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Relatório de estágio

2 de Fevereiro a 1 de Maio 2009

Vanessa Quitério

Jornal Público

sob orientação de

Carla Patrão

Julho 2009

ESEC

Escola Superior de Educação de Coimbra

Instituto Politécnico de Coimbra


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Trabalho científico realizado no âmbito da defesa de estágio

Jornal Público

Relatório de estágio
2 de Fevereiro a 1 de Maio de 2009

Vanessa Quitério

3º Ano Comunicação Social – nº 2006028

sob orientação de

Carla Patrão

Julho de 2009

Escola Superior de Educação de Coimbra

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Índice

Resumo 5

Agradecimentos 6

Introdução 8

O início do terceiro ano e o tão esperado estágio curricular 9

O Jornal Público (breve contextualização) 10

O 1º dia como “a estagiária” do Público 14

“Bom dia, tem ocorrências a registar?” 16

A primeira prática – o primeiro contacto com as fontes 18

Erro no artigo e descasca da PJ 20

Sempre a aprender, agora com as fontes 22

Contar uma estória: a prática versus a deontologia 28

O off the record 34

No terreno ser jornalista é mais complicado 36

Saber dar a informação certa 42

Mozart no P2 44

Na Fugas, o carro de 46

publico.pt – última hora 48

Fotolegenda 54

Último dia 56

Conclusão 59

Bibliografia 61

Anexos 62

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Resumo

Este trabalho tem por base o relato e a análise dos três meses de estágio curricular na redacção
norte do jornal Público, no período de 2 de Fevereiro a 1 de Maio de 2009.

Nesta dissertação o autor tem por base a análise dos posts retirados do blogue Parem as
Máquinas, espaço online que serviu de bloco de notas diário sobre o estágio, práticas tidas,
situações e reflexões.

Palavras-chave:

Estágio, Público, Parem as Máquinas

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Agradecimentos

O sonho tornado realidade


“Chegar até ao cimo da montanha e contemplar o imenso vazio do cume pode ser gratificante.
Mas nada é superior à árdua caminhada desde o baixo terreno e às dificuldades percorridas nessa
viagem, para superar os percalços da subida.”

Esta podia ser uma frase retirada de um qualquer livro ou referência de um outro qualquer autor.
Mas não, pertence-me e achei pertinente começar de forma mais literária este meu relatório de
estágio. Nem só de coisas concretas se escreveram os três meses de estágio passados no Jornal
Público, nem se explica o que aprendi com tamanha experiência. A caminhada feita desde
Fevereiro até Maio foi, sem dúvida, a experiência mais enriquecedora que alguma vez tive no
âmbito da formação académica, não desprezando contudo todo o trabalho que desenvolvi
anteriormente.

De uma forma geral, posso referir que tudo o que foi feito desde a minha entrada para o curso
superior de Comunicação Social foi ponto essencial para culminar na redacção do Porto do Jornal
Público. Foi uma soma de trabalho e dedicação, de objectivos e oportunidades que fui sabendo
agarrar.

Aos que me acompanharam durante estes últimos três anos agradeço o apoio e a ajuda por me
aguentarem euforias e desagrados. Por serem portos de abrigo nas alturas em que quis desistir e
nos momentos em que não vi mais nada a não ser o curso e o jornalismo “minha paixão”. Em
especial deixo o meu maior agradecimento aos meus pais que, pela constante relutância quanto à
minha ida para Coimbra e escolha de curso, me foram instigando a lutar pelo sonho de sempre.
Se não fossem essas barreiras e contrariedades penso que não era tão saborosa esta satisfação de
chegar até aqui.

Depois, sem querer deixar hierarquias definidas, agradeço em geral aos meus colegas de curso os
bons momentos passados, as partilhas feitas nas aulas e fora delas. Se Coimbra é conhecida pela
cidade dos estudantes, melhor ainda se caracteriza pela sua constante festa e alegria. Aos meus
padrinhos de curso, Sandrinha e Laurindo, o carinho é maior e maior ainda o agradecimento pelas
referências que foram. A persistência, dedicação e empenho de um complementou o amor e a
entrega de outro, em caminhos académicos tão antagónicos mas semelhantes ao mesmo tempo:
no fundo não interessam os anos em que se completa o curso mas sim a entrega e amor deixado
nele!

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Ao Jornal Universitário de Coimbra A Cabra, que me acolheu magnificamente e que me ensinou
os primeiros passos no crescimento jornalístico. Pela prática, algo que valorizo e não concebo
fora de uma formação académica, e que foi o motor de arranque para chegar à oportunidade dada
pelo Jornal Público. Na redacção d’A Cabra aprendi a lidar com as fontes, com as pressões de
tempo, os tão abomináveis deadlines para qualquer jornalista. Os fechos de edição deram-me
genica para contemplar cada fase da composição do material noticioso, culminando com o
trabalho impresso no suporte físico. Ao Jornal Universitário A Cabra o agradecimento é eterno.
Pela marca e pela referência.

À minha amiga Ana Maria Coelho, colega de curso e de estágio no Público, pelo apoio prestado
durante este último ano. Obrigada pela força dada nos momentos de desconsolo e pela
oportunidade de valorizar a amizade num ambiente tão selvagem como este que é o jornalismo.

Agradeço com especial apreço a ajuda prestada pelos editores com quem trabalhei durante o
estágio. Na redacção do Jornal Público do Porto contei com o auxílio do subdirector Amílcar
Correia, meu orientador de estágio, com Abel Coentrão e Álvaro Vieira, ambos editores da
secção Local/Porto. As indicações e dicas dadas por estes três jornalistas foram importantíssimas
para me orientar na redacção, bem como perceber toda a mecânica da rotina jornalística. No
mesmo âmbito registo com agrado a ajuda das colegas de estágio que me acompanharam durante
a estadia no Público, tanto da redacção norte como na redacção sul, em Lisboa - onde devo maior
apreço ao jornalista António Granado pelo convite feito ao blogue de estágio ‘Parem as
Máquinas’ – e que me auxiliaram no que foi preciso. Da mesma forma lembro a ajuda dada pelos
outros jornalistas da redacção, designers, fotógrafos e secretárias. Foi uma vivência rica em
confraternização e integração.

Não poderia deixar de reconhecer importância à minha orientadora de estágio Carla Patrão, por
me proporcionar a oportunidade de estagiar no Público, pelo afinco e pela preocupação durante a
experiência. Igualmente agradeço a ajuda do professor Francisco Amaral pelo acompanhamento
também durante o estágio, com a sua participação activa via redes sociais e aconselhamento no
Parem as Máquinas, blogue que criei para ir contado os três meses de estágio.

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Introdução

“Se não reconhecemos o código musical, não conseguimos compreender a música”.

Esta frase sempre fez eco na minha cabeça, desde as primeiras aulas de Teorias da Comunicação.
Escolher uma formação académica na área da Comunicação sempre foi para mim o único
caminho para saciar esta minha sede em querer lidar com a informação e comunicar com o
mundo.

Passados três anos desde o início do meu percurso académico e em vias de concluir a minha
licenciatura em Comunicação Social, vejo-me no terminar de um ciclo, cheio de experiências e
útil no meu objectivo em seguir a prática do jornalismo como profissão.

Neste último ano de curso novos desafios surgiram e o tão esperado estágio curricular apareceu
como o colocar na prática aquilo que foi sendo apreendido nas aulas e nos trabalhos extra-
curriculares em que fui participando.

Foi com grande satisfação que recebi a notícia de que ocuparia durante três meses uma das
secretárias da redacção do jornal Público, no Porto. A experiência, que abarcou cerca de 50
artigos e deu voz a um blogue de estágio, passou para além dos meus objectivos e iniciou um
caminho sem precedentes.

Se inicialmente o meu estágio era parte solitária da minha existência académica, o inicio do
Parem as Máquinas – os três meses de uma estagiária no jornal Público – passou a ser
comunitário e, o espaço primeiramente um bloco de notas introspectivo, passou a ser veículo de
medos e angústias de outros jovens estagiários de outro qualquer órgão de comunicação social.

Este estágio fica marcado por isso: pela universalidade desta minha prática, pelos objectivos
tomados sempre em prol da responsabilidade que quis passar e pela procura de fazer algo que
mostrasse valor, para além da rotina jornalística que sabemos, instala-se em qualquer redacção.

Os medos, esses de ficar cómoda, senti-os bem na pele, passando por uma fase de inércia total. O
apreendido nas aulas e durante o percurso académico mostravam-se frios e mecânicos perante
uma necessidade tal de pro-acção e enquadramento nas novas necessidades jornalísticas a que
assistimos.

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Este relatório pretende ser um espelho dos três meses passados na redacção do Público no Porto,
um retrato fiel daquilo que fiz e deixei fazer, do trabalho fruto da aprendizagem académica e
acima de tudo um marco nesta fase final do inicio do meu sonho como comunicadora do mundo.

O início do terceiro ano e o tão esperado estágio curricular

Começar o terceiro e derradeiro ano de curso foi, para mim, o caminhar mais angustiante que fiz
até agora. O processo de uniformização educativo europeu, chamado de Processo de Bolonha,
encurtou-me em um ano a aquisição de competências e formação académica. De quatro para três
anos vi a minha formação em Comunicação Social escapar-me por entre os dedos.

O primeiro semestre deste último ano, compreendido entre Setembro de 2008 a Fevereiro de
2009 passou a correr. Apresentou-se como o semestre decisivo em termos de competências e
saberes, bem como estrutura importante para partir para estágio com as cadeiras ditas essenciais.
No final de Fevereiro terminei o primeiro semestre. Para trás ficaram duas cadeiras que espero
contornar em Setembro, na época de recurso.

A 18 de Dezembro soube que tinha conseguido um estágio no Jornal Público. O pânico


apoderou-se de mim naquele momento. A felicidade também, mas maior era o medo por ir
ingressar num órgão de comunicação social daquelas dimensões. Era o sonho tornado tangível.

Depois de saber que o Público ia ser o meu local de estágio curricular, foi importante conceber
objectivos e perceber realmente o que poderiam querer de mim naquele local. A responsabilidade
acresceu pelo facto de ser um órgão chamado de referência e o exemplo mais falado nas aulas.
Tive sensivelmente um mês para me preparar, de ponderações e de acerto de detalhes como a
mudança temporária para a cidade do Porto.

Nesse período foi delineado por mim criar um blogue, espaço onde pudesse registar o que fosse
acontecendo durante o estágio e também como suporte de auxílio ao posterior relatório. Nesse
intuito, e seguindo a ideia original da colega Ana Coelho, nasceu o ‘Parem as Máquinas’, blogue
oficial do estágio e com endereço em http://paremasmaquinas.wordpress.com/.

Este pequeno detalhe veio contudo mudar toda a minha vivência no estágio curricular já que
passou a ser parte integrante dos blogues convidados do Público e uma referência - dita por
muitos e não uma mera observação minha - a nível da ciberesfera, nas áreas da comunicação e

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jornalismo. Mais à frente neste relatório explicarei o porquê desse convite e as repercussões que
teve no meu trabalho como estagiária do Público.

Salvo já a explicação de que durante este relatório de estágio será recorrente apresentar citações
ou partes de posts do ‘Parem as Máquinas’, como forma de relatar e complementar a análise
destes três meses no jornal Público. Foi para esse objectivo que o blogue foi criado, em auxílio à
posterior ajuda na análise e elaboração das conclusões desta experiência jornalística.

O jornal Público (breve contextualização)

“ O Público é um dos meus jornais diários (comprados), desde o seu início: 1990. O seu actual
director, José Manuel Fernandes, assumiu o cargo em 1 de Setembro de 1998, quase a festejar 11
desses 19 anos de existência do jornal. O jornal, como qualquer outro produto cultural, mudou
bastante ao longo dos anos. Reconheço que está mais bonito (tem ganhos prémios de design),
mas não consegue ter superavit e perdeu muitos dos jornalistas de referência (Vicente Jorge
Silva, Jorge Wemans, Joaquim Fidalgo, Adelino Gomes, Ana Sá Lopes, para dar conta de alguns
nomes), o que significa uma perda da memória colectiva cultural de um jornal. As notícias
recentes de perda de valores salariais ou rescisão por parte dos colaboradores (colunistas) e igual
tentativa nos redactores, a par da concorrência recente de um novo diário (i, embora os oito mil
exemplares vendidos diariamente por este novo jornal, segundo me disseram, não sejam muito
"concorrenciais") e quebra de vendas generalizadas dos media impressos, não deixa muito espaço
para esperanças”.

Publicado por Rogério Santos no blogue Industrias Culturais


http://industrias-culturais.blogspot.com/

O Jornal Público insere-se no grupo empresarial português Sonacom, sub-holding da Sonae para
as áreas da comunicação, que pertence ao empresário Belmiro de Azevedo.

A publicação conta com 20 anos de existência, tendo sido fundada no ano de 1989. No entanto, o
primeiro número deste jornal diário só saiu a 5 de Março de 1990. Actualmente está organizada
em dois espaços redactoriais, um em Lisboa e outro no Porto e desde 1995 que marca presença na
internet, com o público online, agora denominado publico.pt.

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A 22 de Setembro de 1995 foi colocada online a primeira edição integral do Público impresso,
prática que se mantém até aos dias de hoje. Muitos outros serviços foram desenvolvidos, tendo
maior destaque o lançamento, no ano de 1998, o serviço Última Hora – serviço de informação
online com produção de notícias em contínuo e difusão em tempo real (definição recolhida do
Livro de Estilo do Público). Este serviço dispõe de um estatuto editorial próprio, criado no ano
2000 e que reúne em onze pontos a conduta e o teor do trabalho realizado pelo Público no seu
suporte online.

Actualmente apresenta-se como um jornal generalista de referência, no que diz respeito ao meio
dos jornais portugueses. No ranking de vendas das edições diárias, segundo a media de vendas
em banca nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2009, O Público encontra-se em quarto lugar, (com
um volume médio de vendas de 42,146) atrás do Diário de Notícias, do Jornal de Notícias e do
Correio da Manhã.

VENDAS EM BANCA (Média de Janeiro e


Fevereiro 2009) - Números médios das vendas
durante os últimos quatro anos *
Correio da Manhã – 116 381
Jornal de Notícias – 103 277
Diário de Notícias - 49 257
Público – 42 146

Tabela 1 - Vendas em banca dos primeiros cinco jornais diários portugueses

*Dados da Associação Portuguesa de Controlo de Tiragem e Circulação (APCT)

Face aos nove primeiros meses do ano de 2008, o Público apresentou um decréscimo de 0,8%.
Contudo, dados divulgados pela Bareme/Marktest deram conta que o Público ocupava, nesse
período, o terceiro lugar no ranking dos jornais mais lidos em Portugal, como podemos analisar
pelo seguinte quadro:

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MÉDIA DE VENDAS (Outubro de 2008) por vagas de audiências trimestrais
Correio da Manhã - 117 855
Jornal de Notícias - 86 524
Público - 41 234
Diário de Notícias - 32 277

Tabela 2 - Média de vendas por vaga de audiências por trimestre 2008

A estrutura do Jornal Público acompanha uma variedade de temáticas, estando organizado em


dois cadernos: o primeiro caderno ou P1 trata as questões da actualidade nacional e internacional,
bem como suporta matérias noticiosas sobre desporto, economia e as realidades locais de Lisboa
e Porto. Conta também com espaços de opinião, editoria, cartas ao director, crónicas e o Bartoon.

Segundo o Livro de Estilo, que teve a sua primeira edição em 1997 mas que foi criado como
documento no ano de 1989 - aquando do nascimento do jornal “a concepção editorial do Público
corresponde a uma dupla exigência, de qualidade e diversidade, visando áreas de informação e
tempos de leitura claramente diferenciados, conforme as características de casa uma das
publicações que constituem o jornal”.

O segundo caderno, P2, aborda a temática da cultura e sociedade, bem como os chamados
espaços de roteiros, grelhas de programação da TV e espectáculos. Contém a páginas Pessoas, –
que conta com breves notícias sobre famosos e acerca da área cultural de panorama mundial –
grelhas informativas sobre cinema e espaço de opinião sobre concertos e exposições.

