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Em espírito e em verdade Publicado em 17/11/05 às 12:40

Por Ed René Kivitz

Em sua conversa com a mulher samaritana, Jesus denuncia


que muitos há que adoram o que não conhecem, e, portanto, sua adoração
é inóqua e ineficaz: não mata a sede, isto é, não satisfaz o anseio de
realização espiritual.

A experiência espiritual cristã afirma que é imprescindível o discernimento a


respeito de quem é Jesus: "Se conheceras o dom de Deus e quem é o que te
pede: dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva" (Jo 4.10).

Todo aquele que deseja beber água da vida e ter em seu interior uma fonte
a jorrar para a vida eterna deve conhecer a Jesus (Jo 4.13,14; 7.37-39) e
ouvir Suas palavras, pois as palavras de Jesus são espírito e vida (Jo 6.63).

Em outras palavras, "Deus é espírito, e importa que seus adoradores o


adorem em espírito e em verdade" (Jo 4.24).

A legítima experiência espiritual cristã, a experiência de adoração, acontece


sob a ministração do Espírito Santo (Jo 14.17; Fp 3.3; Ef 6.18 ), somente
possível para aqueles que nasceram da água e do Espírito pela fé em Jesus
Cristo, que é a Verdade (Jo 3.1-16; 14.6).

Neste caso, a adoração cristã não é apenas uma questão de "paixão


infinita", mas também uma questão de conhecimento do Deus que se revela
na história, na Bíblia e absolutamente em Jesus de Nazaré (Hb 1.1-4).

A expressão religiosa popular brasileira, com suas crendices e seus ídolos,


traz a mim um misto de tristeza e esperança.

Tristeza semelhante àquela que o apóstolo Paulo expressa ao afirmar que


os que têm zelo de Deus, mas não têm entendimento, ainda carecem de
salvação (Rm 10.1,2).

Mas, nestes dias de intensa busca espiritual, meu coração enche-se de


esperança, pois creio em um Deus misericordioso e salvador.

A Bíblia conta a história de um homem temente a Deus, piedoso, que fazia


muitas esmolas e orava com fervor (At 10.2).

A parte da história que mais me comove é a afirmação de Pedro, apóstolo:


"Cornélio, a tua oração foi ouvida, e as tuas esmolas, lembradas na
presença de Deus" (10.31).

O extraordinário é que a experiência espiritual de Cornélio era incompleta


até ouvir a pregação apostólica a respeito de Jesus de Nazaré (10.34-43). E
Deus providencia para que esta pregação alcance Cornélio e toda a sua
casa.

Enfim, parece claro que Deus dá ao homem que O procura um jeito de


encontrá-Lo.

Ou, se você preferir, o homem que procura Deus já foi achado por Ele.

Portanto, à semelhança do apóstolo Paulo, oremos pelos que buscam Deus


com paixão infinita ajoelhados diante dos ídolos, a fim de que Deus mesmo
lhes dê o conhecimento da verdade em Jesus.

E oremos por aqueles que se ajoelham diante de Jesus, para que Deus lhes
dê a paixão infinita.

Fonte: Eclésia - ano 5 - nº 49

A oração simples Publicado em 28/01/08 às 9:21 Por: Ed René Kivitz

Não existe oração errada. Aliás, a oração errada é aquela que não é feita. A
Bíblia Sagrada ensina que se deve orar a respeito de tudo. Orar por qualquer
motivo, qualquer hora, qualquer lugar, sempre que o coração não estiver em
paz. Tão logo o coração experimente apreensão, preocupação, medo,
angústia, enfim, seja perturbado por alguma coisa, a ação imediata de quem
confia em Deus é a oração.

O apóstolo Paulo diz que não precisamos andar ansiosos por coisa alguma, mas em
tudo, pela oração e súplicas, com ação de graças, devemos apresentar nossos pedidos a
Deus, tendo nas mãos a promessa de que a paz de Deus que excede todo o
entendimento, guardará nossos sentimentos e pensamentos em Cristo Jesus (Filipenses
4.6,7). A expressão "coisa alguma' inclui desde uma vaga no estacionamento do
shopping center quanto o fechamento de um negócio, o desejo de que não chova no dia
da festa quanto a enfermidade de uma pessoa querida.

Esta experiência de oração é chamada de oração simples: orar sem censura filosófica ou
teológica, orar sem se perguntar "é legítimo pedir isso a Deus?" ou "será que Deus se
envolve nesse tipo de coisa?". Simplesmente orar.

A garantia que temos quando oramos assim é a paz de Deus em nossos corações e
mentes. A Bíblia não garante que Deus atenderá nossos pedidos exatamente como
foram feitos: pode ser que a vaga no estacionamento não seja encontrada e que chova no
dia da festa. A oração não se presta a fazer Deus trabalhar para nós, atendendo nossos
caprichos e provendo o nosso conforto. Já que a causa da oração simples é a ansiedade,
a resposta de Deus é a paz. O resultado da oração não é necessariamente a mudança da
realidade a respeito da qual se ora, mas a mudança da pessoa que ora. A mudança da
situação a respeito da qual se ora é uma possibilidade, a mudança do coração e da mente
da pessoa que ora é uma realidade. Deus não prometeu dizer sim a todos os nossos
pedidos, mas nos garantiu dar paz e nos conduzir à serenidade. Não prometeu nos livrar
do vale da sombra da morte, mas nos garantiu que estaria lá conosco e nos conduziria
em segurança através dele.

O maior fruto da oração não o atendimento do pedido ou da súplica, mas a maturidade


crescente da pessoa que ora. Na verdade, a estatura espiritual de uma pessoa pode ser
medida pelo conteúdo de suas orações. Assim como sabemos se nossos filhos estão
crescendo observando o que nos pedem e o que esperam de nós, podemos avaliar nosso
próprio crescimento espiritual através de nossos pedidos e súplicas a Deus. As orações
revelam o que realmente ocupa nossos corações, o que realmente é objeto dos nossos
desejos, o que nos amedronta, nos desestabiliza e nos rouba a paz.
O apóstolo Paulo diz que quando era menino, falava como menino, pensava como
menino e raciocinava como menino. Mas quando se tornou homem, deixou para trás as
coisas de menino (1Coríntios 13.11). Não existe oração certa e errada. Mas existe
oração de menino e oração de homem. Oração de menina e oração de mulher. A
diferença está no coração: coração de menino e de menina, ora como menino e menina.
A nossa certeza é que Deus também gosta de crianças.

