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H escritores que so uma espcie de ilhas. Existem como se nada os antecedesse e nada pudesse dar-lhes continuidade.

A brasileira Clarice Lispector foi uma escritora assim: um continente parte na literatura de lngua portuguesa. Quem procura apenas enredos bem urdidos pode passar imediatamente ao guich seguinte. A narradora de gua Viva uma pintora e sabe-se que Clarice tambm experimentou a pintura. gua Viva um livro breve e intenso, que parece por vezes escrito em transe. No espanta por isso a constatao que surge a pginas tantas no prprio texto: Verifico que estou escrevendo como se estivesse entre o sono e a viglia. em gua Viva que surge aquela que se tornou uma das expresses mais emblemticas da obra de Clarice Lispector: o instante-j, a percepo de que o tempo nos foge irremediavelmente e de um modo angustiante. Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimenso do instante-j que de to fugido no mais. Cada coisa tem um instante em que ela . Quero apossarme do da coisa. Ler Clarice Lispector requer disponibilidade. Requer sobretudo o mesmo talento que necessrio a quem tem de caminhar s escuras: preciso tatear muito e estar disposto a tropear sem medo. Clarice explica-o de forma lapidar: Sou inopinadamente fragmentria. Sou aos poucos. Minha histria viver. E no tenho medo do fracasso. Que o fracasso me aniquile, quero a glria de cair.

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