Quanto a suplementos, o Público distribui gratuitamente ao fim de semana a revista ‘Fugas’ (que
só em Março de 2008 adquiriu o estatuto de revista) e que tem por base temas dedicados às
viagens, prazeres e automóveis. No Domingo sai para as bancas a revista ‘Pública’, uma
magazine de carácter mais social e que tem por base temas ligados a vida e sociedade, pessoas e
tecnologias. Durante a semana, às quartas-feiras, acompanha a edição diária o ‘Imobiliário’ –
caderno dedicado ao mercado imobiliário, negócios e investimentos; e às sextas o ‘Inimigo
Público’, denominado como o suplemento do “Não aconteceu mas podia ter acontecido”, espaço
de humor e de notícias fictícias. Também à sexta-feira acompanha o Público o ‘Ípsilon’,
suplemento dedicado à literatura, cultura e meio musical, espectáculos e cinema.

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É importante referir que tanto os suplementos ‘Inimigo Público’ como o ‘Ípsilon’ ganharam já
neste ano um espaço na página do publico.pt, reforçando ainda mais o seu carácter informativo e
potencializando novos leitores destes géneros conteúdos.

O Público apresenta-se assim como um jornal de carácter generalista, não tomando ênfase em
determinada temática ou matéria. Aquando de acontecimentos mais celebrativos é recorrente do
Público juntar à sua edição diária um ou outro suplemento temático, como por exemplo o ‘Dia
D’, que assinala o dia Mundial da Terra, a 22 de Abril.

Na sua organização interna conta com um Estatuto Editorial próprio e com um Livro de Estilo
único, que regem todo o trabalho jornalístico enquanto órgão de comunicação social.

Actualmente apresenta-se como referência nos diversos cursos de jornalismo e um instrumento


activo na forma de melhor escrever e informar. Nas palavras de Vicente Jorge Silva, director do
Público no seu início1, “o Livro de Estilo do Público não é uma cartilha ou um catecismo, mas
apenas um conjunto de regras técnicas e deontológicas que se inspiram em critérios de bom
senso, bom gosto e rigor profissional”. Neste texto que serve de introdução ao Livro de Estilo do
Público, o jornalista afirma que a prática jornalística vive de mudança: “Além disso, um livro de
estilo nunca se pretende definitivo: é um texto em evolução permanente onde se registam
princípios, regras e procedimentos que a vida da Redacção do jornal for instituindo como
adquiridas”.

Para um trabalho imparcial e idóneo, correcto e de opinião pública, o jornal Público conta com o
Provedor do Leitor, um instrumento de análise do jornalismo que o jornal faz e chega aos leitores.
Actualmente é Joaquim Vieira o provedor do leitor do Público, desde Janeiro de 2008, seguindo
os anteriores provedores, tais como Rui Araújo, Joaquim Furtado, Joaquim Fidalgo e Jorge
Wemans.

Em Dezembro de 1989, aquando do lançamento do Livro de Estilo do Público, Vicente Jorge


Silva deixou expresso na nota introdutória que o jornalismo é uma arma poderosa e que constitui
um fim, o de informar a opinião pública: “O poder do jornalismo só tem efectiva legitimidade
quando esse poder não se confunde com nenhum outro. O trabalho jornalístico não conhece
moeda de troca e, tal como o trabalho artístico e científico, constitui um fim em si mesmo. O
jornalista não é o missionário de uma verdade instrumental com objectivos políticos, sociais,
económicos ou culturais. Quanto melhor se respeitarem as regras de ouro da técnica e da

1
Silva, Vicente Jorge, Livro de Estilo do Público, pág.16

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deontologia, incorporando a criatividade e o estilo próprio de cada jornalista, maior será a
credibilidade e a influência do jornal de opinião pública”.

O 1.º dia como “a estagiária” do Público

“Começar é que custa sempre. Em tudo ou quase tudo, o início é que se torna doloroso. Nestas
circunstâncias, dar início ao contacto com o mundo do jornalismo foi, e está a ser, uma
descoberta dolorosa onde a ansiedade polvilha o desejo de vir a preencher um lugar no posto
hipotético do “vou poder ser a voz do mundo”.

Entrar para o Público foi e será uma das melhores coisas que me aconteceu em 2008. Bem no
final do último ano muitas foram as novidades e, a nível profissional, novos caminhos se
iniciaram. Mais uma vez, o que custou foi ter a iniciativa e fazer os contactos; custou começar a
tomar consciência de que é isto mesmo que quero. E HOJE, O 1º DIA DO ESTÁGIO, foi o
confirmar de que vai doer um pouco habituar-me a esta mudança inicial”.

Publicado no ’O 1º dia como a estagiária do Público’, Parem as Máquinas a 02/02/2009

Inicio o relatar do meu estágio no Jornal Público com o primeiro post do ‘Parem As Máquinas’ -
blogue que nasceu com o intuito de contar os três meses passados na redacção do Público no
Porto. Impreterivelmente o primeiro dia é o mais emotivo, o mais esperado e o que nos enche de
orgulho por ter conseguido tal lugar. Para mim foi o dia mais expectante, já que tudo se mostrava
novo e desconhecido.

Não querendo ser muito literal ou romanesca, penso que os primeiros dias são aqueles que ainda
nos alimentam o sonho de que podemos ser veículos de mudança. Que finalmente nos vão dar o
reconhecido valor, já que vimos fresquinhos, com a matéria toda na ponta da língua e sabedores
de normas e éticas subjacentes à prática que nos exige o ser jornalista. No meu caso, a primeira
semana sem dúvida a semana do abanão. Confesso que nessa semana queria desistir, deixar a
redacção e o estágio, pelo simples facto de querer trabalhar no imediato e ser útil. Pode parecer
idiota da minha parte, mas ia com uma ânsia tal de mostrar trabalho e valor que, logo no segundo
dia, fiquei contente por fazer uma “caixa”, vulgo pequeno artigo não assinado, com cerca de 800
caracteres. O problema não estava em ser uma caixa ou serem menos de 1000 caracteres. O que
verdadeiramente me atormentou nos primeiros cinco dias na redacção do Público foi o facto de

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saber que podia fazer melhor mas que, como em tudo, ainda agia de forma tímida, dando erros, os
típicos erros de quem ainda está a começar.

Toda a informação jornalística rege-se pelos princípios fundamentais da verdade, da clareza, da


simplicidade, da precisão e da concisão. Todo o produto criado pelo profissional da informação
tem, sem margem de dúvida, que ser do interesse público e assentar nestes princípios
fundamentais. Como jovem jornalista, acabadinha de sair do mundo universitário, foi-me um
pouco difícil adequar a minha escrita de jornal universitário à escrita digamos que padrão do
Público.

Não quero com isto dizer que o Público utiliza uma escrita diferente mas sim expressar a
adequação a uma prática contudo diferente a que estava habituada. Começando pela utilização do
Livro de Estilo, uma ferramenta de consulta da maneira como o Jornal se apresenta e age nas
lides da informação. Da mesma maneira contempla detalhes organizacionais do texto, sintaxe,
significado e significação, sem nunca descurar a pirâmide invertida – isto é – dar em primeiro a
informação relevante e ir desmontando os detalhes, respondendo às questões chave: o quê, quem,
onde, quando, como, porquê.

Segundo Ayala, (1984), o jornalismo apresenta-se como a interpretação sucessiva da realidade. O


relatar a realidade apresenta-se como a construção do presente de forma a prever e a pensar o
futuro. Hoje em dia, e depois da experiência de três meses “dentro” da máquina produtiva que é o
Público, acentuo este cariz imediato e construtivo da realidade.

Logo no primeiro dia também me foi dito, pelo subdirector Amílcar Correia, uma frase que ficou
registada na memória e me acompanhou versus atormentou durante o período em que estive em
estágio: “Se quiseres podes ser a estagiária que está todo o dia na secretária, a ver os takes da
LUSA, ninguém te chateia e não chateias ninguém. Mas, se quiseres, podes ser a estagiária que
dá propostas, procura fazer notícias e não está à espera que digamos o que fazer”.

Este conselho é digamos que o ‘prato da casa’ para quem começa. É o avisar de que ali nos é
exigido empenho, se assim for nosso entender e aspiração. Se assim não o for também não
constitui problema, já que o jornal não está para nos levar ao colo. Acho que foi isso que me
assustou mais. O abrir realmente a porta da responsabilidade, de ser a imagem daquilo que
poderia fazer, desta vez sem o aconchego dos colegas do jornal universitário. Começava o meu
percurso por minha conta e risco. E como em qualquer lado e profissão, o que custa é começar.

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“Bom dia, tem ocorrências a registar?”

De tudo o que fiz no meu estágio, reconheço realmente as marcas deixadas pela primeira semana.
Durante esses cinco dias experimentei um pouco de tudo no que diz respeito à prática jornalista.
Comecei com a ronda ou volta, um dos pressupostos primordiais da recolha de informação.

No Público a ronda jornalística é feita por telefone e realiza-se por três vezes durante o dia. A
primeira acontece pelas 10h/11h, sendo o primeiro contacto com as fontes. Esta ronda toma
especial importância pelo facto de ser o primeiro contacto da manhã e que tem o objectivo
principal de perceber se houve algum acontecimento registado durante a noite ou madrugada que
tenha importância de ser aprofundado. Aqui aplicamos a regra da actualidade e interesse público,
critérios jornalísticos que regulam a escolha dos assuntos e temáticas a abordar, e que, numa
lógica informativa, servem para dar ao leitor aquilo que lhe interessa saber.

A segunda ronda, feita ao início da tarde tem lugar por volta das 15h. Mais uma vez tenta apurar-
se o registo de ocorrências do dia e explorar detalhes de assuntos que envolvam o interesse de
publicação na edição do dia ou do dia seguinte. A última ronda é feita pelas 17h30/18h e
caracteriza-se pela última abordagem da ronda, muitas vezes feita com o intuito de confirmar
dados que carecem de maior tempo de pesquisa.

É importante explicar que as rondas informativas seguem uma lógica informativa e inserem-se
num plano de acção que passa pelo contacto a autoridades locais e regionais. Deste modo e
seguindo uma grelha de contactos, todos os dias são abordados pelos jornalistas do Público
entidades como Bombeiros Voluntários do Porto e Grande Porto, Sapadores, o Centro de
Orientação de Doentes Urgentes (CODU), GNR, PJ e PSP e as Brigadas de Trânsito da área
metropolitana do Porto e Grande Porto, bem como da região de Aveiro e Braga.

Sublinho que o contacto com as fontes não é somente feito nas três rondas diárias. De toda a vez
que necessitei de contactar com as fontes ou efectuar qualquer esclarecimento adicional ao artigo
ou trabalho que realizei, contactei com as pessoas envolvidas, como procedimento habitual de
qualquer jornalista. As rondas, mais uma vez reforço, são somente os contactos ditos
institucionais que têm de ser feitos para que se mantenha o fluxo informativo do dia e não se
perca o carácter actual da informação.

Relacionado com este aspecto, o da actualidade e fluxo informativo, é importante reflectir sobre a
informação dita do dia e o carácter imediato dos acontecimentos. Como em qualquer órgão de

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comunicação social, o fluxo informativo segue a agenda mediática. Esta agenda é alimentada pela
lista diária dos acontecimentos cuja noticiabilidade é dada como certa e inserem-se na esfera
política/institucional. Por exemplo, como os comunicados de imprensa enviados por entidades
que pretendem divulgar acontecimentos ou eventos, de âmbito local e regional, neste caso, da
área do Porto e Grande Porto.

Daí ser da maior importância num jornal existir uma agenda organizada e articulada com os
diversos serviços do meio de comunicação de social, de maneira a rentabilizar a realidade
mediática. Por vezes, durante o trabalho em redacção no Público, senti que nem sempre as coisas
estavam assim tão articuladas como deveriam ser. Muitos episódios caricatos se passaram neste
estágio, que contarei em devido contexto, mais à frente neste relatório.

O meu trabalho como estagiária do Público durante os três meses foi, muitas das vezes, de
acompanhamento de acontecimentos locais, como por exemplo conferências de imprensa,
apresentação de projectos de âmbito local, comunicações ou apresentação de exposições ou
inaugurações. Tem de se ter em conta um aspecto: o trabalho desenvolvido no estágio no Público
teve notoriamente um carácter mais de âmbito local, já que me inseri na secção de Local/Porto.

Todos os assuntos que tratei jornalísticamente inseriram-se no âmbito nacional do Público,


estando mais directamente relacionados com edição Norte da publicação. Esses trabalhos tiveram
início na distribuição de tarefas dadas pelos editores, com o intuito de fazer a cobertura noticiosa
da área de influência.

Contudo, durante o tempo que estive na redacção do Público, não esperava agarrar-me tantas
vezes ao telefone para exercer a minha busca pela obtenção e confirmação da informação.
Ingenuamente ainda vinha com a ideia que o jornalismo se faz na rua, em contacto directo com as
pessoas, na mistura inevitável de cheiros e sons que tão surrealmente me transportam para um
qualquer filme.

Logo no segundo dia fui alertada para a consulta da agenda do dia, grelha de distribuição de
tarefas, na qual os jornalistas consultam a atribuição de algum serviço marcado para esse mesmo
dia. Previamente o jornalista deve marcar o serviço com a agenda, para que, de forma articulada e
organizada, ‘escrita e imagem’ se articulem também e se faça o trabalho de cobertura
informativa.

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No meu caso, para começar a semana de estágio, marcaram-me a ronda ou volta, tarefa da praxe
dos estagiários, como tão sorridentemente todos os colegas da redacção sussurravam entre dentes.
Por mim até que não me importei, era uma primeira tarefa, ia agarrá-la com dedicação e
empenho.

Desde logo reconheci grande importância à ronda, já que me permitia entrar em contacto com as
fontes ditas institucionais e primárias, no que diz respeito a acontecimentos na zona do Porto e
Grande Porto, bem como na generalidade do Norte do país. Antes de começar a desbravar a
primeira tarefa de estágio, foi-me explicado como funcionava a ronda e como deveria proceder a
determinados mecanismos de bloqueio de informação por parte das fontes. Por acaso já sabia um
pouco como funcionava esse jogo de cintura entre a obtenção de informação e a tão preciosa
fonte, já que no Jornal Universitário A Cabra utilizávamos o mesmo método (telefónico) para
contactar as fontes.

A primeira prática – o primeiro contacto com as fontes

O contacto com as fontes via telefone mostra-se essencial para a obtenção da informação e
posterior confirmação. As fontes são o alimento do jornalista e sem elas não podemos sequer
actuar. Nesse segundo dia de estágio as coisas correram bem, sem problemas ou pânicos. Fica
registada a frase que marca esta passagem no relatar do estágio no Público, com o “Bom dia, tem
ocorrências a registar”, frase que mais tarde se tornou mecânica e que já era conhecida das
minhas fontes.

Não resisto a transcrever o post que conta como passei o meu segundo dia na redacção. Está rico
em descrições daquilo que tive de fazer para escrever o meu primeiro artigo, uma caixa de 800
caracteres e fruto do primeiro dia de ronda. Os primeiros procedimentos como jornalista do
Público, o primeiro dia de trabalho a sério e o inicio do longo suar que foi o de me relacionar com
as fontes através das rondas telefónicas.

“Este 2º dia foi, sem dúvida, dolorosamente fascinante!

Doeu passar todo aquele tempo agarrada ao telefone, a ouvir as negas das tentativas de obtenção
de informações e, num todo cáustico, ouvir o meu editor a dizer: “tens de ter esta informação,
senão os outros conseguem e nós não!”.

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Hoje foi um dia quase de casos de polícia. Segundo a gíria jornalística, dediquei-me à ronda ou
casos do dia. Por três vezes, às 11h/12h, às 15h/16h e às 17h30/18h, tive de telefonar para os
bombeiros, PJ, GNR, PSP e Sapadores aqui da zona do Porto, Gaia, Aveiro e afins. Ao segundo
telefonema tudo se tornou um pouco automático, num repetitivo: “Bom dia, sou a Vanessa
Quitério, do Jornal Público, queria saber se têm alguma ocorrência a registar?”. Teve a sua piada,
não fosse o atordoante trabalho que tive de fazer ao longo do dia e que quase me levou à angústia
de desistir naquele momento de tudo.