Ed René Kivitz é teólogo, com mestrado em Ciências da Religião pela Universidade


Metodista de São Paulo, e pastor presidente da Igreja Batista de Água Branca, SP. É
também palestrante e escritor, e dentre suas obras mais conhecidas estão Vivendo com
propósitos e Outra Espiritualidade, ambas publicados pela Editora Mundo Cristão.

Fonte: www.galilea.com.br

Presentes no Mundo Publicado em 03/07/06 às 21:39 Por Ed


René Kivitz

"Prega o evangelho durante todo o tempo: se necessário,


use as palavras"
(São Francisco de Assis)

Cristãos devem fazer diferença. Não fosse a presença cristã, o mundo


estaria não apenas em decadência ainda mais acelerada, como também,
absolutamente impossibilitado de conhecer a Deus. No Sermão do Monte o
Senhor Jesus oferece as bases do testemunho cristão no mundo. (Mt 5.14-
16).

A finalidade do testemunho é a glória de Deus: "para que glorifiquem a


vosso Pai que está nos céus". O conteúdo do testemunho são as boas obras:
"para que vejam as vossas boas obras". Mas o pré-requisito para o
testemunho é a luz : "assim resplandeça a vossa luz diante dos homens,
para que vejam as vossas boas obras, e glorifiquem a vosso Pai, que está
nos céus".

O conceito cristão de boas obras é muito abrangente. Paulo escreve a Tito


afirmando que o Senhor Jesus "se deu a si mesmo por nós para nos remir de
toda iniqüidade, e purificar para si um povo todo seu, zeloso de boas obras".
(Tt 2.14).

O texto mais esclarecedor, entretanto, é Efésios 2.1 -10, ele diz que não
somos salvos por causa de obras, mas "para as boas obras, que Deus
preparou de antemão para que andássemos nelas". "Boas obras" entram
em contraste com "delitos e pecados" nos quais andávamos antes de Cristo

(2.1). E este "contraste é completo. É um contraste entre dois estilos de


vida (o mau e o bom) e, por trás deles, dois senhores (o diabo e Deus)",
comenta John Stott em "A mensagem de Efésios",. ABU Editora, 1986. p.57).

Sendo assim, "boas obras" não são apenas uma alusão à solidariedade e à
caridade. "Boas obras" dizem respeito à totalidade da vida do cristão.
Referem-se a tudo quanto um cristão faz: "quer comais quer bebais, ou
façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus"(1Co 10.31).

Voltando ao Sermão do Monte, a leitura superficial do texto sugere que as


boas obras dos cristãos são a luz que os homens vêem para que possam
glorificar a Deus. O Senhor Jesus, entretanto, afirmou que os homens
somente conseguiriam ver as boas obras caso a luz resplandecesse. O brilho
da luz possibilita a visibilidade das boas obras. Os cristãos é que são luz,
não são as sua boas obras. O que os cristãos são, ilumina o que os cristãos
fazem. O Senhor Jesus se utiliza das Bem-Aventuranças para descrever
quem é o cristão. Em seguida, afirma que pessoas com aquela essência
(luz) agindo no mundo (boas obras) causariam um impacto inescondível, o
que resultaria em glória para Deus, que está nos céus. Em outras palavras,
o que "fazer" somente resulta em glória para Deus quando iluminado pelo
"ser". Essa constatação traz pelo menos três implicações para a ética cristã.

O Ser Precede o Fazer

Na ética cristã, o ser precede o fazer, sob pena de que o fazer caia no vazio
ou, pior, em contradição com o ser, além de ser um peso excessivo para
quem faz. A ação cristã despida de caráter anterior que a qualifique é
incipiente porque não é possível de ser registrada. A mensagem mais forte
suplanta a mais fraca, e nesse caso, a mais forte diz respeito ao ser, de
modo que o fazer sem o ser cai no vazio.

O ser precede o fazer. O cristão, portanto, deve agir tendo cuidado das
intenções, do caráter e dos meios que possibilitam a ação. O cristão deve
agir, mas deve antes certificar-se de que seu estilo de vida credencia sua
ação e fala. A contradição entre o ser e o fazer faz lembrar a mãe que
belisca a criança no colo. É a chamada "mensagem de duplo vínculo": o
carinho do colo e a agressão do beliscão. A contradição entre as mensagens
gera confusão psíquica e emocional. O cristão que age em desacordo com o
que é lança uma mensagem difícil de ser acreditada.

O ser precede o fazer. O cristão portanto age em conseqüência de que, tal


qual árvore, é fruto. A impossibilidade do mundo natural não acompanha a
realidade da ação humana: laranjeiras não dão limões, mas pessoas ruins
podem agir com bondade, egoístas podem doar, invejosos podem aplaudir e
rancorosos podem abraçar. A violência contra si mesmo é dotada de
conseqüências funestas. Quem abre mão sem antes experimentar a
mansidão, por exemplo, carrega consigo um crônico sentimento de perda. O
ser precede o fazer para que a ação não seja esvaziada, confundida nem
pesada.

O Ser Esclarece o Fazer

Na ética cristã, o ser esclarece o fazer. Não são poucos os exemplos de


ações semelhantes com repercussões desiguais. A força da mensagem está
respaldada pela intensidade da militância. Martin Luther King Jr., Nelson
Mandella, Malcom X, tiveram suas mensagens amplificadas pelo fato de que
suas vidas estiveram e estão comprometidas com a causa esposada. A
identificação solidária com pobres não vale nada na boca de teólogos de
gabinete.

Não é por menos que o apóstolo Paulo insistiu em ser seguido no que falou
e mostrou. O evangelho não é algo para ser ouvido é para ser visto.
Aprendera isso do seu Mestre, que ensinava com a autoridade peculiar,
àqueles, cujas ações e palavras, são como água a jorrar do fundo do ser.

