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A Explicação Marxista das Crises

A teoria marxista das crises rechaça toda concepção mono causal. As crises se
devem exclusivamente ao excesso de capitais (super acumulação) ou, o que é
equivalente, à insuficiência da massa de mais-valia produzida normalmente. Não se
devem exclusivamente à insuficiência do poder de compra por parte das massas.
Tampouco se devem exclusivamente à desproporção entre os dois departamentos
fundamentais da produção, o departamento de bens de produção e o departamento
de bens de consumo. Todas essas causas desempenham um papel no
desencadeamento da crise e em sua reprodução cíclica, mas nenhuma delas
determina, por si só, a irrupção regular das crises.

A razão pela qual Marx rechaça toda explicação mono causal das crises é que
considera o ciclo industrial e a crise de superprodução nas quais aquele desemboca
regularmente, como inerentes ao modo de produção capitalista. Este modo de
produção está baseado sobre a produção mercantil generalizada. É do fato de que
os meios de produção (incluídas as terras) e a força de trabalho se terem convertido
em mercadorias, de onde se deduz a relação capital/trabalho assalariado, isto é, o
modo de produção capitalista.

Agora, produção mercantil generalizada implica um trabalho não imediatamente


social, implica contradição entre trabalho privado e trabalho social, disposição
fragmentada dos meios de produção (é dizer propriedade privada no sentido
econômico e não puramente jurídico do termo), flutuações dos investimentos no
tempo, contradição entre valor de uso e valor de troca, contradição entre
mercadoria e dinheiro. Daí se deduz a oposição fundamental de Marx à “Lei do
equilíbrio” de J. B. Say e aos erros paralelos de Ricardo. Para Marx, a produção não
cria automaticamente sua própria demanda, rechaço das teses que são retomadas
pelos monetaristas e os economistas “supply-side” de hoje.

As crises fundam suas raízes no fato de que as condições de produção da mais-valia


não implicam automaticamente as condições de sua realização (não coincidem
automaticamente com elas).

Neste sentido, no marco da teoria marxista das crises, a crise é por sua vez uma
crise de superprodução de capitais e uma crise de superprodução de mercadorias.
Em sua preparação e em sua irrupção intervêm todas as contradições internas do
modo de produção capitalista. Pode se representar a crise como determinada
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fundamentalmente pela queda tendencial da taxa média de lucro na medida que as
flutuações da taxa de lucro resumem o conjunto destas contradições.

Por sua própria essência, a crise capitalista é então uma crise de superprodução de
valores de troca. Nisto, ela se contrapõe às crises das sociedades pré-capitalsitas e
às crises das sociedades pós-capitalistas, que são essencialmente crises de
subprodução de valores de uso. Estas crises se combinam nestes casos, em graus
diferentes, com fenômenos ligados ao mercado, na medida em que a produção
mercantil se desenvolve ou sobrevive nestas sociedades. Por outro lado, enquanto
subsiste o modo de produção capitalista e a economia continua sendo regida pela
lei do valor, as crises de superprodução são inevitáveis.

A explicação marxista das crise atual

A recessão 1980-1982 foi a vigésima primeira crise de superprodução desde o


“nascimento do mercado mundial de mercadorias industriais”, como o chama Marx,
nascimento que se situa por volta de 1825. Isto dá uma média de duração do ciclo
industrial de 15 anos, divididos por 21, ou seja, de 7.5 anos, confirmação total de
uma hipótese de Marx. A própria natureza do ciclo industrial implica que não haja
“crise permanente”. Depois da recessão vem a recuperação, ainda que seja
vacilante, pouco profunda, de duração relativamente limitada e não sincronizada.
Acreditamos que uma recuperação começou já em 1983, ao menos nos EUA, na
República Federal Alemã, na Grã-Bretanha, no Canadá, assim como houve uma
recuperação entre a recessão de 1974-1975 e a recessão de 1980-1982.

