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Faz-me tanto bem e tanto mal dar uma aula

Dei por mim a desfolhar textos de Sebastio da Gama. A dado passo li "faz-me tanto
bem e tanto mal dar uma aula". Ao fim de 12 anos e outras tantas escolas questiono-me
porque ainda estou nisto. Quando digo "nisto" refiro-me s cinco horas de sono por noite, aos
40000 km por ano, s tarefas para cumprir para ontem, s toneladas de papis para
preencher... Afinal, nunca foi este o meu sonho profissional. Comecei por querer ser "cavador
de enxada", nos gloriosos tempos de infncia, passados na Quinta da Fontinha, a acompanhar
os trabalhos do campo, sob a asa protetora da Ia, alcunha amorosa da tia Alzira. Mais tarde,
quis ser bombeiro, qui pela proximidade do quartel dos Bombeiros Voluntrios escola da
Avenida. A magia dos camies vermelhos, das mangueiras e das sirenes fez-me viajar tantas
vezes para mundos de super heris! Mais tarde ainda, saltei para mdico, astronauta e
futebolista. Estranhamente, nunca quis ser professor. A figura autoritria, de verbe rspida,
rgua e alma fria criou em mim um quase dio misso professoral. Houve, claro, figuras
nobres e mgicas, professores fantsticos pela forma como prendiam a ateno pela magia
das palavras ou pelos afetos. O professor Anbal, que fazia os Lusitanos ganharem vida nos
livros de Histria do 7. ano; a professora Zilda, que tornava Portugus uma disciplina
inesquecvel, fazendo-me derramar lgrimas pela triste sorte de Mira, pobre touro! Ou o
professor Gustavo Barosa, que me ensinou a gostar de poesia e da rdio e ainda a professora
Ana Maria, figura que ainda hoje me inspira na viagem pelo mundo de Shakespeare. S ela
para me convencer (e Cristina - que feito de ti, Jane?) a encenar um Romeu e Julieta
perante a plateia do Liceu! A verdade que nada me encaminhava para esta vida, at porque
garanti a uma professora em especial que, se algum dia a ironia da vida me pregasse essa
partida, tudo faria para ser diferente dela - injusta, fria, m, cruel.
Ainda hoje no sei se sei ser professor, mas concordo com Sebastio da Gama. J no
me imagino a fazer outra coisa. Todos os dias so diferentes. Exigentes, difceis, loooongos...
Mas compensadores, divertidos. Todos os dias aprendo. Tantos amigos para fazer e tantos
sonhos para cumprir. Faz-me tanto bem e tanto mal dar uma aula.

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