De manhã quando cheguei, um pouco tarde até, por volta das 10h40, vi na agenda de redacção
que me tinha sido atribuída a tarefa de fazer a tal ronda. Bem, até fiquei entusiasmada já que era a
minha primeira tarefa a sério… Mas depois começaram a chegar os takes da Lusa sobre os
assaltos ocorridos ontem aqui no Grande Porto, a farmácias, e a detenção de dois suspeitos de
assaltos também a farmácias. O meu tormento jornalístico do dia ia começar…. O editor deu-me
a indicação que era para explorar a notícia das detenções e dos assaltos no fim do dia anterior.
Tinha que descobrir detalhes que enriquecessem o que já tinha sido dito nos outros órgãos de
informação e adiantado pela Lusa e pelos outros portais online. Parecia que ia ser fácil mas não
foi.

Passei o resto da tarde agarrada ao telefone a tentar recolher informações da GNR e da PSP, na
tentativa de descobrir de onde eram os suspeitos, como tinham sido detidos e o modus operandi
da coisa. DETALHES - NADA! Alegaram-me sempre que não davam essas informações pois
estava tudo sobre investigação e segredo de justiça. Ia desesperando a cada minuto que passava
pois sabia que me ia ser exigido um artigo para o dia seguinte.

Também por ideia do editor, contactei a Associação de Farmácias Portuguesas, na tentativa de me


dizerem que farmácias tinham sido assaltadas… a ideia era boa, mas também me foi barrada tal
informação. Mais uma vez estava a ficar com o artigo em risco, quase a cair na transcrição de um
comunicado, coisa que os outros jornais também tinham e que ia ser mais um artigo de agência.
Por sorte ou não, numa das rondas, a GNR facultou o nome da rua das farmácias assaltadas e,
numa pesquisa rápida pelo Google lá descobri o contacto. De seguida foi telefonar e confirmar se
eram ou não as farmácias perpetradas pelos assaltantes ao fim do dia anterior.

E lá consegui falar com alguém! Dos técnicos presentes nos assaltos, um deles recusou-se a dar-
me detalhes; o outro falou-me da situação, do modo como tudo aconteceu e, a meu ver, salvou o
meu trabalho da tarde toda.

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Recolhida a informação, comecei a escrever os 800 caracteres necessários para a coluna que vem
amanhã no Local/Porto, na edição cá do norte. Mas atenção, não são totalmente meus: o editor,
esse ‘Eduard Sissor Hands’, lá cortou caracteres, limou frases e reformulou o ângulo. Com o meu
consentimento, vi ser-me modelado o artigo para aquilo que realmente tinha interesse jornalístico.
E, desta forma, percebi que tenho muito ainda a aprender sobre cruzamento de informação,
escrita pressionada e ângulo jornalístico.

Foi um dia frustrante. Saí da redacção às 20h… Amanhã espera me uma ida a Matosinhos, ainda
fazer não sei bem o quê. Que seja o que eles quiserem e o que eu souber fazer da experiência. A
ver vamos.”

Publicado no ‘Bom dia, tem ocorrências a registar? Parem as Máquinas 03/02/2009

Desta primeira experiência saiu, na edição do dia seguinte, o meu primeiro artigo (ver imagem
em anexo).

Erro no artigo e descasca da PJ

No Parem as Máquinas escrevi assim:

“Caiu-me tudo aos pés quando, esta manhã, telefonei para a Polícia Judiciária e a Relações
Públicas me repreendeu por uma informação incorrecta no meu artigo de hoje. Se tivesse um
buraco para me esconder, tê-lo-ia feito nesse momento. Só não desatei a chorar porque não queria
criar constrangimentos para a minha pessoa, aqui na redacção.

Como era de esperar, algum dia teria de ser confrontada com os erros ou imprecisões da prática
jornalística, mas esta repreensão por parte da PJ deixou me sinceramente com a moral em baixo.
Mas que raio aconteceu para veicular mal este dado?!.

O que aconteceu foi uma falha na edição do texto, já que numa fase inicial juntava várias
ocorrências acontecidas esta semana aqui no Grande Porto. Juntei as informações recolhidas
pelos dados fornecidos nos comunicados da PJ e posteriormente explicações pela Relações
Públicas e também pelos dados fornecidos pela PSP. O que levou ao erro foi uma má edição da

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informação relevante, já que no artigo que entreguei no layout da página a informação sobre os
quatro suspeitos por assalto a estabelecimento comercial estava junta a uma ocorrência da PSP,
acontecida no mesmo dia; foi por esse elemento comum que liguei os acontecimentos, não
fazendo necessariamente a referência que a ocorrência tinha sido feita por uma força policial
diferente.

Pedi desculpas à PJ pelo meu erro. Em meu nome e em nome do jornal”.

Publicado no “Erro no artigo e descasca da PJ”, Parem as Máquinas a 19/02/2009

Este dia foi um dos piores dias de estágio que tive no jornal Público. Senti-me profissionalmente
atingida por um erro básico e, nesse sentido coloquei em causa muito do trabalho feito
anteriormente.

Percebo que foi no início do meu estágio mas, como pessoa e profissional em causa, pequenos
detalhes destes só poderiam desmoralizar. Mais que isso, percebo agora, que acidentes como este
servem principalmente para chamar a atenção para a eterna responsabilidade que o profissional
tem em qualquer acto de informar. Neste caso, um erro na junção de vários artigos omitiu um
dado importante e deturpou o verdadeiro teor noticioso.

Para a PJ tratou-se de um erro crasso e deveras perdoável. Quando a Relações Públicas da PJ me


repreendeu senti-me miseravelmente culpada. Culpada por não ter revisto o texto final
juntamente com o editor, culpada por não ter elaborado desde o início o artigo correctamente, não
deixando qualquer género de dúvida ou erro nas informações que assinei.

Mas, como em qualquer coisa, consegui ultrapassar o sucedido e por isso congratulo os imensos
comentários que recebi posteriormente no blogue de estágio. Nesta situação foram muitos os que
deixaram mensagens de apoio e de conforto, bem como experiências idênticas e que se
mostraram mais aprendizagens do que repreensões.

Neste aspecto o Parem as Máquinas funcionou na perfeição, como espelho da minha prática
diária e como contador de estórias e aventuras, para o mundo de fora, o dos meus leitores e
colegas, puxando sempre para a análise saudável do que ia fazendo como jornalista estagiária do
Público.

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Sempre a aprender, agora com as fontes

Na lida constante entre a informação e o escrupuloso dever de confirmar dados e reconfirmar


dados, a aprendizagem como jornalista altera-se e reconfigura-se. No tempo em que estagiei no
Público comecei a perceber a importância de ganhar a confiança das fontes, mais em concreto
com as ditas institucionais e com as quais lidei diariamente na ronda ou casos do dia.

No meu caso em concreto tive a dificuldade sumária de, ao início, não estar a vontade em abordar
a Relações Públicas da Polícia Judiciária do Porto. Como fonte e, segundo o alfabeto do Livro de
Estilo (página 129), “só pode ser considerada fonte a pessoa a quem o Público reconhece
competência e seriedade para prestar a informação. Na avaliação de uma informação pondera-se
o seu valor intrínseco, a possibilidade de a comprovar e a idoneidade da fonte”.

Como tal, sendo inevitável o meu contacto com a fonte da PJ, fui adaptando-me à maneira por
vezes amarga de abordagem e de instrumentalização de um poder ao qual, como jornalista, ainda
tenho muito que aprender. Saber levar a fonte a dizer o que nós queremos é, na minha óptica,
uma arte comparada ao do bem falar ou escrever. Sem as fontes não somos nada, tanto no
jornalismo, como em qualquer outra área ligada à informação e difusão de conteúdos.
Numa das conversas com a Relações Públicas da PJ consegui discernir que, muito mais que um
veículo de esclarecimentos, as fontes são instrumentos de aprendizagem. No Parem as Máquinas
publiquei a seguinte análise:

“Hoje, num dos telefonemas feitos para uma das fontes apercebi-me que posso retirar alguma
aprendizagem nesta relação necessária e inevitável. Ao falar todos os dias com esta fonte, vou
colocando em ordem procedimentos e conteúdos que devem ser a base para a minha prática como
profissional da informação.

O adquirir conceitos e maneiras de abordagem só é fácil de cimentar se tivermos uma prática


corrente e mais afincada; neste caso, contactar com fontes todos os dias ajuda-me a adquirir
hábitos básicos, mas que sem a prática repetida me seriam mais difíceis de apreender.

Com esta fonte aprendi que:

- A arte de confirmar cada detalhe pode ser aborrecido para quem dá a informação mas é uma
salvaguarda para o jornalista

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- Por mais ralhetes que ouçamos por parte das nossas fontes, também é esse o papel delas para
que não ganhemos a dita “mania” de pedir e fazer o que nos bem apetece

- A relação fonte -jornalista deve ser cordial mas também uma ligação íntegra, de respeito mútuo
e que não quebre as regras de ambos. Quebrada uma confiança, podemos “queimarmo-nos” para
sempre.”

Publicado no “Sempre a aprender, agora com as fontes”, Parem as Máquinas a 24/03/2009

A questão da confiança é, para mim, algo necessário e imprescindível nesta prática como
jornalista. Foram muitas as vezes em que percebi que muita da informação não me foi dada ou
disponibilizada por ser nova na “casa” ou ainda não ter um estatuto reconhecido
profissionalmente. Embora, em nenhum dos casos isso foi barreira para realizar os meus artigos
ou pesquisas e obter as informações necessárias.

Recorrendo de novo ao Livro de Estilo do Público (página 130) acrescento mais um pouco a
definição de fonte, segundo este instrumento balizar do órgão de comunicação social onde
estagiei: “Uma fonte é quase sempre parte interessada e o jornalista tem de ter o cuidado de não
se deixar instrumentalizar. Os jornalistas do Público devem alimentar uma relação assídua com as
suas fontes de informação, contactos regulares, boas relações em postos-chave e iniciativa junto
de entidades que possam constituir-se como fonte de informação e/ou ponto de partida para uma
investigação jornalística”.

O contacto assíduo com as fontes realizei mais em concreto através das rondas telefónicas que se
mostraram diárias e num fluxo contínuo. Durante dias e semanas contactei autoridades e fontes
institucionais, conseguindo ao fim de algum tempo mostrar um certo “à vontade” que não tinha
inicialmente. Como estória caricata recordo as inúmeras vezes que a Relações Públicas da PJ me
auxiliava no esclarecimento dos comunicados de imprensa enviados e, no fim desse trabalho
institucional, me cumprimentava e desejava um bom trabalho, deixando sempre um beijo ou
abraço. A nossa relação, jornalista - fonte, tornou-se mais suportável e não tão mecânica,
ajudando na tarefa de obter mais dados do que aqueles que eram fornecidos via comunicados. Foi
sem dúvida um ganhar de confiança.

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Ao terceiro dia de estágio tratei de novo de comunicados vindos das forças policiais e tive a
minha primeira saída para fora da redacção, como jornalista do Público. A tarefa consistiu em
acompanhar uma conferência de imprensa em Matosinhos, que dava conta da apresentação do
projecto de requalificação das instalações da Associação Recreativa Aurora da Liberdade, espaço
emblemático da cidade.

Dessa saída, feita na parte da manhã, não resultou um artigo, já que por motivos de paginação,
outros assuntos tiveram que ocupar as páginas do Local/Porto.

Cada dia apresentou-se como uma oportunidade de perceber como funciona a rotina jornalística e
como proceder perante uma prática que se quer isenta e a mais verdadeira possível. Como já
referi no inicio deste relatório, criei para ir contando esta minha aventura no Público um blogue, o
‘Parem as Máquinas’, plataforma online que contou até ao fim do estágio com 13.000 visitas. Em
três meses recebi conselhos e dicas, parabéns e algumas chamadas de atenção, tudo no sentido de
melhorar a minha escrita e a melhor relatar o que ia aprendendo e conhecendo.

Na primeira semana fiz o primeiro balanço. Mas antes de expor as conclusões dos primeiros sete
dias, é me necessário analisar um dos momentos mais emocionantes do meu estágio e que serve
de ensino para a prática como jornalista.

“Foi um dia emocionante: tive a minha primeira saída como repórter, fui ao local do dito “crime”
e tive a minha primeira notícia publicada no online. Vou explicar por partes, já que o mérito não
é todo meu, um pouco de trabalho sim, mas mais foi o suor do meu editor, que me vai ajudando a
melhorar aspectos e aparando os golpes da minha ainda inexperiência jornalística”.

Publicado no ‘A conversa, a tragédia e um dia mais animador’, Parem As Máquinas, 05/02/2009

No terreno privei com a informação em bruto e com as fontes, numa saída repentina e que
careceu de “estômago”, pelo assunto que foi e pelo tratamento jornalístico que levou. Refiro-me
ao acidente no Senhor da Pedra, em Miramar, Gaia, onde uma mulher foi dada como
desaparecida. Ao início da tarde, através da ronda foi-me comunicado o desaparecimento e que
estavam a decorrer as buscas pelo possível corpo da vítima. Alertado para este facto o meu editor
colocou-me no artigo e partimos ambos até ao local, para recolher mais elementos de reportagem.

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Desta saída muito tenho a relatar. Primeiro o assunto de trabalho, já que se tratava de um aparente
suicídio e, como norma ética, o Público não trata suicídios. Jornalisticamente é também um
assunto delicado, o que desde logo me despertou para a minha conduta segundo o código
deontológico. Mesmo assim agarramos a informação e da recolha feita no local, realizamos um
artigo, focado no ângulo do acidente e dos inúmeros meios de salvamento envolvidos.

Segundo ponto de análise prende-se pelo modus operandi tido no local, realizado em parceria
com o editor que me acompanhou. Numa espécie de parceria, tentamos obter detalhes sobre o
acidente e abordar as entidades que estavam a coordenar as buscas no local. Ao mesmo tempo
conversamos com as pessoas que se encontravam nas imediações, na tentativa de arranjar
detalhes de contexto para melhor perceber o que se estava a passar na praia do Senhor da Pedra.

No fim, passado algum tempo regressamos à redacção. Tanto na ida para o local, como no
regresso, foi-me possível trocar impressões com o meu editor. Reconheço que foi uma mais-valia
poder privar tão pessoalmente com o editor, numa conversa quase de professor - aluno e que me
ajudou a perceber as angústias dessa primeira semana.

“Durante aqueles minutos de viagem as palavras que o meu orientador proferiu bastaram para me
tirar da ideia que estava a errar. Afinal era o meu quarto dia na redacção e é normal ainda não
estar habituada à mecânica do diário. Acima de tudo disse que não vale a pena estar a sofrer
antecipadamente, mas que estar no Público é algo que é exigente por si só. Se estou lá é porque
me foi dada a oportunidade de mostrar que merecia a aposta. De resto, vai-se aprendendo todos
os dias e esta é a melhor escola que se podia ter em termos de referência do jornalismo diário em
Portugal – fora modéstia, referiu-me ele – na tentativa de não parecer parcial”.

Publicado no ‘A conversa, a tragédia e um dia mais animador’, Parem As Máquinas, 05/02/2009

Senti-me privilegiada por ter a oportunidade de contar com o apoio e dedicação de tamanho
profissional que me auxiliou nesta primeira tarefa de campo, dificultada pelo facto de se tratar de
um aparente suicídio. No fim, desse trabalho conjunto, saiu para a edição do dia uma fotolegenda,
a primeira de algumas que fiz durante o estágio. O artigo saiu também no online, inaugurando
assim os meus trabalhos como jornalista do Público.

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Ainda na primeira semana de estágio vi serem publicados mais dois artigos no Local/Porto (ver
artigos em anexo). Trataram-se de ocorrências do dia, vindas da ronda e dos comunicados das
forças policiais. Como dei por título a um dos post’s do ‘Parem as Máquinas’, na Sexta-feira foi o
dia em que os artigos apareceram naturalmente, e onde mais fluentemente consegui aplicar as
técnicas já desenvolvidas nos anteriores artigos, os primeiros da primeira semana de estágio.

“Sendo eu a mera transmissora de informação, a mediadora entre o material em bruto e o


diamante lapidado, que mais posso fazer se não dar o essencial e nada mais que o essencial?! Só
sei que dos dois artigos que escrevi nesse espaço de tempo, pouco ou nada foram modificados.
Somente os ajustes do costume, as imperfeições de quem ainda está a sair do mundo académico,
viciado de esquemas sincronizados de fazer as coisas.