Nós definimos as crises depois da segunda guerra mundial – na época do


capitalismo tardio – como recessões, porque são crises combinadas com uma
inflação permanente que atenua parcialmente seus efeitos. A inflação do crédito,
quer dizer da moeda fiduciária, da “moeda bancária”, permite vender mais
mercadorias do que com o poder de compra efetivamente criado durante o
processo de produção. Permite acumular mais capitais do que com a mais-valia
efetivamente produzida no curso do processo de produção e realizada no curso do
processo de circulação. Apesar de toda a demagogia dos monetaristas e todas as
medidas deflacionistas tomadas pelos governos burgueses (tanto de “direita” como
de “esquerda”), a inflação subsiste no curso do atual ciclo industrial, ainda que ela
tenha sido reduzida em relação aos anos 70 (mas não com relação aos anos 50 e
60).

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Mas o capitalismo tardio não pode atenuar durante um período limitado suas
contradições internas por meio da inflação permanente sem pagar um preço
elevado – a longo prazo insuportável – por esta tendência: a desorganização
crescente de seu sistema monetário internacional, os crescentes riscos de
arruinamento de todo os sistema bancário e de todo o sistema de crédito
internacional.

Hipocritamente, os capitalistas e seus ideólogos concentram seu fogo, a este


respeito, sobre as dívidas dos países chamados “de Terceiro Mundo” e dos Estados
chamados socialistas (que nós preferimos chamar Estados operários burocratizados
ou Estados pós-capitalistas). Mas em realidade, o capitalismo atravessou um
imprevisto boom econômico depois da segunda guerra mundial flutuando sobre um
oceano de dívidas que transbordam pelos quatro cantos: 1) as empresas
capitalistas privadas, inclusive as firmas multinacionais; 2) os países do Terceiro
Mundo; 3) os governos imperialistas; 4) os governos dos Estados operários
burocratizados. Destas quatro massas de dívidas, a mais importante é a primeira e
não a segunda. A terceira já superou a quarta e pode superar a segunda.

Os detonadores das recessões de 1974-1975 e de 1980-1982 foram os detonadores


clássicos e seu desenvolvimento foi um desenvolvimento clássico: superprodução
nos setores chaves da expansão precedente (automobilístico, construção
imobiliária, aço, petroquímica, etc.), baixa da taxa média de ganância, agravamento
das tendências especulativas e inflacionistas, obrigação para a burguesia de iniciar
uma política deflacionista, desemprego em rápido ascenso e, devido a isto,
contração do mercado interno, concorrência imperialista e interimperialista
acentuada, com ascenso do protecionismo e contração do mercado mundial.

Ciclo industrial e ondas longas

O fato de Marx ter desnudado os mecanismos fundamentais, estruturais, das crises


de superprodução capitalista, implica que há características fundamentais,
estruturais, comuns entre todas as crises. Mas não implica que todas as crises são
estritamente idênticas. Cada Crise representa uma combinação de traços gerais e
traços particulares. O próprio Marx analisou em detalhe as características
particulares de uma série de crises que ele viveu, como a crise de 1857-1858 e seu
aspecto monetário, e a de 1861 ligada às conseqüências da Guerra de Secessão
nos Estados Unidos.

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Não posso analisar em detalhe todos as características particulares das crises de
1970-1971, de 1974-1975 e de 1980-1982. Mas quero insistir sobre um aspecto
essencial desta combinação de trações particulares e traços gerais das crises
atuais: a combinação entre o ciclo industrial septenal ou hexenal, e a onda longa
expansiva que se estende de 1948-1949 a 1968 (salvo nos países anglo-saxões,
onde começou, sem dúvida, desde 1940).

Esta combinação entre ciclo industrial clássico e onda longa depressiva tem
conseqüências consideráveis sobre a evolução econômica a médio e longo prazo.
Tem conseqüências igualmente importantes no plano social e político.

A onda longa depressiva atualmente em curso caracteriza-se pela “vulgarização”


das inovações tecnológicas iniciadas durante a onda longa expansiva precedente, o
qual é por outra parte uma característica geral das ondas longas destas duas
tonalidades fundamentais diferentes.

