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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA

FRACTAIS: CONCEITOS BÁSICOS,


REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS E
APLICAÇÕES AO ENSINO NÃO
UNIVERSITÁRIO

Célia Maria Filipe Santos Jordão Alves

MESTRADO EM MATEMÁTICA PARA O ENSINO


Dissertação orientada pela
Professora Doutora Ana Maria Ribeiro Ferreira Nunes

i
ii

2007
iii

A presente obra encontra-se licenciada sob a licença Creative Commons Attribution-


NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported. Para visualizar uma cópia da licença, visite
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/ ou mande uma carta para: Crea-
tive Commons, 171 Second Street, Suite 300, San Francisco, California, 94105, USA.
iv

Dedico este trabalho ao meu marido e ao meu filho.


v
vi

Agradecimentos

Muito há o que e a quem agradecer depois desta longa jornada.


Em primeiro lugar, agradeço à minha orientadora, Professora Doutora Ana Nunes,
por ter aceite acompanhar-me nesta caminhada e por ter uma paciência tão grande ou
maior que a minha persistência.
Agradeço a todos quantos escreveram e editaram livros sobre fractais, em parti-
cular aos autores dos livros que eu consultei e que foram a minha principal fonte de
informação e a base de inspiração de todo o meu trabalho. Obrigada também aos que
disponibilizaram material escrito na internet sobre o tema, em particular ao Profes-
sor Doutor João Carlos Alves Barata, da Universidade de São Paulo, pelo manual de
Fı́sica-Matemática que disponibilizou on-line e que tão útil me foi para a compreensão
das bases da Teoria da Medida, e ainda pela sua prontidão e simpatia na resposta às
minhas questões.
Outros autores eu tive a ousadia de importunar e a todos agradeço a paciência e
a amabilidade com que sempre contestaram aos meus emails; são eles Michael Frame
da Yale University, Michael Barnsley da Australian National University e Kenneth
Falconer da University of St Andrews.
Agradeço ainda a todos aqueles que produziram software e applets para representar
fractais e que colocaram esse material para acesso gratuito na internet. Esse material
serviu não só para compreender melhor alguns conceitos, como também para utilizar
em algumas propostas de trabalho para alunos.
O meu muito obrigada ao Professor Doutor Luı́s Sequeira, da Universidade de
Lisboa, por ter ministrado um curso de Latex, onde eu pude aprender as bases para
a utilização desta linguagem, e por ter respondido tão atenciosa e prontamente às
questões que lhe fui colocando ao longo de todo o meu trabalho. Agradeço ainda a
todos aqueles que disponibilizaram textos na internet com instruções para o LaTex
que me permitiram esclarecer muitas dúvidas e aborrecer menos vezes o Professor Luı́s
Sequeira.
vii

Obrigada à Ana Paula Jordão pelo apoio prestado aquando da elaboração do meu
pedido de licença sabática e à Sónia Figueinhas que, não acreditando que este trabalho
algum dia pudesse ter fim, se muniu de toda a paciência necessária para digitalizar e
enviar-me por email material impresso que eu não possuı́a.
Um agradecimento muito especial a todos os meus amigos que se ofereceram para
ler as versões prévias desta tese de modo a ajudar na detecção de gralhas, em particular
à Marta Carapuço a quem eu incumbi essa tarefa e que a cumpriu sempre com muito
boa disposição, muita eficiência e ainda com um enorme sentido crı́tico-construtivo.
Por fim agradeço àqueles que me acompanharam de perto, dia-a-dia, ao longo de
toda esta viagem, e que testemunharam todos os momentos não só de entusiasmo mas
também de angústia que fazem parte de tarefas como esta: o meu marido e o meu
filho. Não esqueço a resignação, a compreensão e o amor com que aceitaram a minha
ausência no tempo que roubei à convivência familiar para dedicar à finalização deste
trabalho.
viii

 As nuvens não são esferas, as montanhas não são cones, as linhas


costeiras não são cı́rculos, a casca das árvores não é lisa e os relâmpagos
não viajam em linha recta.

Benoı̂t Mandelbrot
ix
x

RESUMO O objectivo deste trabalho é a elaboração e a apresentação de propostas


de trabalho sobre Fractais para serem utilizadas na sala de aula de Matemática, com
alunos do ensino não universitário. Para além disso, são também apresentadas algumas
propostas para serem desenvolvidas na modalidade de Projecto, na disciplina de Área
de Projecto. De modo a atingir este objectivo, patente no último capı́tulo, apresentam-
se previamente três outros capı́tulos. O primeiro que consiste na apresentação do con-
ceito de Fractal enquanto ponto fixo de um Sistema de Funções Iteradas; o segundo
que consta na apresentação do conceito de Dimensão Fractal, em particular das de-
finições de Dimensão de Hausdorff e de Dimensão de Contagem de Caixas, sendo a
primeira feita a partir da Construção de Medida de Carathéodory; e o terceiro que
contém uma compilação de aplicações possı́veis da Geometria Fractal com o intuito de
dar a perceber a importância que esta geometria tem vindo a alcançar pela sua enorme
utilidade e aplicabilidade nas mais variadas áreas do conhecimento. No último capı́tulo
é, então, apresentado um conjunto de propostas de actividades que pretendem levar
o aluno a compreender o conceito de Fractal, estudar algumas propriedades de casos
concretos e entender a importância da Geometria Fractal para o mundo actual, sendo
evidenciados, sempre que possı́vel, os conteúdos programáticos dos programas oficiais
de Matemática portugueses em vigor actualmente que podem ser trabalhados nessa
actividade a par dos conceitos da Geometria Fractal.

Palavras-Chave: geometria, fractal, sistema de funções iteradas, dimensão fractal, di-


mensão de Hausdorff, dimensão de contagem de caixas, aplicações, aula de matemática,
representação gráfica
xi

ABSTRACT The main objective of this work is the elaboration and presentation of
some proposals for classroom activities about fractals to be used in Mathematic classes,
with non-University students. In addition, it is also presented some activities for being
developed as a project. To reach this goal, which is highlighted in the last chapter,
three previous chapters are introduced. The first presents the concept of Fractal as a
fixed point of a Iterated Function System; the second relies on the concept of Fractal
Dimension, in particular in the definition of both the Hausdorff Dimension and the Box
Counting Dimension, being the first created from the Carathéodory Measure Theory;
and the third includes a compilation of possible applications of the Fractal Geometry
in order to emphasize the importance that this geometry has been gaining due to its
vast utility and applicability in various areas of knowledge. In the last chapter it is
presented a collection of classroom activities, which pretend to take the pupil into the
concept of Fractal and into the study of some properties of some particular cases. At
the same time, it is pretended that the students deep their knowledge about the impor-
tance of the Fractal Geometry in the current world. Whenever possible, the contents
of the current Portuguese official learning programmes of Mathematics were pointed
out in a way that they can be worked in parallel with the Fractal Geometry concepts.

Keywords: geometry, fractal, iterated function system, fractal dimension, Hausdorff


dimension, box counting dimension, applications, mathematics lessons, graphical re-
presentations
Conteúdo

Lista de Figuras xv

Lista de Tabelas xxi

Introdução xxiii
As Minhas Motivações xxv
As Origens da Geometria Fractal xxviii
Os Conceitos de Fractal e de Dimensão Fractal xxxi
A Estrutura deste Trabalho xxxvi

Capı́tulo 1. Fractais definidos por Sistemas de Funções Iteradas 1


1. Conceito de espaço métrico 5
2. Conceito de espaço métrico com métrica de Hausdorff 5
3. Ponto fixo de uma transformação 22
4. Sistemas de Funções Iteradas 26
5. Exemplos de Fractais definidos por Sistemas de Funções Iteradas 36
6. Fractais parecidos com objectos naturais 42
7. Sistemas de Funções Iteradas com Conjunto de Condensação 44
8. O Problema Inverso - Modelação com Sistemas de Funções Iteradas 47

Capı́tulo 2. A Dimensão Fractal 53


1. Construção de uma Medida pelo método de Carathéodory 57
2. Medida e Dimensão de Hausdorff 86
3. Definições alternativas de Dimensão 109

Capı́tulo 3. Aplicações da Geometria Fractal 139


1. Fractais Naturais 142
xiii
xiv CONTEÚDO

2. Fractais criados pelo Homem 158


3. Fractais aplicados às Ciências Económicas, Sociais e Humanı́sticas 171
4. Os Fractais e a Teoria do Caos 175

Capı́tulo 4. Exploração de Fractais em contexto de Sala de Aula 179


1. Tipos de Actividades 184
2. Conexões matemáticas proporcionadas pelo tópico “Fractais” 186
3. Competências, Capacidades e Atitudes 186
4. Exploração de Fractais com software 191
5. Propostas de Actividades para a Aula de Matemática 194
6. Propostas para a disciplina de Área de Projecto 265

Conclusão 289

Anexos 297

Bibliografia 321
Lista de Figuras

1.1 Distância de um ponto x a um conjunto compacto A. 6

1.2 Distância de A a B. 8

1.3 Distância de A a B e distância de B a A. 8

1.4 Distância de pontos ”estratégicos”aos conjuntos A, B e C. 10

1.5 Lema da Extensão 18

1.6 Dois elementos de H(R2 ). 21

1.7 Contracção em R 23

1.8 Representação gráfica de um ponto f de C[0, 1], da sua imagem pela função
1
w(f ) = f + 1 e do ponto fixo de w. 23
2
1.9 Contracção no espaço das funções contı́nuas em [0,1 29

1.10Iteradas sucessivas de um compacto de R pela função fe definida em H(R). 31

1.11Iteradas sucessivas de um compacto de R2 pela função we definida em H(R2 ). 32

1.12A distância de B1 a C1 ∪ C2 é igual ao menor valor entre d(B1 , C1 ) e d(B1 , C2 ). 33

1.13Um Fractal definido por um SFI é independente do elemento inicial de H(X ) ao qual
se aplica esse SFI. 38

1.14As primeiras duas iteradas de um SFI não linear. 40

1.15Resultado da primeira iterada do SFI que gera a curva de Peano. 41

1.16Resultado das cinco primeiras iteradas do SFI que gera a curva de Peano. 42

1.17Reescalamento de um quadrilátero com distorção. 43

1.18Representação gráfica de algumas das iteradas de um SFI que define um fractal que
se assemelha a um feto. 44
xv
xvi LISTA DE FIGURAS

1.19Imagem obtida depois de cinco iterações num SFI com conjunto de condensação. 46

1.20Imagens de plantas virtuais geradas a partir de Sistemas de Funções Iteradas com


Conjunto de Condensação. 47

1.21Simulação de avenida ladeada por árvores, gerada a partir de um Sistema de Funções


Iteradas com Conjunto de Condensação. 48

1.22À esquerda a folha que se pretende representar através do ponto fixo de um SFI
e à direita a imagem dessa folha por seis contracções diferentes juntamente com o

contorno da folha original. 50

1.23A iteração zero e o resultado obtido ao fim de seis iterações através de um SFI
constituı́do por seis contracções em R2 . 51

2.1 Gráfico de µsH em função de s. 92

2.2 Relação entre medidas de figuras semelhantes. 97

2.3 As primeiras três iterações na construção do conjunto Poeira de Cantor. 98

2.4 As primeiras quatro iterações na construção do Conjunto de Cantor. 99

2.5 As primeiras três iterações na construção de um conjunto totalmente desconexo em


R2 com dimensão de Hausdorff igual a r. 106

2.6 Rede-δ em R, R2 e R3 . 113

2.7 Ilustração em R e em R2 de “Em Rn , cada bola fechada de raio δ intersecta, no


máximo, 3n cubos da rede-δ. 114

2.8 Se a dimensão de caixas de um conjunto A é maior que a dimensão de caixas de um


conjunto B, então a dimensão de caixas de A ∪ B é igual à dimensão de caixas de A. 117

2.9 Primeiras quatro iteradas da construção da Curva de Koch. 122


 k
1
2.10Para δ = são necessários, no máximo, 4k conjuntos de diâmetro δ para cobrir
3
a Curva de Koch. 122
 k
1
2.11Para δ = conseguem-se, pelo menos, 4k + 1 bolas de diâmetro δ com centro
3
em pontos da Curva de Koch. 123
LISTA DE FIGURAS xvii

2.12Recobrimento do Triângulo de Sierpinski por quadrados de lado 12 , 1


4 e 18 . 126

2.13Árvore de uma das variedades de acer palmatum. 127

2.14Versão binária da imagem digital da folha. 127

2.15Divisão da imagem em caixas de lado 512, 256, 128, 64, 32, 16 e 8 pixels
respectivamente. 128

2.16Número de caixas que intersectam a folha (Nδ (G)) em função do comprimento (em
pixels) do lado da caixa (δ). 129

2.17Logaritmo do Número de caixas que intersectam a folha (log (Nδ (G))) em função
do Logaritmo do inverso do comprimento (em pixels) do lado da caixa (− log(δ)) e

recta de regressão linear para o conjunto de pontos representados. 130

2.18Primeiras duas iteradas da construção um fractal que pode ser definido por um SFI
constituı́dos por cinco contracções, com dois factores de contracção diferentes. 132

2.19Resolução Gráfica, pelo Método Heurı́stico, para determinar a dimensão de um


fractal definido por um SFI constituı́do por contracções de diferentes factores de

contracção. 133

2.20Primeiras quatro iteradas da construção do Triângulo de Sierpinski. 134

2.21Esquema de construção da primeira iterada e as primeiras cinco iteradas da


construção da Curva de Peano. 135

2.22Primeiras iteradas da construção de duas curvas com processo de construção idêntico


à Curva de Koch. 136

2.23Primeiras iteradas da construção da Ilha de Minkowski. 137

3.1 Diversos elementos da flora que exibem a repetição da mesma forma a várias
escalas. 144

3.2 Vegetais com estrutura fractal. 145

3.3 Imagem do sistema pulmonar e de um modelo fractal desse sistema. 145

3.4 Modelo do sistema de irrigação do coração humano. 146


xviii LISTA DE FIGURAS

3.5 Neurónio. 147

3.6 Padrão formado por bactérias em crescimento, em laboratório, em prato petri. 150

3.7 Vista aérea de uma rede fluvial e fotografia de uma cascata. 151

3.8 Imagens de grutas onde a geometria fractal é bem visı́vel. 152

3.9 Imagens de montanhas onde a geometria fractal está bem patente. 153

3.10As nuvens apresentam uma estrutura fractal 154

3.11A luz de um relâmpago percorre um caminho fractal. 154

3.12Agregação por Difusão Limitada 156

3.13Flocos de neve com estrutura fractal. 157

3.14Galáxia criada por computador. 158

3.15Paisagens criadas por computador. 159

3.16Dithering com a curva de Hilbert. 161

3.17Antena com formato fractal. 162

3.18Secção de cabo de fibra óptica com a colocação das fibras segundo uma
estrutura fractal. 163

3.19Misturadores de fluı́dos com forma fractal, 164

3.20Conjunto de Mandelbrot 165

3.21Imagens digitais criadas por processos idênticos ao do Conjunto de Mandelbrot.166

3.22Quadro de Paul Jackson Pollock. 169

3.23Padrão fractal obtido pela compressão de tinta entre duas folhas de papel. 169

3.24Vista aérea de uma povoação em Ba-Ila e as primeiras três iterações do modelo


fractal correspondente. 170

3.25Vista aérea da cidade de Logone-Birni 171

3.26Projecto de Kazimir Malevich. 172

3.27Mosteiro da Batalha. 173

3.28Esboço de Da Vinci de uma catedral. 174


LISTA DE FIGURAS xix

3.29Atractor de Lorenz. 176

4.1 Esta folha foi, na verdade, desenhada por computador a partir de um SFI; mas
parece bem verdadeira! 241

4.2 A folha é a reunião de três contracções de si mesma. 242

4.3 À esquerda, a folha que se pretende representar através de um fractal definido por
um SFI e à direita, a reunião de seis imagens dessa folha através de seis contracções

diferentes juntamente com o contorno da folha original. 246

4.4 Comparação da forma original com a forma obtida ao fim de seis iterações através
de um SFI constituı́do por seis contracções. 246
Lista de Tabelas

1.1 Coeficientes de cada uma das contracções do Exemplo 17. 50

2.1 Valores obtidos a partir da contagem de caixas que intersectam a Figura 2.14. 129

4.1 Conceitos matemáticos implı́citos em cada uma das Propostas. 187

4.2 Conceitos matemáticos implı́citos em cada uma das Propostas. 188

xxi
Introdução

xxiii
xxiv INTRODUÇÃO
AS MINHAS MOTIVAÇÕES xxv

As Minhas Motivações

Ao longo do tempo, na minha actividade como docente tenho-me preocupado em


leccionar Matemática aos alunos da forma o mais atractiva possı́vel, tentando ir ao
encontro das suas expectativas e dos seus interesses. A intenção é conseguir que os
conteúdos programáticos adquiram um sentido prático e, daı́, sejam melhor compreen-
didos e adquiridos. Apresentar actividades que relacionem a Matemática com o real
e utilizar as novas tecnologias foram sempre duas das minhas apostas por considerar
que são estratégias bastante eficazes no que diz respeito à motivação dos alunos para
o estudo da Matemática. Entender a relação da Matemática com a realidade aclara
nos alunos a ideia da utilidade da aprendizagem que se pretende que efectuem. Por
conseguinte, a Matemática pode tornar-se necessária para eles, o que por si só pode
ser um factor facilitador da aquisição e compreensão dos conceitos. Por outro lado, a
utilização do computador, das calculadoras gráficas e de outros aparelhos electrónicos
pode tornar mais visual, mais concreta e, portanto, mais apelativa, qualquer tarefa que
se apresente aos alunos da era actual.
Com base nestes dois pontos, e à medida que fui tendo contacto com o tema dos
Fractais, este veio a suscitar-me um interesse crescente, por notar que tem potenciali-
dades para ir ao encontro desse objectivo. Comecei por notar a forma como o estudo
de um só fractal pode conectar uma vasta lista de conceitos matemáticos e como a sua
representação gráfica no computador pode tornar esse objecto de estudo muito inte-
ressante e apelativo. Depois, de forma mais gradual, fui-me dando conta da enorme
aplicabilidade destes objectos geométricos ao estudo de elementos e fenómenos naturais
o que torna, portanto, perfeitamente evidente a ligação da Matemática com o real.
A primeira vez que ouvi falar sobre Fractais foi no primeiro ano da licenciatura em
Ensino da Matemática. Não existia no curso uma disciplina dedicada ao assunto, mas
o tópico foi referido algumas vezes pelo Professor Sousa Ramos durante as suas aulas
de Introdução à Computação. Apesar de ter recebido muito pouca informação sobre o
xxvi INTRODUÇÃO

assunto, de algum modo ele me suscitou interesse que me incitou a aproveitar outras
oportunidades que foram surgindo para escutar várias pessoas a falarem sobre fractais.
Mais tarde aproveitei a oportunidade oferecida pela disciplina de “Seminário de
Matemática para o Ensino” integrada na parte curricular do Mestrado em Matemática
para o Ensino, para explorar o tema dos Fractais. Produzi um trabalho que consistiu
no estudo teórico do conceito enquanto ponto fixo de um sistema de funções itera-
das seguido da enumeração dos conceitos matemáticos constantes nos programas de
Matemática do ensino básico e secundário que podem estar associados ao estudo de
sistemas de funções iteradas. Este trabalho veio a constituir a base de desenvolvimento
do Capı́tulo 1 desta dissertação.
No congresso anual de professores de Matemática (Profmat 2003) em Santarém
orientei uma sessão prática de três horas sobre fractais onde, depois de uma explicação
sobre o conceito, apresentei aos professores participantes algumas das actividades que
podem ser realizadas com os alunos para que as resolvessem eles mesmos e depois
as comentassem. Voltei depois a dinamizar uma acção idêntica na Escola Secundária
c/ 3o C.E.B. da Batalha também dirigida aos professores de Matemática e, das duas
experiências, depreendi que seria importante organizar melhor as actividades que tinha
já pensadas para os alunos de forma a que estas pudessem estar disponı́veis e acessı́veis
a mais professores que possam interessar-se pelo assunto.
Em Setembro de 2004 participei numa Acção de Formação onde estavam presentes
professores de diversas disciplinas, intitulada “Interdisciplinaridade e Computação no
Ensino Secundário” e cujo objectivo era aprender as bases de programação em NetLogo,
uma linguagem que funciona com uma plataforma auxiliar de apresentação gráfica e
que permite criar programas de simulação de situações reais nas mais variadas vertentes
do estudo das ciências. O trabalho que realizei como produto final e para avaliação da
minha aprendizagem nessa acção de formação, incidiu mais uma vez sobre o tema dos
fractais e consistiu na criação de programas em NetLogo que permitem ao utilizador a
construção de fractais e na elaboração de algumas propostas de trabalho para alunos do
AS MINHAS MOTIVAÇÕES xxvii

ensino secundário, que lhes pede que explorem alguns conceitos matemáticos através da
construção e análise de fractais recorrendo ao software criado. Mais uma vez senti que
seria importante aprofundar este trabalho de forma a introduzir mais alguns aspectos e
a melhorar outros, para depois o poder aplicar na sala de aula e também disponibilizá-lo
a quem possa estar interessado em o utilizar.
O trabalho resultante destas últimas experiências constituiu o ponto de partida
para o Capı́tulo 4 onde é apresentado um conjunto de propostas de actividades para
trabalhar com os alunos, tendo o NetLogo perdido alguma relevância em detrimento
de outros softwares que também são sugeridos.
Foi com a realização do trabalho de “Seminário de Matemática para o Ensino”
que comecei a aperceber-me que o estudo dos fractais se encontrava em franca ex-
pansão devido à sua aplicabilidade num vasto leque de áreas. Apesar de se tratar
de um tema bastante recente (só lhe foi dada importância a partir da segunda me-
tade do século XX), os fractais já demonstraram ter correlação com quase todos os
domı́nios do conhecimento e surgem constantemente novas aplicações dos mesmos. Os
fractais “puros” estão patentes apenas na Matemática, mas podem servir para modelar
fenómenos e objectos da Fı́sica, da Astronomia, da Sismologia, da Meteorologia, da Bi-
ologia, da Medicina, das Ciências Humanas, da Economia, de diversas formas de Arte,
da Informática, da Indústria, etc, etc,... Esta constatação levou-me a considerar que
a Geometria Fractal merece ser apresentada aos alunos a partir do ensino básico e fez
com que o seu papel nas propostas de actividades apresentadas no último capı́tulo deste
trabalho deixasse de ser apenas o de elo de conexão entre conceitos matemáticos e o de
ilustração da aplicação dos mesmos, para passar a ser como que o actor principal, isto é,
o assunto que interessa realmente estudar. A necessidade de fundamentar esta opinião
deu origem ao Capı́tulo 3, onde tento dar uma visão abrangente das possibilidades de
utilização e aplicação da Geometria Fractal.
Assim, é possı́vel encontrar no estudo dos conjuntos fractais um manancial de
tópicos para trabalhar com os alunos em actividades de exploração e de investigação
xxviii INTRODUÇÃO

tanto na aula de Matemática, como noutras situações em que a Matemática se pode


conectar de forma estreita com outras disciplinas. Um dos espaços privilegiados para
esse efeito poderá ser a disciplina de Área de Projecto, quer no ensino básico, quer no
ensino secundário, pelo que algumas das propostas mais abertas e multidisciplinares
serão apresentadas para o âmbito desta disciplina.
O conceito de fractal, não sendo fácil de definir formalmente, é bastante fácil de
entender e pode ser trabalhado com alunos desde os mais jovens até aos do ensino
secundário. Ao realizar tarefas sobre fractais, desde a interiorização do conceito, à
construção dos mesmos (apoiada ou não por suporte informático) ou à análise das suas
propriedades, o aluno pode aplicar, desenvolver, aprofundar e conectar variadı́ssimos
conceitos matemáticos, muitos dos quais fazem parte dos conteúdos programáticos do
ensino básico e do ensino secundário. No Capı́tulo 4 é indicada a lista dos conteúdos
programáticos da disciplina de Matemática que podem estar, de alguma forma, relaci-
onados com as actividades propostas.

As Origens da Geometria Fractal

A partir da segunda metade do século XIX, foram sendo apresentados alguns dos
objectos hoje tidos como fractais. Exemplos disso são alguns dos Fractais clássicos fa-
mosos que serão mostrados durante este trabalho, como é o caso do Conjunto de Cantor
(ver Exemplo 11, página 38) introduzido pelo matemático alemão Georg Cantor (1845-
1918) em 1883, da Curva de Peano que percorre todos os pontos de um quadrado (ver
Exemplo 13, página 40), apresentada em 1890 pelo matemático alemão Giuseppe Pe-
ano (1858-1932), da Curva de Koch (ver Exemplo 40, página 122) que apareceu num
trabalho do matemático sueco Helge von Koch (1870-1924) em 1904 e do Triângulo de
Sierpinski (ver Exemplo 1, página 21 e Exemplo 9, página 37) apresentado pelo ma-
temático polaco Waclaw Sierpinski (1882-1969) em 1915.[48] Não havia, nessa altura,
quase nenhuma representação gráfica destes conjuntos porque a inexistência de com-
putadores na época obrigava a que se dispendesse muito tempo em cálculos fastidiosos
sem, no entanto, se produzirem grandes resultados gráficos. Por vezes, conjuntos deste
AS ORIGENS DA GEOMETRIA FRACTAL xxix

tipo, com propriedades estranhas - curvas que não eram diferenciáveis em nenhum
ponto, auto-semelhantes, com comprimento indefinido ou que não podia ser medido,
às quais o conceito de dimensão topológica parecia não se adequar - eram vulgarmente
apelidados de “monstros” e de “casos patológicos” sem interesse matemático e eram
apresentados sem qualquer suporte de imagem ou apenas acompanhados por esboços
de pouca qualidade gráfica. Exemplos disso são esboços de movimentos fı́sicos e de
movimentos brownianos simulados nos livros Les Atomes do fı́sico francês Jean Perrin
(1870-1942) de 1913 e Introduction to Probability do matemático croata William Feller
(1906-1970) de 1950, e aqueles que viriam a ser dos primeiros conjuntos a ser apelidados
de fractais, que apareceram no trabalho dos matemáticos franceses Pierre Fatou (1878-
1929) e Gaston Julia (1893-1978), por volta de 1918, sem terem sido representados
graficamente nessa época[5].
Em 1945, um tio de Benoı̂t Mandelbrot - Szolem Mandelbrot, um matemático
franco-polaco - recomendou-lhe a leitura de um trabalho de 300 páginas de Gaston
Julia intitulado Mémoire sur la iteration des fonctions rationelles, publicado em 1918
no Journal de Mathématiques Pures et Appliquées, e que foi um documento precursor
da moderna teoria dos sistemas dinâmicos.
Em 1970 Benoı̂t Mandelbrot, também ele matemático francês nascido na Polónia
em 1924, retomou o interesse pelas questões relacionadas com a publicação de Gas-
ton Julia e, com a ajuda dos meios computacionais que tinha ao seu dispor na IBM,
onde trabalhava, iniciou a partir de 1957 no centro de investigação Thomas J. Wat-
son, o seu estudo. Começou por estudar séries temporais relacionadas com preços e
posteriormente com um problema que, naquela época, preocupava os técnicos da mul-
tinacional, e que estava relacionado com o ruı́do das linhas telefónicas utilizadas para
interligar computadores. A informação transmitia-se mediante impulsos eléctricos, e
a consequência do ruı́do era o eventual desaparecimento de um fragmento de sinal.
Mandelbrot propôs um modelo que se inspirava directamente no conjunto de Cantor
xxx INTRODUÇÃO

e demonstrou que não era possı́vel eliminar os ruı́dos, mas poder-se-ia estabelecer um
controlo dos mesmos mediante oportunas estratégias de redundância.
Em 1962, Mandelbrot publicou a memória Sur certains prix spéculatifs: faits em-
piriques et modèle basé sur les processus stables additifs de Paul Lévy, uma das suas
primeiras referências sobre séries temporais em finanças. Em 1967 publicou How Long
is the Coast of Britain? Statistical Self-similarity and Fractional Dimension, sobre um
tema que encontrou numa publicação póstuma do cientista britânico Lewis F. Richard-
son.
E assim se foram dando os primeiros passos do desenvolvimento de uma geome-
tria fractal sistemática, que incluı́a o seu aspecto gráfico, levado a cabo por Benoı̂t
Mandelbrot, praticamente sozinho durante dez anos. Posteriormente passou a incluir
programadores que foram sendo pessoas diferentes ao longo do tempo, parte deles
estagiários na IBM[5].
Todo este trabalho de investigação viria a dar origem ao seu ensaio de 1975 in-
titulado Les objects fractales: forme, hasard et dimension. É nesse trabalho que é
introduzido o termo fractal a partir do adjectivo latino fractus, do verbo frangere,
que significa quebrar[48]. É por isso que este matemático é hoje apelidado de pai da
geometria fractal já que foi também a partir deste seu ensaio que começou verdadei-
ramente a desenvolver-se um interesse crescente, por parte da comunidade cientı́fica,
pela geometria fractal.
A partir de 1975 foi sendo possı́vel desenhar fractais com recurso aos computadores.
Mais tarde, Benoı̂t Mandelbrot, foi um dos primeiros a utilizar o computador para
processar iterações sucessivas de equações[6].
Em 1980, novamente com a ajuda de um computador, Mandelbrot apresenta o pri-
meiro traçado detalhado do gráfico de um conjunto deduzido da avaliação do parâmetro
de um sistema dinâmico no campo complexo: z → z 2 + c sendo c um número com-
plexo, que é o parâmetro em questão. O dito conjunto (hoje denominado conjunto de
OS CONCEITOS DE FRACTAL E DE DIMENSÃO FRACTAL xxxi

Mandelbrot) é provavelmente o fractal mais popular e, possivelmente, um dos objectos


matemáticos contemporâneos visualmente mais conhecidos pelo grande público.
Richard F. Voss que também trabalhou temporariamente na IBM, apareceu quando
Mandelbrot estava a traduzir o livro Les objects fractals e criou um sistema gráfico
computacional inovador que permitiu criar imagens de fractais até então nunca vistas
e que foram publicadas no livro Fractals. Os gráficos com cor apareceram no livro
seguinte de Mandelbrot, Fractal Geometry of Nature, na edição de 1982. Trata-se de
un ensaio onde Mandelbrot coloca os fractais num sem número de contextos cientı́ficos.
Um pouco mais tarde aplicaram-se estes métodos e outros mais avançados à criação de
imagens de paisagens e de galáxias para filmes como os da saga Star Trek [5].
Benoit B.Mandelbrot, com o seu enorme e criativo trabalho introduziu o conceito
de geometria fractal e ao escrever variadı́ssimos artigos que lidam com a geometria
de fenómenos observados em vários campos da ciência, gerou um interesse sobre este
assunto que se foi alastrando[4, pág. 3].
A geometria fractal fomenta a interdisciplinaridade, começando nos próprios li-
vros de Mandelbrot que discutem árvores, rios, pulmões, linhas de água, turbulência,
economia, frequência de palavras num texto, e muitos outros tópicos interligados por
conceitos geométricos[4, pág. 3].

Os Conceitos de Fractal e de Dimensão Fractal

Durante séculos, os objectos e os conceitos da filosofia e da geometria euclidiana


foram considerados como os que melhor descreviam o mundo em que vivemos. No
entanto, outras geometrias não-euclidianas foram sendo descobertas e aplicadas à mo-
delação de certos fenómenos do Universo. O mesmo sucedeu com a geometria fractal
que pode ser aplicada a um quase sem número de objectos e de fenómenos naturais, de
fenómenos sociais, e ser ainda usada como fonte de inspiração para vários tipos de arte
e, de mão dada com a Teoria do Caos, permitir a modelação e o estudo de movimentos
ou fenómenos aparentemente totalmente aleatórios[4, pág. 3].
xxxii INTRODUÇÃO

A geometria euclidiana é aquela que é apresentada na escola a todas as crianças. Os


polı́gonos e os poliedros regulares fazem parte da história da Matemática como elemen-
tos que serviram de base para a compreensão da Natureza através da Matemática. As
criações humanas servem-se maioritariamente das formas geométricas euclidianas para
as suas construções. Edifı́cios, objectos industriais e do quotidiano podem, por norma,
ser modelados de modo aceitável por essas formas de limites “lisos” - paralelepı́pedos,
cilindros, quadriláteros, entre outros. Essas mesmas formas também serviram, durante
muito tempo, para modelar a Natureza. Em alguns casos continua a fazer sentido
utilizá-las. É o caso da esfera que serve perfeitamente como primeira aproximação de
modelo da forma da Terra, da elipse como modelo das órbitas celestes e da parábola
como trajectória de projécteis. No entanto, a maior parte das formas apresentadas pela
Natureza não são regulares nem suaves; pelo contrário, são extremamente complexas,
recortadas e irregulares. É o caso da grande parte das árvores e plantas (ramos, folhas,
tronco,...), das rochas, das nuvens, dos relâmpagos, etc. Só de uma maneira muito
tosca se poderá modelar formas deste tipo pela geometria euclidiana. A geometria
fractal, essa sim, fornece algoritmos para construção de formas idênticas às naturais e
também ferramentas para o estudo das mesmas.
Não há uma definição exacta e acabada de fractal. Inicialmente, Benoit Mandelbrot
apresentou, com relutância uma definição de fractal, reforçando que se tratava apenas
de uma tentativa de definição e, mais tarde, retirou essa definição[4, pág. 1-2].
Foi na obra The Fractal Geometry of Nature que definiu fractal como um conjunto
cuja dimensão de Hausdorff-Besicovitch é estritamente maior que a sua dimensão to-
pológica (A dimensão topológica de um conjunto é sempre um número inteiro e é 0
se for totalmente desconexo, 1 se cada um dos seus pontos possuir vizinhanças ar-
bitrariamente pequenas com fronteiras de dimensão 0, etc...) Esta definição, apesar
de correcta e precisa, revelou-se insatisfatória já que excluı́a alguns casos de conjun-
tos que deveriam ser considerados fractais. Outras tentativas de definir fractal foram
OS CONCEITOS DE FRACTAL E DE DIMENSÃO FRACTAL xxxiii

surgindo, mas todas pareciam ter o mesmo problema[2, pág. XX]. Mais tarde, Man-
delbrot propôs outra definição: Um fractal é uma forma composta de partes que de
algum modo são semelhantes ao todo[4, pág. 11]. Têm sido propostas várias outras
definições e, de facto, está-se diante de um conceito geométrico para o qual ainda não
existe uma definição precisa, nem uma teoria única e genericamente aceite[39].
Segundo a primeira definição, um quadrado não é um fractal. Mas se for visto
como o resultado de uma Curva de Peano (ver Exemplo 13, página 40), cuja dimensão
topológica é 1, já poderá ser considerado um fractal. Um objecto geométrico é tido
como um fractal se possuir pelo menos algumas das seguintes caracterı́sticas:

• Tem uma “estrutura fina”, isto é, contém detalhe a escala arbitrariamente
pequena e quanto mais se amplia a sua imagem, mais detalhes é possı́vel
observar.
• É demasiado irregular para poder descrever-se facilmente nos termos clássicos,
quer em termos globais quer ao nı́vel da sua geometria local, isto é, não se trata
do lugar de pontos que satisfaz uma determinada condição nem dos pontos
que representam o conjunto-solução de uma equação simples, sendo também
complicado descrever o que se passa à volta de cada um dos seus pontos.
• Possui algum tipo de auto-semelhança (exacta, aproximada ou estatı́stica), isto
é, contém cópias de si próprio a várias escalas. Um fractal auto-semelhante
“puro” contém cópias de si próprio a escalas tão pequenas quanto se queira.
Na Natureza, o intervalo de escalas a que o fractal se representa dentro de si
mesmo é limitado.
• Pode construir-se a partir de um processo muito simples e directo podendo
eventualmente obter-se através de um procedimento recursivo que gera, em
cada passo (iteração), uma melhor aproximação do fractal.
• As definições clássicas de medida (como a de Lebesgue, por exemplo), podem
não ser apropriadas para indicar o seu “tamanho”, e a sua dimensão fractal é
maior que a sua dimensão topológica.
xxxiv INTRODUÇÃO

Um fractal pode ter todas estas caracterı́sticas, ou apenas algumas. Pode ainda,
apresentar outras caracterı́sticas não mencionadas aqui mas que sejam de interesse.
De qualquer forma, qualquer fractal que se preze desse nome terá uma estrutura fina
com detalhes a qualquer escala, isto é, complexidade infinita, que permite ampliá-lo
infinitamente obtendo sempre “cópias” dele mesmo no seu interior. E esta aborda-
gem parece ser melhor do que optar por uma definição que possa excluir alguns casos
eventualmente interessantes.
Podem ser considerados vários tipos de auto-semelhança. Um fractal dir-se-á estri-
tamente auto-semelhante ou com auto-semelhança exacta quando for composto apenas
por reduções de si mesmo a várias escalas, como é o caso do Triângulo de Sierpinski
(ver Exemplo 1, página 21 e Exemplo 9, página 37). Um fractal dir-se-á auto-afim
ou com auto-semelhança aproximada quando for composto por várias contracções (ver
Definição 13, página 22) de si mesmo, como é o caso do feto do Exemplo 14, página 42.
Um fractal pode ainda ter uma auto-semelhança estatı́stica quando contiver dentro si,
a escalas tão pequenas quanto se queira, formas estatisticamente idênticas à sua forma
global. É o caso do fractal que se obtém com o mesmo processo da Curva de Koch
(ver Exemplo 40, página 122) acrescentando o facto de se sortear, em cada passo, o
lado para o qual se constrói a nova saliência da curva. Os fractais com este tipo de
auto-semelhança dizem-se aleatórios e não serão estudados neste trabalho.
Entretanto, nem todos os objectos auto-semelhantes são considerados fractais. A
recta real (uma linha recta Euclidiana), por exemplo, é exactamente auto-semelhante,
mas não tem uma estrutura fina, tı́pica de um fractal.
Não há fractais “puros” na Natureza, tal como nela também não existem esferas
perfeitas. Os fractais podem ser úteis para modelar objectos e fenómenos naturais,
desde a escala atómica (na turbulência de fluidos, por exemplo) até ao tamanho do
Universo (constituição de galáxias, por exemplo), porém, em cada caso, a sua auto-
semelhança não será repetida infinitamente, mas apenas num determinado intervalo de
escalas.
OS CONCEITOS DE FRACTAL E DE DIMENSÃO FRACTAL xxxv

Os fractais podem também ser divididos em várias categorias segundo o modo como
são formados ou gerados:

• Fractais definidos por uma relação de recorrência em cada ponto do espaço,


como é o caso do Conjunto de Mandelbrot.
• Fractais aleatórios, gerados por processos estocásticos ao invés de determinı́sticos.
• Ponto fixo de um sistema de funções iteradas: Um conjunto de funções é
aplicado sucessivamente, a um subconjunto compacto de um espaço métrico,
um número infinito de vezes.

Apenas este último tipo de fractais referido será tratado neste trabalho.
Uma das ferramentas importantes para o estudo e análise de conjuntos fractais é
a dimensão fractal. Existem várias definições que podem não gerar o mesmo valor
quando aplicadas ao mesmo conjunto e é necessário saber sempre, em cada momento,
com qual das definições se está a trabalhar.
O valor da dimensão é um indicador da quantidade de espaço que ocupa um deter-
minado conjunto. É uma medida das proeminências das irregularidades de um conjunto
quando observado a uma escala muito pequena. No Capı́tulo 2 serão tratadas duas das
mais utilizadas habitualmente: a dimensão de Hausdorff e a dimensão de contagem
de caixas. Quando não for relevante acerca de qual das duas se fala, dir-se-á dimensão
fractal.
Curiosamente, o conceito de dimensão de Haudorff foi apresentado muito antes dos
ditos “casos patológicos” constituı́dos por conjuntos hoje conhecidos como fractais, em
1918, pelo matemático alemão Felix Hausdorff (1868-1942)[48] e é útil como quantifi-
cador da dimensão de conjuntos muito irregulares em qualquer espaço métrico sendo,
por isso, uma das definições de dimensão fractal mais usadas. É muitas vezes dita di-
mensão de Hausdorff-Besicovitch por ter sido Besicovitch (1891-1970), um matemático
russo, a introduzir muitos desenvolvimentos técnicos que permitem a computação da
dimensão de Hausdorff em conjuntos muito irregulares[48].
xxxvi INTRODUÇÃO

A origem da dimensão de contagem de caixas não é fácil de determinar; parece ter


sido considerada primeiramente pelos pioneiros estudiosos da dimensão e da medida
de Hausdorff, mas terá sido inicialmente rejeitada por parecer menos satisfatória do
ponto de vista matemático.
A ideia de definir medida a partir de recobrimentos do conjunto, foi introduzida em
1914 pelo matemático grego Carathéodory (1873-1950).
Os fractais são conhecidos por terem habitualmente uma dimensão fractal não in-
teira. No entanto, há fractais com dimensão inteira e há conjuntos com dimensão fractal
não inteira que não deverão ser considerados fractais por não possuı́rem algumas das
propriedades tı́picas dos fractais.

A Estrutura deste Trabalho

Este trabalho é baseado em muitos documentos, mas os que fundamentam a maior


parte do seu conteúdo são os seguintes: No Capı́tulo 1, Fractals Everywhere de Mi-
chael Barnsley[1]; no Capı́tulo 2, Curso de Fı́sica-Matemática de João Barata[33],
Fractal Geometry - Mathmatical Foundations and Applications de Keneth Falconer[2]
e novamente Fractals Everywhere de Michael Barnsley[1]; no Capı́tulo 3, predominan-
temente os livros Fractals de Jens Feder[4] e Fractals in Biology and Medicine de T.
F.Nonnenmacher, G. A. Losa e E. R. Weibel[14] entre outros e, entre muitos textos
disponı́veis na internet, destaca-se o artigo Fractals in the Biological Sciences de N.C.
Kenkel e D.J. Walker[34] e o conteúdo do site A Panorama of Fractals and Their
Uses[40]; no Capı́tulo 4, para além da consulta aos vários programas oficiais para a
disciplina de Matemática, quer para o ensino básico, quer para o ensino secundário,
foram de grande importância os livros Fractals for the Classroom, Part One, Intro-
duction to Fractals and Chaos de Heinz-Otto Peitgen, Hartmut Jürgens e Dietmar
Saupe[10] bem como os três volumes de Fractals for the Classroom, Strategic Activi-
ties de Heinz-Otto Peitgen, Hartmut Jürgens, Dietmar Saupe, Evan Maletsky, Terence
Perciante e Lee Yunker[11][12][13] e ainda Fractals, A tool Kit of Dynamics Activi-
ties de Jonathan Choate, Robert Devaney e Alice Foster[9], Descobrindo a Geometria
A ESTRUTURA DESTE TRABALHO xxxvii

Fractal para a Sala de Aula de Ruy Madsen Barbosa[7], Fractais no Ensino Secundário
de Ana Paula Canavarro e Outros[21], Els Fractals - Introducció pràctica als fractals
IFS. Crèdit de Iliure elecció per a alumnes d’ESO um trabalho não editado de Oriol
OLIVÉ [30] e todo o conteúdo dos sites Fractal Geometry da responsabilidade de Mi-
chael Frame, Benoı̂t Mandelbrot e Nial Neger[41], Pattern Exploration: Integrating
Math and Science for the Middle School, um projecto para formação de professores do
Departamento de Ciências Matemáticas da Florida Atlantic University[43] e Patterns
in Nature, um projecto do Center for Polymer Studies da Universidade de Boston[42].
Dada a diversidade de notação de livro para livro, foi necessário proceder a escolhas
e a ajustes de modo a torná-la uniforme em todo este trabalho.
No Capı́tulo 1 é apresentado o conceito de fractal enquanto ponto fixo de um Sis-
tema de Funções Iteradas, com a devida apresentação dos elementos teóricos necessários
e a análise de alguns exemplos. No Capı́tulo 2, é apresentado o conceito de dimensão
fractal sendo estudadas duas das possı́veis definições de dimensão fractal - a dimensão
de Hausdorff e a dimensão de contagem de caixas. A primeira é feita a partir da
Construção de Medida de Carathéodory pelo que os conceitos matemáticos necessários
serão previamente apresentados, sendo também mostrados alguns exemplos ao longo
de todo o capı́tulo. O Capı́tulo 3 contém uma compilação de aplicações possı́veis da
geometria fractal e, sendo um capı́tulo ligeiro na medida em que os exemplos apresen-
tados não estão fundamentados teoricamente, tem interesse, para se poder perceber
a importância que esta geometria tem vindo a alcançar dada a sua enorme utilidade
e aplicabilidade nas mais variadas áreas do conhecimento. Finalmente, o Capı́tulo 4
contém um conjunto de propostas de actividades para realizar com os alunos do ensino
não universitário quer na aula de Matemática, quer noutros ambientes mais abertos
como é o caso do da disciplina de Área de Projecto. A ideia inicial era a de encontrar
propostas de actividades que utilizassem os fractais como meio de estudo de vários
conceitos matemáticos, já que isso é possı́vel, dada a grande conexão que existe entre
xxxviii INTRODUÇÃO

a geometria fractal e diversos tópicos da matemática. Essas actividades estariam per-


feitamente enquadradas nos programas actuais. No entanto, o interesse pela geometria
fractal em si falou mais alto. Com o desenrolar deste trabalho, a geometria fractal dei-
xou de ser apenas um meio que eu poderia utilizar para estudar com os alunos outros
tópicos da matemática de forma mais apelativa, para passar a ser o objecto principal
de estudo. E o que aqui se apresenta é um conjunto de actividades que, fazendo a ponte
com muitos conteúdos programáticos dos programas oficiais de matemática pretende,
acima de tudo, explicar o conceito de fractal, estudar algumas das suas propriedades e
revelar a sua importância para o mundo actual.
CAPı́TULO 1

Fractais definidos por Sistemas de Funções Iteradas

1
2 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS
1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 3

O conceito de fractal é simples e, no entanto, não é fácil defini-lo de modo formal;


dir-se-á até que se trata de uma ideia que se torna mais útil quando entendida de
forma abrangente através das muitas imagens e contextos que a ele se referem. Neste
capı́tulo ver-se-á como pode definir-se um fractal através de um sistema de funções
iteradas. Fractais deste tipo são a reunião de várias partes que são, de alguma forma,
semelhantes ao todo. Por exemplo, o Conjunto de Cantor (um dos fractais clássicos
mais famosos), como se verá (na página 38), é a reunião de duas cópias reduzidas de
si mesmo e tem, por isso, auto-semelhança exacta.
Esta propriedade da auto-semelhança, para além de ser uma das caracterı́sticas dos
fractais, pode também ser usada para os definir. Será esse o assunto principal deste
capı́tulo. Demonstrar-se-á que aplicando a um conjunto, em simultâneo e sucessivas
vezes, uma famı́lia de transformações que o contraem (chamada Sistema de Funções
Iteradas - SFI), obter-se-á, após a repetição deste processo infinitas vezes, um conjunto
que é único e que pode ter as caracterı́sticas de um fractal. Será interessante reparar em
como um pequeno número de aplicações pode definir um conjunto com uma estrutura
altamente intrincada.
Para a definição de um SFI será necessário introduzir previamente os conceitos de
métrica, de espaço métrico, de métrica de Hausdorff, de contracção e de ponto fixo.
Para além destes, todos os outros conceitos matemáticos necessários serão também
apresentados oportunamente.
Serão também dados exemplos dos diversos conceitos que irão sendo apresentados e
construir-se-ão alguns fractais (melhor dito, aproximações de fractais), quer recorrendo
a SFI simples, quer a SFI com condensação.
A última parte do capı́tulo é dedicada ao Teorema da Colagem que indica o grau de
aproximação entre o fractal produzido por um SFI e um objecto previamente escolhido,
que se pretenda modelar com esse SFI.
4 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Os fractais definidos por sistemas de funções iteradas constituem apenas uma pe-
quena classe dos fractais, mas esta forma de construir fractais é muito útil para traba-
lhar o conceito de fractal com os alunos dos ensinos básico e secundário porque, por um
lado é simples de entender e, por outro, pode interligar muitos conceitos matemáticos.
No Capı́tulo 4 serão apresentadas algumas propostas de actividades para a sala de
aula, em que se utilizam sistemas de funções iteradas, e onde se poderá notar a grande
conexão entre este tópico e um vasto leque de conceitos matemáticos. Além disso, o
facto de se conseguirem desenhar fractais, recorrendo a SFI’s, que se assemelham a
objectos naturais (como folhas e plantas, por exemplo) é, não só muito interessante,
como pode ser o mote para um conjunto alargado de actividades com fractais de ı́ndole
multi e interdisciplinar.
Para principiar, pode dizer-se que um Fractal é um subconjunto “complicado”de
um espaço métrico “simples”, tal como R, R2 , [0, 1], C e Ĉ, entre outros. Teoricamente,
qualquer espaço métrico, desde que completo, serve para construir um fractal, mas na
prática interessam aqueles que facilmente se podem representar graficamente, como é
o caso de R, R2 , C e Ĉ e seus subespaços.
Essa forma ”complicada”pode obter-se como resultado de um sistema de funções
iteradas (SFI). Segundo a abordagem que se apresenta de seguida: Um Fractal é o ponto
fixo de um sistema de funções iteradas num espaço métrico munido de uma métrica
de Hausdorff. De seguida, explicar-se-ão todos os aspectos necessários à compreensão
desta definição, a saber:

• O que é um espaço métrico;


• O que é um espaço métrico munido de uma métrica de Hausdorff;
• O que é um sistema de funções iteradas;
• O que é um ponto fixo de um sistema de funções iteradas.
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 5

1. Conceito de espaço métrico

Qualquer conjunto X pode ser encarado como um espaço, em que os seus elementos
são os “pontos” desse espaço. Para se obter um espaço métrico, é necessário definir em
X uma métrica que é uma aplicação d : X × X → R com as seguintes propriedades:

• d(x, y) = d(y, x), ∀x, y ∈ X;


• 0 < d(x, y) < ∞, ∀x, y ∈ X, x 6= y;
• d(x, x) = 0, ∀x ∈ X;
• d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y), ∀x, y, z ∈ X.

Tendo uma aplicação deste tipo definida em X, diz-se que X, juntamente com essa
aplicação formam um espaço métrico (e. m.) que se designa por (X, d).

2. Conceito de espaço métrico com métrica de Hausdorff

Antes de se construir a métrica de Hausdorff é necessário introduzir alguns concei-


tos, o que se fará de imediato.

Definição 1. Seja (X, d) um espaço métrico. Diz-se que X é completo se para


cada sucessão de Cauchy {xn }∞
n=1 de elementos X, existe x ∈ X tal que xn → x .

Definição 2. Seja (X, d) um espaço métrico e A um subconjunto de X. Diz-se


que A é compacto se toda a sucessão de elementos de A admite pelo menos uma
subsucessão com limite em A.

Assim, dado um e.m. completo (X, d), designe-se por H(X ) o espaço cujos
pontos são os subconjuntos compactos e não vazios de X. E agora define-se uma
métrica em H(X ).
Sendo (X, d) um e.m. completo, x um elemento de X e A e B elementos de H(X ),
definir-se-á a métrica de Hausdorff, percorrendo as seguintes etapas:

(1) Definição de distância de x a A;


(2) Definição de distância de A a B;
(3) Definição de uma métrica em H(X ).
6 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Faça-se agora, então, esse percurso.

Definição 3. Seja (X, d) um e.m., A ∈ H(X ) e x um ponto de X. A distância


do ponto x ao subconjunto compacto A é dada por d(x, A) = min{d(x, a) : a ∈ A}.

Figura 1.1. Distância de um ponto x a um conjunto compacto A.

É necessário verificar que a distância de x a A está bem definida desta forma,


isto é, que o conjunto {d(x, a) : a ∈ A} tem mı́nimo. Sabe-se, desde já, que esse
conjunto é não vazio porque A, sendo um elemento de H(X ), também é não vazio. Para
chegar à conclusão pretendida será necessário introduzir previamente uma definição e
demonstrar duas proposições.

Definição 4. Seja S ⊂ R diz-se que o ı́nfimo de S é −∞ se S contém números


tão arbitrariamente grandes negativos quanto se queira. Caso contrário, diz-se que o
ı́nfimo de S = max{x ∈ R : x ≤ s, ∀s ∈ S} e denota-se o ı́nfimo de S por inf S.

De seguida, define-se em X a função distância a um ponto e verifica-se a sua con-


tinuidade.

Proposição 1. Seja X um e.m. e seja x ∈ X. Considere-se a aplicação

dx : X → R

y → d(y, x).

Então, dx (y) é uma função contı́nua.


2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 7

Demonstração. Sabe-se, pela propriedade da desigualdade triangular, que para


quaisquer elementos y, z e x de X se tem d(y, x) ≤ d(y, z) + d(z, x) donde, d(y, x) −
d(z, x) ≤ d(y, z). Invertendo os papéis de y e de z também se pode escrever que
d(z, x) − d(y, x) ≤ d(z, y) = d(y, z). Então, |d(y, x) − d(z, x)| ≤ d(y, z), para quaisquer
elementos x, y e z de X, o que permite concluir que dx (y) é uma função contı́nua
porque para cada valor δ > 0, existe ε > 0 tal que d(y, z) < ε ⇒ |dx (y) − dx (z)| < δ,
bastando para tal escolher ε = δ . 

Proposição 2. Seja (X, d) um e.m. completo, seja x ∈ X seja A ∈ H(X ). Então


o conjunto {d(x, y) : y ∈ A} tem mı́nimo.

Demonstração. Seja P = inf{d(x, y) : y ∈ A}. P é finito porque A é compacto


e a distância entre dois pontos de um e.m. é sempre não negativa. Quer-se mostrar
que existe a ∈ A tal que P = d(x, a).
Considere-se a função dx (y) definida na proposição anterior. Seja {yn }∞
n=1 uma

1
sucessão de elementos de A tal que d(x, yn ) − P ≤ n
, ∀n ∈ N. Desta forma, dx (yn )
tende para P quando n tende para infinito.
Sendo A um conjunto compacto, sabe-se que {yn }∞
n=1 admite uma subsucessão

{yNi }∞
i=1 em que N1 < N2 < N3 < . . ., com limite a ∈ A. Como dx (y) é uma função

contı́nua, então {dx (yNi )}∞ ∞


i=1 será uma subsucessão de {dx (yn )}n=1 , convergente para

dx (a). Mas, se dx (yn ) tende para P , o mesmo acontecerá com qualquer sua subsucessão,
donde P = dx (a) e, portanto, o conjunto {d(x, y) : y ∈ A} tem mı́nimo. 

É possı́vel agora prosseguir o caminho rumo à definição da métrica de Hausdorff.

Definição 5. Seja (X, d) um e.m. e A e B dois subconjuntos compactos de X. A


distância de A a B é dada por d(A, B) = max {d(a, B) : a ∈ A}.

Pelo mesmo argumento usado antes, é sabido que existe pelo menos um elemento
a de A e pelo menos um elemento b de B tais que d(A, B) = d(a, b).
8 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.2. Distância de A a B.

Como facilmente se pode ver, esta definição de distância entre os subconjuntos A


e B de X não pode ser encarada como uma métrica em H(X ) pois, em geral, não se
tem d(A, B) = d(B, A).

Figura 1.3. Distância de A a B e distância de B a A.

Definição 6. Sendo (X, d) um e.m. completo e dados A, B ∈ H(X ), a distância


de Hausdorff entre A e B é dada por h(A, B) = max {d(A, B), d(B, A)}.

Proposição 3. Seja (X, d) um e.m. completo e A e B dois elementos de H(X ).


Então a distância de Hausdorff dada por h(A, B) = max {d(A, B), d(B, A)} é uma
métrica em H(X ).

Demonstração. A propriedade da simetria resulta imediatamente da definição:


para quaisquer dois elementos A e B de H(X ), h(A, B) = max {d(A, B), d(B, A)} =
max {d(B, A), d(A, B)} = h(B, A).
Veja-se agora que, sendo A e B elementos de H(X ) com A 6= B, então h(A, B) é
um número real positivo. Existem pelo menos um elemento a de A e um elemento b
de B tais que d(A, B) = d(a, b). Como d é uma métrica em X, então 0 ≤ d(a, b) < ∞
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 9

e, consequentemente, 0 ≤ d(A, B) < ∞ e, de forma análoga, 0 ≤ d(B, A) < ∞ , donde


0 ≤ h(A, B) < ∞, quaisquer que sejam A e B de H(X ).
Mas, se A 6= B, então pode dizer-se sem perda de generalidade que existe pelo
menos um elemento a de A que não pertence a B, e portanto d(a, B) é positiva, o
mesmo acontecendo com d(A, B), que é limitada inferiormente por d(a, B). Assim,
0 < h(A, B) < ∞.
A terceira propriedade a demonstrar é que para qualquer elemento A de H(X ) se
tem h(A, A) = 0. Ora,

h(A, A) = max {d(A, A), d(A, A)} = d(A, A) =

= max {d(a, A) : a ∈ A)} =

= max {min {d(a, a0 ) : a0 A} : a ∈ A} = 0

porque a distância entre dois pontos distintos é sempre positiva e d(a, a) = 0.


Finalmente há que demonstrar a desigualdade triangular, ou seja, que para quais-
quer elementos A, B e C de H(X ) se tem h(A, B) ≤ h(A, C) + h(C, B). Sejam, então,
A, B e C elementos de H(X ). Verifique-se primeiro que d(A, B) ≤ d(A, C) + d(C, B),
quaisquer que sejam A, B, C ∈ H(X ). Como A, B e C são compactos e não vazios,
sabe-se que: existem os pontos a de A e b de B, tais que d(A, B) = d(a, b); da mesma
forma, existem os pontos a0 de A e c de C, tais que d(A, C) = d(a0 , c); e ainda, existem
os pontos b0 de B e c0 de C, tais que d(C, B) = d(c0 , b0 ). Por outro lado, tem-se que a
distância de A a C dada por d(a0 , c) é maior ou igual que a distância de qualquer outro
elemento de A a C; em particular,

d(A, C) ≥ d(a, C). (1.1)

Analogamente, a distância de C a B dada por d(c0 , b0 ) é maior ou igual que a distância


de qualquer outro elemento de C a B; em particular

d(C, B) ≥ d(c00 , B) (1.2)


10 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

onde c00 ∈ C é tal que d(a, C) = d(a, c00 ). Considere-se também b00 ∈ B tal que d(c00 , B) =
d(c00 , b00 ).

Figura 1.4. Distância de pontos ”estratégicos”aos conjuntos A, B e C.

Então, de (1.1) e (1.2) vem: d(A, C) + d(C, B) ≥ d(a, C) + d(c00 , B) = d(a, c00 ) +
d(c00 , b00 ) ≥ d(a, b00 ) pela propriedade da desigualdade triangular da métrica d. Por
outro lado, d(a, b00 ) ≥ min {d(a, y) : y ∈ B} = d(a, b) = d(A, B). Portanto, d(A, B) ≤
d(A, C) + d(C, B), quaisquer que sejam A, B, C ∈ H(X ). Pela arbitrariedade de A, B
e C, também pode escrever-se que d(B, A) ≤ d(B, C) + d(C, A). Destas duas últimas
desigualdades obtém-se que

h(A, B) = max {d(A, B), d(B, A)} ≤ max {d(A, C) + d(C, B), d(B, C) + d(C, A)}.

De quaisquer duas parcelas, uma de cada soma, escolha-se a maior. Somando essas
duas parcelas maiores, obtém-se uma soma que é maior ou igual a qualquer das duas
somas anteriores. Então,
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 11

max {d(A, C) + d(C, B), d(B, C) + d(C, A)} ≤

≤ max {d(A, C), d(C, A)} + max {d(C, B), d(B, C)} =

=h(A, C) + h(C, B).

Assim, h(A, B) ≤ h(A, C) + h(C, B), para quaisquer elementos A, B e C de H(X ),


pelo que a desigualdade triangular fica demonstrada.
Conclui-se, portanto, que a distância de Hausdorff é uma métrica em H(X ). 

Então, dado um e. m. completo (X, d) existe, associado a este, um novo


e.m. com métrica de Hausdorff, que passará a ser representado por (H(X ), h(d)).

De seguida, pretende-se demonstrar que o e.m. (H(X ), h(d)) agora definido é com-
pleto. Para isso é necessário introduzir algumas definições e demonstrar alguns resul-
tados prévios.

Definição 7. Seja (X, d) um e.m., A um subconjunto não vazio de X e ε ≥ 0.


A A + ε = {y ∈ X : d(y, x) ≤ ε para algum x ∈ A} chama-se dilatação de
A por uma bola de raio ε.

Definição 8. Seja A ⊂ X um subconjunto do e.m. (X, d). Um ponto x ∈ X diz-se


ponto de acumulação de A se existe uma sucessão {xn }∞
n=1 de pontos pertencentes

a A\{a} tal que lim xn = x.


n→∞

Definição 9. Seja A ⊂ X um subconjunto do e.m. (X, d). Designa-se por


aderência de A o conjunto ad(A) = A ∪ {pontos de acumulação de A}.

Definição 10. Seja A ⊂ X um subconjunto do e.m. (X, d). Diz-se que A é um


conjunto fechado se se tiver ad(A) = A.

Será útil, para mais à frente, demonstrar agora o seguinte:

Proposição 4. Seja (X, d) um e.m. e A um subconjunto não vazio de X. Se A é


fechado, então A + ε também é fechado.
12 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Demonstração. Uma vez que para um subconjunto arbitrário de X se tem sem-


pre que ele está contido na sua aderência, para comprovar que A + ε é fechado basta
verificar que ad(A + ε) ⊂ A + ε, ou seja, que todos os pontos de acumulação de A + ε
pertencem a A + ε.
Seja, então, a um ponto de ad(A + ε). Sabe-se que existe uma sucessão {xn }∞
n=1

de pontos de A + ε \ {a} tal que lim xn = a. Como A é fechado, vem que para cada
n→∞

xn existe yn ∈ A tal que d(xn , yn ) = d(xn , A). Então, aplicando a propriedade da


desigualdade triangular de d, vem d(a, yn ) ≤ d(a, xn ) + d(xn , yn ), para todo n ∈ N,
sendo que a primeira parcela do segundo membro tende para zero quando n tende
para infinito e a segunda é sempre menor ou igual a ε porque todos os termos xn são
elementos de A + ε. Donde, existe pelo menos um ponto yn de A que dista de a tanto
ou menos que ε. Então, a ∈ A + ε, logo A + ε é um conjunto fechado. 

Lema 1. Sejam A, B ∈ H(X ), em que (X, d) é um e.m. completo, e seja ε > 0.


Então, h(A, B) ≤ ε se e só se A ⊂ B + ε ∧ B ⊂ A + ε .

