um dos condôminos
mediante compensação;

Dívís~o (ART. 979)


11 instituir-se-ão as servidões, que f orem indispensáveis3), em favor de uns quinhões sobre os outros, incluindo
o respectivo valor no orçamento para que, não se tratando de servidões naturais, seja compensado o condômino
aquinhoado com o prédio serviente;
Iii as benfeitorias particulares4) dos condôminos, que excederem a área a que têm direito, serão adjudicadas ao
quinhoeiro vizinho mediante reposição;
IV se outra coisa não acordarem as partes, as compensações e reposições serão feitas em dinheiro5).

1)AUDIÊNCIA DAS PARTES E PRAZO. O plano de divisão já foi feito. Têm de ser ouvidas as partes, no
prazo comum de dez dias, sobre o cálculo e sobre o plano de divisão . Nenhum quinhão foi atribuído, de modo
que, para todos os efeitos, persiste a res indivisa. Só a sentença, com a coisa julgada, divide o bem imóvel. Aliás,
se os quinhões são desiguais, desde cedo se sabe quais os condôminos que os vão receber. Sobre o plano de
divisão falam os interessados em dez dias. Não havendo impugnação, divide-se o imóvel. Mas, tudo isso ainda
depende da observância dos arts. 979-981. Há a deliberação da partilha; há a demarcação dos quinhões; há o
memorial descritivo; há novas manifestações das partes de acordo com o art. 965; há o auto de divisão, assinado
pelo juiz, pelo agrimensor e pelos arbitradores; finalmente, a sentença do juiz, que é homologatória da divisão.

2)BENFEITORIAS COMUNS. O art. 979, 1, atendeu a que pode ser nociva, incômoda, ou desaconselhável a
divisão de benfeitorias comuns. A solução que a lei apresenta é a de serem adjudicadas a um dos condôminos,
que há de pagar o valor calculado.

3)SERVIDõES INDISPENSÁvEIS. Se é indispensável a algum dos quinhões, ou a alguns dos quinhões, a


servidão sobre outro, ou outros quinhões, tem de ser respeitada (e. g., não havia saida para a rua sem a servidão
de passagem do quinhão A, ou do quinhão A e B, ou A, B e C, sobre o quinhão D; os habitantes do quinhão A
teriam de passar pelo quinhão B, C e D, ou os habitantes do quinhão A e B teriam de passar pelos quinhões C e
D).
Tem-se de fixar o respectivo valor, que é o correspondente ao prejuízo do quinhão, ou dos quinhões servientes.
Quando se faz direito real limitado, não se limita o conteúdo do direito de propriedade, porque o domínio é o
direito sobre todo o conteúdo, embora esse se restrinja, quanto ao exercício, pelo fato de se constituir direito real
limitado. O conteúdo do domínio é usus, fructus e abusus, ainda que se haja constituído enfiteuse, usufruto, uso
ou habitação. Por isso é que, cessado qualquer deles, a restrição é riscada e se dá o que se assentou em chamar
consolidação. Passa-se o mesmo quanto às servidões: o conteúdo do domínio continua o mesmo, mas “restringe-
se” pela retirada de elemento com que se compõe o direito de servidão. Esse é ponto da maior importância. Nem
usufruto, nem uso, nem habitação, nem servidão, e até mesmo enfiteuse limita, isto é, diminui o conteúdo do
direito de propriedade:
só o restringem no tocante ao exercício, O dono do prédio perde o usus a favor do usufrutuário, ou do usuário, ou
perde a habitatio, a favor do habitador mas o que ele perde é exercício do direito de domínio, não “conteúdo”.
Restrição a conteúdo não é restrição a exercício, porque não se dá a cisão, o corte no conteúdo; somente ocorre a
determinação de linha que corresponde à restrição. Muito diferente é o que acontece quando a lei limita o
conteúdo, quando o conteúdo diminui: era C e passou a ser O menos 1.
Os direitos da vizinhança são direitos que correspondem a limitações do conteúdo do direito de propriedade.
Mas há outros direitos, sem serem os de vizinhança, que o limitam. Quando se diz que se estabelece servidão
supõe -se estar incólume o conteúdo do direito de propriedade; apenas se restringe o seu exercício. Porque usus é
exercício, fructus ê exercício, abusus é exercício. Com a enfiteuse, restringe-se o exercício do domínio; com o
usufruto, o uso e a habitação, restringe-se o exercício do domínio; idem as servidões. A incolunúdade do
conteúdo dominical continua. Daí ser de sérias conseqúências a confusão entre limitação e restrição. A limitacão
somente pode ser por lei. A restrição pode ser por ato dos particulares ou do Estado, ou por lei. Quando algo se
tira ao conteúdo do direito da propriedade, o conteúdo não é como seria se não tivesse havido a limitação Muito
diferente é o que acontece quando, em vez de se diminuir o conteúdo, se restringe o conteúdo, quanto ao
exercício, para se compor o objeto de alguma relação jurídica, que se considera direito real limitado.