Na prática isto quer dizer três coisas: 1) manutenção de uma taxa de crescimento
anual bastante elevada da produtividade; 2) baixa e até desaparecimento da “renda
tecnológica”, dos superlucros monopolísticos dos grandes trustes, incluídas as
“multinacionais”, o que contribui para deprimir a taxa média de lucro; 3) descenso
considerável da taxa média da produção, que permanece durante um longo tempo
inferior a taxa de crescimento da produtividade. O resultado é claro:
simultaneamente, o aumento do desemprego e a ofensiva de austeridade da
burguesia se manterão durante um longo período, independente das flutuações
cíclicas da produção anual.

Para não falar mais do desemprego dos países imperialistas: subiu de 10 milhões
em 1970 a 15 milhões em 1975, a 20 milhões em 1978, a 30 milhões em 1980, a 35
milhões em 1983 e alcançará 40 milhões em 1985, independente da recuperação
em curso. Por outro lado, trata-se de estatísticas que subestimam fortemente a
realidade, pois não incluem a todos aqueles e aquelas que como dizem tão
elegantemente os ideólogos burgueses e pequeno-burgueses, “abandonaram o
mercado de trabalho” perdendo toda a esperança de encontrar um emprego. Trata-
se antes de tudo das mulheres rechaçadas para os lares e dos trabalhadores
imigrados rechaçados até seus países de origem.

No marco da onda larga depressiva, houve dessincronização cíclica entra as crises


que castigam os países imperialistas e a crise que castiga aos países semi-coloniais
e os países dependentes semi-industrializados. Especialmente estes últimos
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puderam manter uma taxa de crescimento relativamente elevada, sobretudo no
México, no Brasil, na Coréia do Sul, na Índia, em Taiwan e numa série dos países da
OPEP. Mas a partir de 1980, a situação mudou radicalmente. Hoje os países
chamados de terceiro mundo são golpeados duramente pela crise.

Para os menos subdesenvolvidos dentre eles isto significa uma mudança de clima
socioeconômico e político completo com relação aos dez anos precedentes, uma
perda de credibilidade dos projetos nacionalista-populistas, etc., com uma queda
brutal do nível de vida das massas. Para os mais pobres dentre eles, o que está se
desenvolvendo é uma tragédia de dimensões históricas, da qual para vergonha
comum de todos nós, vanguarda revolucionária internacional, para não falar do
movimento operário internacional, não se tomou a menor consciência. Pode-se
resumir essa tragédia em uma fórmula: a onda larga depressiva provoca uma
pauperização absoluta nos países semi-coloniais mais pobres que leva o poder de
compras dos salários médios até o nível das porções de alimentos dos campos de
concentração nazista.

A função política e social das diferentes interpretações da crise

A defesa da teoria marxista das crises não é só um dever de honestidade científica,


de capacidade de compreender, de explicar e prever a marcha da economia
mundial. Desempenha também um papel preciso na luta ideológica que se
desenvolve hoje no seio da opinião pública, ou seja, da luta de classes política, da
luta de classes no sentido mais direto. Desempenha um papel ainda mais preciso
nas linhas divisórias no interior do movimento operário internacional, entre aqueles
que, sob as formas mais diversas e com os argumentos mais contraditórios,
aceitam a crise como inevitável e se contentam com propor receitas para
administrar esta crise com doses graduais de austeridade, e aqueles que querem
organizar, ampliar e generalizar o rechaço de toda política de austeridade, a
resistência militante e ativa contra a ofensiva do capital, a luta contra o
desemprego mediante a introdução imediata da semana de 35 horas sem redução
de salário semanal e com contratação obrigatória, a luta por uma alternativa anti-
capitalista de conjunto à política de austeridade. Esta linha divisória contrapõe em
última análise a todos os defensores da colaboração de classes e a todos os
partidários irredutíveis da independência política de classe do proletariado, pela
qual Marx dedicou toda sua a partir de 1850.