O Ser, Faz

Finalmente, na ética cristã, o ser, faz. Nada mais óbvio. Quem é


misericordioso age com solidariedade. Quem é pacificador aproxima
pessoas. E assim por diante. O mais notável, entretanto, é que a ação
genuinamente cristã é decorrente. Veja, por exemplo, que Jesus de Nazaré
não apenas serviu, ele se fez servo. Sua ação que priorizava o outro, em
detrimento de si mesmo, não era uma auto-violência mas uma expressão
natural do ser.

São Francisco estava certo. Conseguiu interpretar o espírito iluminado


cristão: "Prega o evangelho durante todo o tempo: se necessário, use as
palavras".

Deus é Inocente Publicado em 01/06/05 às 17:11


Por Ed René Kivitz

"Se o céu existe, Deus tem muito o que explicar". Essa afirmação
do ator Robert DeNiro faz eco em meu coração.
Também experimento o incômodo de deixar Deus sub judice diante do
sofrimento humano. Não me conformo diante das injustiças da vida. O
argumento de que todos somos maus e, em última análise, ninguém
mereceria ser poupado do mal, não me satisfaz.

Acredito que coisas ruins acontecem às pessoas boas e acalento, silencioso,


uma certa contrariedade quando coisas boas acontecem aos ruins.

E também creio que a maioria das pessoas não merece a tragédia que sofre
- o casal que perde o filho recém-nascido; o adolescente que fica
tetraplégico após um mergulho displiscente; a mulher que se vê mutilada
pelo câncer; o pai de família que percorre as ruas na indignidade do
desemprego. São situações cotidianas que me fazem dormir mal sob o peso
do veredito: Deus tem mesmo muito que explicar.

Mas trago no coração uma certeza que apazigua a alma, dá coragem para
viver e me anima à solidariedade, ainda que tímida e pouco suficiente: o
céu existe.

Não sei como é, nem onde fica. Não sei quando acontece. Mas que existe,
existe. O presente estado das coisas não é a versão final da obra de Deus.

Uma coisa é o mundo em que vivemos; outra, aquele em que viveremos


eternamente. E a respeito das coisas que acontecem neste mundo e não
deveriam acontecer, mas que não acontecerão no mundo vindouro, Deus já
Se explicou.

O Pai Se pronunciou em alto e bom som, há mais de 2 mil anos, na cruz do


Calvário, onde foi morto Jesus de Nazaré, o Cristo, unigênito de Deus.

A tradição cristã afirma que "Deus prova seu amor para conosco em que
Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores".

Quem duvida do amor de Deus deve olhar para o Calvário. No dia em que o
sofrimento se agiganta e a visão do amor de Deus fica ofuscada pelas
lágrimas da dor, a cruz é o grito apaixonado de Deus.

O teólogo britânico John Stott disse que, na cruz de Cristo, Deus justifica não
apenas a humanidade, mas a Si mesmo.

Na cruz de Cristo, Deus Se levanta diante de todos os que O acusam de ser


injusto, tirano, indiferente ao sofrimento e à dor humanas, e pronuncia a
sentença de inocência sobre Si mesmo. O madeiro é a prova irrefutável do
amor de Deus.

Na cruz há quatro afirmações que provam o amor e definem a inocência de


Deus.

Na cruz de Cristo, Deus se solidariza com as vítimas do mal e da


malignidade. Através da morte de Jesus Cristo, seu Filho, Deus afirma: "O
mal também me feriu"; "O sofrimento chegou também à minha casa"; "As
lágrimas pelo padecimento injusto também rolam dos meus olhos".

Aqueles que imaginam que o Deus que habita em luz inacessível vive
confortavelmente no ar condicionado do céu, enquanto Suas criaturas
penam contra o diabo na terra do sol, estão absolutamente enganados.

Na cruz de Cristo, Deus sofre conosco. Sofre por nós. Padece em nosso
lugar. Deus sabe o que é padecer - seu Filho é homem de dores, ovelha
muda entre seus sanguinários tosquiadores. Na cruz de Cristo Deus
atravessou não apenas o vale da sombra da morte; atravessou a própria
morte.

Na cruz de Cristo, Deus é declarado inocente porque não é contado entre os


promotores do mal, mas entre os que sofrem os danos da malignidade.

Na cruz de Cristo, Deus afirma: "Não olhem para mim como se eu ordenasse
o mal"; "Quando estiver sofrendo, não me conte entre os que lhe causam a
dor".

Quase posso escutar o Senhor dizendo à mãe que chora a filha atropelada:
"Não me tome como quem passou por cima. Eu estava embaixo, sendo
esmagado sob o peso da roda que me dilacerava a carne e a alma".

Na cruz de Cristo, Deus sofre o mal. Ali, o Senhor é exposto como vítima, e
não como algoz que causa dor e sofrimento.

Na cruz de Cristo, os verdadeiros promotores da morte são publicamente


desmascarados. Cai o pano. E todo mundo pode ver que Deus não está com
mãos sujas de sangue inocente - na cruz de Cristo, Deus é a mão inocente
que sangra.

No episódio do Calvário, o Pai é declarado inocente porque fica evidente que


a causa do sofrimento é o pecado da raça humana.

Os pecadores pendem das cruzes laterais; mas a do meio sustém um


inocente.

Na cruz de Cristo, Deus afirma: "Vocês deflagraram o mal, soltaram a besta


fera. Vocês macularam o Paraíso". O aviso "No dia em que pecares,
certamente morrerás" ainda ecoa pelo universo.

A presença da morte é evidência de pecado; e o pecado é responsabilidade


da raça. A cruz de Cristo somente se explica porque o pecado a faz
necessária. Naquele dia em que Deus provava Seu amor para conosco,
éramos de fato ainda pecadores.

Na cruz, Deus é O que morre, e não O que mata. Na cruz de Cristo, pende o
justo morrendo a morte dos injustos. O veredito está lançado - há pecado;
pois que haja morte.

O salário do pecado é a morte, disse o apóstolo. A justiça do Deus três


vezes santo há que ser satisfeita.

Deus está diante de Seu dilema eterno: matar ou morrer. E sua opção é
definitiva, desde antes da criação do mundo - morrer.