Demonstração. Prove-se primeiro que, se h(A, B) ≤ ε, então A ⊂ B + ε ∧ B ⊂


A + ε. Para isso, suponha-se, sem perda de generalidade, que h(A, B) = d(A, B) ≤ ε.
Então, como d(A, B) = max{d(a, B) : a ∈ A}, vem que d(a, B) ≤ ε, qualquer que seja
a pertencente a A, ou seja, qualquer elemento a de A pertence a B + ε e, portanto,
A ⊂ B + ε. Se h(A, B) = d(A, B) ≤ ε então, por definição de h(A, B), vem d(B, A) ≤
d(A, B) ≤ ε e, analogamente, tem-se também B ⊂ A + ε.
Demonstre-se agora que, se A ⊂ B +ε e B ⊂ A+ε, então h(A, B) ≤ ε. Se A ⊂ B +ε
então, para qualquer elemento a de A, existe pelo menos um elemento b de B tal que
d(a, b) ≤ ε, isto é, d(a, B) ≤ ε. Portanto, max{d(a, B) : a ∈ A} = d(A, B) ≤ ε, donde
d(A, B) ≤ ε.
De forma semelhante, se B ⊂ A + ε, então d(B, A) ≤ ε.
Ora, se d(A, B) ≤ ε e d(B, A) ≤ ε então, max{d(A, B), d(B, A)} ≤ ε, ou seja,
h(A, B) ≤ ε. 
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 13

Lema 2 (Lema da Extensão). Seja (X, d) um e.m. completo e seja {An }∞


n=1 uma

sucessão de Cauchy de pontos em (H(X ), h(d)). Seja {nj }∞


j=1 , uma sucessão infinita de

inteiros tais que 0 < n1 < n2 < n3 < . . . . Supondo que existe uma sucessão de Cauchy
{xnj ∈ Anj }∞ xn ∈ An }∞
j=1 em (X, d), então existe também uma sucessão de Cauchy {e n=1

enj = xnj , ∀j = 1, 2, 3, . . . .
tal que x

xn ∈ An }∞
Demonstração. Comece-se pela construção de uma sucessão {e n=1 . Para

todo n ∈ {1, 2, . . . , n1 } escolhe-se x


en ∈ {x ∈ An : d(xn1 , x) = d(xn1 , An )}, ou seja, x
en é
o ponto mais próximo (ou um dos pontos mais próximos) em An de xn1 . Esse ponto
existe porque An é compacto.
Analogamente, para todo j ∈ {1, 2, 3, 4 . . .} e todo n ∈ {nj +1, . . . , nj+1 }, escolha-se
en ∈ {x ∈ An : d(xnj+1 , x) = d(xnj+1 , An )}.
x
xn } ∞
Mostre-se agora que {e n=1 tem as propriedades desejadas.

enj = xnj , para qualquer j ∈ N, porque o ponto de Anj


Obviamente, por construção, x
en ∈ An , para todo n ∈ N. Para
mais próximo de xnj é o próprio xnj ; e também se tem x
mostrar que se trata de uma sucessão de Cauchy, considere-se ε > 0. Existe uma ordem
N1 ∈ N a partir da qual, para quaisquer dois termos nk , nj se tem d(xnk , xnj ) ≤ ε/3
(porque, por hipótese, {xnj }∞
j=1 é uma sucessão de Cauchy). Também existe uma ordem

N2 ∈ N a partir da qual, para quaisquer dois termos Am e An da sucessão {An }∞


n=1

se tem d(Am , An ) ≤ ε/3 (porque, também por hipótese, {An }∞


n=1 é uma sucessão de

Cauchy). Seja, N = max{N1 , N2 } e sejam m, n, nj , nk ≥ N , com m ∈ {nj−1 + 1, nj−1 +


2, . . . , nj } e n ∈ {nk−1 + 1, nk−1 + 2, . . . , nk }. Aplicando duas vezes a propriedade
da desigualdade triangular vem que d(e en ) ≤ d(e
xm , x xm , x
enj ) + d(e
xnj , x
enk ) + d(e
xnk , x
en ).
Como h(Am , Anj ) < ε/3, então, pelo lema 1, Am ⊂ Anj + ε/3 e Anj ⊂ Am + ε/3. Sendo
enj = xnj ∈ Anj , então existe ym ∈ Am tal que d(ym , x
x enj ) ≤ ε/3. Como x
em é, por
construção, o ponto de Am mais próximo de x
enj , então d(e enj ) ≤ ε/3. Analogamente,
xm , x
d(e en ) ≤ ε/3. Logo, para quaisquer dois termos de ordem m e n superior a N da
xnk , x
xn } ∞
sucessão {e n=1 , tem-se d(e xn } ∞
en ) ≤ ε/3 + ε/3 + ε/3 = ε, donde {e
xm , x n=1 é sucessão

de Cauchy. 
14 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Definição 11. Seja X um e.m. e seja S ⊂ X. Diz-se que S é totalmente


limitado se para qualquer ε > 0, existe um conjunto finito de pontos {y1 , y2 , . . . , yn } ⊂
S tal que ∀x ∈ S, ∃yi : d(x, yi ) < ε. Ao conjunto {y1 , y2 , . . . , yn } chamamos rede-ε .

Lema 3. Seja X um e.m. e seja S ⊂ X. Se S não é totalmente limitado, então


existe ε > 0 e uma sucessão {xn }∞
n=1 de pontos de S tal que d(xi , xj ) > ε, sempre que

i 6= j.

Demonstração. Se S não é totalmente limitado, existe ε > 0 para o qual não


há uma rede-ε finita de S, isto é, não é possı́vel cobrir S com uma colecção finita de
bolas de raio ε. Seja x1 ∈ S e seja B1 a bola de centro em x1 e de raio ε. Como B1
não cobre S, pode escolher-se x2 ∈ S \ B1 e sabe-se que d(x1 , x2 ) > ε. Seja B2 a bola
de centro em x2 e de raio ε. Como B1 ∪ B2 não cobre S, então existe x3 ∈ S \ B1 ∪ B2
tal que d(x1 , x3 ) > ε e d(x2 , x3 ) > ε. Seja B3 a bola de raio ε com centro em x3 .
S3
Como B1 ∪ B2 ∪ B3 não cobre S, então seja x4 um ponto de S \ Bi . Sabe-se que
i=1
d(xi , x4 ) > ε, para i ∈ {1, 2, 3}.
E desta forma determina-se um conjunto {x1 , x2 , . . . , xk } de k elementos de S, tais
que d(xi , xj ) > ε, para quaisquer i, j ∈ {1, 2, . . . , k} desde que i 6= j. Como, por
k
S
hipótese, Bk (sendo Bk a bola de raio ε com centro em xk ) não cobre S, pode
i=1
k
S
encontrar-se um elemento xk+1 ∈ S \ Bk tal que d(xi , xk+1 ) > ε, para qualquer
i=1
i ∈ {1, 2, . . . , k}. Por indução matemática é possı́vel construir a pretendida sucessão
infinita de pontos de S. 

Teorema 1. Seja (X, d) um e.m. completo e seja S ⊂ X. Então, S é compacto se


e só se for fechado e totalmente limitado.

Demonstração. Suponha-se primeiro que S é fechado e totalmente limitado e


prove-se que S é compacto.
Seja {xn ∈ S}∞
n=1 , uma sucessão de pontos de S. Como S é totalmente limitado,

pode encontrar-se uma colecção finita de bolas de raio 1 cuja reunião contém S. Sendo
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 15

a sucessão infinita, pelo menos uma das bolas da colecção - designe-se por B1 - contém
uma quantidade infinita de termos.
Seja N1 ∈ N tal que xN1 ∈ B1 . Sabe-se que B1 ∩S é totalmente limitado porque está
contido em S que também é um conjunto totalmente limitado, por hipótese. Então é
possı́vel cobrir B1 ∩S com uma famı́lia finita de bolas de raio 21 . Novamente, uma dessas
bolas - designada por B2 - contém uma quantidade infinita de termos de {xn }∞
n=1 .

Seja N2 ∈ N tal que N2 > N1 e xN2 ∈ B2 . Continuando desta forma, constrói-se


uma sucessão de bolas {Bn }∞
n=1 tal que para qualquer n ∈ N, Bn tem raio
1
2n−1
e
(B1 ∩ S) ⊃ (B2 ∩ S) ⊃ (B3 ∩ S) ⊃ . . . ⊃ (Bn ∩ S) ⊃ . . . e obtém-se também uma
sucessão de inteiros {Nn }∞
n=1 tal que xNn ∈ Bn .

Verifique-se que {xNn }∞ ∞


n=1 (que é uma subsucessão da sucessão original {xn }n=1 ,) é

1
uma sucessão de Cauchy. Seja ε > 0. Se se escolher k ∈ N tal que 2k−1
≤ 2ε , (ou seja,
k ≥ 2 − log2 ε), sabe-se que para todo n ≥ k, os termos xNn pertencem à bola Bk , cujo
1
raio é igual a 2k−1
e inferior ou igual a 2ε , pelo que a distância entre quaisquer dois
termos xNn e xNm tais que n, m ≥ k é inferior ou igual a ε. Então, {xNn }∞
n=1 é uma

sucessão de Cauchy e, portanto, convergente, de elementos de S. Como, por hipótese,


S é fechado, o limite desta sucessão pertence a S, pelo que S é compacto.
Demonstre-se agora o recı́proco. Suponha-se que S é compacto. Para provar que
S é totalmente limitado, suponha-se que para determinado ε > 0 não existe uma rede-
ε para S. Então, pelo lema 3, poder-se-ia construir uma sucessão infinita de pontos
{xn ∈ S} tal que

d(xi , xj ) > ε, (1.3)

sempre que i 6= j. Mas como, por hipótese, S é compacto, esta sucessão terá que
ter uma subsucessão {xNi }∞
i=1 convergente e, portanto, de Cauchy. Então é possı́vel

encontrar inteiros Ni e Nj , com Ni 6= Nj , tais que d(xNi , xNj ) < ε, o que contradiz
(1.3). Portanto, terá que existir uma rede-ε para S e S é totalmente limitado.
Prove-se agora que S é fechado. Seja a ∈ ad(S). Então existe uma sucessão {yn }∞
n=1

de pontos de S \ {a} tal que lim yn = a. Como S é compacto, então {yn }∞


n=1 tem uma
n
16 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

subsucessão convergente em S, cujo limite tem que ser a. Então, a ∈ S. Portanto


ad(S) ⊂ S, ou seja, S é fechado. 

Teorema 2 (Completude do Espaço dos Fractais). Seja (X, d) um e.m. completo.


Então (H(X ), h(d)) é um e.m. completo. Além disso, se {An }∞
n=1 é uma sucessão

de Cauchy em H(X ), então A = lim An ∈ H(X ), sendo A = {x ∈ X : existe uma


n→∞

sucessão de Cauchy {xn ∈ An } que converge para x}.

Demonstração. Seja {An }∞


n=1 uma sucessão de Cauchy em H(X ) e seja A o

conjunto definido no enunciado do Teorema.


Esta demonstração será repartida nas seguintes partes:

a) A 6= ∅.
b) A é fechado.
c) ∀ε > 0, ∃N ∈ N : ∀n ≥ N, A ⊂ An + ε.
d) A é totalmente limitado (e portanto, por b) e pelo Teorema 1, também será
compacto - ou seja, A ∈ H(X )).
e) lim An = A.

Provar-se-á a) mostrando que existe de uma sucessão de Cauchy {ai ∈ Ai }∞


i=1 em

X. Ora, sendo {An }∞ n=1 uma sucessão de Cauchy em H(X ), pode considerar-se uma
1
sucessão de inteiros positivos N1 < N2 < N3 < . . . < Nn < . . . tal que h(Am , An ) < i ,
2
1
para m, n > Ni . De AN1 escolhe-se um elemento xN1 . Como h(AN1 , AN2 ) ≤ , pode
2
1
encontrar-se xN2 ∈ AN2 tal que d(xN1 , xN2 ) ≤ . Pode prosseguir-se este processo
2
até ser seleccionada uma sequência finita xNi ∈ ANi , i = 1, 2, . . . , k, para a qual
1 1
d(xNi−1 , xNi ) ≤ i−1 . Novamente, como h(ANk , ANk+1 ) < k e xNk ∈ ANk , pode
2 2
1
encontrar-se xNk+1 ∈ ANk+1 tal que d(xNk , xNk+1 ) ≤ k - basta que xNk+1 seja um dos
2
pontos de ANk+1 mais próximos de xNk . Por indução matemática, pode encontrar-se
1
uma sucessão infinita {xNi ∈ ANi }∞ i=1 tal que d(xNi , xNi+1 ) ≤ i .
2

Veja-se agora que {xNi }i=1 é uma sucessão de Cauchy em X. Seja ε > 0 e escolha-se
P∞ 1
Nε ∈ N tal que i
< ε. Então, sempre que n > m ≥ Nε tem-se d(xNm , xNn ) ≤
i=Nε 2
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 17


P P∞ 1
d(xNm , xNm+1 )+d(xNm+1 , xNm+2 )+· · ·+d(xNn−1 , xNn ) < d(xNi , xNi+1 ) =
i
< ε,
i=Nε i=Nε 2
o que quer dizer que para qualquer ε > 0 existe uma ordem Nε a partir da qual a
distância entre quaisquer dois termos xNm e xNn desta sucessão é inferior a ε, ou seja,
{xNi }∞
i=1 é uma sucessão de Cauchy. Usando agora o Lema da Extensão (Lema 2), pode

afirmar-se que também existe uma sucessão de Cauchy {ai ∈ Ai }∞


i=1 tal que aNi = xNi

cujo limite existe e que, por definição de A, será um elemento de A. Fica então provado
que A é um conjunto não vazio.
Para demonstrar b), considere-se uma sucessão {ai }∞
i=1 de elementos de A conver-

gente para um ponto a. Para provar que A é fechado basta mostrar que a ∈ A, isto é,
que existe uma sucessão de Cauchy {zn ∈ An }∞
n=1 que converge para a. Por definição do

conjunto A, sabe-se que para qualquer termo da sucessão {ai }∞


i=1 existe uma sucessão

{xi,n ∈ An }∞ ∞
n=1 tal que lim xi,n = ai . Como {ai ∈ A}i=1 é uma sucessão convergente
n

para a, podem escolher-se nela termos tão próximos de a quanto se queira. Por exem-
1
plo, existe uma sucessão crescente de números positivos {Ni }∞i=1 tal que d(aNi , a) ≤ .
i

Olhando agora para o conjunto das sucessões {xNi ,n ∈ An }n=1 sabe-se que existe
1
em cada uma delas uma sucessão de inteiros {mi }∞i=1 tal que d(xNi ,mi , aNi ) ≤ porque
i
{xNi ,n ∈ An }∞
n=1 converge para aNi . Donde, d(xNi ,mi , a) ≤ d(xNi ,mi , aNi ) + d(aNi , a) ≤
1 1 2
+ = .
i i i
Designando xNi ,mi por ymi obtém-se uma sucessão {ymi ∈ Ami }∞ i=1 tal que para

todo ε > 0, existe uma ordem i ∈ N a partir da qual d(ymi , a) < ε, bastando para isso
2
escolher i ≥ . Então, {ymi ∈ Ami }∞
i=1 é uma sucessão convergente e lim ymi = a.
ε i→∞

Para se obter uma sucessão de Cauchy, que converge para a, nas condições exigidas
pela definição do conjunto A, basta usar novamente o Lema da Extensão (lema 2), que
diz que é possı́vel encontrar uma sucessão {zn ∈ An }∞
n=1 tal que zmi = ymi , convergente

para a. Portanto, a ∈ A donde A é fechado.


Demonstre-se agora c). Dado ε > 0, sabe-se que existe uma ordem N a partir da
qual quaisquer dois termos Am e An da sucessão {An }∞
n=1 estão a uma distância de

Hausdorff inferior ou igual a ε. Pelo lema 1, de h(Am , An ) < ε vem que Am ⊂ An + ε


18 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.5. Dada uma sucessão {ai }∞


i=1 de elementos de A convergente para

um ponto a, a imagem representa a construção de uma sucessão de Cauchy

{zn ∈ An }∞
n=1 a convergir para a. Esta sucessão é construı́da a partir da

sucessão {ymi ∈ Ami }∞


i=1 usando o Lema da Extensão que diz que é possı́vel

encontrar uma sucessão {zn ∈ An }∞


n=1 tal que zmi = ymi .

e An ⊂ Am + ε. Em particular, pode considerar-se m ≥ n ≥ N e, tendo Am ⊂ An + ε,


quer-se demonstrar que também A ⊂ An + ε. Para isso, tome-se um elemento a de A.
Por definição deste conjunto, existe uma sucessão {ai ∈ Ai } que converge para a. Pode
considerar-se que N é também suficientemente grande para que se tenha d(am , a) < ε
para m ≥ N . Então, para todo m ≥ N vem que am pertence a Am que, por sua vez,
está contido em An + ε, pelo que se tem em An + ε uma sucessão que tende para a.
Como An é compacto, e portanto fechado, então, pela proposição 4, An + ε também é
fechado e, desta forma, a tem que estar também em An + ε, ou seja, A ⊂ An + ε.
Para demonstrar d) recorrer-se-á ao método de redução ao absurdo, supondo que
A não é totalmente limitado. Nesse caso, para um certo ε > 0 não existe uma rede-ε
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 19

finita, pelo que, pelo lema 3, seria possı́vel encontrar uma sucessão {xi }∞
i=1 em A tal

que

d(xi , xj ) ≥ ε, i 6= j. (1.4)

Mas, pela alı́nea c) desta demonstração, existe n suficientemente grande tal que
A ⊂ An + ε/3 o que significa que, para cada xi ∈ A, existe yi correspondente em An
para o qual

d(xi , yi ) ≤ ε/3. (1.5)

Considere-se a sucessão {yi }∞ ∞


i=1 . Como An é compacto, {yi }i=1 tem uma subsucessão

{yni } convergente em An ; o que quer dizer que se podem encontrar pontos da sucessão
{yni } tão próximos quanto se queira. Em particular, podem encontrar-se dois pontos
yni e ynj tais que

d(yni , ynj ) < ε/3. (1.6)


ε ε ε
Mas, nesse caso, d(xni , xnj ) ≤ d(xni , yni ) + d(yni , ynj ) + d(ynj , xnj ) ≤
+ + =ε
3 3 3
(por (1.5),(1.6) e (1.5), respectivamente) o que contradiz (1.4). Logo, A é totalmente
limitado e, como pela alı́nea b) também é fechado, então, pelo Teorema 1, A é compacto.
Por a) sabe-se, ainda, que A é não vazio; donde se conclui que A ∈ H(X ).
Finalmente, demonstre-se e). Já se sabe que A ∈ H(X ). Pretende-se demonstrar
que tendo uma sucessão de Cauchy {An }∞
n=1 em H(X ), ela convergirá para A que é o

conjunto de todos os pontos limite de sucessões de Cauchy do tipo {xn ∈ An }∞


n=1 . Ou

seja, quer-se mostrar que para qualquer ε > 0 se tem h(An , A) ≤ ε a partir de certa
ordem.
Seja ε > 0. Por c) e pelo lema 1 basta provar que a partir de certa ordem se
tem An ⊂ A + ε. Como {An }∞
n=1 é uma sucessão de Cauchy, então existe uma ordem

M ∈ N a partir da qual, para quaisquer dois termos An e Am da sucessão, se tem


ε
h(An , Am ) ≤ , o que, pelo lema 1, nos permite concluir que
2
ε ε
para quaisquer m, n ≥ M se tem An ⊂ Am + (e também Am ⊂ An + ). (1.7)
2 2
20 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Seja n > M e seja y ∈ An . Sendo {An }∞


n=1 uma sucessão de Cauchy e usando novamente

o lema 1, pode afirmar-se que existe uma sucessão crescente {Nj }∞ j=1 de inteiros, com
ε
n = N1 < N2 < . . . < Nk < . . ., tais que An ≡ AN1 ⊂ AN2 + e ANj ⊂ ANj+1 +
2
ε
para todo j ∈ N. A partir desta nova sucessão, pode construir-se uma outra
2j+1
ε ε
sucessão {xNj ∈ ANj }∞ j=1 tal que y ≡ xN1 e d(y, xN2 ) ≤ 2
, d(xN2 , xN3 ) ≤ 3 , . . . e
2 2
ε
d(xNj , xNj+1 ) ≤ j+1 , para todo j ∈ N. Esta sucessão constrói-se do seguinte modo:
2
ε
Tem-se M ≤ n = N1 e An ⊂ AN2 + . Então, sendo y (≡ xN1 ) um elemento de
2
ε
An (≡ AN1 ), existirá pelo menos um elemento xN2 de AN2 tal que d(y, xN2 ) ≤ 2 . De
2
ε
seguida, para j = 2 vem que AN2 ⊂ AN3 + 3 e se xN2 ∈ AN2 , então existe pelo menos
2
ε
um elemento xN3 de AN3 tal que d(xN2 , xN3 ) ≤ 3 . De forma análoga, e por indução
2
matemática, pode encontrar-se uma sucessão xN1 , xN2 , xN3 , . . . tal que xNj ∈ ANj e
ε
d(xNj , xNj+1 ) ≤ j+1 .
2
Mas como Nj ≥ n > M para todo j ∈ N, também se tem, por (1.7) que ANj ⊂
ε
An + , para todo j ∈ N. Pelo que {xNj }∞ j=1 é, portanto, uma sucessão de pontos de
2
ε
An + . Além disso, {xNj }∞ j=1 é uma sucessão de Cauchy. Veja-se porquê: Sabe-se
2
que para qualquer ε > 0 existe uma ordem a partir da qual quaisquer dois termos
consecutivos de {xNj }∞
j=1 estão entre si uma distância igual ou inferior a ε/2
j+1
. Para
dois termos xNj e xNk , eventualmente não consecutivos, tais que Nk > Nj , vem:
 k−j+1
1
k 1−
X ε ε 2 2k+1 − 2j 2k+1
d(xNj , xNk ) ≤ = j+1 · = ε · k+j+1 < ε · k+j+1 < ε.
2p+1 2 1 2 2
p=j 1−
2
Portanto, para qualquer ε positivo existe uma ordem n a partir da qual quaisquer dois
termos de {xNj }∞ ∞
j=1 estão a uma distância entre si inferior a ε, isto é, {xNj }j=1 é uma

sucessão de Cauchy.
ε
Assim, obtém-se uma sucessão de Cauchy de pontos de An + que, pelo Teorema 1
2
e pela Proposição 4, é um conjunto fechado. Donde se conclui que a sucessão {xNj }∞
j=1
ε
converge para um ponto x que pertence a An + e,
2
ε
a partir de certa ordem tem-se d(xNj , x) ≤ , para todo j ∈ N. (1.8)
2
2. CONCEITO DE ESPAÇO MÉTRICO COM MÉTRICA DE HAUSDORFF 21

Por outro lado,


ε
d(y, xNj ) ≤ , para todo j ∈ N, (1.9)
2
já que, usando a desigualdade triangular um determinado número de vezes, se obtém
que, para um dado termo xNj da sucessão {xNj ∈ ANj }∞ j=1 , se tem d(y, xNj ) ≤
j−1
P ε
d(y, xN2 ) + d(xN2 , xN3 ) + · · · + d(xNj−1 , xNj ) ≤ k+1
; passando ao limite quando
k=1 2
P∞ ε 1 1 ε
j tende para infinito, vem que d(y, xNj ) ≤ =ε· 2 × = .
k=1 2
k+1 2 1 2
1−
2
De (1.8) e de (1.9), novamente pela propriedade da desigualdade triangular de d,
vem que d(y, x) ≤ ε. Aplicando agora o lema 2 à sucessão {xNj }∞
j=1 , sabe-se que existe

uma sucessão de Cauchy {xn ∈ An } que converge para x, o que, por definição de A,
permite dizer que x ∈ A.
Ora, se x ∈ A e se d(x, y) ≤ ε, isso é equivalente a dizer que y ∈ A + ε. Mas como
y é um elemento qualquer de An , então An ⊂ A + ε, que era o que se pretendia. Assim,
vem finalmente que lim An = A. 

H(X ) será, então, o espaço onde “vivem” os fractais e, para já, um fractal é um
qualquer dos seus pontos, ou seja, um subconjunto compacto não vazio de um e.m X
completo.

Exemplo 1. A Figura 1.6 mostra dois exemplos de subconjuntos compactos de R2 .


À esquerda um compacto simples em R2 e à direita o Triângulo de Sierpinski. Este

Figura 1.6. Dois elementos de H(R2 ).

triângulo constrói-se da seguinte forma: Começando com um triângulo idêntico ao da


figura anterior, marcam-se os pontos médios de cada um dos seus lados e unem-se por
segmentos. Obtêm-se quatro novos triângulos mais pequenos, semelhantes ao inicial.
22 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Retira-se o triângulo do meio e faz-se o mesmo processo em cada um dos triângulos que
sobram. E assim sucessivamente... A imagem mostra o resultado que se obtém depois
de se realizar esta operação três vezes. O conjunto que se obteria, se se realizasse
esta tarefa um número infinito de vezes, chama-se Triângulo de Sierpinski e só na
mente pode ser concebido. Representá-lo graficamente é impossı́vel: não há tempo e,
ainda que o houvesse, a definição do monitor do computador seria insuficiente por ser
demasiado “grosseira”. 

Prossiga-se então com a construção do conceito de fractal como ponto fixo de um


sistema de funções iteradas.

3. Ponto fixo de uma transformação

Definição 12. Seja f : X → X uma aplicação de um e.m. nele próprio. Chama-


se ponto fixo de f a um elemento xf de X tal que f (xf ) = xf .

Para o propósito deste trabalho interessam, entre as transformações de X, aquelas


que são contracções.

Definição 13. Uma transformação f : X → X num e.m. (X, d) diz-se uma


contracção se existe uma constante s, com 0 ≤ s < 1, tal que d(f (x), f (y)) ≤
s.d(x, y), ∀x, y ∈ X. A s chama-se factor de contracção.

Vejam-se alguns exemplos de contracções:

Exemplo 2. Sendo R o espaço métrico com a métrica d(x, y) = |x−y|, considere-se


1
nele a aplicação f (x) = x (veja-se a figura 1.7).
2

Trata-se de uma contracção com factor de contracção igual a 1/2 e cujo ponto fixo

1 1
é o zero já que, para quaisquer pontos x e y de R se tem d(f (x), f (y)) = x − y =

2 2
1 1 1
|x − y| = d(x, y) e sendo x um ponto de R tem-se f (x) = x se e só se x = x, ou
2 2 2
seja, se e só se x = 0. 
3. PONTO FIXO DE UMA TRANSFORMAÇÃO 23

Figura 1.7. Contracção em R

Exemplo 3. Seja X o conjunto das funções contı́nuas f : [0, 1] → R que se repre-


sentará por C[0, 1]. Um “ponto” de X é, portanto, uma função. Considere-se agora a
seguinte métrica definida neste espaço: d(f, g) = max{|f (x)−g(x)| : x ∈ [0, 1]}, ∀f, g ∈
C[0, 1]. Esta métrica está bem definida porque f e g são contı́nuas em [0, 1].
Um exemplo de uma contracção em C[0, 1] poderá ser a aplicação w : C[0, 1] →
 
1 1 1
C[0, 1] que aplica cada função f em w(f ) = f + 1 em que f + 1 (x) = f (x) +
2 2 2
1, ∀x ∈ [0, 1]. Veja-se que w é uma contracção com factor de contracção igual a 1/2 e
que tem como ponto fixo a função p(x) = 2, ∀x ∈ [0, 1].

Figura 1.8. Representação gráfica de um ponto f de C[0, 1], da sua imagem


1
pela função w(f ) = f + 1 e do ponto fixo de w.
2
24 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Para quaisquer funções f e g de C[0, 1] vem que

d(w(f ), w(g)) = max{|(w(f ))(x) − (w(g))(x)| : x ∈ [0, 1]} =


 
1 1
= max f (x) + 1 − g(x) − 1 : x ∈ [0, 1] =

2 2
 
1
= max |f (x) − g(x)| : x ∈ [0, 1] =
2
1
= max{|f (x) − g(x)| : x ∈ [0, 1]} =
2
1
= d(f, g).
2

Por outro lado, se f for um elemento qualquer de C[0, 1], tem-se w(f ) = f se e só
1 1
se f (x) + 1 = f (x), ∀x ∈ [0, 1], o que equivale a f (x) = 1, ∀x ∈ [0, 1], ou seja, f (x)
2 2
é a função constante igual a 2 no intervalo [0, 1]. 

Exemplo 4. Um outro exemplo poderá ser uma aplicação definida em R2 com a


distância euclidiana como métrica associada, isto é, dados dois pontos x = (x1 , x2 ) e
q
y = (y1 , y2 ) de R , a distância entre eles é dada por d(x, y) = (x1 − y1 )2 + (x2 − y2 )2 .
2

Considere-se então, em R2 , a aplicação w(x) = Ax + t sendo


   
1 o 1 o 1
2
cos 120 − 2
sin 120 2
A=   et=  .
1 o 1 o
2
sin 120 2
cos 120 0

Aplicar esta função a um ponto de R2 corresponde a rodá-lo 120o em torno da origem,


de seguida aproximá-lo desta, reduzindo para metade a distância a que dela se encontra
e, finalmente, transladar o ponto resultado das operações anteriores meia unidade, na
horizontal, para a direita.
Verifique-se que esta aplicação é uma contracção com factor de contracção igual a
√ !
1 5 3
e que tem, como ponto fixo, o ponto ; :
2 14 14
Seja x = (x1 , x2 ) um ponto de R2 . Então,
      √ 
1 o 1 o 1 1 3 1
2
cos 120 − 2
sin 120 x 1 − x 1 − x 2 +
w(x) = Ax + t =     + 2 =  4 √ 4 2
.
1 o 1 o 3 1
2
sin 120 2
cos 120 x 2 0 4
x 1 − 4
x 2
3. PONTO FIXO DE UMA TRANSFORMAÇÃO 25

Assim, dados quaisquer dois pontos x e y de R2 , a distância entre w(x) e w(y) é


dada por:

d(w(x), w(y)) =
√ √ √ √
v !2 !2
u
u 1 3 1 1 3 1 3 1 3 1
=t − x1 − x2 + + y1 + y2 − + x1 − x2 − y1 + y2 =
4 4 2 4 4 2 4 4 4 4
r
1 h √ i2 h√ i2
= (y1 − x1 ) + 3 (y2 − x2 ) + 3 (x1 − y1 ) − (x2 − y2 ) =
4
1
q
= 4 (x1 − y1 )2 + 4 (x2 − y2 )2 =
4
1 1
q
= (x1 − y1 )2 + (x2 − y2 )2 = d(x, y)
2 2
1
Donde, w é, em R2 , uma contracção com factor de contracção igual a .
2
Determine-seagora o ponto fixo de w: 

 1 x1 − 3 x2 + 1 = x1

 


4 4 2
w(x) = x ⇔ √ ⇔ √ ⇔
3 1  3 x1 = x 2
 
 x1 − x2 = x2
 
4 4 5
 
√ √
− 1 x 1 − 3 · 3 x 1 + 1 = x 1 x 1 = 5

 

4 4 5 2 14
⇔ ⇔ √
x 2 = 3

 


14
√ !
5 3
O ponto fixo de w é, portanto, ; .
14 14


No que diz respeito às contracções, serão úteis os dois resultados que se seguem.

Proposição 5. Seja w : X → X uma contracção com factor de contracção s num


espaço métrico X. Então w é uma função contı́nua.

Demonstração. Seja ε > 0 e x, y ∈ X. Sendo s o factor de contracção de w,


se d(x, y) < ε/s, então d(w(x), w(y)) ≤ s.d(x, y), isto é, d(w(x), w(y)) ≤ s.ε/s = ε.
Portanto, se w é uma contracção de factor s, dado ε > 0, existe δ = ε/s tal que, se para
dois elementos x e y de X se tem d(x, y) < δ, então também se terá d(w(x), w(y)) < ε.
Portanto, w é uma aplicação contı́nua em X. 
26 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Proposição 6. Se f, g : X → X são contracções de factores de contracção s e t


respectivamente, então f og é uma contracção de factor de contracção st.

Demonstração. Sendo f uma contracção de factor de contracção s então, para


quaisquer dois pontos x e y de X sabe-se que

d(f (x), f (y)) ≤ s.d(x, y). (1.10)

Analogamente, sendo g uma contracção de factor de contracção t, também se tem que,


para quaisquer dois pontos x e y de X,

d(g(x), g(y)) ≤ t.d(x, y). (1.11)

Mas, dados x e y de X, d(f og(x), f og(y)) = d(f (g(x)), f (g(y))) que, por (1.10), é
menor ou igual a s.d(g(x), g(y)) e isto, por (1.11) , é menor ou igual a st.d(x, y). Para
além disto, se 0 ≤ s < 1 e se 0 ≤ t < 1, então também 0 ≤ st < 1 pelo que st é factor
de contracção de f og. 

Definir-se-á agora o que falta para construir o conceito de Fractal.

4. Sistemas de Funções Iteradas

Definição 14. Seja f : X → X uma transformação num e.m. As iteradas


sucessivas de f são transformações f n : X → X definidas por:

f 0 (x) = x
f 1 (x) = f (x)
f (n+1) (x) = (f of n )(x) = f (f n (x)), n = 1, 2, 3, . . .

Tendo em conta agora as iteradas sucessivas de uma contracção, verifique-se


o que sucede ao factor de contracção de f .

Proposição 7. Se f : X → X é uma contracção de factor de contracção s, então


f n : X → X é uma contracção de factor de contracção sn .

Demonstração. Basta aplicar a Proposição 6 n-1 vezes. 


4. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 27

Teorema 3. Se f : X → X é uma contracção definida num e.m. (X, d) completo,


então f possui exactamente um ponto fixo xf ∈ X e, para qualquer ponto x ∈ X, a
sucessão {f n (x)}∞ n
n=0 converge para xf , isto é, lim f (x) = xf , ∀x ∈ X.
n→∞

Demonstração. Para esta demonstração percorrer-se-ão as seguintes três etapas:

a) {f n (x)}∞
n=0 é uma sucessão de Cauchy, ∀x ∈ X.

b) {f n (x)}∞
n=0 converge para o ponto fixo de f .

c) f tem exactamente um ponto fixo.

Comece-se, então, pela demonstração de a) e, para tal, fixe-se um ponto x ∈ X.


Sendo s o factor de contracção de f e m e n dois números naturais , sabe-se que

d(f n (x), f m (x)) ≤ smin{m,n} .d(x, f |m−n| (x)) (1.12)

Em particular, para k = 0, 1, 2, . . . , tem-se, pela propriedade da desigualdade


triangular de d aplicada k vezes, que d(x, f k (x)) ≤ d(x, f (x)) + d(f (x), f 2 (x)) +
d(f 2 (x), f 3 (x)) + · · · + d(f (k−1) (x), f k (x)). Tendo em conta que f é uma contracção de
factor s, pode dizer-se que o anterior é menor ou igual que d(x, f (x)) + s.d(x, f (x)) +
s.d(f (x), f 2 (x)) + · · · + s.d(f (k−2) (x), f (k−1) (x)). Aplicando agora o mesmo, sucessi-
vamente a cada uma das parcelas anteriores, vem que o designado pela última ex-
pressão é menor ou igual a (1 + s + s2 + · · · + sk−1 ).d(x, f (x)) que é igual a 1 ·
1 − sk
· d (x, f (x)). Tendo em conta que f é uma contracção, tem-se que 1 − sk < 1,
1−s
donde d(x, f k (x)) ≤ (1 − s)−1 .d(x, f (x)). Aplicando agora isto a (1.12) vem ∀m, n =
0, 1, 2, . . . , d(f n (x), f m (x)) ≤ smin{m,n} .(1 − s)−1 .d(x, f (x)).
Seja ε > 0. Têm-se as seguintes equivalências: smin{m,n} .(1 − s)−1 .d(x, f (x)) < ε ⇔
ε(1 − s) ε(1−s)
⇔ smin{m,n} < ⇔ smin{m,n} < slogs ( d(x,f (x)) ) . A última expressão equivale a
d(x,f (x)) 
ε(1−s)
min {n, m} > logs d(x,f (x))
porque 0 ≤ s < 1 e pode aplicar-se o logaritmo porque
ε, (1 − s) e d(x, f (x)) pertencem a R+
o.

Então, dado x ∈ X fixo e dado ε > 0, basta escolher N o menor inteiro tal que
 
ε(1−s)
N ≥ logs d(x,f (x)) e obter-se-á que para quaisquer m, n > N, d(f n (x), f m (x)) < ε, o
que prova que {f n (x)}∞
n=0 é uma sucessão de Cauchy.
28 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Demonstração de b): Como X é, por hipótese, um e.m. completo, então sendo
{f n (x)}∞
n=0 uma sucessão de Cauchy, sabe-se que tem limite em X - designe-se por xf .
 
Pretende-se demonstrar que xf é ponto fixo de f . Ora, f (xf ) = f lim f n (x) =
n→∞
n
lim f (f (x)) = lim f (n+1)
(x) = xf porque {f (n+1)
(x)}∞
n=0 é uma subsucessão de
n→∞ n→∞

{f (x)}∞
n
n=0 . E, portanto, xf é ponto fixo de f .

Demonstre-se, por fim, c). Para isso, suponha-se que f tem dois pontos fixos xf
e yf . Nesse caso, f (xf ) = xf e também f (yf ) = yf , o que faz com que d(f (xf ), f (yf )) =
d(xf , yf ). Mas como f é uma contracção de factor s, então d(f (xf ), f (yf )) ≤ s.d(xf , yf ).
Juntando estes dois factos vem que d(xf , yf ) ≤ s.d(xf , yf ) o que equivale a (1 −
s).d(xf , yf ) ≤ 0. Daqui, como (1 − s) > 0 porque 0 ≤ s < 1 e d(xf , yf ) ≥ 0 por-
que d é métrica, vem obrigatoriamente que d(xf , yf ) = 0, o que corresponde a dizer
que xf = yf , ou seja, xf é o único ponto fixo de f . Em conclusão, partindo de qualquer
elemento x de X, a sucessão das suas iteradas sucessivas por f converge para xf , que
é o (único) ponto fixo de dessa aplicação. 

Exemplo 5. Considere-se a aplicação w já apresentada, definida no espaço C[0, 1]


1
em que w(f ) = f +1. Já se viu que se trata de uma contracção de factor de contracção
2
1
, cujo ponto fixo é a função p(x) = 2, ∀x ∈ [0, 1]. Sabe-se agora que a sucessão das
2
iteradas sucessivas de uma qualquer função f de C[0, 1] tende para a função p. A
Figura 1.9 ilustra dois casos desses. 

O trabalho que se apresenta de seguida realiza-se no e.m. (H(X ), h(d)). Como se


trata de um espaço métrico completo, tendo uma contracção definida nesse e.m., pode
afirmar-se que a sucessão das iteradas sucessivas de um elemento de H(X ) por essa
aplicação é uma sucessão de Cauchy de sub-conjuntos compactos de X que convergirá
para o ponto fixo dessa contracção. Veja-se que, a partir de uma contracção em X,
fica definida de uma maneira natural uma contracção em (H(X ), h(d)). Falta apenas
definir essa contracção em (H(X ), h(d)), mas antes é necessário provar o seguinte lema.
4. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 29

Figura 1.9. .
Dois exemplos apresentando as quatro primeiras iteradas por w de duas funções do espaço

C[0,1], iteradas essas que se aproximam progressivamente do ponto fixo de w que é a função

constante p(x) = 2 definida no intervalo [0,1].


30 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Lema 4. Seja f : X → X uma aplicação contı́nua num espaço métrico (X, d) e


seja S ∈ H(X ). Então f (S) ∈ H(X ).

Demonstração. Seja {yn = f (xn )}∞


n=1 uma sucessão infinita de pontos em f (S).

Então, {xn }∞ ∞
n=1 é uma sucessão em S, que é compacto e, por isso, {xn }n=1 tem uma

subsucessão que é convergente em S - diga-se {xNn }∞


n=1 , em que N1 < N2 < . . . <

Nn < . . .. Como f é contı́nua, então {yNn = f (xNn )}∞ ∞


n=1 é uma subsucessão de {yn }n=1

que também é convergente em f (S). Portanto, f (S) é compacto. 

Proposição 8. Seja w : X → X uma contracção num espaço métrico (X, d),


e : H(X ) → H(X ) tal que
com factor de contracção s e com ponto fixo xw . Seja w
w(B)
e = {w(x) : x ∈ B}, ∀B ∈ H(X ). Então w
e está bem definida e é uma contracção
em (H(X ), h(d)) com factor de contracção s e cujo ponto fixo é {xw }.

Demonstração. Sejam A, B ∈ H(X ). Se w é uma contracção, é também uma


função contı́nua. Então, sendo B um conjunto compacto, pelo lema 4, w(B) também
e está bem definida porque aplica H(X ) nele
é um conjunto compacto. Portanto, w
e é uma contracção em H(X ) há que usar a métrica h(d)
próprio. Para provar que w
definida nesse espaço. Sabe-se que

h(w(A),
e w(B))
e = max{d(w(A),
e w(B));
e d(w(B),
e w(A))}.
e

Relativamente a d(w(A),
e w(B))
e pode escrever-se que

d(w(A),
e w(B))
e = max{d(w(x), w(B))
e : x ∈ A} =

= max{min{d(w(x), w(y)) : y ∈ B} : x ∈ A} ≤

≤ max{min{sd(x, y) : y ∈ B} : x ∈ A} =

= max{s min{d(x, y) : y ∈ B} : x ∈ A} =

= max{sd(x, B) : x ∈ A} = s max{d(x, B) : x ∈ A} = sd(A, B)


4. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 31

Analogamente, d(w(B),
e w(A))
e ≤ sd(B, A). Então,

h(w(A),
e w(B))
e ≤ max{sd(A, B); sd(B, A)} =

= s max{d(A, B); d(B, A)} = sh(A, B).

Portanto, w
e é uma contracção com factor de contracção s. Já se sabe, pelo Teorema
e têm, cada uma, um ponto fixo. Seja xw o ponto fixo de w e seja {xw } um
3, que w e w
ponto de H(X ). Então, w
e ({xw }) = {w (xw )} = {xw }, pelo que {xw } é o ponto fixo de
w.
e 

Apresentam-se agora dois exemplos, um com uma contracção em (R) e outro com
uma contracção em (R2 ).

Exemplo 6. Usando o exemplo já apresentado em R, f (x) = 21 x, cujo ponto fixo


é x = 0, diz a Proposição 8 que f induz em H(R) uma contracção fe, tal que fe(A) =
{ 12 x : x ∈ A}, ∀A ∈ H(R), cujo ponto fixo é {0}. Pelo Teorema 3, lim fen ([0, 1]) = {0}.
n

A Figura 1.10 ilustra este exemplo. 

Figura 1.10. Iteradas sucessivas de um compacto de R pela função fe defi-


nida em H(R).

Exemplo 7. Empregando agora o outro exemplo definido em R2 , cujo ponto fixo


 √ 
é 5
, 3 , e aplicando os mesmos resultados utilizados no exemplo anterior, vem que
14 14

w(x) definida em R2 induz uma aplicação w


e em H(R2 ) tal que a sucessão das iteradas
n √ o
sucessivas de qualquer ponto deste e.m. converge para 5
, 3 . Por exemplo,
14 14

partindo de um triângulo equilátero de lado 1 e aplicando we sucessivas vezes, obtém-


n √ o
se, no limite, o ponto fixo de w
e que é 5
, 3
14 14
(veja-se a Figura 1.11). 

Este resultado, embora importante e interessante, na prática não é muito signi-


ficativo, pelo menos em termos gráficos, já que após infinitas iterações sucessivas de
32 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.11. Iteradas sucessivas de um compacto de R2 pela função we


definida em H(R2 ).

qualquer subconjunto compacto de X, se obtém sempre um e apenas um ponto de


X. No entanto, o resultado final pode ser interessante se se operar com várias con-
tracções em simultâneo.

Teorema 4. Seja (X, d) um e.m., seja {w


en : n = 1, 2, . . . , N } um conjunto de
contracções em (H(X ), h(d)) cada uma delas com o seu respectivo factor de contracção
sn , n = 1, 2, . . . , N . Seja WN : H(X ) → H(X ) tal que WN (B) = w
e1 (B) ∪ w
e2 (B) ∪
4. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 33

N
S
... ∪ w
eN (B) = en (B), ∀B ∈ H(X ). Então WN é uma contracção em H(X ) com
w
n=1
factor de contracção s = max{sn : n = 1, 2, . . . , N }.

Demonstração. Use-se o método de indução matemática.


Para N = 2 pretende-se provar que W2 : H(X ) → H(X ) tal que W2 (B) =
2
S
e1 (B) ∪ w
w e2 (B) = en (B), ∀B ∈ H(X ), é uma contracção em H(X ) com factor
w
n=1
de contracção s = max{s1 , s2 }. Para isso, considere-se que B e C são dois pontos de
H(X ). Então, h(W2 (B), W2 (C)) = h(w
e1 (B) ∪ w e1 (C) ∪ w
e2 (B), w e2 (C)). Simplifique-se a
escrita designando w
e1 (B) por B1 , w
e2 (B) por B2 , w
e1 (C) por C1 e w
e2 (C) por C2 . Vem
h(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ) = max{d(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ), d(C1 ∪ C2 , B1 ∪ B2 )}. Ora,

d(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ) = max{d(x, C1 ∪ C2 ) : x ∈ B1 ∪ B2 } =

= max{max{d(x, C1 ∪ C2 ) : x ∈ B1 }; max{d(x, C1 ∪ C2 ) : x ∈ B2 }} =

= max{d(B1 , C1 ∪ C2 ), d(B2 , C1 ∪ C2 )}.

Para obter a distância de B1 ao conjunto reunião de C1 com C2 , basta considerar


as distâncias de B1 a C1 e de B1 a C2 e escolher a menor delas (veja-se a Figura 1.12).

Figura 1.12. A distância de B1 a C1 ∪ C2 é igual ao menor valor entre


d(B1 , C1 ) e d(B1 , C2 ).

De forma análoga, obtém-se a distância de B2 a C1 ∪ C2 . Então, retomando o


raciocı́nio anterior vem:

max{d(B1 , C1 ∪ C2 ), d(B2 , C1 ∪ C2 )} =

= max{min{d(B1 , C1 ), d(B1 , C2 )}, min{d(B2 , C1 ), d(B2 , C2 )}}.


34 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Agora, de cada um destes dois pares de distâncias, convém, para o que se pretende, es-
colher d(B1 , C1 ) no primeiro par e d(B2 , C2 ) no segundo. Como os elementos escolhidos
podem não ser os menores valores em cada par de distâncias, então o mı́nimo é menor
ou igual que a distância escolhida. Com tudo isto obtém-se que d(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ) ≤
max{d(B1 , C1 ), d(B2 , C2 )} e, de forma análoga,

d(C1 ∪ C2 , B1 ∪ B2 ) ≤ max{d(C1 , B1 ), d(C2 , B2 )}.

Daqui vem que

h(W2 (B), W2 (C)) = h(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ) =

= max{d(B1 ∪ B2 , C1 ∪ C2 ), d(C1 ∪ C2 , B1 ∪ B2 )} ≤

≤ max{d(B1 , C1 ), d(B2 , C2 ), d(C1 , B1 ), d(C2 , B2 )}.

Mas, escolher o máximo entre estas quatro entidades é o mesmo que dividi-las em dois
pares, escolher o máximo em cada um desses pares, e depois o máximo entre os dois
valores obtidos. Assim, como é conveniente neste caso, dir-se-á que a última expressão
designatória é igual a

max{max{d(B1 , C1 ), d(C1 , B1 )}, max{d(B2 , C2 ), d(C2 , B2 )}},

que corresponde a max{h(B1 , C1 ), h(B2 , C2 )}, isto é,

max{h(w
e1 (B), w
e1 (C)), h(w
e2 (B), w
e2 (C))}.

Como w
e1 e w
e2 são contracções de factor s1 e s2 respectivamente, então este último
resultado é menor ou igual a max{s1 .h(B, C), s2 .h(B, C)} o que equivale a s.h(B, C),
sendo s = max{s1 , s2 }. Portanto, W2 é uma contracção de factor de contracção s.
Suponha-se agora que para N = k é verdade o seguinte: a aplicação Wk : H(X ) →
k
S
H(X ) tal que Wk (B) = w
e1 (B) ∪ w
e2 (B) ∪ . . . ∪ w
ek (B) = en (B), ∀B ∈ H(X ) é uma
w
n=1
contracção em H(X ) com factor de contracção sk = max{sn : n = 1, 2, . . . , k}.
Prove-se agora que a proposição também será verdadeira para N = k + 1. Sejam,
então, w
e1 , w
e2 , . . . , w ek+1 : H(X ) → H(X ) as contracções com factores de contracção
ek , w
4. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 35

s1 , s2 , . . . , sk , sk+1 respectivamente, que definem Wk+1 . Dados dois pontos quaisquer B


e C de H(X ), vem que

h(Wk+1 (B), Wk+1 (C)) =

e1 (B) ∪ . . . ∪ w
=h(w ek (B) ∪ w e1 (C) ∪ w
ek+1 (B), w e2 (C) ∪ . . . ∪ w
ek (C) ∪ w
ek+1 (C)) =

=h(Wk (B) ∪ w
ek+1 (B), Wk (C) ∪ w
ek+1 (C)).

Pelo resultado já comprovado para N = 2, sabe-se que o anterior é menor ou igual a

max{h(Wk (B), Wk (C)), h(w


ek+1 (B), w
ek+1 (C))}.

Utilizando agora a hipótese e o facto de w


ek+1 ser uma contracção de factor sk+1 vem
que o anterior é menor ou igual a

max{sk .h(B, C), sk+1 .h(B, C)}

que é igual a s.h(B, C), sendo s = max{sn : n = 1, 2, . . . , k + 1}.


Portanto, pelo método de indução matemática, a proposição é verdadeira para todo
N ∈ N, isto é, W é contracção em H(X ) com factor de contracção s. 

Definiu-se o que é necessário para ter um Sistema de Funções Iteradas (SFI)


que consiste num e.m. (X, d) no qual se define um conjunto finito de contracções
wn : X → X com os respectivos factores de contracção sn , n = 1, 2, . . . , N . Denota-se
este SFI por {X; wn , n = 1, 2, ..., N } e o seu factor de contracção é
s = max{sn : n = 1, 2, . . . , N }.
Como W (definida como no Teorema 4, página 32), é uma contracção no espaço
métrico completo (H(X ), h(d)) então, pelo Teorema 3, página 27, {W n (B)}∞
n=1 é uma

sucessão de Cauchy em H(X ), que converge para o ponto fixo de W independentemente


do ponto B de H(X ) com que se inicia a iteração. Diz-se que esse ponto fixo de W é
o ponto fixo do SFI e chama-se-lhe Fractal.
Finalmente pode apresentar-se uma definição de fractal.
36 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Definição 15. Seja (X,d) um e.m. completo. Seja {X; wn , n = 1, 2, . . . , N } um


SFI em X, constituı́do por N contracções, cada uma com o respectivo factor de con-
tracção sn . O ponto fixo deste SFI diz-se um FRACTAL.

Esta não é “a” definição de fractal. Na verdade, como já foi dito na Introdução,
não existe uma definição de fractal porque qualquer uma delas pode excluir conjuntos
ou objectos com caracterı́sticas que permitem considerá-los de natureza fractal. Esta
definição apenas define fractal enquanto ponto fixo de um sistema de funções iteradas.
Trata-se apenas de uma das classes de fractais. Por outro lado, esta definição inclui
alguns conjuntos que, na prática, não são habitualmente considerados fractais. É o
caso do de um Intervalo em R (ver Exemplo 10, página 37) que, sendo o ponto fixo de
um SFI, é um conjunto que pode descrever-se de forma simples, quer a nı́vel global,
quer local, ao contrário daqueles conjuntos que são tidos, por quem conhece o conceito,
como fractais.
Tal como todos os entes matemáticos, os fractais só existem em estado puro na
mente humana, pois é impossı́vel, em tempo e em espaço, concretizá-los graficamente,
já que não é possı́vel determinar um número infinito de iteradas de uma função. O
computador é uma ferramenta muito valiosa no estudo e na construção de fractais
porque permite realizar com rapidez uma enorme quantidade de cálculos e representá-
los graficamente com grande precisão, dando ainda a possibilidade de facilmente poder
observar-se na figura as implicâncias da alteração de alguns parâmetros nas expressões
das funções que constituem o SFI que ela representa. Ainda assim, e por muito potente
que seja a máquina, a sua capacidade de cálculo e de representação gráfica é sempre
limitada; há que ter isso em consideração e imaginar o que esta não consegue executar.

5. Exemplos de Fractais definidos por Sistemas de Funções Iteradas

Apresentam-se agora alguns exemplos de Fractais segundo a Definição 15 e também


algumas observações.
5. EXEMPLOS DE FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 37

Exemplo 8 (Há unicidade do SFI que produz um fractal?). Não há uni-
cidade. Por exemplo, os SFI’s {R; w1 = 21 x, w2 = 12 x + 12 } e {R; w1 = 13 x, w2 =
1
3
x + 13 , w3 = 31 x + 32 } definem ambos o mesmo fractal - o intervalo [0, 1]. 

Exemplo 9 (Triângulo de Sierpinski). Apresenta-se de novo este exemplo, desta


vez indicando um SFI que o produz: {R2 ; w1 , w2 , w3 } em que

w1 (x, y) = ( 21 x, 21 y),
w2 (x, y) = ( 12 x, 21 y) + ( 12 , 0), e

3
w3 (x, y) = ( 21 x, 21 y) + ( 14 , 4
).

Viu-se que um sistema de funções iteradas converge sempre para o mesmo ponto
de H(R2 ) independentemente do ponto com o qual se comece a iteração. Assim, para
obter o Triângulo de Sierpinski, não é obrigatório começar com um triângulo, podendo
iniciar a iteração a partir de qualquer conjunto compacto não vazio de R2 , como por
exemplo um quadrado “cheio’. A partir de uma ordem suficientemente grande, é irre-
levante a diferença entre cada uma das figuras que compõem cada iteração e cada um
dos triângulos que a comporiam caso se iniciasse com um triângulo (veja-se a Figura
1.13). Começando com um triângulo de lado lo , a n-ésima iteração é composta por
3n triângulos de lado ( 21 )n × lo e a sua área total é de A0 × ( 34 )n (em que A0 é a área
do triângulo inicial), que tende para zero quando o número de iterações tende para
infinito; ou seja, o fractal Triângulo de Sierpinski tem área nula. No entanto, o seu
perı́metro é infinito. Iniciando com um triângulo equilátero de lado lo , o perı́metro da
figura correspondente à n-ésima iteração é Pn = ( 12 )n × lo × 3 × 3n = 3 × ( 32 )n × lo que
tende para +∞ quando n tende para +∞. 

1
Exemplo 10 (Um Intervalo em R). O SFI {R; w1 , w2 } em que w1 (x) = 3
x
e w2 (x) = 23 x + 1
3
tem factor de contracção igual a max{ 13 ; 32 } = 23 . Iniciando com
B0 = [0, 1], determine-se a primeira iteração B1 :
e2 (B0 ) = [0; 13 ] ∪ [ 13 ; 1] = [0; 1] = B0 . Então B0 = B1 =
e1 (B0 ) ∪ w
B1 = W (B0 ) = w
B2 = . . . = Bn = [0, 1] que tende para [0, 1] quando n tende para infinito; logo, segundo
a Definição 15, [0, 1] é um fractal em R. Na prática, este conjunto não é considerado
38 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.13. Um Fractal definido por um SFI é independente do elemento


inicial de H(X ) ao qual se aplica esse SFI.

um fractal por não ter uma estrutura de detalhe intrincado, sendo um conjunto que se
pode definir facilmente tanto a nı́vel global, como local. 

Exemplo 11 (O Conjunto de Cantor). O SFI {R; w1 , w2 } com w1 (x) = 31 x e


w2 (x) = 13 x + 2
3
tem factor de contracção igual a 13 . A diferença entre as expressões
destas funções e as das funções do exemplo anterior é que os coeficientes da segunda
aplicação foram trocados. Esta alteração, aparentemente pouco significativa, é sufici-
ente para se obter um fractal mais interessante.
Aplique-se este SFI ao intervalo B0 = [0, 1].

B0

e2 (B0 ) = [0; 31 ] ∪ [ 32 ; 1] =
e1 (B0 ) ∪ w
O resultado da primeira iteração é B1 = W (B0 ) = w
[0, 1] \ 13 ; 32 .
 

B1
5. EXEMPLOS DE FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 39

e1 (B1 ) ∪ w
A segunda iteração será B2 = W (B1) = w e2 (B1 ) =
e1 ([0; 31 ] ∪ [ 32 ; 1]) ∪ w
=w e2 ([0; 13 ] ∪ [ 32 ; 1]) =
e1 ([0; 13 ]) ∪ w
=w e1 ([ 32 ; 1]) ∪ w
e2 ([0; 13 ] ∪ w
e2 ([ 23 ; 1]) =
= [0; 91 ] ∪ [ 29 ; 31 ] ∪ [ 32 ; 79 ] ∪ [ 89 ; 1].

B2

E de seguida obtêm-se os conjuntos abaixo representados:

B3
B4

O termo Bn da sucessão é constituı́do pela reunião disjunta de 2n intervalos fecha-



dos, cada um de amplitude ( 13 )n . O limite dos conjuntos Bn é definido por A =
T
Bn
n=0
e chama-se “Conjunto de Cantor”. Trata-se de um conjunto compacto por ser a inter-
secção de conjuntos compactos. Por outro lado, é um conjunto totalmente desconexo
(os seus únicos subconjuntos conexos são formados por um único ponto; veja-se a De-
finição 53 na página 104). A não seria totalmente desconexo se contivesse pelo menos
um intervalo [a, b]. No entanto, existe uma ordem N a partir da qual uma parte desse
intervalo é removida para formar o termo BN +1 , logo, A não contém intervalos mas
apenas conjuntos singulares. Também não é um conjunto vazio já que, por exemplo, 1
e 0 pertencem a A.
Sobre este fractal pode ainda dizer-se que é um conjunto perfeito (não tem pontos
isolados) porque todos os seus pontos, são pontos de acumulação. Veja-se porquê: Seja
x um elemento qualquer de A e seja ε > 0. Se x pertence a A, então pertence à inter-
secção de todos os conjuntos Bn que constituem cada uma das iterações. Sabe-se que
cada um desses conjuntos Bn é constituı́do por 2n intervalos fechados In1 , In2 , . . . , In2n
e x pertence a um desses intervalos - designe-se por Ink . Como todos esses interva-
los são fechados, podem definir-se duas sucessões: {mn }n∈N = {min{y ∈ Ink }}n∈N e
{Mn }n∈N = {max{y ∈ Ink }}n∈N . Então, para qualquer iteração n, existe um termo de
cada uma das duas sucessões tal que mn ≤ x ≤ Mn . Por outro lado, cada intervalo
Ink tem amplitude ( 13 )n , amplitude essa que tende para zero à medida que aumenta o
40 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

número de iterações; pelo que a diferença entre Mn e mn também tende para zero e,
portanto, ambas as sucessões convergem para x, sendo que pelo menos uma delas não
é constante a partir de certa ordem. Então, dado ε > 0, existe pelo menos um ponto
de A na vizinhança de x de raio ε e, por isso, x não é ponto isolado de A.
Note-se ainda a propriedade de auto-semelhança, caracterı́stica dos fractais, e que
neste caso é exacta: em qualquer escala, ou seja, em qualquer das iterações, cada parte
que compõe o conjunto nela obtido é semelhante a uma das iterações anteriores. 

Exemplo 12. Um Caso Não Linear


SFI: {R; w1 , w2 } em que: w1 (x) = 19 x2 e w2 (x) = 34 x + 12 .
Neste caso, umas das equações é do segundo grau, o que faz com que os intervalos
abertos eliminados em cada iteração não tenham todos a mesma amplitude, mas o
fractal obtido tem as mesmas propriedades gerais que o Conjunto de Cantor (veja-se a
Figura 1.14).

Figura 1.14. As primeiras duas iteradas de um SFI não linear.



4 1 2 1 2
O factor de contracção de w1 é porque d (w1 (x), w1 (y)) = x − y = =
9 9 9
1 4 3
|x − y| |x + y| ≤ d(x, y), ∀x, y ∈ [0, 2] e o factor de contracção de w2 é ; pelo que
9 9 4
3
o factor de contracção deste SFI é . 
4

Exemplo 13 (A Curva de Peano). Esta curva inventada em 1890 por Giuseppe


 
x
Peano é um fractal cujo SFI é constituı́do por nove contracções do tipo w   =
y
    
a b x e
    +  , todas de factor de contracção 1 e cujos parâmetros são os seguintes:
3
c d y f
5. EXEMPLOS DE FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 41

a b c d e f

1/3 0 0 1/3 0 0
1/3 0 0 -1/3 0 -1/3
1/3 0 0 1/3 -1/3 -1/3
-1/3 0 0 1/3 1/3 -2/3
-1/3 0 0 -1/3 -2/3 0
-1/3 0 0 1/3 0 -1/3
1/3 0 0 1/3 -1/3 1/3
1/3 0 0 -1/3 1/3 -2/3
1/3 0 0 1/3 -2/3 0
Para construirmos a curva podemos começar, por exemplo, com um segmento de
1
recta unitário e em seguida colocamos os nove segmentos de comprimento 3
como
mostra a Figura 1.15.

Figura 1.15. Resultado da primeira iterada do SFI que gera a curva de Peano.

O resultado que se obtém nas primeiras iterações é o que está na Figura 1.16.
Prova-se que o fractal Curva de Peano é uma curva que cobre por completo um
quadrado e, assim sendo, faz sentido perguntar: Qual é a dimensão desta curva? 

Foi criado o conceito de dimensão fractal que mede a “quantidade” de recta, plano
ou espaço que ocupa um fractal. Também se pode pensar no valor da dimensão de
42 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.16. Resultado das cinco primeiras iteradas do SFI que gera a
curva de Peano.

um fractal como um quantificador da sua “rugosidade”. Deste modo, a dimensão de


uma curva no plano pode ser um qualquer valor do intervalo [1, 2]. No Capı́tulo 2, será
explorado este conceito.

6. Fractais parecidos com objectos naturais

Exemplo 14 (Feto Fractal). Um dos exemplos mais conhecidos de forma fractal


na Natureza é a folha do feto. Nesta planta é muito fácil observar e compreender a pro-
priedade da auto-semelhança de um fractal já que esta cresce repetindo sensivelmente
a mesma forma em escalas cada vez menores (uma parte da folha, parece-se muito
com a folha inteira). O SFI que se apresenta, definido em R2 , é formado por quatro
contracções e tem um ponto fixo cuja forma é muito semelhante à folha do feto. A pri-
meira contracção define a “subfolha” esquerda de baixo como redução da folha inteira,
a segunda define a “subfolha” direita de baixo, a terceira define o conjunto formado
pelas restantes “subfolhas” e a quarta, que define o caule, é uma contracção cujo factor
de redução na horizontal é muito menor que o factor de redução na vertical. Cada
uma das quatro contracções consiste num reescalamento, seguido de uma rotação (que
pode ser diferente relativamente a cada um dos eixos coordenados, produzindo, nesse
caso, uma “distorção”), e finalmente uma translação. Cada uma delas pode, portanto,
       
x1 a b x e
escrever-se analiticamente na forma w(x) = w   =    1  +   = Ax + t
x2 c d x2 f
 
r1 cos θ1 −r2 sin θ2
sendo a matriz A do tipo A =   em que r1 e r2 correspondem aos
r1 sin θ1 r2 cos θ2
factores de reescalamento horizontal e vertical, respectivamente, e θ1 e θ2 correspondem
aos ângulos de rotação relativamente a cada um dos eixos coordenados (veja-se a Figura
6. FRACTAIS PARECIDOS COM OBJECTOS NATURAIS 43

1.17). Este tipo de transformação é uma transformação afim; e quando 0 ≤ r1 ≤ 1,


0 ≤ r2 ≤ 1 e pelo menos um dos factores r1 e r2 é diferente de 1, trata-se de uma con-
tracção (ver a Definição 13, página 22). Se 0 < r1 = r2 < 1 tem-se uma redução (ver
a Definição 47, página 96). Se r1 for negativo, a transformação w contém, em si, uma
simetria relativamente ao eixo das coordenadas e se r2 for negativo, a transformação
w contém em si uma simetria relativamente ao eixo das abcissas.
Como a ordem em que as transformações são aplicadas pode ter influência no re-
sultado, a ordem será sempre a seguinte:

1o - reescalamentos,
2o - simetrias,
3o - rotações,
4o - translações.

Figura 1.17. Reescalamento de um quadrilátero com distorção.

Os coeficientes de cada uma das aplicações que constituem o SFI apresentam-se na


tabela que se segue:

Contracção r1 r2 θ1 θ2 e f

w1 0,3 0,5 45 45 0,4 0

w2 0,3 0,5 -45 -45 0,4 0,15

w3 0,8 0,78 5 5 0,1 0,2

w4 0,02 0,3 0 0 0,49 0


O resultado de algumas iterações estão na Figura 1.18.

44 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

iterada 0 iterada 1 iterada 2

iterada 3 iterada 4 iterada 7

iterada 10 iterada 15 iterada 30

Figura 1.18. Representação gráfica de algumas das iteradas de um SFI que


define um fractal que se assemelha a um feto.

7. Sistemas de Funções Iteradas com Conjunto de Condensação

Vejam-se agora exemplos de fractais definidos por SFI com conjunto de condensação.
Um “SFI com Conjunto de Condensação” é um SFI ao qual se acrescenta uma aplicação
constante em H(X ). Antes de um exemplo, apresentam-se as definições e os resultados
necessários para a sua compreensão.
7. SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS COM CONJUNTO DE CONDENSAÇÃO 45

Definição 16. Seja (X, d) um e.m. e seja C ∈ H(X ). Considere-se a trans-


formação w0 H(X ) → H(X ) tal que w0 (B) = C, ∀B ∈ H(X ). A w0 chama-se trans-
formação de condensação e diz-se que C é o seu conjunto de condensação
associado.

Proposição 9. Seja (X, d) um e.m. e seja wo : H(X ) → H(X ) uma trans-


formação de condensação cujo conjunto de condensação associado é C ∈ H(X ). Então
w0 é uma contracção com factor de contracção igual a zero e C é o seu ponto fixo.

