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Canto do Abismo Profundo (Martha Kiev) Minha carne se transformou num campo de um milho de bocas que gritam, de mos

abertas que buscam no ar algo em que se agarrar, mas no conseguem. Minhas costelas so dedos sseos que pressionam meu peito a ponto de eu no conseguir respirar. Parece que todo peso do mundo caiu sobre meus ombros e j no consigo sustentar. Nunca pude, nunca quis. E agora aqui estou. Meus olhos se fecham na esperana de cessar ao menos por um segundo essa dor profunda, fsica, mas isso no vai acontecer. Minha boca tem sede, mas nada a umedecer. Somente o tempo vai ressequir meu corpo em carne viva, vai estancar a sensibilidade ao toque, vai emudecer a lngua e tornar surdos meus ouvidos. Somente o tempo vai tirar a alma de mim e colocar no lugar algo que no sou eu. Um ser destitudo de todo sentimento, porque para mim eles de nada mais servem.

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