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Sem poder fazer uma lista exaustiva de todas as “explicações” de reajuste da crise
com relação à explicação marxista, mencionaremos os esquemas ideológicos
seguintes:

• A crise seria resultado inevitável da alta dos salários diretos e indiretos durante
a fase de expansão precedente. Há uma versão direitista desta “explicação” (a
explicação neoclássica, monetarista: “The workers priced themselves out of the
labor market”). Há também uma versão de “esquerda” desta “explicação”: a
teoria do “profit squeeze” que voltando de Marx a Ricardo, reduz a queda da
taxa de lucro à queda da taxa de mais-valia, ou seja, explica a crise pela alta
dos salários.

• A crise seria resultado inevitável da inflação, consideravelmente aumentada


pela alta dos preços do petróleo em 1973 e em 1979.

• A crise seria o resultado de uma conspiração das multinacionais ou de uma


conspiração do imperialismo norte-americano, para restabelecer (ou consolidar)
sua hegemonia sobre a economia capitalista internacional, inclusive sobre a
economia mundial.

• A crise não seria mais do que um mecanismo normal de reedição internacional


da acumulação de capital, que o capitalismo seria capaz de realizar e que por
outro lado estaria já em vias de realizar-se.

A função destas “explicações” é política e social e não científica. Às vezes, seu


aspecto irracional adquire uma dimensão grotesca: assim, segundo alguns autores
na França (e não só na França!), seriam sucessivamente alta do preço do petróleo e
sua queda posterior o que haveria causado – ou agravado consideravelmente – a
crise. Mas uma vez descartada a pretensão científica destas “explicações”, que é
nula, não devemos tirar a conclusão de que carecem de importância. Têm uma
importância muito grande, pois são um instrumento da burguesia para obter
resultados sociopolíticos precisos:

• Culpabilizar a classe operária e ao movimento operário como responsáveis pela


crise;

• Culpabilizar os xeiques do petróleo ou mais geralmente ao países do Terceiro


Mundo como responsáveis pela crise;

• Apresentar a crise como uma fatalidade, a qual ninguém pode impedir;

• Justificar as concessões, declaradas inevitáveis, aos imperativos das


austeridade, ou seja, os imperativos do lucro.

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Todos estes resultados que perseguem têm um objetivo central: exercer uma
enorme pressão sobre a classe operária para que esta não reconheça que o
capitalismo e somente o capitalismo é responsável pela crise, e que toda luta real e
eficaz contra as conseqüências desastrosas das crises para as massas
trabalhadoras deve ser uma luta contra o capitalismo, um luta anti-capitalista. É
uma pressão para impedir o surgimento de uma alternativa anti-capitalista,
socialista à crise, pela qual amplas massas estariam dispostas a combater.

A crise e o futuro da humanidade

Estamos convencidos de que a depressão é muito grave e que, na realidade, é no


contexto da crise do sistema imperialista e do sistema social, a crise mais profunda
que o capitalismo já conheceu desde o seu nascimento. Para retomar uma fórmula
de Marx, é na crise onde se expressa a tendência do capitalismo a transformar
periodicamente as forças produtivas em forças destrutivas. Porém, a amplitude da
crise determina a amplitude do potencial destrutor desencadeado pela “solução”
capitalista da crise. Para sair da crise dos anos 30 sem sair do capitalismo, a
humanidade pagou o preço de 100 milhões de mortos, o preço de Auschwitz e de
Hiroshima.

Com o nível alcançado atualmente pelo armamento – sobretudo, mas não apenas o
armamento nuclear -, com o processo de destruição do meio ambiente em curso,
com o ascenso da fome no mundo, este potencial destrutivo deveria hoje ser
multiplicado ao menos por cinco. Isto implica o risco real da destruição da infra-
estrutura material e humana sobre a terra.

Desde 1914 a humanidade está confrontada com o dilema: socialismo ou barbárie.


