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A sereia

lvaro Magalhes

A sereia
lvaro Magalhes

ra uma vez uma mulher que gostava de ler e de ver televiso com os ps mergulhados numa bacia de gua quente. E se fosse s isso... Tambm gostava de molhar os ps no mar, no rio, na piscina, ou onde houvesse uma pocinha de gua. E na banheira? Quem a quisesse encontrar, era sentada na banheira, a ler, a ouvir msica. No saa dali. Foi um exagero, que no podia acabar bem. Quando deu por ela, a mulher era peixe da cintura para baixo: tinha

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A sereia

uma pele viscosa, escamas, e uma barbatana no stio dos ps. Quem serei? Quem serei?, perguntava ela, desgostosa, ao ver-se ao espelho. Passaram dias, passaram noites e ela naquilo: Quem serei? Quem serei? As pessoas tanto a ouviram gritar Quem serei?, que passaram a chamar-lhe a Serei e, com o tempo, a Sereia. E tambm no sabiam o que fazer quilo, sereia. Se era meio -peixe devia ser lanada ao meio-mar, mas como s havia um mar inteiro foi para l que ela foi, embora a queixar-se de que no sabia nadar. Ningum

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acreditou. Onde se vira um peixe (v l, meio-peixe) que no soubesse nadar? E se tinha barbatana, que nadasse no mar. A Terra era para quem tinha pernas para andar. Perguntou-lhe o homem que comandava a multido: Ou preferes ir para o mercado do peixe e acabar numa caldeirada de sereia? Credo. Que ideia!, disse a sereia, e lanou-se ao mar. Parece que engoliu muita gua, sempre a vir superfcie para respirar, mas l acabou por aprender e at de gostar. Pelo mar se ficou e, por fim, at

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casou e teve a sua famlia de sereias. Ningum sabe, mas foi assim que elas nasceram, umas gordas, outras ma gras, umas lindas, outras feias.

Fim

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