Demonstração. Sejam A, B ∈ H(X ). Então, h (wo (A), wo (B)) = h(C, C) = 0 =


0 · h(A, B). Portanto, wo é uma é uma contracção em H(X ) com factor de contracção
igual a zero. Para além disso, w0 (C) = C, pelo que C é o ponto fixo de w0 . 

Definição 17. Seja {X; w1 , w2 , . . . , wn } um SFI com factor de contracção 0 ≤


s < 1. Seja w0 : H(X ) → H(X ) uma transformação de condensação. Então, a
{X; w0 , w1 , w2 , . . . , wn } chama-se SFI com condensação com factor de contracção
s.

Pode agora adaptar-se o Teorema 4 para sistemas de funções iteradas com conjunto
de condensação:

Teorema 5. Seja (X, d) um e.m. e seja (X; wn : n = 0, 1, 2, . . . , N } um SFI com


condensação com factor de contracção s. Então, a transformação W : H(X ) → H(X )
N
S
definida por W (B) = wn (B), ∀B ∈ H(X ) é uma contracção em (H(X ), h(d)) com
n=0
factor de contracção s.

Demonstração. A demonstração é idêntica à do Teorema 4 já que neste caso se


tem um SFI com N + 1 contracções sendo o factor de contracção de pelo menos uma
delas igual a zero. 

Note-se que o único ponto fixo da função W definida no Teorema anterior é A ∈


H(X ) tal que A = W (A) = N n
S
n=0 Wn (A) e é dado por A = lim W (B), ∀B ∈ H(X ).
n
46 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Exemplo 15 (SFI com Condensação no Plano Complexo). Considere-se o


SFI com condensação: {C; w0 , w1 , w2 } em que:
w0 (B) = T com T = {z ∈ C : − 21 ≤ Re(z) ≤ 1
2
∧ 0 ≤ Im(z) ≤ 10}, ∀B ∈ H(X ),
π π
w1 (x) = 0, 75e 4 i z + 10i e w2 (x) = 0, 75e− 4 i z + 10i
O factor de contracção deste SFI é de 0, 75 e o conjunto que se obtém depois de
cinco iterações do conjunto Bo = T é o que está representado na figura 1.19.

Figura 1.19. Imagem obtida depois de cinco iterações num SFI com con-
junto de condensação.

Poder-se-ia depois modificar alguns parâmetros nas funções e verificar que alterações
isso provoca na imagem obtida. Com SFI’s idênticos ao anterior podem obter-se con-
juntos como os representados na Figura 1.20.
Este é um dos exemplos onde se pode observar a estreita relação existente entre a
Geometria Fractal e a Natureza. Na verdade, e contrariamente à Geometria Euclidiana
que dificilmente terá na Natureza uma fiel representação de algum dos seus objectos, a
Geometria Fractal será talvez aquela que melhor se adequa, de uma forma umas vezes
mais, outras vezes menos grosseira (já que, como foi dito, os fractais no seu estado puro
só existem na mente humana) ao estudo das formas da Natureza: árvores e plantas,
flocos de neve, sistemas de irrigação sanguı́nea e de distribuição de oxigénio, galáxias,
recortes da costa dos continentes, nuvens, relâmpagos, ... e ainda numa multiplicidade
de processos fı́sicos e quı́micos como a cristalização, movimentos de partı́culas num
fluı́do, electrólise, etc. ... 

Exemplo 16 (Série geométrica de ciprestes - um fractal em R2 gerado


por por um SFI com condensação). A imagem representada na Figura 1.21 é
8. O PROBLEMA INVERSO - MODELAÇÃO COM SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 47

Figura 1.20. Imagens de plantas virtuais geradas a partir de Sistemas de


Funções Iteradas com Conjunto de Condensação.

conseguida com o SFI com condensação {R2 ; w0 , w1 } em que: w0 (B) = C, ∀B ∈ H(X ),


com
4 (y − 6)2
C = {(x, y) ∈ R2 : (−0, 5 ≤ x ≤ 0, 5 ∧ 0 ≤ y ≤ 3) ∨ x2 + = 1} e
        9 9
22
x 25
0 x 3
w1 (x, y) = w1   =     +  .
y 0 22
25
y 0
22
O factor de contracção deste SFI é de e o conjunto que se obtém após oito
25
iterações do conjunto Bo = C é o que está representado na Figura 1.21.
Com este tipo de procedimento, utilizando uma árvore mais “verı́dica” e mais al-
gumas contracções, pode conseguir-se a simulação virtual de uma paisagem. 

8. O Problema Inverso - Modelação com Sistemas de Funções Iteradas

Até agora mostrou-se como se constroem (aproximações de) fractais definidos por
sistemas de funções iteradas e um dos resultados conseguidos foi a obtenção de imagens
idênticas às de objectos naturais como os que estão representados na Figura 1.20, página
47 e na Figura 1.18, página 44. O que se pretende ver agora é o processo inverso, isto
48 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Figura 1.21. Simulação de avenida ladeada por árvores, gerada a partir de


um Sistema de Funções Iteradas com Conjunto de Condensação.

é, dada uma imagem de um objecto natural, encontrar um SFI cujo ponto fixo seja a
imagem dada ou algo aproximado. Parte da resposta para este problema é dada pelo
Teorema da Colagem, que dá uma ideia de quão próximo está um conjunto dado do
ponto fixo de um SFI.

Teorema 6 (Teorema da Colagem). Seja (X, d) um e.m. completo. Seja L ∈


H(X) um conjunto dado e seja ε > 0. Escolha-se um SFI (ou um SFI com Con-
densação) {X; (w0 ), w1 ,!w2 , . . . , wN } com factor de contracção 0 ≤ s < 1, de modo
N
S
que h L, wn (L) ≤ ε, onde h(d) é a métrica de Hausdorff. Então, para todo
n=1(n=0)
ε
L ∈ H(X ), h(L, A) ≤ , sendo A o ponto fixo do SFI (ou, de forma equivalente,
1−s !
N
h(L, A) ≤ (1 − s)−1 h L,
S
wn (L) ).
n=1(n=0)

Para demonstrar este Teorema é necessário demonstrar previamente o lema que se


segue.

Lema 5. Seja (X, d) um e.m. completo. Seja f : X → X uma contracção com


factor de contracção 0 ≤ s < 1 e seja xf ∈ X o ponto fixo de f . Então, d(x, xf ) ≤
(1 − s)−1 d(x, f (x)), para todo x ∈ X.
8. O PROBLEMA INVERSO - MODELAÇÃO COM SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 49

Demonstração. Sabe-se, pela Proposição 1, que a função distância a um ponto


dado de X é uma função contı́nua em X. Então, aplicando o Teorema 3, página 27 e
a Proposição 7, página 26, vem que para qualquer x ∈ X
 
d(x, xf ) = d x, lim f n (x) = lim d(x, f n (x))
n→∞ n→∞
n
X
≤ lim d(f (m−1) (x), f (m)(x) )
n→∞
m=1

≤ lim d(x, f (x))(1 + s + · · · + sn−1 ) ≤ (1 − s)−1 d(x, f (x)).


n→∞

Demonstração do Teorema da Colagem. Para demonstrar este Teorema basta usar


N
S
o Lema 5 substituindo f por wn (L), xf por A e x por L pois, pelo Teorema 4,
n=1(n=0)
N
S
página 32, wn (L) é uma contracção de factor de contracção s. 
n=1(n=0)
O Teorema da Colagem diz que para se encontrar um SFI cujo ponto fixo seja
“próximo” ou “se pareça com” um conjunto previamente dado, há que procurar um
conjunto de contracções definidas num espaço métrico adequado, de tal modo que a
reunião (ou a “colagem”) das imagens do conjunto, obtidas através dessas contracções,
seja próxima do conjunto dado. Essa proximidade é medida usando a métrica de Haus-
dorff. Como consequência deste Teorema, tem-se que qualquer compacto não vazio de
Rn pode ser aproximado por um conjunto auto-semelhante de forma tão arbitraria-
mente próxima quanto se queira.
Este Teorema leva à possibilidade de substituir uma imagem real pelo ponto fixo
de un SFI; ou seja, oferece a possibilidade de representar uma imagem através de um
modelo fractal da mesma. Como um conjunto de expressões matemáticas ocupa, em
geral, muito menos espaço na memória de um computador que o conjunto de pixels que
constituem essa imagem, este Teorema leva também à possibilidade de armazenamento
de imagens digitais de forma muito mais económica. Além disso, consegue-se uma
representação da imagem considerada que é independente da resolução, visto que, ao
calcular numericamente o ponto fixo do SFI, é possı́vel realizar iterações sucessivas,
acrescentando progressivamente mais detalhe.[38]
50 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Veja-se agora um exemplo de aplicação do Teorema da Colagem.

Exemplo 17. Pretende-se encontrar um SFI que defina uma imagem semelhante
à folha à esquerda na Figura 1.22. Para tal, efectuou-se uma “colagem” com seis
contracções dessa folha como se mostra na mesma figura, à direita.

Figura 1.22. À esquerda a folha que se pretende representar através do


ponto fixo de um SFI e à direita a imagem dessa folha por seis contracções

diferentes juntamente com o contorno da folha original.

Os coeficientes de cada uma das aplicações são apresentados na Tabela 1.1 (ver a
matriz no Exemplo 14, página 42 e a Figura 1.17, página 43).

Contracção r1 r2 θ1 θ2 e f

w1 0,436 0,595 -8,5 -8,5 0,18 0,55

w2 0,338 0,573 42,9 42,9 0,37 0,42

w3 0,423 0,665 -37 -37 0,22 0,53

w4 0,469 0,672 66,2 66,2 0,62 0,16

w5 0,408 0,804 -42 -42 0,15 0,21

w6 0,713 0,675 2,5 2,5 0,12 0


Tabela 1.1. Coeficientes de cada uma das contracções do Exemplo 17.
8. O PROBLEMA INVERSO - MODELAÇÃO COM SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS 51

Os factores de contracção das seis transformações usadas, w1 , w2 , . . . , w6 , são, res-


pectivamente, s1 = 0, 595, s2 = 0, 573, s3 = 0, 665, s4 = 0, 672, s5 = 0, 804, e s6 =
0, 713. Portanto, o SFI tem factor de contracção s = 0, 804.
De seguida introduziram-se os coeficientes de cada uma das aplicações num soft-
ware 1 para representação gráfica de SFI Deterministas. A distância de Hausdorff entre
a reunião das seis imagens da folha original e a própria folha, representada na Figura
1.22 pela sua fronteira, é de, aproximadamente, 0,85 unidades (tendo a moldura da
imagem 11 unidades de largura e 14 unidades de comprimento). O Teorema da Cola-
gem garante, então, que a distância de Hausdorff h(Euclideana) entre a folha original
0, 85
e o ponto fixo do SFI utilizado será inferior a ≈ 4, 33 unidades, o que não
1 − 0, 804
é nada prometedor... Ainda assim, com este SFI, iniciando-se o processo de iteração
com um quadrado, ao fim de seis iteradas obteve-se a imagem da Figura 1.23 que,
apesar das fracas expectativas, revela alguma semelhança com a folha que se pretendia
representar. 

Figura 1.23. A iteração zero e o resultado obtido ao fim de seis iterações


através de um SFI constituı́do por seis contracções em R2 .

1Deterministic IFS - Applet interactivo disponı́vel em

http://classes.yale.edu/Fractals/Software/detifs.html.
52 1. FRACTAIS DEFINIDOS POR SISTEMAS DE FUNÇÕES ITERADAS

Por norma é fácil a computação necessária para desenhar um objecto recorrendo a


um IFS, dados os parâmetros das contracções e, além disso, pequenas alterações nos
mesmos produzem pequenas alterações nos pontos fixos do IFS. Saliente-se ainda que
as transformações do IFS definem a imagem a escalas arbitrariamente pequenas o que
permite conseguir zooms de pequenas regiões da mesma. A construção de objectos
naturais recorrendo a IFS é, portanto, muito prática e útil, sobretudo se o que se
pretende é uma perspectiva global do objecto. Se, pelo contrário, a alta correlação
entre diferentes partes da imagem for um obstáculo e se, por exemplo, se pretenderem
posições e arranjos diferentes de folhas em cada ramo de uma árvore, então a construção
com recurso a um IFS não servirá de nada. Para além disso, conseguir um conjunto
óptimo de contracções para representar bem um dado objecto, nem sempre é simples.
CAPı́TULO 2

A Dimensão Fractal

53
54 2. A DIMENSÃO FRACTAL
2. A DIMENSÃO FRACTAL 55

Nos “Elementos” de Euclides já se define, implicitamente, o conceito de dimensão.


Diz-se que uma figura tem dimensão 1 se a sua fronteira é composta por pontos; tem
dimensão dois se a sua fronteira é composta por linhas e tem dimensão três se a sua
fronteira for constituı́da por superfı́cies. Se um conjunto for totalmente desconexo,
a sua dimensão topológica é zero. Em geral, um objecto tem dimensão n se a sua
fronteira tiver dimensão n − 1. A dimensão euclidiana de um objecto é sempre um
número inteiro e representa a menor dimensão do espaço em que esse objecto pode
estar inserido.
Das caracterı́sticas que definem um fractal, uma das mais importantes é a dimensão
fractal que representa o nı́vel de irregularidade de um objecto geométrico. A dimensão
fractal de um conjunto pode ser diferente da sua dimensão topológica e, inclusivamente,
pode ser um número não inteiro. Sendo assim, quanto maior a irregularidade de uma
forma, isto é, quanto maior for a densidade do espaço ocupado pelo objecto no espaço
métrico em que se insere, maior é a diferença entre a sua dimensão fractal e a sua
dimensão topológica. Por isso, a dimensão fractal pode ser uma ferramenta útil e
objectiva de comparação entre duas formas fractais. Objectos “pouco irregulares” e
compactos têm, em geral, a dimensão fractal igual à dimensão topológica.
Existem várias definições de dimensão fractal e cada uma tem os seus métodos para
estimar o seu valor. Nem todos os métodos podem ser aplicados a qualquer tipo de
estrutura e em cada caso há que escolher um que seja adequado. É necessário que,
quando se fale de dimensão fractal, se saiba qual é o método de cálculo que está a ser
usado nessa situação. A utilização de definições diferentes de dimensão pode originar a
obtenção de resultados diferentes para um mesmo objecto. A maior parte das definições
de dimensão de um conjunto dependem de uma medição desse conjunto à escala r, que
quantifica a sua irregularidade quando observado a essa escala. A dimensão é, então,
usualmente definida em termos do comportamento da lei potencial dessa medições, à
medida que r tende para zero. De entre as diversas definições de dimensão fractal, as
mais conhecidas e utilizadas são a Dimensão de Hausdorff e a Dimensão de Contagem
56 2. A DIMENSÃO FRACTAL

de Caixas. A primeira porque é baseada em medidas que são relativamente fáceis de


manipular (embora em muitos casos seja difı́cil de calcular ou de estimar, mesmo por
métodos computacionais) e a segunda porque é bastante simples de estimar. Ambas são
matematicamente convenientes por estarem definidas para qualquer conjunto. Estas
duas definições serão aqui apresentas e analisadas.
As dimensões fractais podem ser associadas a objectos reais tais como a superfı́cie
das nuvens e superfı́cies topográficas, árvores e folhas, linhas costeiras, redes de neurónios
e redes de irrigação sanguı́nea, pó no ar num determinado instante, constituição de te-
cidos, a superfı́cie rugosa do mar durante uma tempestade, a superfı́cie de uma célula
cancerı́gena, etc, etc. . . Estes números permitem modelar fractais do mundo real com
fractais de laboratório, tais como os pontos fixos de sistemas de funções iteradas; isto
é, permitem que se modele o mundo fı́sico real. Ter-se-á particular atenção nos sub-
conjuntos compactos de espaços métricos com especial preferência por Rn com a métrica
euclidiana. A assunção da compacidade com que já se trabalhou no Capı́tulo I permite
que os modelos se adaptem melhor aos objectos estudados e que sejam manuseados
teoricamente com alguma facilidade.
A dimensão de Hausdorff é baseada na construção de medida de Carathéodory. As-
sim, far-se-á primeiro essa construção, com a devida apresentação dos conceitos básicos
necessários para tal e só depois será apresentada a definição de dimensão de Hausdorff.
Depois de analisadas algumas das suas propriedades segue-se a apresentação da de-
finição de dimensão de contagem de caixas; o estudo de algumas das suas propriedades
e, finalmente, será feita a comparação entre as duas definições.
A estimativa da Dimensão Fractal determina a complexidade de objectos fractais,
e pode ser estendida para diversas aplicações.
Ao longo de todo o capı́tulo serão apresentados exemplos sempre que se considerar
oportuno.
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 57

1. Construção de uma Medida pelo método de Carathéodory

Para definir dimensão de Hausdorff é necessária a definição de medida de Haudorff,


pelo que antes é necessário definir “medida”. Definir uma medida corresponde a de-
terminar uma forma de atribuir um valor numérico ao “tamanho” de um conjunto,
de modo que se um conjunto for decomposto, respeitando determinadas regras, num
número finito ou numerável de partes, então o “tamanho” do todo é a soma dos “ta-
manhos” das partes. As noções mais intuitivas de medida são as de comprimento, área
e volume de subconjuntos de Rn . Porém, contrariamente ao que a intuição de cada um
possa dizer, há conjuntos que não são mensuráveis, isto é, para os quais não pode ser
definida uma medida.
As σ-álgebras são o ambiente ideal para desenvolver a noção de medida de conjuntos.
Por isso vai usar-se aqui a definição de medida em σ-álgebras.
Todos estes conceitos necessários para chegar à definição de dimensão de Hausdorff
serão agora introduzidos.

Dado um conjunto X não vazio, denota-se por P(X) a colecção de todos os


subconjuntos de X. Matematicamente, será equivalente escrever A ⊂ X ou escre-
ver A ∈ P(X). Além disso, X é subconjunto de si próprio, por isso X ∈ P(X) e
convenciona-se que ∅ ∈ P(X). Para cada A ⊂ X, denota-se por Ac o conjunto X \ A
que se designa por complementar de A em X.

Definição 18. Seja X um conjunto não vazio e M uma colecção de subconjuntos


de X, isto é, M ⊂ P(X). Diz-se que M é uma σ-álgebra em X se se verificarem os
seguintes requisitos:

(1) ∅ ∈ M e X ∈ M.
(2) Se A ∈ M, então Ac ∈ M.
(3) Se {An }n∈N é uma colecção numerável arbitrária de elementos de M, então
S
An também é um elemento de M.
n∈N
58 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Definição 19. Seja X um conjunto não vazio e M uma σ-álgebra em X. Ao par


(X, M) chama-se espaço mensurável.

Definição 20. Seja (X, M) um espaço mensurável. Os subconjuntos A ⊂ X


que são membros da σ-álgebra M dizem-se conjuntos mensuráveis (em relação à
σ-álgebra M).

O conceito de medida será introduzido mais à frente para conjuntos que sejam
mensuráveis. Há que ter em consideração que um conjunto pode ser mensurável em
relação a uma σ-álgebra e não o ser em relação a outra.
De seguida apresentam-se alguns resultados úteis.

Proposição 10. Se A1 , A2 , . . . , An é uma colecção de n elementos de uma σ-


álgebra M, então A1 ∪ A2 ∪ . . . ∪ An é também um elemento de M.

Demonstração. Se se definir Am = ∅ para todo m > n tem-se, pelo item 3 da


S
definição de σ-álgebra, que A1 ∪ A2 ∪ . . . ∪ An = Aa é um elemento de M. 
a∈N

Proposição 11. Seja X um conjunto não vazio. Se M é uma σ-álgebra em X, e


A e B são elementos de M, então A ∩ B também pertence a M.

Demonstração. Sabe-se que A ∩ B = (Ac ∪ B c )c . Pelo item 2 da definição de


σ-álgebra (Definição 18) tem-se que se A e B pertencem a M, então Ac e B c também
são elementos de M, e pela Proposição 10, a sua reunião também o é. Novamente pelo
item 2 já referido, tem-se que o complementar de Ac ∪ B c também pertence a M. 

Proposição 12. Seja X um conjunto não vazio. Se M é uma σ-álgebra em X,


T
e se {An }n∈N é uma colecção numerável de elementos de M, então An também
n∈N
pertence a M.
 c
c
T S
Demonstração. Sabe-se que An = (An ) . Pelo item 2 da definição
n∈N n∈N
de σ-álgebra tem-se que Acn ∈ M para todo n ∈ N. Pelo item 3 vem que a reunião
numerável desses elementos de M também pertence a M e novamente pelo item 2,
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 59

tem-se que o complementar da reunião dos complementares de todos os An também


pertence a M. 

Apresentam-se, de seguida, alguns exemplos muito simples de σ-álgebras.

Exemplo 18. Seja X um conjunto não vazio e M = {∅, X}. Então, M é uma
σ-álgebra em X.
O item 1 da definição de σ-álgebra está automaticamente verificado. O mesmo
acontece com o item 2, visto que X é o complementar de ∅ em X e vice-versa. Também
se verifica o item 3, já que X ∪ ∅ = X, ∅ ∪ ∅ = ∅ e X ∪ X = X e estes são os resultados
possı́veis de reuniões com os elementos de M.
Esta σ-álgebra chama-se σ-álgebra indiscreta ou σ-álgebra trivial e é a menor σ-
álgebra que se pode formar em X. 

Exemplo 19. Seja M = P(X) a colecção de todos os subconjuntos de X. Então,


M é uma σ-álgebra em X.
Verifica-se o item 1 da definição de σ-álgebra porque tanto X como ∅ são elementos
de P(X). Além disso, dados A e B dois subconjuntos de X, então Ac ⊂ X e também
A ∪ B ⊂ X pelo que tanto Ac como a reunião numerável de subconjuntos de X serão
elementos de P(X). Portanto, M é uma σ-álgebra em X.
Esta σ-álgebra chama-se σ-álgebra discreta e é a maior σ-álgebra que se pode formar
em X. 

Exemplo 20. Seja X um conjunto não vazio e A ⊂ X. Então, a colecção M =


{∅, A, Ac , X} é uma σ-álgebra em X.
Visto que (Ac )c = A ficam verificados os items 1 e 2 da definição de σ-álgebra.
Quanto ao item 3, este também fica verificado se se tiver em conta que a reunião de
∅ com qualquer conjunto é igual a esse mesmo conjunto, que a reunião de X com
qualquer elemento de M é igual a X e que A ∪ Ac = X.
Esta σ-álgebra é a menor σ-álgebra em X que contém A. 
60 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Sabendo que cada σ-álgebra consiste num subconjunto de P(X), faz sentido consi-
derar intersecções e reuniões de σ-álgebras. Apresenta-se agora a noção de σ-álgebra
gerada que irá ser necessária um pouco mais adiante.

Proposição 13. Seja X um conjunto não vazio e {Mλ , λ ∈ I} uma colecção de


σ-álgebras em X (cada uma indexada por um elemento λ de um conjunto de ı́ndices I
T
arbitrário). Então, o subconjunto MI de P(X) dado por MI = Mλ é também uma
λ∈I
σ-álgebra em X.

T
Demonstração. Há que ver se MI = Mλ verifica os três items da definição
λ∈I
de σ-álgebra. Como ∅ e X pertencem, por definição de σ-álgebra, a todos os conjuntos
Mλ com λ ∈ I, então também pertencem a MI , ficando o primeiro item resolvido.
Para verificar o segundo item, considere-se que A ⊂ X é um elemento de MI .
Nesse caso, por definição de MI , sabe-se que A ∈ Mλ para todo λ ∈ I. Como Mλ
é uma σ-álgebra, então também se tem que Ac ∈ Mλ , para todo λ ∈ I. Portanto,
T
A∈ Mλ = MI .
λ∈I
O item 3 demonstra-se de forma análoga. Considera-se que {An , n ∈ N} é uma
colecção numerável de elementos de MI ; então {An , n ∈ N} é uma colecção numerável
de elementos de cada Mλ qualquer que seja λ ∈ I. Como, para todo λ ∈ I, Mλ é uma
S
σ-álgebra, então sabe-se que An é também um elemento de cada Mλ e, portanto,
n∈N
T
também é um elemento de Mλ = MI . 
λ∈I

O resultado anterior é importante porque fornece um método para gerar σ-álgebras.

Definição 21. Seja A uma colecção qualquer de subconjuntos de X. A intersecção


de todas as σ-álgebras que contêm A como um subconjunto chama-se σ-álgebra ge-
rada por A e denota-se por M[A].

Assim, cada colecção A de subconjuntos de um conjunto X tem automaticamente


uma σ-álgebra associada: aquela que é gerada por A. Colecções convenientes de sub-
conjuntos de X podem gerar σ-álgebras úteis.
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 61

De entre os muitos tipos de σ-álgebras existentes, têm particular destaque aquelas


que são geradas por topologias, às quais se chama σ-álgebras de Borel e que desem-
penham um papel importante na Teoria da Medida. Estes conceitos irão ser agora
introduzidos e explicados já que depois vão ser necessários para a construção da me-
dida de Hausdorff.

Definição 22. Seja X um conjunto não vazio. Uma colecção τ de subconjuntos


de X (isto é, τ ⊂ P(X)) diz-se uma topologia em X se verificar o seguinte:

(1) ∅ ∈ τ e X ∈ τ .
(2) Se A ∈ τ e B ∈ τ , então A ∩ B ∈ τ .
(3) Se I é um conjunto arbitrário de ı́ndices e Aλ ∈ τ para todo λ ∈ I, então
S
Aλ também é um elemento de τ .
λ∈I

Observe-se que no item 3 da definição anterior, não é feita qualquer restrição ao


conjunto I de ı́ndices, pelo que o mesmo pode ser um conjunto não numerável.

Definição 23. Seja X um conjunto não vazio e τ uma topologia em X. Ao par


(X, τ ) chama-se espaço topológico.

Definição 24. Seja X um conjunto não vazio e τ uma topologia em X. Se A ∈ τ


diz-se que A é um conjunto aberto em relação à topologia τ . Se Ac ⊂ τ , então
A diz-se fechado relativamente à topologia τ .

Note-se que há conjuntos que podem ser simultaneamente abertos e fechados em
relação à mesma topologia. Por exemplo, como ∅ e X pertencem sempre a τ e são o
complementar um do outro, então ∅ e X são sempre abertos e fechados para qualquer
topologia. Note-se também que um conjunto pode ser aberto para uma topologia e não
o ser para outra.

Proposição 14. Seja X um conjunto não vazio e τ uma topologia em X. Se


A1 , . . . , An é uma colecção de n conjuntos abertos em relação à topologia τ , então
A1 ∩ . . . ∩ An é também um conjunto aberto relativamente a essa topologia.
62 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Demonstração. Se A1 , A2 ∈ τ sabe-se, por definição de topologia, que A1 ∩A2 ∈


τ . Agora, se A1 ∩A2 , A3 ∈ τ então (A1 ∩A2 )∩A3 ∈ τ . Repetindo este processo recursivo
mais n − 3 vezes chega-se ao resultado pretendido. 

Apresentam-se agora alguns exemplos muito simples de topologias à semelhança


dos exemplos já apresentados de σ-álgebras.

Exemplo 21. Seja X um conjunto não vazio e τ = {∅, X}. Então, τ é uma
topologia em X.
O item 1 da definição de topologia está automaticamente verificado. O mesmo
acontece com o item 2, visto que ∅ ∩ X = X ∩ ∅ = ∅ ∈ τ . Também se verifica o item
3, já que X ∪ ∅ = X ∈ τ .
Esta topologia chama-se topologia indiscreta ou topologia trivial e é a menor topo-
logia que se pode formar em X. 

Exemplo 22. Seja τ = P(X) a colecção de todos os subconjuntos de X. Então, τ


é uma topologia em X.
Verifica-se o item 1 da definição de topologia porque tanto X como ∅ são elementos
de P(X). Além disso, dados A e B dois subconjuntos de X, então A ∩ B ⊂ X pelo que
A ∩ B é um elemento de P(X). Se I é um conjunto arbitrário de ı́ndices e Aλ ⊂ X para
S
todo λ ∈ I, então Aλ também é um subconjunto de X e, portanto, é um elemento
λ∈I
de τ = P(X).
Esta topologia chama-se topologia discreta e é a maior topologia que se pode formar
em X. 

Exemplo 23. Seja X um conjunto não vazio e A ⊂ X. Então, {∅, A, X} é uma


topologia em X.
O primeiro item da definição de topologia está verificado por definição e tendo em
conta que A ∩ X = A e A ∩ ∅ = ∅ fica também verificado o item 2 da definição de
topologia. Quanto ao item 3, este também fica verificado já que a reunião de ∅ com
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 63

qualquer conjunto é igual a esse mesmo conjunto e a reunião de X com qualquer seu
subconjunto é igual a X.
Esta topologia é a menor topologia em X que contém A. 

Exemplo 24. Seja X um conjunto não vazio e A, B ⊂ X. Então, {∅, A, B, A ∩


B, A ∪ B, X} é uma topologia em X. Esta topologia é a menor topologia em X que
contém A e B. 

No Capı́tulo 1 foi introduzida a definição de conjunto fechado (Definição 10, página


11) num espaço métrico; apresenta-se agora, por ser necessário mais à frente, a definição
de conjunto aberto.

Definição 25. Seja (X, d) um e.m. e A um subconjunto de X. A diz-se um


conjunto aberto em relação à métrica d se para todo x ∈ A existe pelo menos
um número real δ > 0 de modo a que para todo x0 ∈ X tal que d(x, x0 ) < δ tem-se que
x0 também pertence a A.

Note-se que, por definição, o conjunto X é um conjunto aberto em relação à métrica


d. Convenciona-se que ∅ é também um conjunto aberto em relação à métrica d.

Proposição 15. Seja (X, d) um espaço métrico e seja τd a colecção de todos os


subconjuntos abertos de X em relação a d. Então τd é uma topologia.

Demonstração. Tal como já foi dito, X e ∅ são conjuntos abertos em relação à
métrica d, pelo que pertencem a τd .
Sejam A e B dois subconjuntos de X pertencentes a τd . Se A ∩ B = ∅ então
A ∩ B ∈ τd , caso contrário, considere-se x ∈ A ∩ B. Por x ser um elemento de A e
A pertencer a τd , sabe-se que existe pelo menos um valor δ1 > 0 tal que para todo
o elemento x0 de X que esteja a uma distância inferior a δ1 de x se tem x0 ∈ A.
Analogamente, por x ser um elemento de B e B pertencer a τd , sabe-se que existe pelo
menos um valor δ2 > 0 tal que para todo o elemento x0 de X que verifica d(x, x0 ) < δ2
se tem x0 ∈ B. Basta agora escolher δ = min{δ1 , δ2 } e tem-se que todo o elemento de
64 2. A DIMENSÃO FRACTAL

X que diste de x menos que δ será um elemento de A ∩ B. Logo, se A, B ∈ τδ então


A ∩ B ∈ τδ .
Considere-se agora I, um conjunto arbitrário de ı́ndices e {Aλ }λ∈I uma colecção de
Aλ ; então existe pelo menos um λ∗ ∈ I tal que x ∈ Aλ∗ .
S
elementos de τδ . Seja x ∈
λ∈I
E, nesse caso, existe pelo menos um δ > 0 tal que todos os elementos de X que distem
S
de x menos que δ são também elementos de Aλ∗ ⊂ Aλ . Logo, se {Aλ }λ∈I é uma
λ∈I
S
colecção arbitrária de elementos de τδ , então Aλ é também um elemento de τδ . 
λ∈I

Definição 26. Seja (X, d) um espaço métrico. À topologia τd constituı́da pela


colecção de todos os subconjuntos abertos de X em relação à métrica d chama-se to-
pologia induzida pela métrica d.

Definição 27. Seja X um conjunto não vazio e τ uma topologia em X. τ diz-se


uma topologia métrica se existir em X uma métrica d tal que τ = τd .

Exemplo 25. Quando X = R, o conjunto dos números reais, pode definir-se a


topologia métrica definida pela métrica euclidiana d(x, y) = |x − y|. Esta topologia
designa-se por topologia usual da recta, denota-se por τR e é constituı́da pela colecção
de todos os subconjuntos abertos de R em relação à métrica euclidiana.
Para a < b ∈ R, todo o intervalo ]a, b[ é um elemento de τR e todo o intervalo [a, b]
é um conjunto fechado em relação a τR . Veja-se, de seguida, porquê:
]a, b[∈ τR se for aberto para a métrica d. Para qualquer x ∈]a, b[ seja δ = min{d(x, a),
d(x, b)}. Para todo x0 ∈ R tal que d(x, x0 ) < δ vem d(x, x0 ) < d(x, a) e d(x, x0 ) < d(x, b).
Usando estas duas desigualdades tem-se, por um lado, d(x0 , a) ≤ d(x0 , x) + d(x, a) <
d(x, b) + d(x, a) = d(a, b) (porque a < x < b) e, por outro lado, de forma análoga,
d(x0 , b) ≤ d(x0 , x) + d(x, b) < d(x, a) + d(x, b) = d(a, b).
Se as distâncias de x0 a a e de x0 a b são ambas inferiores à distância entre a e b,
então x0 ∈]a, b[. Portanto, ]a, b[ é aberto para a métrica euclidiana e, consequentemente,
]a, b[∈ τR .
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 65

Veja-se agora o caso do conjunto [a, b] cujo complementar é R\[a, b] =]−∞, a[∪]b, +∞[.
Verifique-se que ] − ∞, a[∈ τR . Para isso, seja x ∈] − ∞, a[ e seja δ = d(x, a). Para
qualquer x0 ∈ R tal que d(x, x0 ) < δ vem que x0 < x + d(x, a) = a porque x < a,
donde x0 ∈] − ∞, a[ e, portanto, ] − ∞, a[ é aberto para a métrica d. De forma análoga
também se prova que ]b, +∞[ é aberto para d. Como foi visto na demonstração da
Proposição 15, se ] − ∞, a[ e ]b, +∞[ são ambos abertos para a métrica euclidiana, o
mesmo se poderá dizer de ] − ∞, a[∪]b, +∞[. Então ([a, b])c ∈ τR e [a, b] é fechado em
relação a τR . 

Como cada topologia é, por si, um subconjunto de P(X), então faz sentido consi-
derar reuniões e intersecções de topologias.

Proposição 16. Seja X um conjunto não vazio e {τλ , λ ∈ I} uma colecção de


topologias em X (cada uma indexada por um elemento λ de um conjunto de ı́ndices
T
I arbitrário). Então, o subconjunto τI de P(X) dado por τI = τλ é também uma
λ∈I
topologia em X.

T
Demonstração. Há que ver se τI = τλ verifica os três items da definição de
λ∈I
topologia. Como ∅ e X pertencem, por definição de topologia, a todos os conjuntos τλ
com λ ∈ I, então também se tem que ∅ ∈ τI e que X ∈ τI , pelo que o primeiro item
está resolvido.
Para verificar o segundo item, considere-se que A, B ⊂ X são elementos de τI .
Nesse caso, por definição de τI , sabe-se que A, B ∈ τλ para todo λ ∈ I. Como τλ
é uma topologia, então também se tem que A ∩ B ∈ τλ para todo λ ∈ I. Então,
T
A∩B ∈ τλ = τI , como se pretendia.
λ∈I
O item 3 demonstra-se de forma análoga. Considera-se que {Aµ , µ ∈ J} (onde
J é uma colecção arbitrária de ı́ndices) é uma colecção de elementos de τI ; então
{Aµ , µ ∈ J} é uma colecção de elementos de cada τλ qualquer que seja λ ∈ I. Como,
S
para todo λ ∈ I, τλ é uma topologia, então sabe-se que Aµ é também um elemento
T µ∈J
de cada τλ e, portanto, também é um elemento de τλ = τI . 
λ∈I
66 2. A DIMENSÃO FRACTAL

O resultado anterior é importante porque fornece um método para gerar topologias.

Definição 28. Seja A uma colecção qualquer de subconjuntos de X. A intersecção


de todas as topologias que contêm A como um subconjunto chama-se topologia gerada
por A e denota-se por τ [A].

Assim, cada colecção A de subconjuntos de um conjunto X tem automaticamente


uma topologia associada: a que é gerada por A. Colecções convenientes de subconjun-
tos de X podem gerar topologias úteis.
Existem agora as condições necessárias para definir a σ-álgebra de Borel.

Definição 29. Seja X um conjunto não vazio e τ uma topologia em X. A σ-


álgebra gerada pela topologia τ chama-se σ-álgebra de Borel associada à topologia τ
em X e denota-se por M[τ ]. Os seus elementos chamam-se conjuntos de Borel ou
conjuntos Borelianos.

De outro modo, pode dizer-se que a famı́lia de subconjuntos de Borel de um dado


conjunto X é a menor famı́lia de conjuntos que verifica:

a) Qualquer conjunto aberto é um conjunto de Borel e qualquer conjunto fechado


é um conjunto de Borel.
b) Se A1 , A2 , . . . é uma colecção numerável de conjuntos de Borel, então

S ∞
T
Ai , Ai e A1 \ A2 são conjuntos de Borel.
i=1 i=1

Exemplo 26. A topologia usual da recta, τR , definida no Exemplo 25 que é cons-


tituı́da pela colecção de todos os subconjuntos abertos de R em relação à métrica
euclidiana pode também ser definida de outra forma: seja A a colecção de todos os
intervalos abertos ]a, b[ de R, com a < b. Tem-se que τR = τ [A], isto é, a topologia
usual é equivalente à topologia gerada pela colecção de todos os intervalos abertos de
R.
Já se sabe, pelo Exemplo 25, que A ⊂ τR . Como, por definição, τ [A] é a menor
topologia que contém A, tem-se que τ [A] ⊂ τR . É necessário então provar que τR ⊂
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 67

τ [A]. Pelo item 3 da definição de topologia sabe-se que qualquer topologia que contenha
A contém também as reuniões arbitrárias de elementos de A. Se B é um elemento de
τR então para cada x ∈ B existe um valor δ(x) > 0 tal que se |y − x| < δ, então y ∈ B.
S
Pode portanto escrever-se que B = ]x − δ(x), x + δ(x)[. Como todo o intervalo
x∈B
do tipo ]x − δ(x), x + δ(x)[ é um elemento de A, vem que B, que é uma reunião de
elementos de A, pertence a qualquer topologia que contenha A, nomeadamente a τ [A].
Portanto, τR ⊂ τ [A], como se pretendia. 

Exemplo 27. Os intervalos ]a, b[, [a, b[, ]a, b], com a < b e [a, b], com a ≤ b, são
elementos da σ-álgebra de Borel M[τR ].
Como foi dito no Exemplo 25, página 64, para a, b ∈ R com a < b, tem-se que
]a, b[∈ τR e [a, b] é fechado relativamente a τR . Logo, o complementar de [a, b] é aberto
para τR , isto é, ] − ∞; a[∪]b; +∞[ pertence a τR . Pode então dizer-se que os conjun-
tos ]a, b[ e ] − ∞; a[∪]b; +∞[ são elementos da σ-álgebra gerada por τR - designada
por M[τR ]. Por definição de σ-álgebra, se ] − ∞; a[∪]b; +∞[∈ M[τR ] então também
(] − ∞; a[∪]b; +∞[)c = [a, b] ∈ M[τR ].
Sejam agora [a, b] e ]a0 , b0 [ elementos de M[τR ] tais que a < a0 < b < b0 . Então,
pela Proposição 11, página 58, [a, b]∩]a0 , b0 [=]a0 , b] ∈ M[τR ]. Do mesmo modo, se ]a, b[ e
[a0 , b0 ] são elementos de M[τR ], com a < a0 < b < b0 , então ]a, b[∩[a0 , b0 ] = [a0 , b[∈ M[τR ].
Se a = b, vem [a, b] = {a}. Por outro lado, ({a})c =] − ∞; a[∪]a; +∞[. Usando
de novo o Exemplo 25, página 64, sabe-se que os conjuntos ] − ∞; a[ e ]a; +∞[ per-
tencem a τR que é um subconjunto de M[τR ]. Sendo M[τR ] uma σ-álgebra, então
] − ∞; a[∪]a; +∞[∈ M[τR ], o mesmo acontecendo com o seu complementar; isto é,
{a} ∈ M[τR ]. 

Exemplo 28. Q e o Conjunto de Cantor (definido no Capı́tulo 1, página 38) são


ambos Borelianos.
Como foi visto no Exemplo 27, um conjunto do tipo {a}, com a ∈ R, pertence à
σ-álgebra de Borel M[τR ]. Considerem-se os conjuntos do tipo {a0 }, tais que a0 ∈ Q.
68 2. A DIMENSÃO FRACTAL

{a0 } ∈ M[τR ],
S
Por Q ser numerável e por definição de σ-álgebra tem-se que Q =
a0 ∈Q
ou seja, o conjunto dos números racionais é um conjunto de Borel.
Já o Conjunto de Cantor é não numerável. No entanto, em cada iteração Bk da
sua construção tem-se uma reunião finita de intervalos fechados de R. Portanto cada
conjunto Bk correspondente a cada uma das iterações na construção do Conjunto de
Cantor é um conjunto Boreliano. Como o Conjunto e Cantor é a intersecção numerável
T
Bk então, pela Proposição 12, página 58, conclui-se que o Conjunto de Cantor
k∈N
também é um elemento da σ-álgebra M[τR ], ou seja, é Boreliano. 

Em geral, pode dizer-se que qualquer conjunto que possa ser construı́do, começando
com conjuntos abertos ou fechados e tomando depois reuniões ou disjunções numeráveis
um número finito de vezes, é um Conjunto de Borel. Os subconjuntos de Rn encontra-
dos neste trabalho são, por norma, conjuntos de Borel.
Estão agora criadas as condições necessárias para a introdução do conceito de me-
dida.

Definição 30. Seja X um conjunto não vazio e M uma σ-álgebra em X. Uma


medida em M é uma função µ que associa a cada elemento da σ-álgebra M um
número real não negativo ou +∞, ou seja µ : M → R+
0 ∪ {+∞} tal que:

(1) µ(∅) = 0;
(2) Se {Ai }i∈N é uma colecção numerável e disjunta de elementos de M, então
∞  ∞
S P
µ Ai = µ(Ai ).(Propriedade da aditividade numerável ou σ-aditividade.)
i=1 i=1

Denota-se medida do conjunto A por µ(A).

A noção de medida ultrapassa a noção geométrica de comprimento, área e volume


que, aliás, são conceitos que só se aplicam a alguns sub-conjuntos de Rn . Pode-se,
por exemplo, definir uma medida que conta o número de pontos de um conjunto ou
outra cujo valor para um conjunto seja 1 se ele contiver um determinado elemento
pré-definido, ou 0 no caso contrário. As medidas referentes às noções geométricas
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 69

de comprimento, área, etc. de sub-conjuntos de Rn são conhecidas como medidas de


Lebesgue.
Vejam-se agora algumas propriedades básicas de uma medida decorrentes da
definição anterior. Para tal, considere-se X um conjunto não vazio, M uma σ-álgebra
em X e µ uma medida em M.

Propriedade 1. Se A1 , . . . , An é uma colecção finita de elementos disjuntos de M,


então µ(A1 ∪ . . . ∪ An ) = µ(A1 ) + . . . + µ(An ).
Para obter esta igualdade, tendo em conta que µ(∅) = 0, basta definir Am = ∅
para m > n e aplicar o segundo item da definição de medida.
Propriedade 2. Se A e B são elementos de M tais que A ⊂ B, então µ(A) ≤ µ(B).
Como A ⊂ B, então B = A ∪ (Ac ∩ B) que é uma união disjunta de elementos
de M. Logo, pela propriedade anterior, vem µ(B) = µ(A) + µ(Ac ∩ B). Como
µ(Ac ∩ B) ≥ 0, então µ(A) ≤ µ(B).
Propriedade 3. Se {Aj }, j ∈ N, são elementos de M com Aj ⊂ Aj+1 , para todo
S
j ∈ N, então lim µ(An ) = µ(A), onde A = An .
n→∞ n∈N
Defina-se B1 = A1 e Ba = Aa \ Aa−1 , para a ≥ 2. Então, pelas hipóteses
S
enunciadas tem-se que An = B1 ∪ . . . ∪ Bn e A = Ba sendo as reuniões
a∈N
disjuntas em ambos os casos. Assim, pela propriedade 1 e pelo item 2 da
P
definição de medida, vem que µ(An ) = µ(B1 )+. . .+µ(Bn ) e µ(A) = µ(Ba ),
a∈N
donde µ(A) = lim µ(An ).
n→∞

Propriedade 4. Se {Aj }, j ∈ N, são elementos de M com Aj+1 ⊂ Aj , para todo


T
j ∈ N, e se µ(A1 ) for finito, então lim µ(An ) = µ(A), onde A = An .
n→∞ n∈N
Defina-se Ca = A1 \ Aa . Então, pelas hipóteses enunciadas tem-se Cj ⊂ Cj+1 .
S
Pela propriedade anterior, lim µ(Cn ) = µ(C), onde C = Ca = A1 \ A.
n→∞ a∈N
Tem-se agora que A1 = An ∪ Cn e A1 = A ∪ C, duas reuniões disjuntas.
Portanto, µ(An ) + µ(Cn ) = µ(A) + µ(C). Assim, lim µ(An ) + lim µ(Cn ) =
n→∞ n→∞

µ(A) + µ(C) e, então, lim µ(An ) + µ(C) = µ(A) + µ(C).


n→∞
70 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Como µ(A1 ) é finito, então µ(C) e µ(A) também são finitos (porque são
subconjuntos de A1 ). Subtraindo µ(C) a cada membro da última igualdade
obtém-se o pretendido.

As duas primeiras propriedades são resultados desejados pela noção intuitiva de


medida. A terceira propriedade diz que a medida de um conjunto mensurável pode
ser aproximada “por dentro” pelas medidas de conjuntos mensuráveis, nele contidos,
termos de uma sucessão que convirja para ele. A última propriedade, de forma análoga
à anterior, diz que se um conjunto mensurável tem medida finita, essa pode ser “apro-
ximada por fora” pelas medidas finitas de conjuntos mensuráveis de uma sucessão que
tenda para ele.

Definição 31. Seja X um conjunto não vazio e µ uma medida definida em X.


Se uma determinada afirmação acerca dos elementos de X for falsa apenas para um
subconjunto de X de medida µ nula, diz-se que que essa afirmação vale em quase
toda a parte relativamente a µ ou que é µ-quase em toda a parte. Escreve-se
de forma abreviada como q.t.p. ou µ-q.t.p..

Há vários processos para a construção de medidas que obedeçam a determinadas


caracterı́sticas. Um desses processos é o de Carathéodory que é importante para a
construção da medida de Hausdorff. Para compreender essa construção é necessária a
introdução do conceito de medida exterior. A Teoria da Medida Exterior foi, em grande
parte, desenvolvida por Carathéodory que foi também quem introduziu esse conceito.

Definição 32. Seja X um conjunto não vazio. Uma medida exterior µ em X


é uma função que a cada subconjunto de X associa um número real maior ou igual a
zero, ou infinito, de modo que:

(1) µ(∅) = 0.
(2) Se A ⊂ B então µ(A) ≤ µ(B).
(3) Para qualquer!colecção numerável {Aj , j ∈ N} de subconjuntos de X tem-se
S P
que µ Aj ≤ µ(Aj ).
j∈N j∈N
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 71

Note-se que as medidas exteriores são definidas sobre a totalidade dos subconjuntos
de X, ao contrário das medidas que são definidas apenas sobre σ-álgebras em X.
Outra distinção importante entre uma medida e uma medida exterior é que se A
for um conjunto e A1 e A2 forem dois subconjuntos próprios tais que A = A1 ∪ A2 , há
casos em que µ(A) 6= µ(A1 ) + µ(A2 ). Isto contraria a noção intuitiva de medida de
um conjunto. E, pela definição de medida apresentada atrás (Definição 30, página 68),
isto nunca acontece com uma medida µ, se A, A1 e A2 forem elementos da σ-álgebra
dos conjuntos mensuráveis por µ.
Relativamente a µ, se A1 e A2 são dois subconjuntos de X, tem-se que µ(A1 ∪A2 ) ≤
µ(A1 ) + µ(A2 ). (Para confirmar isto basta considerar, no terceiro item da definição de
medida exterior em X, Aj = ∅, para j > 2.)
A proposição que se segue será importante para a construção da medida de Haus-
dorff.

Proposição 17. Se {µλ , λ ∈ Λ} for uma famı́lia de medidas exteriores em X,


então µ definida por µ = sup µλ é também uma medida exterior em X.
λ∈Λ

Demonstração. Há que verificar se µ obedece aos três items da definição de


medida exterior.
Como µλ (∅) = 0, para todo λ ∈ Λ, então µ(∅) = sup{µλ (∅)} = 0.
λ∈Λ
Sejam agora A e B dois subconjuntos de X tais que A ⊂ B. Como, por definição
de medida exterior, µλ (A) ≤ µλ (B), para todo λ ∈ Λ, então µ(A) = sup{µλ (A)} ≤
λ∈Λ
sup{µλ (B)} = µ(B).
λ∈Λ
Finalmente, seja {An , n ∈ N} uma colecção numerável de subconjuntos de X.
Como, novamente por definição de medida exterior, se tem, para cada λ ∈ Λ, que
      
S P S S
µλ An ≤ µλ (An ), então µ An = sup µλ An ≤
n∈N
 n∈N n∈N λ∈Λ n∈N
P P P
≤ sup µλ (An ) ≤ sup {µλ (An )} = µ(An ). 
λ∈Λ n∈N n∈N λ∈Λ n∈N

O conceito de medida exterior será agora utilizado no Teorema de Carathéodory.


72 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Teorema 7 (Teorema de Carathéodory). Seja X um conjunto não vazio, µ uma


medida exterior em X e Mµ a colecção de todos os subconjuntos A de X que tenham
a seguinte propriedade:

Para todo E ⊂ X tem-se µ(E) = µ(E ∩ A) + µ(E ∩ Ac ). (2.1)

Então, Mµ é uma σ-álgebra e a restrição µ de µ a Mµ é uma medida.

Este Teorema, embora pouco intuitivo, é importante porque fornece um método


para a construção de medidas. É que por vezes é mais fácil construir primeiro a medida
exterior sobre um conjunto X do que uma medida, já que isso implicaria a definição
prévia de uma σ-álgebra conveniente. O Teorema permite exibir a tal σ-álgebra Mµ
para a qual µ é uma medida. Para a demonstração deste Teorema será necessário
provar previamente o resultado que se segue.

Lema 6. Seja X um conjunto não vazio e Mµ a colecção de todos os subconjuntos


de X que tenham a propriedade indicada no Teorema anterior. Se A1 , . . . , An é uma
colecção finita de n elementos de Mµ , então, A1 ∪ . . . ∪ An também é um elemento de
Mµ , qualquer que seja n ∈ N.

Demonstração. Prove-se primeiro para o caso n = 2. Para tal é necessário


verificar que µ(E) = µ(E ∩ (A ∪ B)) + µ(E ∩ (A ∪ B)c ), qualquer que seja o subconjunto
E de X. Dado um subconjunto qualquer E de X, seja E 0 = (A∪B)∩E. Como A ∈ Mµ
tem-se que

µ(E 0 ) = µ(E 0 ∩ A) + µ(E 0 ∩ Ac ),

isto é,

µ((A ∪ B) ∩ E) = µ((A ∪ B) ∩ E ∩ A) + µ((A ∪ B) ∩ E ∩ Ac ).


1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 73

Mas,

(A ∪ B) ∩ E ∩ A = (A ∪ B) ∩ (E ∩ A) =

= (A ∩ (E ∩ A)) ∪ (B ∩ (E ∩ A)) =

= (E ∩ A) ∪ (B ∩ (E ∩ A)) = E ∩ A.

porque B ∩ (E ∩ A) ⊂ E ∩ A. E também,

(A ∪ B) ∩ E ∩ Ac = [(A ∩ Ac ) ∪ (B ∩ Ac )] ∩ E = B ∩ Ac ∩ E.

Donde,

µ((A ∪ B) ∩ E) = µ(A ∩ E) + µ(B ∩ Ac ∩ E). (2.2)

Por outro lado, como A é um elemento de Mµ tem-se que µ(E) = µ(A ∩ E) +


µ(Ac ∩ E); aplicando nesta segunda parcela o facto de B também ser um elemento de
Mµ vem que µ(E) = µ(A ∩ E) + µ(Ac ∩ E ∩ B) + µ(Ac ∩ E ∩ B c ). Aplicando agora aos
dois primeiros termos do segundo membro a igualdade (2.2) e aplicando ao terceiro o
facto de Ac ∩ B c = (A ∪ B)c obtém-se µ(E) = µ((A ∪ B) ∩ E) + µ(E ∩ (A ∪ B)c ), como
se pretendia demonstrar.
Aplicando agora o método da indução matemática obtém-se o que se pretende. 

Demonstração do Teorema de Carathéodory. Em primeiro lugar demonstrar-se-á


que o conjunto Mµ é uma σ-álgebra. Para tal, considere-se A um elemento de Mµ
e E um subconjunto qualquer de X. Para ver se Ac também pretence a Mµ há que
confirmar se esse conjunto obedece à propriedade que define Mµ no enunciado do
Teorema. Ora, tendo em conta que (Ac )c = A tem-se que

µ(E ∩ (Ac )) + µ(E ∩ (Ac )c ) = µ(E ∩ (Ac )) + µ(E ∩ (A)

que é igual a µ(E) por hipótese, porque A ∈ Mµ . Por outro lado, como ∅ é o comple-
mentar de X e vice-versa e como também se tem E∩X = E, E∩∅ = ∅ e µ(∅) = 0, então
vem que µ(E) = µ(E ∩ ∅) + µ(E ∩ ∅c ) que é equivalente a µ(E) = µ(E ∩ X c ) + µ(E ∩ X)
e, portanto, fica provado que ∅ e X pertencem a Mµ .
74 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Mµ verifica, portanto, os dois primeiros items da definição de σ-álgebra. Para


demonstrar que também verifica o terceiro item, convém provar previamente que, se
A e B forem dois elementos de Mµ o mesmo acontece com A ∩ B e A \ B. Ora,
A ∩ B = (Ac ∪ B c )c . Pelo que foi visto no inı́cio desta demonstração sabe-se que Ac
e B c pertencem a Mµ . Pelo lema 6 tem-se que Ac ∪ B c também pertence a Mµ , logo
A ∩ B ∈ Mµ . Por outro lado, A \ B = A ∩ B c . Como A e B c são elementos de Mµ
então, pelo que foi visto agora, também A ∩ B c = A \ B está em Mµ .
Verifique-se então agora que Mµ obedece à terceira propriedade da definição de
σ-álgebra. Pretende-se demonstrar que se {Aj , j ∈ N} é uma colecção numerável de
elementos de Mµ , então A0 =
S
Aj também o é. Sendo E um subconjunto genérico de
j∈N
X, tem-se sempre que E = (E ∩ A0 ) ∪ (E ∩ A0c ), pelo que µ(E) ≤ µ(E ∩ A0 ) + µ(E ∩ A0c )
por µ ser uma medida exterior. Basta provar que µ(E) ≥ µ(E ∩ A0 ) + µ(E ∩ A0c ) para
demonstrar que A0 ∈ Mµ .
Sabe-se que, para qualquer sub-conjunto E 0 de X e para qualquer elemento A de
Mµ se tem, por definição de Mµ , que

µ(E 0 ) = µ(E 0 ∩ A) + µ(E 0 ∩ Ac ). (2.3)

Considere-se E 0 da forma

E 0 = (A ∪ B) ∩ E, (2.4)

com E ⊂ X e A, B ∈ Mµ com A ∩ B = ∅. Como (A ∪ B) ∩ E ∩ A = [(A ∩ E) ∪


(B ∩ E)] ∩ A = (A ∩ E ∩ A) ∪ (B ∩ E ∩ A) = (A ∩ E) ∪ ∅, porque A ∩ B = ∅, então,
(A ∪ B) ∩ E ∩ A = A ∩ E; e também,(A ∪ B) ∩ E ∩ Ac = [(A ∩ Ac ) ∪ (B ∩ Ac )] ∩ E =
B ∩ Ac ∩ E = B ∩ E porque, se A ∩ B = ∅, então Ac ∩ B = B; então, de (2.3) e de (2.4)
vem que µ((A ∪ B) ∩ E) = µ(A ∩ E) + µ(B ∩ E). Daqui pode retirar-se em particular
que, se B1 , . . . , Bn são elementos disjuntos de Mµ , então µ(E ∩ (B1 ∪ . . . ∪ Bn )) =
µ(E ∩ B1 ) + . . . + µ(E ∩ Bn ).
Defina-se, para n ≥ 2, B1 = A1 e Bn = An \ (A1 ∪ . . . ∪ An−1 ). Tem-se que para
n
S n
S
todo i, j ∈ {1, . . . , n} com i 6= j, Bj é elemento de Mµ , Bi ∩ Bj = ∅ e Bk = Ak .
k=1 k=1
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 75

Tem-se ainda, pelo Lema 6, que se B1 , . . . , Bn é uma colecção finita de n elementos de


n
S
Mµ , então Bk também é um elemento de Mµ e, portanto,
k=1

n
!! n
!c !
[ [
µ(E) = µ E ∩ Bk +µ E∩ Bk , (2.5)
k=1 k=1

n
P
para todo E ⊂ X, sendo a primeira parcela da adição igual a µ(Bk ∩ E) porque os
k=1
conjuntos Bk são disjuntos dois a dois.
Se se considerar agora uma colecção numerável de conjuntos {Bk0 , k ∈ N} em que
n
 n c
0 0
S S 0 S
Bk = Bk , para k = 1, . . . , n tem-se que Bk ⊂ Bk e, portanto, Bk ⊃
 c k=1 k∈N k=1
S 0
Bk . Daı́ vem que
k∈N

n
!c ! !c !
[ [
µ E∩ Bk ≥µ E∩ Bk0 .
k=1 k∈N

Voltando à equação (2.5) tem-se agora que


n
!c !
X [
µ(E) ≥ µ(Bk ∩ E) + µ E ∩ Bk0 .
k=1 k∈N

Como esta desigualdade é válida para qualquer n ∈ N, então também se tem que

!c !
X [
µ(E) ≥ µ(Bk0 ∩ E) + µ E ∩ Bk0 . (2.6)
k=1 k∈N

Mas a primeira parcela da adição, pela definição de medida exterior, é maior ou igual
    
S 0 S 0
que µ (Bk ∩ E) que, por sua vez, é igual a µ E ∩ Bk .
k∈N k∈N
Das duas últimas desigualdades obtém-se, finalmente, que
!! !c !
[ [
µ(E) ≥ µ E ∩ Bk0 +µ E∩ Bk0
k∈N k∈N

     c  n
Bk0 =
S S S
que é o mesmo que µ(E) ≥ µ E ∩ Ak +µ E ∩ Ak porque
k∈N k∈N k=1
n
S n
S
Bk = Ak . Está, então, demonstrado que Mµ é uma σ-álgebra.
k=1 k=1
Falta agora provar a segunda parte do Teorema que diz que a medida exterior µ
é uma medida quando restrita aos elementos da σ-álgebra Mµ . Para isso, há que
76 2. A DIMENSÃO FRACTAL
 
S P
demonstrar que µ Bk =
µ(Bk ). De (2.6) e tendo em conta que para qual-
k∈N k∈N c 

 
0
P S
quer k ∈ N, Bk = Bk , vem que µ(E) ≥ µ(Bk ∩ E) + µ E ∩ Bk ≥
     c  k=1 k∈N
S S
µ E∩ Bk +µ E∩ Bk = µ(E), pelo que se obtém a igualdade
k∈N k∈N

  c
P S
µ(E) = µ(Bk ∩ E) + µ E ∩ Bk para todo E ⊂ X; em particular, esta
k=1 k∈N
S
igualdade é válida para E = Bk . Fazendo essa substituição na expressão anterior
  k∈N
S P
vem µ Bk = µ(Bk ) que era o que se pretendia. 
k∈N k∈N
Está demonstrado o Teorema de Carathéodory que será utilizado na construção da
medida de Hausdorff.

Definição 33. Seja X um conjunto não vazio, M uma σ-álgebra em X e µ uma


medida em M. Diz-se que µ é uma medida completa se todos os elementos A de
M com medida nula verificam o seguinte: se B ⊂ A, então B ∈ M.

Por outras palavras, uma medida em M é completa se todos os subconjuntos de


um conjunto de medida nula forem mensuráveis relativamente a M.
O Teorema que se segue relaciona medidas completas com o Teorema de Ca-
rathéodory.

Teorema 8. Seja µ uma medida exterior em X, um conjunto não-vazio. Sejam


Mµ e µ a σ-álgebra e a medida associadas a µ pela construção de Carathéodory. Então,
µ é completa.

Demonstração. Considerem-se as condições enunciadas no Teorema e sejam A,


B e E subconjuntos de X tais que B ⊂ A, com µ(A) = 0. Pretende-se mostrar que B
é µ-mensurável. Então, pelo segundo item da definição de medida exterior têm-se as
seguintes desigualdades

µ(E ∩ B) ≤ µ(E ∩ A) ≤ µ(A) = µ(A) = 0, (2.7)

µ(E ∩ B c ∩ A) ≤ µ(A) = µ(A) = 0, (2.8)


1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 77

µ(E ∩ A) ≤ µ(A) = µ(A) = 0, (2.9)

porque E ∩ B está contido em E ∩ A e os conjuntos E ∩ B, E ∩ B c ∩ A e E ∩ A estão


todos contidos em A.
Verifique-se agora que B é µ-mensurável. De (2.7) vem que µ(E ∩ B) + µ(E ∩ B c ) =
µ(E ∩ B c ). Aplicando agora o facto de A ser µ-mensurável vem que µ(E ∩ B c ) é igual
a µ(E ∩ B c ∩ Ac ) + µ(E ∩ B c ∩ A), que é o mesmo que µ(E ∩ (B ∪ A)c ) + µ(E ∩ B c ∩ A),
que se resume a µ(E ∩ Ac ) porque B está contido em A e por (2.8). Como, por (2.9),
µ(E ∩ A) = 0, então também se pode escrever que µ(E ∩ Ac ) = µ(E ∩ Ac ) + µ(E ∩ A)
que é igual a µ(E) porque A é µ-mensurável. Assim, estabeleceu-se que para todo
E ⊂ X se tem µ(E) = µ(E ∩ B) + µ(E ∩ B c ) e, portanto, B é µ-mensurável e µ é uma
medida completa. 

Discutir-se-á agora a classe de medidas exteriores que são definidas em conjuntos


dotados de uma métrica e que tenham uma relação “cordial” com a topologia in-
duzida por essa métrica - as chamadas medidas exteriores métricas. O Teorema de
Carathéodory, por si só, não diz que conjuntos são mensuráveis. A grande importância
das medidas exteriores métricas reside no facto, demonstrado mais à frente, de que
todo conjunto o Boreliano (em relação à topologia induzida pela métrica) é mensurável
no sentido de Carathéodory, ou seja, satisfaz a condição do Teorema de Carathéodory.
Assim, a σ-álgebra dos conjuntos mensuráveis por uma medida exterior métrica contém
a σ-álgebra de Borel, isto é, provar-se-á que os Conjuntos de Borel são mensuráveis no
sentido de Carathéodory.

Definição 34. Seja X um conjunto não vazio dotado de uma métrica d. Dados
dois conjuntos A, B ⊂ X define-se a distância entre A e B, denotada por d∗ (A, B),
da seguinte forma: d∗ (A, B) = inf{d(a, b), a ∈ A, b ∈ B}.

Note-se que esta definição é diferente e não equivalente às definições de “distância
de A a B” (Definição 5, página 7) e de “distância de Hausdorff entre A e B” (Definição
78 2. A DIMENSÃO FRACTAL

6, página 8) introduzidas no Capı́tulo 1. Além disso, é fácil verificar que d∗ não é uma
métrica em P(X) (basta ver que para dois conjuntos A e B diferentes entre si, mas de
intersecção não vazia não se tem d∗ (A, B) > 0).

Proposição 18. Seja X um conjunto não vazio dotado de uma métrica d e sejam
A e B dois subconjuntos de X tais que d∗ (A, B) > 0. Então, as aderências de A e de
B não têm pontos em comum, isto é, ad(A) ∩ ad(B) = ∅.