Deus faz a escolha e anuncia sua disposição de amor absoluto: se alguém


tem que morrer para que a justiça volte a brilhar, que viva a raça humana.
"E que morra eu", diz o Senhor.

O primeiro dos dilemas é criar ou não criar. O segundo é criar com liberdade
ou sem liberdade. O terceiro é assumir o ônus da liberdade ou deixar este
ônus nas mãos da criatura.

Deus faz as escolhas que O machucam, que lhe causam dor, que o fazem
sofrer, que o diminuem.

Simone Weil diz que "Deus e todas as Suas criaturas é menos do que Deus
sozinho".

O Senhor escolhe criar um ser livre, pois se não fosse livre não seria à
imagem do Criador. E escolhe arcar com ônus da liberdade que concede à
Sua criatura. Na cruz de Cristo está Deus entregando a Sua vida,
voluntariamente, em favor dos pecadores.

O mal deflagrado pela raça humana levanta sua sombra sobre o trono de
Deus. E o próprio Deus Se levanta como um Cordeiro que a Si mesmo se
doa, pois sua escolha foi morrer, ao invés de matar.

Na cruz de Cristo está o Deus que morre para que todos tenham vida. Vida
completa, abundante vida.

Extraído da revista ECLÉSIA - ANO 9 - EDIÇÃO 96.

Princípios Bíblicos de Liderança Publicado em 22/04/04 às


23:39 Por Ed Rene Kivitz

Como ter um ministério eficaz, mesmo sendo pastor de uma


Igreja pequena e pobre...

O tamanho de seu ministério não é medido pelo número de pessoas a quem


você serve, mas pelo número de pessoas servidas pelas pessoas a quem
você serve", ensinoume Bruce Wikinson há alguns anos atrás.

Na verdade este é o princípio de liderança de Efésios 4.11-16 nas suas três


afirmações básicas:

1. A Igreja do Senhor Jesus cresce e se solidifica quando todas as suas


partes (santos) estão ligados entre si e trabalhando bem;

2. As partes (santos) somente estarão harmonizadas e desempenhando


cada qual o seu papel se forem capacitadas para tanto.

3. A responsabilidade por capacitar as partes (santos) para atuar repousa


sobre os apóstolos, evangelistas, profetas e pastores-mestres.

Em outras palavras, a função pastoral não é fazer, mas "fazer fazer" e,


principalmente, subsidiar os que fazem para que façam bem feito. Isto diz o
apóstolo Paulo claramente: "Deus escolheu alguns para serem apóstolos,
outros para profetas, outros para evangelistas e ainda outros para pastores
e mestres da Igreja. Ele fez isso para preparar o povo de Deus para o
serviço cristão, afim de construir o corpo de Cristo" (Ef 4.11-12).

Até aqui não há qualquer novidade, pois o princípio é o mesmo usado pelo
Senhor Jesus quando de seu ministério terreno. Robert Coleman afirma que
Jesus não se preocupou com as multidões, mas sim com os homens a quem
as multidões seguiriam. O auditório de domingo à noite não estimulava
tanto Jesus quanto os encontros de discipulado durante a semana.

O Cristianismo virou o mundo de ponta cabeça em razão da qualidade


intrínseca de um nazareno e sua capacidade de olhar nos olhos de homens
comuns: sem tecnologia, sem um grande templo, sem agressividade na
arrecadação financeira, sem promoção da indústria do milagre, sem
programa de rádio e televisão, e sem bandas para entusiasmar o povo no
louvor. Apenas contato-contágio, multiplicando homens, dos quais o mundo
não era digno, que por sua vez fariam contato e contagiariam outros.

Quando atualmente ouvimos falar de ministérios eficazes e abrangentes,


logo imaginamos uma enorme estrutura por trás de um semideus. Pastores
retornam dos encontros cheios de entusiasmo e logo "caem na real"
lamentando a escassez de líderes, as dificuldades financeiras e a carência
de recursos para ampliar o ministério. Se o alvo é alcançar multidões, a
queixa está correta e o melhor que as instituições paraeclesiásticas
poderiam, fazer pelo Brasil, seria arrecadar fundos no exterior. Mas se o
alvo é discipular homens fiéis e idôneos para o princípio contatocontágio,
então não há razão para lamentações e frustrações.

O mais recente best seller da administração foi escrito por Jerry Forras e
James Collins. Chamase "FEITAS PARA DURAR" (Editora Rocco), e apresenta
princípios de liderança capazes de manter uma empresa viva após a morte
de seu primeiros visionários. Jerry e James disseram que líderes de verdade
não dão soluções, dão ferramentas. Isto é, não dizem as horas, ensinam a
construir relógios. Isto é, não fazem, providenciam que seja feito. Isto é, não
reúnem seus funcionários para declarações solenes do horário do dia, mas
multiplicam pessoas capazes de dizer que horas são. Sabem que o tamanho
de sua contribuição ao mundo não se pode medir pelo número de pessoas a
quem estes disserem as horas, mas pelo número de pessoas que puderem
saber as horas quando ele não estiver por perto.

Bem, confesso que estou em dúvida: não sei se James e Jerry pesquisaram
empresas visionárias ou os princípios de liderança do Senhor Jesus e do
apóstolo Paulo. Na verdade, acho mesmo que foram aqueles camaradas que
construíram impérios como Disney, IBM, American Express, Ford, Boeing,
Johnson & Johnson, 3M e WalMart, que eram leitores do Novo Testamento,
aliás, prática bastante negligenciada pelas lideranças evangélicas
contemporâneas.

Ed Rene Kivitz é pastor da Igreja Batista de Água Branca e autor de três


livros, "Nasce uma Igreja" (Ed. Sepal), "Koinonia" e "Quebrando os
Paradigmas" (Ed. Abba Press).

A oração de uma palavra só Publicado em 25/09/08 às 24:55 Por:


Ed René Kivitz

As pessoas que convivem comigo dificilmente me descreveriam


como um homem de oração. Mas peço licença a Paulo, apóstolo,
para usar suas palavras em minha defesa –"Ninguém me considere
insensato! Ou então suportai-me como insensato, a fim de que também eu
me possa gloriar um pouco. O que vou dizer, não o direi conforme o Senhor,
mas como insensato, certo que estou de ter motivo de me gloriar".