Na evolução da técnica jurídica, vão permanecendo pelo caminho juristas cuja mentalidade, em vez de vir em
linha de aperfeiçoamento técnico do direito romano para os nossos dias, herdaram a confusão pós-romana entre
direitos limitativos do conteúdo do direito da propriedade (direitos que existem porque onde eles existem não
existe direito de propriedade) e direitos reais limitados que são direitos que existem, como direitos reais, posto
que não diminuam (não limitem) o conteúdo mesmo do direito real.
Os direitos que se podem colocar no espaço que seria parte do conteúdo se o conteúdo não houvesse sido
limitado (direitos limitativos, chamamos-lhes) são direitos que não entram no direito de propriedade, pois estão
fora: esbarram de encontro ao conteúdo desse. Ou são direitos formados, ou são direitos formativos. Se são
direitos formativos, criam-se situações como que ondulantes, pois o conteúdo se retrai, se o titular do direito
formativo o exerce, ou se dilata, se o titular o não exerce. Juristas formados em séculos pós-romanos e
impermeáveis às críticas que se fizeram a esses séculos de confusão entre direitos limitativos e direitos restrin
gentes (direitos reais limitados) continuaram, por exemplo, a ver servidão onde o que havia era direito limitativo.
De inre condendo, tudo aconselharia a que só se vissem servidões onde não há direito formado de incursão, nem
direito formativo, isto é, quando não se pudesse pensar em limitação ao conteúdo do direito de propriedade.
Infelizmente, de lege lata, por persistência de mentalidades híbridas, se mencionam “servidões” onde se limitou
o conteúdo do direito de propriedade. Se houve limitação do conteúdo do direito de propriedade, há contradição
em se falar de servidão, que é direito sobre o conteúdo.

4)BENFEITORIAS PARTICULARES. Se a benfeitoria não é comum, ou a) ela fica com quem a tem, isto é, no
quinhão de quem a adquiriu de outrem, ou a fez, ou b) ou ela excedeu o que cabe no quinhão de quem a adquiriu,
ou a fez,e tem-se de atribuir ao vizinho, ou aos vizinhos, o excesso da benfeitoria, razão por que tem de haver
ressarcimento.

5) PAGAMENTOS. O que se há de ressarcir pode ser em terras ou outros bens. Se não chegaram a acordo as
partes interessadas, entende-se que a prestação há de ser em dinheiro.

Art. 980. Terminados os trabalhos e desenhados na planta os quinhões 1) e as servidões aparentes, organizará o
agrimensor o memorial descritivo. Em seguida, cumprido o disposto no art. 965, o escrivão lavrará o auto de
divisão, seguido de uma folha de pagamento para cada condômino. Assinado o auto pelo juiz, agrimensor e
arbitradores, será pro ferida sentença homologatória da divisão2) 3)~

§ 1.0 O auto conterá:


1 a confinação e a extensão superficial do imóvel4);
II a classificação das terras com o cálculo das áreas de cada consorte e a respectiva avaliação, ou a avaliação
do imóvel na sua integridade, quando a homogeneidade das terras
não determinar diversidade de valores 5);
III o valor e a quantidade geométrica que couber a cada condômino, declarando-se as reduções e compensações
resultantes da diversidade de valores das glebas componentes de cada quinhão6).

§ 2/’ Cada folha de pagamento 7) conterá:


1 a descrição das linhas divisórias do quinhão, mencionadas as confinantes;
II a relação das benfeitorias e culturas do próprio quinhoeiro e das que lhe forem adjudicadas por serem
comuns ou mediante compensação;
Iii a declaração das servidões instituidas, especificados os lugares, a extensão e modo de exercício.