Aqui, num espaço de cinco dias, já consegui ver mais detalhes e perceber como realmente se
chega a um artigo jornalístico, do que nos anos que andei a ler sobre pirâmides invertidas e
critérios noticiosos. NÃO QUERO COM ISTO menosprezar o que aprendi, muito pelo contrário.
Os últimos três anos serviram para me dar as bases para está prática mais acérrima de jornalismo.
Se o não fosse dessa forma, não conseguiria neste momento distinguir entre evolução e
aprendizagem”.

Publicado no “Sexta-feira - o dia em que os artigos apareceram naturalmente”, Parem as


Máquinas a 06/02/2009

Numa espécie de resumo da primeira semana, escrevi no Parem as Máquinas as primeiras


impressões dos sete dias iniciais do estágio. Mais uma vez recorro a um dos post’s do blogue,
como forma de não incorrer em erro neste contar de experiências.

A começar, é importante realçar que este sonho tornado realidade acarreta uma enorme
responsabilidade. Acrescida por estar no órgão de comunicação em que estou e também por ter
apresentado provas daquilo que valho e poderei fazer. Este foi o motivo crucial que me levou, nos
primeiros três dias, a entrar em rota de colisão comigo mesma e pensasse que não estava
preparada ainda para tamanho salto.

“Foram dias angustiantes a meu ver pois revelarem em mim coisas que não queria, como a
incapacidade de resposta imediata às pressões e o constante bloquear de iniciativa. Para assustar
assim logo no primeiro dia, não esqueço o conselho do subdirector Amílcar Correia - de

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empreendermos dentro do jornal e não sermos mais uns bonequinhos amestrados da vontade de
fazer pouco. Engoli em seco e comecei a imaginar mil e uma coisas para poder tratar
jornalísticamente. Até agora nada! Seguiram-se dias ainda um pouco turbulentos.

A ronda, os artigos de casos de polícia, a pressão de apresentar trabalho em vez de ser mais uma a
consumir oxigénio dentro daquela redacção que transpira a trabalho, foram duras metas a
atingir… Se não fosse a força de vontade que tenho em lutar pelo que gosto, certamente ter-me-ia
sido mais fácil agarrar na trouxa e vir embora. Por vezes é mais fácil…

Mas assim não o foi. E nesta semana aprendi já coisas que me vão ser bastante úteis. Deixo então
as dicas da semana, numa breve alusão às dicas promocionais dos supermercados, em busca da
divulgação dos produtos mais baratos. Não digo coisas ocas de interesse, antes pelo contrário,
que podem ser luz a muitos estudantes como eu, que nesta fase mais puxada da vida, nos
deixamos entrar à deriva…

1º - Entrar numa redacção com olhos de ver - é uma área que transpira a ambiente de trabalho,
por mais desarrumado que esteja;

2º - Se os editores e os directores parecerem carrancudos ao início, é tudo uma camada de bluff.


Afinal o que eles mais vêem são estagiários com o sonho idílico de mudar o mundo e com
pretensões de ficar. Por acaso tenho esse sonho, mas o de ficar nunca coloquei a hipótese, por ser
difícil, e por não ser para já esse o meu objectivo - ainda tenho de “comer muita relva antes de
aprender a bem rematar”;3º - Quanto à postura a ter em ambiente de trabalho, não vale a pena
sabermos a teoria toda se, na prática nem se sabe o que são 800 caracteres. Eu por acaso tenho
essa noção, mas continuo a não saber colocar bem em prática a pirâmide invertida. Problemas…

4º - Os primeiros dias são aqueles em que nos chegamos ao pé do editor em busca de algum
conforto. Eu tive a sorte de ter como editores de secção duas pessoas muito profissionais e
competentes. Sabem dar as dicas a seu tempo e exigir a seu tempo também. Há que encará-los
como uma preciosa ajuda e, acima de tudo, tratá-los por TU.

5º - Ter atenção às normas e maneiras de escrita do Jornal. Há coisas que às vezes são tão básicas
mas que não correspondem ao caminho editorial que o jornal pratica. Tive essa experiência com
os alegados casos de suicídio que surgiram nesta primeira semana. Davam boas estórias mas de
jornalismos não tinham nada.

Agora não sei mais o que escrever… Varrem-se-me as ideias para mais dicas, tenho que passar a
anotar com mais precisão cada nova aprendizagem. Esta semana foi rica em novas experiências e
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novos contactos. Desta ideia surgiu uma das melhores oportunidades que estou a ter, a de
potenciar o meu trabalho fora redacção e fora do âmbito académico.

Abre-se neste primeiro instante, o crescer de uma reputação a nível da web e a responsabilidade
de estar a ser uma janela aberta para o mundo. O mundo que se diz ser Público e que neste
momento é o meu estágio.

Publicado no ‘Resumo da primeira semana’, Parem as Máquinas a 08/02/2009

A partir da segunda semana já estava inserida na rotina da redacção do Público, no Porto. Por
defeito meu ou insistência pessoal primei sempre por chegar cedo à redacção, por mais
desajustado que fosse, já que somente a partir das 11h/12h é que começava o trabalho na
redacção. Mas, como sempre foi desde o início, aprendi a gostar do silêncio e do vazio da
redacção, assim como numa espécie de contemplar do habitat natural do jornalismo.

O meu estágio foi sem dúvida alguma uma experiência rica e marcante. Pela positiva, no abrir de
portas e de conhecimentos a nível do jornalismo, mas também como na troca de experiências e
oportunidade de aplicar um jornalismo dito de referência e que me dava total liberdade de acção e
ideias.

Contar uma estória: a prática versus a deontologia

“Era uma vez, um gato maltês, que tinha umas calças e falava francês!

Não, não é destas histórias que vou contar ou que me propõem fazer aqui na redacção do Público.
Antes mais, o que crio ou tenho de criar, são daquelas histórias com factos e que são o prato do
dia de qualquer jornalista: recolher informações a partir dos diversos tipos de fontes, cruzar
informação e redigir artigos imparciais, limpos de treta e choradinhos, referenciais do jornal onde
estou.

Publicado no ‘Contar uma estória’, Parem as Máquinas, 27/02/2009

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Muitas foram as dificuldades sentidas durante a elaboração dos artigos, bem como na recolha dos
elementos informativos. Desde o início que me posicionei criticamente ao meu trabalho, como
jornalista e veículo de informação, bem como no rigor da escrita daquilo que tratei. Durante todo
o trabalho desenvolvido tive oportunidade de colocar em prática os vários conhecimentos
adquiridos na formação académica e, mais em demasia, a prática deontológica e a análise dos
meus direitos e deveres como jornalista.

Bem no início, no começar de relação com as minhas fontes institucionais, senti que muitas das
vezes foi-me barrada informação por ser a “ estagiária”. Muitas das vezes ouvi por parte da
Relações Públicas da Polícia Judiciária que “não podia perguntar tal coisa por estar sobre segredo
de justiça”, muito embora soubesse que tinha a meu favor o direito de saber detalhes sobre os
casos em tratamento jornalístico, nunca colidindo com o segredo de justiça ou incorrendo em
violações de privacidade. Por ser a estagiária, muitas das vezes as minhas fontes quiseram ocultar
informações, no pensar que, por ser nova nas lides de recolha e exploração da informação, não
trataria dignamente a informação recolhida e me deixaria vencer por um simples não.

Foi-me muito útil relembrar as aulas de Direito da Comunicação, bem como da prática
deontológica, seguindo os parâmetros do Código Deontológico dos Jornalistas Portugueses.

A prática deontológica e o exercício real do jornalismo vivem em constante colisão. A reflexão


do que fazemos enquanto profissionais colide, muita das vezes, com os procedimentos tidos mais
éticos e que devem regular o nosso saber - fazer enquanto veículos de informação.

Este confronto instalou-se durante o meu estágio por diversas vezes, tanto no perceber como agir
perante novas situações como na escolha do ângulo a tratar os dados. Dois artigos que redigi
colocaram-me numa situação delicada, pelo facto de necessitarem de uma atenção especial pelo
teor e modo de actuar.

O primeiro artigo suscitou-me problemas porque despertou a análise do valor-noticia - conceito


pelo qual o jornalista avalia o grau de noticiabilidade de um acontecimento. Segundo Nelson
Traquina (2002), os critérios noticiosos são como uns ‘óculos deontológicos’, através dos quais
se distingue o normal, vulgar e esperado do anormal, inesperado e desviante. São conceitos que
estão presentes em todo o processo produtivo e apresentam-se como instrumentos de análise do
que pode e deve ser noticiado.

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Em alguns casos de análise de dados que recebia mediante as rondas e comunicados de imprensa,
senti a dificuldade de perceber realmente quais valores-notícia os meus editores me pediriam para
aprofundar, e se tudo o que recebia desse background era passível de ser noticiado.

O primeiro artigo que exploro prende-se com uma situação pouco comum e que me levou a
questionar a publicação.

“A estória chega ao ponto de parecer bizarra, mas aconteceu mesmo: uma funcionária de um
hospital aqui do Porto ficou com a mão presa numa máquina de passar roupa. Segundo os
Bombeiros Sapadores do Porto, a mulher ficou com a mão entalada entre dois rolos de aço,
acabando por não sofrer esmagamento ou danos de maior. Mal me foi comunicado este acidente,
tratei de recolher os dados, confirmar com os bombeiros o local, a hora de chamada, ocorrência,
estado de saúde da vítima, entre outros elementos”

Publicado no ‘2º página, na esquerda, em baixo’, Parem as Máquinas, 18/02/2009

Este artigo “custou a fazer”. Não tanto pela definição do valor-notícia em si, mas pelo facto de se
tratar de um acidente num hospital, um tanto ou quanto caricato e que me envolveu numa
discussão de pontos de vista com o editor.

Foi através de uma das rondas que obtive a informação de que uma pessoa tinha ficado ferida
num acidente de trabalho no Hospital Magalhães Lemos, no Porto. Uma funcionária tinha ficado
com o braço esquerdo entalado numa máquina de dobrar roupa, o que causou um grande aparato
no local. Quando comuniquei ao editor a ocorrência, ele disse-me para avançar com o caso e
recolher o maior número de factos sobre o acidente. Nesse aspecto cumpri com a regra, confirmei
dados e cruzei informações com as diversas fontes. O que me levou a entrar em discussão com o
editor foi, realmente o âmago da questão e o real valor-noticia daquela ocorrência, já que me
parecia sensacionalista “demais para pegarmos no caso”.

Foram palavras minhas o que acabei de referir, o que espoletou grande consternação por parte do
meu editor. Pela maneira como questionei o critério noticioso, bem como na minha definição de
informação sensacionalista. Percebi que não podia revogar sensacionalismo nem muito menos
colocar em causa a decisão de tratar jornalísticamente o caso.

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Na minha opinião, ingénua de jovem ainda com muito por aprender, senti-me estupidificada por
falar sobre um caso caricato, que foi mais aparato que outra coisa. Questionei para mim mesma se
aquilo era o mais correcto a fazer, na busca do interesse público que o jornalismo tanto revoga.

Para piorar as coisas, alguns dias depois vi esse mesmo artigo ser apresentado no mural de
entrada da redacção, espaço onde são deixadas informações ou colocadas coisas engraçadas, e
que neste caso reportavam o meu artigo para uma qualquer página de jornal sensacionalista
(exemplo de um Correio da Manhã ou mesmo de um jornal O Crime). O meu artigo estava
sublinhado a fluorescente, destacado assim para quem mais distraído não se tinha apercebido na
edição do dia 19 de Fevereiro.

Fiquei chateada, por estar a ser gozada, e muito mais por pensar o que iriam pensar de mim os
restantes jornalistas da redacção. Agora, depois de um tempo de análise, percebo que tudo o que
fiz enquanto estagiária do Público serviu para aprender e para abrir os olhos, enquanto futura
profissional e para perceber a engrenagem produtiva dos conteúdos.

Tudo pode ser passível de ser notícia, tendo em conta que lidamos com a realidade. Mas, muito
mais que dar notícias, temos de ser responsáveis na escolha dos assuntos e não informar por
informar. Senti que este artigo da funcionária presa na máquina de passar roupa do Hospital
Lemos foi, mais que um layout para preencher espaço na edição do dia, uma oportunidade que o
meu editor me deu para explorar os factos e praticar a recolha de dados.

O assunto, por azar ou sorte, não se mostrou o mais abonatório para mim, já que vindo do sítio
que veio, deu a entender naquele mural das informações que eu era a estagiária das estórias
engraçadas, denegrindo-me enquanto profissional e descredibilizando-me, interiormente. Este
artigo “deu-me cabo do ego”.

O segundo artigo colocou-me em rota de colisão com a deontologia jornalística e foi um caso
extremamente delicado e que exigiu bastante de mim, como profissional e como ser humano.
Desde o início do meu percurso académico como jornalista e no meio envolvente a toda esta
prática, nunca descuidei da responsabilidade de que lidamos com outras pessoas, e mais que
meros receptores, estes receptores são cidadãos. Ora, por muito mais que eu saiba aplicar as
teorias (do jornalismo) e as dite numa espécie de “ponta da língua”, não conseguirei atingir o
objectivo de bem informar se não souber lidar com o meu receptor e ter sensibilidade para ver
onde ficam os limites da exploração noticiosa.

Página 32
O artigo que servirá de análise neste ponto da prática como jornalista versus a deontologia da
profissão tratou-se de um caso de infanticídio, com contornos macabros e que tive de tratar
jornalísticamente para uma das edições do Público.

Por via da ronda, recebi por parte da GNR do Porto a informação que uma mulher tida sido detida
e identificada como alegada autora do crime de infanticídio, na freguesia de Arcozelos, Vila
Verde. Depois de ficar aterrorizada com tamanho crime, discerni que esta era uma matéria
importante para ser tratada e informei o meu editor do sucedido. Foi logo unânime que teria de
recolher todas as informações sobre o crime e que teria de descobrir detalhes, motivos, modus
operandi, constituir a estória e ter elementos que me distinguissem dos outros demais jornais
diários que, de certeza, iriam agarrar o assunto.

Seguiu-se a habitual maratona para obter detalhes de todos os passos até à identificação e
detenção da autora do crime, bem como de luta contra o tempo, já que só se soube desta
ocorrência ao início da tarde e, até as 21h no máximo, os artigos de Local/Porto teriam de estar
paginados e inseridos no layout, para não atrasar a edição no seu global.

Para além de sofrermos a pressão do deadline e do fecho de edição, temos sempre de contar com
as negas de informação por parte das entidades envolvidas nos casos, bem como pelo facto de,
pelas 18h, as relações públicas das diversas instituições de segurança nacional ficarem
indisponíveis.

Neste caso em concreto, a luta contra o tempo agudizou-se pelo facto de o caso carecer de
detalhes que fugissem aos simples dados fornecidos pelas autoridades. De imediato contactei os
Bombeiros Voluntários de Vila Verde e as autoridades locais, para perceber como foi conhecido
o caso e os procedimentos que envolveram a recolha do corpo e a detenção da alegada autora do
infanticídio.

Num dos post’s do ‘Parem as Máquinas’ analisei todos os procedimentos que levei a cabo para
redigir este artigo:

“A partir das 14h, a minha tarde sofreu uma reviravolta:

- A GNR do Porto dá-me a indicação de que uma mulher tinha sido detida e confessado o crime;

- A partir daí seguem-se os contactos com as forças policiais locais e Bombeiros Voluntários de
Vila Verde;

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- Começo a cruzar os dados obtidos pelas fontes oficiais com os dados vindos do comunicado da
PJ e da Lusa;

- Aos poucos começo a ter detalhes do que aconteceu: o meu editor chama-me à atenção de
pormenores importantes para distinguir uma boa história de um simples artigo “seco” de agência;

- Consigo o contacto de um habitante daquela zona, que me conta pormenores da mulher detida e
me dá o ambiente vivido na freguesia, após a descoberta do crime;

- Volto a confirmar dados com os Bombeiros Voluntários de VV e com a GNR de Braga, numa
tentativa de estabelecer confiadamente uma cronologia de todo o caso;

- Após a recolha de todos os dados possíveis e imagináveis desta situação, começo a redigir o
artigo;

- Pelas 19h comunico de novo com a PJ do Porto, para saber da medida de coação aplicada. A
informação é me dado e assim concluo o artigo em questão.