Sou um daqueles denunciados por William James, que ora simplesmente


porque não consegue evitar a oração. Minha vida de oração não se explica
por outra razão senão o mais profundo desespero. Durante muito tempo
carreguei a culpa de orar por razões diversas – a busca da santidade, o
amor ao Senhor (o famoso e piedoso "buscar a Deus por quem Deus é") ou
mesmo aquela intercessão generosa, solidária e compassiva. Mas encontrei
consolo nas palavras de Thomas Merton: "A oração é uma expressão de
quem somos".

A oração nunca me fez sentido. Para falar a verdade, ainda não faz.
Também não consigo compreender a mecânica ou dinâmica processual da
oração. Jamais consegui me ajoelhar aos pés de um deus deliberativo, que
recebe as petições e súplicas das mãos do "anjo protocolador" e as
despacha à luz de critérios misteriosos. Não consigo imaginar um deus
pensando se responde ou não à súplica de uma mãe no corredor do hospital
ou considerando se atende ou não ao clamor de uma comunidade que pede
chuva.

Alguém deve imaginar que Deus ouve as orações, avalia a questão e depois
dá ordens aos seus anjos conforme sua perfeita vontade: "Gabriel, faça com
que aquele advogado desista da compra do apartamento, pois decidi que
vou deixar que o casal que orou esta manhã feche o negócio"; ou "Miguel,
dê um jeito de aquele menino esquecer o agasalho e ter que voltar para
buscar, porque a mãe dele está orando e eu vou poupá-lo do acidente que
está para acontecer na esquina da escola". Se o leitor acredita que as coisas
de fato acontecem desta maneira, nada contra. Não tenho qualquer
argumento para afirmar que Deus não faça ou não possa atender orações
desse tipo. Respeito seu ponto de vista, até porque não duvido que você
tenha inúmeras histórias de orações cujas respostas de Deus o levam a
acreditar que as coisas funcionam assim mesmo.

Quando comecei a pensar nessas coisas, minha experiência de oração


mudou muito, e para melhor. Tudo começou quando Jesus me ensinou a
invocar a Deus usando a expressão Abba. Os historiadores, Joachim
Jeremias por exemplo, afirmam que abba era a palavra do dialeto siro-
ocidental aramaico que uma criança usava para se referir ao seu pai. O
Talmud, comentário rabínico da Torah, diz que "quando uma criança
saboreia o trigo, aprende a dizer abba e imma", querendo dizer que "papai"
e "mamãe" são as primeiras palavras de um pequeno recém-desmamado
que está aprendendo a falar. Na verdade, a melhor tradução para abba
seria "papa" ou mesmo "pa", algo como o mero balbuciar, assim como para
imma, seria "mama" ou simplesmente "ma".

O fato é que abba era um termo infantil, anterior à construção conceitual,


despido de significados culturais, ainda não elaborados na mente, mas
perfeitamente compreensível ao coração. A criança que pronuncia abba ou
imma não detém qualquer conceito de pai ou mãe, não sabe o significado
de expressões como pessoa, identidade, individualidade. Ignora o que é
família, casal, irmão, irmã – quanto mais conceitos abstratos como
sociedade ou comunidade. Tudo quanto uma criança que pronuncia abba
sabe é que existe apenas um a quem se refere assim. Diante de muitos
braços estendidos em sua direção, a criança identifica quem são seu abba e
sua imma. é como se, intuitivamente, pensasse assim: "Esse é meu abba,
essa é minha imma; posso ir no seu colo ou lançar-me em seus braços. Ali
estou suprida e segura".

Joachim Jeremias relata que Jesus se dirigia a Deus "como uma criancinha
fala a seu pai, com mesma simplicidade íntima, o mesmo abandono
confiante". Jeremias considerou este Abba "ipsissima vox de Jesus", isto é,
maneira própria e original de falar do Filho de Deus. Os apóstolos assim
compreenderam, e Paulo vai dizer mais tarde que o clamor Abba é ipsissima
vox dos filhos de Deus, adotados na comunhão do Espírito Santo.

Muito provavelmente, Abba é a palavra com que Jesus invoca Deus Pai
quando do seu brado final e triunfante do alto da cruz: "Abba, nas tuas
mãos entrego o meu espírito". Logo, a expressão da mais absoluta
confiança está presente no momento da mais profunda solidão e senso de
abandono e desamparo. Eis a fé, como disse Martin Buber, como "adesão a
Deus". Não a uma imagem de Deus, um conceito, uma idéia do divino. Mas
uma adesão a Deus, uma adesão que transcende imagens, conceitos, idéias
e também sensações e percepções. A fé como adesão a Deus tal qual a
adesão de uma criança desmamada no colo de sua mãe: além, ou aquém,
da consciência racional, que decodifica e disseca o Senhor como um
cadáver sobre a mesa da academia.

Mas, ao mesmo tempo, trata-se de fé como adesão adulta, madura, capaz


de transitar além, ou aquém, das sensações e percepções, ciente tão
somente de que Deus está, Deus é, e que seus braços acolhem. A oração de
uma palavra só, Abba, é pronunciada na mais tenra infância e na mais
extrema maturidade. Entre os dois momentos da pronúncia do Abba está a
prepotência de quem acredita compreender e manipular o Deus 'que habita
em luz inacessível'.

Diante do Abba, a oração deixa de ser um arrazoado inteligente, ou uma


ladainha de murmurações e súplicas que serão depois catalogadas em
colunas de "respondidas na data tal". Diante do Abba, a oração é mais
parecida com um suspiro, um gemido profundo, ou uma efusão de lágrimas;
também é semelhante a um salto de alegria incontida, um literal derramar
do coração. O Abba é aquele que transcende nossos dogmas, nossos
sentidos e nossas manipulações. Mas é aquele que compreende e acolhe o
que não dizemos pela simples razão de não sabermos o que dizer, ou como
dizer. é aquele que recebe o peso dos nossos corações simultaneamente
depositados aos pés da cruz e entregues em suas amorosas mãos,
devolvendo ao aflito "a paz que excede a todo o entendimento".