1)DESENHADOS NA PLANTA. Após os trabalhos a que antes nos referimos e desenhados na planta os
quinhões e as servidões que podem ser desenhadas, o agrimensor faz o memorial descritivo. Sobre isso, têm de
manifestar-se as partes no prazo comum de dez dias. Diante do que disseram e mesmo do que ao juiz ocorreu
atender, tem ele de ordenar que se façam correções e retificações, que sejam necessárias. A necessidade preexclui
o arbítrio do juiz.
O escrivão lavra o auto de divisão, a que há de seguir a folha de pagamento para cada condômino. Assinam-no o
juiz, o agrimensor e os arbitradores Após isso, há a sentença dita de homologação da divisão.

2)SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DA DIVISÃO . 0 que ficou estabelecido, conforme as medidas tomadas e


a manifestação das partes, tem de ser homologado. No intervalo, antes da sentença, algo pode ter ocorrido ou
sido descoberto que crie problemas.
Se, por exemplo, a área, a que se referem os limites conforme os títulos, não corresponde a área que se vai
dividir, ou há falta ou há excesso de terreno, em ambas as espécies (ali, diferença negativa; aqui, positiva) tem-se
de procede! à distribuição proporcional do que falta, ou do que é excesso. Não importa qual a causa da falta (má
descrição de terreno dividendo, má-fé do alienante, usucapião de trato de terra por vizinho ou outrem, inclusive
qualquer dos condôminos).
Os comuneiros têm pretensão e ação de evicção contra o alienante, na proporção do que lhes diminui nos
quinhões, se ainda pode ser exercida (cf. ~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 10 de janeiro de
1953, Paraná J., 57, 299).
As sobras de terras, que se encontram a mais na área dividenda, isto é, dentro dos limites a que se referem os
títulos, dividem-se proporcionalmente aos quinhões, porque são partes deles. Se a divisão abrange a área em que
se juntam lotes e partes ideais em terras não loteadas, em verdade demarca-se e divide-se, de modo que o excesso
só se entende como parte do que não foi loteado ou alienado como lote. Sem razão a Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Ceará, a 16 de junho de 1952 (J. e D., 15 de abril de 1951, J. e D., VII, 113).
Antes, no art. 979, falou-se da deliberação da partilha, o que mostra a inserção do ato judicial antes mesmo da
sentença do art. 980, que homologa a divisão. Há algo semelhante ao que se passa no tocante a sucessões, com a
deliberação da partilha.
Quem somente parte, não divide. Quem divide, não somente parte. Quem parte e separa as partes de si, ou
algumas ou uma, parte e divide. A divisão supõe que se multiplique: em vez de um só bem, dois ou mais. A
partilha, em que não se divide, deixa permanecer a integridade do bem ou dos bens. A deliberação, a que se
refere o art. 979, é, portanto, de1iberação de divisão, e não deliberação de partilha. No art. 979, cogita-se de
despacho de deliberação de partilha, ou melhor, de divisão, porque se está a deliberar divisão, e não partilha.
Quaisquer apreciações que faça o juiz é sem compicta cognição, porque a sentença de homologação de divisão é
a decisão do art. 980. Daí caber no intervalo produção de provas pelos interessados (cf. 1.a Câmara Cível do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 22 de junho de 1950, IikF., 146, 330).

3)NATUREZA E EFICÁCIA DA SENTENÇA. A sentença é executiva e tem efeito constitutivo. Tem força de
executividade, à semelhança das outras resoluções adjudicatórias, além da força de coisa julgada formal.