Duas guerras mundiais, inumeráveis guerras locais, o ascenso periódico de
ditaduras sanguinárias fascistas, semifacistas, militares, a extensão da tortura em
mais de 60 países; tudo isto comprova que a noção de “barbárie” não é
propagandista, nem mistificadora, nem abstrata, mas está carregada de um
conteúdo real cada vez mais dramático. Mas hoje, com o armamento e o
sobrearmamento nuclear, o dilema “socialismo ou barbárie” adquire uma nova
dimensão ainda mais precisa. Hoje, a vitória mundial do socialismo se converteu em
uma questão de sobrevivência física do gênero humano. Hoje, a longo prazo, o
dilema é: “Socialismo ou destruição do gênero humano”.

Digo “a longo prazo”. A curto prazo e a médio prazo, o capital internacional choca
com obstáculos e resistências imensas para aplicar um curso até a reconquista dos
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mercados perdidos, ou seja, um curso até a terceira guerra mundial. Entre estes
obstáculos e estas resistências está, entes de tudo, a força do movimento operário
e do movimento anti-guerra nos países imperialistas e a força do movimento
antiimperialista nos países semi-coloniais e nos países dependentes. Hoje, o que a
remilitarização põe na ordem do dia de imediato, são guerras contra-revolucionárias
locais, como a agressão ao Líbano contra a revolução palestina, a agressão contra a
revolução centro-americana, a agressão contra a revolução na África Austral. Antes
que possam ser infligidas derrotas muito severas ao movimento operário e ao
movimento de massas dos principais países do mundo capitalista, a terceira guerra
mundial não está na ordem do dia.

Mas justamente em função da gravidade e da duração da depressão, o risco da


terceira guerra mundial tenderá a aumentar na medida em que a ofensiva de
austeridade e de remilitarização consiga debilitar ou desarticular o movimento de
massas e a reorganização de massas nos principais países capitalistas do mundo.

Para nós, isto não é algo que está resolvido: as batalhas decisivas estão diante de
nós e não para trás de nós. Se queremos referir-nos com todos os riscos inerentes
às analogias históricas, às etapas preparatórias para a segunda guerra mundial,
estamos hoje em 1929 e não em 1933 ou em 1938. A marcha até a segunda guerra
mundial poderia ser invertida se Hitler não tivesse tomado o poder, se Franco
tivesse sido derrotado, se o ascenso revolucionário na França não houvesse se
afogado pela Frente Popular. As grandes batalhas de classe que virão na Europa
Ocidental, no Brasil, no México, na Argentina, na Índia, no Canadá, na África do Sul,
no Japão, e sem dúvida, finalmente, nos Estados Unidos, decidirão a marcha até a
terceira guerra mundial e, em conseqüência, a sorte da humanidade.

É possível colocar-se a questão: é racional para o capitalismo, inclusive o dirigido


por um pessoal político de direita e de extrema direita, considerar uma “solução”
para a crise através da guerra nuclear mundial? A pergunta em si mesma está mal
colocada. A sociedade burguesa em seu conjunto se caracteriza por uma
combinação sui generis de racionalidade parcial e de irracionalidade global. A
mesma característica se aplica aos armamentos.

Mas na medida em que efetivamente existe um fundo irracional no projeto de


guerra nuclear, isto não implica de modo algum que esse projeto seja irrealizável.
Auschwitz era igualmente irracional a partir do ponto de vista dos interesses de
conjunto do imperialismo alemão, inclusive desde o ponto de vista de uma guerra
imperialista onde se buscará obter a vitória. No entanto, Auschwitz foi realizado. É a

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presença da naturalização política e ideológica das massas ao irracional e ao
monstruoso o que é decisivo na etapa atual para o imperialismo na perspectiva da
preparação da guerra.