Caso lhe seja possível compreender a oração com um estar diante daquele
a respeito de quem pouco ou quase nada sabemos, exceto que é nosso
Abba; se a oração é para você expressar diante dele o que lhe pesa no
coração, através de gemidos profundos e um singelo balbuciar Abba, num
salto de fé que transporta para além das sensações, percepções e
conceitos; ou caso considere que um simples suspiro balbuciando Abba
implica a mais profunda e legítima oração, então não apenas você vai orar
mais, muito mais, como também – e principalmente – nunca mais será a
mesma pessoa.
Fonte: www.cristianismohoje.com.br

As casas e as verdades Publicado em 28/05/08 às 13:16 Por: Ed René Kivitz

Assim como uma casa se faz com tijolos, mas uma pilha de tijolos não é uma
casa, também uma verdade cristã se faz com versículos – mas um amontoado
de versículos não equivale necessariamente a uma verdade bíblica.

Era uma manhã ensolarada e a caminhada já se estendia. A cidade estava


logo ali. Antes da chegada, a fome. E depois da fome, uma figueira. Jesus se aproxima
da planta esperando colher algum fruto. Mas encontrou apenas folhas. Não teve dó nem
piedade – amaldiçoou a figueira, e deixou seus discípulos assombrados. Depois deu uma
bronca em todo mundo e vaticinou: quem tiver fé, ainda que do tamanho de um grão de
mostarda, vai mandar esse monte sair do lugar e ele vai obedecer. No meio dessa coisa
toda, Jesus ainda encontra tempo para, literalmente, chutar o balde dos comerciantes do
templo, que haviam transformado a casa do Pai em covil de ladrões.

O que uma cidade, uma figueira, um monte, um templo e a fé estão fazendo juntos nesta
cena? Aliás, observe. Caso não tenha percebido, eles estão juntos. Não são episódios
estanques, separados: o da figueira, o do templo e o aforismo sobre a fé. São peças de
um quebra-cabeças que, montadas, deixam claro como o sol do meio-dia o que Jesus
estava querendo dizer. Já, já, a gente chega lá. Mas quero contar outra história. Certa
ocasião, Cristo se deparou com um homem dominado por espíritos malignos. “Legião”,
disseram, ao responder qual era seu nome. Diante do Filho do Deus Altíssimo, os
demônios pediram que Jesus os deixasse entrar nos porcos, perto de dois mil. Jesus
consentiu. Em seguida, os porcos se lançaram ao lago de Genezaré e se afogaram. O
pessoal da região ficou louco da vida com Jesus e pediu que ele fosse embora daquele
lugar.

Não tenho dúvidas de que você já ouviu e leu centenas de meditações baseadas nestes
dois episódios da caminhada de Jesus com seus discípulos. Provavelmente, alguém já
disse que seus problemas são como aquele monte citado pelo Mestre, e que podem ser
superados pela fé. Não importam quais sejam seus embaraços, seus problemas, suas
angústias e as razões do seu sofrimento; basta ter fé. Afinal, a fé remove montanhas, isto
é, com fé a gente vence qualquer dificuldade.

Também deve ter ouvido a respeito da autoridade de Jesus sobre os espíritos malignos,
o que é absolutamente verdadeiro. E não é pouca autoridade, não. O Senhor deu conta
de expulsar dois mil demônios de um homem de uma vez só. Eles fizeram fila e saíram
um de cada vez. Então, imagine o que Cristo não é capaz de fazer com um
demoniozinho tupiniquim! Principalmente, no palco de uma igreja evangélica. Com
base na história do gadareno e sob a intercessão das mãos estendidas dos fiéis, os
pastores se enchem de coragem e repetem sua fórmula infalível: “Sai desse corpo que
não te pertence”.

Será que estes episódios se prestam apenas a ensinar a respeito do poder da fé para
vencer dificuldades na vida e acerca da autoridade de Jesus sobre o diabo e seus
asseclas? Ou haveria algo mais nas entrelinhas das narrativas? Fico com a segunda
alternativa: os Evangelhos – decerto, a Bíblia toda –contêm linguagem cifrada, códigos
secretos que comunicam verdades profundas, perfeitamente percebidas pelos
circunstantes, porém raramente alcançadas pelos leitores contemporâneos.

Mas, e a figueira, a cidade, o templo? O que fazer com essas figuras? Vamos lá.
Primeiro, o caso da figueira. Sabemos que essa árvore é um símbolo que identifica a
nação de Israel. Assim também a cidade, o templo, e o monte. A cidade é Jerusalém,
onde está o Templo de Salomão, no monte Sião. Jesus faz a limpa, cumprindo a
profecia de Malaquias – “Logo virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais” – e a
de Zacarias: “E, naquele dia, não haverá mais mercadores na casa do Senhor dos
exércitos”.

Jesus deixa claro que Israel é uma figueira estéril, sem frutos, o que é demonstrado pela
profanação do Templo e deturpação de sua religião. A nação é amaldiçoada; Sião
deixará de ser o centro da revelação de Deus e Israel será preterida por um povo com
quem Deus celebrará uma nova aliança – em Jesus, e não mais em Moisés: “É evidente
que pela lei ninguém será justificado diante de Deus, porque o justo viverá da fé”.

A fé que remove montanha não é a fé individual, aquela porção de fé de cada crente,


mas coletiva, do povo da nova aliança: “Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do
pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo fosse dada aos crentes. Mas, antes
que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se
havia de manifestar. De maneira que a lei nos serviu de aio, para nos conduzir a Cristo,
para que pela fé fôssemos justificados. Mas, depois que veio a fé, já não estamos
debaixo de aio. Porque todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus. Sabei, pois,
que os que são da fé são filhos de Abraão”.

O monte removido pela fé não é a dificuldade particular de cada crente, mas Sião, o
monte santo, que não se abala – ou melhor, não se abalava, até que Israel rejeitou o
Messias, que conforme a Escritura, veio para os seus, mas não foi recebido por eles. Em
Cristo, a Igreja – o povo da fé – recebe todos os títulos que pertenciam a Israel:
“Geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido”. A fé remove o Monte
Sião. Portanto, da próxima vez que alguém lhe disser que a fé remove montanhas, diga
que já removeu. Sião não é mais o que era. A figueira secou. E nasceu a Igreja, povo de
Deus, povo da fé.