Dito assim até parece que foi fácil todo este trabalho. Mas confesso que foi mais uma prova de
fogo, colocada subtilmente pelo meu editor. Ao longo da tarde, ele foi despertando em mim
pequenas dicas, pequenas formas de actuar que me poderiam ajudar a resolver o caso.
Subtilmente foi-me instruindo num caminho que me afastava da “pescadinha de rabo na boca”
que é o mundo dos comunicados de imprensa e das ditas fontes oficiais. Foi-me dizendo que
deveria descobrir algo perto do local da ocorrência, tentar descobrir dados através de uma rádio
local, café da zona, coisas que estivessem no local.

Por sorte ou não, descobri na internet o endereço telefónico de um café pertinho da ocorrência e,
numa facilidade, tive acesso à explicação de dados sobre a mulher detida e do ambiente que se
vive na freguesia. Foi uma lufada de ar fresco este contacto, que agradou ao meu editor, já que
segui o que ele me tinha indicado.

Senti que dei um pequeno passo a caminho da melhor prática jornalística e na relação que devo
ter com as fontes. Percebi um pouco como se faz este “jogo de cintura” entre nós, colectores de
informação, e as fontes, sempre tão disponíveis mas que nos manobram e reduzem campos de
visão.

Página 34
Que o dia que passou me sirva de lição e não me saia da memória, para ver se aprendo mesmo
alguma coisa, nestes dias em que me enriqueço com a experiência de trabalhos com profissionais
de referência”.

Publicado no ‘Contar uma estória’, Parem as Máquinas, 27/02/2009

Este caso foi sem dúvida uma prova de fogo, pelo tema em si, mas também pelo facto de me
instruir e mostrar que caminhos devo fazer para obter a informação. Foi uma batalha difícil a que
travei com o meu editor, sedento de detalhes e de confirmações, e entre as fontes, sempre mais
disponíveis para emitir dados do que para nos debitarem os detalhes tão preciosos na redacção
jornalística.

No ‘Parem as Máquinas’ referi uma coisa que me acompanhou até agora e que serve para todos
os trabalhos do futuro: “ o dia de ontem foi cansativo, trabalhoso mas fortificador. Percebi que
esta vida de jornalista é dura, mas compensatória no momento em que nos dizem que fizemos um
bom trabalho e que valeu o esforço feito durante toda a tarde”

Os dois casos marcaram-me de forma negativa e positiva, numa espécie de equilíbrio para esta
análise. No entanto percebo que foram experiências muito ricas, pois tanto um como outro
trabalho auxiliaram-me na percepção de como trabalhar a informação e explanar as metodologias
de recolha desses mesmos elementos.

O off the record

Sobre o off the record analisei em concreto três situações passadas na minha rotina diária de
casos do dia. Mais uma vez, em conversa com a fonte da Polícia Judiciária, percebi que a prática
jornalística percorre meandros muitas das vezes longe do nosso alcance e controlo. O off the
record aperta-nos a área de actuação e sufoca, por vezes a ânsia de ir mais além da investigação
banal e difusão dos conteúdos ditos institucionais.

Mais uma vez e para não incorrer em imprecisões, coloco como parte deste relatar sobre o
estágio, um post do Parem as Máquinas:

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“Durante este já mês e meio de estágio no Jornal Público, ainda não me tinha deparado com a
famosa questão do off the record, um quase “bicho papão” da prática jornalística. Apelido tal
coisa como papão, não tão especificamente na prática dos profissionais em si, mas na perspectiva
da jovem estudante que sou e mais ainda inexperiente como jornalista.

O off the record é daquelas coisas que me deixa impotente. É ter a informação de que
necessitamos e ao mesmo tempo estarmos impossibilitados de a utilizar livremente, sem estar
preocupado em usar aquela afirmação ou expressão, recolhidas nas conversas aceites pelas nossas
fontes. Ora bem, no trabalho que desenvolvi durante a tarde de ontem, deparei-me com
informações que não me foram passíveis de publicar e que, talvez por isso, não chegaram a ser
notícia. Não quer dizer que tenha sido o motivo maior para que isso não passasse para o layout,
mas de qualquer forma com o desenrolar da tarde noticiosa outras coisas foram tomando
relevância.

Neste tempo que estou a passar na redacção vou-me apercebendo como funciona a máquina
jornalística. Na redacção o que parece óbvio passa a ser a dúvida curiosa do jornalista. O que para
mim parece ser de caras, afinal não passa de pormenores irrisórios de uma inexperiência que se
nota a milhas. A um mês e pouco de sair daqui, sinto já que me moldei um pouco mais às lides de
confirmar, justificar e escrever ao jeito noticioso. Por acaso já tive histórias engraçadas
relacionadas com confirmações ou mesmo últimas horas de “bradar aos céus”. E que tal contar
um pouco disso? Aqui vai então uma pequena série de situações que me deram e dão vontade de
rir:

- Pior que não quererem dar uma informação ao jornal é pensarem que os jornalistas são burros!
Comigo aconteceu a situação de, ao telefone com uma instituição importante de segurança, me
negarem a passar ao superior hierárquico pelo simples facto de ele dizer que não estava. Sim,
disseram-me que o superior não se encontrava disponível para entrar em linha, quando do outro
lado ouvi claramente a negação do querer falar comigo e pedirem para dizer que não estava.
Fiquei tão absurdamente parva que nem reagi. Simplesmente acatei a ordem e liguei minutos
depois como se nada fosse;

- Mais que para o meu bem como jornalista e para salvaguardar o meu trabalho como mediadora
entre o que acontece e os leitores, todas as questões que coloco aquando das rondas de
confirmação e cruzamento de dados são sem dúvida alguma pertinentes e curiosas. O que me tem
acontecido regularmente é certas fontes institucionais não perceberem o porquê de tanta questão e

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de tanta confirmação de dados sobre dados. Ontem dei por mim a explicar os critérios noticiosos
e a hierarquização dos acontecimentos segundo o público-alvo e a relevância dos temas para o
público que lê o jornal diariamente;

- A mais espantosa e aterradora experiência, durante este estágio, prendeu-se com uma chamada
telefónica que tinha como objectivo denunciar uma situação de agressão e abuso de poder por
parte de uma força policial. Como não sabia como fazer neste tipo de caso, recolhi as
informações necessárias e apresentei a situação aos meus editores. No fim veio a confirmar-se ser
um caso de agressão mas que fora provocado por uma conduta menos própria. A denúncia acabou
por não ser noticiada por reportar também a um insólito não tão insólito quanto isso. Se a conduta
do Público fosse populista e sedenta de histórias fatalistas, acho que podia dizer que tinha um
grande scoop ou cacha - palavra que representa na gíria jornalística o mesmo que uma novidade,
algo inesperado”.

Publicado no “Off the record”, no Parem as Máquinas a 24/03/2009

No terreno ser jornalista é mais complicado

Outro dos pontos de análise deste meu estágio curricular no jornal Público prende-se com a
prática no exterior do nosso trabalho como historiadores do instante. A recolha de informação
tem, ao longo dos tempos, mudado de fisionomia, e o que antigamente – nos primórdios do
jornalismo – era um farejar ao ar livre e no terreno, apresenta-se nos dias que correm como uma
prática fechada em quatro paredes, onde o computador é única janela que nos permite ver o que
se passa lá fora.

Durante os três meses saí para a rua, fiz trabalho de campo, mas estive muito mais tempo na
secretária e ao telefone. Das vezes que saí, senti dificuldades como quem vislumbra pela primeira
vez o raiar do sol e descobre a imensidão de probabilidades de termos uma própria estória e
trabalha-la jornalísticamente. Em campo, senti as negas do barrar a informação, o medo de falhar
nos objectivos pedidos pelo editor, o inconveniente de abordar as pessoas e a agradável surpresa
de se admirarem por ser já uma estagiária, estreante nas andanças de conferências e da
responsabilidade de albergar um estágio no Público.

Página 37
Mais uma vez recorro ao blogue ‘Parem as Máquinas’ para abordar um tópico deste relatório. Foi
nesse intuito que ele foi criado e, sem perder a génese da sua origem é com prazer que relembro
as peripécias das saídas fora da redacção. O episódio que se segue conta um serviço um pouco
atribulado que, mais uma vez, proporcionou-me uma aprendizagem satisfatória e necessária.

“Artigos à parte, o dia de hoje foi bastante agitado, pelo simples facto que saí da redacção e estive
a trabalhar no terreno da ocorrência.

Na ronda das 15h surgiu a informação de que um trabalhador tinha caído de um andaime e estava
a ser socorrido pelos bombeiros. Vi naquela chamada o meu scoop do dia, e nesse instante senti
que podia ter um artigo em grande. Corri a avisar o meu editor, a contar o sucedido e, num lapso,
estava a caminho do local, juntamente com a minha colega fotojornalista Ana Coelho.

Chegadas ao estaleiro da obra, deparamo-nos com a ambulância a socorrer o homem acidentado.


Inquiri os presentes, tentei saber pormenores mas, num ar estranho e rancoroso, foi-me barrado
qualquer detalhe que esclarecesse a queda. Não consegui sacar nada do responsável pela obra
nem dos demais presentes. Mesmo a PSP, que estava no local a tratar da ocorrência, não me deu
qualquer informação, remetendo-me para o comando geral e para as burocracias hierárquicas que
esse tipo de situações me leva a ter que enfrentar.

Para ajudar mais ainda à “festa” foi-nos negado o acesso a tirar fotos, e mesmo exigido que
apagássemos as fotos que tínhamos tirado no local, pelo facto de ser uma obra privada e os
responsáveis não autorizarem a captação de imagens. Houve ali uma tensão entre mim e os
responsáveis pela construção. Senti na pele a negação da minha prática jornalística. E a frustração
de ficar impotente a uma informação que vale tanto como as palavras que escrevo.

Já na redacção, expliquei o que aconteceu no estaleiro ao editor e comecei a escrever o artigo. Ao


mesmo tempo fui tentando “sacar” as informações que a PSP não me tinha disponibilizado no
local, recolher os dados dos bombeiros e saber se do Hospital de Santo António também me
diziam alguma coisa. Foram três horas angustiantes, de confirmações atrás de confirmações, de
cruzamento de dados e de esperas intermináveis ao telefone, sob aquelas músicas irritantes.
Chegada às 20h00 apresentei o artigo ao editor, corrigimo-lo e dei por terminada a minha semana
de estágio. Isto porque amanhã rumo a Coimbra tratar de uns exames pendentes. Volto à redacção
na terça-feira que vem”.

Publicado no “No terreno ser jornalista é mais complicado”, Parem as Máquinas, 10/02/2009

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Neste exemplo, senti na pele a negação da minha prática como jornalista. Ao barrarem-me
informações sobre o acidente na obra do Sea Life, junto ao Castelo do Queijo, na Foz do Douro,
questionei até que ponto os nossos deveres e direitos como jornalistas são colocados em causa
diariamente.

Segundo o Estatuto do Jornalista, documento que salvaguarda os direitos dos profissionais da


informação e regula a sua actuação na sociedade, naquele momento foi-me negado um direito
primordial que é o do acesso a locais públicos para a realização do meu trabalho. No artigo 9º do
Estatuto do Jornalista, alínea 1) e 2) está bem claro que: “os jornalistas têm o direito de acesso a
locais abertos ao público desde que para fins de cobertura informativa” e que “o disposto no
número anterior é extensivo aos locais que, embora não acessíveis ao público, sejam abertos à
generalidade da comunicação social”.

Nesta situação, por ser uma obra de âmbito privado foi-nos pedido (a mim e à colega
fotojornalista que me acompanhou) que não fotografássemos o local nem oportunasse-mos as
pessoas presentes, pelo simples facto de que se tratar de um acidente sem gravidade. Logo, a meu
ver, esse não é motivo para que me barrassem a informação.

Como jornalista, o meu dever é reportar a realidade dos factos e tentar ao máximo ser coerente
com as minhas balizas deontológicas. Em causa estava uma matéria noticiosa vinda de um alerta
da ronda, no instante em que saíram, do seu quartel, os Sapadores do Porto. Por acaso o local do
acidente é pertíssimo das instalações do Público, na Foz. Logo foi maior o espanto que causei
quando cheguei ao local, pela rapidez como a informação se espalhou.

Fui das primeiras repórteres a chegar ao local, mas nada me valeu. O barrar da informação pelo
delegado da obra, bem como da engenheira da construtora, foi um golpe forte na prática
estagiária do meu jornalismo no terreno. A pouca experiência e estofo para situações de pressão
entranhou-se em mim naquele momento. O nervoso miudinho apoderou-se de mim aquando da
pressão em querer saber o estado de saúde do operário e como se tinha dado o acidente. Pior me
senti quando, numa espécie atitude repressora, um dos elementos dirigentes da obra nos
proibiram a captação de imagens, impossibilitando assim ainda mais a nossa recolha de dados no
local.

Tanto eu como a minha colega fotojornalista tentamos revogar o nosso direito de estar no local e
as nossas intenções em tomar nota daquela matéria noticiosa. Mas sem complacência alguma, foi-

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nos pedidos que apagássemos todas as fotos tiradas no local, sob a medida de que nos
encontrávamos numa obra privada. Impotentes, lá cedemos à chantagem e regressamos à
redacção com uma nega para contar e uma série de pormenores para ver explicados.

No local, a própria Polícia de Segurança Pública recusou-se a dar detalhes sobre a ocorrência.
Limitei-me a fazer o meu jogo de “curiosa - chata”, inquirir vizinhos e os demais trabalhadores e
insistir com um agente da autoridade que, entre sorrisos me esboçou um “tem de ligar para o
comando que lá dar-lhe-hão mais pormenores”.

Já na redacção, o editor percebeu o que se tinha passado no local, mas insistiu em que apurasse os
elementos chave do acidente. Coloquei mais uma vez em prática a minha rede de contactos e as
confirmações com os agentes da autoridade e o Hospital para o qual o operário fora levado.

Ao final do dia, o que apurei deu azo a uma pequena chamada de página, vulgo topo, a dar conta
do acidente.

Ilustração 1 - "Um ferido ligeiro em acidente de trabalho no Sea Life"

Os medos e as angústias de não correspondermos ao que nos é pedido para x artigo ou para y
trabalho jornalístico são influenciados pelo nosso próprio desempenho nessas tarefas. Nas
variadas vezes que saí da redacção para fazer a cobertura de eventos ou ocorrências de última
hora, senti o mesmo “friozinho na barriga” que senti quando entrei no primeiro dia como
estagiária no Público, ou mesmo quando soube da notícia deste meu estágio curricular. Nessas
duas vezes, apoderou-se de mim o medo de não vir a corresponder às exigências e, acima de tudo,
incorrer em erros ou falhas. Sobre isso mesmo coloco em análise uma situação que condicionou
uma parte do meu estágio, bem como a minha auto-estima como estagiária da redacção do
Público, no Porto.

Uma das razões de alguma controvérsia durante esta minha última parte do meu percurso
académico prendeu-se pelo facto de ter criado assim do nada o blogue ‘Parem as Máquinas’. Para
muitos não passou de uma ideia estapafúrdia, ou mesmo narcisista. Para outros foi um aposta

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ganha e um bom veículo de informação e conhecimento da prática inicial de jovens jornalistas
como eu. Na minha opinião, foi um “rebento” bem-criado, que deu muitas alegrias, abriu
caminhos e angustiou-me em alguns momentos pela responsabilidade que carregou.

Num dos meus trabalhos como estagiária, coloquei em causa a veracidade do serviço e até
mesmo a organização interna da agenda, que coordena os trabalhos apontados pelos editores e os
jornalistas disponíveis no dia. A situação em si não foi nada de especial, mas foi o necessário
para receber por parte do subdirector uma chamada de atenção.

O serviço estava marcado para o fim da manhã no Mercado do Bom Sucesso, na Boavista.
Cometi um pequeno erro ao sair da redacção sem confirmar com o editor disponível qual o
ângulo do artigo. Mas, como à hora que saí nenhum estava presente, decidi sair para o serviço,
com a ideia de que chegando ao local me aperceberia do pretendido. É de acrescentar que a nota
da agenda explicava que no local iria estar presente a Comissão de Trabalhadores da Câmara
Municipal do Porto, para fazer a denúncia dos vários incumprimentos acerca dos requisitos de
limpeza e higiene. Só por esta definição depreendi que estaria perante uma apresentação à
imprensa e, logo, seria mais um serviço de recolha de motivos.