A decisão não tem efeitos contra terceiros, nem mesmo constitutivos (RUDOLF POLLAK, System, 1024). Em
todo caso, cumulada com a de vindicativo fundi, os efeitos da sentença sobre o pedido prejudicial podem atingir
opoentes e outros intervenientes.
Tratando-se de divisão, se houve ressalva da ação de reivindicação, ou se não se julgou da validade dos títulos,
inclusive usucapião, a eficácia de coisa julgada é somente quanto à declaração dos quinhões, e não sobre o
direito de propriedade. Por isso mesmo não se pode dizer, a priori, como fez a í.a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais a 17 de agosto de 1950 (R.F., 140, 314), que a decisão sobre a divisão faz coisa julgada
material sobre o domínio.
Somente após a observância dos arts. 978 e 979 é que incide o art. 965. Aqueles artigos, especiais à divisão, têm
de ser udos como se constassem do texto antes do art. 965.
O prazo que vem depois para que sejam ouvidos os interessados é o do art. 965, findo o qual o juiz pronuncia a
sentença do art. 980. Somente após ela é que pode o escrivão extrair certidão da folha de divisão, dita, na
linguagem do foro, folha de pagamento, à semelhança do que ocorre com a partilha de herança.
Nenhum dos despachos e assinaturas que se passam durante as operações é suscetível de recurso, salvo se se
compõe pressuposto para agravo de instrumento, ou se há decisão estranha à matéria. Por exemplo, o despacho
pelo qual o juiz aprova o critério concernente às sobras é irrecorrível (cf. 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça
de Minas Gerais, 5 de abril de 1951, R.F., 140 e 320).
Da sentença homologatória cabe o recurso de apelação.
A sentença homologatória é executiva. Os que a dizem declarativa são vítimas de discussões doutrinárias já
superadas. Tem eficácia imediata de declaração, porém não força:
a força é executiva. Já é tempo de a jurisprudência não empregar velhos temas (e. g., 2.~ Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 13 de novembro de 1951, R. dos T., 197, 242).

A certidão da sentença de divisão ainda não tem a eficácia real da operação feita. Tem-se de transcrever. Só o
registro põe termos à indivisão. Daí não ser exato que a certidão, ainda não transcrita, já goze da presunção de
que fala o art. 859 do Código Civil. Os exames e pronunciamentos do juiz a respeito de títulos ao portador com o
trânsito em julgado das decisões somente têm eficácia executiva e declaratória inter partes. Não se lhes pode
atribuir eficácia erga omnes (e. g., 3~O Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de São Paulo, 6 de junho de 1952,
R. dos T., 203, 142).

4)SITUAÇÃO E EXTENSÃO DO IMÓVEL. O primeiro elemento essencial é o que se refere à situação do


imóvel, porque assim se sabe o que é e com que confina. Em seguida a extensão da superfície.

5) CLASsIFIcAçÃo DAS TERRAS. Para se classificarem os terrenos dividendos tem-se de atender à sua
extensão e qualidade, e à avaliação do todo, se não há diversidade de valores conforme as partes do terreno. Se
há distinguibilidade, o valor é conforme cada porção. Tem-se de calcular a área de cada condômino.
mas nem sempre foi feita, durante as operações para a divisão, suficiente demarcação dos quinhões entregues. O
art. 952 trata da legitimação ativa dos condôminos para a ação de demarcação do imóvel comum, citando-se os
litisconsortes; o art. 955 refere-se ao procedimento, se há ou se não há contestação.

2)REMISSÃO Às REGRAS JURÍDICAS 5OBRE DEMARCAÇÃO . A remissão que se faz no art. 981 aos
arts. 952 a 955 é para que, por analogia, se permita a ação de demarcação, com aquelas regras jurídicas
processuais, antes ou a despeito de a divisão já estar feita.
6)REDUÇÕES E RESSARCIMENTOS. O que se prevê é a homogeneidade das áreas, razão por que pode ser
feita somente conforme quantidade geométrica a divisão das terras. Se tal não ocorre, porque uma área vale mais
do que a outra, quem com isso perderia tem direito a que se lhe preste o valor diminuído.

7) FOLHA DE PAGAMENTO. Uma vez que pagamento somente ocorre se não houve tratamento igualitário,
devido ao valor único das terras, têm-se de descrever as linhas divisórias de cada quinhão, com a referência das
linhas confinantes. Depois, qualquer dado que haja levado a prestação ou a prestações, como acontece se houve
adjudicação de terras ou de benfeitorias, ou instituição de servidões. Tem-se de caracterizar, com clareza e
precisão, cada servidão.

Art. 981. Aplica-se às divisões o disposto nos arts. 952 a 955. 1)2)

1)DEMARCAÇÃO. Feita a divisão, têm-se os elementos suficientes para se saber o que toca a cada quinhoeiro;

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