Demonstração. Sejam A e B dois subconjuntos de X tais que d∗ (A, B) =


inf{d(a, b), a ∈ A, b ∈ B} > 0 e considere-se que existe c ∈ ad(A) ∩ ad(B). Nesse
caso existe também uma sucessão de Cauchy {an }n∈N de pontos A que converge
para c e existe uma sucessão {bn }n∈N de pontos B que também converge para c.
Então, pela propriedade da desigualdade triangular de d tem-se, para todo n ∈ N
que d(an , bn ) ≤ d(an , c) + d(c, bn ). Como o segundo membro desta desigualdade tende
para zero quando n tende para ∞ e como d(an , bn ) ≥ 0 para todo n ∈ N, obtém-se que
d(an , bn ) também tende para zero quando n tende para ∞, o que contraria a hipótese de
d∗ (A, B) = inf{d(a, b), a ∈ A, b ∈ B} > 0. Portanto, se a distância entre dois conjuntos
é positiva, a intersecção das suas aderências é vazia. 

Definição 35. Uma medida exterior µ em X diz-se uma medida exterior métrica
(em relação à métrica d) se para todos os conjuntos A, B ⊂ X tais que d∗ (A, B) > 0
se tiver µ(A ∪ B) = µ(A) + µ(B).

Definição 36. Seja X um conjunto não vazio e {An }n∈N uma sucessão de sub-
conjuntos de X. Designa-se por limite máximo da sucessão de conjuntos e
representa-se por limAn o conjunto de todos os elementos de X que pertencem a uma
infinidade de conjuntos da sucessão; designa-se por limite mı́nimo da sucessão de
conjuntos e representa-se por limAn o conjunto de todos os elementos de X que per-
tencem a todos os conjuntos da sucessão a partir de certa ordem em diante. Quando
coincidam os limites máximo e mı́nimo de uma sucessão de conjuntos, ao conjunto
comum chama-se limite da sucessão de conjuntos e representa-se por lim An .
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 79

Definição 37. Uma sucessão {An }n∈N de conjuntos diz-se crescente, ou ex-
pansiva, se An ⊂ An+1 para todo n ∈ N. Uma sucessão {An }n∈N de conjuntos diz-se
decrescente, ou contractiva, se An ⊃ An+1 para todo n ∈ N.

Proposição 19. Se uma sucessão de conjuntos {An }n∈N for crescente ou decres-

S
cente então lim An existe. Se {An }n∈N é crescente, tem-se lim An = Ak . Se {An }n∈N
k=1

T
é decrescente, então lim An = Ak .
k=1

Demonstração. Seja {An }n∈N uma sucessão crescente de conjuntos. Então,



T ∞ T
S ∞ ∞
S
Ak = An Logo, limAn = Ak = An . Por outro lado, pelo facto de An ser
k=n n=1 k=n n=1

S ∞
S ∞ S
T ∞ ∞ S
T ∞ ∞
S
crescente tem-se que Ak = Ak . Logo, limAn = Ak = Ak = Ak .
k=n k=1 n=1 k=n n=1 k=1 k=1

S
Assim, limAn = limAn e, portanto, lim An existe e é igual a Ak .
k=1
A demonstração para o caso das sucessões decrescentes é análoga. 

O lema técnico que se segue tem consequências importantes a respeito da mensu-


rabilidade de conjuntos Borelianos, assunto que se irá tratar logo a seguir.

Lema 7. Sejam X um conjunto não vazio dotado de uma métrica d, τd a topologia


em X induzida por d e µ uma medida exterior métrica em X. Seja {An }n∈N uma
sucessão crescente de subconjuntos de X tal que d∗ (An , A \ An+1 ) > 0 para todo n ∈ N,
S  
onde A = lim An = Am . Então, µ lim An = lim µ(An ).
n→∞ m∈N n→∞ n→∞

Demonstração. Defina-se uma nova sucessão {Bn , n ∈ N} de subconjuntos de


X de modo que B1 = A1 , Bk = Ak \ Ak−1 , k ≥ 2. Por definição vem que

Bk ⊂ Ak para todo k ∈ N (2.10)

e que,
para l − k ≥ 2, Bl ⊂ A \ Ak+1 (2.11)

porque Bl = Al \ Al−1 ⊂ A \ Al−1 ⊂ A \ Ak+1 sendo que a última relação se deve ao


facto de Al−1 ⊃ Ak+1 . Então,

para todos k e l com l − k ≥ 2 tem-se d∗ (Bk , Bl ) > 0 (2.12)


80 2. A DIMENSÃO FRACTAL

porque d∗ (Bk , Bl ) = inf{d(x, y), x ∈ Bk , y ∈ Bl } que, por (2.10) e por (2.11) é maior
que
inf {d(x, y), x ∈ Ak , y ∈ A \ Ak+1 } isto é, que d∗ (Ak , A \ Ak+1 ), que é positiva por
hipótese. Por definição de medida exterior métrica, vem de (2.12) que µ(B1 ∪ B3 ) =
µ(B1 )+µ(B3 ), µ(B2 ∪B4 ) = µ(B2 )+µ(B4 ) e, por indução matemática, tem-se também
que

m
! m m
! m
[ X [ X
µ B2a−1 = µ (B2a−1 ) e µ B2a = µ (B2a ) para todo m ≥ 1.
a=1 a=1 a=1 a=1
(2.13)
Há dois casos a considerar:

(1) Pelo menos uma das somas em (2.13) diverge quando m → ∞;


(2) Ambas as somas em (2.13) convergem quando m → ∞.

No primeiro caso observe-se que

k
[
para todo k ∈ N, Ak = Ba . (2.14)
a=1

k
S k
S
Logo, para todo k ∈ N tem-se A2k−1 ⊃ B2a−1 e A2k ⊃ B2a . Portanto, µ (A2k−1 ) ≥
 k  a=1 a=1  k 
S k
P S
µ B2a−1 que, por (2.13), é igual a µ (B2a−1 ) e µ (A2k ) ≥ µ B2a que, no-
a=1 a=1 a=1
k
P
vamente por (2.13), é igual a µ (B2a ) .
a=1
Consequentemente, se qualquer das somas em (2.13) divergir quando m → ∞ ter-
se-á lim µ (An ) = ∞, o que implica µ(A) = ∞ porque se A ⊃ An para todo n, então
n→∞

µ(A) ≥ µ(An ), também para todo n. Nesse caso ter-se-ı́a, então, µ(A) = lim µ(An ) =
n→∞

∞, provando o lema nas condições do caso 1.



S ∞
S
Veja-se agora o segundo caso. De (2.14) vem que A = Aa = Aj ∪ Ba para
a=1 a=j+1
qualquer j. Logo,


! ∞
! ∞
[ [ X
µ(A) = µ Aj ∪ Ba ≤ µ(Aj ) + µ Ba ≤ µ (Aj ) + µ(Ba ), (2.15)
a=j+1 a=j+1 a=j+1
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 81

sendo a última soma convergente, por hipótese. Pela mesma razão, tem-se que

X
lim µ(Ba ) = 0
j→∞
a=j+1

e, portanto, de (2.15) vem que

µ(A) ≤ lim µ(Aj ). (2.16)


j→∞

Do facto de A ⊃ An para todo n, segue que µ(A) ≥ µ(An ), donde

µ(A) ≥ lim µ(An ). (2.17)


n→∞

Daqui, (2.16) e (2.17) implicam a conclusão da demonstração do lema para as condições


do caso 2. 

Teorema 9. Sejam X um conjunto não vazio dotado de uma métrica d, τd a


topologia em X induzida por d e µ uma medida exterior métrica em X. Então M[τd ] ⊂
Mµ , isto é, os conjuntos Borelianos de X (segundo a topologia τd ) são mensuráveis
para a medida exterior métrica µ.

Demonstração. É suficiente demonstrar que todo aberto A ∈ τd satisfaz a condição


de mensurabilidade de Carathéodory (2.1), página 72, para todo E ⊂ X, pois isso ga-
rantirá que τd ⊂ Mµ , o que implica que M[τd ] ⊂ Mµ . Para tal, é suficiente provar que
µ(E) ≥ µ(E ∩ A) + µ(E ∩ Ac ) para todo A ∈ τd e todo E ⊂ X, pois a desigualdade
oposta, µ(E) ≤ µ(E ∩ A) + µ(E ∩ Ac ), é sempre satisfeita por uma medida exterior µ.
Para cada m ∈ N, seja Em ⊂ E ∩ A o conjunto
 
1 c
Em = x ∈ E ∩ A : d(x, y) ≥ para todo y ∈ A .
m
1
Para todo x ∈ Em e para todo y ∈ E ∩ Ac tem-se d(x, y) ≥ m
porque E ∩ Ac ⊂ Ac e,
1
portanto, d(Em , E ∩ Ac ) ≥ m
para todo m ∈ N. Logo, por µ ser uma medida exterior
métrica, tem-se

µ (Em ∪ (E ∩ Ac )) = µ(Em ) + µ(E ∩ Ac ). (2.18)


82 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Porém, como Em ⊂ E ∩ A, vem que Em ∪ (E ∩ Ac ) ⊂ (E ∩ A) ∪ (E ∩ Ac ) = E e,


portanto, µ (Em ∪ (E ∩ Ac )) ≤ µ(E). Assim, por (2.18) tem-se que

para todo m ∈ N, µ(E) ≥ µ(Em ) + µ(E ∩ Ac ). (2.19)

Se se provar que lim µ(Em ) = µ(E ∩A), ter-se-á por (2.19) que µ(E) ≥ µ(E ∩A)+
m→∞
c
µ(E ∩ A ) o que completará esta demonstração. Para estabelecer a relação pretendida,
percorrer-se-ão três passos sucessivos.
O primeiro passo é provar que
[
E∩A= Em . (2.20)
m∈N

Prove-se isto agora. Sabe-se que para todo m ∈ N se tem Em ⊂ E ∩ A e, portanto,


S
Em ⊂ E ∩A. Por outro lado, se x ∈ E ∩A então existe r(x) > 0 tal que todo z ∈ X
m∈N
com d(z, x) < r(x) também pertence a A, pois, por hipótese, A é aberto relativamente
a τd . Logo, para todo y ∈ Ac tem-se obrigatoriamente que d(y, x) ≥ r(x). Assim, se
1
x ∈ E ∩A existe algum m grande o suficiente tal que d(y, x) ≥ para todo y ∈ Ac . Isso
m
S
equivale a dizer que se x ∈ E ∩ A, então x ∈ Em para algum m. Logo, E ∩ A ⊂ Em ,
m∈N
o que prova (2.20).
O segundo passo é demonstrar que,

lim Em = E ∩ A. (2.21)
m→∞

Ora, como a sucessão de conjuntos Em é crescente, ou seja, Em ⊂ Em0 para todos


m ≤ m0 , tem-se que
S
Em = lim Em ; daqui e de (2.20), sai imediatamente (2.21).
m∈N m→∞

No terceiro passo demonstra-se que

para todo m ∈ N se verifica d (Em , (E ∩ A) \ Em+1 ) > 0. (2.22)

De facto, se z ∈ (E ∩ A) \ Em+1 então, pela definição de Em+1 , existe pelo menos


um ponto y ∈ Ac tal que d(z, y) < 1/(m + 1). Além disso, para qualquer x ∈ Em
1
ter-se-á pela definição de Em que d(x, y) ≥ m
.
Da desigualdade triangular de d vem
1 1
que d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y) e, portanto, que d(x, z) ≥ d(x, y) − d(z, y) > − .
m m+1
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 83

1
Assim, d∗ (Em , (E ∩ A) \ Em+1 ) = inf {d(x, z), x ∈ Em , z ∈ (E ∩ A) \ Em+1 } > −
m
1
> 0, o que prova (2.22).
m+1
Por (2.21), por (2.22) e pelo Lema 7, tem-se µ(E ∩ A) = lim µ(Em ).
m→∞

Logo, de (2.19) vem que µ(E) ≥ lim µ(Em ) + µ(E ∩ A ) = µ(E ∩ A) + µ(E ∩ Ac ),
c
m→∞

o que completa a demonstração. 

Definição 38. Seja X um conjunto não vazio e A um subconjunto não vazio de


X. Seja B = {Bn ⊂ X, n ∈ N} uma colecção numerável de subconjuntos de X. B
S
diz-se um recobrimento numerável de A se A ⊂ Bn .
n∈N
Convenciona-se que {∅} é um recobrimento numerável de ∅.

Apresenta-se agora um esquema para a construção de medidas exteriores que será


aplicável na construção da medida de Hausdorff.

Proposição 20. Seja X um conjunto não vazio e seja R ⊂ P(X) uma colecção
não vazia de subconjuntos de X tal que ∅ ∈ R. Denote-se por GR a colecção de todos
os subconjuntos numeráveis de R. Considere-se a função h : R → R+
0 ∪ {∞} tal que

h(∅) = 0. Defina-se a função H : GR → R+


0 ∪ {∞} da seguinte forma: para cada
P
R = {Rn ∈ R, n ∈ N} ∈ GR tem-se H(R) = h(Rn ). Então:
Rn ∈R
(1) H(∅) = 0.
 
b b
H(Rb ).
S P
(2) Se R ∈ GR para todo b ∈ N, então H R ≤
  b∈N b∈N
S b
(H R está bem definida porque uma reunião numerável de conjuntos
b∈N
numeráveis é também numerável.)

Demonstração. Tem-se ∅ ∈ R. A colecção {∅}n∈N = {∅} ∈ GR . H(∅) =


P
h(∅) = 0 porque h(∅) = 0. Passe-se agora à demonstração do segundo ponto. Se
n∈N
R ∈ GR , então é da forma Rb = {Rnb ∈ R, n ∈ N}. Logo,
b
S b
R = {Rnb ∈ R, n ∈
  b∈N
S b P0 0
h(Rnb ) sendo
P
N, b ∈ N}. Portanto, H R = a soma feita entre elementos
b∈N
distintos de {Rnb ∈ R, n ∈ N}. Então, 0 h(Rnb ) ≤ h(Rnb ) = H(Rb ), como se
P P P P
b∈N n∈N b∈N
pretendia. 
84 2. A DIMENSÃO FRACTAL

O Teorema seguinte descreve um esquema para a construção de medidas exteriores.

Teorema 10. Seja X um conjunto não vazio. Suponha-se que existe uma colecção
não vazia R ⊂ P(X) de subconjuntos de X com as seguintes propriedades:

(1) ∅ ∈ R.
(2) Se GR denota a colecção de todos os subconjuntos numeráveis de R, então
existe uma função H : GR → R+
0 ∪ {∞} com as seguintes propriedades:

(a) H({∅}) = 0.
 
b b
H(Rb )
S P
(b) Se R ∈ GR para todo b ∈ N, então H R ≤
b∈N b∈N
(3) Todo o subconjunto A de X possui pelo menos um recobrimento numerável por
elementos de R. Denote-se por CR (A) ∈ GR a colecção (não vazia) de todos
os recobrimentos numeráveis de A por elementos de R

Com isto, defina-se para cada A ⊂ X, µ(A) ≡ µR (A) = inf{H(R), R ∈ CR (A)}.


Então, a aplicação µ : P(X) → R+
0 ∪ {∞}, definida acima, é uma medida exterior

em X.

Alguns comentários antes da demonstração:

(1) Cada R ∈ CR (A) é uma colecção numerável do tipo {Bn ∈ R, n ∈ N} de


S
elementos de R tais que Bm ⊃ A.
Bm ∈R
(2) Como CR (A) ∈ GR , então CR (A) pertence ao domı́nio da função H.
(3) Se {Rb , b ∈ N} for uma colecção numerável de elementos de CR (A), então
S b
R é também um elemento de CR (A):
b∈N

[
Rb ∈ CR (A), ∀b ∈ N ⇒ Rb ∈ CR (A).
b∈N

(4) No Teorema 10 a função H desempenha um papel especial, pois µ é definida


como o ı́nfimo entre certos valores de H. Em algumas situações, como é o
caso da medida de Hausdorff, a função H é definida a partir de uma função h,
dotada de significado geométrico, definida em R como descrito na Proposição
20.
1. CONSTRUÇÃO DE UMA MEDIDA PELO MÉTODO DE CARATHÉODORY 85

Demonstração. É necessário provar que µ verifica os três items da definição de


medida exterior; veja-se a Definição 32, página 70.
Quanto ao primeiro item, como {∅} é um recobrimento numerável de ∅, então
H({∅}) = 0 e, por definição de µ, tem-se que µ(∅) = 0, já que uma medida não toma
valores inferiores a zero.
Passando à verificação do segundo item, considere-se A e B dois subconjuntos X tais
que A ⊂ B. Então, CR (B) ⊂ CR (A) porque qualquer colecção R ∈ R que recobre B
também recobre qualquer subconjunto de B. Então inf {H(R)} ≤ inf {H(R)},
R∈CR (A) R∈CR (B)
ou seja, µ(A) ≤ µ(B).
 
S P
Falta provar o terceiro item, isto é, que µ Ai ≤ µ (Ai ) onde Ai ⊂ X para
i∈N i∈N
todo i ∈ N. Para isso, observe-se previamente que se A é um subconjunto qualquer de
X, então, pela definição de ı́nfimo de um conjunto de números, é possı́vel encontrar,
para qualquer número real r > 0, pelo menos um elemento R de CR (A) tal que H(R) ≤
µ(A) + r. Assim, fixado ε > 0, existe para cada b ∈ N um Rb ∈ CR (Ab ) tal que

ε
H(Rb ) ≤ µ(Ab ) + . (2.23)
2b

Rb é também uma colecção numerável de conjuntos


S
Sabe-se que a colecção J =
b∈N  
S S
que cobre o conjunto Ai e que, por isso, pertence a CR Ai . Assim, por de-
i∈N i∈N

b
P
finição de H, tem-se que H(J ) é menor ou igual a H(R ) que, por (2.23), é menor
b=1
P∞  ε P
ou igual a µ(Ab ) + b , que é o mesmo que µ(Ab ) + ε.
b=1  2 b∈N
S
Como J ∈ CR Ai , segue que
i∈N
! ( !)
[ [ X
µ Ai = inf H(R), R ∈ CR Ai ≤ H(J ) ≤ µ(Ab ) + ε.
i∈N i∈N b∈N
 
S P
Como isto é válido para qualquer ε > 0, então µ Ai ≤ µ(Ab ), que é o que
i∈N b∈N
faltava para provar que µ é uma medida exterior. 

Os dois últimos resultados (a Proposição 20 e o Teorema 10 indicam os ingredientes


necessários para a construção de uma medida exterior em X - a saber: uma colecção R
86 2. A DIMENSÃO FRACTAL

de subconjuntos de X e uma função positiva h, definida em R - que devem satisfazer


as condições dessa proposição e desse Teorema.

2. Medida e Dimensão de Hausdorff

Vai agora proceder-se à construção da medida de Hausdorff. A construção do


conceito de medida foi feita no contexto geral dos espaço métricos; porém, nesta secção,
a medida de Hausdorff será introduzida nos espaços Rn com a métrica usual já que são
estes os espaços que contêm a maior parte dos fractais que interessa estudar. Portanto,
doravante, e quando nada for dito em contrário, considera-se X = Rn , d a métrica
euclidiana e τd a topologia induzida em Rn por essa métrica.
Depois de construı́da a medida de Hausdorff, será definida a dimensão de Hausdorff.

2.1. A Medida de Hausdorff.

Definição 39. Seja R um subconjunto não vazio do espaço euclidiano Rn . Chama-


se diâmetro de R a |R| = sup{|x − y| : x, y ∈ R}.

O diâmetro de um conjunto é, portanto, em limite, a maior distância que pode obter-
se entre dois pontos seus. Para o conjunto vazio, convenciona-se que o seu diâmetro é
zero.

Definição 40. Seja A um subconjunto não vazio de Rn e {Ri } uma colecção finita
ou numerável de subconjuntos não vazios de Rn de diâmetro menor ou igual a δ, isto
S
é, 0 < |Ri | ≤ δ, ∀i. Diz-se que {Ri } é um recobrimento-δ de A se A ⊂ Ri .
i

Rn munido da métrica euclidiana é um espaço métrico no qual todo o seu subcon-


junto possui pelo menos um recobrimento-δ, qualquer que seja δ > 0. Basta pensar em
Rn coberto por uma rede de “cubos” de diâmetro δ. Dado A ⊂ Rn , um recobrimento-δ
possı́vel para A é aquele constituı́do pelos “cubos” dessa rede que intersectam A.
É necessário agora, para δ > 0 fixo, definir os ingredientes que satisfazem as
condições da Proposição 20 e do Teorema 10.
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 87

(1) Uma colecção de conjuntos Rδ de Rn : Seja Rδ a colecção de todos os subcon-


juntos de Rn com diâmetro menor ou igual a δ. Rδ = {R ⊂ Rn : |R| ≤ δ}
Considera-se que ∅ ∈ Rδ .
(2) Uma função positiva hs definida em Rδ , para s ≥ 0: Para cada R ∈ Rδ , seja
hs (R) = |R|s . Define-se também hs (∅) = 0.
(3) Para cada subconjunto A de Rn , uma colecção CRδ (A) de recobrimentos nu-
meráveis de A por elementos de Rδ : Seja CRδ (A) a colecção de todos os
recobrimentos de A por colecções numeráveis de sub-conjuntos de Rn com
diâmetro menor ou igual a δ.

Note-se que CRδ (A) é, portanto, a colecção de todos os recobrimentos-δ de A por
elementos de Rn e inclui recobrimentos-δ finitos: como ∅ ∈ Rδ , basta considerar que um
recobrimento-δ finito é um recobrimento-δ numerável em que apenas uma quantidade
finita de elementos da colecção que o constitui é diferente do conjunto vazio.
Ora, com os elementos que agora se definiram e com o facto de todo o subconjunto
de Rn possuir um recobrimento-δ, a Proposição 20 e o Teorema 10 garantem que

µδ,s
H (A) = inf{Hs (R), R ∈ CRδ (A)} =
( )
X
= inf hs (Rn ), R ∈ CRδ (A) =
(2.24)
Rn ∈R
( )
X
= inf |Rn |s , R ∈ CRδ (A)
Rn ∈R

definida para todo A ⊂ Rn , é uma medida exterior em Rn . De uma forma mais simples
e de modo a aliviar a notação, agora que o conceito de medida está explanado, pode
escrever-se
( )
X
µδ,s
H (A) = inf |Rn |s : {Rn } é um recobrimento-δ de A (2.25)
n

Ou seja, consideram-se todos os recobrimentos de A de conjuntos com diâmetro menor


ou igual a δ e procura-se o ı́nfimo das somas das s-potências dos diâmetros dos conjuntos
que constituem cada um desses recobrimentos.
88 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Pela proposição 17,

µsH (A) = sup µδ,s


H (A)
δ>0

= sup inf {Hs (R), R ∈ CRδ (A)}


δ>0
( )
X (2.26)
= sup inf hs (Rn ), R ∈ CRδ (A)
δ>0
Rn ∈R
( )
X
s
= sup inf |Rn | , R ∈ CRδ (A) ,
δ>0
Rn ∈R

definida para todo A ⊂ Rn , é também uma medida exterior em Rn , denominada


medida exterior de Hausdorff de dimensão s. Simplificando a notação escreve-se
( )
X
µsH (A) = sup inf |Rn |s : {Rn } é um recobrimento-δ de A . (2.27)
δ>0 n

Os resultados que se seguem revelam algumas propriedades das medidas exteriores


de Hausdorff e a próxima proposição fornece uma definição alternativa e útil da medida
exterior de Hausdorff de dimensão s ≥ 0.

Proposição 21. Para cada s ≥ 0 e todo A ⊂ Rn tem-se que se 0 < δ1 < δ2 , então
µδH1 ,s (A) ≥ µδH2 ,s (A). Logo, para todo A ⊂ Rn ,

µsH (A) = lim µδ,s


H (A) =
δ→0

= lim inf{Hs (R), R ∈ CRδ (A)} =


δ→0 (2.28)
( )
X
= lim inf hs (Rn ), R ∈ CRδ (A) .
δ→0
Rn ∈R

Demonstração. Quanto menor for δ, menos recobrimentos-δ de A existem por-


que a classe dos recobrimentos-δ1 de A está contida na classe dos recobrimentos δ2 de
A, sempre que δ1 ≤ δ2 ; portanto, o ı́nfimo µδ,s
H (A) aumenta. Isto é, se δ1 < δ2 então

Rδ1 ⊂ Rδ2 , porque todo o recobrimento-δ1 é também um recobrimento-δ2 . Logo, para


todo A ⊂ Rn tem-se que CRδ1 (A) ⊂ CRδ2 (A) e, portanto, inf{Hs (R), R ∈ CRδ1 (A)} ≥
inf{Hs (R), R ∈ CRδ2 (A)}, o que significa que µδH1 ,s (A) ≥ µδH2 ,s (A). Portanto, µδ,s
H (A)
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 89

cresce à medida que δ tende para zero, pelo que tomar o supremo de µδ,s
H (A) é o equi-

valente a determinar o lim µδ,s


H (A). Este existe e pode ser zero ou finito ou infinito. 
δ→0

Antes de se explorarem as consequências da proposição anterior, prove-se o resul-


tado que se segue, que será importante para a discussão da noção de dimensão Hausdorff
de um conjunto.
 
Proposição 22. Para todo δ > 0 e para cada A ⊂ Rn tem-se que δ −t µδ,t
H (A) ≥
 
δ −u µδ,u
H (A) sempre que 0 ≤ t ≤ u.

Demonstração. Por definição, todo conjunto R ∈ Rδ tem diâmetro menor ou


|R|
igual a δ donde, evidentemente, 0 ≤ ≤ 1. Como se escolheu atrás, tem-se, para
δ
s ≥ 0, hs (R) = |R|s . Portanto, para cada R ∈ Rδ a função de s, h∗s (R), definida para
 s
∗ −r |R|
s ≥ 0 por hs (R) = δ hs (R) = é decrescente. Portanto, h∗t (R) ≥ h∗u (R),
δ
ou seja, δ −t ht (R) ≥ δ −u hu (R) sempre que 0 ≤ t ≤ u. A conclusão pretendida segue
imediatamente a partir da definição (2.24). 

É possı́vel agora afirmar o seguinte:

Proposição 23. Para cada s ≥ 0, a medida exterior de Hausdorff de dimensão s


definida por
( )
X
µsH (A) = sup inf |Rn |s : {Rn } é um recobrimento-δ de A , para todo A ⊂ Rn
δ>0 n

ou por
( )
X
µsH (A) = lim inf |Rn |s : {Rn } é um recobrimento-δ de A , para todo A ⊂ Rn
δ→0
n

é uma medida exterior métrica.

Demonstração. Recorde-se a definição de medida exterior métrica (Definição 35,


página 78). Suponha-se que A e B são dois subconjuntos de Rn tais que d∗ (A, B) = ε,
com ε > 0. Se R é um recobrimento-δ de A ∪ B e se δ é escolhido de forma a ser menor
que ε, então pode afirmar-se que R é a reunião de três conjuntos disjuntos: RA , RB
e R0 , sendo RA um recobrimento de A que não intersecta B, RB um recobrimento de
90 2. A DIMENSÃO FRACTAL

B que não intersecta A e R0 que não intersecta nem A nem B. Se assim não fosse,
existiria um aberto em R que intersectaria A e B, o que só seria possı́vel se o seu
diâmetro fosse maior que ε.
Note-se que RA ∈ CRδ (A), que RB ∈ CRδ (B) e que R0 pode ser vazio. Tem-se,
portanto,
X X X X
hs (Rn ) = hs (Rn ) + hs (Rn ) + hs (Rn )
Rn ∈R Rn ∈RA Rn ∈RB Rn ∈R0

porque RA , RB e R0 são conjuntos disjuntos. Logo,


X X X
hs (Rn ) ≥ hs (Rn ) + hs (Rn ).
Rn ∈R Rn ∈RA Rn ∈RB
P
Assim, para todo δ tal que 0 < δ < ε, ao tomar o ı́nfimo de hs (Rn ) para
Rn ∈R
todos os elementos R de CRδ (A ∪ B), podem restringir-se aos conjuntos da forma
R = RA ∪ RB , como descrito acima, com R0 vazio. Daqui vem que

µδ,s
H (A ∪ B) = inf{Hs (R), R ∈ CRδ (A)} + inf{Hs (R), R ∈ CRδ (B)} =

= µδ,s δ,s
H (A) + µH (B).

Então, passando ao limite quando δ → 0 obtém-se

µsH (A ∪ B) = lim µsH (A ∪ B) = lim µδ,s δ,s s s


H (A) + lim µH (B) = µH (A) + µH (B).
δ→0 δ→0 δ→0

Portanto, µsH é uma medida exterior métrica. 

Na posse da construção e dos factos acima descritos e evocando o Teorema de Ca-


rathéodory (Teorema 7), o Teorema 8 e o Teorema 9 retiram-se as conclusões expressas
a seguir:

Teorema 11 (A Medida de Hausdorff de Dimensão s ≥ 0). Para cada s ≥ 0,


considere-se no e.m. Rn com a métrica usual, a medida exterior µsH definida por

µsH (A) = lim µδ,s


H (A) =
δ→0
(
X
) (2.29)
= lim inf |Rn |s : {Rn } é um recobrimento-δ de A ,
δ→0
n
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 91

para todo A ⊂ Rn . Seja MµsH a σ-algebra formada por todos os conjuntos A ⊂ Rn


mensuráveis segundo Carathéodory, ou seja, que satisfazem µsH (E) = µsH (E ∩ A) +
µsH (E ∩ Ac ) para todo E ⊂ Rn . A restrição de µsH a MµsH define uma medida, denotada
por µsH , denominada medida de Hausdorff de dimensão s. Essa medida é com-
pleta e todo conjunto Boreliano de Rn segundo τd , a topologia induzida pela métrica
euclidiana, é mensurável, ou seja M[τd ] ⊂ MµsH para todo s ≥ 0.

Definição 41. A medida µsH restrita a M[τd ] denomina-se medida de Borel-


Hausdorff e denota-se por µsH .

Note-se que M[τd ] não depende de s e, portanto, faz sentido perguntar como varia
com s a medida de um conjunto Boreliano fixo. A proposição que se segue fornece
algumas respostas.

Proposição 24. Seja E ∈ M[τd ]. Então são válidas as seguintes afirmações:

(1) µsH1 (E) ≥ µsH2 (E) sempre que 0 ≤ s1 ≤ s2 < ∞. 



∞, se 0 ≤ s < t

(2) Se existir t ≥ 0 tal que 0 < µtH (E) < ∞, então µsH (E) = .

0, se s > t

Demonstração. Por definição, todo conjunto R ∈ Rδ tem diâmetro menor ou


igual a δ. Logo, se 0 < δ < 1 vem 0 ≤ |R| < 1 para todo R ∈ Rδ . Consequentemente,
para δ fixo e 0 < δ < 1 e para cada R ∈ Rδ , a função de s definida para s ∈ [0, +∞[
por hs (R) = |R|s é decrescente, ou seja, hs1 (R) ≥ hs2 (R) sempre que 0 ≤ s1 ≤ s2 .
Logo, pela definição (2.25) de µδ,s δ,s1
H , tem-se para 0 < δ < 1 e 0 ≤ s1 ≤ s2 que µH (E) ≥

µδ,s n s δ,s
H (E), para todo E ⊂ R . Pela definição (2.28) tem-se µH (E) = lim µH (E) para
1

δ→0

todo s ≥ 0 e, portanto, segue que µsH1 (E) ≥ µsH2 (E) sempre que 0 ≤ s1 ≤ s2 < ∞ já
que δ se torna menor que 1 quando tende para zero.
Pela Proposição 22, sabe-se que para todo δ > 0 e sempre que 0 ≤ s ≤ t se
 
δ,s
tem µH (E) ≥ δ s−t
µH (E) . Neste caso, se µtH (E) = lim µδ,t
δ,t
H (E) for não-nulo, o
δ→0

limite µsH (E) = lim µδ,s


H (E) será infinito. Se s > t, também pela Proposição 22, vem
 δ→0 
µδ,s
H (E) ≤ δ s−t µδ,t
H (E) , para todo δ > 0. Neste caso, se µtH (E) = lim µδ,t
H (E) < ∞
δ→0
92 2. A DIMENSÃO FRACTAL

tem-se µsH (E) = lim µδ,s t


H (E) = 0 sempre que s > t. Assim, se 0 < µH (E) < ∞ para
δ→0

algum t > 0 vem µsH (E) = ∞ para todo 0 ≤ s < t e µsH (E) = 0 para todo s > t. 

2.2. A Dimensão de Hausdorff. A partir da Proposição 24 define-se o seguinte:

Definição 42. Seja E um subconjunto borelianode Rn . Se existir um número



∞, se 0 ≤ s < dim (E)
H

s
dimH (E) com 0 ≤ dimH (E) ≤ ∞ tal que µH (E) = , e

0, se dimH (E) < s < ∞

com 0 < µsH (E) < ∞ para s = dimH (E), ao número dimH (E), que é único, chama-se
dimensão Hausdorff do conjunto Boreliano E.

O gráfico de µsH (E) em função de s, na Figura 2.1 mostra que existe um valor crı́tico
da variável onde µsH (E) “salta” de ∞ para 0; a esse valor crı́tico chama-se dimensão
de Hausdorff de E e representa-se por dimH (E).

Figura 2.1. Gráfico de µsH em função de s.

Tem-se dimH (E) = inf{s : µsH (E) = 0} = sup{s : µsH (E) = ∞} porque


∞ se s < dimH E

s
µH (E) =

0 se s > dimH E

e se s = dimH (E), então µsH (E) pode ser 0 ou ∞ ou 0 < µsH (E) < ∞.

Exemplo 29. Seja A um conjunto de k pontos distintos em (Rn , Euclidiana). Então


µ0H (A) = k e µpH (A) = 0, para p > 0.
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 93

µ0H (A) = lim µδ,0 |Rn |0 : {Rn } é recobrimento-δ de A}.


P
H (A) = lim inf{
δ→0 δ→0 n
Como A é constituı́do por k pontos distintos de Rn , para δ suficientemente pequeno
serão necessários k subconjuntos distintos de Rn para formar um recobrimento-δ de
A (note-se que δ pode ser tão pequeno quanto se queira, mas não zero porque, por
definição de recobrimento-δ, toma-se δ 0) e tem-se:
k
µ0H (A) = lim inf{ |Rn |0 : {Rn } é recobrimento-δ de A} = k.
P
δ→0 n=1
Seja p > 0.

µpH (A) = lim µδ,p


H (A) =
δ→0
k
X
= lim inf{ |Rn |p : {Rn } é recobrimento-δ de A} =
δ→0
n=1
k
X
= 0p = 0.
n=1

Além disso, já se sabia pela Proposição 24 que, se µ0H = k < ∞, então µpH (A) = 0
para todo p > 0. Portanto, dimH (A) = 0. 

Exemplo 30. Se A é um conjunto infinito e numerável de pontos distintos em


(Rn , Euclidiana), então, µ0H (A) = ∞ e µpH (A) = 0, para p > 0.
Basta substituir no exemplo anterior k por +∞. Obtém-se µ0H (A) = +∞ e µpH (A) =
0 para p > 0. Como µsH (A) só está definida para s ≥ 0, então também se tem neste
caso que dimH (A) = 0. 

Portanto, se A é um conjunto finito ou numerável de pontos distintos de


(Rn , Euclidiana), então µ0H (A) é igual ao número de pontos de A e esse conjunto tem
dimensão de Hausdorff igual a zero.
A seguinte proposição é útil:

Proposição 25. Se E1 e E2 são conjuntos Borelianos e E1 ⊂ E2 , então dimH (E1 ) ≤


dimH (E2 ).

Demonstração. Como µsH é uma medida em M[τd ] para todo s ≥ 0, tendo


E1 ⊂ E2 , vem que µsH (E1 ) ≤ µsH (E2 ). Quando µsH (E2 ) = 0 para algum s segue que
94 2. A DIMENSÃO FRACTAL

µsH (E1 ) = 0 para o mesmo s, porque uma medida não toma valores negativos. Assim,
a dimensão de Hausdorff de E1 que é o valor de s em que µsH (E1 ) “salta” de ∞ para
0, será sempre igual, ou inferior, à dimensão de Hausdorff de E2 . 

Note-se que, para um espaço métrico X em geral, é possı́vel haver conjuntos com
dimensão de Hausdorff infinita. Porém, no caso em que X = Rn com a métrica
Euclidiana usual, pode provar-se que dimH (E) ≤ n para todo o Boreliano E ⊂ Rn .
Isso será discutido de seguida, após a introdução de uma definição que será necessária.

Definição 43. Em Rn com a métrica euclidiana, chama-se cubo compacto a um


conjunto K da forma K = [a1 ; a1 + 1] × . . . × [an ; an + 1], com a1 , . . . , an ∈ R.

Em R, K é um intervalo unitário; em R2 , K é um quadrado de lado 1 e em R3 , K



é um cubo com 1 de aresta. O diâmetro de K ⊂ Rn é n.

Proposição 26. Considere-se o espaço métrico Rn com a métrica usual. Seja K ⊂


Rn um cubo compacto. Então, µnH (K) < ∞ e, portanto, dimH (K) ≤ n, dimH (Rn ) ≤ n
e dimH (E) ≤ n para todo o Boreliano E ⊂ Rn .

Demonstração. K é um Boreliano de Rn por ser fechado. Tomando um número


inteiro positivo m e dividindo a aresta de K em m partes iguais, pode escrever-se K
como uma união de mn cubos fechados, cada um de aresta m1 . O diâmetro de cada um
√ √
desses cubos fechados menores é m1 n. Logo, se δ > m1 n, o conjunto dos mn cubos
√ n n
forma um recobrimento-δ de K pelo que, pela definição, µδ,n
H (K) ≤ m
n 1
m
n = n2.
n n
Como n 2 não depende de m, conclui-se que µδ,n
H (K) ≤ n para todo δ > 0 e, portanto,
2

n
µnH (K) ≤ n 2 < ∞ para qualquer n ∈ N. Pela Proposição 24 vem, então, que µsH (K) =
0 para todo s > n, pelo que dimH (K) ≤ n. Como Rn é a soma numerável de cubos
fechados limitados (compactos), segue também que µsH (Rn ) = 0 para todo s > n e,
portanto, que dimH (Rn ) ≤ n, donde, pela Proposição 25, dimH (E) ≤ n para todo o
Boreliano E ∈ Rn . 
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 95

Portanto, todo o conjunto Boreliano de Rn tem uma dimensão Hausdorff finita e


menor ou igual a n. A dimensão Hausdorff pode assumir valores não-inteiros. Ver-se-ão
exemplos disso em breve.
As medidas de Hausdorff generalizam as ideias comuns de comprimento, área, vo-
lume, etc.
Haverá interesse em perceber o que acontece à medida de uma conjunto quando
este é transformado por uma aplicação, em particular por uma aplicação que verifica
a condição de Hölder de expoente α.

Definição 44. Seja F ⊂ Rn e f : F → Rm uma aplicação. Diz-se que f verifica


a condição de Hölder de expoente α se |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|α , ∀x, y ∈ F para
constantes c > 0 e α > 0.

Proposição 27. Se f é uma aplicação que verifica a condição de Hölder de expo-


ente α então f é contı́nua.

Demonstração. Pretende-se mostrar que para qualquer δ > 0, existe um valor


ε > 0 tal que, se |x − y| < ε, então |f (x) − f (y)| < δ. Ora, se f é uma aplicação que
verifica a condição de Hölder para determinados c > 0 e α > 0 então, dado δ > 0,
q
basta escolher ε = α δc e, sempre que |x − y| < ε tem-se que |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|α <
c εα = δ. 

Proposição 28. Seja F ⊂ Rn e f : F → Rm uma aplicação que verifica a


condição de Hölder de expoente α para constantes c > 0 e α > 0. Então, para cada
s s
s, µHα (f (F )) ≤ c α µsH (F ).

Demonstração. Se {Ri } for um recobrimento-δ de F , então, como para qual-


quer dos conjuntos Ri se tem |f (F ∩ Ri )| ≤ c|Ri |α vem que {f (F ∩ Ri )} é um
s s P
recobrimento-ε de f (F ), sendo ε = c δ α . Assim, |Ri |s e,
P
|f (F ∩ Ri )| α ≤ c α
i i
ε, s s
portanto, µH α (f (F )) ≤c α µδ,s
H (F ). Quando δ tende para zero, o mesmo acontece com
s s
ε, o que origina µH (f (F )) ≤ c α µsH (F ).
α

96 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Definição 45. Uma aplicação f : F ⊂ Rn → Rm que verifica a condição de Hölder


de expoente α = 1 diz-se uma aplicação de Lipschitz. Nesse caso, para quaisquer
dois elementos x e y de F tem-se |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y|, com c > 0.

Uma contracção (veja-se a Definição 13, página 22) é uma aplicação de Lipschitz
em que 0 < c < 1.

Definição 46. Uma aplicação f : F ⊂ Rn → Rm que verifica c1 |x − y| ≤


|f (x) − f (y)| ≤ c2 |x − y| , ∀x, y ∈ F , onde 0 < c1 ≤ c2 < ∞ diz-se uma aplicação
bi-Lipschitz.

Corolário 1. Seja F ⊂ Rn e f : F → Rm uma aplicação.

a) Se f é uma transformação de Lipschitz, então µsH (f (F )) ≤ cs µsH (F ).


b) Se f : F → Rm é uma aplicação bi-Lipschitz, então cs1 µsH (F ) ≤ µsH (f (F )) ≤
cs2 µsH (F ).

Demonstração. Para demonstrar a) basta substituir α por 1 na Proposição 28.


A demonstração de b) é idêntica à da Proposição 28 fazendo α = 1 e invertendo os
sinais de desigualdade. 

Corolário 2 (Propriedade do Redimensionamento à Escala). Se F ⊂ Rn e λ > 0,


então µsH (λF ) = λs µsH (F ) onde λF = {λx : x ∈ F }, isto é, o conjunto F redimensio-
nado pelo factor λ .

Demonstração. Basta considerar f : F ⊂ Rn → Rn tal que f (x) = λx. Tem-se


que, para quaisquer x, y ∈ F, |f (x) − f (y)| = λ|x − y| donde f é uma aplicação de
Lipschitz em que c = λ. Pelo Corolário 1 tem-se que µsH (λF ) ≤ λs µsH (F ). Para obter
a desigualdade contrária, basta considerar a aplicação g : λF → Rn tal que g(x) = λ1 x.
Então, g é uma aplicação de Lipschitz com c = λ1 e, novamente pelo Corolário 1, tem-se
s
µsH ( λ1 λF ) ≤ λ1 µsH (λF ), isto é, µsH (λF ) ≥ λs µsH (F ). 

Definição 47. Uma função f : F ⊂ Rn → Rn diz-se uma semelhança se |f (x) −


f (y)| = c|x − y|, com c > 0, quaisquer que sejam x, y ∈ F.. Em particular,
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 97

Semelhança de razão λ

Comprimento → λ× Comprimento
Área → λ2 ×Área
Volume → λ3 ×Volume
µsH → λs × µsH

Figura 2.2. Relação entre medidas de figuras semelhantes.

a) se c = 1, f diz se uma isometria (tem-se |f (x) − f (y)| = |x − y| quaisquer


que sejam x, y ∈ F );
b) se c < 1, f diz-se, uma redução;
c) se c > 1, f diz-se, uma ampliação.

A c dá-se o nome de razão de semelhança.

As reduções são casos particulares de contracções.

Corolário 3. Se f é uma isometria, então, µsH (f (F )) = µsH (F ).

Demonstração. Basta considerar c1 = c2 = 1 no Corolário 1 ou considerar λ = 1


no Corolário 2. 

Isto significa que as medidas de Hausdorff são invariantes para as isometrias como
é o caso da translação e da rotação.
Apresentam-se agora dois exemplos onde serão utilizados alguns dos resultados
demonstrados.

Exemplo 31. Seja C o conjunto Poeira de Cantor no quadrado unitário. Em cada


1
iteração, da construção cada quadrado dá lugar a quatro quadrados com lado igual a 4

do comprimento do lado dos quadrados da iteração anterior, tal como mostra a Figura

2.3. Então, 1 ≤ µ1H (C) ≤ 2, donde dimH (C) = 1.
98 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Figura 2.3. As primeiras três iterações na construção do conjunto Poeira de Cantor.

Tomando o recobrimento-δ óbvio para C constituı́do pelos 4k quadrados de lado



4−k (e portanto com diâmetro δ = 4−k 2) de Ek , a k-ésima iteração da construção

do conjunto, obtém-se a estimativa µδ,1
H ≤ 4k −k
4 2. Quando k tende para infinito, δ

tende para zero e obtém-se µ1H ≤ 2.
Para se conseguir um ı́nfimo de µ1H considere-se a projecção ortogonal no eixo das
abcissas, denotada por proj. A projecção ortogonal não aumenta as distâncias, isto
é, |projx − projy| ≤ |x − y| para todo x, y ∈ R2 . Portanto, proj é uma aplicação de
Lipschitz. Considera-se que E0 é o quadrado unitário com o vértice inferior esquerdo
coincidente com a origem de um referencial ortonormado cujos semi-eixos positivos
contêm os dois lados do quadrado adjacentes a esse vértice. Pela forma como C é
construı́do, a projecção de C no eixo Ox é o intervalo [0, 1]. Pelo Corolário 1 vem
µ1H (f (C)) ≤ 11 µ1H (C), isto é, 1 = µ1H ([0, 1]) ≤ µ1H (C), porque µ1H ([0, 1]) corresponde

ao comprimento de [0, 1]. Portanto, 1 ≤ µ1H (C) ≤ 2, pelo que dimH (C) = 1.
O mesmo se manteria se o processo de divisão de E0 fosse o de obter m2 quadrados
1
de lado m
, retendo um quadrado de cada coluna.
Usar a projecção ortogonal para minimizar a medida de Hausdorff é um truque
que só funciona em circunstâncias especiais e não é a base de um método mais geral.
Normalmente conseguir um mı́nimo dá muito mais trabalho do que neste exemplo.[2]


Exemplo 32. Seja C o Conjunto de Cantor em [0, 1]. Como foi visto no Exemplo
11 do Capı́tulo 1, página 38, C é compacto e é totalmente desconexo (veja-se a Definição
53 na página 104). O seu processo de construção está ilustrado na Figura 2.4.
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 99

Figura 2.4. As primeiras quatro iterações na construção do Conjunto de Cantor.

Inicia-se com o intervalo [0, 1] e cada conjunto Bk correspondente à k-ésima iteração


k
é constituı́do por 2k intervalos de diâmetro igual a 31 .
Ver-se-á em seguida que µ0H (C) = ∞ e que µ1H (C) = 0, donde se conclui que o
conjunto de Cantor tem dimensão de Hausdorff entre 0 e 1. Depois disso, demonstrar-
1
se-á que para s = log 2/ log 3 = 0, 6309 . . . tem-se ≤ µsH (C) ≤ 1, donde se pode
2
concluir que dimH (C) = log 2
log 3
.
k
Demonstre-se a primeira afirmação. Para s = 0, seja δ < 31 . Existem pelo menos
2k conjuntos em qualquer recobrimento-δ de C. Basta que os extremos máximos de
k
cada um dos 2k intervalos disjuntos, de diâmetro 13 sejam elementos de C e não
pertençam a um mesmo subconjunto de Bk . Logo,
( ) "  #0
k
X 1
µδ,0
H = inf |Ri |0
: {Ri } é recobrimento-δ de C ≥ 2k

i
3

e µ0H (C) = lim µδ,0 k


H ≥ lim 2 = +∞.
δ→0 δ→0
1 k

Para s = 1, seja δ > 0. Escolhe-se o menor k tal que 3
≤ δ e considera-se
o recobrimento-δ de C com exactamente 2k subconjuntos com diâmetro menor ou
igual a δ, tomando a intersecção de C com subintervalos de [0, 1]. Tem-se µδ,1H (C) =
  h
k
i 1
|Ri |1 : {Ri } é recobrimento-δ deC ≤ 2k 31
P 
inf e, quando δ tende para zero,
i
2 k
k tende para infinito. E vem µ1H (C) = lim µδ,1

H (C) ≤ lim 3 = 0.
δ→0 k→∞

Para demonstrar a segunda parte, utilize-se um método heurı́stico: O Conjunto de


Cantor divide-se em duas partes: a parte esquerda, CE = C ∩ [0, 31 ] e a parte direita,
CD = C ∩ [ 23 , 1]. Ambas são semelhantes a C porque são reduções de C à escala de
1
3
. Tem-se a reunião disjunta C = CE ∪ CD . Então, pela Proposição 23, para qualquer
s > 0 vem µsH (C) = µsH (CE ) + µsH (CD ). E pela propriedade do redimensionamento
100 2. A DIMENSÃO FRACTAL

1 s

à escala, Corolário 2, tanto µsH (CE ) como µsH (CD ) equivalem a 3
µsH (C). Como na
primeira parte deste exemplo se concluiu que no valor crı́tico s = dimH (C) se tem
0 ≤ µsH (C) ≤ 1, assuma-se que µsH (C) 6= 0; tem-se:

 s
1
µsH (C)
=2 µsH (C) ⇔
3
 s
1
⇔1=2 ⇔ (2.30)
3
log 2
⇔s= .
log 3

Para uma demonstração mais rigorosa, considerem-se os intervalos de comprimento


3−k (k = 0, 1, 2, . . .) que constituem os conjuntos Bk de cada iteração da construção de
C e que formam um recobrimento {Ri } de C.
−k ,s s
Daı́, pode escrever-se que µ3H (C) ≤ 2k 3−k , porque s > 0.
log2
Se s = log3
vem:

 log2
µsH (C) ≤ lim 2k 3−k log3
=
k→∞
 k
2
= lim log2 = (2.31)
k→∞
3 log3
= lim 1k = 1.
k→∞

Demonstre-se agora que µsH (C) ≥ 12 . Seja {Ri } um recobrimento-δ de C. Estando a


trabalhar em R pode assumir-se que Ri é sempre um intervalo já que o seu diâmetro
tem que ser positivo. Como C é compacto, {Ri } pode ser uma colecção finita de
subintervalos fechados de [0, 1]. Para cada um dos conjuntos Ri que constituem o
recobrimento {Ri }, seja k o inteiro tal que 3−(k+1) ≤ |Ui | ≤ δ < 3−k . Então Ri
intersecta, no máximo, um dos intervalos de Bk já que eles distam entre si pelo menos
3−k .
Se j ≥ k então, por construção, Ri intersecta, no máximo, 2j−k intervalos de Bj .
log 2
Se s = log 3
, então 1
2
= 3−s e pode escrever-se 2j−k = 2j 3−sk ≤ 2j 3s |Ri |s .
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 101

Se se escolher j suficientemente grande para que 3−(j+1) ≤ |Ri | ≤ δ para todos os


conjuntos Ri que compõem o recobrimento, então, como {Ri } intersecta todos os 2j in-
tervalos de comprimento 3−j , contando os intervalos obtém-se 2j ≤ 2j 3s |Ri |s . Daqui
P
i
|Ri |s ≥ 3−s = 21 , donde µsH (C) = inf{ |Ri |s : {Ri } é recobrimento-δ de C} ≥
P P
vem
i
1
, como se pretendia.
2
log 2
Pode, portanto, concluir-se que dimH (C) = log 3
.
log2
Com esforço extra poder-se-ia mostrar que efectivamente µsH (C) = 1 para s = log3
.
O cálculo da dimensão de Hausdorff pode ser muito trabalhoso mesmo para conjuntos
simples e normalmente a estimativa inferior é a mais difı́cil de obter.[2] 

Veja-se agora o que acontece à dimensão de Hausdorff de um conjunto quando sofre


uma transformação que verifica a condição de Hölder de expoente α.

Proposição 29. Seja F ⊂ Rn e seja f : F → Rn uma aplicação que satisfaz a


1
condição de Hölder de expoente α. Então, dimH f (F ) ≤ dimH F .
α
Demonstração. Se f satisfaz a condição de Holder de expoente α, então, |f (x) −
f (y)| ≤ c|x−y|α , quaisquer que sejam x, y ∈ F com c > 0 e α > 0. Pela Proposição 28,
s s s
µHα (f (F )) ≤ c α µsH (F ). Quando µH (F ) = 0, o mesmo acontece com µHα (f (F )), então
s
o valor de s em que µHα (f (F )) “salta” de ∞ para zero é menor ou igual ao valor de s
s 1
em que o mesmo acontece com µsH (F ). Portanto, dimH (f (F )) ≤ α
= α
dimH (F ). 

Corolário 4. a) Se f : F → Rm é uma aplicação de Lipschitz, então


dimH (f (F )) ≤ dimH F .
b) Se f : F → Rm é uma aplicação bi-Lipschitz, então dimH (f (F )) = dimH F .

Demonstração. Para demonstrar a) basta substituir α por 1 na Proposição 29.


Demonstra-se b) usando a alı́nea b) do Corolário 1: pela segunda desigualdade vem que,
sempre que µsH (F ) for zero, o mesmo acontece com µsH (f (F )) , donde dimH (f (F )) ≤
dimH (F ). Pela primeira desigualdade vem que, sempre que µsH (F ) for infinito, o mesmo
acontece com µsH (f (F )) , pelo que dimH (F ) ≤ dimH (f (F )) . Portanto, dimH (f (F )) =
dimH (F ). 
102 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Portanto, a dimensão de Hausdorff é invariante para a transformação bi-Lipschitz,


ou seja, não pode haver uma transformação bi-Lipschitz entre dois conjuntos com di-
mensões de Hausdorff diferentes. Em topologia, dois conjuntos são vistos como o mesmo
conjunto se existe um homeomorfismo entre eles; da mesma forma, em geometria frac-
tal, dois conjuntos poderão considerar-se o mesmo se existir uma bi-transformação de
Lipschitz entre eles. Ou, de outra forma, dois fractais podem considerar-se o mesmo
(no sentido em que têm a mesma dimensão) se forem metricamente equivalentes. Para
utilizar este conceito há que recordar as noções de espaço métrico e de métrica, intro-
duzidas no Capı́tulo 1.

Definição 48. Duas métricas d1 e d2 num espaço X dizem-se equivalentes se


existirem constantes 0 < c1 < c2 < ∞ tais que c1 d1 (x, y) ≤ d2 (x, y) ≤ c2 d1 (x, y), ∀(x, y) ∈
X × X.

Uma ideia subjacente ao conceito de métricas equivalentes é a de que qualquer par


de métricas equivalentes dão a mesma noção acerca da distância entre dois pontos. É
como pensar numa maneira de deformar, de modo limitado, um espaço, e comparar
as distâncias entre dois pontos, antes e depois da deformação. Requerer a condição de
equivalência é o mesmo que exigir que não haja uma deformação (esticar ou encolher)
ilimitada do espaço. Isto introduz a ideia de espaços métricos equivalentes.[1]

Definição 49. Dois espaços métricos (X1 , d1 ) e (X2 , d2 ) são equivalentes se


existir uma função bijectiva h : X1 → X2 tal que a métrica d˜1 definida em X1 por
d˜1 (x, y) = d2 (h(x), h(y)), ∀x, y ∈ X1 é equivalente a d1 .

A definição anterior corresponde a ter dois espaços métricos em que um deles é o


resultado de uma deformação limitada do outro, sem esticar ou encolher infinitamente
e sem “dobragens”, “sobreposições” ou “rasgões”.

Proposição 30. Sejam A e B dois subconjuntos de Rn . Se A e B são metricamente


equivalentes, então existe entre eles uma aplicação bi-Lipschitz.
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 103

Demonstração. Sejam A e B dois subconjuntos de Rn metricamente equivalen-


tes. Então existe uma função bijectiva h : A → B tal que c1 |x − y| ≤ |h(x) − h(y)| ≤
c2 |x − y|, para todo (x, y) ∈ A × A com 0 < c1 < c2 < ∞. Dado isto, pode dizer-se que
h é uma aplicação bi-Lipschitz entre A e B. 

O inverso desta proposição só não é assegurado porque na definição de aplicação


bi-Lipschitiz as constantes c1 e c2 têm de verificar 0 < c1 ≤ c2 < ∞ e a definição de
espaços métricos equivalentes exige que 0 < c1 < c2 < ∞.

Proposição 31. A dimensão de Hausdorff de dois subconjuntos limitados e me-


tricamente equivalentes de (Rn , Euclidiana) é igual.

Demonstração. Se A e B são dois subconjuntos de Rn limitados e metricamente


equivalentes então, pela Proposição 30, sabe-se que existe entre eles uma função bijec-
tiva h : A → B (portanto B = h(A)) tal que h é uma aplicação bi-Lipschitz e daqui,
pela alı́nea b) do Corolário 4, página 101, tem-se que dimH B = dimH A. 

Exemplo 33. Se f : R → R é a função f (x) = x2 e F é um subconjunto qualquer


de R, então dimH (f (F )) = dimH (F ).
Tem-se |f (x) − f (y)| = |x2 − y 2 | = |x − y||x + y|. Seja M = sup{|x| : x ∈ F } e
m = inf{|x| : x ∈ F }. Pode escrever-se m|x − y| ≤ |x − y||x + y| ≤ 2M |x − y|. Então f
é uma aplicação bi-Lipschitz e, pelo Corolário 4, vem que dimH (f (F )) = dimH (F ). 

Exemplo 34. Seja f : R2 → R tal que f (x) = projx, isto é, f (x1 , x2 ) = x1 para
todo (x1 , x2 ) ∈ R2 . Então, como foi visto no Exemplo 31, página 97, tem-se, para
quaisquer x, y ∈ R2 , |f (x) − f (y)| = |projx − projy| ≤ |x − y|. Mas não existe c > 0
tal que para quaisquer x, y ∈ R2 seja válido que c|x − y| ≤ |projx − projy| porque se
x e y forem dois pontos de R2 com a mesma abcissa, então |projx − projy| = 0. Logo
f é uma aplicação de Lipschitz mas não é uma aplicação bi-Lipschitz. Assim, dado
F ⊂ R2 , vem dimH (f (F )) < dimH (F ). 

Vejam-se agora alguns aspectos relacionados com a dimensão de conjuntos total-


mente desconexos.
104 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Definição 50. Seja (X, τ ) um espaço topológico. Um conjunto F ⊂ X diz-se um


conjunto desconexo em relação à topologia τ , se existirem dois abertos A1 , A2 ∈ τ ,
tais que:

(1) F ∩ A1 6= ∅ e F ∩ A2 6= ∅,
(2) (F ∩ A1 ) ∩ (F ∩ A2 ) = ∅,
(3) F = (F ∩ A1 ) ∪ (F ∩ A2 ).

Definição 51. Seja (X, τ ) um espaço topológico. Um conjunto F ⊂ X diz-se um


conjunto conexo em relação à topologia τ se não for desconexo em relação a τ .

Definição 52. Seja (X, τ ) um espaço topológico e F ⊂ X. Aos subconjuntos


conexos de F que não estejam contidos em mais nenhum subconjunto também conexo
de F chamam-se componentes conexas em relação à topologia τ de F .

Definição 53. Seja (X, τ ) um espaço topológico. Um conjunto F ⊂ X diz-se


um conjunto totalmente desconexo em relação à topologia τ se todas as suas
componentes conexas forem constituı́das apenas por um ponto.

Definição 54. Seja (X, d) um e.m. e F ⊂ X. Diz-se que F é denso em X se


ad(F ) = X.

Por outras palavras, existem pontos de F tão próximos quanto se queira de qualquer
ponto de X. Por exemplo, Q é denso em R relativamente à métrica usual; tem-se
ad(Q) = R. Contudo, Q é numerável e R não.

Lema 8. Seja F um subconjunto do e.m. (R, Euclideana). Se µ1H (F ) = 0 então o


complementar de F é denso em R.

Demonstração. Suponha-se que o complementar de F não é denso em R. Então


F contém uma “bola”, isto é, contém um intervalo de R e, nesse caso, µ1H (F ) 6= 0, o
que contradiz a hipótese. Portanto, se µ1H (F ) = 0 então o complementar de F é denso
em R. 
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 105

Proposição 32. Um conjunto F ⊂ Rn com dimH (F ) < 1 é totalmente desconexo.

Demonstração. Sejam x e y dois pontos distintos de F . Considere-se a aplicação


f : Rn → [0; ∞[ tal que f (z) = |z − x|. Tem-se |f (z) − f (w)| = ||z − x| − |w − x|| =
||z| − |w|| ≤ |z − w|, o que mostra que f não aumenta as distâncias e é uma aplicação
de Lipschitz. Pelo Corolário 4, dimH (f (F )) ≤ dimH (F ) < 1. Portanto, pelo Lema 8,
µ1H (f (F )) = 0, logo f (F ) tem um complementar denso em [0; ∞[. Escolhendo r tal
que r 6= f (F ) e 0 < r < f (y) vem que F = {z ∈ F : |z − x| < r} ∪ {z ∈ F : |z − x| > r}.
Donde, F está contido na reunião de dois conjuntos abertos disjuntos com x num dos
conjuntos e y no outro, isto é, x e y pertencem a diferentes componentes conexas de
F . Como x e y eram quaisquer dois elementos de F , conclui-se que F é totalmente
desconexo. 

Proposição 33. Para qualquer s tal que 0 ≤ s ≤ 2, existe um conjunto totalmente


desconexo do plano com dimensão de Hausdorff igual a s.

Demonstração. Designe-se por E0 um quadrado unitário em R2 . Tome-se um


valor r, fixo, tal que 0 < r < 21 . Coloque-se em cada vértice de E0 um quadrado de lado
r de modo a que fiquem os quatro totalmente contidos em E0 como mostra a figura
2.5. Seja E1 o conjunto formado por esses quatro quadrados. De seguida, substitui-se
cada um dos quatro quadrados de E1 por uma redução de E1 de factor de redução r.
Obtém-se E2 , o conjunto formado por 16 quadrados de lado r2 .
Repetindo sucessivamente este processo, na k-ésima iterada obtém-se Ek , um con-

junto constituı́do por 4k quadrados de lado rk . Então Fr =
T
Ek é um subconjunto
k=1
totalmente desconexo de R2 . Veja-se porquê: se se supõe que dois pontos x e y estão
na mesma componente conexa de Fr , então pertencerão a um mesmo quadrado de Ek ,

para k = 1, 2, 3, . . .. Donde |x − y| ≤ 2rk para todo k ∈ N, portanto |x − y| = 0, ou
seja, x = y.
Tem-se ainda que Fr é composto por quatro reduções de si mesmo de factor de
redução r, disjuntas duas a duas; designem-se por Fr,1 , Fr,2 , Fr,3 , e Fr,4 . Por µsH
106 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Figura 2.5. As primeiras três iterações na construção de um conjunto to-


talmente desconexo em R2 com dimensão de Hausdorff igual a r.

ser uma medida exterior métrica (Proposição 23, página 89), e pela Propriedade do
Redimensionamento à Escala (Corolário 2, página 96), vem que, para s ≥ 0, µsH (Fr ) =
4 4
µsH (Fr,i ) = rs µsH (Fr ). Assumindo que quando s = dimH Fr se tem 0 < µsH (Fr ) <
P P
i=1 i=1
∞ e aplicando o método heurı́stico já usado no Exemplo 32, obtém-se 1 = 4rs donde
log 4
s=− . Fazendo r variar entre 0 e 21 , a dimensão de Hausdorff de Fr tomará todos
log r
os valores entre 0 e 2.
Falta apenas encontrar um subconjunto do plano que seja totalmente desconexo
com dimensão de Hausdorff igual a zero e outro que seja totalmente desconexo com
dimensão de Hausdorff igual a 2.
Para o primeiro caso é muito simples: basta considerar um conjunto formado por
um único ponto de R2 .

S
Para o caso de s = 2, considere-se o conjunto G = Gk em que Gk = F 1 − 1 +(k, 0).
2 k
k=3
Em termos práticos, G é o conjunto que se obtém colocando todos os F 1 − 1 lado a lado,
2 k

sem que dois conjuntos sucessivos se intersectem. Os conjuntos Gk são disjuntos e cada
2. MEDIDA E DIMENSÃO DE HAUSDORFF 107

Gk é congruente com F 1 − 1 e, portanto, totalmente desconexo. Assim, G é também um


2 k

2
subconjunto de R totalmente desconexo. Pela Propriedade da Estabilidade Numerável
da dimensão de Hausdorff (que será explicada já de seguida) tem-se que dimH G =
 
sup dimH Gk = sup dimH F 1 − 1 = 2 
2 k
k≥3 k≥3

Quanto à dimensão de Hausdorff podem, portanto, listar-se as seguintes proprieda-


des:

Propriedade 1. Monotonia - Se E ⊂ F , então dimH E ≤ dimH F .