A mesma coisa acontece com a história do endemoninhado gadareno. Os espíritos


imundos chamam a si mesmos de Legião, numa clara e explícita referência ao poderio
militar romano. Assim como os opressores egípcios se afogaram no Mar Vermelho,
quando com mão forte Yahweh libertou Israel pelas mãos de Moisés, também os
opressores romanos estavam se afogando no Mar da Galiléia, sob as ordens daquele que
ousou pronunciar “ouvistes o que foi dito por Moisés; eu, o Messias, porém, vos digo”.

Da próxima vez que alguém lhe disser que Jesus é maior que os demônios, concorde.
Mas acrescente – ele é também maior que Moisés. E maior que o Egito, a Babilônia, a
Pérsia. É também maior que Roma.

Maior que os espíritos malignos que agem nas entranhas do mundo, que jaz no maligno.
E, porque maior que tudo e todos, é Senhor e libertador, aqui e agora, ali e além; Rei de
um reino que não terá fim.

Assim como uma casa se faz com tijolos, mas uma pilha de tijolos não é uma casa,
também uma verdade cristã se faz com versículos – mas um amontoado de versículos
não equivale necessariamente a uma verdade bíblica. Uma casa é resultado de um
processo inteligente de ordenação harmoniosa de tijolos, todos agrupados conforme
determinado projeto. Assim também, a verdade do Evangelho possui sua lógica. Fora
dessa lógica intrínseca, versículos não passam de tijolos.

Fonte: Revista Cristianismo Hoje

Governo evangélico, jamais! Publicado em 09/02/06 às 16:30

Por Ed René Kivitz*


O ideal de um Estado teocrático é a pedra no sapato dos projetos políticos
desenvolvidos ao longo da história cristã. Desde a conversão de Constantino
e a conseqüente identificação do cristianismo como "religião oficial do
Império", passando pela Genebra de Calvino e Farei, as relações entre fé cristã e
projetos políticos visam, via de regra, submeter o Estado à Igreja, fazendo com que o
poder civil público sirva como instrumento facilitador e garantidor da religião. A idéia
subjacente nesta relação é que "Deus é o Senhor, a Igreja deseja adorá-lo, e o Estado
obriga a fazê-lo", como interpretou o historiador Seeberg. Tais ideais estão na origem da
Terra Brasilis: o primeiro ato cívico e governamental realizado em solo brasileiro foi
uma missa, e as forças colonizadoras que atuaram no Brasil foram escandalosamente
marcadas pela catequização. Esta matriz que se propaga desde o século 4 forneceu a
base do catolicismo brasileiro praticado na intercessão entre Igreja Romana e poder
público, onde os bispos católicos interferiram quase em caráter oficial nos rumos do
país.
Em resposta ao monopólio católico em relação aos fóruns governamentais e formação
da cultura política brasileira, alimentados pelo sonho do Estado teocrático e
deslumbrados com seu crescimento numérico — que resulta um significativo
contingente eleitoral -, nós evangélicos colocamos as mangas de fora e começamos a
acreditar que chegou a nossa vez: é hora, e já é tarde, de elegermos um presidente da
República. Com significativas vitórias nas urnas nos pleitos eletivos de vereadores,
deputados, senadores, prefeitos e governadores, e razoável visibilidade no cenário
federal, com uma expressiva bancada (que já foi chamada de cambada), as lideranças
eclesiásticas se articulam mais uma vez na pretensão de alçar um evangélico ao cargo
máximo da nação.
Ser evangélico; articular uma plataforma política alinhada com lideranças evangélicas;
governar com os evangélicos; conduzir o Legislativo de acordo com os interesses das
igrejas evangélicas; lotear o Executivo entre os evangélicos; manipular o Judiciário com
a ética evangélica; definir políticas públicas visando ao favorecimento do avanço
evangélico, e tantas outras justificativas em pauta, não qualificam qualquer candidatura
à presidência da República. Na verdade, desqualificam.
Quando Martin Luther King Jr. escreveu desde Birmingham afirmando que "a injustiça
em algum lugar é uma ameaça à justiça em todos os lugares", estava fazendo eco às
palavras de Abraham Lincoln ao Congresso Nacional Americano: "Ao darmos liberdade
aos escravos, estamos garantindo a liberdade aos que são livres". Traduzindo e
atualizando, podemos compreender que, ou o governo é para todos, por meio de todos,
em benefício de todos, mediante a cooperação de todos, em todos os níveis, ou as bases
do totalitarismo estão deflagradas ou mantidas.
Todo e qualquer discurso totalitário é execrável. Uma sociedade democrática deve se
constituir e desenvolver através das tensões e cooperações de todos os seus segmentos
representativos em termos de raças, credos, sexos e classes. Emilio Monti sustenta que
não existe soberania se ela não é exercida pelo soberano, e não há dúvida que no Estado
democrático o uso do termo soberano é sinônimo de povo. E o povo não tem cor, ou
melhor, tem todas as cores. Nesse caso, devemos fazer coro com Paul Freston quando
afirma que a tarefa do governo não é implementar a moralidade, mas sim a justiça.
Podemos ir mais longe, afirmando que a tarefa do governo também não é impor uma
religião. De minha parte, ficaria arrepiado se ouvisse um discurso político do tipo
"espírita vota em espírita", "agora todo mundo tem que ser gay", "os umbandistas
merecem isenção fiscal", ou "é proibido pregar o Evangelho na televisão".
Devemos crer que os fóruns legislativos sejam compostos por blocos e representantes de
vários e indistintos setores e segmentos da sociedade civil. É justo que todos os
cidadãos se vejam defendidos nas instâncias normativas da convivência social. Mas é
inadmissível que o Executivo e o Judiciário estejam comprometidos com quaisquer
segmentos da sociedade. A democracia implica em a riqueza produzida ser justamente
compartilhada, a teia cultural diversamente construída e evidenciada, a cadeia produtiva
amplamente socializada.
Quando empunhamos a bandeira da justiça social nos levantamos contra toda e qualquer
forma de favoritismo nas relações entre os habitantes da polis. Defendemos a igualdade
de direitos e sustentamos que as autoridades ordenadas por Deus devem agir como seus
ministros para o benefício do cidadão, promovendo o bem e coibindo o mal. Não
queremos um governo evangélico; queremos um governo justo. E, ao que tudo indica,
justiça e ética evangélica se largaram as mãos em alguma esquina do passado.
Evidentemente, numa sociedade cada vez mais distante dos ideais de justiça e ética
propugnados pelo cristianismo, também queremos fazer ouvir a voz do Cristo, que
andou por toda parte fazendo o bem. Mas não podemos cair na armadilha da
possibilidade de sermos influência dentre as forças que constróem a polis, antes de
sermos uma cidade edifícada sobre os montes. Enquanto as igrejas evangélicas não se
estabelecerem como micro-sociedades alternativas, jamais poderão pretender
apresentar-se como alternativas para a sociedade.
Quero crer na possibilidade e viabilidade de um cristão evangélico na presidência da
República. Presidente evangélico, quem sabe. Governo evangélico, jamais.
Fonte: Revista Eclésia - Ano VI - Número 69
*Ed René Kivitz é teólogo, consultor, conferencista e escritor. É autor de vários livros, dentre eles
"Quebrando paradigmas"; "Stress e espiritualidade integral" e "Vivendo com Propósitos". É pastor da
Igreja Batista da Água Branca-SP, fundador e diretor presidente da Galilea Consultoria e Treinamento.
Ed René será um dos preletores de plenárias do 33º Encontro Sepal para Pastores e Líderes. Para saber
mais do Encontro Sepal clique Aqui
A cidade edificada sobre o monte Publicado em 10/01/06 às 16:16
Por Ed René Kivitz