No Parem as Máquinas escrevi assim:

“Chegadas as 13h, comecei a duvidar do serviço. No local, nada se passava de estranho ou que
fugisse à rotina do Mercado do Bom Sucesso. No interior, as bancas das verduras eram ajeitadas,
eram repostas as frutas e o peixe era amanhado.

A Ana ia dando conta da sua arte, tirando fotos aquele ambiente, ao colorido em questão. Antes
de iniciarmos o serviço contactei os meus editores para tentar descortinar o que se passava na
realidade; por incrível que pareça ninguém me soube explicar o que era a suposta visita da
comissão de trabalhadores da câmara, numa reivindicação sobre condições de trabalho. Por
incrível que pareça, eu e a Ana ficamos um pouco à nora com a situação, e entrei um pouco em
pânico.

O pânico que senti foi por ter sido “eleita” para um serviço e não estar a conseguir fazer algo de
jeito. O que seria de mim, como estagiária se tivesse que fazer um dado tratamento noticioso e
me falhasse o momento? Acho que se tal me sucedesse, desistia por completo de jornalismo.
Bem, mas não aconteceu, seguiu-se situação um pouco pior: na realidade, a indicação que
tivemos por parte da agenda era algo que hipoteticamente não existiu. Digo hipoteticamente,

Página 41
porque de algum lado o meu editor deve ter tirado a informação e visto que era possível de
noticiar.

Seguindo a indicação de um responsável do Mercado do Bom Sucesso, rumamos até outro local,
ao posto de higiene e limpeza da câmara do Porto, ali naquela zona. Chegadas ao sítio, comecei
por procurar um responsável e explicar a indicação que nos tinha surgido. Novamente, por
incrível que pareça, ninguém sabia do que estava a falar e até ficaram surpreendidos. Mas que
raio se estava a passar ali? Senti-me uma idiota chapada ao perguntar pela possível reivindicação
e eles (os trabalhadores em causa) não saberem de nada.

Concluindo, este serviço foi algo fantasma, algo que alguém aparentemente viabilizou mas que
não aconteceu. Nada se reivindicou, nada fugiu ao panorama normal da rotina da cidade. E, tanto
eu como a Ana, não levamos a mal a situação, visto que saímos da redacção e fomos passear até à
Boavista. Fugindo agora de brincadeiras, gostava que tivesse sido diferente. Gostava que tivesse
acontecido algo na verdade, o que me dava a oportunidade para escrever para o jornal.

Foi uma troca estranha. Possível erro de agenda. Ou outra coisa qualquer. Só tive pena de perder
esta oportunidade de escrever na página do dia. Não estando com os casos do dia, são serviços
assim que me permitem ter uma liberdade de escrita e “apalpar” na melhor das formas o ser
jornalista, sair para o terreno e contactar com o ambiente informativo.

Fico à espera de mais oportunidades. Pode ser que amanhã apareça mais algum serviço, com mais
pés e cabeça, e não desmembrado como este “fantasma reivindicativo”.

Publicado no “O dia das trocas e baldrocas”, Parem as Máquinas 03/03/2009

Todo este aparato foi estranho, refiro-o mais uma vez. Mas questiono: a agenda de um órgão de
comunicação social também tem enganos? O que terá acontecido realmente para que este serviço
não surtisse efeito e aparentemente tenha sido fantasma? Em resposta a estas mesmas questões
que coloquei mais tarde ao meu editor, foi-me referido que fora uma indicação de uma fonte, logo
a credibilidade foi dada. O editor também ficou sem perceber a situação e arrumou-se o assunto.

O pior foi mais tarde, quando no dia seguinte o subdirector do Público da redacção norte me
chamou ao gabinete e começou de mansinho a dizer de sua justiça. Por ele não existiu mal algum
em criar o blogue e em querer passar para o lado de fora as aventuras e desventuras de uma

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estagiária. O que o levou a ter uma conversa comigo foi o facto de, em alguns posts falar
demasiadamente da mecânica de trabalho do jornal, das coisas passadas no seu interior e
questionar alguns procedimentos como o caso do erro da agenda. Confesso que já notava e me
tinham feito notar que andava a “esticar-me” um pouco nas descrições. Mas receber uma
chamada de atenção por parte de um órgão directivo abalou-me um pouco a moral.

Não levei a mal, mas penso que foi a partir deste momento que percebi que afinal estava mesmo a
passar uma imagem para o lado de fora da minha visão de blogger. Fora das paredes do Parem as
Máquinas estava a ser descortinada uma forma de trabalhar que não era desejada fazer-se saber.
Acarretei a responsabilidade do que fizera, e comecei a ter mais cuidado com o escrevia.

Depois dessa semana comecei a ser mais analítica. Ponderei tudo o que tinha feito até ai e
continuei com as rondas. Por mais estranho que pareça, a ordem natural de cada estagiária ficar
com uma ronda por semana começou a não fazer efeito. Sem perceber comecei a ficar com as
rondas semanas sucessivas, sem perceber o porquê. Passei a ficar na redacção todos os dias, a
confirmar dados e a receber comunicados de imprensa. Não reclamei, já que enquanto estagiária,
ainda tinha o medo de confrontar os editores. E depois da chamada de atenção por causa do
blogue, comecei a acanhar-me e a deixar morrer um pouco a vivacidade jornalística característica
das primeiras semanas.

Saber dar a informação certa

O farejar tipicamente jornalístico não se adquire de um momento para o outro. Requer alguma
prática e alguma astúcia. Boas estórias poderão ser aquelas que envolvem algo já conhecido mas
que abordadas de outra maneira se tornam novas, no que diz respeito ao acto de dar algo novo a
conhecer, a informar.

Também foi minha experiência durante o estágio curricular no Público o sabor amargo da
frustração, tanto por não corresponder às expectativas de arranjar boas estórias para investigação,
bem como não corresponder às expectativas de algumas fontes. Não quero com isto dizer que
tenha estabelecido uma relação de “toma-lá, dá-cá” com algumas delas, mas quando nos é
fornecida uma informação em primeiríssima mão, o desejo é de ser dos primeiros a avançá-la e
fazer ver à fonte o seu valor como tal.

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As abordagens, os ângulos e as tomadas de decisão passam sempre pelos editores e, muitas das
vezes, o que pensamos ser um bom assunto, cai por terra e volta à fase inicial. Num caso
específico, senti que me recolhi demasiado na opinião de um dos editores e deixei de lado um
assunto que poderia ter sido abordado na edição.

Sobre este tópico relembro um caso contado no ‘Parem as Máquinas’:

“Saber gerir os dados que nos dão pode fazer toda a diferença. Hoje senti que deixei passar ao
lado uma oportunidade de trabalho jornalístico, pelo facto de errar ainda como profissional.
Agarro-me ao estatuto de estagiária, mas isso poderá ser desculpa para deixar frustrada a minha
fonte?

No outro dia um amigo meu aqui do Porto deu-me a dica de um projecto de âmbito académico
que ele e uns colegas elaboraram. A mim pareceu-me algo interessante já que partia de uma
campanha institucional de consciencialização da prática de bullying nas escolas. Apressei-me
assim que soube mais detalhadamente o teor do trabalho e apresentei o que tinha a um dos meus
editores. Ao início foi-me dada luz verde para pesquisar e ver o que o tema podia dar. Avancei,
contactei de novo esse meu amigo e os colegas de grupo e acompanhei-os alguns dias na
divulgação da dita campanha. Ao findar a semana apercebo-me que afinal o suposto tema que até
dava para algo deixa de ter interesse ao editor a quem ia apresentando detalhes. Acabou por não
achar evidente qualquer tratamento jornalístico publicável. Era algo background do tema
bullying. E nesse background deixei então a proposta feita directamente dessa minha fonte.

Na edição de hoje do Público reparo que a entrada para a editoria de Nacional não é nada mais do
que sobre bullying e sobre um documentário sobre bullying. Percebi que poderia ter sido eu a
abordar o tema daquela maneira, já que duas semanas atrás estive a tratar o mesmo assunto com
estudantes que fizeram algo semelhante. Se tivesse abordado a perspectiva de analisar os dados
avançados pelas estatísticas, se tivesse proposto relacionar os casos com o que acontece
verdadeiramente nas escolas, se calhar a oportunidade que a minha fonte me deu tinha dado em
algo mais que o sentimento de frustração.

Sei que poderia ter utilizado a informação do meu amigo de outra maneira. Mas aninhei-me na
resposta do editor que me disse que para a editoria não era nada passível de se abordar. Não o
culpo. Nem por sombras. O que acontece é que pensei fechado. Não explorei o devido assunto e
morri na praia. Agora a minha fonte colapsou, não entende porque este artigo saiu e o da proposta
que me fez não. Repito aqui: eu é que não soube dar melhor caminho à informação que me

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deram. Errei, neste meu estatuto aninhado de estagiária que ainda não vê o que está à volta. Não
me apercebi que existia mais do que o óbvio de relatar a campanha organizada no âmbito
académico. Ardi na oportunidade der ter desenvolvido o tema.

O artigo de hoje está elucidativo da realidade. Foram realmente aquelas conclusões que tirei do
que acompanhei da campanha do meu amigo e dos colegas”.

Publicado no “Saber dar a informação certa”, Parem as Máquinas, 30/03/2009

Neste caso em concreto o meu erro centrou-se no olhar estagnado que tive perante a informação
dada pela minha fonte. Com ela poderia ter aprofundado o assunto e sair do redundante
informativo que era dar a conhecer a campanha.

Faltou-me visão de campo e de profundidade, factores imprescindíveis para as reportagens


jornalísticas. Com um pouco mais de investigação e junção de outros elementos mais factuais,
tinha conseguido certamente levar o meu tema por diante. Mas assim não aconteceu e aprendi
mais um detalhe importante para a prática como jornalista.

Mozart no P2

Passando mais tempo na redacção, comecei a sentir a necessidade de fugir às rondas diárias e a
pensar em alternativas viáveis para escrever sobre outras coisas. O conselho do primeiro dia,
dado pelo subdirector Amílcar Correia, não me saía da cabeça. E a necessidade de encontrar
temas para aprofundar e fazer reportagem teimavam em não aparecer.

Por parte da editoria de cultura surgiu um desafio que se apresentou bastante agradável e que deu
um pouco de colorido ao meu estágio. Para fugir ao cinzento dos casos de polícia ou como
complemento às rotineiras chamadas para a polícia ou bombeiros, foi-me dada a tarefa de
escrever sobre peças de teatro ou exposições. Por seis vezes tive o prazer de dar largas a
imaginação e, a partir dos dados fornecidos pelos comunicados de imprensa ou mesmo em
contacto com as agências divulgadoras dos eventos, elaborei simples caixas de 1000 caracteres
que davam conta do teor do espectáculo musical, teatral ou visual, na cidade do Porto ou
arredores.

Foram pequenos desafios que iam dando que fazer, de forma a vencer a inércia que por vezes se
apoderou de mim. Foram seis artigos diferentes, que exigiram uma escrita criativa mas que não
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fugisse aos parâmetros primordiais do jornalismo: informar claramente o receptor. No ‘Parem as
Máquinas’ escrevi: “A pedido do editor da secção de cultura, escrevi uma espécie de
apresentação de uma peça de teatro a estrear por estes dias em Matosinhos. A partir de umas
notas de imprensa e de uma breve pesquisa na Internet, redigi com agrado os mil caracteres de
pura liberdade criativa. Este exercício permite que possamos opinar sobre a peça, desmontá-la
para além do comunicado e dar asas à imaginação. Ajudar o leitor a conhecer mais por dentro a
peça e a decidir se valerá a pena ou não ganhar a experiência de encarnar as personagens e
depreender a mensagem criada em palco”.

Transcrevo o artigo em questão, para uma melhor compreensão de toda a prática dos artigos
feitos para o P2.

Janis e a Tartaruga
Os dias de hoje podiam bem ser a América da década de sessenta. A rebeldia, na busca de uma
sociedade melhor e de uma existência mais verdadeira, continua a ser o sonho de muitos. O
desejo de mudança, encarnada por uma única personagem em palco, pretende agitar consciências
em Janis e a Tartaruga. A peça, uma produção conjunta da Câmara Municipal de Matosinhos e do
Cine Teatro Constantino Nery, não pretende ser uma biografia chapada da mítica Janis Joplin, a
cantora hippie e reflexo dos desejos colectivos dos anos sessenta. O monólogo da personagem
agarra os desejos que também são os de agora, e corporiza os caminhos de uma juventude sedenta
de mudança, liberdade e abertura. De hoje até 29 de Março, Filomena Cautela apresenta-se como
Janis, uma jovem à boleia do “sim e do não” do que dever ser a vida humana. Nesta ficção, que
podia bem ser a realidade, uma rapariga fala para si, devaneia sobre tudo e acompanha os desejos
de cada um de nós. Janis a Tartaruga tem textos de Pedro Pinto e Filipe Pinto, música de Carlos
Tê e encenação e figurinos de Luísa Pinto. Sessões às 21h30, de quarta a sábado, e às 16h, aos
domingos. Bilhetes a cinco euros.

Publicado “O voltar ao normal dia de trabalho, Parem as Máquinas, 11/03/2009

Seguiram-se outros artigos, ligados ao teatro e à música, em espaços tão diferentes como a Casa
da Música ou o Teatro Carlos Alberto (TeCa). (Ver anexos)

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Na Fugas, o carro de…

Para além de escrever artigos para a editoria de Cultura, auxiliei a editoria da Revista Fugas com
quatro artigos para a rubrica “o carro de”. Esta rubrica do suplemento de fim-de-semana
caracteriza-se pela descoberta do carro de uma personalidade famosa, de carácter público da
nossa sociedade. Aborda questões como o carro utilizado, o porquê desse carro e marca, possíveis
estórias passadas com o veículo, questões de comodidade, gostos pessoais, viagens,
recordações… um sem fim de aspectos que ajudem a descrever o gosto por determinado carro.

Muitas das vezes, enquanto estagiária do Público, ouvi dizer por parte de um colega jornalista da
“casa” que escrever para a Fugas era uma boa maneira de ir praticando e, dessa forma, aliviar os
jornalistas do suplemento de artigos de carácter mais simples e que não necessitavam de tanto
trabalho. Por trabalho entenda-se contactar as fontes e elaborar artigos de cerca de 1000
caracteres a contar os gostos automobilísticos de personalidades ditas conhecidas dos diversos
quadrantes da sociedade portuguesa.

Numa dessas intervenções feitas pelo jornalista da redacção, decidi colocar em acção alguns dos
meus contactos e descobrir personalidades famosas que ainda não tivessem sido entrevistadas
para a rubrica “o carro de”. Aproveitando um contacto adquirido em trabalhos anteriores no
jornal universitário de Coimbra, aplicando a minha rede de contactos como jornalista e
pesquisando na base das redes sociais portuguesas consegui aceder a personalidades conhecidas
como a jornalista Fernanda Freitas, o apresentador de televisão Manuel Luís Goucha, o humorista
Eduardo Madeira e a actriz Andreia Dinis.

Foram estas quatro personalidades que entrevistei para a rubrica “o carro de”. Durante quatro
edições da Fugas vi parte do meu trabalho como jornalista ser publicado e, como se pressupõe,
coloquei em prática o esquema de abordar as fontes, conversar com elas e redigir o artigo no
ângulo pretendido. Reforço a ideia de que a primeira abordagem foi feita através de email
(adquirido através das redes sociais e de contactos pessoais) e posteriormente as conversas tidas
via telefone. Foi bastante agradável conversar com as quatro personalidades já que se revelaram
acessíveis ao tema e contaram imensas estórias engraçadas sobre o seu carro do dia-a-dia. A
juntar a isso foi mais uma pequena tarefa que me ocupou os dias passados na redacção.

No ‘Parem as Máquinas’ escrevi:

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“Hoje na edição da revista Fugas, suplemento do Público que sai ao Sábado, tive a minha
pequena participação como jornalista.

Para a rubrica “O carro de”, tive o prazer de entrevistar Manuel Luís Goucha, animador das
manhãs da TVI. Foi uma entrevista engraçada de se fazer, onde o ‘entertainer’ português mostrou
que, no que diz respeito a carros, é bastante desprendido. Conta que não tem carta de condução e
o que lhe vale no seu dia-a-dia é o motorista, um amigo já considerado. Para saberem mais basta
ler o artigo.