Foi visto na Proposição 25, na página 93.
Propriedade 2. Estabilidade Numerável - Se {Fi } é uma colecção numerável de con-
juntos, então
∞ 
S
dimH Fi = sup {dimH Fi }.
i=1 1≤i≤∞

S
Como qualquer elemento Fj da colecção está contido em Fi então, pela
 ∞  i=1
S
propriedade anterior tem-se que dimH Fj ≤ dimH Fi qualquer que seja
i=1
j e, portanto,

!
[
sup {dimH Fi } ≤ dimH Fi . (2.32)
1≤i≤∞
i=1

Por outro lado, se s > dimH Fj qualquer que seja j, então µsH (Fj ) = 0
∞ 
s
S
para todos os elementos da colecção de conjuntos e µH Fi = 0. Este
i=1
último valor deixa de ser zero quando, ao diminuir o valor de s, este toma o
maior valor para o qual um dos Fi tem dimensão de Hausdorff diferente de
zero. Portanto,

!
[
dimH Fi ≤ sup {dimH Fi }. (2.33)
1≤i≤∞
i=1
∞ 
S
De (2.32) e de (2.33) conclui-se que dimH Fi = sup {dimH Fi }.
i=1 1≤i≤∞
Propriedade 3. Conjuntos numeráveis - Se F é numerável, então dimH F = 0. Ver o
Exemplo 30, na página 93.
Propriedade 4. Conjuntos abertos - Se F ⊂ Rn é aberto e contém uma bola de
volume n-dimensional positivo, então dimH F = n. Um aberto em Rn é um
108 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Boreliano. Esta propriedade está demonstrada na Proposição 26, na página


94.

Nos casos de Fractais definidos por um SFI {Rm ; w1 , w2 , . . . , wN }, com semelhança


exacta (diz-se que um conjunto tem auto-semelhança exacta se corresponder à reunião
de várias reduções de si mesmo, ou seja, wn é uma redução de razão de semelhança
sn para cada n ∈ {1, 2, . . . N }), totalmente desconexos ou justapostos (isto é, para
quaisquer i, j ∈ {1, 2, . . . , N }, wi (F ) e wj (F ) “tocam-se” mas não se sobrepõem), a
medida s-dimensional de Hausdorff, µsH , pode ser utilizada para comparar os tamanhos
de fractais que tenham a mesma dimensão. Quanto maior for o valor de µsH de um
conjunto, “maior” ele é. Se dois fractais tiverem dimensões diferentes, considera-se
“maior” aquele cujo valor da dimensão de Hausdorff for mais alto.

É possı́vel demonstrar que a Dimensão de Hausdorff pode ser definida de ou-


tras formas usando outro tipo de recobrimentos que determinam medidas que levam
a dimensões de valor igual ao da dimensão de Hausdorff para o mesmo conjunto.
Por exemplo, poderiam usar-se apenas recobrimentos-δ constituı́dos apenas por bo-
las “esféricas”, ou então recobrimentos-δ constituı́dos unicamente por conjuntos aber-
tos, ou por conjuntos fechados. Outra hipótese é considerar uma medida de redes em
que os recobrimentos-δ usados são constituı́dos por intervalos binários (sendo F um
subconjunto do intervalo [0, 1[, chama-se intervalo binário a um intervalo da forma
 −k
r.2 ; (r + 1).2−k com k = 0, 1, 2, . . . e r = 0, 1, 2, . . . , 2k − 1). As medidas de rede


são convenientes porque quaisquer dois conjuntos binários ou são disjuntos, ou um está
contido no outro, permitindo que qualquer recobrimento de intervalos binários seja re-
duzido a uma recobrimento de intervalos binários disjuntos. Em cada caso, para cada
conjunto em particular, pode adoptar-se a definição que melhor convier ao cálculo da
sua dimensão de Hausdorff. Na secção que se segue apresentam-se outras definições de
dimensão que, em geral, não são equivalentes à definição de dimensão de Hausdorff.
Apenas em alguns casos especı́ficos poderá haver igualdade entre os valores obtidos
através das diferentes definições. Isso também será abordado.
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 109

3. Definições alternativas de Dimensão

O que é fundamental para quase todas as definições de dimensão é a ideia de medida


à escala δ: para cada δ, o conjunto é medido desprezando as irregularidades de tamanho
inferior a δ, depois observam-se como os resultados dessas medições se comportam à
medida que δ tende para zero.
Por exemplo, se F é uma curva plana, designe-se por Mδ (F ) o número de passos
de tamanho δ necessários para percorrer F . A dimensão de F é determinada pelo
expoente da potência a que Mδ (F ) obedece quando δ tende para zero. Escreve-se

Mδ (F ) ∼ cδ −s , com c e s constantes, (2.34)

significando que a diferença relativa entre Mδ (F ) e cδ −s tende para zero com δ, e diz-se
que F tem “dimensão” s olhando c como o “comprimento s-dimensional” de F .
Aplicando o logaritmo a ambos os membros de (2.34) obtém-se log Mδ (F ) ∼ log c −
log Mδ (F ) log c s log δ
s log δ; dividindo ambos membros por − log δ vem ∼ − + e
− log δ log δ log δ
log Mδ (F )
passando ao limite quando δ tende para zero, obtém-se s = lim .
δ→0 − log δ

Esta fórmula leva a procedimentos computacionais, pois s pode ser estimado através
do declive de uma gráfico log-log desenhado num intervalo apropriado de δ (ver-se-á
um exemplo mais adiante). No entanto, quando isto é aplicado ao estudo de fenómenos
naturais, só é possı́vel considerar “intervalos” finitos de valores de δ, já que a experiência
e a teoria divergem antes ainda de se alcançar a escala atómica. Por isso, quando se
estudam fractais naturais só se utiliza uma certa gama de escalas que será apropriada
e adequada a cada caso. Também pode acontecer que não se consiga alcançar o valor
exacto de s e que apenas se possam determinar os seus limites superior e inferior.
De salientar ainda que para que o valor de s determinado da forma dada acima se
comporte como uma dimensão é necessário que o método de medição seja tal que, ao
redimensionar F e, proporcionalmente, a escala a que se fez a medição, isso não afecte
a resposta; isto é: Mδ (δF ) = M1 (F ), qualquer que seja δ. É que, se por exemplo se
alterar a definição de Mδ (F ) para que passe a ser a soma dos comprimentos dos passos,
110 2. A DIMENSÃO FRACTAL

tem-se que Mδ (δF ) = δ 1 M1 (F ) para δ > 0; e é necessário ter isto em conta quando é
definida a dimensão.
Mas não há regras rápidas para decidir se uma determinada quantidade é uma
dimensão; tudo depende da definição. E muitas vezes são necessárias a experiência
e a intuição para decidir se uma definição de dimensão é aceitável. Pode acontecer
que definições muito parecidas de dimensão tenham propriedades muito diferentes e
como tal não se deve assumir que definições diferentes de dimensão produzem o mesmo
valor de dimensão, mesmo tratando-se de conjuntos “bons”. As propriedades de cada
de dimensão devem, portanto, retirar-se da sua própria definição e não inferirem-se de
propriedades de outras definições de dimensão. Nem todas as propriedades da dimensão
de Hausdorff se mantêm necessariamente válidas para as outras definições de dimensão,
no entanto, é desejável que outras definições de dimensão mantenham as seguintes:

• Monotonia: se E ⊂ F , então dimH E ≤ dimH F .


• Estabilidade: dimH (E ∪ F ) = max{dimH E, dimH F }.
∞ 
S
• Estabilidade Numerável: dimH Fi = sup dimH Fi .
i=1 1≤i≤∞
• Invariância Geométrica: dimH f (F ) = dimH F se f é uma transformação de
Rn como uma translação, rotação, ampliação ou redução, etc. . .
• Invariância de Lipschitz: dimH f (F ) = dimH F se f é uma aplicação bi-
lipschitz, isto é, c1 |x − y| ≤ |f (x) − f (y)| ≤ c2 |x − y| para quaisquer x e
y pertencentes a F e com 0 < c1 ≤ c2 < ∞.
• Conjuntos Numeráveis: dimH F = 0 se F é finito ou numerável.
• Conjuntos Abertos: Se F é um conjunto aberto de Rn , contendo uma bola de
volume n-dimensional positivo, então dimH F = n.

A definição de dimensão de Hausdorff pode ser entendida uma extensão da definição


clássica de dimensão topológica. Normalmente, todas as definições são Lipschitz-
invariantes, e portanto geometricamente invariantes, mas definições diferentes de di-
mensão podem produzir valores diferentes.
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 111

3.1. Dimensões de Contagem de Caixas (”Box-Counting Dimensions”).


Esta é uma das definições de dimensão mais usadas e a sua popularidade deve-se
essencialmente à facilidade com que se pode calcular e estimar empiricamente. Na
literatura poderá aparecer com outras designações mas aqui utilizar-se-á a designação
de dimensão de contagem de caixas ou, de forma mais simples, dimensão de caixas e
representar-se-á por dimB , em conformidade com a bibliografia utilizada, que é mai-
oritariamente de lı́ngua inglesa, onde esta dimensão se designa por “box-counting di-
mension” ou por “box dimension”, tendo-se optado aqui pela tradução directa destes
termos.

Definição 55. Seja F um subconjunto de Rn , não vazio e limitado e seja Nδ (F )


o menor número de conjuntos de diâmetro no máximo δ que pode cobrir F .
A dimensão de caixas superior de F e a dimensão de caixas inferior de
F são definidas respectivamente por

log Nδ (F )
dimB F = lim (2.35)
δ→0 − log δ

e por
log Nδ (F )
dimB F = lim . (2.36)
δ→0 − log δ

Se estes dois limites forem iguais, designa-se o seu valor por dimensão de con-
tagem de caixas de F (ou dimensão de caixas de F) e tem-se ,

log Nδ (F )
dimB F = lim . (2.37)
δ→0 − log δ

Há várias definições equivalentes de dimensão de contagem de caixas. Consoante a


situação, umas poderão ser mais convenientes de utilizar que outras.

Definição 56. Chama-se cubo da rede-δ coordenada de Rn a um conjunto


da forma [m1 δ; (m1 + 1)δ] × . . . × [mn δ; (mn + 1)δ] com m1 , . . . , mn ∈ Z.

Em R1 este “cubo” é um intervalo de comprimento δ, em R2 é um quadrado de


lado δ, etc. . .
112 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Teorema 12. Seja F um subconjunto não vazio e limitado de Rn . Sendo as di-


mensões de contagem de caixas superior e inferior de F definidas respectivamente por
log Nδ (F ) log Nδ (F )
dimB F = lim e por dimB F = lim e sendo, se estes dois li-
δ→0 − log δ δ→0 − log δ
mites forem iguais, a dimensão de contagem de caixas de F definida por dimB F =
log Nδ (F )
lim , então Nδ (F ) pode ser qualquer dos seguintes números:
δ→0 − log δ

i) o menor número de bolas fechadas com raio δ que cobre F ;


ii) o menor número de “cubos” de lado δ que cobre F ;
iii) o menor número de cubos da rede-δ coordenada que intersectam F ;
iv) o menor número de conjuntos de diâmetro no máximo δ que cobrem F ;
v) o maior número de bolas disjuntas de raio δ com centro em F .

Demonstração. Começa-se por demonstrar que a definição em iii) é equivalente


à definição em iv). Seja Nδ (F ) o menor número de conjuntos de diâmetro no máximo
δ que pode cobrir F . Seja Nδ0 (F ) o número de cubos da rede-δ coordenada de Rn que
intersectam F . Esses cubos fornecem uma colecção de Nδ0 (F ) conjuntos de diâmetro
√ √ √
δ n que cobrem F , donde Nδ√n (F ) ≤ Nδ0 (F ). Quando δ n < 1, tem-se − log(δ n) >
0 e pode escrever-se

log Nδ√n (F ) log Nδ0 (F )


√ ≤ √ .
− log (δ n) − log n − logδ

Tomando o limite quando δ tende para zero obtém-se

log Nδ0 (F ) log Nδ0 (F )


dimB F ≤ lim e dimB F ≤ lim
δ→0 − log δ δ→0 − log δ

log Nδ0 (F ) log Nδ0 (F )


( porque lim √ = lim ).
δ→0 − log n − logδ δ→0 − log δ
Por outro lado, qualquer conjunto de diâmetro menor ou igual a δ está contido em
3n cubos de lado δ da rede-δ coordenada (escolhendo um cubo que contenha algum
ponto do conjunto, juntamente com os cubos seus vizinhos); veja-se a Figura 2.6.
Donde, Nδ0 (F ) ≤ 3n Nδ (F ). Efectuam-se agora as seguintes operações a ambos os
membros: divide-se por 3n , toma-se o logaritmo e divide-se por − log δ (que é positivo
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 113

Figura 2.6. Rede-δ em R, R2 e R3 .

sempre que δ < 1). Obtém-se

log Nδ0 (F ) − log 3n log Nδ (F )


≤ .
− log δ − log δ

No limite, quando δ tende para zero, vem

log Nδ0 (F ) log Nδ0 (F )


lim ≤ dimB F e lim ≤ dimB F.
δ→0 − log δ δ→0 − log δ

Portanto, para determinar dimB F , dimB F e dimB F pode considerar-se que Nδ (F )


é o número de cubos da rede-δ coordenada que intersectam F .
Demonstre-se agora a equivalência das definições em ii) e em iv). Essa equivalência
demonstra-se como no caso da rede-δ de cubos notando que qualquer cubo de lado δ

tem diâmetro δ n e que qualquer conjunto de diâmetro no máximo δ está contido num
cubo de lado δ.
Para demonstrar a equivalência entre as definições de i) e de iii), seja NBδ (F ) o
menor número de bolas fechadas de raio δ (diâmetro 2δ) que cobrem F . Considere-se
também uma rede-δ de cubos construı́da sobre F ⊂ Rn .
Em Rn , cada bola fechada de raio δ intersecta, no máximo, 3n cubos da rede-δ,
veja-se a Figura 2.7.
Portanto, NCδ (F ) ≤ 3n NBδ (F ) em que NCδ (F ) é o número de cubos da rede-δ que
intersecta F . De forma análoga ao que já foi feito antes, efectuam-se as operações
seguintes a ambos os membros: divide-se por 3n , toma-se o logaritmo e divide-se por
114 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Figura 2.7. Ilustração em R e em R2 de “Em Rn , cada bola fechada de raio


δ intersecta, no máximo, 3n cubos da rede-δ.

− log δ (que é positivo sempre que δ < 1). No limite, quando δ tende para zero, vem

dimBC F ≤ dimBB F e dimBC F ≤ dimBB F

em que dimBC F representa a dimensão de caixas usando a contagem de cubos da rede-


δ e dimBB F representa a dimensão de caixas usando a contagem de bolas fechadas que
cobrem F .
Por outro lado, se se considerar a rede-δ de cubos e se contar o número NCδ (F ) de
cubos da rede-δ que intersectam F , e em cada um deles se considerar um bola fechada
de raio δ e com centro coincidente com o centro do cubo, tem-se que essa colecção de
NCδ (F ) bolas cobre F porque cada bola intersecta 3n cubos.
Vem NBδ (F ) ≤ NCδ (F ) donde (para δ < 1 e passando ao limite quando δ tende
para zero)

dimBB F ≤ dimBC F e dimBB F ≤ dimBC F.

Portanto, dimBC F = dimBB F e dimBC F = dimBB F e se as dimensões superior


e inferior coincidirem, então dimBC F = dimBB F. Logo, as definições i) e iii) são
equivalentes.
Finalmente, demonstre-se a equivalência entre iv) e v). Seja Nδ0 (F ) o maior número
de bolas disjuntas de raio δ com centro em F designadas por B1 , . . . , BNδ0 (F ) . Se
x ∈ F , então x está a uma distância menor ou igual a δ de uma das bolas Bi (caso
contrário, a bola de centro em x e de raio δ poderia ser acrescentada para formar uma
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 115

colecção ainda maior de bolas). Então, as Nδ0 (F ) bolas concêntricas com as Bi mas de
raio 2δ (diâmetro 4δ), cobrem F e N4δ (F ) ≤ Nδ0 (F ).
Por outro lado, suponha-se que B1 , . . . , BNδ0 (F ) são bolas disjuntas de raio δ com
centro em F e seja U1 , . . . , Uk uma colecção de conjuntos de diâmetro menor ou
igual a δ que cobre F . Como o centro de cada uma das bolas Bi é um elemento de
F , então cada bola Bi tem que conter pelo menos um dos conjuntos Uj . Como as
bolas Bi são disjuntas, então há pelo menos tantos conjuntos Uj como bolas Bi ; donde,
Nδ0 (F ) ≤ Nδ (F ). Tomando em cada membro o logaritmo e em seguida o limite quando
δ tende para zero, obtém-se o mesmo valor para a dimensão de caixas se se utilizar na
respectiva definição, Nδ0 em vez de Nδ . 

Na prática, adopta-se a definição mais conveniente em cada caso. A definição


que utiliza Nδ (F ) como o menor número de cubos da rede-δ coordenada é a mais
usada empiricamente. Para determinar a dimensão de caixas de um conjunto plano F
desenha-se a rede-δ de quadrados (caixas) e conta-se, para vários valores de δ cada vez
menores, o número Nδ (F ) de quadrados (“caixas”) que se sobrepõem ao conjunto. Daı́
o nome “dimensão de contagem de caixas”. A dimensão é a razão logarı́tmica à qual
Nδ (F ) cresce quando δ tende para zero e pode ser estimada pelo declive do gráfico de
log Nδ (F ) em função de − log δ. Esta definição dá uma interpretação do significado de
dimensão de caixas. O número de cubos da rede-δ que intersecta F é um indicador
de quão “espalhado” ou “irregular” é o conjunto, quando examinado à escala δ. A
dimensão reflecte quão rapidamente as irregularidades se desenvolvem à medida que δ
tende para zero.

Exemplo 35. No espaço métrico (R2 ; Euclidiana) considere-se o conjunto singular


A = {a}. Então, para qualquer δ > 0, tem-se Nδ (A) = 1 e dimB A = 0.
Nδ (A) 1
dimB (A) = lim = lim = 0 e, analogamente, dimB (A) = 0, pelo que
δ→0 − log δ δ→0 − log δ
dimB (A) = 0. 
116 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Da mesma forma se determina que um conjunto finito de pontos de Rn tem dimensão


de caixas igual a zero. Se A for um conjunto infinito numerável, ver-se-á mais à frente
(Exemplo 38, página 121) que a sua dimensão de caixas pode não ser zero.

Teorema 13. Seja n um inteiro positivo e considere-se o espaço métrico


(Rn ,Euclidiana). Para todo o elemento A de H(Rn ) existe dimB (A) e se A e B são
elementos de H(Rn ) tais que A ⊂ B, então 0 ≤ dimB A ≤ dimB B ≤ n.

Demonstração. Efectuar-se-á a demonstração para o caso de n = 2. Sem perda


de generalidade, como A é limitado, pode considerar-se que o conjunto A está contido
num quadrado C. Então, Nδ (A) ≤ Nδ (C) para qualquer δ > 0. Daı́, sempre que
log Nδ (A) log Nδ (C)
0 < δ < 1, vem que 0 ≤ ≤ .
− log δ − log δ
log Nδ (A) log Nδ (C)
Segue que lim ≤ lim , onde o limite do segundo membro existe
δ→0 − log δ δ→0 − log δ

e é 2, pelo que o limite do primeiro membro também existe e é limitado superiormente


por 2.
Se A, B ∈ H(Rn ) com A ⊂ B, substituindo no argumento anterior C por B vem
que dimB A ≤ dimB B. 

Teorema 14. Seja n um inteiro positivo e considere-se o espaço métrico


(Rn , Euclidiana). Sejam A e B elementos de H(Rn ) tais que dimB B < dimB A. Então
dimB (A ∪ B) = dimB (A).

Demonstração. Do Teorema 13 vem que dimB (A ∪ B) ≥ dimB (A) porque A ⊂


A ∪ B. Quer-se demonstrar agora que dimB (A ∪ B) ≤ dimB (A). Note-se que, para
todo δ > 0, Nδ (A ∪ B) ≤ Nδ (A) + Nδ (B). Segue que

log Nδ (A ∪ B)
dimB (A ∪ B) ≤ lim ≤
δ→0 − log δ
log [Nδ (A) + Nδ (B)]
≤ lim =
δ→0 − log δ (2.38)
 
Nδ (B)
log 1 +
log Nδ (A) Nδ (A)
= lim + lim .
δ→0 − log δ δ→0 − log δ
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 117

log Nδ (B) log Nδ (A)


Como dimB B < dimB A, então lim < lim , ou seja,
δ→0 − log δ δ→0 − log δ
 
log Nδ (B) − log Nδ (A)
lim < 0. Para δ < 1 tem-se − log δ > 0 pelo que, obriga-
δ→0 − log δ  
Nδ (B) Nδ (B)
toriamente, log Nδ (B) − log Nδ (A) < 0, isto é, log < 0, logo < 1.
Nδ (A) Nδ (A)
Voltando a (2.38), tem-se que a segunda parcela tende para zero e a primeira converge
para dimB (A) (que existe, por hipótese). Concluindo, dimB (A ∪ B) = dimB (A). 

Exemplo 36. A dimensão de caixas do conjunto “cabeludo” A ⊂ R2 apresentado


na Figura 2.8 é 2, porque se trata de um conjunto que é a reunião de um quadrado
(com dimensão de caixas igual a 2) com um conjunto de linhas (com dimensão de caixas
menor que 2).

Figura 2.8. Se a dimensão de caixas de um conjunto A é maior que a


dimensão de caixas de um conjunto B, então a dimensão de caixas de A ∪ B

é igual à dimensão de caixas de A.

Na verdade, à medida que δ → 0, a contribuição dos ditos “cabelos” para Nδ (A),


torna-se exponencialmente pequena comparada com a contribuição do quadrado.


3.2. Relação entre a Dimensão de Contagem de Caixas e a Dimensão de


Hausdorff.

Proposição 34. Seja F um subconjunto de Rn . Então dimH (F ) ≤ dimB (F ).


118 2. A DIMENSÃO FRACTAL

log Nδ
Demonstração. Tem-se por definição que dimB (F ) = lim em que Nδ é
δ→0 − log δ

o menor número de conjuntos de diâmetro δ necessários para cobrir F . Seja {Bi }


uma tal colecção de conjuntos. Quando δ é muito pequeno tem-se s ≈ log 1 Nδ com
δ
1 Nδ
s = dimB (F ). Daqui vem s ≈ Nδ que é equivalente a 1 ≈ Nδ .δ s = δs.
P
δ i=1
Seja {Ui } uma colecção de conjuntos tais que Ui = Bi ∩ F. Então {Ui } é um

recobrimento-δ de F e µδ,s δ s < ∞ porque dimB (F ) converge por hipótese e
P
H (F ) ≤
i=1
é menor que n.
Nδ Nδ
Assim, lim µδ,s |Ui |s : {Ui } é recobrimento-δ de F} ≤ lim δ s que
P P
H (F ) = lim inf{
δ→0 δ→0 i=1 δ→0 i=1

existe é finito, com s = dimB (F ).


Se este limite for zero para s = dimB (F ), então o valor em que lim µδ,s
H (F ) “salta”
δ→0

de infinito para zero é dimH (F ) ≤ s = dimB (F ). Se este limite não for zero, sendo
finito, tem-se dimH (F ) = dimB (F ).


Normalmente não se obtém aqui a igualdade estrita, excepto em casos em que o


conjunto é suficientemente regular.

log 2
Exemplo 37. Seja C o Conjunto de Cantor. Então dimB C = dimB C = log 3
.
O recobrimento-δ de cada iteração Bk da construção de C (ver Figura 2.4, página
99) de 2k intervalos dá que Nδ (C) ≤ 2k se 3−k < δ ≤ 3−k+1 e tem-se

log Nδ (C) log 2k log 2


dimB C = lim ≤ lim = .
δ→0 − log δ k→∞ log 3k−1 log 3

Por outro lado, qualquer intervalo de comprimento δ com 3−k−1 ≤ δ < 3−k in-
tersecta, no máximo um dos intervalos binários de diâmetro 3−k que compõem cada
estádio Bk . Há 2k intervalos desses em Bk e portanto, são necessários pelo menos 2k
log 2
intervalos de comprimento δ para cobrir C. Daı́, Nδ (C) ≥ 2k o que dá dimB C ≥ .
log 3
log 2
Logo, dimB C = , valor esse que é igual à dimensão de Hausdorff de C deter-
log 3
minada no Exemplo 32, página98. Portanto, no caso do Conjunto de Cantor tem-se
dimH C = dimB C. 
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 119

O Conjunto de Cantor é um fractal com auto-semelhança exacta. Diz-se que um


conjunto tem auto-semelhança exacta se puder construir-se como uma reunião de várias
reduções de si mesmo. Em geral todos os fractais deste tipo têm a dimensão de Haus-
dorff igual à dimensão de caixas. Noutro tipo de fractais, o mais habitual é definições
diferentes de dimensão gerarem valores diferentes.

log Nδ (F )
A Definição 2.37, página 111, que diz que dimB F = lim indica, gros-
δ→0 − log δ

seiramente falando, que para valores pequenos de δ, Nδ (F ) ≈ δ −s , onde s = dimB F


(ou seja, Nδ (F )δ s ≈ 1). Mais precisamente, diz que Nδ (F )δ s → ∞ se s < dimB F e
Nδ (F )δ s → 0 se s > dimB F. Mas
X
Nδ (F )δ s = inf{ δ s : {Ui } é um recobrimento-δ (finito) de F }
i

deveria ser comparado com


X
µsH (F ) = inf{ |Ui |s : {Ui } é um recobrimento-δ de F }.
i

Ao calcular a dimensão de Hausdorff |Ui |s pode tomar valores diferentes consoante


varia i, enquanto que para a dimensão de caixas se atribui o mesmo peso de δ s a todos
os conjuntos do recobrimento.
A dimensão de caixas pode ser tida como indicadora da eficiência com que um
conjunto pode ser coberto por pequenos conjuntos de tamanho igual, enquanto que a
dimensão de Hausdorff envolve recobrimentos por conjuntos de diâmetros pequenos,
mas eventualmente de valores muito variados.
Como na dimensão de Hausdorff se utilizam recobrimentos compostos por conjuntos
de diâmetros diferentes e na dimensão de box-counting se usam recobrimentos compos-
tos por conjuntos todos com o mesmo diâmetro, esta última tende a ser mais fácil
de calcular. No entanto, tem algumas propriedades com consequências indesejáveis.
Vejam-se algumas propriedades e alguns inconvenientes da dimensão por caixas.
As seguintes propriedades elementares da dimensão de caixas espelham as proprie-
dades da dimensão de Hausdorff e podem ser verificadas de forma muito idêntica.
120 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Propriedade 1. Uma hipersuperfı́cie regular Rn tem dimensão de caixas igual a m


com m ∈ {1, 2 . . . , n}.
Propriedade 2. dimB e dimB são monótonas.
Basta usar o Teorema 13 e, de forma análoga se prova que, se dimB (A)
e dimB (B) existirem, estando A contido em B, também se tem dimB (A) ≤
dimB (B).
Propriedade 3. dimB é finitamente estável, isto é,

dimB (E ∪ F ) = max{dimB E, dimB F },

mas dimB não o é.


Propriedade 4. Se f : F → Rn é uma função de Lipschitz, então, dimB f (F ) ≤
dimB F e dimB f (F ) ≤ dimB F .
Isto acontece porque se |f (x) − f (y)| ≤ c|x − y| e F tem um recobrimento
constituı́do por Nδ (F ) conjuntos de diâmetro menor ou igual a δ, então as
Nδ (F ) imagens por f desses conjuntos formam um recobrimento de f (F ) por
conjuntos de diâmetro, no máximo cδ, donde dimB f (F ) ≤ dimB F. A di-
mensão de caixas comporta-se de forma análoga às dimensões de Hausdorff
sob transformações bi-Lipschitz e de Hölder.

Vejam-se agora algumas desvantagens da dimensão de contagem de caixas. A


próxima Proposição é, a princı́pio, apelativa, mas tem consequências indesejáveis.

Proposição 35. Seja ad(F ) a aderência de F (ou seja, o menor subconjunto


fechado de Rn que contém F ). Então, dimB [ad(F )] = dimB F e dimB [ad(F )] = dimB F .

Demonstração. Seja B1 , . . . Bk uma colecção finita de bolas fechadas, de raio


k
S
δ. Se o conjunto fechado Bi contém F , então também contém ad(F ). Portanto, o
i=1
menor número de bolas fechadas de raio δ que cobre F é suficiente para cobrir ad(F )
(que pode ser um conjunto “maior” que F ). Donde se conclui o que se pretende. 

Uma consequência imediata disto é que se F é um subconjunto denso de uma região


aberta de Rn , então dimB F = dimB F = n.
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 121

Exemplo 38. Sendo F o conjunto (numerável) dos números racionais entre 0 e 1,


então ad(F ) é todo o intervalo [0,1] e dimB F = dimB F = 1. 

Daqui se conclui que conjuntos numeráveis podem ter dimensão de caixas dife-
rente de zero, o que não acontecia com a dimensão de Hausdorff. Além disso, a di-
mensão de caixas de qualquer número racional olhado como um conjunto singular é
zero (como foi visto no Exemplo 35 na página 115); no entanto, a união numerável
destes conjuntos singulares tem dimensão 1. Então, nem sempre será verdade que

S
dimB Fi = supi dimB Fi como se passa com a dimensão de Hausdorff.
i=1
Isto limita a utilidade da dimensão de caixas já que, introduzindo um “pequeno”
conjunto, isto é, um conjunto numerável de pontos, isso pode alterar completamente a
dimensão do conjunto ao contrário do que acontecia com a dimensão de Hausdorff.

Exemplo 39. F = {0; 1; 12 ; 13 ; . . .} é um conjunto compacto com dimB F = 12 .


1
Vejam-se os cálculos: Se |U | = δ < 12 e k é o inteiro que satisfaz >δ≥
(k − 1)k
1 1 1
, então U pode cobrir, no máximo, um dos pontos {1; ; . . . ; }. Assim, pelo
k(k + 1) 2 k
log Nδ (F )
menos k conjuntos de diâmetro δ são necessários para cobrir F , donde ≥
− log δ
log k 1
. Quando δ → 0, vem dimB F ≥ .
log k(k + 1) 2
1 1 1
Por outro lado, se > δ > 0, toma-se k tal que >δ≥ . Então,
2 (k − 1)k k(k + 1)
k + 1 intervalos de comprimento δ cobrem [0; k1 ], deixando k − 1 pontos de F que
log Nδ (F ) log(2k)
podem ser cobertos por outros k − 1 intervalos. Logo, ≤ o que
− log δ log k(k + 1)
1
dá dimB F ≤ .
2
À partida, não seria de esperar que este conjunto cujos pontos são todos isolados,
excepto um, fosse um fractal; no entanto, tem dimensão de caixas fraccionária. 

Tal como são muito convenientes na prática, as dimensões de caixas são também
muito úteis na teoria. Se, como acontece regularmente, se puder demonstrar que um
conjunto tem dimensão de caixas igual à dimensão de Hausdorff, da relação entre essas
duas definições podem surgir resultados profı́cuos.
122 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Exemplo 40. A Curva de Koch é um conjunto em R2 que se constrói da seguinte


forma: a um segmento de recta de comprimento l dividido em três partes iguais, retira-
se o segmento do meio que se substitui por dois segmentos, ambos de comprimento 3l .
Os primeiros estádios de construção desta curva estão representados na Figura 2.9.

Figura 2.9. Primeiras quatro iteradas da construção da Curva de Koch.

Se C for a Curva de von Koch, então, pela alı́nea iv) do Teorema 12, dimB C é, no
máximo, log 4/ log 3 e pela alı́nea v) do mesmo Teorema, dimB C é, no mı́nimo, esse
mesmo valor; donde dimB C = log 4/ log 3.
 k  k−1
1 1
Vejam-se os pormenores: Para ≤δ< são necessários, no máximo,
3 3
4k conjuntos de diâmetro δ para cobrir C; veja-se a Figura 2.10.

 k
1
Figura 2.10. Para δ = são necessários, no máximo, 4k conjuntos de
3
diâmetro δ para cobrir a Curva de Koch.

Pela alı́nea iv) do Teorema 12 da página 112 vem

log Nδ (C) log 4k log 4


≤  k =
− log δ 1 log 3
− log
3
log 4
donde, dimB C ≤ .
log 3
 k+1  k
1 1
Por outro lado, para <δ≤ conseguem-se, pelo menos, 4k + 1 bolas
3 3
de diâmetro δ com centro em C; veja-se a Figura 2.11.
Pela alı́nea v) do Teorema 12 da página 112 vem
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 123

 k
1
Figura 2.11. Para δ = conseguem-se, pelo menos, 4k + 1 bolas de
3
diâmetro δ com centro em pontos da Curva de Koch.


log Nδ (C) log 4k + 1 log 4k log 4
≥  k ≥  k =
− log δ 1 1 log 3
− log − log
3 3
log 4
donde, dimB C ≥ .
log 3
log 4
Portanto, dimB C = ≈ 1, 262. Este valor, sendo maior que 1 e menor que 2,
log 3
é consistente com o facto de se tratar de uma linha com comprimento infinito e com
área nula.


O Teorema seguinte simplifica o processo de cálculo da dimensão de caixas porque


permite que se substitua a variável contı́nua δ por uma variável discreta.
124 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Teorema 15. Seja F ∈ H(X ), sendo (X, d) um espaço métrico. Seja δk = C.rk
log Nδk (F )
para números reais 0 < r < 1 e C > 0 e para k ∈ N. Se D = lim então,
k→∞ − log δk

F tem dimensão de caixas igual a D.

Demonstração. Considerem-se os números reais r e C e a sucessão {δk }k∈N como


definidos no enunciado do Teorema.
Considere-se δ ≤ r e seja f (δ) = max{δk : δk ≤ δ, k ∈ N}. Então, Crk = f (δ) ≤
f (δ)
δ≤ = Crk−1 (porque 0 < r < 1) e, portanto,
r

Nf (δ) (F ) ≥ Nδ (F ) ≥ N f (δ) (F ). (2.39)


r

f (δ) 1 1 r
Para valores de δ pequenos tais que f (δ) ≤ δ ≤ < 1 vem ≥ ≥ > 1.
r f (δ) δ f (δ) 
1
Como log x é uma função crescente e positiva para x ≥ 1, vem que log ≥
    f (δ)
1 r
log ≥ log que é o mesmo que escrever
δ f (δ)
 
f (δ)
− log f (δ) ≥ − log δ ≥ − log . (2.40)
r

De (2.39) e de (2.40) vem


 
log N f (δ) (F )

r
log (Nδ (F )) log Nf (δ) (F )
≤ ≤   . (2.41)
− log f (δ) − log δ − log f (δ)
r

Assumindo que Nδ (F ) → ∞ à medida que δ → 0 (caso contrário, o Teorema é


verdadeiro porque se terá D = 0) o segundo membro da segunda desigualdade em
(2.41) verifica
  !
log Nf (δ) (F ) log N δ k
(F )
lim     = lim  =
δ→0
− log r f (δ) k→∞ − log δrk
 −1
log r − log δk
= lim =
k→∞ log Nδk (F )

log Nδk (F )
= lim .
k→∞ − log δk
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 125

O primeiro membro da primeira desigualdade em (2.41) verifica


  
log N f (δ) (F ) 
log Nδk−1 (F )

r
lim   = lim =
δ→0 − log f (δ) k→∞ − log δk

log Nδk−1 (F )
= lim =
k→∞ − log r − log δk−1

log Nδk−1 (F )
= lim =
k→∞ − log δk−1

log Nδk (F )
= lim .
k→∞ − log δk

Portanto, à medida que δ → 0, ambos os extremos de (2.41) tendem para o valor D


indicado no enunciado do Teorema donde, o limite quando δ → 0 do termo intermédio
de (2.41) também existe e tem o mesmo valor D. 

Este último resultado permite que o cálculo da dimensão de caixas se torne mais
simples, sempre que seja possı́vel determinar uma sucessão {δk } adequada.

Exemplo 41. O conjunto Poeira de Cantor apresentado no Exemplo 31 da página


97 tem dimensão de caixas igual a 1.
1
Considere-se a sucessão δk = k com k = 1, 2, 3, . . .. Usando a alı́nea ii) do Teorema
4
12, na página 112, basta considerar que, para cada valor de δk os cubos pretendidos
coincidem com os quadrados que constituem cada um dos conjuntos Ek correspondentes
às várias etapas de construção do conjunto C. Para cada δk , tem-se Nδ (C) = 4k para
todo k ∈ N. Quando k tende para infinito, δ tende para zero e pelo Teorema 15
log(4k )
dimB C = lim = 1.
δ→0 −log(4−k )

Para este conjunto já tinha sido determinada a sua dimensão de Hausdorff, cujo
valor é também 1 (Exemplo 31, na página 97). 

Exemplo 42. Considere-se em (R2 , Euclideana) o subconjunto F denominado


Triângulo de Sierpinski cujo processo de construção se inicia com um triângulo equilátero
com uma unidade de comprimento de lado e foi explicado nos Exemplos 1 e 9, páginas
log 3
21 e 37 respectivamente, no Capı́tulo 1. Então, dimB F = log 2
.
126 2. A DIMENSÃO FRACTAL
 k
1
Considere-se a sequência δk = . Sendo Nδk (F ) o número mı́nimo de quadrados
2
1 1 1
de lado δk que cobre F , tem-se: δ1 = e Nδ1 (F ) = 3; δ2 = e Nδ2 (F ) = 9; δ3 = e
2 4 8
n
Nδ3 (F ) = 27;. . . e, em geral, Nδn (F ) = 3 ; veja-se a Figura 2.12.

Figura 2.12. Recobrimento do Triângulo de Sierpinski por quadrados de


lado 12 , 1
4 e 81 .

Então, pela alı́nea ii) do Teorema 12 e pelo Teorema 15, a dimensão de caixas do
Triângulo de Sierpinski é

log 3k log 3
lim  k = .
k→∞ 1 log 2
− log
2

Exemplo 43. Na Figura 2.13 está uma imagem de uma das árvores da espécie acer
palmatum cujas folhas são muito recortadas. Mostra-se de seguida como determinar a
dimensão de caixas de uma delas.
Em primeiro lugar procedeu-se à obtenção de uma imagem digital da folha. Neste
caso foi usado um scaner, tendo o cuidado de espalmar o melhor possı́vel a folha e de
a abrir de modo a evitar a sobreposição das suas diversas componentes. De seguida
produziu-se uma versão da imagem a preto e branco (Figura 2.14). É de salientar que,
neste caso, a a atribuição da cor branca ou preta a cada um dos pixels foi feita de modo
automático, pelo programa usado para trabalhar a imagem.
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 127

Figura 2.13. Árvore de uma das variedades de acer palmatum.

Figura 2.14. Versão binária da imagem digital da folha.

Depois, a imagem foi dividida em quadrados (“caixas”) de lado δ cada vez menor.
Para cada valor escolhido para δ contou-se o número de quadrados da rede-δ que
intersectavam a imagem (Figura 2.15).
Os dados dados obtidos são os que estão registados nas duas primeiras colunas da
Tabela 2.1 e a respectiva representação gráfica encontra-se na Figura 2.16.
Como o número de quadrados a cobrir a área total da figura é proporcional ao qua-
drado do inverso da medida do lado de cada quadrado em que se dividiu a mesma, basta
agora usar os resultados obtidos nas medições anteriores, e representar graficamente
o logaritmo do número de caixas que intersectam a figura em função do logaritmo do
128 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Figura 2.15. Divisão da imagem em caixas de lado 512, 256, 128, 64, 32,
16 e 8 pixels respectivamente.

inverso do lado de cada quadrado (Figura 2.17). O declive da recta de regressão linear
que melhor se ajusta ao conjunto de pontos obtidos é uma estimativa da dimensão de
caixas da imagem. Neste caso obteve-se 1, 5362 como valor aproximado da dimensão
de contagem de caixas desta folha de acer palmatum.
Convém referir que uma gama diferente de escalas pode originar outro valor para a
dimensão. Um alinhamento diferente da grelha que forma a rede-δ pode também pro-
duzir resultados ligeiramente diferentes; e um tratamento diferente da imagem quando
se produz a imagem a preto e branco também pode interferir em todo o processo,
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 129

δ Nδ (G)

Lado da Caixa Número de caixas que log Nδ (G) − log δ

(em pixels) intersectam a folha

512 4 0,6021 0,3010

256 13 1,1139 0,6021

128 36 1,5563 0,9031

64 96 1,9823 1,2041

32 280 2,4472 1,5051

16 851 2,9299 1,8062

8 2574 3,4106 2,1072


Tabela 2.1. Valores obtidos a partir da contagem de caixas que intersectam
a Figura 2.14.

Figura 2.16. Número de caixas que intersectam a folha (Nδ (G)) em função
do comprimento (em pixels) do lado da caixa (δ).

provocando alterações nos resultados finais. Além disso, o comprimento do lado do


quadrado da rede-δ coordenada está limitado inferiormente pelo comprimento do lado
do pixel e, por isso, não se consegue efectivamente obter o limite, quando δ tende para
130 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Figura 2.17. Logaritmo do Número de caixas que intersectam a folha


(log (Nδ (G))) em função do Logaritmo do inverso do comprimento (em pi-

xels) do lado da caixa (− log(δ)) e recta de regressão linear para o conjunto

de pontos representados.

log Nδ (G)
zero, de . Tudo isto indica que este método é, apesar de muito prático e fácil
− log δ
de utilizar, também bastante empı́rico. 

Veja-se agora que relação existe entre as dimensões de caixas de dois conjuntos
metricamente equivalentes.

Teorema 16. Sejam (X1 , d1 ) e (X2 , d2 ) dois espaços métricos equivalentes. Seja
h : X1 → X2 a transformação que providencia a equivalência dos espaços. Seja A1
um elemento de H(X1 ) com dimensão de caixas D. Então, A2 = h(A1 ) também tem
dimensão de caixas igual a D.

Demonstração. Basta usar a Proposição 30 da página 102 e a propriedade 4


da dimensão de caixas mencionada na página 119 (uma vez para h e outra vez para
h−1 ). 

O Teorema anterior permite-nos concluir que dois objectos fractais que resultam um
do outro por uma “distorção simples” têm a mesma dimensão de caixas. Além disso,
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 131

uma aplicação bi-Lipschitz entre dois conjuntos garante que estes tenham a mesma
dimensão de caixas, tal como acontecia para a dimensão de Hausdorff (Proposição 31,
página 103).

Exemplo 44. O Conjunto de Cantor que se constrói tendo como ponto de partida
o intervalo [0; 1] ou o Conjunto de Cantor que se obtém da mesma forma mas iniciando
com o intervalo [0; 3] têm ambos a mesma dimensão de caixas.
Considerem-se os espaços métricos (X1 , d1 ) e (X2 , d2 ) em que X1 = [0, 1], X2 =
[0, 3] e d1 e d2 são ambas a métrica euclidiana. Considere-se também a aplicação
h : [0, 1] → [0, 3] tal que h(x) = 3x que é invertı́vel. Defina-se em [0, 1] a métrica d˜1 tal
que d˜1 (x, y) = d2 (h(x), h(y)), para quaisquer dois elementos x e y de X1 . Tem-se

d1 (x, y) = |x − y| ≤ 3|x − y| = |3x − 3y| = |h(x) − h(y)| = d˜1 (x, y);

e também

1˜ 1 1
d1 (x, y) = |h(x) − h(y)| = |3x − 3y| = |3x − 3y| = |x − y| = d1 (x, y);
3 3 3

isto é,

d1 (x, y) ≤ d(x, y) ≤ d˜1 (x, y), ∀x, y ∈ [0, 1].
3
Portanto, d1 e d˜1 são métricas equivalentes em [0, 1] e ([0, 1], d1 ) e ([0, 3], d2 ) são
espaços métricos equivalentes (ver Definição 48 e Definição 49 na página 102).
Se A1 for o Conjunto de Cantor em [0, 1] e A2 o Conjunto de Cantor em [0, 3],
tem-se A1 ∈ H([0, 1]), A2 ∈ H([0, 3]) e A2 = h(A1 ); pelo Teorema 16 ambos terão a
mesma dimensão de caixas. 

A seguir apresenta-se um algoritmo para determinar a dimensão de fractais com


auto-semelhança exacta e funciona para aqueles cujas reduções de si mesmo que o
compõem não se sobreponham ou não se sobreponham “demasiado”. O resultado que
enuncia esse algoritmo não se demonstra aqui, designar-se-á por “Método Heurı́stico”
e diz que sendo m e N números inteiros positivos, F o fractal definido pelo SFI
{Rm ; w1 , w2 , . . . , wN } em que wn é uma redução de razão de semelhança sn para cada
132 2. A DIMENSÃO FRACTAL

N
|sn |D = 1, então se o SFI é total-
P
n ∈ {1, 2, . . . N } e D ∈ [0, m], a única solução de
n=1
mente desconexo ou justaposto (isto é, para quaisquer i, j ∈ {1, 2, . . . , N }, wi (F ) e
wj (F ) “tocam-se” mas não se sobrepõem), vem que a dimensão de Hausdorff (dimH F ) e
a dimensão de caixas (dimB F ) do fractal F são iguais e tem-se dimH F = dimB F = D.
Se existir sobreposição no SFI, então dimB F ≤ D.
Um exemplo de aplicação deste resultado foi já apresentado no Exemplo 32, página
98, em que uma parte foi resolvida através de um método heurı́stico. De seguida,
apresentam-se mais exemplos da sua aplicação a fractais definidos por sistemas de
funções iteradas em que a imagem produzida por cada uma das contracções não se
sobrepõe a nenhuma das imagens produzidas pelas restantes. Nesses casos, a dimensão
de Hausdorff é igual à dimensão de caixas.

Exemplo 45. Seja F o fractal cujos primeiros estádios de construção estão repre-
sentados na Figura 2.18. Este fractal pode ser definido por um SFI constituı́do por

Figura 2.18. Primeiras duas iteradas da construção um fractal que pode


ser definido por um SFI constituı́dos por cinco contracções, com dois factores

de contracção diferentes.

1
cinco contracções, uma delas de factor de contracção 2
e as restantes de factor de con-
tracção 41 . O Método Heurı́stico diz que a dimensão fractal (quer de Hausdorff, quer
 s  s
1 1
de caixas) deste conjunto é a solução de 4 + = 1. Pode obter-se a solução
4 2
desta equação quer algebricamente, quer graficamente.
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 133
 s
1
Resolução algébrica com a mudança de variável y = :
2

 s 2  s
1 1
4 + −1=0
2 2

⇔4y 2 + y − 1 = 0

1 ± 17
⇔y =
8
√ ! √
−1 + 17 
⇒s = − log2 = − log2 17 − 1 + 3 ≈ 1, 357.
8

 s  s
1 1
Resolução gráfica: Representam-se graficamente as funções f (s) = 4 +
4 2
e g(s) = 1. O valor pretendido corresponde à abcissa do ponto de intersecção entre os
gráficos destas duas funções; veja-se o gráfico na Figura 2.19.

Figura 2.19. Resolução Gráfica, pelo Método Heurı́stico, para determinar


a dimensão de um fractal definido por um SFI constituı́do por contracções de

diferentes factores de contracção.


134 2. A DIMENSÃO FRACTAL

Exemplo 46. O Triângulo de Sierpinski pode ser definido por um SFI constituı́do
1
por 3 contracções de factor de contracção (veja-se o Exemplo 9, página 37 do Capı́tulo
2
1). As primeiras iteradas desse SFI estão também representadas na Figura 2.21.

Figura 2.20. Primeiras quatro iteradas da construção do Triângulo de Sierpinski.


 D  D
1 1
A sua dimensão fractal é D tal que 3 = 1. Tem-se 3 × = 1 ⇔
  2 2
1 ln 3
log 1 =D⇔D= ≈ 1, 585.
2 3 ln 2
Este valor já tinha sido encontrado quando se calculou a dimensão de caixas do
Triângulo de Sierpinski no Exemplo 42 da página 125. 

Quando o SFI é constituı́do por N contracções que não se sobreponham, todas com
factor de contracção igual a r, a dimensão do fractal é o valor D tal que N rD = 1, isto
 D
1 log N
é, N = ou então, D =   . Mas este valor para a dimensão só faz sentido
r 1
log
r
no caso de fractais com auto-semelhança exacta em que as várias partes que o compõem
são cópias de si mesmo, todas elas à mesma escala. Esta definição de dimensão só se
aplica, portanto, a uma pequena classe de conjuntos estritamente auto-semelhantes.
O número obtido desta forma é por vezes chamado de dimensão de semelhança do
conjunto.

Exemplo 47. No caso da Curva de Peano já apresentada no Exemplo 13, página
40 do Capı́tulo 1, utilizam-se nove contracções (N = 9) com factor de redução igual
a 1/3 (r = 1/3). Então D = log9/log3 = 2. Este é um exemplo interessante por se
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 135

tratar de uma curva no plano (em R2 ) com dimensão 2. O ponto fixo do SFI que a
define é uma curva que passa por todos os pontos do interior de um quadrado.

Figura 2.21. Esquema de construção da primeira iterada e as primeiras


cinco iteradas da construção da Curva de Peano.

Exemplo 48. Este mesmo processo pode servir para verificar que imagens com
dimensão euclidiana têm dimensão fractal com igual valor. Por exemplo, um segmento
de recta é feito de quatro cópias de si mesmo a uma escala de 1/4. O segmento tem
log 4
dimensão log 14
= 1. Um quadrado é composto de quatro cópias de si mesmo a uma
1 log 4
escala de 2
e tem dimensão log 12
= 2. 

Exemplo 49. A Curva de Koch cuja dimensão fractal já foi calculada no Exemplo
1
40 na página 122 é constituı́da por 4 cópias de si mesma a uma escala de . Tem
3
log 4
dimensão ≈ 1, 286.
log 3
Esta curva tem algumas propriedades interessantes (tais como não ter derivada em
nenhum dos seus pontos e ter comprimento infinito) que serão utilizadas no Capı́tulo
4 em propostas de actividades para realizar com os alunos na aula de Matemática. 

Exemplo 50. As curvas cujas primeiras iteradas estão representadas na Figura 2.22
constroem-se de uma forma idêntica à Curva de Koch, variando o factor de redução
de cada um dos segmentos relativamente ao segmento inicial e, automaticamente, o
ângulo entre estes segmentos. Ambas são definidas por SFI’s constituı́dos por quatro
136 2. A DIMENSÃO FRACTAL

9
contracções de igual factor de contracção; no primeiro caso o factor de contracção é 20

e no segundo é 21 .

...

...
Figura 2.22. Primeiras iteradas da construção de duas curvas com processo
de construção idêntico à Curva de Koch.

log 4 log 4
A dimensão da primeira curva é 20 ≈ 1, 736 e a dimensão da segunda é = 2.
log 9 log 2


Exemplo 51. A Ilha de Minkowski é o fractal construı́do da forma ilustrada na


Figura 2.23. Em cada iteração, o perı́metro da “ilha” aumenta (tendendo para infinito)
mas a sua área mantém-se constante.
log 8
A dimensão da linha que delimita a “ilha” é ≈ 1, 5. 
log 4

Exemplo 52. O Conjunto de Cantor também pode ser visto como compreendendo
quatro cópias de si mesmo a uma escala de 1/9. Com base nisso pode calcular-se a sua
log 4 log 2
dimensão da seguinte forma: D = = ≈ 0, 631. O valor que se obtém é o
log 1/9 log 3
3. DEFINIÇÕES ALTERNATIVAS DE DIMENSÃO 137

Figura 2.23. Primeiras iteradas da construção da Ilha de Minkowski.

mesmo que já se tinha obtido por outros métodos, como é o caso do cálculo efectuado
no Exemplo 32. 
CAPı́TULO 3

Aplicações da Geometria Fractal

139
140 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL
3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL 141

Em cada campo da ciência os conceitos de geometria vão sendo adaptados às ne-
cessidades do que se estuda (morfologia, espaço de 4 dimensões, textura, etc.) sendo
frequentemente utilizados de forma intuitiva. Durante séculos, a geometria euclideana
serviu de base para a modelação e para a compreensão da geometria da Natureza. Com
o aparecimento da geometria fractal nos anos ’70 do século XX, pela mão de Mandel-
brot, que escreveu artigos que a relacionam com a geometria de fenómenos observados
em diversas áreas da ciência, o conceito de fractal acabou por captar a atenção de cien-
tistas de muitos campos diferentes e hoje aparecem diariamente artigos sobre fractais
aplicados nos mais diversos contextos .
A geometria fractal pode ser utilizada para modelar objectos naturais desde a escala
atómica (por exemplo na dinâmica de fluı́dos) até ao tamanho do universo (como no
caso do estudo da formação de galáxias). Porém, há que ter em conta que em cada caso
a aplicação dos fractais está sempre limitada a um intervalo de escalas, fora do qual
a propriedade da auto-semelhança, seja ela exacta ou estatı́stica, já não se verifica.
Isso faz com que, em geral, não se possa aplicar directamente a teoria às situações
práticas; por exemplo, para o cálculo da dimensão de contagem de caixas, na prática,
não se pode considerar o diâmetro das caixas a tender para zero, porque isso deixa
de fazer sentido fora de um determinado intervalo de valores. Assim, a modelação
de objectos ou fenómenos naturais com a geometria fractal, é feita considerando uma
série de aproximações que dependerão do grau correcção que se pretende nos resultados
finais, tal como já se fazia antes com a geometria euclideana onde, por exemplo o
globo terrestre é, em muitos casos, estudado como se de uma esfera se tratasse. Há
também que ter em conta que nem tudo na Natureza é fractal, pelo que a geometria
euclideana continuará a ser útil e necessária. Por exemplo, a luz, constituı́da por
partı́culas elementares e sem subestruturas não é fractal, no entanto, um relâmpago
viaja segundo uma linha fractal. Porções de água parada, ou gotas de água não são
fractais, mas as ondas do oceano e as correntes e percursos dos rios são, muitas vezes,
fractais.
142 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Neste capı́tulo serão apresentadas algumas das aplicações possı́veis da geometria


fractal. Não se pretende que a lista seja exaustiva nem que cada uma das aplicações
seja explicada detalhadamente. As possibilidades de utilização da geometria fractal são
crescentes e, como se verá, existe uma enorme variedades de áreas do conhecimento
onde os fractais são úteis. O que se pretende é dar isso a conhecer neste pequeno
capı́tulo para que sirva de apoio ao capı́tulo que se segue sobre actividades com fractais
na sala de aula e também ao argumento último e principal deste trabalho: É urgente
e importante que os nossos alunos contactem com a geometria fractal e adquiram e
compreendam alguns dos seus conceitos básicos.
As aplicações dos fractais estão divididas em três grupos: aquelas que se aplicam
a objectos ou fenómenos da Natureza, aquelas que são criações humanas e aquelas
que se destinam a modelar ocorrências das ciências economico-sociais ou das áreas
humanı́sticas. Há ainda uma referência à ligação entre os fractais e a Teoria do Caos.

1. Fractais Naturais

1.1. Fractais na Biologia e na Medicina. Os biólogos e os ecologistas, à se-


melhança dos cientistas de outras áreas, começaram por modelar a Natureza usando
a geometria euclidiana. Por exemplo, os batimentos cardı́acos começaram por ser
modelados por sinusóides, as árvores conı́feras por cones, os habitats de animais por
áreas simples e as membranas de células por curvas ou superfı́cies simples. Contudo,
acabaram por reconhecer que muitas das estruturas naturais são melhor modeladas,
caracterizadas ou representadas através da geometria fractal. Os sistemas e os proces-
sos biológicos são tipicamente constituı́dos por vários nı́veis ou subestruturas em que
o mesmo padrão geral se repete em escalas menores. Muitos são os exempos de estru-
turas fractais que podem ser encontrados na Natureza. Basta um olhar minimamente
atento e, com um pouco de treino, poder-se-ão observar vários objectos com geometria
fractal durante um passeio.
Apesar de não haver fractais verdadeiros na Natureza (porque geralmente há sempre
um limite para a escala menor de auto-semelhança no objecto, e porque a Natureza
1. FRACTAIS NATURAIS 143

inclui, por norma, um coeficiente de aleatoriedade nos seus processos) a geometria


fractal revela-se muito mais próxima da Natureza que a geometria euclidiana. Sabe-se
hoje que as relações que dependem da escala têm profundas implicações na fisiologia
humana, na ecologia e em muitas outras subdisciplinas da biologia. O facto da fisiologia
animal ser muito regida pela geometria fractal faz com que os fractais sejam cada vez
mais úteis em diversas áreas da medicina.
A relevância da geometria fractal na biologia depende dos objectivos. Se se quiser
estimar a espessura média do tronco das árvores de uma determinada espécie, aproximá-
lo a um cilindro pode muito bem ser suficiente; mas se se quiser modelar o habitat de
pequenos insectos que vivem nesses troncos, a geometria fractal poderá ser muito mais
adequada. É que se se tratar de um tronco rugoso, a distância que um insecto de 10
mm terá que percorrer para o contornar será maior que o diâmetro da circunferência
inicialmente considerada. E se o insecto medir 1 mm, maior ainda será essa distância.
Quanto mais rugoso for o tronco, maior será a diferença nos comprimentos e nas áreas
de superfı́cie notada entre insectos maiores e insectos menores.
Vejam-se agora alguns exemplos da aplicabilidade dos fractais na biologia e na
medicina.
1.1.1. Estruturas de células. A dimensão fractal já foi usada como medida da com-
plexidade do contorno de células neuronais em imagens bidimensionais; e o valor da
dimensão fractal foi recomendado como uma medida morfológica quantitativa da com-
plexidade celular a ter em conta.
1.1.2. Fı́sica do Solo. Determinou-se a dimensão fractal de solos a partir da dis-
tribuição dos tamanhos das partı́culas que os compõem e estudou-se a relação da sua
dimensão com as suas propriedades de percolação e de retenção de água. O mesmo
método também já foi usado para estudar a fragmentação do solo. Este e outros
métodos utilizaram-se para estimar a dimensão fractal da massa, dos poros e da su-
perfı́cie de solos arenosos e lodosos. Sugeriu-se que também seria interessante analisar
144 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

a relação entre a geometria fractal do solo e a diversidade das suas micro-flora e micro-
fauna.
1.1.3. Estruturas de Plantas e de Fungos. Já foi medida a dimensão fractal do
contorno de folhas de várias espécies e pensa-se que, apesar desse valor variar bastante
dentro da mesma espécie, ele poderá vir a ser uma referência taxonómica.
Também já foi medida a dimensão fractal de sistemas de raı́zes através do método
de contagem de caixas e demonstrou-se que a dimensão fractal de um sistema de raı́zes
vai aumentando ao longo do tempo e varia conforme a espécie.
A geometria fractal da forragem de fungos foi estudada e concluiu-se que a dimensão
fractal varia entre as espécies e tende a ser maior quando há mais nutrientes disponı́veis.
Muitas plantas crescem de forma ramificada: o tronco subdivide-se em vários ramos
que, por sua vez, se subdividem em ramos mais estreitos e assim por diante. Muitas
vezes, uma parte da planta tem uma forma semelhante à planta completa.

Figura 3.1. Diversos elementos da flora que exibem a repetição


da mesma forma a várias escalas. (Imagens retiradas respectivamente de

http://www.flickr.com/photos/marsupial, http://www.flickr.com/photos/ricardo ferreira e

http://www.flickr.com/photos/gripspix.)

1.1.4. Sistemas ramificados na fisiologia animal. Alguns dos exemplos de fractais


com estrutura mais intricada encontram-se na fisiologia animal: os sitemas respiratório,
circulatório e nervoso possuem uma estrutura altamente ramificada.
O sistema pulmonar é composto por tubos através dos quais o ar passa para os
alvéolos que são sacos microscópicos. O tubo principal do sistema pulmonar é a traqueia
que se subdivide em dois tubos mais finos, que se subdividem em brônquios que, por
1. FRACTAIS NATURAIS 145

Figura 3.2. Vegetais com estrutura fractal. Nestes dois casos é clara
a semelhança entre uma parte da planta e a planta inteira. (Imagens reti-

radas respectivamente de http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Nature/NAtFracGallery e de

http://www.flickr.com/photos/87024394@N00).

sua vez se subdividem em tubos cada vez mais finos, e assim sucessivamente até se
atingirem os tubinhos mais fininhos do sistema que são os bronquı́olos, que vão dar
aos alvéolos. Uma análise cuidada aos pulmões revela que este possui vários nı́veis de
auto-semelhança e notou-se que esta estrutura fractal torna os pulmões mais tolerantes
a defeitos durante o crescimento.

Figura 3.3. Imagem do sistema pulmonar e de um modelo fractal


desse sistema. (Imagens retiradas respectivamente de http://www.imunoonco.com.br e de

http://library.thinkquest.org/26242/full/)

De forma semelhante, a subdivisão sucessiva pode também ser encontrada nos vasos
sanguı́neos. A aorta divide-se em artérias menores, que por sua vez se vão subdividindo
146 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

em vasos sanguı́neos mais estreitos até se chegar aos vasos capilares. O coração está
repleto de redes fractais: as coronárias, as artérias e as veias, as fibras que ligam as
válvulas à parede do coração, os músculos cardı́acos e o sistema His-Purkinje (que
é constituı́do pelas fibras através das quais viajam os impulsos eléctricos que fazem
contrair os ventrı́culos).

Figura 3.4. Modelo do sistema de irrigação do coração humano (Scien-


tific American, 1990. (262) February, p. 46. by Hans van Beek and

James B. Bassingthwaighte, University of Washington. Imagem retirada de

http://fractogene.com/full genome/fractal visual gallery.html.)

Os biólogos investigam também as estruturas ramificadas de neurónios como a que


está representada na Figura 3.5.
Para além de proporcionar mais tolerância a defeitos no crescimento e a danos,
a ramificação fractal amplifica grandemente a área da superfı́cie de um tecido, quer
seja ele para absorção (caso do pulmão e do intestino), para distribuição e colheita
(vasos sanguı́neos, bronquı́olos, intestino, condutas da bı́lis) ou para processamento de
informação (nervos).
Em consequência de uma pesquisa sobre tambores com formas fractais (ver página
168) concluiu-se que outra vantagem da forma fractal do sistema circulatório é a de
este poder amortecer a força com que o sangue é bombeado pelo coração, evitando que
haja ressonância na circulação do sangue.
1. FRACTAIS NATURAIS 147

Figura 3.5. Neurónio. Foto de Paul De Koninck. ( Imagem retirada de

http://www.greenspine.ca/en/mGFP neuron2.html).