Este é o objetivo central da ofensiva, não somente anticomunista, antimarxista,


anti-socialista, nos meios de comunicação de massas e nas universidades
burguesas, mas também de uma campanha contra a ciência, contra a razão, contra
os ideais da revolução burguesa e do século das luzes, inclusive contra os ideais
igualitários elementares presentes na tradição religiosa judaico-cristã. A barbárie
das idéias precede a barbárie dos fatos. Por isso é preciso desencadear uma
ofensiva teórica vigorosa para a defesa contra essa grande bestialidade, dotada de
formidáveis meios materiais de difusão e de pressão, ao marxismo, ao socialismo, à
ciência, à razão, aos direitos iguais de todos os homens e de todas as mulheres que
habitam nosso planeta.

Esta contra-ofensiva se vê hipotecada por uma realidade objetiva: a situação real,


econômica, social, política, ideológica, cultural, moral nos países do Leste, as
sociedades burocratizadas de transição entre o capitalismo o socialismo, os
Estados operários burocratizados. Evidentemente rechaçamos toda noção de
socialismo de um “socialismo realmente existente” em qualquer lugar do mundo
que seja. Do mesmo modo, rechaçamos toda a noção segundo a qual Marx seria
responsável pela prática da burocracia soviética, ou da prática da burocracia social
democrata reformista. Em troca, registramos um fato que pesa sobre todos nós.
Quando na crise dos anos 30 havia uma quase unanimidade no movimento operário
mundial ao redor da unidade central: o capitalismo está em crise; a solução é a
planificação socialista. Hoje, a quase totalidade do proletariado mundial, inclusive
membros dos Partidos Comunistas, já não encontra facilmente esta resposta.

A razão fundamental que explica esta mudança não é a propaganda imperialista,


nem a pressão de meios pequenos burgueses desmoralizados e ascéticos, ainda
que não se possa subestimar a importância destes fatores. A razão fundamental é a
compreensão, tardia mas saudável, por parte da classe operária internacional, da
realidade econômica e social dos países do Leste, tal como ela se revelou de forma
clamorosa com o ascenso da revolução e da contra-revolução política na Polônia. A
crise econômica e social no Leste é um fator constitutivo da crise mundial. Não é
ela idêntica á crise capitalista, ainda que seja influenciada por ela. É uma crise
específica dessas sociedades. Tem um peso muito grande sobre a consciência
média do proletariado internacional. Na teoria e na prática, os marxistas do mundo
inteiro devem responsabilizar-se por ela francamente.

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É claro que uma resposta puramente teórica e propagandística jamais dará
satisfação suficiente às grandes massas. Enquanto não exista, nos fatos, um
“modelo” de sociedade de transição que transcenda de forma decisiva os abusos,
as aberrações, os desastres, as desigualdades, as opressões que existem hoje no
Leste, nossa resposta não convencerá a todo o mundo. Mas isto não significa que se
tenha que esperar a vitória da revolução socialista no ocidente e da revolução
política no Leste, para defender de forma resoluta a planificação socialista como a
resposta socialista à crise capitalista.

Nós dizemos que a economia e a sociedade fundadas na ciência e na técnica


contemporâneas se tornaram demasiado complexas e demasiados prenhe de
catástrofes para ser administradas por alguns “experts” - por outro lado cada vez
menos competentes – por algumas minorias elitistas, sejam elas burguesas do
Oeste ou burocráticas no Leste. Do mesmo modo, cremos que esta crise mundial é
demasiado grave para que se a deixe a mercê das “leis objetivas do mercado” que
se cumprem pelas costas da humanidade.

Esta crise só será resolvida se as massas tomam em suas mãos a gestão de seus
próprios assuntos, da economia, do Estado, da sociedade. Esta crise só será
resolvida pela socialização dos grandes meios de produção, seu funcionamento
planificado sobre a base de objetivos prioritários fixados democraticamente com o
pluralismo político indispensável à democracia, pela massas dos produtores-
consumidores próprios, pela gestão da economia pelos produtores associados, pela
criação de uma Federação Socialista Mundial, baseada no poder dos trabalhadores,
o poder dos conselhos operários e populares no mundo inteiro.

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