O carro de Manuel Luís Goucha

Mercedes E Station

Abençoado seja o motorista

“Não tenho carta de condução. Tentei tirá-la, quando ainda estava no Porto, a fazer o Praça da
Alegria. As aulas viraram um autêntico pagode, comigo a não mostrar interesse algum em
decorar o código e, claro, chumbei no exame”. É desta maneira descontraída que Manuel Luís
Goucha descreve a sua tentativa para obter a licença de condução, quando questionado sobre a
sua relação com carros.

O animador das manhãs da TVI não se esforçou muito para passar no exame sobre sinais e regras
de trânsito e até exibia o seu desinteresse pelo tema. “Fazia gala em mostrar que não estava nada
interessado no código, por isso as minhas respostas eram quase sempre ao lado.” Passados 16
anos e tendo rumando a Lisboa, o apresentador desloca-se diariamente numa carrinha Mercedes
classe E.

Contando desde essa altura com um motorista particular, Manuel Luís Goucha justifica: “Sinto-
me bem melhor em ser conduzido, sem stresses e não tenho o problema de perder tempo à
procura de um lugar para estacionar o veículo. Tenho o motorista para o fazer por mim.
Abençoado seja!”

Num dia-a-dia com várias deslocações, aproveita cada minuto para produzir, “nem que seja
mentalmente”. “Como sou conduzido, o tempo de viagem entre os locais é precioso para
trabalhar. Aprecio a pontualidade, pelo que chego sempre, mas sempre, a horas aos meus
compromissos”, acrescenta.

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Deixando de lado marcas relevantes de automóveis, ou mesmo histórias mais caricatas, o
apresentador acentua somente duas características essenciais para que um carro o cative: o espaço
e a comodidade, para além dos dispositivos tecnológicos que se vão tornando mais ou menos
comuns hoje em dia. “Considero imprescindíveis num automóvel o ar condicionado, o GPS, o
leitor de CD, o telefone e uma boa suspensão.” Em tom de brincadeira, entre a explicação do
porquê de não tirar a carta e das suas deslocações diárias, acaba por confessar que “quase de
certeza, seria um mau condutor”. “Acabei por chumbar no exame de código. E eu ralado!”,
conclui, sem problemas, o animador das manhãs televisivas. Vanessa Quitério”

Publicado no “ Na Fugas… o carro de Manuel Luís Goucha”, Parem as Máquinas, 21/03/2009

publico.pt – última hora

Pontualmente surgiram oportunidades para escrever para o online do Público e colocar em prática
os conhecimentos recolhidos ao longo da formação académica e mais vincadamente no jornal
universitário de Coimbra A Cabra. No último semestre passado em Coimbra ocupei o cargo de
editora online do portal do jornal universitário e orientei as noites de cobertura da Queima das
Fitas 2008. Por isso levava já um gosto especial pela escrita online, bem como um apelativo
maior ao imediato da informação e ao modelo impreterível que se apresenta o ciberjornalismo
nos dias que correm. Antes de dar nota daquilo que fiz no publico.pt enquanto estagiária, gostaria
de reflectir sobre o carácter actual da informação e sobre os novos modelos jornalísticos que
emergem com a chamada Web 2.0 e conceito de rede social.

Durante o meu estágio foi notória a divulgação dos conteúdos do blogue Parem as Máquinas
através da rede de microblogging Twitter, bem como no Facebook. A partir destas duas redes
sociais fui dando a conhecer o meu dia-a-dia como estagiária do Público e interagindo com os
meus leitores. Com eles fui trocando pontos de vista, recolhendo feedback sobre o que escrevia e
respondendo a dúvidas a colegas que, como eu, estavam a concretizar um estágio curricular ou já
passado por essa fase. Admito que essa participação e divulgação foi importante para criar ao que
eu neste momento chama de estatuto na internet. Com todo este “aparato social” consegui
construir uma reputação online que me acompanha ainda no meu percurso pós estágio. Muitas
portas foram abertas graças à divulgação via internet e muitos contactos foram instituídos a partir
das partilhas feitas nos comentários via blogue.

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Contudo, não posso deixar de fazer uma análise ao conceito de jornalismo online e
ciberjornalismo ou jornalismo digital. Parecem conceitos idênticos mas detêm actuações um tanto
ou quanto diferentes mas que correspondem a diferentes práticas na internet. Hélder Bastos,
investigador na área do ciberjornalismo defendeu na sua tese de mestrado, apresentada à
Universidade Nova de Lisboa em 1999, a diferenciação destes dois termos.

Por jornalismo online percebe-se “a utilização da rede como instrumento privilegiado de contacto
com as fontes e de pesquisa de conteúdos, onde podemos situar a internet como uma componente
essencial do jornalismo assistido por computador, o qual engloba a pesquisa online”. Já o outro
conceito, o de ciberjornalismo ou jornalismo digital define-se como “produção de textos
jornalísticos na rede e para a rede”, segundo o mesmo autor.

Em Portugal assistimos desde 1995 a um enquadramento dos media nacionais à chamada


presença na internet. Começou com o aparecimento do Diário Digital, Portugal Diário e o
publico.pt e, desde essa altura, muito mudou na maneira de pensar e fazer jornalismo na internet.

Para Bastos (2009) a história do ciberjornalismo em Portugal passa por três fases distintas: a
implementação - compreendida no período de 1995 a 1998, numa fase experimental dominada
pelo “shovelware” onde os meios tradicionais criam os seus sites para neles reproduzirem os
mesmos conteúdos que os do velho modelo; a expansão ou “boom” (1999-2000) onde aparecem
os primeiros jornais generalistas exclusivamente online e, por último, a depressão seguida de
estagnação (2001-2007) que está marcada pelo fim de uma certa ilusão no novo modelo, mas que
se acentua pelo investimento, ainda que tímido, na plataforma online.

Novas sinergias foram criadas e, muito mais que aplicações informáticas adaptáveis aos novos
conteúdos, foi necessário criar novos profissionais para lidar com os novos preceitos jornalísticos.
Apareceram novos conceitos como a hipertextualidade, a interactividade, a multimedialidade, a
instantaneidade, a ubiquidade, a memória e a personalização, entre outros. Muito mais que
transpor para o online os conteúdos dos meios tradicionais, houve a necessidade de produzir
conteúdos específicos e tirar partido das novas ferramentas. Integrar vídeo e som, inserir imagens
e jogar com o hipertexto é, actualmente, um imperativo que já não se questiona mas que ainda
recebe resistência por parte de basicamente todos os medias.

Essa nova narrativa foi fundamentada por Hélder Bastos no seu texto “Ciberjornalismo: dos
primórdios ao impasse”, publicado na revista Comunicação e Sociedade em 2006 (página 103):
“Os primeiros avanços no campo do jornalismo digital, em Portugal, têm sido lentos e
assinalados por uma série de frustrações, algumas delas devido a expectativas utópicas com
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relação à viabilidade de alguns projectos. Contudo, e apesar de alguns obstáculos, novos desafios
são impostos aos jornalistas profissionais. Destes espera-se que sejam capazes de lidar com as
novas ferramentas da Internet e que contem as suas estórias, usando novos recursos, tal como
arranjem uma nova lógica para construírem os seus artigos. Começa a cimentar-se nos
académicos que se debruçam sobre os media a ideia de que a formação de jornalistas
especificamente para a área digital deve seguir regras diferentes, especialmente no que diz
respeito a estórias em hipertexto e competências técnicas. O grande desafio deverá ser a formação
de estudantes que pratiquem esta modalidade de jornalismo, sempre com o necessário equilíbrio
entre as aptidões técnicas e a consciência ética e valores profissionais”

Com o passar dos anos, o poder da internet como meio de difusão de conteúdos massificou-se e
revelou-se essencial, refere Granado (2000) numa das aulas disponíveis na plataforma online da
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa: “em alguns pontos
essenciais falamos da instantaneidade, da interactividade, da atractividade, da distribuição fácil e
da produção mais barata de conteúdos”.

Estes aspectos resumem de forma simples as potencialidades do meio online. Contudo, novas
questões são colocadas diariamente no exercício desta nova prática jornalística. Sem um modelo
de negócio os meios de comunicação social não subsistem e, sem escapatória possível, pensar
online requer pensar em negócio e formas de obter receitas. O pisar da linha ténue que existe
entre o rigor jornalístico e a venda do produto jornalístico está entre os principais problemas
éticos que os jornalistas enfrentam nos dias de hoje.

António Granado, jornalista do Público e professor na Universidade Nova de Lisboa reúne online
uma série de dicas e materiais didácticos para as aulas da cadeira de ciberjornalismo que lecciona.
Numa dessas aulas, dedicadas ao jornalismo online menciona J.D.Lassica e a questão da ética na
prática online do jornalismo.

Lasica (1997), citando Fred Mann refere que “existe uma pressão considerável sobre os editores
online para fazerem crescer o negócio e começarem a fazer dinheiro, por isso a tentação de pisar
o risco é grande”.

No mesmo texto, publicado na revista American Journalism Review, J.D. Lasica (1997) indica
outros problemas que poderão surgir com a prática oline do jornalismo, tornando a análise ainda
muito actual: “While all the old ethical rules surely still apply, the Internet also presents
dilemmas that never existed in a print world: reporters lurking invisibly in chat rooms; ad links
embedded in editorial copy; the posting of private tragedies in news archives until the end of
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time; tracking users' habits and sharing data with advertisers; putting the tools of publishing into
the hands of Little League coaches and others who aren't trained journalists”.

Nesta nova prática outros dilemas surgem, como a luta ética e deontológica entre informar com
isenção e não cair na tentação do sensacionalismo. O jornalista vê-se na encruzilhada de ter
intrinsecamente que informar com o máximo rigor e modelar-se aos critérios de negócio que o
rodeiam. Mais que informar, o jornalista tem de saber distanciar-se da possibilidade criar
conteúdos mais agradáveis ao leitor e que o ajudam a obter audiência mas que fogem do carácter
essencial do jornalismo: o de informar com rigor.

Durante as várias intervenções que fiz como jornalista no sítio online do Público, senti que a
dificuldade de informar no imediato prendia-se mais com a questão de não incorrer em erros e ser
simples no informar. Pelo facto de a difusão ser imediata e lidarmos com o factor última hora,
mais responsabilidade acrescida se pautou e pauta o trabalho no online. Dos sete artigos que fiz
para o publico.pt, cinco deles trataram de acidentes de última hora e somente dois abordaram
eventos culturais.

Nos sete artigos online sobre acidentes tive a árdua tarefa de escrever depressa e bem, impulso da
imediata necessidade de dar a informação em tempo real. Essa tarefa somente foi dificultada pelo
facto de, na redacção do Público no Porto não existir ainda um editor online. De todas as vezes
que necessitei de colocar alguma informação online tive que contactar com o editor que se
encontra em Lisboa e, nesse compasso de espera, tentar que as minhas notícias não perdessem o
carácter actualidade e última hora que as caracterizavam.

Foi difícil essa tarefa, chegando por vezes a ter que esperar mais de duas horas pela colocação
online do artigo. Parece ridículo mas aconteceu mesmo o caso de dar conta de um atropelamento
mortal na cidade de Guimarães ao início da manhã e só ter o artigo online pelas 15h. Por
indicação do editor do Local/Porto a informação era mais pertinente no online e não seria tratada
na edição do dia seguinte. Nesse sentido encaminhei as informações para a plataforma online e
corri contra o tempo, na necessidade de não perder o carácter de última hora da notícia.

A explicação para o atraso na difusão da informação é simples: o editor do publico.pt não estava
naquele momento na editoria e mais ninguém tratou de atender ao meu pedido de colocar online e
no mais breve possível o artigo no sítio do Público. Esta situação deixou a “nu” uma carência da
redacção norte: um editor próprio de online na redacção ou a não dependência perante a redacção
de Lisboa para aceitar e colocar online noticias feitas na redacção do Porto.

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Muitas das vezes ouvi por parte dos editores do Local/Porto que essa necessidade tinha de ser
colmatada mas que nada ou pouco podiam fazer para mudar a situação. Mais grave me pareceu,
na minha opinião, constatar que muita das vezes era preferível nem apostar na divulgação online
pelo facto de isso depender da aprovação dos editores de Lisboa. Se por ventura colocassem
entraves no género de artigo ou mesmo na informação divulgada era preferível “deixar ficar” o
artigo. Ouvir isto aterrorizou-me enquanto profissional e muito mais como leitora. Percebi que
muito mais que o dever de informar o que acontece na sociedade e no mundo, o jornalista como
profissional está preso pelas amarras do tempo e da escolha dos critérios noticiosos, por mais que
sejam seus ou de outros jornalistas.

Sublinho também a questão do imediato do feedback que recebemos sobre os artigos colocados
online. Cada vez mais os leitores do publico.pt usam a plataforma de comentários e fazem dela
uma espécie de fórum de discussão, de troca de ideias e de exploração dos conteúdos. No mesmo
sentido existe a benesse de em tempo real e de forma também imediata podermos, enquanto
redactores dos artigos, actualizar a informação, acrescentar modos e estados da informação e
proceder a correcções. Por duas vezes, em dois dos sete artigos que redigi para o online, recebi
por parte dos leitores pequenos reparos sobre a informação que tinha dado. Foram gralhas que
deturpavam o meu objectivo de informar com rigor e que me passaram ao lado aquando da
redacção. Percebi que por vezes focava-me mais na questão de seguir o modelo de escrita online
do Público (antetítulo, título, e corpo de texto em forma de pirâmide invertida), simples e sem
rodeios, do que na percepção de pequenos detalhes.

Através desses feedbacks dados pelos dos leitores foi-me possível corrigir as gralhas a tempo e
perceber que depressa e bem, no jornalismo, não existe prática possível. Existe sim a
possibilidade de escrever depressa e correctamente, mas para aqueles que já têm um certo
conforto na sua escrita e prática. No meu caso, uma prática ainda inexperiente e lenta para a
engrenagem fortemente rápida que o online exige.

O meu último artigo no publico.pt saiu no dia após o fim do meu estágio. Abordou a edição 2009
do Gouveia Art Rock, e contou com a preciosa dica de um amigo jornalista da RTP. Um dos
contactos firmados através desta minha experiência no Público:

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“Música

Sétima edição do festival internacional de música progressiva agita Gouveia até domingo
01.05.2009 - 09h26, Vanessa Quitério

Três dias, doze concertos e uma sétima edição alargada. São estes os números fortes do Gouveia
Art Rock, festival internacional de música progressiva, que tem lugar a partir de hoje no Teatro-
Cine de Gouveia.

Pela primeira vez a organização do Gouveia Art Rock (GAR) vai aproveitar o feriado de 1º Maio
e dedicar três dias às abordagens variadas deste estilo musical que tem ganho centenas de novos
entusiastas a cada nova edição. Na opinião de Eduardo Mota, membro da organização do festival,
existem duas razões principais para as mudanças deste ano: “Já era nossa ideia estender o festival
por mais dias. É uma experiência, por isso vamos ver como funciona. Da mesma maneira
queremos testar a participação do público, que vem de diversos pontos do globo. Cinquenta por
cento dos visitantes são estrangeiros e os restantes são entusiastas nacionais”, esclarece.

O evento, que decorre até domingo, apresenta no cartaz deste ano a estreia de duas bandas
japonesas do estilo ‘progressivo de vanguarda’ e a estreia nacional dos italianos PFM- premiata
forneria marconi.

“O Gouveia Art Rock apresenta-se desde 2002 como um festival importante no panorama do
progressivo em Portugal e no mundo” refere Eduardo Mota, assinalando as inúmeras vantagens
da realização do evento na cidade de Gouveia: “O principal hotel da cidade já está esgotado e
outros serviços de hotelaria receberam já inúmeros pedidos, havendo um impacto significativo na
economia local”.

Nesta sétima edição marcam hoje presença os October Equus (Espanha), Gatto Marte (Itália) e os
lendários Focus (Holanda). Amanhã actuam os KBB, formação japonesa do progressivo
emergente dos anos 90, Gordon Giltrao (Inglaterra), Volapük (França) os Califórnia Guitar Trio,
presentes na edição de 2005 do GAR e Tony Levin, músico e compositor que faz parte dos King
Crimson e da banda de Peter Gabriel. No domingo sobem ao palco do Teatro-Cine os Koenji
Hyakkei (Japão), o australiano Daevid Allen (antigo membro dos Soft Machine e dos Gong) com
seu projecto de experimentalismo e ousadia Univerity of Errors e os italianos PFM.

