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A VIDA NO CAMPO NO SÉCULO XIX

Depois de um cansativo dia de escola, chegou finalmente a hora de descansar. Fui-me deitar e, enquanto aguardava a chegada do
sono, comecei a pensar no trabalho de casa de História, tinha que me imaginar uma criança do campo no século XIX e relatar o meu quotidiano.
Pensei que seria bom se tivesse vivido nesse tempo, assim seria muito mais simples contar como era a vida então. Foi a pensar nisto que eu
adormeci. A minha preocupação levou-me a sonhar sobre este trabalho. Vou então contar o sonho que tive.
Lembro-me de ser uma criança que vivia numa aldeia da Beira Alta, onde as casas eram feitas de granito, com uma larga escadaria,
com poucas divisões e, na parte de baixo da casa, ficava a loja onde dormiam as vacas.
A minha família trabalhava na agricultura, eram jornaleiros, vendiam a sua força de trabalho à jorna. Começavam a trabalhar muito cedo, mal
nascia o sol, já se encontravam nas terras e só regressavam a casa quando o sol se punha, muitas vezes eu tinha que ir com eles trabalhar para o
campo. No início da primavera, tratavam-se as terras para o cultivo da batata, semeavam-se os produtos hortícolas, depois vinha a monda
(arranque das ervas daninhas) e a rega. No início do verão, era altura da ceifa e debulha dos cereais. Lembro-me de ver as mulheres vestidas com
blusas, saias compridas feitas de chita, avental, lenço na cabeça, chapéu de palha e calçavam tamancos feitos de pau de amieiro. A ceifa era muito
dura, eu também tinha uma foice para ceifar o trigo e tinha que acompanhar os meus pais nesta difícil tarefa. Depois de ceifado, o trigo era
levado para a eira, os homens juntavam-se e com a ajuda do mangual (alfaia agrícola) malhavam-no para lhe retirar o cereal, o grão era entregue
ao moleiro para ser moído na azenha e transformado em farinha, a palha era aproveitada para os animais.
Os trabalhos agrícolas eram acompanhados por cantares e danças para não serem tão monótonos.
Nesta época, eram poucas as crianças que iam à escola, apenas iam os filhos das pessoas mais abastadas. O meu dia era principalmente ocupado
a ajudar os meus pais nos trabalhos do campo e, quando tinha um pouco de tempo livre, juntava-me com alguns amigos e brincávamos às
escondidas, ao jogo do cântaro (pote), à cabra cega, salta castanha… Mas ao sol-posto tinha que estar em casa, senão lá vinham os castigos.
A época das vindimas era muito trabalhosa, mas também era muito alegre. As pessoas iam para a vinha colher as uvas, os homens carregavam os
cestos de vime às costas que, depois, despejavam no lagar, era então altura dos homens pisarem as uvas com os pés, para dar início ao fabrico do
vinho.
A nossa alimentação era muito pobre, comiam-se sobretudo os produtos que a terra dava: a batata, couves, feijão, grão, azeitonas; fazia-se a
matança do porco que nos iria alimentar durante todo o ano. A carne que não era utilizada para fazer enchidos era colocada na salgadeira, a banha
servia para temperar a sopa, quanto aos doces, eram escassos, apenas se comiam em dias de festa. Na véspera das festas, acendia-se o lume no
forno comunitário para cozer as broas e os bolinhos esquecidos, também era aí que se cozia o pão centeio que comia diariamente.
A festa da Nossa Senhora da Póvoa e da Nossa Senhora da Ajuda eram as romarias mais festejadas, era nesses dias que tinha autorização para
vestir roupa nova e calçar sapatos, a maior parte do tempo andava descalço.
Gostava imenso de ir com a minha mãe lavar a roupa no rio Côa, lá corriam águas cristalinas, tinha que se percorrer alguns quilómetros com o
alguidar à cabeça até lá chegar, mas o esforço era recompensado pela beleza e tranquilidade do local.
Quando acordei, lembrei-me logo de uma fotografia que tinha visto no álbum lá de casa em que o meu avô
estava a arrancar as batatas da terra com o arado puxado pelas vacas, isso aconteceu há alguns anos atrás mas a técnica era a mesma que se
utilizava no século XIX.

Este sonho que tive foi muito enriquecedor, aprendi muita coisa e facilitou-me o trabalho!
Não me posso esquecer da frase que me foi dita tantas vezes: “ A vida do campo é muito dura, mas sem trabalho nada vem”.

André Estevinha, nº4

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