Há ainda a acrescentar que o corpo humano também apresenta dinâmicas fractais.
Por exemplo, o batimento cardı́aco de um coração saudável é caótico e não regular.
A representação gráfica de um batimento cardı́aco revela auto-semelhança em diversas
escalas de tempo.
O cálculo da dimensão fractal é utilizado para o diagnóstico de células tumorais. As
células doentes tendem a ser mais ramificadas e, por isso, terão uma dimensão fractal
maior que as células sãs.
A geometria fractal é também útil para caracterizar os padrões gerados por electro-
encefalogramas em estudos sobre o reconhecimento de odores familiares e em estudos
sobre os diversos estados do cérebro durante o sono.
1.1.5. O tamanho dos organismos e a sua fisiologia. A modelação da relação entre o
tamanho e a fisiologia (ritmo de metabolismo, velocidade de crescimento da população
da espécie, idade da primeira reprodução, duração do desenvolvimento do embrião,...)
de cada ser vivo só começou a produzir previsões de valores próximos aos obtidos
nas observações directas quando se entendeu que os mecanismos de distribuição de
148 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

alimento e de energia nos organismos tinham estruturas fractais. A partir da análise


em termos geométricos e fı́sicos dos sistemas de tubos que fazem a distribuição de
recursos (oxigénio, alimento) e de desperdı́cios por todo o organismo, e a partir das
premissas de que a rede de distribuição tinha que alcançar todos os pontos do corpo
tridimensional devendo, para tal, requerer o mı́nimo de energia para transportar esses
elementos num meio fluı́do, sendo os últimos ”tubinhos”da rede (por exemplo os vasos
capilares num sistema circulatório) todos do mesmo tamanho (considerando que as
células em todos os seres vivos são, grosso modo, do mesmo tamanho) concluiu-se
que tal rede de distribuição era melhor caracterizada por um sistema de ramificação
fractal para preenchimento do espaço. Com este sistema, ao qual foram acrescentados
melhoramentos que têm em conta alguns aspectos dinâmicos inicialmente desprezados
(como por exemplo a elasticidade dos vasos sanguı́neos), obtiveram-se previsões que se
aproximavam mais dos valores observados na prática (e outras que depois teriam que
ser, ou não, comprovadas). Este método prevê, por exemplo, o grau de ramificação de
um sistema circulatório e indica que uma baleia, sendo 107 vezes mais pesada que um
rato, apenas necessita de mais 70% de ramificações no seu sistema circulatório para
poder abastecer todo o seu organismo.
1.1.6. O tamanho dos organismos e o número de indivı́duos. Observou-se que a
previsão do número de indivı́duos invertebrados, baseada na sua massa corporal e nas
suas taxas metabólicas, funcionava bem para organismos maiores, mas subestimavam
constantemente os valores depois obtidos na prática para as classes de organismos de
tamanhos menores. Essas previsões eram depois consideravelmente melhoradas quando
a dimensão fractal do habitat era incorporada no modelo. Os organismos pequenos po-
dem ser comparativamente mais abundantes porque podem aproveitar melhor o espaço
que lhes é cedido pelas estruturas fractais do habitat. Isto foi testado através da
utilização de substratos artificiais de diferentes dimensões fractais.
1. FRACTAIS NATURAIS 149

1.1.7. Movimento de organismos. Movimentos brownianos fractais foram usados


para caracterizar o movimento de organismos. A análise fractal foi usada para examinar
os pequenos movimentos da aranha na presença e na ausência de feromonas dispersas.
Foram também feitos vários estudos sobre como se movimentam vários organismos,
segundo o seu tamanho, num terreno de estrutura fractal.
O aglomerado de indivı́duos numa colónia levanta questões importantes acerca da
escala da estrutura e funcionamento da mesma. Modelou-se os benefı́cios metabólicos
e os custos de trilhos de “saque”, tipo fractal, do género dos que são usados pelas
colónias de algumas espécies de formigas. A área total saqueada pela colónia e, con-
sequentemente, o fluxo de recursos para o ninho e a taxa de metabolismo da colónia,
2
aumentam de forma não linear com o número F de “saqueadores” segundo F 3 e os cus-
tos do “saque” aumentam linearmente com F . O modelo previu um número óptimo de
“saqueadores” e, consequentemente, a área total de saque que maximiza a boa-forma
da colónia e a alocação de energia necessária para a reprodução.
1.1.8. Dispersão de Organismos e de Doenças. Pensa-se que a dispersão de diásporas
e de patogenes têm propriedades fractais. O padrão formado pelo espaço ocupado numa
paisagem por espécies de plantas que produzem diásporas adaptadas para percorrer
longas distâncias terá uma dimensão fractal baixa. Estas plantas dispersam-se pela
paisagem, avançando com grandes intervalos entre os diversos pontos de fixação, esta-
belecendo continuamente novas colónias e epicentros que se apresentam em diferentes
escalas. Contrariamente, as espécies menos adaptadas a percorrer longas distâncias,
percorrem a paisagem estabelecendo-se nela de forma contı́nua, apresentando novos
epicentros apenas ocasionalmente, o que origina um padrão de distribuição do espaço
com dimensão fractal mais alta.
Assim, fazendo uma transposição deste modelo para os agentes patogénicos, conclui-
se que serão difı́ceis de prever novas erupções de patogenes cuja distribuição tenha
menor dimensão fractal.
150 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

As bactérias podem formar padrões muito interessantes quando crescem em labo-


ratórios em pratos petri. As estruturas das colónias formam respostas de adaptação
às condições impostas em laboratório que simulam as condições hostis que enfrentam
na Natureza. As imagens formadas por essas estruturas ilustram as estratégias que as
bactérias empregam e que envolvem cooperação através da comunicação. Estas mesmas
estratégias são usadas pelas bactérias quando lutam contra os melhores antibióticos.
Portanto, se forem compreendidos os mecanismos que estão por detrás dos padrões,
poderá ser possı́vel aprender como iludir as bactérias, interferindo, por exemplo, na
sua comunicação.

Figura 3.6. Padrão formado por bactérias em crescimento, em laboratório,


em prato petri. A imagem é da autoria de Eshel Ben Jacob que adicionou cor

para obter uma imagem artı́stica. (Imagem retirada de http://star.tau.ac.il/ eshel/.)

1.1.9. Complexidade de Habitats. Sabe-se que a coexistência de espécies aumenta


com a dimensão fractal da paisagem e que a natureza fractal das paisagens é um
importante determinante das taxas de utilização de recursos.
1.1.10. Imagem e Análise de Texturas. Há vários métodos de análise de texturas
baseados na geometria fractal. A análise de imagens tem sido usada na medicina e na
biologia celular para analisar, por exemplo, as estruturas locais e as de larga-escala de
imagens de ressonâncias magnéticas cardı́acas e de raios-X aos ossos.
1. FRACTAIS NATURAIS 151

1.2. Fractais na Geologia, na Geografia e na Meteorologia. A invariância


de escala nos fenómenos geológicos é um dos primeiros conceitos ensinados aos estudan-
tes de Geologia. Eles aprendem que quando fotografam um objecto geológico devem
colocar ao lado um outro objecto do qual se conheça o tamanho (por exemplo uma mo-
eda ou um martelo) que possa servir de referência para a escala. A fotografia de uma
pedra ou um pequeno curso de água podem parecer imagens aéreas de uma montanha
e de um rio se não se tiver tido esse cuidado.
Os rios são bons exemplos de fractais naturais, dada a sua forma ramificada e
tortuosa. As cascatas também podem apresentar efeitos visuais de aspecto fractal, com
ramificações sucessivas do curso da água, criadas pela combinação da força gravı́tica e
a forma da superfı́cie da rocha por onde cai a água.

Figura 3.7. Vista aérea de uma rede fluvial e fotografia de uma cascata; em
ambas as imagens são bem visı́veis estruturas ramificadas auto-semelhantes.

(Imagens retirada de http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Nature/Rivers/Rivers.html.)

Os sitemas fluviais têm dimensão fractal [4, pág. 5], havendo uma relação entre o
comprimento do braço principal e a área drenada. [4, pág. 209].
O movimento das ondas do mar sendo muito interessante de observar, é também
vital para diversas actividades. O ciclo de vida de alguma fauna e flora marinha
dependem dos ciclos das marés. Por outro lado, uma boa parte das perdas de vidas
152 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

humanas e de barcos no mar é devida à altura das ondas em momentos de tempo


severo. Por isso, observações detalhadas da altura das ondas, do perı́odo e de outras
caracterı́sticas têm vindo a ser efectuadas em muitos locais por todo o mundo. Trata-se
de uma análise semelhante à do movimento browniano (ver página 155) com a que se
pretende, entre outras coisas, prever quando irão ocorrer ondas grandes [4, pág. 193].
As formações de estalactites e de estalagmites nas grutas subterrâneas também
apresentam padrões fractais.

Figura 3.8. Duas imagens de grutas onde a geometria fractal é bem


visı́vel. (Imagens retiradas respectivamente de http://www.flickr.com/photos/45995688@N00 e

de http://www.flickr.com/photos/51656349@N00).

Muito do vasto interesse pelos fractais deve-se, provavelmente, à produção por


computadores de fabulosas imagens de paisagens. A partir de imagens de satélite, já se
fazem estudo de paisagens, relativamente ao contorno da mancha florestal, em que se
recorre à geometria fractal para análise dos dados. Modelos simples de paisagens e de
costas marı́timas podem conseguir-se rapidamente com meios computacionais bastante
reduzidos [4, pág. 3] (veja-se a Proposta 14, na página 258). A costa marı́tima é mais
um bom exemplo de fractalidade na Natureza. À medida que se fazem ampliações na
curva delineadora da costa marı́tima, mais e mais pormenores vão sendo revelados e
formas estatisticamente semelhantes à inicial vão surgindo.
Os tremores de terra ocorrem em estruturas de falhas com amplitudes que variam
desde os milhares de quilómetros até aos centı́metros[15]. Os sismologistas usam os
1. FRACTAIS NATURAIS 153

fractais para estudar as fissuras causadas por tremores de terra[9]. As montanhas são
construı́das por forças tectónicas e são esculpidas pela água e pelo vento que actuam de
formas semelhantes, em diversas escalas. Apresentam formas fractais e podem inclusivé
ser imitadas por algoritmos matemáticos e software baseado na geometria fractal.

Figura 3.9. Duas imagens de montanhas onde a ge-

ometria fractal está bem patente. (Imagens retiradas de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Nature/MountainsReal/MountainsReal.html).

Ecologistas e ambientalistas tentam prever o percurso dos fogos florestais e o pos-


terior processo de regeneração da floresta. A geometria fractal é útil também aqui.
A superfı́cie das nuvens tem dimensão fractal. [4, pág. 5] As núvens têm invariância
estatı́stica de escala. Sem uma referência, é difı́cil saber o tamanho real da nuvem. Con-
tudo, apesar da teoria dos fractais fornecer uma forma elegante de descrever grande
parte da estrutura das nuvens, ainda não se compreende bem porque é que as núvens
têm uma estrutura fractal. Têm sido realizados estudos, a partir de imagens de nuvens
obtidas por satélites meteorológicos, em que se estima a dimensão fractal das núvens
para tentar perceber se existe diferença na dimensão fractal das nuvens conforme seu
tipo e estágio (com ou sem chuva ou granizo, etc.) e, em caso afirmativo, saber se exis-
tem meios de calcular essa dimensão de maneira suficientemente precisa que permita
discriminar os diferentes tipos de nuvens. Voss (1985) conseguiu gerar computacional-
mente, imagens notáveis de nuvens fractais cuja qualidade visual só tinha sido ainda
conseguida por pintores. [4, pág. 207].
154 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.10. A forma das núvens pode ser muito variada e


a sua dimensão fractal tem sido objecto de estudo, procurando-

se uma relação entre esta e a constituição da nuvem. (Ima-

gens retiradas de http://www.flickr.com/photos/93975313@N00/366255969/ e de

http://www.flickr.com/photos/fernandafronza/407955174/ respectivamente).

O tempo metereológico comporta-se de forma inconstante. Às vezes altera-se de


forma lenta de um dia para o outro e outras vezes muda rapidamente, isto é, o tempo
apresenta padrões fractais.

Figura 3.11. ”...nem os relâmpagos viajam em linha recta”disse Mandel-


brot para ilustrar as propriedades fractais da Natureza. (Imagens retiradas respec-

tivamente de http://www.flickr.com/photos/thirnbeck/ e de http://www.flickr.com/photos/jirik).

O crescimento de populações urbanas em torno de um núcleo pode também formar


padrões com caracterı́sticas fractais.

1.3. Fractais na Fı́sica. O acaso é inerente a todos os fenómenos naturais. Até o


mais perfeito dos cristais tem inúmeras impureza e defeitos situados ao acaso. E mesmo
1. FRACTAIS NATURAIS 155

que o cristal fosse perfeito com todos os átomos no seu devido lugar, isso seria apenas
em termos médios, já que cada átomo se encontra sempre em movimento térmico.
Portanto, o estado de qualquer sistema, por mais perfeito que seja, tem elementos
aleatórios, por isso, muitos fenómenos ou objectos naturais terão de ser modelados
através de fractais aleatórios (que não foram estudados neste trabalho).
Os percursos aleatórios, ou movimentos brownianos têm grande importância na
fı́sica, na quı́mica e na biologia. O movimento errático de partı́culas microscópicas de
pólen é fı́sico, e não biológico, como se pensou inicialmente. Tudo está sujeito a flu-
tuações térmicas e moléculas, macromoléculas, vı́rus, partı́culas e outros componentes
do mundo natural estão todos em constante movimento, colidindo ao acaso devido à
energia térmica.
O movimento de uma partı́cula browniana visto pelo microscópio consiste aparen-
temente em passos dados numa direcção aleatória e com um comprimento que tem um
determinado valor caracterı́stico. O movimento de uma partı́cula num dado intervalo
de tempo é independente do seu movimento noutro intervalo de tempo. Aumentar a
resolução do microscópio e a resolução da escala de tempo apenas produz percursos
aleatórios semelhantes.
Muitas imagens atractivas e interessantes podem ser geradas usando teorias da
quı́mica e da fı́sica. Um exemplo disso é o processo de agregação por difusão limitada
(DLA) que descreve, entre outras coisas, a difusão e a agregação de iões de zinco numa
solução electrolı́tica nos eléctrodos e que produz estruturas do tipo das que estão na
Figura 3.12.
O modelo de agregação por difusão limitada conduz a estruturas que exibem au-
tosemelhança estatı́stica, constituı́das por aglomerados de partı́culas, arborescentes e
altamente ramificadas. Existem vários exemplos na Fı́sica e na Biologia que correspon-
dem a modelos de crescimento deste tipo: solidificação dendrı́tica, colónias de bactérias,
sistema vascular da retina, etc. E é também compatı́vel com a produção de relâmpagos,
a cristalização de lava, formação de cristais como os dos flocos de neve e crescimento
156 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.12. Imagens deste tipo são obtidas nos processos de Agregação
por Difusão Limitada, e também em colónias de bactérias em crescimento.

(Imagem retirada de http://local.wasp.uwa.edu.au/∼pbourke/fractals/fracintro/).

de espaços urbanos, entre outros fenómenos. O uso da geometria fractal para o estudo
de fenómenos como a cinética da agregação, da congelação e da sedimentação ajuda a
racionalizar grandes quantidades de resultados experimentais. [4, pág. 3-4]
Quanto à deslocação de um fluido num meio poroso (fenómeno designado por per-
colação) sabe-se que, quando o fluido é de baixa viscosidade ou é um gás, a sua des-
locação é matematicamente idêntica à cinética do processo de agregação.
Os engenheiros estudam o comportamento fluido imprevisı́vel da água ou do gás
quando injectado em reservatórios de petróleo e também esse fenómeno produz padrões
fractais.
A superfı́cie de um pó e de outros meios porosos é fractal [4, pág. 5]. A superfı́cie
especı́fica do modelo depende do tamanho das moléculas usadas. A porosidade mi-
croscópica de certas substâncias pode também ser fractal [4, pág. 237-239].
1. FRACTAIS NATURAIS 157

Quando uma peça de metal é fracturada, a superfı́cie que se forma na fractura é


áspera e irregular e pode ser modelada utilizando geometria fractal. O mesmo acontece
com o alastramento de uma fractura numa superfı́cie (como num vidro, por exemplo).
Alguns cristais, nomeadamente os flocos de neve, podem apresentar uma estru-
tura fractal. Existem diversos tipos de flocos de neve e alguns deles têm uma forma
semelhante ao conjunto conhecido por Ilha de Koch (ver Proposta 4 na página 205).

Figura 3.13. Há diversos tipos de flocos de neve. Alguns têm estruturas
fractais. (Imagens retiradas de http://www.its.caltech.edu/ atomic/snowcrystals/).

1.4. Fractais na Astronomia. A estrutura do Universo possui auto-semelhança.


O Universo é composto de aglomerados gigantes de estrelas e planetas que, por sua
vez, são compostos por aglomerados menores, que são compostos por galáxias, que são
compostas por sistemas de estrelas como o nosso sistema solar que, por sua vez ainda,
são compostos por planetas com as suas respctivas luas em torno de si.
Há um consenso geral acerca da existência de estruturas fractais no universo a partir
de, aproximadamente, 50 milhões de anos-luz, mas há dificuldades em determinar as
escalas de distância entre as galáxias. Por isto e por outros pormenores de natureza
técnica e cientı́fica onde não há conhecimentos ainda suficientes, ou acordo entre os
cientistas, o grau de fractalidade do universo também não é ainda consensual.
158 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.14. Galáxia criada por computador. (Imagem retirada de

http://library.thinkquest.org/26242/full/).

2. Fractais criados pelo Homem

A partir do momento em que o aparecimento e a evolução dos computadores per-


mitiu a construção e a visualização rápidas de fractais, isso nunca mais parou de acon-
tecer. Os fractais são desenhados não só por motivos estéticos e por puro divertimento
e deleite dos que os constroem e observam, mas fazem também parte de inúmeras ex-
periências e projectos na área da informática, do cinema, da indústria e da tecnologia
e ainda de diversas expressões de arte.

2.1. Imagem, Cinema, Informática, Tecnologia, Indústria. Imagens gera-


das por computador foram uma das primeiras aplicações dos fractais. Através dos
fractais pode conseguir-se realismo e beleza, ocupando pouco espaço de memória por
ser fácil comprimir os dados. Benoit Mandelbrot publicou no seu livro Fractal Ge-
ometry of Nature imagens de paisagens muito bonitas, geradas por computador por
Richar Voss. Mais tarde, a indústria cinematográfica utilizou métodos idênticos para
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 159

criar cenários virtuais. A geometria fractal permite simular imagens naturais não só
de paisagens, como também de núvens e de plantas (veja-se o Exemplo 14 na página
42).

Figura 3.15. Paisagens criadas por computador. A última é da auto-


ria de Sig Handelman e as restantes são da autoria de Musgrave.(A primeira

imagem foi retirada de http://library.thinkquest.org/26242/full/. As restantes foram retiradas de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/.)

Ainda na área da imagem digital, quando se pretende converter uma imagem a


cores para uma escala de cinzentos e depois imprimi-la, usam-se as chamadas técnicas
de dithering que pretendem simular que se possui uma paleta grande de cores, quando
160 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

na verdade se dispõe apenas de preto e branco. Uma delas consiste em varrer a imagem
por linhas, colocando em cada pixel uma quantidade de tinta apropriada ao tom cor-
respondente da escala de cinzentos. Mas este processo produz, habitualmente, imagens
de muito baixa qualidade, em que se nota esse varrido por linhas. A curva de Hilbert
é conhecida desde 1890 e é, portanto, muito anterior ao inı́cio do desenvolvimento da
geometria fractal por Benoı̂t Mandelbrot, mas há aplicações técnicas desta curva no
processamento de imagens digitais. Se se aplicar um algoritmo em que esse varrido dos
pixeis seja feito segundo a curva de Hilbert, conseguem-se imagens de melhor qualidade
em que a direcção do varrido dos pixels não se nota (veja-se a Figura 3.16).
A compressão de dados informáticos também pode ser feita através de métodos
que envolvem a geometria fractal. Uma imagem do Conjunto de Mandelbrot (ver
página 163 e seguintes e Figura 3.20 na página 165), em formato GIF, ocupando todo
o écan, pode ocupar 35 kilobytes e pode ser armazenada segundo a fórmula que a gera
- z = z 2 + c - que não ocupa mais do que 7 bytes. Neste caso, tem-se uma compressão
de 99.98%. Da mesma forma, para outra imagem qualquer, podem procurar-se funções
que produzam, cada uma delas, uma parte da imagem dada. Para uma imagem que não
seja fractal poderão ser necessárias centenas de funções dessas; no entanto isso pode,
ainda assim, ocupar menos espaço que mihares de pixels coloridos. Michael Barnsley
foi quem primeiro sistematizou os fractais gerados por sistemas de funções iteradas e
quem lançou a base da compressão de imagens através da geometria fractal, utilizando
os SFI. Para além de se conseguirem valores muito bons de compressão, o importante
é que essa compressão é feita sem perdas, isto é, ao recuperar a imagem ela está igual
e, além disso, pode ainda usar-se o SFI para gerar mais detalhe e conseguir imagens
de alta-resolução.
A estutura da Internet é constituı́da por um número relativamente pequeno de
grandes nós que se ligam a um número maior de nós de tamanho médio que, por sua
vez se ligam a uma imensidão de pequenos nós. É uma estrutura com caracterı́sticas
fractais. A modelação do tráfego na internet é um ingrediente chave na planificação
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 161

Figura 3.16. Em cima está a imagen de Lena original em 256 nı́veis de


cinzento (à esquerda), com dithering para imitar 256 nı́veis a partir de um

conjunto menor de tons (ao centro) e com dithering baseado só em dois tons

(à direita). Na segunda linha pode comparar-se o dithering tradicional (à

esquerda) com o dithering com a curva de Hilbert (à direita). Finalmente

mostra-se como é feito o varrido dos pixeis seguindo a curva de Hilbert. (As

imagens foram retiradas de http://coco.ccu.uniovi.es/geofractal/capitulos/01/01-15.shtm.)

e construção de redes e na gerência das terefas nelas processadas. Tem-se vindo a


demonstrar que o tráfego na internet também tem caracterı́sticas fractais e, com base
nisso, tem-se vindo a tentar modelar melhor o tráfego na internet combinando as suas
caracterı́sticas fractais com outras propriedades conhecidas. Para além de modelar o
tráfego, há também necessidade de modelar a topologia da rede de suporte à internet.
E estes dois factores estão correlacionados; por um lado, se se alterar a rede em si, isso
provocará modificações no tráfego e por outro, as redes são construı́das com base no
tráfego que têm que suportar.
162 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Apesar de os fractais estarem essencialmente presentes na Natureza e de os obejctos


feitos pelo homem terem formas dominadas pela geometria euclidiana, o facto de a
geometria fractal ter vindo a ser reconhecida como importante na modelação de muitos
fenómenos levou a que várias empresas tivessem começado a explorar a aplicabilidade
das formas fractais nos seu produtos. Por exemplo, as antenas com formatos comuns são
sensı́veis apenas a um número limitado de frequências e não são eficientes se a frequência
for menor que um quarto do comprimento de onda. Isto transforma o desenho de
pequenas antenas portáteis, como as dos telemóveis, num desafio. As antenas com
formatos fractais podem ultrapassar algumas destas dificuldades, já que a experiência
demonstrou que as antenas cuja forma corresponda à imagem obtida após um pequeno
número de iterações da construção de um fractal conseguem detectar várias frequências.
À medida que o número de iterações aumenta, o campo de frequências detectáveis pela
antena aumenta também. Além disso, as antenas fractais conseguem ser operacionais
com apenas um quarto do tamanho das antenas comuns. Várias companhias estão já
a utilizar os fractais para a construção de antenas multi-frequência de telefones móveis
e de hardware militar (ver Figura 3.17).

Figura 3.17. Exemplo de antena com o formato de (uma determi-


nada iteração no processo de construção de) um fractal. (Imagem retirada de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/ManuFractals/FractalAntennas/FractalAntennas.html).
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 163

A construção de feixes de fibra óptica, segundo um processo iterativo, formam cabos


cujo contorno da sua secção é fractal e que conseguem melhor rendimento no tranporte
da informação (ver Figura 3.18).

Figura 3.18. Secção de cabo de fibra óptica com a colocação


das fibras segundo uma estrutura fractal. (Imagem retirada de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/ManuFractals/FractalFiberoptics/FractalFiberoptics.html).

Na indústria são usados misturadores com estruturas fractais que permitem a mis-
tura de fluı́dos com um menor grau de turbulência que os misturadores “normais” e
ainda com consumo inferior de energia. Com este tipo de misturadores pode conseguir-
se um maior controlo das reacções entre os vários fluı́dos quando se misturam, já que
o fluido injectado sai de todos os pontos de injecção ao mesmo tempo, porque todos
estão à mesma distância da fonte (ver Figura 3.19). Salienta-se ainda que a área de
interface entre os fluidos é aumentada significativamente em relação aos injectores de
fluidos com formas geométricas tradicionais.
Há vários métodos de análise de texturas baseados na geometria fractal. Isto pode
ter várias aplicações e um exemplo é a utilização destes métodos para a detecção de
falhas em tecidos na indústria têxtil.
Imagens digitais de rara beleza e extremamente complexas são criadas segundo o
mesmo processo com que é desenhado o Conjunto de Mandelbrot .
164 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.19. Misturadores de fluı́dos com forma fractal, cons-

truı́dos pela Amalgamated Research Inc. (Imagem retirada de

http://www.arifractal.com/ari%20engineered%20fluid%20transporting%20fractals.pdf).

Esse conjunto é um fractal definido como o conjunto


 de pontos c = x + yi ∈ C para

z0 = 0

os quais a sucessão definida recursivamente por não tende
2

zn+1 = zn + c, n ∈ N

para o infinito. Para representar este conjunto graficamente, basta pintar o ponto do
plano de coordenadas (x, y) de preto, caso c = x+yi pertença ao conjunto, e de branco,
caso não pertença (ver Figura 3.20).
Este conjunto foi definido pela primeira vez em 1905 por Pierre Fatou, um ma-
temático francês que trabalhou no campo da dinâmica analı́tica complexa. Na era de
Fatou ainda não existiam computadores, mas ele tentou calcular e representar grafi-
camente os pontos do conjunto à mão. E provou que uma vez que um ponto atinja
uma distância da origem maior que 2, a sucessão correspondente (órbita) tenderá para
infinito. Fatou nunca viu uma imagem deste conjunto que deve o nome a Benoı̂t Man-
delbrot, a primeira pessoa a utilizar um computador para representar o conjunto gra-
ficamente. Com o computador é ainda possı́vel adicionar cor à representação gráfica
do conjunto, atribuindo uma cor a cada pı́xel consoante o número de iterações que
são necessárias para que se atinja uma certa distância da origem. Usando métodos
idênticos para outras fórmulas matemáticas, podem ser criados outros conjuntos cujas
imagens são sempre extremamente complexas e, muitas vezes, extremamente bonitas.
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 165

Figura 3.20. Representação gráfica do Conjunto de Mandelbrot -


os pontos a preto são os que lhe pertencem. (Imagem retirada de

http://pt.wikipedia.org/wiki/Conjunto de Mandelbrot).

Como em todos os outros fractais verdadeiros, podem realizar-se ampliações sucessivas


de partes do conjunto e verificar que nele estão contidas infinitas cópias (exactas ou
aproximadas) de si mesmo.

2.2. Arte. Tal como já sugere o último exemplo de aplicação dos fractais men-
cionado na secção anterior, eles também estão presentes na arte. Ou porque o ob-
jecto artı́stico é construı́do segundo processos da geometria fractal, ou porque esta é
útil para investigar acerca das caracterı́sticas desse objecto. Curiosamente, isso não é
válido apenas para imagens ou objectos tridimensionais, como esculturas ou edifı́cios
arquitectónicos, como à partida se poderia pensar; os fractais estão também presentes
na música!
2.2.1. Música. A relação entre a música e a matemática há muito que é conhecida
e as ligações entre as duas disciplinas são de vária ordem - simetrias entre trechos da
166 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.21. O Conjunto de Mandelbrot representado a cores e outra ima-


gem construı́da segundo o mesmo processo. (Imagens retiradas respectivamente de

html.rincondelvago.com/fractales-y-caos.html e de http://www.faemalia.net/Fractals/Sterling-v1.7-

Part1/).

composição e relação entre comprimentos de cordas de um instrumento e os tons das


notas musicais que delas soam, são dois exemplos. A geometria fractal é mais uma
forma de relacionar a matemática e a música.
A música fractal é o resultado de um processo iterativo no qual um algoritmo é
aplicado a uma nota musical inicial para produzir a nota seguinte, de seguida aplica-
se a mesma fórmula à nota obtida para determinar a terceira nota musical, e assim
sucessivamente. Este tipo de processo origina normalmente uma “melodia” caótica e
totalmente imprevisı́vel, mas pelos resultados interessantes produzidos, tem vindo a
ganhar entusiastas e apreciadores. Na verdade, este estilo de música desperta reacções
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 167

dı́spares nas pessoas, entre o apreciar muito e o detestar ao ponto de se sentir mal
fisicamente ao ouvi-la.
Existe uma variedade considerável de software disponı́vel na internet para com-
posição de música fractal e alguns dos programas transformam imagens fractais, como
o Conjunto de Mandelbrot (ver Figura 3.21 na página 166), em música. Fazem isso
associando a cor de cada pixel a uma nota. Percorrendo a imagem linha a linha obtém-
se uma melodia. Outro método consiste em criar as notas com base na localização do
“pixel” no monitor do computador, na ordem pela qual o fractal foi criado. Estes são
apenas dois dos métodos possı́veis para a transformação de uma imagem fractal em
música fractal, existindo ainda outros.
Existem já alguns músicos profissionais a usar música fractal, como é exemplo a
”New World Chaos”, uma banda de música fractal, ou a ”Omar´s Basement”, uma
banda de jazz, que em 1995 actuou na Austrália com uma música de 4 minutos em
que a bateria, o baixo, a guitarra e o saxofone foram tocados por pessoas e o piano
sintetizado foi tocado por um computador que tinha um programa fractal. Portanto,
quando menos se esperar, a música fractal poderá ainda vir a desempenhar um papel
na sociedade, idêntico ao de outros estilos musicais. Um dos compositores que mais se
tem dedicado a este tipo de música é Phil Thompson, hoje o mais conceituado autor
de música fractal.
Por outro lado, a análise de partituras de música não fractal, isto é, não produzida
da forma supracitada, pode, por vezes, também revelar auto-semelhança no processo
de composição. Há quem encontre aspectos da geometria fractal nos trabalhos de
compositores de música clássica e barroca.
Uma das experiências possı́veis consiste em retirar o terço central da composição
e depois retirar o terço central de cada um dos dois trechos restantes, e assim suces-
sivamente, repetindo isto diversas vezes, à semelhança da construção do Conjunto de
Cantor (ver Exemplo 11 na página 38) e de seguida verificar se o que sobra ainda soa de
forma idêntica à composição inicial. Isso acontece realmente em composições de Bach,
168 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Beethoven e Brahms mas não em obras de outros compositores menos complexos. Isto
pode sugerir que a robustez de uma composição perante um processo destes possa ser
um indicador de sofisticação musical.
Já foram construı́dos tambores com formas fractais e analisados os movimentos da
sua superfı́cie quando se bate num ponto. Verificou-se que, ao contrário dos tambores
normais em que toda a superfı́cie vibra, nestes consegue-se que apenas vibre uma parte
da sua superfı́cie. Em consequência disto, foi sugerido que a razão de a costa marı́tima
ser fractal (veja-se a página 152) é que essa é a melhor forma para travar as ondas e a
sua acção erosiva, de modo que a forma da costa fique estabilizada, sem que essa acção
consiga provocar alterações significativas.
Um projecto, intitulado “A Música do coração” consiste em transformar os da-
dos obtidos em gravações digitais dos sinais elécticos do coração humano (através de
electrocardiogramas - ECG) em música. Os dados obtidos no ECG são convertidos
em notas musicais e a seguir o compositor acrescenta harmonia e ritmo para tornar
a música agradável. Como já foi dito antes, um coração saudável apresenta um bati-
mento cardı́aco irregular e, por isso, a partir do método usado neste projeccto, produz
músicas agradáveis e melodias interessantes, enquanto que um coração doente cria
melodias nonótonas.
2.2.2. Pintura, Fotografia. Historiadores de arte usam fractais para datar pinturas
chinesas antigas.[9]
Estruturas auto-semelhantes, com caracterı́sticas fractais, estão também patentes
em alguns padrões decorativos africanos e islâmicos. A técnica de pintura de alguns
pintores também produz resultados com caraterı́sticas fractais. É o caso de alguns
trabalhos de Jackson Polloc (ver Figura 3.22).
Podem criar-se padrões fractais muito interessantes com tinta comprimida entre
duas folhas de papel que depois se descolam (ver Figura 3.23). Ao variar a viscosidade
da tinta que se usa e a forma como se comprimem e descolam as folhas, obtêm-se
padrões diferentes.
2. FRACTAIS CRIADOS PELO HOMEM 169

Figura 3.22. Detalhe do quadro Number 8, de Paul Jackson Pollock


1949; Neuberger Museum, State University of New York. (Imagem retirada de

http://www.ibiblio.org/wm/paint/auth/pollock/).

Figura 3.23. Resultado obtido por compressão de tinta en-

tre duas folhas que se separam em seguida. (Imagem retirada de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/Decalcomania/Decalcomania.html).

A imitação de paisagens é possı́vel com software adequado baseado na geometria


fractal. Podem conseguir-se imagens tão reais que parecem fotografias verdadeiras (ver
Figura 3.15 na página 159). Imagens abstractas, também dignas de galerias de arte,
são geradas segundo processos iterativos (ver Figura 3.21 na página 166).
170 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

2.2.3. Arquitectura. O livro African Fractals de Ron Englash, sobre os fractais na


cultura aficana revela, entre outros aspectos, como os fractais estão patentes na ar-
quitectura de alguns povoamentos. Segundo esse autor, a arquitectura reflecte as es-
truturas social e religiosa das colónias o que, nalguns casos, dá origem a aglomerados
arquitectónicos que apresentam caracterı́sticas fractais (ver Figura 3.24 e Figura 3.25).

Figura 3.24. Vista aérea de uma povoação em Ba-Ila, na Zâmbia, antes de


1944 (American Geographic Institute) e as primeiras três iterações do modelo

fractal correspondente. (Imagens retiradas de

http://www.rpi.edu/∼eglash/eglash.dir/afractal/afarch.htm).

Na arquitectura europeia podem encontrar-se exemplos de edifı́cios com carac-


terı́sticas fractais que vão desde o estilo moderno até aos antigos desenhos de Da
Vinci (ver Figura 3.26, Figura 3.27 e Figura 3.28). As propriedades fractais revela-
das por esses edifı́cios podem ser utilitárias ou reflectir hierarquias sociais, religiosas
ou polı́ticas. A decoração intrincada da arquitectura dos estilos gótico, renascentista
e barroco, especialmente expressa nas catedrais, exibe frequentemente a repetição do
mesmo objecto em diferentes escalas.
3. FRACTAIS APLICADOS ÀS CIÊNCIAS ECONÓMICAS, SOCIAIS E HUMANÍSTICAS 171

Figura 3.25. Vista aérea da cidade de Logone-Birni cons-

truı́da pelo povo Kotoko do Camarão. (Imagem retirada de

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Architecture/AfricanArch/Kotoko1.html).

3. Fractais aplicados às Ciências Económicas, Sociais e Humanı́sticas

Mandelbrot escreveu muitos artigos que lidam com a geometria de fenómenos ob-
servados em diversas áreas da ciência. Ele estudou a geometria fractal das mudanças de
preço e da distribuição de salários, da estatı́stica dos erros em mensagens telefónicas,
da frequência de palavras em textos escritos e de muitos outros objectos matemáticos
noutros assuntos.[4]

3.1. Economia. Na Economia é importante conseguir prever o que irá acontecer


no mercado em momentos futuros. Com base na geometria fractal, Benoit Mandelbrot
introduziu uma teoria que pode ser utilizada para analizar o mercado, segundo a qual
o comportamento do mesmo é estatisticamente igual em larga escala (um ano, por
exemplo) e em escalas menores (uma semana ou um dia). A análise dos gráficos do
172 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.26. Projecto de Kazimir Malevich, um artista e arquitecto russo.


(Imagem retirada de http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Architecture/Arkhitektonics/Arkhitektonics.html).

comportamento dos ı́ndices ou dos preços de acções na bolsa, permitem visualizar essa
teoria.

3.2. História. A geometria fractal está intimamente relacionada com a Teoria


do Caos segundo a qual determinados fenómenos são muito sensı́veis à alteração das
condições iniciais; isto é, o mesmo tipo de mecanismo, com determinadas condições
iniciais ou com outras ligeiramente diferentes, pode produzir a curto, médio ou longo
prazo, resultados muito diferentes. Metaforicamente utiliza-se a imagem da borboleta
cujo suave batimento de asas aqui pode provocar grandes tempestades no lado oposto
do globo terrestre. Este tipo de abordagem pode também ter aplicações no estudo da
História tentando relacionar os eventos menores com os de maior escala.
Além disso, a estrutura hierárquica de muitos sistemas sociais sugere fractalidade
no sistema polı́tico: federações constituı́das por estados, estados compostos por paı́ses,
paı́ses que contêm cidades, que se repartem em bairros que, por sua vez, abarcam
3. FRACTAIS APLICADOS ÀS CIÊNCIAS ECONÓMICAS, SOCIAIS E HUMANÍSTICAS 173

Figura 3.27. Neste pormenor do Mosteiro da Batalha, pode observar-se


o mesmo padrão de arcos repetido em diferentes escalas. (Imagem retirada de

http://pt.wikipedia.org/wiki/Mosteiro da Batalha).

várias ruas, nas quais vivem diversas famı́lias, compostas por indivı́duos. Isto poderá
representar relacionamentos funcionais a diversos nı́veis de escala.
Nas estatı́sticas do tamanho e frequência de guerras foram também encontradas
diversas escalas sugerindo uma possı́vel aplicação da geometria fractal. Um modelo
proposto para estudar a interacção entre os paı́ses e as possibilidades de guerra e
alastramento da mesma entre eles, é baseado no modelo aplicado ao estudo dos fogos
florestais, em que as árvores secas ou de mais fácil combustão são substituı́das pelos
paı́ses nos quais uma pequena instabilidade pode levá-lo a entrar em guerra.

3.3. Psicologia. A geometria fractal e a Teoria do Caos geraram também aborda-


gens diversas na psicologia. É verdade que algumas destas aplicações tomaram grandes
liberdades relativamente ao significado especı́fico de construção fractal, mas ainda assim
a utilização dos fractais nesta área do conhecimento revela-se promissora, havendo até
uma entidade chamada Society For Chaos Theory in Psychology and Life Sciences que é
174 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

Figura 3.28. Esboço de Da Vinci de uma catedral constituı́da por


abóbadas de formato idêntico em diversas escalas diferentes (imagem retirada

de http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Architecture/daVinci/daVinci.html).

uma organização multidisciplinar internacional que pretende reunir os esforços dos que
se interessam e investigam as possı́veis aplicações da teoria de sistemas dinâmicos, da
auto-organização, redes neuronais, fractais, autómatos celulares, caos e outros tópicos
relacionados. A organização tem membros das disciplinas de psicologia, ciências soci-
ais, reabilitação, biologia, fisiologia, neurociência, matemática, filosofia, fı́sica, ciências
computacionais, economia, gestão, ciências polı́ticas, engenharia e artes. Exemplos de
investigações levadas a cabo por membros desta organização são: a aplicação de Siste-
mas de Funções Iteradas para modelar a memória visual e a comparação do formalismo
dos SFI com a dinâmica de tratamento psicoanalı́tico de um paciente cujos resultados
sugerem aspectos fractais do ego.

3.4. Literatura. Podem encontrar-se na literatura exemplos de assuntos fractais,


provavelmente construı́dos pelos autores de forma inconsciente. Por exemplo, um texto
de Jorge Luı́s Borges descreve a vida de um ansião chinês, na qual todas as bifurcações
4. OS FRACTAIS E A TEORIA DO CAOS 175

da história ocorrem, isto é, cada vez que a personagem tem que escolher entre várias
alternativas, ele escolhe todas, criando diversos futuros e múltiplos tempos, que por
sua vez evoluem e também ramificam. Os fractais também aparecem, por vezes, como
objectos explı́citos na literatura. Exemplos disso são um castelo com um lago com a
forma do Conjunto de Mandelbrot (ver Figura 3.20 na página 165), ou descobertas
matemáticas (entre as quais aspectos da geometria fractal) que vão sendo feitas pela
personagem principal, ou ainda uma experiência psicológica na qual a observação de
imagens fractais altera os arquétipos da percepção, abrindo a visão a fantásticos mundos
novos.
Foi proposto um modelo de medição da complexidade de um texto a partir da
medição da dimensão fractal de um diagrama efectuado com base em determinadas
regras. Esse modelo sugere que quanto maior for a dimensão, maior é a complexidade
do texto. Um outro projecto envolve a desconstrução de um poema. Retira-se a terça
parte do meio. Primeiro retira-se a terça parte das estâncias, depois das linhas, a seguir
do conjunto de palavras de cada linha. Em alguns casos, o resultado final ainda se lê
bem e preserva algum do sentido global, sugerindo que esses poemas possuem uma
estrutura fractal através da repetição de ideias a diversas escalas.
A repetição é um processo fundamental na poesia e os padrões de repetição há
muito que vêm sendo estudados. Foi descoberto uma nova forma de repetição em
determinados poemas, em que a mesma palavra (dita raiz do poema) aparece com um
padrão de repetição na estrutura global do poema, idêntico ao formado pelas várias
componentes de uma determinada iteração do Conjunto de Cantor (ver Exemplo 11
na página 38).

4. Os Fractais e a Teoria do Caos

No final do séc. XIX, quando Poincaré tentava resolver as equações que lhe per-
mitiam descrever o movimento de três corpos em interacção gravı́tica percebeu que
o problema não tinha soluções regulares e periódicas como, à partida, tinha suposto.
Afinal, o comportamento de um corpo sob a influência gravı́tica de outros dois corpos
176 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

muito mais pesados (por exemplo um asteróide entre o campo gravı́tico do Sol e de
Júpiter) era irregular, e essencialmente imprevisı́vel, pois quaisquer duas órbitas com
condições iniciais arbitrariamente próximas resultavam, no futuro, em órbitas muito
diferentes. Estes foram os primeiros passos para o conhecimento do caos determinista,
que não tiveram grandes consequências imediatas devido à falta de matemática e de
meios técnicos suficientes na época.
Só no inı́cio dos anos 60 do século XX é que Lorenz, ao calcular com recurso a
um computador, soluções aproximadas para um sistema de equações que modela a
convexão na atmosfera, se deparou com o mesmo fenómeno de divergência de soluções
inicialmente muito próximas que Poincaré tinha descoberto. Este fenómeno, a que se dá
o nome de sensibilidade às condições iniciais, deu origem, neste contexto, à metáfora do
efeito borboleta, já referida na secção 3.2. A partir dos seus cálculos, Lorenz desenhou
o primeiro esboço do atractor caótico que hoje é conhecido com o seu nome.

Figura 3.29. Atractor de Lorenz. (Imagem retirada de http://en.wikipedia.org/wiki/Lorenz attractor).

A partir de então, a utilização de computadores para achar soluções aproximadas de


equações foi-se generalizando e foram-se multiplicando os exemplos de comportamento
caótico em contextos muito diversos.
À medida que as ferramentas matemáticas foram evoluindo, foi-se entendendo que
a dinâmica caótica, caracterizada por comportamentos irregulares e pela dependência
sensı́vel nas condições iniciais, é caracterizada por sistemas não lineares e com feedback.
4. OS FRACTAIS E A TEORIA DO CAOS 177

Um sistema é formado por um conjunto de objectos que se relacionam entre si. Podem
considerar-se dois tipos de sistemas: os lineares e os não-lineares. No primeiro tipo, a
resposta a um distúrbio é directamente proporcional à intensidade deste; no segundo,
a resposta obtida não é necessariamente proporcional à intensidade do distúrbio. Em
sistemas não lineares e com feedback, inclusive em sistemas bastante simples, pode
aparecer o caos.
A teoria do caos estuda o comportamento aleatório e imprevisı́vel dos sistemas e
sustenta que os comportamentos casuais (aleatórios) também são governados por leis.
O comportamento do sistema dependerá da sua situação “de inı́cio”. Se se alteram
essas condições iniciais, ainda que as alterações sejam pequenas, o sistema poderá
comportar-se de forma muito diferente.
Bons exemplos de sistemas caóticos são o crescimento de lavouras e a formação de
tempestades, onde qualquer pequena alteração da direcção ou da velocidade dos ventos,
por exemplo, pode provocar grandes mudanças ao fim de algum tempo. Outro Exemplo
é a formação de uma nuvem no céu, que pode ser desencadeada e desenvolver-se com
base numa grande variedade de factores tais como o calor, o frio, a evaporação da água,
o vento, o clima, condições do Sol, os eventos sobre a superfı́cie e inúmeros outros. Não é
por acaso que os meteorologistas se enganam com frequência nas previsões atmosféricas.
Outros fenómenos, para além dos meteorológicos, podem ser entendidos à luz da teoria
do caos: o sistema solar (que era tido como extremamente ordenado), a evolução de
populações, o escoamento de fluidos, as reacções quı́micas, as variações no mercado
financeiro, os movimentos de placas tectónicas, etc. O trânsito é outro exemplo. Basta
um pequeno acidente para provocar grandes alterações no fluxo das viaturas pelas
artérias de uma cidade.
Os conjuntos invariantes de muitos sistemas dinâmicos não lineares, em particular
os chamados “atractores estranhos”, têm estruturas detalhadas em todas as escalas de
magnificação. É esta a ligação dos fractais à teoria do caos. Há uma ordem fractal por
detrás de fenómenos aparentemente caóticos. Assim, a teoria do caos não é uma teoria
178 3. APLICAÇÕES DA GEOMETRIA FRACTAL

de desordem mas busca, no aparente acaso, uma ordem intrı́nseca determinada por
leis precisas. Nas últimas décadas, depois de um árduo trabalho, matemáticos e fı́sicos
elaboraram teorias para explicar o caos. Hoje sabe-se muito a respeito de fenómenos
imprevisı́veis que, ao serem compreendidos, passam a ser um pouco mais previsı́veis.
CAPı́TULO 4

Exploração de Fractais em contexto de Sala de Aula

179
180 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA
4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA 181

Depois de várias tentativas para seguir um critério que uniformizasse as propostas


de actividades para a sala de aula que se apresentarão neste capı́tulo, isto é, depois de
procurar que houvesse uma linha orientadora de modo a que as propostas fossem todas
dirigidas, por exemplo, para a mesma faixa etária, ou só para a aula de Matemática, ou
só para a disciplina de Área de Projecto, decidiu-se pelo oposto: apresentar uma boa
variedade de propostas no que se refere tanto ao público alvo, como aos conceitos abor-
dados, às técnicas utilizadas e aos métodos de trabalho implicados. Porquê? Porque as
possibilidades de exploração de fractais ou das suas aplicações como mote para estudo
de outros conceitos são tão vastas, que se concluiu que o melhor seria introduzir um
pouco de cada tipo de abordagem. Assim, antes de cada proposta serão apresentados
os objectivos de cada actividade e no final serão tecidos os comentários considerados
necessários para que fique clara a forma como a mesma pode ser aplicada e explorada.
Algumas das actividades serão baseadas na utilização de software que, ou é gratuito,
ou está disponı́vel na forma de applet na internet. Caso contrário, sugiro o tipo de
software a utilizar sem mencionar nenhum em particular, como é o caso das folhas de
cálculo ou da calculadora gráfica. De qualquer forma, em qualquer das abordagens aos
fractais, será sempre importante começar por pedir aos alunos que tentem desenhar
as primeiras iterações à mão, no papel. De seguida, perguntar-lhes como se poderiam
conseguir resultados melhores e de forma mais rápida. Facilmente surgirá a sugestão do
uso do computador e isso permite ao professor explicar porque é que o desenvolvimento
da geometria fractal só ocorreu na segunda metade do século XX e também perscrutar
a noção que os alunos têm sobre o que é a programação computacional e sobre a
importância da mesma para o mundo actual.
Deve também ser discutido com os alunos o problema da impossibilidade de cons-
truir um fractal verdadeiro, mesmo que se recorra ao computador. O fractal obtém-se
após uma quantidade infinita de iterações, o que, por questões de insuficiência de
tempo, é impossı́vel realizar. Além disso, não é possı́vel desenhar segmentos de recta
abaixo de um determinado comprimento e o monitor do computador está limitado ao
182 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

tamanho do pixel. Se o software permitir ampliações, haverá uma altura em que só se
conseguirá ver o detalhe e não o fractal completo. Por outro lado, a partir de certa
iteração, é impossı́vel notar a diferença entre duas iterações. Por exemplo na curva de
Koch, é impossı́vel notar a diferença entre a décima e a vigésima iteradas; no entanto,
essa diferença existe e é substancial.
Há ainda a salientar o facto de nunca nenhuma das imagens obtidas numa iteração
de construção de um fractal, ser auto-semelhante. Apenas o fractal o é. Será sempre
necessário imaginar as iterações que faltam para identificar, a partir da imagem de uma
iteração, as várias reduções que o fractal contém de si mesmo.
Porquê trabalhar com Fractais com alunos do Ensino Básico e Secundário? Em
primeiro lugar, o facto (já referido no Capı́tulo 3) de a forma e dimensão fractais
estarem muito presentes na Natureza deverá ser, por si só, um factor de motivação para
professores e alunos. A propriedade da auto-semelhança é facilmente entendida por
uma criança se visualizada, por exemplo, na folha de um feto ou na estrutura de uma
couve-flor. Por outro lado, a aplicabilidade do estudo dos fractais num número cada
vez mais crescente de áreas da ciência e da tecnologia (ver Capı́tulo 3) torna admirável
o facto de não haver referências obrigatórias aos fractais nos programas oficiais de
Matemática do sistema de ensino português. A necessidade do uso do computador para
a execução de algumas das propostas de trabalho é, hoje em dia, um problema menor,
visto que quase todas as escolas de Portugal vão estando suficientemente equipadas
com material informático. A utilização da tecnologia pode também ser outro factor
de motivação para alguns alunos estudarem e explorarem estas formas geométricas e
por outro, uma eventual entrada para o mundo da programação e da exploração de
software de representação de imagens fractais. É ainda de salientar que a quantidade
de conceitos matemáticos que podem ser abordados ou trabalhados quando se realizam
actividades de exploração de fractais pode ser vastı́ssima, e será tanto maior quanto
mais avançado for o nı́vel dos alunos. Vários são os conceitos matemáticos que o aluno
pode adquirir, compreender ou aplicar ao realizar uma tarefa que envolva a construção
4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA 183

ou a exploração de fractais. Esses conceitos podem ser abordados de uma forma mais
ou menos objectiva, mais ou menos evidente, consoante a tarefa estiver dirigida e
consoante a percepção que o aluno vai tendo das operações e das ideias envolvidas.
Os fractais e a geometria fractal, são temas que suscitam o interesse de quem os
explora pelas inúmeras surpresas que escondem. Ao proporcionar uma visão dife-
rente da Matemática, a geometria fractal permite suavizar a abordagem dos conteúdos
programáticos, permitindo também a conexão entre saberes que, por vezes, são consi-
derados pelos alunos como apartados e sem qualquer tipo de correlação possı́vel. Por
exemplo, numa actividade sobre sistemas de funções iteradas podem ser trabalhados os
conceitos de vector, redução, razão de semelhança, transformações no plano (rotação,
simetria, translação), reunião de conjuntos, coordenadas de pontos, função, etc...
Não está previsto nos programas de Matemática portugueses o tema da geome-
tria fractal como um tópico de ensino obrigatório e muito menos lhe está reservado
um perı́odo de tempo para a sua exploração. O único programa que contém uma
referência aos fractais é o de Matemática A para o 11o ano que, no Tema III, Su-
cessões Reais, sugere o estudo da Curva de Koch ou de um Poliedro Fractal como um
problema sobre limites com progressões. Nos programas curriculares de Matemática
para o Ensino Básico e para o Ensino Secundário, encontram-se conteúdos como auto-
semelhança, forma, dimensão, polı́gonos e sólidos geométricos, perı́metros, áreas e volu-
mes, funções, transformações geométricas, semelhança de figuras, sucessões, operações
com conjuntos, composição de funções, função logarı́tmica e limites. Todos eles podem
ser adquiridos, compreendidos e/ou aplicados pelo aluno, através da realização de uma
actividade que envolva a exploração e/ou a construção de fractais.
Em projectos mais completos sobre fractais, a utilização de software torna-se ine-
vitável e a programação será um tópico que, no mı́nimo, terá de ser abordado e discu-
tido. Nas actividades que serão propostas, a programação aparecerá sempre como uma
opção adicional de exploração; mas em trabalhos realizados na modalidade de projecto,
onde o tempo e os materiais disponı́veis o permitirem, ela fará todo o sentido.
184 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Muitas e variadas serão, por certo, as competências que podem ser desenvolvidas
pelos alunos que explorem os fractais. A aquisição ou o desenvolvimento de com-
petências diversas dependerá das actividades que o aluno realizar e de como ele for
guiado através delas, de como estas estiverem construı́das, de como ele for motivado
para elas, das ferramentas que utilizar e ainda da apetência e do conhecimento prévio
que trouxer consigo.
Não será sugerido um tempo para a realização de cada uma das actividades porque
cada uma poderá ser explorada de diversas formas, consoante o contexto em que for
realizada, o nı́vel de preparação dos alunos em causa e os objectivos pretendidos com
a realização da actividade.
Na secção de Anexos (página 299 e seguintes) estão os materiais necessários à
resolução das actividades e no CD incluı́do neste trabalho está o software de distribuição
gratuita utilizado em algumas das actividades.
A seguir, neste capı́tulo, explica-se o tipo de actividades que irão ser apresentadas,
depois é feito um resumo de alguns conteúdos matemáticos que poderão ser trabalhados
e de algumas das competências que poderão ser desenvolvidas com a resolução de
actividades envolvendo fractais; seguem-se algumas considerações sobre a utilização de
software e, finalmente, é apresentado um conjunto de várias propostas de trabalho para
realizar com os alunos.

1. Tipos de Actividades

Em consonância com o suporte teórico deste trabalho apresentado nos dois primeiros
capı́tulos, não se propõem actividades sobre fractais definidos no conjunto dos números
complexos (como o Conjunto de Mandelbrot) nem sobre fractais aleatórios, nem sobre
a relação dos fractais com a Teoria do Caos. Em contrapartida, várias são as propostas
para trabalhar o conceito de sistema de funções iteradas e de dimensão fractal, para
além do próprio conceito de fractal.
As actividades propostas mais à frente incluem:
1. TIPOS DE ACTIVIDADES 185

A possibilidade de comparação da Geometria Fractal com a Propostas números


Geometria Euclidiana; 1, 4, 7, 10, 11, 14 e 21.

A representação e o estudo de propriedades de alguns Propostas números


fractais (incluindo exemplos clássicos famosos); 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9.

A utilização de software para desenhar e/ou analisar e/ou Propostas números


programar fractais; 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
10, 11, 12, 14 e 22.

A identificação/determinação de SFI que definam um Propostas números


determinado fractal; 2, 3, 5, 8, 9, 10, 11 e
12.

A construção de modelos de fractais no plano e no espaço Propostas números


recorrendo ao uso de vários materiais manipuláveis; 4, 5, 7, 8, 14, 18 e 19.

A modelação de objectos naturais com recurso à geometria Propostas números


fractal; 1, 4, 7, 11, 13, 14, 19,
22, 23, e 24.

O estudo da dimensão fractal; Propostas números


2, 3, 4, 5, 12, 13, 14,
22 e 23.

A investigação sobre a aplicação dos fractais nas diversas Propostas números


áreas do conhecimento. 4, 6, 15, 16, 17, 19,
20, 21, 22, 23, e 24.
186 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

2. Conexões matemáticas proporcionadas pelo tópico “Fractais”

Nas Tabelas 4.1 e 4.2 apresentam-se alguns dos conteúdos que podem ser abordados,
explorados e/ou aplicados em cada uma das actividades propostas. Em alguns casos, a
conexão entre a Proposta e os conteúdos pode não decorrer imediatamente da resolução
da actividade, mas de uma exploração mais alargada dos conceitos que estão implı́citos
ou das sugestões que estão no final de cada Proposta. Outros conteúdos, além dos
indicados, poderão também estar implı́citos em cada uma das actividades propostas.

3. Competências, Capacidades e Atitudes

A realização de actividades com fractais poderá contribuir para o alcance de alguns


dos objectivos da disciplina de Matemática. Segundo os programas de Matemática dos
ensinos básico e secundário, o aluno deve reunir, ao longo do seu percurso escolar, um
conjunto de capacidades e de atitudes, bem como de conhecimentos de Matemática
para se poder dizer matematicamente competente. Essa dita competência inclui al-
guns aspectos para os quais algumas das actividades que serão aqui propostas também
poderão contribuir.
Desde logo, a predisposição para raciocinar matematicamente é essencial para o
estudo dos fractais, já que o fractal é um objecto puramente matemático. Quando,
por exemplo, se estudam as caracterı́sticas de um fractal a partir da sucessão das
iteradas obtidas por um SFI que o defina, é necessário procurar regularidades, fazer
e testar conjecturas, formular generalizações... enfim, pensar de forma lógica. Em
actividades nas quais se procuram as relações entre os “fractais matemáticos” e os
“fractais naturais” esse raciocı́nio terá de ser elevado a um nı́vel superior em que se
procuram regularidades e se fazem generalizações lidando com as limitações a que está
imposto o conceito de fractal quando aplicado a um objecto da Natureza. O raciocı́nio
espacial será necessário para a análise dos fractais.
As diversas aplicações da matemática ao real que a geometria fractal permite vi-
sualizar, poderão fomentar o gosto em realizar actividades que envolvem raciocı́nio
3. COMPETÊNCIAS, CAPACIDADES E ATITUDES 187

Número da Proposta

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14

Geometria euclidiana vs geometria fractal x x x x x x x

Transformações geométricas

(translação, rotação, simetria, x x x x x x x x

redução, contracção)

Semelhança de figuras x x x x x x x x

Razão de semelhança x x x x x x x

Razão entre áreas e x x

volumes de figuras semelhantes

Padrões numéricos x x x x x x

Padrões geométricos x x x x x x

Propriedades de polı́gonos x x x x

e de sólidos geométricos
Conceitos matemáticos

Forma, polı́gonos e sólidos geométricos x x x

Área x x

Volume x

Perı́metro x x

Ângulos x

Propriedades de ângulos x

Razões trigonométricas

Teorema de Pitágoras x

Sistemas de eixos coordenados x x x x

Representação gráfica x x x x x x

Declive x

Função afim x x x x x x x x

Função exponencial x x x x x x

Logaritmo e função logarı́tmica x x x x x

Conceito de limite x x x x x x x

Conceito de infinito x x x x x
Tabela 4.1. Conceitos matemáticos implı́citos em cada uma das Propostas.
188 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Número da Proposta

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14

Auto-semelhança x x x x x x x x x x x

Vectores x x x

Sucessões x x x x x x x

(termos, termo geral, limite,

sucessão limitada,

infinitésimo, infinitamente grande

noção de infinito, ...)


Conceitos matemáticos

Iteração de funções x x x x

Operações com conjuntos x x x x x

”Rugosidade”e dimensão fractal x x x x x x

Derivada num ponto x

Triângulo de Pascal x

Binómio de Newton x

Critérios de Divisibilidade x

Progressão aritmética/geométrica x x x x

Soma de séries aritméticas/geométricas x

Equações e Sistemas de Equações x x

Escala x

Regressão Linear x
Tabela 4.2. Conceitos matemáticos implı́citos em cada uma das Propostas.

matemático e, a partir daı́, ajudar a que cresça a confiança pessoal do aluno para se
empenhar em actividades intelectuais.
Sugere-se que uma parte das actividades propostas sejam realizadas em grupos.
Essa metodologia de trabalho é uma das que mais fomentam a comunicação com os
outros. As ideias, as descobertas, os conceitos que poderão ser transmitidos oralmente,
por escrito (em linguagem corrente ou matemática) ou através de imagens, esquemas,
gráficos, etc., estarão a fomentar a capacidade de comunicação dos alunos. Tudo isto,
de uma forma ou de outra, poderá ser trabalhado no conjunto de actividades que
será apresentado. A resolução de algumas destas actividades permitem ainda ao aluno
3. COMPETÊNCIAS, CAPACIDADES E ATITUDES 189

evidenciar o seu grau de rigor e de criatividade na resolução de questões e revelar se tem


rigor, cuidado, organização e espı́rito crı́tico na apresentação e discussão dos resultados.
As actividades em grupo são ainda potenciadoras da promoção da realização pessoal
através de atitudes de responsabilidade, de autonomia, de solidariedade, de tolerância
e de cooperação .
Quanto à resolução de problemas, a maioria das actividades estão demasiado di-
rigidas para que possam ser consideradas um problema. No entanto, consoante a
preparação prévia dos alunos com que se está a trabalhar e o objectivo que se preten-
der atingir, o professor poderá abrir mais uma determinada proposta, não a dirigindo
tanto, de forma a que os alunos sintam a necessidade de ensaiar diversas estratégias
de resolução. As últimas propostas são essencialmente de investigação e exigirão dos
alunos a capacidade de se munir de diversas ferramentas e de seguir diversos processos,
de modo a procurarem a informação de que necessitam para conseguirem alcançar o
que se pretende. Em geral, o aluno é incitado a procurar ver e apreciar a estrutura ma-
temática, em particular a geometria fractal, que está presente numa situação, seja ela
relativa à natureza, à arte, ou a objectos ou processos pertencentes às várias áreas do
conhecimento, envolva ela elementos numéricos, geométricos ou ambos. A realização
de tarefas deste tipo, quer seja em grupo, quer seja individualmente, ajudará o aluno
a ganhar ou a consolidar confiança em si próprio, no confronto com situações novas e
contribuirá para o desenvolvimento de hábitos de trabalho e de persistência, na pro-
cura da realização do trabalho até ao fim, de forma organizada, apresentando-o com a
devida qualidade.
Ao conjunto global de propostas está inerente um leque vasto de instrumentos de
cálculo, que vão desde o cálculo mental, aos algoritmos de papel e lápis e aos meios
tecnológicos. Em muitos casos, a matemática terá de ser usada em combinação com
outros saberes, na compreensão de situações da realidade. O sentido crı́tico terá que
estar sempre presente tanto no que diz respeito à utilização de procedimentos, como
no que se refere à análise dos resultados obtidos.
190 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

O conhecimento das possı́veis aplicações dos fractais nas diversas áreas do conhe-
cimento poderá ajudar a desenvolver nos alunos a capacidade de usar a Matemática
como instrumento de interpretação do real e a promover o aprofundamento de uma
cultura cientı́fica, técnica e humanı́stica que constitua um suporte cognitivo e meto-
dológico para a vida futura, contribuindo também para uma atitude positiva face à
Ciência e para o desenvolvimento de cidadãos activos e participativos em áreas como
o ambiente, a saúde e a economia. A interdisciplinaridade revelada pela geometria
fractal é também um ponto de partida para a apreciação do contributo da Matemática
para a compreensão do mundo que nos rodeia e para a evolução da ciência e poderá
despertar no aluno a curiosidade e o gosto de aprender, de pesquisar e de investigar.
A diversidade de conexões entre diversos conceitos matemáticos que estará patente
em algumas das propostas, permitirá não só a ampliação do conhecimento da Ma-
temática, a aquisição e a consolidação de conceitos matemáticos, mas também poderá
contribuir para a compreensão da Matemática enquanto elo de coesão do pensamento
cientı́fico.
Os temas transversais do programa de matemática do ensino secundário estão todos
eles patentes, de alguma forma, nas actividades que se apresentarão neste capı́tulo. A
comunicação matemática, a lógica e o raciocı́nio matemático são essenciais em todas
elas; a aplicação e a modelação matemática aparecerá sempre que se descobrir geome-
tria fractal em objectos ou fenómenos e ainda na construção de fractais no plano e/ou
no espaço; a tecnologia foi necessária para o aparecimento e desenvolvimento desta
geometria e sê-lo-á também para a realização de uma boa parte das propostas; a ac-
tividade investigativa será um dos objectivos de algumas das propostas e, finalmente,
parte da história da matemática deverá ser também revelada aos alunos, ao ser-lhes
explicada a origem e o desenvolvimento da geometria fractal, a forma como esta se
imiscuiu em tantas áreas do conhecimento e ainda ao serem estudados exemplos de
fractais clássicos.
4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS COM SOFTWARE 191

4. Exploração de Fractais com software

Como ensina a própria história da geometria fractal, a representação e o estudo


dos fractais só é possı́vel graças à tecnologia informática. A estrutura tipicamente
intrincada dos fractais, o pormenor a escalas infinitamente pequenas e a quantidade
infinitamente grande de cálculos e de processos de desenho geométrico necessários para
construir um fractal, fazem com que o recurso aos computadores para obter repre-
sentações de fractais seja inevitável.
Por outro lado, a necessidade absoluta do uso da informática pode transformar-se
num factor de motivação para quem estude a geometria fractal, porque permite uma
visualização rápida e fácil da representação gráfica de elementos matemáticos que, na
forma de equações, não revelam a beleza, o interesse e o intrigante que se esconde em
cada fractal. Com o computador pode testar-se a alteração de parâmetros em equações
ou em transformações geométricas e obter uma resposta rápida acerca dos efeitos dessa
alteração. O trabalho difı́cil e repetitivo de cálculo e de desenho é feito pelo computador
e as tarefas matemáticas serão essencialmente as de análise e de interpretação do fractal
ou da sua aplicação na modelação de outros objectos ou fenómenos.
Existe hoje em dia uma grande quantidade de software disponı́vel para repre-
sentação de fractais através dos mais variados processos, estando alguns deles na forma
de applet em sites da internet.
Para além da utilização dos softwares na perspectiva do utilizador é também impor-
tante que os alunos tenham a oportunidade de experimentar a vertente da programação
porque isso permite-lhes não só desenvolver capacidades de raciocı́nio lógico e de abs-
tracção, como também de terem uma noção de como são criados outros programas que
utilizam no seu dia-a-dia. A programação pode ser levada a cabo no computador ou na
calculadora gráfica, começando pela transcrição de algoritmos previamente fornecidos
aos alunos, podendo o professor depois incitá-los a criar os seus próprios programas.
Os primeiros passos nesse sentido podem ser dados através da alteração de algoritmos
192 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

já existentes, de modo a conseguir que o programa execute a representação de fractais


com regras de formação ligeiramente diferentes das inicialmente programadas.
Uma das linguagens de programação que permite a programação ao alcance dos
alunos mais jovens é o Logo no qual o aluno dá instruções à tartaruga (cursor) sobre
para onde ela deve dirigir-se no monitor de forma a percorrer uma linha fractal no
seu trajecto. Com este tipo de actividades o aluno, além de aprender a construir um
fractal, de ter que verbalizar matematicamente as operações necessárias para tal, de
utilizar e trabalhar vários conceitos matemáticos, está também a adquirir a noção de
programação. Ao aprender a programar, o aluno também pode aprofundar a noção
de variável e de concretização de uma variável e perceber como e para quê se criam
sub-rotinas e se aplicam métodos recursivos. Além disso, pode ainda dar-se conta não
só das capacidades, como também das limitações da máquina, nomeadamente no que
diz respeito à definição dos monitores e às capacidades de cálculo. O NetLogo, cons-
tituindo uma linguagem já bastante mais elaborada, possui um interface muito mais
apelativo e pode ser usado tanto apenas na perspectiva do utilizador (correndo algo-
ritmos já concebidos), como na perspectiva do programador (permite a programação
de raiz ou a alteração de algoritmos). Ambos, Logo e NetLogo são gratuitos. Para o
NetLogo há um portal na internet onde estão disponı́veis um tutorial e programas de
modelação de fenómenos de diversas áreas da ciência o que proporciona a sua utilização
em diversas disciplinas. Na área da matemática há, ente outros, um programa dedicado
aos fractais. Em algumas das propostas de actividades para a sala de aula apresenta-
das (Propostas números 3, 4, 5 e 7), utilizou-se esse modelo ao qual foram efectuadas
algumas adaptações, tendo-lhe sido adicionadas algumas funções para a construção de
outros fractais. No caso dos fractais “Dragão de Heighway” e “Árvore” que foram adi-
cionados ao modelo original, foram programados códigos válidos para cada um deles,
no entanto, pouco eficazes, na medida em que a partir da quinta ou sexta iteração se
tornam muito lentos não permitindo uma boa visualização do fractal. Algumas das
actividades que serão propostas sugerem a utilização do NetLogo e/ou do Logo. Nos
4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS COM SOFTWARE 193

Anexos 19 e 20 encontram-se algoritmos de programas para o NetLogo e para o Logo,


respectivamente.
Para além destes dois programas outros softwares e applets são recomendados nas
propostas que se seguirão, estando todos eles disponı́veis de forma gratuita na internet.
Apresenta-se a listas desses programas:
•Logo
Disponı́vel em http://www.softronix.com/logo.html.
Sugerido nas Propostas 2, 3, 4 e 7.
•NetLogo
Disponı́vel em http://ccl.northwestern.edu/netlogo/.
Sugerido nas Propostas 3, 4, 5 e 7.
•PasFastC
Disponı́vel em: http://www.its.caltech.edu/∼mamikon/PasFastC.html.
Sugerido na Proposta 6.
•Fractal Trees
Disponı́vel em http://library.thinkquest.org/26242/full/progs/trees.html.
Sugerido na Proposta 7.
•L-System Based Fractals - Bush 1, 2 e 3
Disponı́vel em http://arcytech.org/java/fractals/lsystems.shtml.
Sugerido na Proposta 7.
•Pythagorean Tree
Disponı́vel em http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration
/Pythagorean Trees/PTdirections.html.
Sugerido na Proposta 7.
•Deterministic IFS
Disponı́vel em http://classes.yale.edu/fractals/Software/detifs.html.
Sugerido nas Propostas 8, 9, 10 e 11.
194 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

•IFS Construction Kit


Disponı́vel em http://ecademy.agnesscott.edu/∼lriddle/ifskit/index.htm.
Sugerido nas Propostas 8, 9, 10, 11 e 12.
•Relatives of Sierpinski
Disponı́vel em http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration
/Relatives of Sierp Prec/RSprecisionDirections.html.
Sugerido na Proposta 9.
•Affine
Disponı́vel em http://classes.yale.edu/fractals/Software/affine/affine.html.
Sugerido na Proposta 10.
•IFS Lab
Disponı́vel em http://www.nzeldes.com/Fractals/Fractals core.htm.
Sugerido na Proposta 11.
•Coastline
Disponı́vel em http://argento.bu.edu/java/java/coastline/coastlineapplet.html.
Sugerido na Proposta 14.
•Coastlines
Disponı́vel em http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration
/Coastlines/CLdirections.html.
Sugerido na Proposta 14.