Este mundo vai de mal a pior, e aqueles que acreditam que o


mundo vai melhorar precisam ler a Bíblia outra vez. Ou fazer
teologia novamente. Quem acredita que "o dia de justiça, o dia de
verdade, o dia em que haverá na terra paz, em que será vencida a morte
pela vida, e a escravidão enfim acabará" refere-se às possibilidades de
estruturação social está iludido.

A teologia da missão integral da Igreja deu passos significativos para que o


assistencialismo evoluísse para a solidariedade emancipadora. Na verdade,
a bandeira da responsabilidade social da Igreja levantada pelo movimento
chamado evangelical foi além do velho paradigma "dar o peixe e ensinar a
pescar" e profetizou a necessidade da transformação das estruturas sociais,
isto é, lutar pela igualdade de condições entre os pescadores: instrução a
respeito de pescaria, acesso aos apetrechos de pesca e às margens dos
rios. A visão sistêmica que compreende a interação entre o indivíduo e a
sociedade não dá margem para outra postura que não a implicação social
da evangelização. Ponto para os herdeiros de Lausanne.*

Os discursos a respeito da Igreja como agência de transformação histórica e


os apelos para que as cidades sejam conquistadas para Cristo foram,
entretanto, inseridos nas agendas dos políticos cristãos, distorcendo o
próprio propósito do Senhor Jesus para sua Igreja e seu Reino. Boa parte da
chamada Igreja Evangélica brasileira (cada dia gosto menos desta
expressão) padece de um crasso erro hermenêutico, a saber, a transposição
simples das promessas do Velho Testamento para o contexto social e
histórico atual.

Quero dizer que a promessa de Deus ao povo de Israel ("Se o meu povo que
se chama pelo meu nome se humilhar, e orar, e buscar a minha face, e se
converter dos seus maus caminhos, então eu ouvirei do céu e sararei a sua
terra") jamais pode ser aplicada ao Brasil e significar que a terra a ser
sarada é a nação brasileira. Deus tinha um povo, e o seu povo tinha uma
terra, um projeto de Estado, uma ética social e uma agenda litúrgica em
unidade coerente. Isto é, o povo de Israel, habitando na terra da promessa,
organizado num Estado regido pela Lei divina em suas múltiplas dimensões
e sujeito ao único e verdadeiro Deus, seria luz para todas as nações.

Hoje, Deus ainda tem um povo: a Igreja (e se você ainda acredita que o
povo de Deus é a nação de Israel, leia Gálatas novamente). Mas este povo,
a Igreja, não tem uma terra delimitada como espaço geográfico, tipo
território nacional. Mais do que isso, quando o povo de Deus fala em
"organização social", não está falando de um estado de direito, uma ordem
social temporal, mas sim do Reino eterno de Deus. E o Reino de Deus não é
um reino a ser instaurado na história, mas sim sinalizado na história.

A Igreja não vive sob a promessa de que a sociedade pode ser sarada. A
Igreja vive sob o imperativo de oferecer-se ao mundo como humanidade e
sociedade redimida, que se estrutura, de maneira alternativa, e através de
suas relações internas anuncia profeticamente o Reino que virá. Como
aprendi com os evangelicais, a Igreja é responsável por manifestar aqui e
agora a maior densidade possível do Reino que será estabelecido ali e além.
Mas esta manifestação histórica do Reino de Deus, entretanto, não se dá
pela cristianização da sociedade ou, como pretendem alguns, pela tomada
do poder temporal pela Igreja Evangélica.
A igreja, leia-se comunidade cristã local, é uma cidade edificada sobre o
monte, uma luz na escuridão, que, inserida na sociedade corrompida e
vivendo em meio a uma geração perversa, que se opõe a Deus e é inimiga
da cruz, funciona como um sinal do Reino que virá. Não se iluda, esperando
que o Brasil inteiro um dia fique iluminado. Ele, assim como todo o mundo,
continuará em trevas. Mas em meio a estas trevas, viva em comunidade,
uma comunidade que "vive o que prega para que possa pregar o que vive".

Isso significa que os cristãos devem se recolher de sua inserção social? Eu


não disse isso. Aliás, o Senhor Jesus disse que a luz acesa não pode ser
colocada embaixo da cama.

*Congresso Mundial de Evangelização, realizado na Suíça em 1974, cujas


conclusões teológicas, publicadas no Brasil pela ABU Editora, sintetizam a
teologia da missão integral, ou movimento evangelical.

Fonte: Revista Eclésia - Ano V - Nº55

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