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Paralelamente aos concertos realiza-se uma feira do disco, um “workshop” de guitarra com o
britânico Gordon Giltrap no auditório da Biblioteca Vergílio Ferreira e o lançamento de um livro,
seguido de debate, dedicado a Lars Hollmer, compositor sueco e marca incontornável do
‘progressivo mundial’. “Dedicamos a edição deste ano a Lars Hollmer porque ele era um homem
de causas e músico carismático do progressivo”, afirma o organizador do evento. O mesmo
adianta que no domingo também vai ser projectado um documentário sobre o último concerto do
músico sueco em Gouveia, no ano de 2005”.

Publicado no publico.pt a 1/05/2009

Fotolegenda

No ponto “Princípios e normas de conduta profissional” do Livro de Estilo do Público, o uso da


fotografia como elemento jornalístico também é abrangido: “O Público atribui à fotografia uma
importância fundamental na definição do estilo informativo e gráfico do jornal. Nesse contexto,
fotografia e texto estabelecem uma relação dinâmica permanente e intensa. Por isso, a fotografia
não é, para o Público, ou género menor ou um mero suporte ilustrativo, mas um contraponto
informativo e dramático do texto.”

“Uma imagem, por vezes, vale mais que mil palavras”. Esta é uma citação conhecida de todos e
que expressa o verdadeiro carácter de uma imagem. Mais que estudar semiótica e compreender as
componentes que a constituem, um jornalista tem de saber ler uma imagem como fonte de
informação e peça imprescindível no trabalho jornalístico.

Durante o meu estágio realizei três fotolegendas, cada uma de âmbito diferente e com exigências
diferentes. Esta prática informativa é utilizada pelo Público como instrumento de maior
exposição de dado assunto ou evento. É um modelo jornalístico onde a imagem ganha em relação
ao texto, mas onde ambas indissociavelmente constituem a matéria noticiosa. Segundo o alfabeto
do Livro de Estilo do Público (pág.132), a fotonotícia define-se por “notícia que está numa foto
com actualidade sendo a notícia desenvolvida num texto breve que acompanha a foto”. Na
mesma definição é referenciada a incorrecta utilização do termo fotolegenda, erro frequente e
termo mais utilizado na gíria jornalística.

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As exigências de uma fotolegenda foram, para mim, um bom exercício para a prática como
jornalista. Apelaram ao poder de síntese e para o olhar para o acontecimento com olhos de ver,
para que ao escrever o texto de suporte, não incorresse na repetição da informação para além da
que a imagem transmitia. Duas das três fotonotícia que redigi surgiram a partir da ronda
telefónica dos casos do dia. A primeira fotonotícia aconteceu ao quarto dia de estágio, na também
primeira saída ao exterior como jornalista do Público, na cobertura do desaparecimento de uma
senhora ao largo da praia do Senhor da Pedra, em Gaia. A imagem, fotografia do fotojornalista do
Público Manuel Roberto, identifica o ângulo da notícia a explorar: as buscas pelo corpo da vítima
e o envolvimento de meios aéreos de apoio no local.

Para mim, em análise ao trabalho que realizei, foi-me um pouco difícil realizar esta primeira
fotolegenda já que é um estilo que não estava habituada a utilizar. Mas, como em tudo, só se
aprende experimentando e nesta primeira experiência tive a ajuda do editor de local. Este
mostrou-me como agarrar nas informações recolhidas no local, adequar o discurso em
complemento à fotografia e caminhar pelo ângulo pretendido, já que neste caso específico,
tratava-se de um aparente suicídio e teríamos de dar um outro tratamento jornalístico à
ocorrência. Desse modo e em complemento à imagem, explicamos em 1000 caracteres o acidente
na praia do Senhor da Pedra, a questão do desaparecimento de uma pessoa e a presença de vários
meios de salvamento distribuídos por terra, mar e ar.

Na segunda fotonotícia as coisas já foram um pouco mais fácies. Tratou-se de um acidente


aparatoso na Avenida Fernão de Magalhães, no Porto. Ao local dirigi-me em conjunto com um
colega fotojornalista e da ocorrência surgiu uma foto que dava conta da destruição do veículo.
Senti dificuldade somente na adequação da informação trazida do local e na condensação, em
1000 caracteres, da informação pertinente sobre o acidente. Para tal tive que confirmar dados
após a ida ao local, como por exemplo, o estado de saúde das vítimas do acidente, bem como
detalhes pormenorizados sobre a via e modus operandi de toda a operação de resgate e
desobstrução da via acidentada. Acrescento que estas duas fotonotícias saíram na edição impressa
no dia seguinte ao terem acontecido, mas que no próprio dia saíram no última hora do publico.pt.

Quanto à terceira fotonotícia a metodologia de trabalho foi um pouco diferente já que o assunto
também assim o foi. A temática foi cultural e inseriu-se na divulgação de uma iniciativa a ter
lugar nos espaços atingidos pelo fogo no ano passado, na Reitoria da Universidade do Porto.

A exposição multimédia “Rescaldo e Ressonância” surgiu como trabalho de agenda e no dia da


inauguração fiz dupla com um fotojornalista colaborador do Público. Este trabalho já teve uma

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preparação prévia visto que sabia para o que ia e, de antemão, conheci as características da dita
exposição. No local falei com a curadora e os profissionais envolvidos no projecto do
requalificado espaço e percorri o percurso da exposição em busca de detalhes que fossem
chamativos para integrar na legenda da fotonotícia.

Desta vez corri de novo contra o tempo na elaboração do artigo em tempo record já que a
apresentação foi ao fim da tarde, pertinho do fecho da edição. Mas sobretudo deu-me gozo
escrever um texto mais descritivo, como se ao ler, o leitor estivesse na exposição e integrasse a
fotografia.

Ilustração 2 - Fotonotícia "Inauguração: Depois do fogo, salas da reitoria


da UP abriram-se à arte"

Último dia

As últimas impressões são sempre, ou quase sempre, motivo de choro ou de nostalgia. No meu
caso, terminar este estágio curricular no jornal Público espoletou-me um sem número de
sentimentos, mais medos e mais angústias.

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Na análise do que correu bem e do que correu mal, numa espécie de jogo de sombras e luzes,
aponto a minha maior inércia perante a oportunidade. Francamente vi-me fugir de entre os dedos
inúmeras oportunidades de mostrar ainda mais trabalho e de me cansar, agradavelmente, de fazer
jornalismo.

Nem tudo foi sempre perfeito, nem sempre tive as melhores atitudes perante o desalento
instalativo de perceber a realidade onde me inseri. As coisas não foram sempre fáceis nem nunca
esperei que chegava, entrava, brilhava e ficava na redacção. Pelo contrário, tinha a consciência
que é um meio difícil e por vezes selvagem, mas que a paixão que levava e que consegui reforçar,
me ajudaria a ultrapassar as dificuldades.

No ‘Parem as Máquinas’ muitos foram os posts de análise e de reflexão. Os últimos, esses foram
de despedida e de conclusões. Para terminar este relatório de estágio transcrevo os derradeiros
dias na redacção.

“Eis o derradeiro dia

E cheguei ao último dia do estágio no P. Pelas 11h tenho o meu último serviço como jornalista do
Local/Porto, secção na e para a qual trabalhei mais nestes três meses.

É o último dia de redacção. Em que me vou sentar naquela secretária, espaço “sagrado” desta
minha prática como jornalista estagiária. Depois deste derradeiro dia as coisas vão ser bem
diferentes. Não vai haver mais idas em trabalho, não vai haver mais manhãs madrugadoras em
que na secção só encontrava a senhora da limpeza.

A 75 visitas para chegar às 12.000, o PAREM AS MÁQUINAS torna-se ainda mais especial. Foi
folha de rascunho de muito trabalho, de muita ideia, de muita frustração. Mais que agora ganha
significado, já que vai ser o meu guia para elaborar o relatório final.

A todos os que me acompanharam agradeço. Mais logo teço as considerações finais. Neste último
dia ainda tenho um trabalho para fazer e esse, vai ser o mais significativo de todos. Até logo!

[…]

Neste último dia de redacção as coisas foram agitadamente tranquilas. Para começar bem o dia, o
autocarro atrasou-se, tive que ir de táxi para a redacção e ao chegar partir logo para o serviço
marcado. Entre troca de carros, esqueci-me do meu chapéu-de-chuva. Despistada, não dei conta

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que agarrei no bloco de apontamentos para qualquer coisa e larguei o chapéu. Mal o menos,
cheguei vinte minutos antes da hora ao serviço. Pelo menos nisso fui mais que pontual.

Pela hora do almoço tive de tratar de uns últimos assuntos pessoais relacionados com a residência
onde vivi nestes três meses. Regressei assim que pude à redacção e começou a labuta final, mais
intensa e significativa destes últimos tempos.

Foi-me dado um artigo de 1800 caracteres para fazer sobre o serviço da manhã. Para acrescentar,
em forma assim de benesse inesperada, foi-me dado a fazer uma página de breves, a incluir no
Local/Porto. Tive que analisar notícias recebidas de agências de comunicação, seleccionar o mais
relevante e encaixar no espacinho denominado de breve.

Por incrível que pareça, foi um bom exercício, onde me foi colocado à prova o poder de análise
da informação relevante, a colocar em 650 caracteres, num universo de 1500, por ai.

De resto, passadas já longas horas depois do meu regresso à tarde, decidi arrumar as minhas
tralhas. De lá, muito mais que papelada do trabalho diário, jornais e material que adquiri ao ir em
serviço, trago uma escola de referência, exercícios que me melhoraram um pouco como aspirante
a jornalista. Ao despedir-me da redacção, das últimas pessoas que estavam a fechar a edição,
nenhuma lágrima foi vertida. O momento não exigia tanto, mas a catadupa de recordações
mastigam-me por dentro. Ainda não caí em mim, mas já sinto aquele vazio, que no início era
entusiasmo.

Agora, mais que aprendizagens que fiz, levo para casa três meses marcantes. Meus, de todos os
que me acompanharam e do Público, que tão bem me acolheu. Amanhã terei na edição impressa
o trabalho de hoje. Um artigo no Local/Porto e as ditas breves, na mesma editoria.

Publicado no “Eis o derradeiro dia” e “Último dia”, Parem as Máquinas, 30/04/2009

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Conclusão

Relembrar que na primeira semana de estágio pensei em voltar para casa e desistir do sonho de
ser jornalista faz-me ver, neste momento, que sem as dificuldades iniciais o meu percurso
profissional, académico e pessoal seria inóspito e vazio.

Ter realizado o estágio curricular no jornal Público proporcionou-me um extenso abrir de portas e
mais que isso, o privar com um jornalismo de referência mas que, sem descurar em detalhes, se
posiciona na mesma vertente global de qualquer jornalismo ou prática jornalística: a busca da
verdade e interesse público.

Ao longo de três meses de estágio percebi que o mundo do jornalismo, prático e sem as longas
metáforas das aulas teóricas da faculdade, é um mundo difícil mas ao mesmo tempo apaixonante.
Todos os dias, ao chegar à redacção, senti-me como num restart comunicativo. De novo ia
começar a rotina produtiva, os telefonemas, as confrontações éticas e a pouca experiência que
levava. Para trás, no dia anterior, o mesmo se sucedia e o novo dia acumulava as boas e as más
experiências da prática precedente.

Muitas foram as dificuldades de encaixe na engrenagem que é o jornalismo diário e num diário
como o Público. Articular novas competências e tarefas, estar de manhã num serviço, chegar e
escrever contra o tempo, estar preparada para qualquer eventualidade ou simplesmente
aborrecermo-nos em frente ao computador foram as coisas que me alimentaram a prática diária
durante aqueles cerca de 90 dias de estágio.

Mais que ser referenciada como estagiária do Público, carrego na minha bagagem a oportunidade
de o ter sido, já que foi a partir deste experiência que me apercebi verdadeiramente do sentido da
palavra responsabilidade. Cada trabalho que desenvolvi - fora complexidades e temáticas –
obrigou-me a colocar em discernimento a responsabilidade de cada palavra e de cada afirmação,
levando-me a confirmar e reconfirmar os dados, muitas das vezes mais que na triplicação do acto.

Cada artigo mostrou-se uma aprendizagem singular e que me foi cumulativa ao longo do estágio
na medida em que fui encaixando a rotina produtiva. Fazer um jornalismo idóneo e atento tornou-
se uma espécie de obsessão, bem como necessário para dignificar a classe que, a meu ver e neste
actual momento, passa por imensas dificuldades, tanto de afirmação, como de organização.

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A prática jornalística acarreta sempre uma ética responsável e uma actuação objectiva ao
interesse público. Muitas foram as vezes que questionei a minha actuação como jornalista e como
produtora de conteúdos. Questionei a minha maneira de abordar a realidade informativa, de lidar
com as fontes e até de interagir com os meus (naquele momento) colegas de profissão.

Nessa busca de chegar mais perto do interesse público e descolar-me da minha imagem apenas de
leitora foi difícil perceber que, mais que aproveitar, tive a oportunidade de me estrear como
estagiária num jornal como o Público, tive na mão de mostrar o valor que tenho como futura
profissional da área.

As palavras dos primeiros dias ecoam ainda na minha cabeça. O conselho do subdirector Amílcar
Correia marcaram sem dúvida este meu estágio e, nunca mais do que agora, as mesmas palavras
fazem o importante sentido: “Se quiseres podes ser a estagiária que está todo o dia na secretária, a
ver os takes da Lusa, ninguém te chateia e não chateias ninguém. Mas, se quiseres, podes ser a
estagiária que dá propostas, procura fazer notícias e não está à espera que digamos o que fazer”.

As conclusões agora estão feitas, o trabalho foi apresentado e as oportunidades aproveitadas não
num máximo total mas naquilo que fui conseguindo fazer. Percebo agora que poderia ter dado
mais, explorado mais os temas e apostado numa rotina mais afastada da agenda ou das meras
formalidades da redacção.

Mas, como em tudo o que fazemos na vida, os “se’s” não nos servem de nada se queremos
avançar caminho. Poderia ter sido muito melhor mas, assim como foi, atrevo-me a dizer que foi a
melhor coisa do mundo. Pela experiência, pela aprendizagem, pelas pessoas que conheci e pelo
reconhecimento que muito mais que querer ser jornalista, quero abraçar o estudo dos media para
uma melhor compreensão do que poderei dar, como pessoa, a esta área nobre de se estar no
mundo.

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Bibliografia

Ayala, Francisco, (1984). La Retorica del Periodismo y Otras Retoricas, Madrid, Espasa Calpe,
S.A. Prólogo de Rafael Lapesa

Bastos, Hélder, (2000). Jornalismo Electrónico - Internet e Reconfiguração de Práticas nas


Redacções, Coimbra: Minerva Editora

Livro de Estilo do Público (2005) Público – Comunicação Social, SA

Traquina, Nelson (2002). O Que é Jornalismo? Lisboa, Quimera

Consultas online:

Aula nº 7 – Jornalismo Digital: http://www2.fcsh.unl.pt/cadeiras/ciberjornalismo/aula7.htm

Bastos, Hélder, Ciberjornalismo: dos primórdios ao impasse, Comunicação e Sociedade, vol. 9-


10, 2006, pp. 103-112

http://revcom2.portcom.intercom.org.br/index.php/cs_um/article/view/4752/4466

Bastos, Hélder, (2009), Da implementação à estagnação: os primeiros doze anos de


ciberjornalismo em Portugal

http://conferencias.ulusofona.pt/index.php/sopcom_iberico/sopcom_iberico09/paper/view/253/23
0

Código Deontológico dos Jornalistas


http://www.jornalistas.online.pt/noticia.asp?id=24&idselect=369&idCanal=369&p=368
retirado em 21/07/2009

Zamith, Fernando, O subaproveitamento das potencialidades da Internet pelos ciberjornais


portugueses:http://prisma.cetac.up.pt/prisma2/artigospdf/Subaproveitamento_da_Internet_Fernan
do_Zamith.pdf

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Anexos

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