5. Propostas de Actividades para a Aula de Matemática

Com alunos que não conhecem ainda o conceito de fractal, o professor deve começar
por fazer uma abordagem que os motive para o tema que deve passar pela comparação
da geometria fractal com a euclidiana, pela explicação do conceito de fractal e pela
demonstração da aplicabilidade da geometria fractal em contextos diversos. Depois
poderá propor-se aos alunos que descubram no meio em que vivem, objectos que possam
ser representados por cada uma das geometrias: a euclidiana e a fractal.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 195

O conceito de dimensão fractal também deverá ser abordado. Com os alunos mais
jovens essa noção deverá ser introduzida de uma forma intuitiva para que possam
conseguir ordenar vários fractais segundo o valor da sua dimensão, consoante o seu
“grau de rugosidade”. Aos alunos do ensino secundário, sobretudo aos do 12o ano, pode
pedir-se-lhes o cálculo da dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta, que
pode ser determinada por D=log(N)/log (1/r), sendo N o número de cópias que cada
iteração contém da iteração anterior e r a razão de semelhança entre cada uma dessas
cópias e a figura da iteração anterior.
Note-se que se fala em “dimensão fractal” sem especificar qual a definição a utilizar
(dimensão de Hausdorff, de contagem de caixas ou outra), porque no caso dos fractais
com auto-semelhança exacta os valores das definições mais utilizadas coincidem e com
alunos dos ensinos básico e secundário não valerá a pena aprofundar o conceito de
dimensão fractal mais do que isto.
As Propostas de actividades estão numeradas, não significando isso uma ordem
obrigatória para a sua resolução. Também não se pretende que todas sejam realizadas
pelos mesmos alunos. Cada uma das actividades deverá ser adaptada adequadamente
ao público alvo, ao contexto em que está a ser realizada e aos objectivos que se preten-
dem atingir.
196 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

1
Proposta 1 (Por onde andam os fractais?).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de distinguir entre ob-
jectos com formas melhor modeladas pela geometria euclidiana e objectos melhor mo-
delados pela geometria fractal.

Actividade: Objectos que possam ser modelados por fractais têm caracterı́sticas com-
pletamente diferentes dos objectos que se assemelham mais das figuras geométricas
euclidianas.

(1) Procura dentro da tua sala de aula objectos a cujas formas possas associar
figuras geométricas euclidianas conhecidas.

Objectos Observados Figura/sólido geométrica(o) associada(o)

(2) Procura também na tua sala de aula objectos que te pareçam ter uma estrutura
fractal.
(3) Procura agora no exterior da tua sala de aula, em contacto com a Natureza
(parque, jardim, campo, quintal...) objectos a cujas formas possas associar
figuras geométricas euclidianas conhecidas.

1Adaptado de: http://www.ime.uerj.br/ progerio/monografia/1999/atividade1.html - Projecto

Final de Conclusão De Curso de Taı́s Alves Moreira Barbariz


5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 197

Objectos Observados Figura/sólido geométrica(o) associada(o)

(4) Consegues encontrar na Natureza objectos com forma fractal?


(5) Onde é mais fácil encontrar objectos com formas euclidianas, na Natureza ou
nas construções humanas? E os objectos fractais, onde se encontram mais?
Consegues encontrar uma possı́vel explicação para esse facto?

Sugestões: Antes desta actividade o professor terá que fazer aos alunos uma in-
trodução à geometria fractal, focando as principais caracterı́sticas que um fractal pode
ter. F

As actividades que se seguem (Propostas 2, 3, 4, 5 e 7) são actividades tı́picas de


exploração de um fractal como aplicação ou abordagem de conteúdos relacionados com
o estudo das sucessões de números reais. Porém, outros conceitos matemáticos estão
subjacentes (ver a secção 2 - Tabela 4.1 e Tabela 4.2).
O aluno deve saber que o “fractal” é o objecto que se obtém após uma quantidade
infinita de iterações ou então o professor poderá aproveitar as primeiras questões da
Proposta 2, até à alı́nea 2c, para explicar isso aos alunos.
Caso os alunos não conheçam ainda o conceito de dimensão fractal, o professor deve
log N
explorá-lo previamente com os alunos, indicando a fórmula D = log r−1
, utilizada para
determinar a dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta, em que N é o
número de reduções à escala r do fractal que o compõem (ver página 131 e seguintes).
198 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 2 (O conjunto de Cantor).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o processo iterativo e explicar a lei de formação deste fractal;


• Organizar e analisar dados para determinar a expressão geral de uma sucessão;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender o conceito de auto-semelhança e saber assinalar cópias do fractal
dentro dele mesmo, indicando a razão de semelhança;
• Calcular a dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta.

Actividade: Vamos agora estudar o Conjunto de Cantor, um dos fractais mais fa-
mosos.

(1) As primeiras iterações do Conjunto de Cantor são as seguintes:

C0

C1

C2

(a) Desenha mais duas ou três iterações deste conjunto.


(b) Explica como é a lei de formação este conjunto.
(2) Investiga o que acontece relativamente ao número de segmentos, ao compri-
mento de cada um e ao comprimento total do conjunto à medida que aumenta
o número de iterações.
(a) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 199

Comprimento de Número de Comprimento total


cada segmento segmentos do conjunto

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3

Iteração n
(Lei de Formação)
(b) Consegues explicar como é o conjunto ao fim de uma quantidade infinita
de iterações?
(c) Consegues evidenciar partes do conjunto que sejam iguais na forma ao
todo?
(d) Determina a dimensão Fractal do Conjunto de Cantor.
(3) Consegues imaginar um processo análogo a este, mas trabalhando no plano
(começando com um quadrado) ou trabalhando no espaço (começando com um
cubo)? Tenta construir estas duas propostas de fractais ou outros idênticos e
explora algumas das suas propriedades.

Observações:

• Na questão 1a, o aluno pode recorrer ao papel quadriculado, como a própria


imagem sugere, ou então à grelha do Anexo 2 ou do Anexo 4.
• Na questão 1b, o aluno pode utilizar linguagem corrente ou, tendo preparação
para isso, explicitar as funções que intervêm num SFI que defina este conjunto.
• Na questão 2d pretende-se determinar a dimensão D através da expressão D =
log N
, sendo N o número de reduções de factor de redução r que compõem
1
log( )
r
o fractal. Explicar aos alunos que esta fórmula só se aplica a fractais com
200 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

auto-semelhança exacta cujas reduções de si mesmo não se sobreponham ou


não se sobreponham demasiado (ver página 131).

Sugestões:

• Este é um bom conjunto para se iniciar a utilização do Logo, visto que as


instruções para o desenhar se resumem a “seguir em frente” x unidades, “le-
vantar a caneta”, “seguir em frente” x unidades, “baixar a caneta”, “seguir
em frente” x unidades, ...F
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 201

Proposta 3 (A Curva de Koch).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o processo iterativo e explicar a lei de formação deste fractal;


• Organizar e analisar dados para determinar a expressão geral de uma sucessão;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender o conceito de auto-semelhança e saber assinalar cópias do fractal
dentro dele mesmo, indicando a razão de semelhança;
• Calcular a dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta;
• Compreender a relação entre o conceito de dimensão fractal e a “rugosidade”
de um objecto.

Actividade: A Curva de von Koch tem um processo de construção que consiste


em dividir o segmento de recta inicial em três partes iguais e usar quatro cópias de um
desses segmentos, como mostra a figura a seguir.

(1) No NetLogo, abre o modelo fractais geometricos no NetLogo e desenha as pri-


meiras três ou quatro iterações da Linha de Koch (escolhe “Linha de Koch” no
botão de escolha “tipo koch”, coloca o cursor “factor redução” em 33% (apro-
ximadamente 1/3), carrega em “Iniciar Koch” e de seguida em “Desenhar” ou
em “Desenhar uma iteração”).
(2) Explica como é a lei de formação da Linha de von Koch.
(3) Investiga o que acontece relativamente ao número de lados da linha, ao com-
primento de cada um desses lados e ao comprimento total da linha à medida
que aumenta o número de iterações.
202 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(a) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:


Número Comprimento Comprimento
de lados de cada lado total da linha

Iteração 0 1

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3

Iteração n
(Lei de Formação)
(b) Consegues explicar como é a Linha de Koch ao fim de uma quantidade
infinita de iterações?
(c) Para que valor tende cada uma das sucessões apresentadas no quadro de
3a?
(d) A linha de von Koch é auto-semelhante? Na iteração mais avançada
que desenhaste, imagina nela o que falta para obter o fractal e assinala
algumas partes da figura onde estão contidas reduções do fractal. Escolhe
regiões onde a cópia do fractal apareça em escalas diferentes.
(e) Determina a dimensão fractal da Linha de Koch.
(4) Desenha novas Linhas de Koch, variando o factor de redução através do slider
presente no modelo.
(a) O que acontece quando o factor de redução usado é de 50%?
(b) Qual te parece ser a influência do factor de redução escolhido na dimensão
da respectiva figura obtida?
(c) Experimenta vários valores para o factor de redução e determina a di-
mensão fractal de cada uma das respectivas linhas.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 203

Observações:

• Consoante a preparação prévia dos alunos com quem se realize esta actividade,
pode haver necessidade de fornecer algumas pistas sobre como organizar os
dados na tabela da questão 3a, podendo, para tal, completar-se algumas das
suas células. Por exemplo, pode preencher-se a linha da iteração 2 com os
2 2
dados 42 , 13 e 42 31 .
• Na questão 3b, com os alunos dos 11o e 12o anos pode procurar-se que eles
concluam que a Curva de Koch não tem derivada em nenhum dos seus pontos.
• A questão 3c pode ser respondida mesmo por alunos mais novos, bastando
que compreendam que ao multiplicar um valor por um número maior que 1 se
obtém um valor maior que o inicial e ao multiplicar por um número menor
que 1 se obtém um resultado inferior ao inicial.
• A questão 3d pode ser usada para explorar os conceitos de auto-semelhança e
de razão de semelhança.

Sugestões:

• Pode pedir-se aos alunos que comecem por desenhar a Curva de Koch à mão,
usando a grelha de triângulos equiláteros (Anexo 1) ou de pontos (Anexo 3)
sendo para isso necessário explicar a regra de formação e retirar a questão 2 e
adaptar convenientemente a questão 4.
• Pode usar-se o Logo em vez do NetLogo, sendo para isso necessário adaptar as
questões e fornecer, ou não, o algoritmo, consoante as noções de programação
dos alunos. O aluno pode também começar por construı́-lo dando as instruções
uma a uma e depois passar à programação por recursividade, isto é, programar
para que o software devolva a imagem do conjunto a partir dos dados que lhe
fornecemos: comprimento do segmento da 1a iteração e número de iterações
pretendidas (ver algoritmo no Anexo 20).
204 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

• Pode pedir-se que a lei de formação seja explicada pelos alunos indicando
quais as funções que compõem um SFI que defina a Curva de Koch. Mesmo
que não indiquem a expressão analı́tica de cada uma, podem identificá-las
verbalizando as transformações no plano envolvidas. Depois de identificadas
essas transformações, a expressão pode ser escrita tendo em conta as indicações
do Exemplo 14, na página 42.
• De uma forma mais arcaica, mas não menos eficaz e divertida, pode proceder-
se à construção da curva através de fotocópias sucessivas usando os Anexos 7
e 8. Conceitos como razão de semelhança e relação entre áreas e perı́metros de
figuras semelhantes poderão ser explorados usando este processo. Além disso,
cada aluno ou grupo de alunos pode usar uma figura inicial diferente (desde
que não seja um “segmento de recta fino” que poderá desaparecer ao longo
das fotocópias sucessivas) para depois, ao compararem os trabalhos uns dos
outros, poderem compreender que o conjunto inicial ao qual se aplica um SFI
não determina a forma do fractal.F

A actividade da Proposta 4 pode ser resolvida a seguir à da Proposta 3 de forma a


aproveitar alguns dos cálculos já aı́ efectuados.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 205

2
Proposta 4 (A Ilha de Koch ou O Floco de Neve de Koch).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o processo iterativo e explicar a lei de formação deste fractal;


• Organizar e analisar dados para determinar a expressão geral de uma sucessão;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender o conceito de auto-semelhança e saber assinalar cópias do fractal
dentro dele mesmo, indicando a razão de semelhança.

Actividade: Se aplicarmos o processo de construção da Curva de Koch a cada um


dos lados de um triângulo equilátero, obtemos progressivamente um fractal chamado
Ilha de Koch ou Floco de Neve de Koch.

(1) No NetLogo, abre o modelo fractais geometricos e desenha as primeiras três


ou quatro iterações da Ilha de Koch (escolhe “Ilha de Koch” no botão de
escolha “tipo koch”, carrega em “Iniciar Koch” e de seguida em “Desenhar”
ou em “Desenhar uma iteração”. O cursor “factor redução” não tem qualquer
influência no desenho deste fractal).
2Adaptado de: “Fractais no Ensino Secundário” - Ana Paula Canavarro e Outros, APM;

http://math.rice.edu/ lanius/frac/anpr.html ; OLIVÉ, Oriol. Els Fractals - Introducció pràctica als

fractals IFS .
206 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(2) Explica como é a lei de formação da Ilha de Koch.


(3) Investiga o que acontece relativamente ao perı́metro da figura, à medida que
avançamos no número de iterações. (Podes considerar que o comprimento do
primeiro lado da figura da iteração zero é 1 ou então a.)
(a) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:
Perı́metro

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3
(b) Determina o termo geral da sequência dos perı́metros da alı́nea anterior.
(c) Como evolui esta sequência e para que valor tende?
(4) Faz agora um estudo semelhante relativamente à área da figura correspondente
a cada iteração.
(a) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:
Área

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3
(b) Determina o termo geral da sequência das áreas da alı́nea anterior.
(c) De que valor se aproxima a sequência? (Podes utilizar uma calculadora
gráfica ou uma folha de cálculo e construir tabelas e/ou representar os
valores da sucessão para te ajudar a chegar a uma conclusão.)
(5) Imagina a construção do floco de von Koch obtido após um número infinito de
iterações. Consegues assinalar onde estão partes da figura que contêm o todo,
isto é, reduções da figura completa? Este fractal é auto-semelhante?
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 207

(6) O Floco de Neve Invertido

(a) No NetLogo, abre o modelo fractais geometricos e desenha as primeiras


três ou quatro iterações do Floco de Neve Invertido (escolhe “Floco de
Neve Invertido” no botão de escolha “tipo koch”, carrega em “Iniciar
Koch” e de seguida em “Desenhar” ou em “Desenhar uma iteração”. O
cursor “factor redução” não tem qualquer influência no desenho deste
fractal).
(b) A que se deve o nome de “Floco de Neve Invertido deste fractal”?
(c) Investiga o que acontece à área e ao perı́metro total da figura à medida
que avançamos no número de iterações.
(d) A dimensão fractal de um conjunto composto pela reunião finita de vários
outros é igual ao máximo dos valores das suas dimensões fractais. Com
base nisto, e conhecendo já o valor da dimensão fractal da Curva de
Koch, determina a dimensão fractal da Ilha de Koch e do Floco de Neve
Invertido.
(e) Chama-se floco de neve a este fractal pela sua parecença com a forma de
um floco de neve. Mas, na verdade, não existem dois flocos de neve iguais.
Faz uma pequena investigação e tenta descobrir como se formam os flocos
de neve e o que faz com que a forma dos mesmos seja tão diversificada.

“Milhões de toneladas de neve caem sobre grandes áreas a cada ano. Ficamos

maravilhados quando paramos para entender que toda aquela neve é composta

de flocos de neve delicados e delicadamente desenhados, cada um deles menores

do que a unha de seu dedo menor. E que desenhos lindos! As pessoas que os

estudam e fotografam continuamente descobrem, para seu espanto, que não


208 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

existem dois iguais. Seu desenho próprio com raras excepções, os flocos de

neve tem sempre seis lados. Às vezes os seis lados são rectos e achatados, mas

com maior frequência eles têm seis pontas lindamente desenhadas que saem

de um cı́rculo formando um centro comum e tendo este seu desenho próprio.

Cada ponta na forma de lança faz par com as outras no mesmo floco, mas

como foi mencionado acima, não foram encontrados dois flocos exactamente

iguais. Um cientista que fotografou mais de 400.000 flocos de neve mostrou em

suas fotos que isto verdadeiramente ocorre. Que maravilha!”

(http://www.stories.org.br/snow.html)

“Não há dois flocos de neve exactamente iguais. Cada um é uma colecção de

cristais de gelo, de vapor de água gelado, congelados juntos. As formas do

cristal são divididas em aproximadamente 80 categorias. Podem ter a forma

de agulhas, prismas, lâminas, hexágonos e colunas. A forma depende da tem-

peratura, altura e água contida na nuvem na qual se formam. A neve pode ser

“húmida” ou “seca”. A neve húmida é feita de grande flocos e se forma quando

a temperatura está quase zero. É perfeita para fazer bolas de neve, mas difı́cil

de limpar. A neve seca é poeirenta e fácil de limpar; forma-se quando a tempe-

ratura está bem abaixo de zero. O granizo é normalmente neve derretida, mas

pode ser chuva semicongelada formada quando as gotas de chuva evaporam e

esfriam ao cair.”

(http://www.trabalhoescolar.hpg2.ig.com.br/neve.htm)

(f) Adapta o modelo já construı́do em NetLogo para desenhares outros “Flocos de

Neve” com formas diferentes.

Observações:

• Tal como já foi referido para a questão 3c da Proposta 3, a questão 3c desta
actividade pode ser respondida por alunos mais novos. A idade e a preparação
dos alunos em causa, pode determinar a escolha do valor do comprimento do
lado do triângulo inicial (1 ou a).
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 209

• A questão 4 será melhor resolvida por alunos do 12o Ano que já dominem o
conceito de progressão geométrica e possam determinar o valor da sua soma,
não necessitando para isso da sugestão dada na alı́nea 4c. O interessante
desta questão é poder concluir que a Ilha de Koch é uma linha de comprimento
infinito que delimita uma área finita.
• A questão 6c responde-se com muito poucos cálculos tendo em conta o trabalho
que já foi feito antes. É interessante comparar os dois fractais com o mesmo
perı́metro.
• A questão 6d permite observar dois fractais diferentes com a mesma dimensão
fractal.
• As questões 6e e 6f poderão fazer mais sentido no âmbito de uma Área de
Projecto.

Sugestões:

• A Ilha de Koch pode ser desenhada usando a grelha de triângulos equiláteros


Anexo 1. Esta pode ser uma tarefa inicial, ou “a grande” tarefa a realizar com
alunos do 1o ou do 2o ciclo.
• Tendo já utilizado o Logo para resolver a Actividade da Proposta 3, o mesmo
algoritmo é facilmente adaptado para desenhar a Ilha de Koch.
• Em http://www.its.caltech.edu/∼atomic/snowcrystals/ há informação diversa
sobre os vários tipos de flocos de neve que se podem formar. Os alunos poderão
escolher um ou dois tipos com estrutura fractal e tentar modelá-los o melhor
possı́vel. Poderão também estudar a dimensão fractal da linha que delimita
cada cristal de gelo.F
210 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 5 (O Triângulo de Sierpinski).


Esta Actividade é, em muito, idêntica às actividades das Propostas 3 e 4, no que diz
respeito aos conceitos matemáticos envolvidos e à forma como são abordados. Depois
das outras duas trabalhadas na sala de aula, pode ser pedido aos alunos que resolvam
esta actividade em casa.
A segunda parte, dedicada ao Tetraedro de Sierpinski (“Sierpinski no Espaço”) de-
verá ser um projecto de turma em que todos os alunos contribuirão para a construção
de um modelo “tridimensional”.

Objectivos: Um dos interesses em resolver esta actividade e a actividade sobre


a Ilha de Koch é o de poder observar dois fractais com perı́metros infinitos, tendo um
deles área positiva e o outro área nula.
No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o processo iterativo e explicar a lei de formação deste fractal;


• Organizar e analisar dados para determinar a expressão geral de uma sucessão;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender o conceito de auto-semelhança e saber assinalar cópias do fractal
dentro dele mesmo, indicando a razão de semelhança;
• Calcular a dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta.

Actividade:

(1) No NetLogo, abre o modelo fractais geometricos e desenha as primeiras três ou


quatro iterações do Triângulo de Sierpinski (escolhe “Triângulo de Sierpinski”
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 211

no botão de escolha “tipo sierpinski”, carrega em “Iniciar Sierpinski” e de


seguida em “Desenhar” ou em “Desenhar uma iteração”).
(2) Explica como é a lei de formação do Triângulo de Sierpinski.
(3) Investiga o que acontece relativamente ao lado de cada triângulo (dos mais
pequenos que compõem a figura), o perı́metro total da figura, a área de cada
triângulo e a área total, à medida que aumenta o número de iterações. (Podes
considerar que o comprimento do lado do primeiro triângulo é 1 ou então a.)
(a) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:

Lado de cada Perı́metro total Área de cada Área total

triângulo da figura triângulo da figura

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3

Iteração n

(Lei de Formação)
(b) Consegues explicar como é o Triângulo de Sierpinski (o conjunto que se
obtém ao fim de uma quantidade infinita de iterações)?
(c) Como evolui e para que valor tende cada uma das sucessões apresentadas
no quadro de 3a?
(4) Imagina a construção triângulo de Sierpinski com um número infinito de
iterações.
(a) O Triângulo de Sierpinski é auto-semelhante? Consegues assinalar onde
estão partes da figura que contêm o todo, isto é, reduções da figura com-
pleta? Indica reduções do todo a várias escalas.
(b) Determina a dimensão fractal do Triângulo de Sierpinski.
212 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(5) Imagina que o processo de construção da figura era colorir o triângulo central
e em seguida dividir este em quatro triângulos colorindo o central e assim
sucessivamente.
(a) De que se aproximaria esta sequência de figuras?
(b) Adapta o modelo já construı́do em NetLogo para obter a sequência de
figuras sugeridas em 5.
(c) A figura limite dessa sequência tratar-se-á de um fractal?
(6) Sierpinski no Espaço
Pensa no processo análogo ao anterior, mas aplicado a um tetraedro. O
processo de construção está representado a seguir:

(a) Constrói com os teus colegas vários tetraedros de papel3 iguais. Os tetra-
edros devem ser todos do mesmo tamanho para que seja possı́vel juntá-los
para construir um modelo deste fractal com um determinado número de
iterações. A turma deve decidir a que iteração pretende que corresponda
o modelo e determinar previamente o número de tetraedros necessários.

3Em [20, pág. 20 e 21] encontram-se instruções para a construção de tetraedros por dobragens.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 213

Número de Tetratedos

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3

Iteração n
(Lei de Formação)
(b) Qual é a forma dos “buracos”?
(c) Explica como é a lei de formação deste “tetraedro esburacado”.
(d) Segue um raciocı́nio análogo aos das questões 3 e 4 sobre o Triângulo de
Sierpinski de forma a conseguires responder:
(i) Qual é o volume deste fractal?
(ii) Qual é a sua área total?
(iii) Qual é a sua dimensão?
(iv) Como é o seu aspecto?
(v) Qual é a sua dimensão fractal?

Observações:

• Na questão 2 a lei de formação pode ser explicada em linguagem corrente, in-


dicando que a cada triângulo presente na figura de uma determinada iteração,
é retirado o triângulo central cujos vértices são os pontos médios dos lados -
este tipo de resposta é a mais adequada para alunos mais jovens - ou então
podem ser indicadas as funções que constituem um SFI que defina o Triângulo
de Sierpinski.
• A investigação sobre a área do Triângulo de Sierpinski na questão 3 quando
trabalhada por alunos que ainda não sabem, ou têm muitas dificuldades em
214 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

trabalhar com radicais, poderá ser levada a cabo à parte, considerando que o
triângulo que constitui a iteração zero tem área 1.
• Na questão 6c a lei de formação do tetraedro pode ser apenas explicada em lin-
guagem corrente ou então explicando quais as funções que compõem o sistema
de funções iteradas que produzem a figura.

Sugestões:

• Pode pedir-se aos alunos que desenhem o Triângulo de Sierpinski à mão,


usando a grelha de triângulos equiláteros (Anexo 1) ou a grelha triangular
de pontos (Anexo 3) sendo para isso necessário explicar a regra de formação e
retirar a questão 2.
• Pode usar-se o Logo em vez do NetLogo, sendo para isso necessário adaptar as
questões e fornecer, ou não, o algoritmo, consoante as noções de programação
dos alunos.
• Pode pedir-se que a lei de formação seja explicada pelos alunos indicando quais
as funções que compõem um SFI que defina o Triângulo de Sierpinski. Mesmo
que não indiquem a expressão analı́tica de cada uma, podem identificá-las
verbalizando as transformações no plano envolvidas. Depois de identificadas
essas transformações, a expressão pode ser escrita tendo em conta as indicações
do Exemplo 14, na página 42.
• Também neste caso pode proceder-se à construção deste fractal através de
fotocópias sucessivas usando o esquema do Anexo 9 ou 10 e a imagem do
Anexo 11 como iteração zero. Qualquer imagem diferente desta pode ser usa,
desde que não tenha contornos demasiado finos que tendam a desaparecer com
as sucessivas reduções.F
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 215

Proposta 6 (Relação entre o Triângulo de Sierpinski e o Triângulo de


Pascal).

Objectivos: O interessante desta actividade é observar como estes dois triângulos


estão tão intimamente relacionados, quando à primeira vista nada os relacionaria já
que um é um “aglomerado” de números e o outro contém no seu interior um padrão
geométrico.
No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Visualizar a relação entre os dois triângulos, identificando os padrões do triângulo


de Sierpinski no triângulo de Pascal;
• Saber usar os critérios de divisibilidade de um número por 2, por 3, por 4, por
5 e por 10;
• Saber aplicar a fórmula do binómio de Newton para determinar o número
correspondente a cada célula do Triângulo de Pascal;
• Relacionar a simetria do padrão numérico do triângulo de Pascal com as si-
metrias patentes nos padrões geométricos encontrados a partir de um padrão
numérico.

Actividade: Aparentemente nada relaciona o Triângulo de Sierpinski com o Triângulo


de Pascal, a não ser o facto de serem ambos triângulos. No entanto, como se verá, há
muito que os una.

(1) Constrói o Triângulo de Pascal com pelo menos 8 ou 16 linhas (podes usar a
grelha de hexágonos do Anexo 5 ou utilizar o Triângulo de Pascal já construı́do
no Anexo 6) e pinta as casas correspondentes aos números ı́mpares.
(a) Que observas?
(b) Consegues encontrar uma regra que indique que células de uma linha
devem ser pintadas, em função das células pintadas na linha anterior?
216 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(c) A partir da regra determinada na alı́nea anterior, continua a pintar o


Triângulo de Sierpinski no Triângulo de Pascal, até à 32a linha.
(2) Será que outros padrões numéricos geram também padrões geométricos fractais
no triângulo de Pascal?
(a) Investiga. Escolhe um padrão numérico e, noutro Triângulo de Pascal
em branco, pinta as células correspondentes aos números do padrão esco-
lhido. (Algumas sugestões são: Os números que são divisı́veis por três; os
números que são divisı́veis por quatro, os números que são divisı́veis por
cinco...)
(b) Se o padrão geométrico que encontraste a partir do padrão numérico for-
mar uma estrutura fractal, tenta encontrar a regra de formação desse
fractal e desenhar as primeiras iterações.

Observações:

• Esta actividade será realizada na sua plenitude, isto é, tocando num maior
número de conteúdos programáticos, se for realizada por alunos do 12o ano.
Será uma oportunidade para aplicarem os seus conhecimentos sobre o binómio
de Newton, podendo até aplicar a fórmula de cálculo do número que constitui
uma determinada célula, o que pode ser útil para dar continuidade a um padrão
geométrico pintado no triângulo.
• Com alunos mais pequenos, nomeadamente os do 7o ano, esta poderá ser uma
actividade de investigação onde poderão aplicar os seus conhecimentos sobre
os critérios de divisibilidade de números por determinados divisores.

Sugestões:

• Esta actividade, explorada a fundo, poderá necessitar de bastante tempo e


eventualmente ser mais adequada para se realizar no âmbito de uma Área
de Projecto. Em http://www.its.caltech.edu/∼mamikon/PasFastC.html está
disponı́vel um applet que pinta no Triângulo de Pascal, os padrões geométricos
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 217

correspondentes aos divisores de um inteiro escolhido, até 60 linhas. Se se pre-


tender fazer uma investigação mais completa, este applet facilita-a, tornando-a
mais rápida. É muito interessante ver os padrões que emergem na imagem!F
218 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

4
Proposta 7 (Árvores).

Objectivos: Um dos aspectos importantes desta actividade é a possibilidade de pro-


porcionar aos alunos uma visão de como os sistemas de funções iteradas, mesmo os
bastante simples, podem simular formas naturais bastante elaboradas.

No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o processo iterativo e explicar a lei de formação destes fractais;


• Organizar e analisar dados para determinar a expressão geral de uma sucessão;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender o conceito de auto-semelhança e saber assinalar cópias do fractal
dentro dele mesmo, indicando a razão de semelhança;
• Compreender que estruturas ramificadas poderão ser modeladas, com alguma
facilidade, por SFI.

Actividade:

(1) No NetLogo, abre o modelo fractais geometricos e desenha as primeiras três ou


quatro iterações da árvore (carrega em “Árvore” e de seguida em “Desenhar”
ou em “Desenhar uma iteração”).
(a) Explica como é a lei de formação desta árvore.
(b) Investiga o que acontece relativamente ao número de ramos que compõem
cada iteração, à medida que avançamos no número de iterações.
(i) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:

4Adaptado de: “Fractais no Ensino Secundário” - Ana Paula Canavarro e Outros, APM

http://math.rice.edu/ lanius/images/triangle.gif
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 219

Número de ramos Número total


terminais de ramos

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3

Iteração n
(Lei de Formação)
(ii) Para que valor tende cada uma das sucessões apresentadas no qua-
dro de 1(b)i?
(2) Observa as seguintes sucessões de imagens contendo as três primeiras iterações
para a construção de uma árvore.

Iteração 0 - um segmento de recta de medida 1.


Iteração 1 - para a obter, divide-se o segmento inicial em três partes iguais,
e no ponto de união entre cada uma dessas partes acrescenta-se um novo
segmento com 1/3 do comprimento do segmento inicial, de modo a formarem
com este um ângulo de 60o . O segmento mais acima acrescenta-se à esquerda
do segmento inicial e o segmento mais abaixo acrescenta-se à direita.
220 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Iteração 2 - para a obter segue-se o mesmo processo que na geração an-


terior, aplicando-o a cada um dos cinco segmentos que compõem a figura
anterior.
(a) Adapta o modelo em NetLogo para desenhar esta árvore.
(b) Investiga o que acontece relativamente ao número de segmentos que for-
mam a árvore, à medida que avançamos no número de gerações.
(i) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:

Número de segmentos novos Número total de segmentos

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3
(ii) És capaz de encontrar uma fórmula que te permita determinar o
número de segmentos que compõem a n-ésima iteração?
(iii) Como evolui esta sucessão?
(c) Faz agora um estudo semelhante relativamente ao comprimento de cada
segmento novo que constitui a figura em cada iteração.
(i) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:
Comprimento de cada segmento novo

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3
(ii) És capaz de encontrar uma fórmula que te permita determinar o
comprimento de cada um dos segmentos que compõem a n-ésima
iteração?
(iii) Como evolui esta sequência?
(d) Estuda agora o comprimento total da árvore:
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 221

(i) Regista as tuas conclusões no quadro seguinte:


Comprimento total da árvore

Iteração 0

Iteração 1

Iteração 2

Iteração 3
(ii) És capaz de encontrar uma fórmula que te permita determinar o
comprimento total da n-ésima iteração?
(iii) Como evolui esta sucessão?
(iv) Consegues dizer qual seria o comprimento total da árvore completa
(i. é., depois de repetirmos o processo um número infinito de vezes)?
(3) Imagina a construção da árvore até ao infinito. Consegues assinalar onde estão
partes da figura que contêm o todo, isto é, reduções da figura completa? Tenta
encontrar “o todo” em escalas diferentes em cada figura.
(4) Aproveita para descansar e, ao passear no campo, procura recolher pedaços de
plantas que te pareçam desenvolver-se segundo uma forma fractal. Consegues
explicar para cada uma delas a sua lei de formação (aproximada)?

(5) Consegues identificar outro tipo de “coisas” que tenham uma estrutura rami-
ficada?

Observações:

• A ideia da questão 5 é levar os alunos a perceber que os modelos de árvores aqui


estudados, ou outros similares, podem servir para modelar outras estruturas.
222 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

As árvores, o nosso sistema vascular, os rios, a internet, as estruturas gover-


namentais e a organização hierárquica de uma sociedade, as lı́nguas quando
evoluem, as várias variantes das religiões, tudo isto tem em comum uma estru-
tura que ramifica. Importa despertar nos alunos a noção de que a matemática
e, em particular a geometria fractal, pode servir para modelar fenómenos e
objectos de diversas áreas do conhecimento.
• A realização desta actividade pode ser mais uma oportunidade para contrapor
a geometria fractal à geometria euclidiana.

Sugestões:

• As primeiras iterações das árvores também podem ser desenhadas na grelha


do Anexo 3.
• O software Logo também permite desenhar árvores fractais com alguma faci-
lidade.
• Há aspectos da linguagem relativa à construção das árvores que podem ser
trabalhados e generalizados. O professor pode pedir aos alunos que decidam
que nomes dar a cada parte da estrutura. Primeiro em grupos e depois optar
por uma linguagem comum para toda a turma. São esperados termos como
“ramo” e “nó”.
• Na internet há alguns applets que o professor pode utilizar para dinamizar
a aula, mostrando aos alunos como este tipo de processo iterativo pode criar
imagens com aspecto muito natural. Em
http://library.thinkquest.org/26242/full/progs/trees.html está um applet que
cria árvores fractais aleatoriamente e em
http://arcytech.org/java/fractals/lsystems.shtml está um applet que também
desenha arbustos a cores.
• Em http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration
/Pythagorean Trees/PTdirections.html está um applet para desenhar árvores
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 223

pitagóricas, isto é, fractais resultantes de um SFI, criados a partir da repre-


sentação geométrica do Teorema de Pitágoras.F
224 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 8 (Sistemas de Funções Iteradas).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o conceito de ponto fixo de uma função;


• Compreender o conceito de SFI;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender que o fractal definido por um SFI não depende do conjunto ini-
cial.

Actividade: Vamos usar o Triângulo de Sierpinski como base para esta actividade
que introduz o conceito de Sistema de Funções Iteradas.
As primeiras iteradas da construção do Triângulo de Sierpinski são:

Pode dizer-se que a lei de formação do Triângulo de Sierpinski é: “Inicia-se o


processo com um triângulo equilátero, marcam-se os pontos médios dos seus lados,
retira-se o triângulo cujos vértices coincidem com esses pontos e, de seguida, efectua-
se recursivamente o mesmo a todos triângulos que se mantiverem na figura.” Porém, se
se quiser representar este processo de uma forma matemática, há que ter mais cuidado.
Uma das maneiras de o conseguir é pensar nas funções que transformam o triângulo
inicial, em cada um dos três triângulos que constituem a primeira iteração. Para isso,
coloca-se o triângulo inicial, de forma adequada, num referencial cartesiano.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 225

(1) Observa as imagens e explica, por palavras tuas, que transformações são apli-
cadas ao triângulo inicial para se obter cada um dos triângulos que compõem
a primeira iteração.

Função f1

Função f2

Função f3

(2) Que se obtém se se aplicar a função f1 ao triângulo T1?


(3) O que acontece se se aplicar recursivamente f1 , uma quantidade infinita de
vezes?
(4) Quando se aplica uma redução, de forma iterada, a um objecto, uma quanti-
dade infinita de vezes, a sucessão dos objectos obtidos em cada iteração tende
para um ponto. Que ponto é esse no caso da aplicação f1 ?
226 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(5) O ponto determinado na questão anterior chama-se ponto fixo de f1 . É o único


ponto do plano cuja imagem por f1 é igual a si próprio. E é para esse ponto
que tende a sucessão das iteradas sucessivas, de um objecto qualquer do plano,
por f1 .
Consegues identificar o ponto fixo de f2 ? E o de f3 ?

(6) Ao iterar sucessivamente uma redução, uma quantidade infinita de vezes, no


“final” obtém-se sempre um ponto. O interessante começa quando se itera
um conjunto de aplicações em simultâneo. Na figura que se segue está o
triângulo inicial (iteração 0) e o resultado da aplicação das funções f1 , f2 e f3
a esse triângulo (iteração 1). Desenha no terceiro referencial o que se obtém
se aplicarmos f1 , f2 e f3 à primeira iteração do Triângulo de Sierpinski.

Iteração 0 Iteração 1
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 227

Que obtiveste?
(7) Que se obtém se aplicarmos f1 , f2 e f3 ao objecto correspondente à segunda
iteração do Triângulo de Sierpinski?
(8) Ao conjunto das três funções f1 , f2 e f3 com o espaço em que estão definidas
(R2 , neste caso) chama-se Sistema de Funções Iteradas (SFI) e é representado
por {R2 ; f1 , f2 , f3 }. O Triângulo de Sierpinski é o objecto que se obtém após
a aplicação do SFI um número infinito de vezes.
Que acontece se aplicarmos este SFI a um quadrado, em vez de ser a um
triângulo? (Utiliza uma fotocopiadora para obteres as iterações sucessivas e
os Anexos 9 ou 10 e 11 para colocares as cópias na posição correcta.)
(9) Que concluis?

Observações:

• Considera-se que, ao iniciar esta actividade, os alunos já conhecem o Triângulo


de Sierpinski, a sua lei de formação e algumas das suas propriedades (ver
Proposta 5).
• Nesta actividade, palavras como “iterada”, “recursivamente”, ... deverão pas-
sar a ser familiares para os alunos.
• Na questão 1 espera-se que os alunos identifiquem reduções e translações, in-
dicando o vector associado.

Sugestões:

• É muito provável que a questão 5 seja difı́cil para os alunos conseguirem res-
ponder à primeira. Será necessário realizar algumas experiências para perce-
berem bem o processo de iteração das funções f2 e f3 . Como, para além da
redução, estas aplicações contêm uma translação, a visualização do resultado
dos seus processos iterativos não é tão imediata como para a função f1 . A
utilização de uma quadro interactivo na sala de aula, caso seja possı́vel, po-
derá ser uma forma muito prática de realizar várias experiências rapidamente
para levar os alunos a uma conclusão. Ou então, usar o applet disponı́vel em
228 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

http://classes.yale.edu/fractals/Software/detifs.html, devendo o professor co-


locar os parâmetros relativos às matrizes que definem as três funções do SFI.
Ainda em alternativa, pode utilizar-se o software IFS Construction Kit (dis-
ponı́vel gratuitamente em http://ecademy.agnesscott.edu/∼lriddle/ifskit/index.htm).F
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 229

5
Proposta 9 (Alterando o SFI que define o Triângulo de Sierpinski).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender e identificar transformações afins (redução, simetria relativa-


mente a um eixo; rotação e translação) aplicadas a um conjunto do plano.
• Compreender o conceito de SFI;
• Definir um SFI através dos parâmetros associados a cada transformação;
• Identificar as várias componentes (reduções) de um fractal auto-semelhante;
• Aplicar o conceito de limite;
• Compreender que o fractal definido por um SFI não depende do conjunto ini-
cial.

As Transformações Afins no Plano (breve revisão)


Na actividade da Proposta 8 foram identificadas as transformações que compõem
as funções f1 , f2 e f3 que, por sua vez, compõem um sistema de funções iteradas que
define o Triângulo de Sierpinski. Nessas funções intervêm reduções e translações. No
entanto, para desenhar fractais um pouco mais elaborados é necessário entender as
transformações afins no plano.
Uma transformação afim é composta por pelo menos uma das seguintes aplicações:
Reescalamento, Simetria, Rotação e Translação. Como um SFI tem que ser cons-
tituı́do apenas por contracções, no grupo dos reescalamentos ficam postas de parte as
ampliações e a função identidade.

5Adaptado de http://classes.yale.edu/fractals/IntroToFrac/TransfGeom/TransfGeom.html
230 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

O Reescalamento:
No caso dos reescalamentos há a ter em conta aqueles cujo factor de redução segundo
os dois eixos é igual (obtém-se uma redução - uma figura semelhante à inicial) e aque-
les em que o reescalamento segundo o eixo das abcissas é diferente do reescalamento
segundo o eixo das ordenadas.

Uma contracção será sempre um reescalamento (com factores de redução segundo


cada eixo que podem ser iguais ou diferentes) composta, ou não, com pelo menos uma
das outras aplicações mencionadas (simetria, rotação e translação).

A Simetria:

Uma simetria segundo a origem é equivalente à composição de duas simetrias, cada


uma segundo cada um dos eixos coordenados. Também equivale a uma rotação de 180o
em torno da origem.
Se num reescalamento pelo menos um dos factores de redução for negativo, obtém-
se o equivalente a um reescalamento com factor de redução positivo composto com uma
simetria.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 231

A Rotação:

A rotação de uma imagem em torno da origem do referencial corresponde a uma rotação


igual das linhas horizontais e das linhas verticais. Quando o ângulo de rotação das li-
nhas horizontais, é diferente do ângulo de rotação das linhas verticais, obtém-se uma
distorção da imagem original.

A Translação:
232 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Vais agora verificar que alterações provoca no fractal a introdução de transformações


destas no SFI. Como a ordem em que as transformações são aplicadas pode ter in-
fluência no resultado, adopta-se a seguinte ordem:

1o - reescalamentos,
2o - simetrias,
3o - rotações,
4o - translações.

Apresentação do Software a utilizar:


Utilizaremos o programa IFS Construction Kit.6 De seguida apresentam-se algumas
acções que deves executar antes de utilizar este programa para a resolução desta acti-
vidade.

• Abre o programa e no menu Code escolhe a opção Scale/Rotation Form (isso


permitir-te-á definir cada uma das aplicações do SFI introduzindo os valores
dos parâmetros relativos às transformações que as compõem).
• Na janela principal aparece uma tabela onde serão colocados esses valores.
Scale - x: Corresponde ao valor de redução r.
Scale - y: Corresponde ao valor de redução s.
Rotation - x: Corresponde ao valor de rotação θ.
Rotation - y: Corresponde ao valor de rotação ϕ.
Translation - e: Corresponde ao valor de translação e.
Translation - f: Corresponde ao valor de translação f.
Probability: corresponde à probabilidade com que ocorre cada uma das
aplicações e não tem interesse para os fractais que se pretende desenhar agora.
No menu Code selecciona Equal Probabilities e os valores desta coluna devem
ficar todos iguais.
• No menu Draw, selecciona Deterministic.

6Disponı́vel gratuitamente em http://ecademy.agnesscott.edu/∼lriddle/ifskit/index.htm


5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 233

• O programa funciona em três janelas distintas:


Janela IFS (F2) - a janela onde estão os parâmetros que definem cada aplicação;
Janela Fractal (F3) - a janela onde aparecem as representações de cada ite-
rada;
Janela Design (F4) - a janela onde aparece o “esquema” do SFI através da
representação da primeira iterada, aplicada ao objecto inicial escolhido.
Podes aceder a todas elas também através do menu Window. Neste mesmo
menu tens ainda a opção Maximize que maximiza o tamanho de qualquer uma
das janelas que estiver seleccionada.
• No menu Design selecciona Use Initial Polygon - Oriented Box. Isso permitir-
te-á visualizar melhor as transformações de que é composta cada uma das
funções do SFI. Estás a indicar ao programa que o objecto inicial ao qual
será aplicado o SFI é um quadrado com um L no seu interior, o que permite
perceber se lhe são aplicadas rotações ou simetrias. Se se utilizar um quadrado
simples, o fractal obtido será o mesmo (porquê?), mas na janela Design essas
transformações não serão perceptı́veis (porquê?).

Actividade:
234 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(1) Observa a figura dada acima onde estão representadas algumas das iteradas
de um SFI.
(a) Quantas são as contracções que compõem o SFI? Identifica as suas repre-
sentações gráficas na imagem.
(b) Quais são as transformações no plano de que é composta cada uma das
aplicações do SFI?
(c) Na janela IFS do programa, introduz os parâmetros relativos a cada uma
das aplicações que indicaste nas alı́neas anteriores.
(d) Selecciona a operação Draw no menu Draw (ou clica CTRL+D) várias
vezes seguidas para obteres as várias iteradas. Compara com a figura e
comprova se os valores dos parâmetros que introduziste estão correctos.
Caso seja necessário procede a correcções.
(2) Verifica agora o que acontece se forem introduzidas alterações nas funções
do SFI. Na figura que se segue, à esquerda está a iteração 0 e à direita está
representada a primeira iterada de um SFI.

(a) Descobre as funções que constituem o SFI.


(b) Define este SFI no programa, introduzindo os valores dos diversos parâmetros
para cada função.
(c) Executa o comando Draw várias vezes seguidas para obteres uma apro-
ximação do fractal.
(d) Repara na diferença entre este fractal e o anterior. Consegues identificar
neste fractal as várias cópias de si mesmo nele contidas? Identifica cópias
a várias escalas e repara nas transformações associadas.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 235

(3) Repete o raciocı́nio anterior para cada um dos SFI cujas iteração 0 e iteração
1 estão representadas em cada alı́nea:

(a)

(b)

(c)
(4) E agora ao contrário: a partir da imagem de um fractal dado, descobre as
contracções (de maior factor de redução) de si mesmo que o compõem e indica
as transformações de que é composta cada uma delas. De seguida, introduz
os parâmetros correspondentes para confirmar a tua resposta. (Sugestão: Se
tiveres dificuldade em visualizar as transformações, recorta as imagens à direita
de cada fractal, onde estão uma cópia reduzida, uma simetria segundo o eixo
vertical e outra segundo o eixo horizontal.)
236 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(a)

(b)

(c)

(d)
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 237

(e)

(f)

(g)

(h)
238 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Observações:

• Dada a complexidade desta actividade e tendo em conta que nem sempre é fácil
identificar as várias componentes de um fractal e as respectivas aplicações as-
sociadas, aconselha-se que seja realizada pelos alunos utilizando a metodologia
de trabalho de grupo.
• Em alguns dos SFI, algumas das funções poderão ser definidas de vários modos
diferentes; por exemplo, uma rotação de 180o equivale a uma simetria em
relação à origem. O professor deve aproveitar esta actividade para relembrar
isso aos alunos ao comparar a forma como cada grupo definiu os SFI’s.

Sugestões:

• Em vez do software recomendado pode utilizar-se o applet disponı́vel em


http://classes.yale.edu/fractals/Software/detifs.html onde os parâmetros são
introduzidos da mesma forma.
• Há outro applet - Relatives of Sierpinski - disponı́vel em http://www.math.fau.edu/
MLogan/Pattern Exploration/Relatives of Sierp Prec/RSprecisionDirections.html
que, para os alunos mais jovens talvez seja mais indicado, na medida em que
não precisam de introduzir valores; basta escolherem a transformação preten-
dida entre um conjunto de opções disponı́veis: Rotações de 0o , 90o , 180o e 270o
e simetrias relativamente a cada um dos eixos coordenados, ou à bissectriz dos
quadrantes pares, ou dos quadrantes ı́mpares. As translações (segundo os vec-
tores (0; 0), (0, 5; 0) e (0; 0, 5)) e as reduções (de factor de redução 0.5) estão
implı́citas. Esta aplicação não permite a visualização de cada uma das itera-
das pois apresenta logo a imagem de uma aproximação do fractal. No caso de
se optar por este applet, as questões 3b e 3c terão que ser reformuladas, visto
que as rotações de 45o não estão previstas. Este applet permite ainda ao aluno
jogar um jogo7 com o computador que equivale à questão 4, isto é, dado um

7Em http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration/Relatives of Sierp Game/RSgameDirections.html


5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 239

fractal, o aluno tem que descobrir quais são as transformações que compõem
cada uma das contracções de um IFS que defina esse fractal.
• Por fim, há sempre também a possibilidade de recorrer a uma fotocopia-
dora e aos Anexos 10 e 11 para a elaboração dos fractais. Com alguma
paciência também se pode usar um software de desenho que permita reduções
e rotações.F
240 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 10 (Determinação do SFI).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Compreender o conceito de SFI;


• Definir uma função afim no plano através das coordenadas de três pontos do
fractal e das suas respectivas imagens.

Actividade:
Os Sistemas de funções iteradas que construı́ste nas Propostas anteriores são com-
postos apenas por semelhanças. Os resultados são fractais com um aspecto quase
sempre “muito geométrico”. Talvez o da questão 3c da Proposta 9 seja o que tem uma
forma mais parecida com um objecto da natureza. Porém, é possı́vel utilizar sistemas
de funções iteradas para tentar reproduzir objectos naturais com a geometria fractal.
É o caso da folha de um feto representada na Figura 4.1. Verás agora como podes
obter matematicamente um objecto deste tipo.
Pode considerar-se que a folha completa é a reunião de três contracções de si própria:
a sua “sub-folha” inferior esquerda, a sua “sub-folha” inferior direita e o restante (ver
imagem 4.2).
Repara que as imagens das contracções não são exactamente semelhantes à folha
inicial; há pequenas distorções. Repara também que o pé da folha não fica incluı́do em
nenhuma dessas três imagens da folha; por isso não irá aparecer no fractal que resultar
do SFI constituı́do por essas três aplicações. Veremos mais à frente como o conseguir.
As funções que se pretende determinar são funções afins que aplicam pontos (x, y)
do plano
 em pontos (x1 , y1 ) do plano e cujas expressões são do tipo:

ax + by + e = x1

.

cx + dy + f = y1

5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 241

Figura 4.1. Esta folha foi, na verdade, desenhada por computador a partir
de um SFI; mas parece bem verdadeira!

Como há seis parâmetros (a, b, c, d, e e f ) para serem encontrados, é necessário


um sistema de seis equações, bastando para tal, três correspondências (x, y) → (x1 , y1 ).
Então, para cada função do SFI, basta marcar três pontos no fractal (folha) e as suas
242 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Figura 4.2. A folha é a reunião de três contracções de si mesma.

respectivas imagens na imagem da folha obtida pela contracção que se pretende definir.
Estão já marcados esses pontos na Figura 4.1: A; B e C na folha inicial, A1 ; B1 e C1
como respectivas imagens na sub-folha esquerda, A2 ; B2 e C2 como respectivas imagens
na sub-folha direita, e A3 ; B3 e C3 como respectivas imagens na parte restante da folha.

(1) Coloca a imagem do feto num referencial adequado.


(2) Determina as coordenadas dos pontos A, B, C, A1 , B1 , C1 , A2 , B2 , C2 , A3 , B3
e C3 .
(3) Determina a expressão da aplicação afim:
(a) f1 que aplica os pontos A, B e C nos pontos A1 , B1 e C1 respectivamente.
(b) f2 que aplica os pontos A, B e C nos pontos A2 , B2 e C2 respectivamente.
(c) f3 que aplica os pontos A, B e C nos pontos A3 , B3 e C3 respectivamente.
(4) Indica que tipo de transformações no plano estão associadas a cada umas das
aplicações f1 , f2 e f3 .
(5) Abre o programa IFS Construction Kit (já apresentado na Proposta 9), indica
3 como o Number of Functions no cimo da janela IFS e introduz os coeficientes
determinados nas questões 3a, 3b e 3c.
No menu Code selecciona Equal Probabilities.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 243

No menu Draw selecciona a opção Deterministic e depois, no mesmo menu,


selecciona a opção Draw várias vezes consecutivas (ou carrega em CTRL+D)
para observares as várias iterações obtidas com este SFI.
Compara o que obtiveste aqui com a figura original.
(6) Na janela Design efectua alterações às transformações, usando apenas o rato ou
utilizando as opções disponı́veis o menu Design (Scale, Rotate, Stretch/Shear,
Horizontal Reflection, Vertical Reflection) e observa a consequência dessas
alterações no fractal produzido.
(7) Para obter o pé do feto, pode considerar-se que ele é uma contracção da folha
inteira em que o factor de redução segundo o eixo das abcissas é muito próximo
de zero. Experimenta obter uma aproximação da folha inicial com o respectivo
pé, acrescentando uma quarta aplicação que se ajuste ao modelo.

Observações:

• Uma das dificuldades desta actividade, para alguns alunos, vai ser a deter-
minação das coordenadas dos pontos. Pode ser uma oportunidade para lhes
mostrar que a Matemática, quando aplicada à realidade, normalmente não
produz resultados inteiros ou na forma de fracções “bonitas”.
• Outra dificuldade será a resolução de sistemas de seis equações a seis incógnitas.
Poder-se-á “saltar” esse obstáculo utilizando software indicado nas sugestões
que se seguem.

Sugestões:

• Para que o trabalho de cálculo não seja tão fastidioso, pode dividir-se a turma
em três grupos, ficando a cargo de cada um deles uma das alı́neas da questão
3.
• Pode usar-se a grelha quadriculada do Anexo 2 para fotocopiar em acetato e
usar como referencial que, aliás, deve ser colocado da mesma forma por todos
os alunos se se optar pela sugestão anterior.
244 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

• No caso de não se pretender que os alunos resolvam o sistema para determi-


nar as coordenadas dos pontos, podem usar o applet “Affine” (disponı́vel em
http://classes.yale.edu/fractals/Software/affine/affine.html) que, a partir da
introdução das coordenadas de três pontos não colineares e das coordenadas
das suas respectivas imagens, debita os coeficientes das reduções, rotações e
de translações a serem aplicadas ao objecto inicial para obter a imagem pre-
tendida. Os coeficientes obtidos podem ser introduzidos no “IFS Construction
Kit” desde que no menu Code se escolha a opção Scale/Rotation Form.
• Em alternativa ao software “IFS Construction Kit”, pode usar-se o applet
“Deterministic IFS” 8.
• No programa IFS Construction Kit pode ainda proceder-se da seguinte forma:
- carregar uma imagem digital da folha para o fundo da janela Design (esco-
lhendo Load Picture no meu Design);
- desenhar um quadrilátero cujos lados sejam tangentes à folha (menu Design
- Draw Initial Polygon);
-ajustar com o rato, os quadriláteros imagens desse polı́gono, de forma a que
cada um cubra, de forma idêntica, as duas sub-folhas inferiores e o restante da
folha. (Esta funcionalidade pode não ser muito fácil de usar e poderá ser con-
veniente fazer alguns ajustes na tabela de valores dos parâmetros.) Atenção:
não esquecer a simetria na sub-folha direita.
• Se a imagem digital for do formato GIF com transparência e, antes de começar
a iterar, seleccionar no menu Draw, Add Picture - From File e escolher o
ficheiro respectivo, o objecto inicial do processo de iteração passará a ser a
própria folha que se pretende representar. Se se seleccionar, no meu Draw,
Colors - Use Image Colors, a semelhança entre a folha e a aproximação de
fractal obtida será ainda maior.F

8Disponı́vel em http://classes.yale.edu/fractals/Software/detifs.html
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 245

Proposta 11 (Teorema da Colagem).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Aplicar o Teorema da Colagem para modelar formas fractais com o auxı́lio de


software adequado.

Actividade: O Teorema da Colagem diz o seguinte:


Dado um objecto geométrico, se conseguirmos uma “colagem” de contracções desse objecto

cuja forma seja muito idêntica à forma do objecto, então o fractal definido pelo SFI cons-

tituı́do por essas contracções também vai ser parecido com o objecto dado. Esta parecença

será tanto maior quanto a aproximação da colagem ao objecto dado.

A aplicação prática deste Teorema faz-se como se exemplifica a seguir.


Para encontrar um SFI que defina uma imagem semelhante à folha à esquerda na Fi-
gura 4.3 procura-se uma “colagem” com várias contracções dessa folha que se aproxime
o máximo possı́vel da folha inicial. Na mesma figura, à direita, mostra-se uma cola-
gem possı́vel, constituı́da por seis contracções da folha inicial. Cada contracção é uma
função afim - pode ser composta por reescalamentos, simetrias, rotações e translações.
Os reescalamentos e as rotações podem ser diferentes segundo cada um dos eixos.
Determinam-se os coeficientes de cada uma das aplicações, que neste caso são os
seguintes:

Contracção r1 r2 θ1 θ2 e f

w1 0,436 0,595 -8,5 -8,5 0,18 0,55

w2 0,338 0,573 42,9 42,9 0,37 0,42

w3 0,423 0,665 -37 -37 0,22 0,53

w4 0,469 0,672 66,2 66,2 0,62 0,16

w5 0,408 0,804 -42 -42 0,15 0,21

w6 0,713 0,675 2,5 2,5 0,12 0


246 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Figura 4.3. À esquerda, a folha que se pretende representar através de um


fractal definido por um SFI e à direita, a reunião de seis imagens dessa folha

através de seis contracções diferentes juntamente com o contorno da folha

original.

De seguida introduziram-se os coeficientes de cada uma das aplicações num software


para representação gráfica de SFI’s. Ao fim de seis iteradas obteve-se a imagem da
Figura 4.4 que revela alguma semelhança com a folha que se pretendia representar.

Figura 4.4. Comparação da forma original com a forma obtida ao fim de


seis iterações através de um SFI constituı́do por seis contracções.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 247

Repete agora tu este processo.

(1) Encontra uma folha (ou outro objecto) que te pareça ter uma forma fractal.
(2) Produz uma imagem digital da folha, utilizando um scanner e software ade-
quado.
(3) A partir desta imagem, produz outra que consista na folha toda a branco e o
fundo a preto.
(4) Converte uma cópia da imagem para o modo de escala de cinzentos (ou para
menos de 256 cores), formato bmp, com um tamanho que se aproxime dos
600x600 pixels (sem deformar a imagem).
(5) Abre o programa IFS Lab 9 e no menu Outline selecciona Load Outline e escolhe
a imagem que gravaste no passo anterior. (Se for necessário fazer alguns ajustes
na imagem, existem as ferramentas lápis e borracha na régua de ferramentas
ou no mesmo menu.)
(6) Novamente no menu Outline clica em Edit Collage. Isso fará aparecer uma
redução da imagem inicial, dentro de uma caixa rectangular cujos vértices
estão denominados por O, X, Y e Z.
(7) Cada um dos vértices tem uma função:
O - colocando o cursor aqui com o botão do rato premido permite mover a
imagem. O mesmo também se pode fazer com o cursor situado em qualquer
outra parte do écran.
X - colocando o cursor aqui com o botão do rato premido permite reescalar
e rodar as linhas horizontais da caixa rectangular. Passando X para o outro
lado de O, consegue-se uma simetria segundo o eixo OY.
Y - colocando o cursor aqui com o botão do rato premido permite reescalar e
rodar as linhas verticais da caixa rectangular. Passando Y para o outro lado
de O, consegue-se uma simetria segundo o eixo OX.

9Disponı́vel em http://www.nzeldes.com/Fractals/Fractals core.htm.


248 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Z - colocando o cursor aqui com o botão do rato premido permite reduzir ou


ampliar a imagem de forma proporcional nas duas dimensões e rodá-la em
torno de O.

Utiliza estes comandos para obteres uma contracção da imagem inicial.


Coloca a redução e coloca-a por cima da imagem inicial onde as duas formas
se assemelhem.
(8) No menu Collage, clica em Add Piece para criar uma nova redução da imagem
inicial.
(9) Repete os passos 7 e 8 as vezes necessárias até obteres um conjunto de imagens
da folha inicial que a cubram da forma o mais aproximada possı́vel (deixando
o mı́nimo de partes por cobrir e ultrapassando o mı́nimo possı́vel as suas
fronteiras).
No menu Collage há ainda as ferramentas:
Duplicate Piece - permite duplicar automaticamente uma das contracções.
Select Next Piece - permite percorrer as várias contracções existentes para
proceder a ajustamentos.
Delete Piece - apaga a contracção seleccionada no momento.

(10) No menu File, executa Save para guardar o SFI que construı́ste.
(11) No menu Attractor, selecciona uma das opções Preview e deixa passar algum
tempo até a imagem estar suficientemente preenchida. Para parar, executa
Stop no menu Attractor.
(12) Para regressar ao SFI de forma a proceder a alterações escolhe Return to
Collage no menu Attractor.

