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TUDO E TODOs §-:- CONTRA 0 MOTORISTA ‘ Reportagem de ADOLFO: SOETHE Este trafega pel BR-2 (Rio-Pérto Alegre). Tom cozinha istalada no cami- ho. A espésa 0 acbmpanha nas longas viagens, preparando-the as refeicées. O MOTORISTA ‘contincssss to 0 confronto com os despesas; re- pouso e conférto nao existem, € 0 alimentaco 6 precéric. Dai — sem prejuizo do seu espirito de solidarie dade para com os colegas — 0 que yale & chegar antes € gastar menos Por isso, "Fé em Deus e pé na té- uo’, Nao condené-los, no responsabi- lizé-los por todo e qualquer aciden- te. Os motoristas so gente como rnés, humanos como nés, fortes e fré- gels como nés, sujeitos a falhas e frequezas como nés. Como nés, trabalham para © pro- sgresso do pals, para o bem-estar da coletividade, pois sdo,éles que abas- tecem de viveres os“hossos lares, de matéria prima os nossas indiistrios, de artigos manufaturados os nossos mercado. Hé, entretanto, uma diferenca que deve ser levada em conta a favor do motorista: éle néo tem hordrio — trobalha dia e noite; éle ndo tem o conférto do lar nem o aconchégo da fomilia — seu lar € a cabine e seu combiente é a estrade. Sofre, e nao tem recursos; enfrenta todos’os pe- rigs, e ndo tem seguranca. Seu co- pital — se possivel, um “Mercedes” ‘ou “"Fenemé” (quanto mais possante, melhor), adquirido a prestagdes pe- sodissimas e com reserva de dominio — no the dé juros nem dividendos, mas esté sujeito ao desgaste cons- tonte e deprecia de quilémetro em quilémetro, No entanto, é dele que tira 0 sustento para si ¢ sua familia. Seu ganha-pao é © caminhGo. Dani- ficé-lo, destrul-lo em acidentes e desastres seria uma foucura, uma desgraca, além de uma criminosa ir- responsabilidade. E ninguém é tao irresponsdvel a ponto de destruir o que the pertence. Nem tampouco o motorista, seja de taxi ou de ca nh&o, especialmente quando éstes vetculos Ihe garantem a subsisténcio, embora modesta e humilde, da fo- milia e sua prépria, Em viagem, muitas vézes, 0 mo- torista adoece. Desde a dér de ca- beca as moléstias epidémicas estao @ sua espreita. Quando isto ocorre, éle nao tem tempo para demoradas consultas em consultérios médicos. Vai & primeira farmécia 4 beira da estrada, @ compra uns comprimidos que © boticério the recomenda: anal- gésicos, sedatives, drogas. Na Repablica Federal da _Alemo- nha, segundo um estudo de Friedrich Deich para o Servico de Informacoes, ocorreu um caso, assim: "Quando do julgamento de um jo~ vem motorista tido como competen- te, acusado por acidente ocorrido como énibus que dirigia, com 23 Possageiros, o réu péde provar que pouco antes da partida ingerira 5 a 6 drdgeas de um sedative. Féz tam- bém vir 0 dentista que horas antes do desastre havio-Ihe extraido dois dentes com onestesia local. Infeliz~ mente dentista nade podia dizer a respeito. do efeito combinado de fanestesia e sedatives, motivo porque © juiz resolveu fazer uma experi Cia: 0 réu recebeu mais uma vez uma dose igual primeira de anestesa e, em seguida, a mesma quantidade de comprimidos de antes do malfa- dada viagem. © jovem ficou com- pletamente desnorteado, sua capaci- dade fisica e psiquica inteiramente abalada, incapaz de dirigir um vel= culo. © tribunal declarou-o inocen= te, pois o motorista no podia prever © efeito dos medicamentos"” Como se vé, até mesmo uns com- primidos aparentemente inofensivos podem amargurar a vida de um mo- torista, Ndo fésse a preocupacao do juiz em constotar a verdadeira e re mote causa do desastre, e mais um “eriminoso” pagaria nas grades pelo crime de que éle mesmo foi vitima Até 0 cafézinho, sim, senhores entra nesse grupo de “cousadores! de desastres. Porque, de acérdo com © [6 criticado articulista, “ficou cons= tatade que pds beber-se 0 café, a copacidade individual (concentracdo, mao firme e presenca de espirito) @ excitada por um curto tempo ope- nos, para depois baixar vertiginoss- mente”, E explica: “Este efeito s6- bre os pessoas que tomaram café torna-se mais sensivel, quanto maior 4ér o cansago antes de ser ingerida a bebida. Pode-se afastar o cansaco fisiolégico com o café, mas as cus- tos da capacidede de reacdo. Em ou- tras polavras, 0 café excita muito mais do que estimula e, se por acoso, um motorista cansado confiar no efei- to estimulante do café, muito cedo Gle veré que suas fércas fisicas © mentais o abandonam paulatinamen- te". NOS, 0s que trabathamos conforta- velmente, _ despreocupadamente fem nossos.escritérios, armazéns ou estabelecimentos fabris, chegamos em casa a0 meio-dic ou & noite e, no ambiente ecolhedor de nossas fami- 5, ingerimos almocos ou jantares opiparos regados com bebidas copi- tosas. Depois, para estimulor os mis- culos relaxados de tanto comer e be- ber, um gostoso cafézinho. E depois? Ume_ soneca. E 0 motorista? Ele engoliu, nervoso © apressado, © seu bife com arroz ou feijéo pre- Parados em qualquer restaurante de beira-de-estrada. E depois? Pé na tébua ! Consciencioso e cumpridor de seus deveres, sabe que alguém esté & ese pera das mercadorias que éle trans- porta. E, a despeito de tudo e to- dos estarem conspirando contra éle, © motorista continua rodando, ro dando,

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