Observações:

• A resolução desta actividade pressupõe que os alunos possuam alguma destreza


no manuseamento e processamento de imagens digitais.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 249

Sugestões:

• Se os alunos não possuirem a destreza necessária no manuseamento e proces-


samento de imagens digitais, esta actividade poderá ser um bom mote para
um trabalho interdisciplinar entre a Matemática e a Informática. A recolha de
folhas de várias espécies poderá também originar uma pequena investigação no
âmbito da disciplina de Biologia, onde as caracterı́sticas das diversas espécies
de plantas/árvores poderão ser abordadas.
• O software IFS Lab não permite obter boas impressões dos resultados obti-
dos. Uma forma de o conseguir é através de um Print Screen editado noutro
programa de tratamento de imagem.
• Outra possibilidade de ferramenta para trabalhar o Teorema da Colagem é
o programa IFS Construction Kit. Não efectua as reduções imediatamente a
partir de uma imagem dada, mas pode fazer-se o seguinte:
– No menu Design, escolher Load Picture e seleccionar a imagem digital da
folha. Tem que estar em formato bmp, gif ou jpg. Mas o ideal, para outro
passo mais adiante é que esteja em formato gif com o fundo transparente.
– No menu Design, escolher Draw Initial Polygon e, com o rato contornar
a folha da forma o mais exacta possı́vel.
– Na janela IFS colocar o número de contracções que forem necessárias para
cobrir a folha e construir uma “colagem” adequada, com a ajuda do rato
na janela Design. Para conseguir as rotações, o melhor será colocar os
devidos valores na janela IFS devendo, para isso clicar em Scale/Rotation
Form no menu Code.
– Depois da “colagem” terminada, seleccionar no menu Draw a opção De-
terministic, de seguida a opção Add Picture - From File escolhendo a
imagem inicial da folha (em formato gif com o fundo transparente) e
ainda a opção Scale to Design Window.
250 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

– De seguida proceder à iteração do IFS clicando sucessivas vezes CTRL+D


(Draw -Draw ).
– No menu File, há as opções Save Fractal Picture para guardar a imagem
do resultado das iterações efectuadas, Save Design Picture para guardar
a imagem da “colagem”, Save Initial Polygon para guardar o polı́gono
que foi desenhado como contorno da folha e ainda Save Current IFS para
guardar todos os parâmetros deste SFI de modo a poder utilizá-lo mais
tarde, se assim se pretender.
• Os parâmetros obtidos no IFS Construction Kit podem ser copiados para o
applet Deterministic IFS (disponı́vel em http://classes.yale.edu/fractals
/Software/detifs.html) onde há a possibilidade de visualizar, na construção de
cada iterada, a colocação da imagem da iteração anterior por cada uma das
contracções. Neste programa a iteração terá que iniciar-se com outra imagem
que não a da folha inicial; mas isso não importa, já que o fractal obtido não
depende do objecto inicial.F
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 251

Proposta 12 (O Método Heurı́stico).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Identificar num fractal, as várias contracções dele mesmo que o compõem;


• Determinar a dimensão fractal de fractais com auto-semelhança exacta.

Actividade:

(1) Sabendo que:


Um fractal com auto-semelhança exacta que é composto por N reduções de si mesmo
à razão de semelhança r, tem dimensão fractal

log N
D= ,
1
log
r
determina a dimensão destes fractais:
(a) (b)

(c) (d)
252 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(e)

(2) Quando o fractal tem auto-semelhança exacta, mas os factores de redução não
são todos iguais para todas as contracções que o compõem, aplica-se uma ge-
neralização da fórmula anterior - a Equação de Moran:
Um fractal com auto-semelhança exacta definido por um SFI, constituı́do por N
reduções w1 , w2 , · · · , wN com factores de redução s1 , s2 , · · · , sN respectivamente,
tem dimensão fractal D, tal que

|s1 |D + |s2 |D + · · · + |sN |D = 1.

Utiliza a Equação de Moran para determinar a dimensão fractal de cada


um dos seguintes fractais:
(a) (b)
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 253

(c) (d)

(e)

(3) Com o programa IFS Construction Kit constrói dois fractais com dimensão
log 5 log 12
e dois fractais com dimensão . (Sugestão: Utiliza a opção Examples
log 3 log 5
- Box Fractals do menú Design.)

Observações:

• Desde a Proposta 2 que se pede aos alunos que calculem a dimensão de fractais
com auto-semelhança exacta; a actividade agora proposta pretende consolidar
esse método e generalizá-lo a fractais com auto-semelhança exacta em que os
factores de contracção das várias contracções que o compõem não são todos
iguais.
• Na questão 1e pode aproveitar-se para se comparar a dimensão fractal deter-
minada com a dimensão topológica do objecto. Por norma, um fractal tem
dimensão fractal superior à sua dimensão topológica. Neste caso, a dimensão
fractal é 2 e a topológica é 1. Eventualmente, os alunos poderão dizer que a
dimensão topológica deste fractal é 3, por se tratar de um objecto definido em
254 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

R3 mas, na verdade, a intersecção de qualquer vizinhança “pequena” de qual-


quer ponto do tetraedro de Sierpinski com o fractal é um conjunto de pontos
isolados; logo, a dimensão topológica do tetraedro de Sierpinski é 1.
• O professor pode aproveitar a oportunidade para revelar, ou relembrar aos alu-
nos, que há várias definições de dimensão fractal. Os valores calculados nesta
proposta coincidem com os valores da Dimensão de Hausdorff e da Dimensão
de Contagem de Caixas se calculada para os mesmos fractais. Isso só acontece
porque têm auto-semelhança exacta e as várias reduções de si mesmo não se
sobrepõem.
• Há que evidenciar o facto de a equação de Moran ter uma única solução (visto
que 0 < si < 1 para i ∈ {1, 2, . . . , N }).
• Esta proposta só poderá ser resolvida em toda a sua plenitude, tocando em
todas as variantes possı́veis de resolução, com os alunos do 12o ano. Os alunos
dos 10o e do 11o anos poderão resolver todas as alı́neas graficamente. Não se
aconselha esta proposta para os alunos do 3o ciclo.
• Há aqui mais uma oportunidade de observar dois fractais com a mesma di-
mensão: os das questões 2c e 2d.
• As questões 2b, 2c e 2d podem resolver-se usando uma mudança de variável,
ou então graficamente; a questão 2e, ao nı́vel do ensino secundário, só pode
resolver-se graficamente (ver Exemplo 45 no Capı́tulo 2, página 132).
• No âmbito da questão 3 pode falar-se sobre o facto de no plano ser possı́vel
construir um fractal totalmente desconexo com dimensão s, sendo s qualquer
valor do intervalo [0,2] (ver Proposição 33, página 105).

Sugestões:

• Alguns dos fractais da questão 1 podem ser construı́dos facilmente no IFS


Construction Kit indo ao menu Design e escolhendo Examples - Box Fractals;
de seguida escolher o tamanho pretendido, retirar as caixas adequadas a cada
caso, “clicar” em Create IFS e iterar diversas vezes. Para obter o fractal todo
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 255

a preto, basta alterar a cor de cada contracção na janela IFS, “clicando” em


cima do respectivo quadrado à esquerda dos parâmetros.F
256 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 13 (Ordenar pela Dimensão).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Associar o conceito de dimensão fractal com a “rugosidade” do objecto e a


densidade do espaço que ele ocupa.

Actividade:

(1) Apresentam-se 10 fractais e 10 valores de dimensão fractal. Efectua as corres-


pondências correctas.

A B

C D
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 257

E F

G H

0, 631 1, 262 1 1, 404 1, 893 1, 292 1, 661 1, 760

Observações:

• Antes da realização desta proposta pode começar-se pelas questões 3e e 4 da


Proposta 3, página 201. Nesse exemplo é fácil visualizar que a rugosidade e a
densidade de um fractal aumentam com a sua dimensão.

Sugestões:

• Com alunos mais novos pode imprimir-se cada um dos fractais em folhas se-
paradas e pedir-lhes que os ordenem no quadro por ordem da sua dimensão,
sem as associar a valores.F
258 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

10
Proposta 14 (Costa Fractal).

Objectivos: No final desta actividade o aluno deve ser capaz de:

• Determinar a dimensão de uma linha fractal usando o método da contagem de


passos ou o da contagem de caixas;
• Construir uma curva fractal aleatória.

Actividade: A costa marı́tima dos continentes apresenta também caracterı́sticas frac-


tais. O seu comprimento depende da unidade escolhida para o medir. À medida
que o observador se aproxima vai encontrando cada vez mais detalhes. Percorrê-la de
carro junto ao mar, ou a pé pela praia, corresponderá a comprimentos diferentes para
percursos com o mesmo ponto de partida e de chegada. Por vezes encontram-se em
enciclopédias diferentes, valores não coincidentes para o comprimento da mesma costa
marı́tima ou da mesma fronteira entre dois paı́ses. Isso deve-se ao facto de terem sido
usados ”passos”de tamanhos diferentes para medir a mesma linha que, sendo muito
recortada, é sempre medida segundo um determinado grau de aproximação.

(1) Quanto mede a nossa costa?


(a) Tira fotocópia da costa marı́tima portuguesa utilizando o mapa mais por-
menorizado que encontrares.
(b) Anota a escala de representação do mapa e decide entre que pontos da
costa vais efectuar a medição.
(c) Utiliza várias unidades de medida (10 cm, 5 cm, 1 cm... por exemplo),
cada vez mais pequenas, e com um compasso verifica, para cada uma
delas, quantos “passos” são necessárias para percorrer a orla marı́tima

10Adaptado de http://polymer.bu.edu/java/java/coastline/coastline.html e de

http://argento.bu.edu/java/java/coastline/chap1/node12.html
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 259

portuguesa. Efectua em cada caso a conversão para a medida real. Utiliza


a tabela que se segue para organização dos dados.
Unidade Escolhida Número de passos Comprimento Comprimento
(L) (N) (L×N) Real

(d) Que concluis? Consegues prever de que valor se aproxima N×L à medida
que L se aproxima de zero? Que representa esse valor?
(2) Qual é a dimensão da nossa costa?
Considerando que a linha da nossa costa marı́tima tem uma estrutura fractal,
não se tratará de um fractal com auto-semelhança exacta, mas apenas aproxi-
mada. Para determinar a dimensão fractal deste tipo de fractais não se pode
aplicar a fórmula utilizada na Proposta 12, que só é válida para os fractais com
auto-semelhança exacta. Um dos processos para o fazer é utilizar os dados já
recolhidos na questão 1c e representá-los graficamente.
(a) Coloca um sistema de eixos coordenados e os valores adequados no papel
de escala logarı́tmica do Anexo 12.
(b) Representa no referencial construı́do na questão anterior o número de
passos em função da unidade escolhida.
(c) Os pontos representados no gráfico devem estar aproximadamente alinha-
dos segundo uma linha recta. Desenha a recta que melhor se adapta a
esse conjunto de pontos.
(d) A dimensão fractal da costa é o simétrico do declive da recta desenhada
na questão anterior. Determina-a. (Atenção: o declive da recta deve
260 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

ser calculado usando medições com uma régua e não com base na escala
logarı́tmica.)
(3) Outro processo muito utilizado para determinar a dimensão fractal de uma
curva é o método da contagem de caixas, que determina a Dimensão de Caixas.
(a) Desenha na fotocópia do mapa da costa marı́tima portuguesa, um qua-
drado que a contenha.(A este quadrado chamamos “caixa”.)
(b) Divide o quadrado grande em quadrados iguais de lado δ, e conta quantos
deles (Nδ ) contêm um troço de costa. Repete o processo várias vezes com
δ cada vez menor e preenche a tabela que se segue. (Sugestão: em cada
passo utiliza quadrados com o lado igual a metade do lado dos quadrados
do passo anterior.)
Lado da Caixa Número de caixas que

(em cm) contêm o contorno − log δ log Nδ


(δ) (Nδ )

(c) Representa agora graficamente log Nδ em função de − log δ.


(d) No gráfico anterior obtiveste um conjunto de pontos. Procura a recta de
pontos que melhor se ajusta a esse conjunto e determina o seu declive. O
declive dessa recta é uma estimativa da dimensão de caixas da costa.
(4) Compara os dois valores que obtiveste para a dimensão da linha. Há diferenças
significativas?
(5) Realiza o mesmo processo com outros mapas de outras costas marı́timas.
(a) Qual te parece, à primeira vista, mais “enrugada”?
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 261

(b) Compara as dimensões de cada uma delas e tira conclusões.


(6) Podes tu mesmo criar uma costa usando um dos seguintes métodos:
Método 1: Utiliza o applet disponı́vel em
http://argento.bu.edu/java/java/coastline/coastlineapplet.html.
Método 2: Com os teus colegas, seguindo as instruções apresentadas a seguir:
Material necessário: corda (com cerca de 30 metros de comprimento), um
dado, uma moeda, uma máquina de fotografias instantâneas e um espaço am-
plo (interior ou ao ar livre).
Passo 1. Seleccionam-se dois alunos da turma, um para lançar o dado e outro
para lançar a moeda quando for necessário.
Passo 2. Dois alunos (aluno no 1 e aluno no 2), ficam em pé a cerca de 6 metros
de distância um do outro. O aluno no 1 segura numa das pontas da corda
e o aluno no 2 puxa a corda do modo a formar um segmento de recta,
mantendo o que sobra da corda enrolado a seus pés.
Passo 3. Na direcção perpendicular à corda esticada, define-se qual dos sen-
tidos é o positivo e qual é o negativo e associa-se cada um deles a “cara”
e a “coroa”.
Passo 4. O aluno no 3 agarra na corda aproximadamente no seu ponto médio.
Passo 5. Lança-se a moeda e o dado. O aluno no 3 avança, perpendicular-
mente à corda, o número de passos determinados pelo dado, no sentido
sorteado pela moeda. Os passos devem ser pequeninos, encostando o cal-
canhar à ponta do outro pé. O aluno no 2 deve deixar a corda correr o
necessário para o deslocamento do aluno no 3.
Passo 6. Agora os alunos no 4 e no 5 colocam-se nos pontos médios dos dois
segmentos formados pela corda.
Passo 7. Repete-se o Passo 5 para o aluno no 4 e de seguida repete-se o Passo
5 para o aluno no 5.
262 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Passo 8. Continuar este processo de aleatoriamente flectir a corda no ponto


médio de cada um dos segmentos que a compõem, até não haver mais
alunos ou a corda ter sido toda usada.
Passo 9. Fotografar a linha costeira resultante, de preferência de cima.

Os fractais podem dividir-se em dois grupos: os determinı́sticos e os aleatórios.


Os fractais naturais, como é o caso das linhas costeiras, enquadram-se, geralmente,
no grupo dos fractais aleatórios. Dificilmente um processo natural acontece de forma
determinista.
A forma de uma linha costeira deve-se essencialmente à erosão, um processo bas-
tante aleatório devido a diversos factores, como são as correntes marı́timas, as condições
climatéricas e a composição do solo, e que nesta actividade foi modelada pelo lançamento
do dado e da moeda.
Observações:

• A realização destas actividades com mapas apresenta algumas dificuldades. O


mapa escolhido tem muita influência nos resultados e, por vezes, há dificuldade
em decidir onde parar, por exemplo no caso dos rios, sobretudo quando se
medem os passos com o compasso.
• Esta questão será melhor realizada por alunos do 12o ano com conhecimento
do conceito de logaritmo. No entanto, alunos a partir do 9o ano poderão ser
capazes de a levar a cabo, com algumas ajudas por parte do professor.
• Na questão 1a há que ter em atenção a escala, caso se amplie ou se reduza
a figura inicial. O ideal é trabalhar com o tamanho original do mapa para
evitar confusões. Isto é importante apenas para a obtenção de valores, em
quilómetros por exemplo, para o comprimento da nossa costa marı́tima. Se o
objectivo fosse apenas o de determinar a sua dimensão, este cuidado já não
seria necessário.
• Na questão 2 o professor deve explicar aos alunos como usar e porque se utiliza
este tipo de escala.
5. PROPOSTAS DE ACTIVIDADES PARA A AULA DE MATEMÁTICA 263

• O processo utilizado na questão 3 será melhor entendido pelos alunos do 12o


ano depois de adquirirem o conceito de logaritmo, contudo os alunos mais
novos poderão desenvolver todo o processo de cálculo da dimensão de caixas,
utilizando uma calculadora cientı́fica, sendo-lhes dada apenas a noção de loga-
ritmo que poderão utilizar como ferramenta, mesmo sem compreenderem todas
as suas propriedades. Outra possibilidade é a de usarem o papel gráfico com
escala logarı́tmica, não tendo que utilizar as duas últimas colunas da tabela.
• As questões 2d e 3d serão melhor adequadas a alunos a partir do 10o Ano que
já terão conhecimentos suficientes para as compreenderem. O professor terá
que explicar ou relembrar o conceito de recta de regressão linear e como se
determina o declive da recta.
• Se vários alunos ou grupos de alunos resolverem separadamente esta actividade
poderá dar-se o caso de os valores por eles obtidos para a dimensão da costa
no final das questões 2d e 3d sejam diferentes, mesmo que utilizem o mesmo
mapa. Isso poderá dever-se a vários factores:
- Escolha de uma gama diferente para os valores de δ;
- Um alinhamento diferente da linha da costa com a grelha de caixas;
- Ajustamento diferente da recta de regressão linear se esta for ajustada ma-
nualmente.
• As questões 2 e 3 podem ser resolvidas cada uma por metade dos alunos da
turma que depois apresentam aos colegas o processo de resolução e os resulta-
dos obtidos. Depois disso podem, em conjunto, responder à questão 4.
• Na questão 6 deve adoptar-se o método de construção da costa com a corda
no caso de turmas de alunos mais jovens e usar-se o applet com os alunos do
ensino secundário. O applet usa o mesmo algoritmo que o método da corda
para construir a costa; permite medi-la manualmente ou automaticamente, em
caixas ou em passos, elabora uma tabela com os dados da medição, representa-
os graficamente em vários tipos de escalas e determina a dimensão da linhas
264 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

costeira criada. Permite que os alunos sigam os processos das questões 2 e


3 de uma forma rápida e muito apelativa. Imprimindo várias costas podem
mais rapidamente ter dados para responder à questão 5. Este applet é uma boa
ferramenta para o professor ver com os alunos as consequências de representar
os mesmos dados em papel gráfico com diferentes tipos de escalas.

Sugestões:

• A questão 3 também pode ser resolvida recorrendo à utilização de papel gráfico


de escala logarı́tmica. Nesse caso, na questão 3c representar-se-ão os dados
das duas primeiras colunas da tabela da questão 3b e o declive da recta de
regressão linear será o simétrico do pretendido na questão 3d.
• A questão 6 também pode ser realizada utilizando um painel de cortiça,
elásticos e alfinetes, seguindo o mesmo processo que está indicado para re-
alizar com a corda.
• A forma mais prática de resolver esta actividade é recorrer à calculadora gráfica
ou a uma folha de cálculo onde se possa efectuar automaticamente a repre-
sentação gráfica dos dados introduzidos, a da recta de regressão linear e a
determinação do seu declive. Neste caso, o tempo de resolução da actividade
será mais curto, o trabalho será menos maçador, todos os conceitos da pro-
posta inicial serão aplicados, no entanto os alunos perdem uma oportunidade
de ver com mais detalhe todo o raciocı́nio necessário para a representação de
uma recta de regressão linear e a determinação do seu declive.
• Uma das questões que se pode colocar aos alunos para uma investigação é:
qual é a dimensão da linha obtida em cada uma das iterações do processo de
construção da costa? Será que a dimensão varia ao longo desse processo?
• Outro applet para construção de costas está disponı́vel em
http://www.math.fau.edu/MLogan/Pattern Exploration
/Coastlines/CLdirections.html.F
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 265

6. Propostas para a disciplina de Área de Projecto

A Área de Projecto é uma área curricular não disciplinar inscrita no horário lectivo
dos cursos cientı́fico-humanı́sticos no 12o ano de escolaridade, de frequência obrigatória,
com uma carga horária semanal de 2 unidades lectivas de 90 minutos cada.
Segundo o documento de orientação elaborado pelo Ministério de Educação para a
disciplina de Área de Projecto do 12o Ano dos Cursos Cientı́fico-Humanı́sticos, a Área
de Projecto é de “natureza interdisciplinar e transdisciplinar, visando a realização de
projectos concretos por parte dos alunos, com o fim de desenvolver nestes uma visão
integradora do saber, promovendo a sua orientação escolar e profissional e facilitando
a sua aproximação ao mundo do trabalho.”[17, pág. 3] Deve ser “um espaço de con-
fluência e integração de saberes e competências adquiridas ao longo do curso, em torno
do desenvolvimento de metodologias de estudo, investigação e trabalho de grupo.”[17,
pág. 5]
O tópico da Geometria Fractal poderá ser do interesse dos alunos e pode ser ex-
plorado de variadı́ssimas formas, procurando-se as relações entre os fractais e as mais
diversas áreas do saber em geral e da ciência em particular. Visto serem inúmeras as
aplicações práticas da geometria fractal, apresentam-se de seguida apenas algumas das
possibilidades de exploração deste tema que deverão ser precedidas por actividades que
permitam ao aluno consolidar o conceito de fractal bem como construir alguns fractais
e analisar as suas caracterı́sticas.
Não menos importante será o trabalho do professor que dirigir uma Área de Pro-
jecto sobre este tema que deverá ter os conhecimentos e a sensibilidade necessários para
reconhecer a geometria fractal nas suas diversas aplicações e para poder acompanhar
os alunos nas suas investigações. A colaboração com os professores de outras discipli-
nas (Biologia, Fı́sica, Informática, etc) poderá ser fulcral para um acompanhamento
integral aos alunos e para que se possam levar a cabo algumas actividades de ı́ndole la-
boratorial e de interesse relevante. Neste tipo de actividades, os alunos poderão dar-se
266 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

conta da necessidade e da importância da criação de equipas de trabalho multidiscipli-


nares que existe hoje em dia, de forma cada vez mais patente, quer nas universidades,
quer nas empresas.
As metodologias de estudo e de trabalho que podem ser desenvolvidas ao traba-
lhar o tema da geometria fractal podem ser muito variadas. O trabalho de grupo é
essencial para realizar algumas tarefas mais complexas ou trabalhosas, a pesquisa na
internet ou em livros é fundamental (saliente-se aqui a importância do conhecimento
de lı́nguas estrangeiras, nomeadamente do Inglês) e a investigação, quer sobre carac-
terı́sticas próprias dos fractais, quer sobre conexões entre eles e outros temas, pode
ser uma fonte de enriquecimento para os alunos. Estes métodos de trabalho são po-
tenciadores do “trabalho cooperativo alicerçado na exploração e aplicação de processos
mentais complexos, promotores da confiança em si e nos outros, do gosto pela inves-
tigação e pela descoberta e geradores de autonomia intelectual.”[17, pág. 5] “Trata-se
de uma área em que os alunos mobilizam competências desenvolvidas no contexto dos
conteúdos das disciplinas do seu plano curricular para resolverem problemas, para es-
tudarem e compreenderem fenómenos do mundo que os rodeia, elaborando produtos
concretos de natureza diversa.”[17, pág. 7]
A Área de Projecto, segundo as orientações do Ministério da Educação constitui
“um espaço e um tempo curriculares privilegiados para que, sem se substituir ao tra-
balho desenvolvido nas diferentes disciplinas, os alunos possam relacionar-se com o
conhecimento através de realizações concretas: relatórios, ensaios, objectos tridimen-
sionais diversos, programas informáticos, filmes em suporte vı́deo ou DVD, páginas na
internet, trabalhos de suporte multimédia, etc. Neste sentido, os projectos a desen-
volver devem, sobretudo, basear-se em experiências a que não podem deixar de estar
associadas a observação sistemática, a formulação e a testagem de hipóteses, assim
como a análise e a interpretação de factos e fenómenos do mundo real.”[17, pág. 5
e 6] Tudo isto e provavelmente mais, é possı́vel acontecer com o estudo dos fractais,
pelas suas caracterı́sticas e pelas suas aplicações, proporcionando o desenvolvimento de
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 267

“competências que são próprias do pensamento e do trabalho cientı́fico e técnico”[17,


pág. 6].
Também existe no currı́culo do ensino básico a disciplina de Área de Projecto cujo
objectivo central é envolver os alunos na concepção, realização e avaliação de projectos,
permitindo-lhe articular saberes de diversas áreas curriculares em torno de problemas
ou temas de pesquisa ou de intervenção. Há tempos lectivos destinados para o efeito
nos 2o e 3o ciclos. No 1o ciclo, o trabalho da Área de Projecto deve ser integrado
nas actividades regulares da turma e nos trabalhos de casa. Embora a componente
teórica do estudo dos fractais tenha que ficar muito mais limitada no ensino básico,
é possı́vel desenvolver com os alunos pequenos projectos relacionados com os fractais.
Por exemplo, a construção de um modelo no plano ou no espaço de um fractal, pode
envolver diversos conceitos matemáticos e metodologias de estudo e de trabalho. O
conceito de dimensão pode ser abordado e a utilização de software para construção
de fractais é, não só possı́vel, como apelativa para os alunos. Uma pequena pesquisa
sobre as aplicações dos fractais é outra actividade passı́vel de ser desenvolvida com
estes alunos.
O objectivo da Área de Projecto, tanto no ensino básico como no ensino secundário,
é que os alunos se proponham a estudar, com certo grau de aprofundamento, um tema
que seja do seu interesse e que, de preferência, possa ter importância para a sua profissão
futura. Como o tema dos fractais é totalmente desconhecido da maior parte dos alunos,
a proposta para o estudo deste assunto terá que partir do professor que poderá começar
por uma apresentação do que é a geometria fractal e de quais são as suas aplicações.
Apresentam-se, a seguir, algumas sugestões de actividades a desenvolver no âmbito
da Área de Projecto. Algumas das actividades apresentadas atrás poderão também
estar melhor integradas no âmbito do trabalho de Área de Projecto, quer pelo tempo
necessário à sua realização, quer pela conexão que revelam entre conceitos matemáticos
e conteúdos de outras disciplinas. É o caso das Propostas números 1, 4, 7, 9, 10, 11 e
14.
268 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

O sentido que fará a realização de cada uma delas dependerá do interesse manifes-
tado pelos alunos e dos seus objectivos quando se propuseram a estudar os fractais.
Em geral, as actividades estão pensadas para os alunos do 12o ano, mas poderão ser
adaptadas para alunos mais jovens. O facto de se propor estas actividades para a Área
de Projecto não quer dizer que não possam ser desenvolvidas no âmbito de outra dis-
ciplina; e as actividades apresentadas desde o inı́cio do capı́tulo até aqui e que foram
essencialmente pensadas para a disciplina de Matemática poderão igualmente ser tra-
balhadas na disciplina de Área de Projecto. Tudo depende dos objectivos estabelecidos
pelos alunos e pelos professores.

6.1. Os fractais na Arte.


As próximas propostas pretendem relacionar os fractais com as diversas formas de arte
- pintura, escultura, arquitectura, música e fotografia são algumas das possibilidades.
Desde a análise de objectos de arte até à construção de modelos tridimensionais ou à
realização de pinturas, muitas são as possibilidades de trabalho com os alunos, desde
os do primeiro ciclo até aos do ensino secundário. A análise dos objectos pode consistir
apenas na busca e reconhecimento de estruturas fractais nele patentes, mas poderá ser
mais completa se se efectuarem medições nos padrões encontrados e se utilizarem os
valores determinados para criar modelos ou calcular a dimensão fractal da estrutura
em observação.

11
Proposta 15 (Arte com fractais).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se despertar a atenção dos alunos para a
aplicação da geometria fractal na arte. A partir de alguns exemplos pretende-se que

11Adaptado de: Fractais no Ensino Secundário - Ana Paula Canavarro e Ou-

tros, APM; Projecto Final de Conclusão De Curso de Taı́s Alves Moreira Barbariz

- http://www.ime.uerj.br/∼progerio/monografia/1999/atividade2.html; Fractals in the arts -

http://classes.yale.edu/99-00/math190a/ArtFrac.html e OLIVÉ, Oriol. Els Fractals - Introducció

pràctica als fractals IFS.


6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 269

eles olhem para os objectos de arte de um novo prisma e que eles próprios encontrem
outras ocorrências de fractais na arte.

Actividade: Observa as figuras seguintes com alguns exemplos de arte.

Toucador Bamana
Imagem em

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/AfricanArt/Headress.html

Trabalho Tuareg em pele


Imagem em

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/

AfricanArt/Tuareg.html

Trabalho do artista japonês Hokusai


Imagem em

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/

Hokusai/Hokusai.html
270 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

O Rosto da Guerra de Salvador


Dali - 1940
Imagem em

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/Dali/Dali1.html

Mandala - Sı́mbolo Hindu ou Budista


que representa o universo.
Imagem em

http://classes.yale.edu/fractals/Panorama/Art/

Mandalas/Mandala.gif

Mosaico fractal de Robert Fathauer.


Imagem em

http://members.cox.net/fractalenc/fr6g6s.577m2.html
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 271

Joalharia com fractais.


Imagem em

http://www.allegria.com.au/jewellery.html

Consegues reconhecer estruturas fractais nestes trabalhos? Faz uma pesquisa e


procura encontrar evidências de formas fractais em diversos objectos artı́sticos.F
272 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

12
Proposta 16 (Fractais de Tinta).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se levar os alunos a descobrir padrões


com caracterı́sticas fractais em trabalhos efectuados com tinta e, a partir deles, ana-
lisar e sistematizar os processos de produção para conseguir padrões de diversos tipos.

Actividade:

É fácil construir padrões fractais de


tinta viscosa.
(Imagem retirada de

http://classes.yale.edu/fractals/Labs/

FingerPaintLab/FPLColor.html)

(1) Coloca um pouco de tinta viscosa (tinta de óleo, por exemplo) num pedaço de
papel grosso sobre o tampo de uma mesa. Cobre o papel com outro pedaço de
papel (ou com um acetato de forma a poder projectar uma cópia do padrão).
Aperta as duas folhas e espalha a tinta pressionando a folha de cima contra a
de baixo. Em seguida separa as folhas.
Enquanto as folhas se separam, o ar invade a tinta seguindo de frentes
instáveis para pequenas perturbações.
Observa o padrão que obtiveste. Poderás considerá-lo um fractal?
(2) Investiga como se altera o padrão ramificado consoante:
- a viscosidade da tinta;
- a grossura ou qualidade do papel usado;
- a velocidade com que se separam as folhas;
- a pressão que é aplicada às folhas de papel.

12Adaptado de: http://classes.yale.edu/99-00/math190a/ArtFracNonRep1.html e de

http://classes.yale.edu/fractals/Labs/FingerPaintLab/FPLSample.html
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 273

Experimenta várias vezes e observa as alterações do padrão.


(3) Experimenta também rodando a folha de cima depois de a pressionar contra
a outra e antes de as separar.
(4) Inventa outras formas de variar os padrões.
(5) Aponta nas figuras que criaste caracterı́sticas próprias dos fractais.

Sugestões:

• Com os alunos do ensino secundário poderá fazer sentido e ser interessante


ver, com a ajuda do professor de fı́sica, como é o deslocamento do ar entre
as duas folhas e que tipo de fenómenos fı́sicos ocorrem em cada processo de
construção destes fractais.F
274 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 17 (Fractais na Arquitectura).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se que os alunos observem as formas


arquitectónicas de edifı́cios com um olhar diferente, crı́tico, que lhes permita distinguir
entre formas euclidianas simples e estruturas que, sendo eventualmente constituı́das
por formas maioritariamente euclidianas, as tenham presentes em diversas escalas, re-
velando uma organização fractal do todo.

Actividade:

Projecto para um bar (Café Fractal ) em Vila do Conde.


(Imagem retirada de http://arquitectura.pt/forum/f10/fractal-bar-alvaro-leite-siza-2369.html).

(1) Investiga que aplicações pode ter a geometria fractal na Arquitectura. Aqui
estão alguns tópicos para a tua pesquisa:
(a) Catedrais da Europa;
(b) Catedrais da Índia;
(c) Arquitectura Africana;
(d) Arquitectura Moderna.
Com os elementos recolhidos por ti e pelos teus colegas, elaborem uma mostra
dos mesmos.
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 275

Sugestões:

• Os alunos poderão também construir uma maquette do seu próprio “edifı́cio


fractal” e/ou desenhá-lo (em perspectiva ou por vistas). O planeamento e o de-
senvolvimento desta actividade poderá ocasionar discussões acerca da relação
entre áreas e volumes de figuras semelhantes.
• A questão da presença evidente da geometria fractal na arquitectura de po-
voações africanas pode levantar a discussão: Porque é que povos com poucos ou
nenhuns conhecimentos formais de Matemática escolhem a geometria fractal
para organizarem o seu espaço? Será que retiram essa percepção da Natureza
com a qual vivem em tão estreita ligação?F
276 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

13
Proposta 18 (Fractais em Papel).

Objectivos: Nesta actividade pretende-se que os alunos construam com papel um


modelo de um fractal contido no espaço tridimensional, através de corte e dobragem e
que, de seguida, analisem o modelo construı́do, efectuando algumas medições e estu-
dando os padrões numéricos adjacentes.

Actividade:
Com alguma habilidade para cortar e dobrar, podes construir um fractal em papel.

Material necessário: Cópia do esquema de construção X−acto


Cartolina colorida A4 Régua
Cola

Cubos Contrários Quartil Central Triângulo de Sierpinski

(1) Observa as fotografias dos modelos de fractais e escolhe o teu favorito. De


seguida constrói-o seguindo o respectivo esquema de construção (ver Anexos
13, 14 e 15) e as indicações fornecidas.
(2) Observa o fractal que construı́ste e responde às seguintes questões:
(a) Explica a regra de construção das sucessivas iterações, caracterizando os
elementos constituintes de cada uma.

13Adaptado de: Fractais no Ensino Secundário - Ana Paula Canavarro e Outros,

APM e de Projecto Final de Conclusão De Curso de Taı́s Alves Moreira Barbariz -

http://www.ime.uerj.br/∼progerio/monografia/1999/atividade2.html
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 277

(b) Qual é o número de elementos acrescentados em cada iteração? Descobre


a fórmula geradora da sequência de elementos novos em cada iteração.
(c) Tenta descobrir as sequências que traduzem as dimensões dos elementos.
(d) Que outras sequências consegues construir a partir do teu fractal?
(e) Consegues perceber para que valor tende cada uma dessas sequências?

Sugestões:

• Com alunos do ensino secundário poderá ser possı́vel partir desta actividade
para um projecto mais ambicioso, de construção de um modelo tridimensional
deste tipo, representando mais iterações. O fractal terá de ser maior, os alunos
terão de construir eles próprios o molde para cortar e dobrar e os materiais a
utilizar provavelmente terão que ser outros.F
278 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 19 (Construção de modelos no Plano e no Espaço).

Objectivos: Nesta proposta apresentam-se algumas sugestões para construção de


modelos de fractais no espaço tridimensional. Propõe-se que este tipo de actividade
seja realizada com os alunos organizados em grupos. A construção de modelos de frac-
tais pode constituir, por si só, um trabalho de projecto, sobretudo para os alunos do
ensino básico. Envolve uma série de cálculos sobre os elementos necessários a cons-
truir e a quantidade e o tipo de materiais a adquirir; obriga os alunos à delineação de
uma estratégia para a distribuição de tarefas e exige que utilizem diversas formas de
pesquisa e de métodos de trabalho.

Actividade:
Escolhe um dos seguintes projectos para realizares com os teus colegas.

Construção do Tetraedro de Sierpinski


com tetraedros de papel (ver Proposta
5, página 212).

Imagem retirada de

http://www.public.asu.edu/ starlite

Construção do Dragão de
Harter-Heighway com dobragem de
papel.
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 279

Construção da Esponja de Menger


com blocos de madeira.

Imagem retirada de

http://www.sonoma.edu/math/faculty/falbo/sierp3.jpg

Construção de fractais tridimensionais


com dobragens.

Consultar a Proposta 18 e o livro Fractal Cuts[18]

(de Diego Uribe, edição de Tarquin Publications

distribuı́do em Portugal pela Editora Replicação)

para mais modelos.

Construção de árvores fractais, com


palhinhas, no plano ou no espaço.

Escolhido o projecto, o grupo deve pesquisar sobre o fractal a construir para conhe-
cer o processo de o fazer, de seguida determinar que materiais usar e as quantidades de
cada um necessárias e, por fim, distribuir as tarefas pelos vários elementos do grupo. É
desejável que se comece com um esboço do resultado que se pretende e com os cálculos
das dimensões dos vários elementos que irão constituir a estrutura a construir. F
280 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 20 (Música Fractal).

Objectivos: Pretende-se com esta actividade que os alunos tomem conhecimento


da aplicação da geometria fractal na música e que, se possı́vel, criem uma melodia
fractal.

Actividade:
“Depois de três minutos de “Caos Organizado” tocado numa estação de rádio britânica
seguiu-se uma torrente de chamadas telefónicas de ouvintes. Queriam saber mais acerca
do que tinham ouvido. Para alguns tinha sido uma experiência assustadora. E depois
disso, diversos fãs continuam a escrever ao compositor - Phil Thompson - para des-
crever o quão profundo a música fractal lhes toca. Para alguns tornou-se até uma
obsessão.”
“Para criar a sua música só precisa de um computador e de uma equação sim-
ples que, por iterações sucessivas gera imagens complexas e espectaculares, ao pintar
um determinado pixel do écran de determinada cor, consoante a solução da equação
obtida. Estas imagens fractais espectaculares e a matemática que a apoia inspiraram
um crescente grupo de compositores, programadores e amadores. As imagens fractais
enfeitiçam não só pela sua beleza, mas também pelas suas formas extremamente com-
plexas que surgem de equações muito simples. A mais famosa é conhecida por Conjunto
de Mandelbrot e deve o seu nome ao matemático Benoit Mandelbrot que, em 1795 usou
o termo “fractal” vindo do latim “fractus” que significa quebrar.”
“Qual é o som do caos? Nunca é o mesmo. Uma mistura de familiar e de novo, a
complexidade da música tem notas que soam a jazz e a avant-gard. A música prende
alguns ouvintes em quase suspensão quando pensam ter descoberto uma regularidade
na melodia e já sabe o que se segue; mas depois a música acaba por dar uma volta
completamente inesperada. A base para caos em música é muito simples. Associa-se
cada nota musical a um único número. Por exemplo, dó, ré e mi podem corresponder
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 281

respectivamente ao números 1, 2 e 3. Quando a solução da equação que gera o fractal é


2, toca a nota ré. Cada vez que se resolve a equação obtém-se uma nova solução e uma
nova nota de música. O que se obtém pode ser bastante complexo. David Clark Little,
compositor e harpista usou programas de fractais para compor música nos últimos 10
anos. Diz que o processo é análogo ao dos compositores tradicionais que se inspiram
em antecessores seus ou na natureza. A diferença é que, com a música fractal não
sabemos o resultado da nossa inspiração até que tocamos a música e a ouvimos.”
“O crı́tico de música alternativa Matt Howarth vê grande parte da música fractal
como “fraca”, a menos que criada por alguém com o dom da composição. “A tecnologia
é muito bonita, mas é apenas uma ferramenta e requer talento para a utilizar.” (Retirado

de: http://www.apm.pt/apm/curiosidades/curio13.htm)

Podes ouvir exemplos de músicas fractais nos seguintes sites:

(1) Em http://www.fractal−vibes.com/fm/index.html há exemplos de músicas


fractais e existe um software gratuito para criação de música fractal. O pro-
grama não é simples de usar para quem não sabe música, mas ainda assim
podes experimentá-lo e tentar fazer alterações nos vários parâmetros, obser-
vando depois as consequências dessas alterações na música.
(2) Em http://polymer.bu.edu/music/ estão exemplos de músicas criadas a partir
de batimentos cardı́acos de humanos. Hoje considera-se que um batimento
cardı́aco saudável tem um ritmo fractal.
(3) Em http://gingerbooth.com/courseware/fracmusic.html está disponı́vel um ap-
plet para composição de música fractal.
(4) Mais informação em:
• http://www.educ.fc.ul.pt/icm/icm99/icm14/musica fractal.htm
• http://classes.yale.edu/fractals/Labs/FractalMusicLab/FractalMusicLab.html
• http://members.aol.com/dspondike/fractal.html
• http://thinks.com/webguide/fractal−music.htm
282 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

(5) Faz uma pesquisa por “fractal music” e visita outros sites relacionados com o
tema.

Depois de leres o texto, ouvires alguns exemplos de “músicas fractais” e de, eventu-
almente teres tentado criar a tua própria melodia fractal, escreve um texto sobre este
assunto, tocando nos seguintes pontos:

• Que sensação te provoca este tipo de música?


• Na tua opinião, trata-se de arte?
• Que tipo de contribuição traz a Matemática em geral e a geometria fractal em
particular, para a Música?

Investiga mais se for necessário para fundamentares a tua opinião.F


6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 283

Proposta 21 (Exposição Fotográfica).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se reforçar a evidência de formas fractais


na natureza e despertar a atenção dos alunos para essas formas, incitando-os a olhar
em seu redor de modo ponderado e crı́tico.

Actividade:

Fotografa objectos da Natureza ou do teu mundo que te pareçam ter uma estrutura
fractal. Salienta a auto-semelhança encontrada nas estruturas fotografadas e discute
com os teus colegas a validade de cada uma das fotos enquanto exemplo de forma
fractal.
Organiza, com os teus colegas, uma exposição fotográfica.
Nos Anexos 16, 17 e 18 estão exemplos de fotos.

Sugestões:

• Para completar a exposição podem também procurar-se outras fotos na inter-


net, tendo o cuidado de citar as fontes.F
284 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

6.2. Os fractais na Natureza. As próximas propostas de actividades pretendem


realçar a aplicabilidade e a utilidade da geometria fractal em várias ciências que estu-
dam o mundo, os seres vivos que nele habitam e os fenómenos que nele ocorrem.

Proposta 22 (Fractais na Biologia).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se reiterar a importância e a utilidade


de geometria fractal para a modelação, a representação e o estudo das formas da Natu-
reza. É uma actividade aberta, de investigação, que exige dos alunos a capacidade para
recolher, organizar a informação e posteriormente apresentá-la de forma adequada.

Actividade:

(1) Investiga que aplicações pode ter a geometria fractal na Biologia. Aqui estão
alguns tópicos para a tua pesquisa:
(a) Objectos naturais com estruturas fractais;
(b) Superfı́cie de células cancerı́genas;
(c) Padrões formados por colónias de bactérias em crescimento;
(d) Representação gráfica de um batimento cardı́aco;
(e) Movimentos aleatórios e sua relação com o percurso de alguns animais (O
que é um movimento aleatório?);
(f) Estrutura geométrica de proteı́nas.
Elabora um texto onde expliques as tuas descobertas.
(2) Escolhe duas espécies de árvores ou plantas cujas folhas te pareçam ter di-
mensão fractal. Recolhe várias folhas de cada uma delas e determina a di-
mensão fractal das linhas de contorno dessas folhas (ver Exemplo 43 na página
126).
(a) As folhas da mesma espécie têm dimensão fractal idêntica?
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 285

(b) Há diferenças significativas entre a dimensão fractal das folhas de uma
espécie e a das folhas da outra espécie?

Observações:

• A colaboração do professor de Biologia no desenvolvimento desta actividade é


essencial.

Sugestões:

• Com o mesmo processo apresentado na Proposta 14, pode determinar-se a


dimensão fractal da linha de contorno de vários tipos de folhas de plantas ou
de árvores.
• A Proposta 11 também pode ser realizada no âmbito deste tema.
• Quando os alunos tiverem recolhido bastante informação sobre objectos natu-
rais com estrutura fractal pode fomentar-se a discussão sobre: Porque é que a
Natureza elege as formas fractais? Será que é porque estas oferecem um maior
grau de conectividade com maior economia? Se assim for, como podemos
aplicar isto em nosso benefı́cio? Fará sentido pensar em utilizar estruturas
fractais, por exemplo em redes de transmissão de informação?
• Sugere-se aos alunos a elaboração de um texto, mas o resultado do seu trabalho
pode ser apresentado de outras formas, como por exemplo em cartazes, numa
apresentação powerpoint ou numa página para a internet.F
286 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 23 (Fractais na Fı́sica).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se que os alunos descubram algumas das
possibilidades de aplicação da geometria fractal ao estudo de fenómenos fı́sicos. É uma
actividade aberta, de investigação, que exige dos alunos a capacidade para recolher,
organizar a informação e posteriormente apresentá-la de forma adequada.

Actividade:

(1) Investiga que aplicações pode ter a geometria fractal na Fı́sica. Aqui estão
alguns tópicos para a tua pesquisa:
(a) Dimensão fractal de uma galáxia;
(b) Movimento browniano (Geometria da trajectória de partı́culas);
(c) Indústria (mecânica de fluı́dos - misturadores, antenas);
(d) Turbulência atmosférica;
(e) Agregação de Difusão Limitada (ADL);
(f) Flocos de neve (ver Proposta 4).
Elabora um texto onde expliques as tuas descobertas.

Observações:

• A colaboração do professor de Fı́sica no desenvolvimento desta actividade é


essencial.

Sugestões:

• Em http://www.math.fau.edu/Teacher/CATEs PDF/9%20TI
%2083+/TI%2083+,%20part%202.pdf encontra-se um programa (BALLAGG
(Patterns in Nature)) para a calculadora gráfica TI-83 que simula a agregação
de partı́culas. No programa é possı́vel definir o grau de atracção que a estrutura
já construı́da exerce sobre as partı́culas que se aproximam para depois observar
a influência que esse valor tem na forma da estrutura final.
6. PROPOSTAS PARA A DISCIPLINA DE ÁREA DE PROJECTO 287

• Em http://polymer.bu.edu/ogaf/html/software.htm está o software ADL que


permite simular ADL’s com movimentos aleatórios de partı́culas e movimen-
tos lineares. Podem depois usar-se as imagens obtidas para estudar a sua
dimensão.
• Seria importante e interessante que os alunos pudessem realizar algumas ex-
periências em laboratório que lhes permitissem observar alguns dos fenómenos
que podem ser estudados através da geometria fractal.
• Sugere-se a elaboração de um texto aos alunos, mas o resultado do seu trabalho
pode ser apresentado de outras formas, como por exemplo em cartazes, numa
apresentação powerpoint ou numa página para a internet.F
288 4. EXPLORAÇÃO DE FRACTAIS EM CONTEXTO DE SALA DE AULA

Proposta 24 (Fractais na Geografia).

Objectivos: Com esta actividade pretende-se reiterar a utilidade da geometria fractal


para a modelação, a representação e o estudo de fenómenos atmosféricos e geológicos,
bem como das formas geográficas.

Actividade:

(1) Investiga que aplicações pode ter a geometria fractal na Geografia. Aqui estão
alguns tópicos para a tua pesquisa:
(a) Formas de paisagens;
(b) Redes fluviais;
(c) Manchas florestais;
(d) Costa marı́tima;
(e) Nuvens;
(f) Meteorologia.
Elabora um texto onde expliques as tuas descobertas.

Observações:

• A colaboração do professor de Geografia no desenvolvimento desta actividade


é essencial.

Sugestões:

• A Proposta 14 também pode ser realizada no âmbito deste tema.


• Sugere-se a elaboração de um texto aos alunos, mas o resultado do seu trabalho
pode ser apresentado de outras formas, como por exemplo em cartazes, numa
apresentação powerpoint ou numa página para a internet.F
Conclusão

289
290 CONCLUSÃO
CONCLUSÃO 291

Várias lembranças me vêm à memória quando recordo o caminho que percorri


para realizar este trabalho bem como o que li, o que aprendi, o que experimentei e o
que descobri. Mesmo depois de ter organizado e compilado neste trabalho parte da
informação que recebi até agora sobre os fractais, algumas ideias soltas povoam a minha
mente e vou tentar escrevê-las sem que a ordem de importância seja necessariamente
aquela em que aparecem no texto. O trabalho foi, antes de mais, muito gratificante
porque me levou a descobrir um tema do qual eu tinha apenas uma noção muito vaga
(e julgo que muito vaga continua, comparando com o que ainda tenho para aprender).
Ainda assim, para além do interesse inicial que já me despertavam os Fractais, à medida
que fui compreendendo melhor novos conceitos associados ao tema e fui sendo capaz
de os sintetizar e de os apresentar de forma ordenada, a curiosidade sobre o assunto
cresceu amplamente. Para isso também muito contribuiu o constatar que a geometria
fractal está patente em tantos lugares (sobretudo em objectos e em seres naturais) e
que formas tão complexas e por vezes tão bonitas, podem ser criadas ou simuladas por
processos matemáticos muito simples. Outra surpresa, foi a grande aplicabilidade da
geometria fractal, nomeadamente dos conceitos de estrutura e de dimensão fractal a um
leque tão vasto de áreas, desde as ciências naturais às económico-sociais, à tecnologia
e à indústria.
A sensação de ter pegado na ponta de uma enorme meada de fio enrolado, mas
não muito emaranhado, porque afinal tudo a pouco e pouco vai fazendo sentido, é
agradável e ao mesmo tempo inquietante. É estimulante pensar que neste processo,
por detrás de cada porta que se abre e de cada conceito que se entende está um mundo
de aplicabilidades do mesmo e de outros conceitos e ideias correlacionados. E assim,
cada porta que se abre leva a outras que se abrem para outras, e ainda mais outras...
tal e qual como no processo de criação de uma estrutura fractal - sempre igual, sem
nunca acabar e tornando o todo cada vez mais complexo e mais bonito. E quanto mais
aprendo, mais descubro que muito mais há para aprender e fica a sensação de que só
292 CONCLUSÃO

agora estaria em condições para realmente começar a estudar geometria fractal. Sinto
que esta jornada serviu apenas para adquirir os conceitos básicos.
Nem tudo na Natureza é fractal e, como já foi dito no inı́cio deste trabalho, a Geo-
metria Euclidiana continua e continuará a ser fundamental não só para a estruturação
do raciocı́nio matemático, como para a modelação de inúmeros objectos e fenómenos.
Por outro lado, não basta que um determinado padrão se repita num objecto para que
ele possa ser considerado um fractal. Por exemplo, uma parede de tijolos não deverá
ser considerada um fractal porque a repetição que se verifica diz respeito essencial-
mente a translações e não a contracções. Deve haver alguma auto-semelhança num
determinado objecto para que ele possa ser considerado um fractal e é necessário que
essa auto-semelhança se repita por, pelo menos, alguns nı́veis de escala. Além disso,
essa repetição deve acontecer através de duas contracções no mı́nimo; caso contrário
o que se obtém não deverá ser considerado um fractal, porque se existir uma única
contracção, após infinitas iterações obter-se-á um ponto.
A geometria fractal é uma nova linguagem para a interpretação das formas e dos
padrões complexos patentes na Natureza e tem contribuı́do para o evoluir da ciência
ao fornecer novas ferramentas para descrever, modelar, analisar e medir o mundo e
revela conexões espantosas deste com a Matemática. A geometria fractal é excitante,
intrigante, desafiadora e importante para muitas disciplinas. O conceito de fractal
é simples de entender e julgo que com relativamente poucos conhecimentos de ma-
temática é possı́vel abordar e resolver vários tipos de problemas que envolvam fractais.
Valerá a pena continuar a estudar o conceito de Fractal e as suas aplicabilidades
e a formalizar meios de apresentar esta ideia matemática aos alunos. Não é fácil, no
âmbito dos currı́culos actuais, um professor conseguir uma ou duas semanas de tempo
de aula para leccionar uma unidade extra especifica sobre fractais, mas esse tópico
pode ser usado como uma forma diferente, rica e contemporânea de abordar muitos
dos conteúdos programáticos, dada a forte conexão entre os fractais e um vasto conjunto
de conteúdos programáticos já presentes no currı́culo.
CONCLUSÃO 293

O ideal seria que a Geometria Fractal pudesse passar a fazer parte, de forma oficial
e consciente, do currı́culo dos nossos alunos, quer do ensino básico, quer do ensino
secundário, não só da disciplina de Matemática, mas também de outras disciplinas em
que a aplicabilidade da geometria fractal é mais evidente, como é o caso da Biologia,
da Geografia, da Fı́sica e da Quı́mica. Nas disciplinas das áreas de Informática e
das Artes, os alunos deveriam também ter a oportunidade de construir objectos com
estruturas fractais. Julgo que não seria necessário investir muito tempo em cada ano
lectivo exclusivamente com este assunto, mas sou da opinião de que o tema pode ser
muito enriquecedor, sobretudo se a forma como for trabalhado proporcionar aos alunos
a noção de que todos os saberes estão, de alguma forma, interligados. Penso que poucos
temas de estudo podem proporcionar esta ideia de forma tão evidente e abrangente e
é por isso que considero que o tema é passı́vel de ser explorado na disciplina de Área
de Projecto.
Com os alunos mais pequenos, pode começar-se com actividades que explorem o
conceito de iterada, “semente” (isto é, conjunto inicial ao qual é aplicado uma função),
“órbita” (isto é, sequência das iteradas) e “regra” (ou seja, qual a função que está a
ser aplicada). A identificação das contracções do fractal contidas em si mesmo, com
fractais mais simples, também é possı́vel realizar com os alunos mais jovens.
Para levar isto a cabo, seria necessário começar pela formação dos professores, das
várias áreas de estudo, onde eles próprios começariam por aprender os conceitos básicos
e por desenvolver pequenos projectos multi e interdisciplinares para, a partir da daı́,
perceberem que tipo de actividades faz sentido propor aos alunos. Posteriormente seria
interessante que esses professores testassem as convicções adquiridas na sua formação,
realizando algumas sessões de formação para alunos do ensino secundário, dedicadas
exclusivamente à geometria fractal enquanto tema unificador do conhecimento e às suas
aplicações nas áreas das disciplinas curriculares.
Algumas universidades têm vindo não só a integrar disciplinas dedicadas à Geo-
metria Fractal nos seus cursos cientı́ficos, como também a desenvolver vários projectos
294 CONCLUSÃO

relacionados com formação de professores (procurando que depois alguns deles pros-
sigam com a formação de outros professores) ou com formação de alunos (mesmo os
que não têm uma forte preparação matemática ou particular interesse pela ciência)
ou ainda com o desenvolvimento de materiais curriculares que poderão ser utilizados
pelos professores do ensino secundário. É o caso de um projecto realizado desde 1995
pelo Departamento de Ciências Matemáticas da Florida Atlantic University14, de ou-
tro concretizado pela Universidade de Yale dedicado aos alunos15 e ainda de um outro
levado a cabo pelo Center for Polymer Studies da Universidade de Boston, desde 1989,
que consiste no desenvolvimento de materiais curriculares para o ensino secundário e
universitário, baseado em investigação da ciência moderna e no qual se incluiu uma
parte dedicada à geometria fractal16.
Considero urgente e importante que os nossos alunos contactem com a geometria
fractal e adquiram e compreendam alguns dos seus conceitos básicos. Em primeiro
lugar porque não faz sentido que a palavra “geometria” faça surgir nas suas mentes
apenas imagens relacionadas com a geometria euclidiana sendo o mundo natural muito
melhor descrito pela geometria fractal; em segundo lugar, porque a possibilidade de
aplicação desta geometria a outras áreas é tão elevada que poderá ser uma mais valia
para os alunos terem a mente aberta e desperta para esta possibilidade; em terceiro
lugar porque a geometria fractal é muito atractiva devido às bonitas representações
gráficas que gera e ao interesse que desperta não só pelas propriedades interessan-
tes patentes nos fractais, como na conectividade que revela ter com outros conceitos
matemáticos e com outras áreas do saber; em quarto lugar porque pode fomentar o
desenvolvimento de inúmeras capacidades e competências que já foram referidas no
Capı́tulo 4 (ver página 186) e entre as quais destaco as mais imediatas: a predisposição

14Projecto “Pattern Exploration: Integrating Math and Science for the

Middle School” - http://www.math.fau.edu/Teacher/Teacher homepage.htm e

http://www.math.fau.edu/Teacher/MSP/
15Projecto “Fractal Geometry” - http://classes.yale.edu/fractals/
16Projecto “Patterns in Nature” - http://polymer.bu.edu/ogaf/
CONCLUSÃO 295

para raciocinar matematicamente e para aplicar conceitos matemáticos em contextos


reais, a capacidade de comunicar e de trabalhar em grupo e a competência para ma-
nusear software informático.
A exploração do conceito de fractal na disciplina de Matemática pode ainda cons-
tituir um tópico de união de temas transversais da disciplina como é o caso da Comu-
nicação Matemática, da Aplicação e Modelação Matemática, da Lógica e Raciocı́nio
Matemático, da Resolução de Problemas e Actividades de Investigação e da Tecnologia
e Matemática que não são menos importantes que os conteúdos especı́ficos da disci-
plina, visto que encerram em si o potenciamento de variadı́ssimas competências que
hoje são necessárias a qualquer cidadão activo. Além disso, discussões interessantes
podem surgir através do estudo dos fractais através de questões que podem ser colo-
cadas aos alunos, tais como: Porque é que a Natureza elege as formas fractais? Como
podemos usar a Geometria Fractal em nosso benefı́cio?
Ambiciono com este trabalho contribuir para que a geometria fractal, que se mostra
tão útil e crescentemente importante para a compreensão do mundo em geral, possa
ser conhecida por todos, quer alunos, quer professores. Gostaria que alguns dos actuais
alunos, futuros académicos ou profissionais de qualquer área, ao terem conhecimento
sobre o conceito de fractal e da sua aplicabilidade, pudessem mais tarde encontrar
novas aplicações da geometria fractal e melhorar o entendimento que a humanidade
tem do mundo em que vive.
Aspiro divulgar o tema e sensibilizar alunos e professores de Matemática e de ou-
tras disciplinas para a possibilidade de realização trabalhos de projecto multi e inter-
disciplinar sobre fractais. Sendo assim, pretendo colaborar com professores e alunos
trabalhando com estes o conceito de fractal na sala de aula e realizando pequenas
conferências e sessões práticas sobre a geometria fractal. Tenciono também divulgar
na internet todo o material que reuni para que possa ser utilizado por mais pessoas
interessadas pela Geometria Fractal.
296 CONCLUSÃO

Acredito que a Geometria Fractal proporcionará mudanças fundamentais na forma


como olhamos e entendemos o nosso mundo e como iremos interagir com ele.
Anexos

297
298 ANEXOS
ANEXOS 299

Anexo 1. Grelha Triangular


300 ANEXOS

Anexo 2. Grelha Quadriculada


ANEXOS 301

Anexo 3. Grelha Triangular de Pontos


302 ANEXOS

Anexo 4. Grelha Quadriculada de Pontos


ANEXOS 303

Anexo 5. Grelha Hexagonal


304 ANEXOS

Anexo 6. Triângulo de Pascal


ANEXOS 305

Anexo 7. Curva de Koch - Esquema de colocação das fotocópias


306 ANEXOS

Anexo 8. Curva de Koch - Esquema de colocação das fotocópias - Iteração 0


ANEXOS 307

Anexo 9. Triângulo de Sierpinski (Equilátero) - Esquema de colocação das


fotocópias
308 ANEXOS

Anexo 10. Triângulo (Rectângulo) de Sierpinski - Esquema de colocação das


fotocópias
ANEXOS 309

Anexo 11. Triângulo de Sierpinski - Esquema de colocação das fotocópias -


Iteração 0
310 ANEXOS

Anexo 12. Papel para Gráficos com escala log-log


ANEXOS 311

Anexo 13. Modelo e instruções


para construção de Fractal Tridimensional em Papel
“Cubos Contrários”

(Adaptado de [18, pág. 37]-Fractal Cuts de Diego Uribe, edição de Tarquin Publicati-
ons distribuı́do em Portugal pela Editora Replicação.)
312 ANEXOS

Anexo 14. Modelo e Instruções


para construção de Fractal Tridimensional em Papel
Quartil Central

(Adaptado de [18, pág. 19]-Fractal Cuts de Diego Uribe, edição de Tarquin Publicati-
ons distribuı́do em Portugal pela Editora Replicação.)
ANEXOS 313

Anexo 15. Modelo e Instruções


para construção de Fractal Tridimensional em Papel
Triângulo de Sierpinski

(Adaptado de [18, pág. 49]-Fractal Cuts de Diego Uribe, edição de Tarquin Publicati-
ons distribuı́do em Portugal pela Editora Replicação.)
314 ANEXOS

Anexo 16. Neste cacto pode observar-se a mesma forma em diferentes escalas.
ANEXOS 315

Anexo 17. Nesta foto podem observar-se dois exemplos de fractais: o padrão
gerado pelos candeeiros alinhados ao longo da avenida (que pode obter-se através de
um SFI com conjunto de condensação) e as nuvens.
316 ANEXOS

Anexo 18. Nesta foto pode observar-se a mesma forma em diferentes escalas no
padrão gerado pelo rebentamento da onda.
ANEXOS 317

Anexo 19. Algoritmos para o NetLogo

Estão no ficheiro fractais geometricos.pdf no CD que acompanha esta dissertação.


318 ANEXOS

Anexo 20. Algoritmos para o LOGO

Curvas de Peano
to peano2 :itera :size
if :itera = 0 [fd :size stop]
peano2 :itera-1 :size/3
lt 90
peano2 :itera-1 :size/3
rt 90
peano2 :itera-1 :size/3
rt 90
peano2 :itera-1 :size/3
peano2 :itera-1 :size/3
rt 90
peano2 :itera-1 :size/3
rt 90
peano2 :itera-1 :size/3
rt 90
peano2 :itera-1 :size/3
peano2 :itera-1 :size/3
end

to peano1 :itera :size


if :itera = 0 [fd :size stop]
peano1 :itera-1 :size/2
lt 90
peano1 :itera-1 :size/2
rt 180
peano1 :itera-1 :size/2
lt 90
peano1 :itera-1 :size/2
end

to peano3 :itera :size


if :itera = 0 [fd :size stop]
peano3 :itera-1 :size*9/20
lt arccos 1/9
peano3 :itera-1 :size*9/20
rt 2*arccos 1/9
peano3 :itera-1 :size*9/20
lt arccos 1/9
peano3 :itera-1 :size*9/20
end

Curva de Koch
to koch :iteration :longitud
if :iteration = 0 [fd :longitud stop]
koch :iteration-1 :longitud/3
lt 60
koch :iteration-1 :longitud/3
rt 120
koch :iteration-1 :longitud/3
lt 60
koch :iteration-1 :longitud/3
end
ANEXOS 319

Ilha de Minkowski
to Minkowski :size :level
repeat 4 [MLado :size :level rt 90]
end

to MLado :size :level


if :level = 0 [fd :size stop]
MLado :size/4 :level-1
lt 90 MLado :size/4 :level-1
rt 90 MLado :size/4 :level-1
rt 90 MLado :size/4 :level-1
MLado :size/4 :level-1
lt 90 MLado :size/4 :level-1
lt 90 MLado :size/4 :level-1
rt 90 MLado :size/4 :level-1
end

Triângulo de Sierpinski
to sierpinski :itera :size
if :itera = 0 [setpc 0
setfc pencolor
repeat 3 [fd :size lt 120]
pu
lt 10
fd :size/2
fill
bk :size/2
rt 10
pd
stop]
if :itera = 1 [sierpinski :itera-1 :size
fd :size/2 lt 60
setpc 7
setfc pencolor
repeat 3 [fd :size/2 lt 120]
pu
lt 10
fd :size/4
fill
bk :size/4
rt 10
rt 60
bk :size/2
pd
stop]
sierpinski :itera-1 :size/2
fd :size/2
sierpinski :itera-1 :size/2
bk :size/2
lt 60
fd :size/2
rt 60
sierpinski :itera-1 :size/2
lt 60
bk :size/2
rt 60
end
320 ANEXOS

Conteúdo do CD que acompanha esta Dissertação:

• NetLogo (Algoritmos)
• Imagens a cores
• Apresentação Powerpoint “Fractais? E isso come-se com quê?”- apresentada
no âmbito do Projecto para a Licença Sabática durante a Semana Cultural na
Escola Secundária c/3o C.E.B. da Batalha
Bibliografia

[1] BARNSLEY, Michael F..Fractals Everywhere. London: Academic Press Professional, 1993

[2] FALCONER, Keneth. Fractal Geometry - Mathmatical Foundations and Applications. Chichester:

John Wiley & Sons, 1990

[3] FALCONER, Keneth. Techniques in Fractal Geometry. West Sussex: John Wiley & Sons, 1997

[4] FEDER, Jens. Fractals. New York: Plenum Press, 1988

[5] BARNSLEY, Michael F., DEVANAY, Robert L., FISHER, Yuval, MANDELBROT, Benoit B.,

McGUIRE, Michael, PEITGEN, Heinz-Ottto, SAUPE, Dietmar, VOSS, Richard F.. The Science

of Fractal Images. New York: Springer-Verlag, 1988

[6] STEVENS, Roger T.. Creating Fractals. Hingham: Charles River Media, Inc., 2005

[7] BARBOSA, Ruy Madsen. Descobrindo a Geometria Fractal para a Sala de Aula. Belo Horizonte:

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