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A BELA É FERA:

A passagem do oculto consentido, à visibilidade contestada.

Betania Maciel de Araujo

RESUMO
O texto discute as principais transformações que se processaram
em relação às mulheres na busca de sua identidade e seu espaço
no meio intelectual/tecnológico. Com esse objetivo são abordadas
as relações econômicas, jurídicas, políticas, familiares, e
psicológicas, que compõem o espírito feminino, fazendo referência
às diversas fontes bibliográficas relacionadas ao tema. No primeiro
momento, faremos uma viagem pelo tempo, buscando resgatar no
passado a participação da mulher dentro da sociedade. No segundo
momento, as questões abordadas serão: Mesmo sem o poder,
como as mulheres ganharam influência nas redes, durante tanto
tempo dominadas pelos homens? Conseguiram as mulheres passar
do oculto, que lhes é permitido, à visibilidade, que lhes é
contestada?
Resgatar o silêncio e o não dito, através da viagem pelo passado,
no século XVIII e XIX, para buscando esclarecer a participação da
Mulher na organização social e seu interesse primeiramente pela
igualdade dos sexos e mais tarde a busca pela diferenciação.
Considerando as observações de escritores clássicos, faremos
essa viagem primeiramente, tentando compreender como
começaram essas indagações e/ou necessidades. Para Michelet, a
"Mulher" seria, Corpo reflexo da alma... Bastaria à mulher ser bela e
asseada para educar harmoniosamente a filha e administrar uma
família. Ela conservaria então o "aveludado da alma", escaparia à
vulgaridade e à fealdade. O amor poderia reinar sobre a terra, abolir
as diferenças, suprimir a luta de classes e de sexos.
No entanto, as mulheres no século XIX movem-se mais do que se
pensa. Participam das migrações, camponesas vindas à cidade
como domésticas ou costureiras, burguesas médias contratadas
como preceptoras, não raro muito longe de seu país. Elas viajam e
(às vezes). O mundo muda, modificam-se as fronteiras, também
entre os sexos.
Em todas as suas obras mais importantes, Rousseau expõe idéias
de feminilidade que não só se opunham aos feministas cartesianos,
como Poulain de la Barre e Mary Astell, como também instauravam
uma ideologia de diferenciação sexual que exerceria enorme
influência nas elites sociais que tomaram o poder durante a
Revolução Francesa, e sobretudo depois, no decorrer do século
XIX. Embora fosse um pensador democrático no que tange à
política, quando se tratava de gênero as idéias de Rousseau
mostravam-se profundamente reacionárias. O que tomava as idéias
de Rousseau acerca de gênero tão significativas é que ele as
vinculava às suas idéias sobre política. Em sua Lettre à m.
D’Alembert sur les spectacles [carta ao sr. D'alembert sobre o
teatro], de 1758, Rousseau atribuía às mulheres a culpa por muitos
dos problemas da França do Antigo Regime, observava como
algumas mulheres tomaram-se ativas na vida política e cultural e
argumentava que a sua participação havia arruinado os assuntos
públicos. "Não existe boa moral para as mulheres fora de uma vida
retirada e doméstica", insistia Rousseau. "Afirmo que os tranqüilos
cuidados com a família e com o lar constituem o seu quinhão, que a
dignidade do seu sexo consiste na modéstia." Ao tomarem-se
políticos poderosos na esfera pública, as mulheres se
conspurcaram; pior, suas maneiras brandas se disseminaram por
toda a sociedade, transformando em poltrões uma elite aristocrática
de guerreiros. "incapazes de se transformarem em homens, as
mulheres nos transformam em mulheres", afirmou Rousseau. Esse
pensamento também pode ser considerado significante quando se
estende ao processo de busca de conhecimento intelectual e
também na produção de ciência, quando discutiremos mais tarde.
No pensamento do Iluminismo, era lugar-comum a idéia de que o
papel e a posição das mulheres se aprimoravam com o progresso
da civilização. Todos sabiam que uma aristocracia que minimizava
as artes militares em favor de interesses mais cultos, como as
maneiras à mesa, a conversação, a música e a literatura, era mais
civilizada do que uma classe de guerreiros. Com efeito, no século
XVIII, o modelo mais velho e mais viril do cortesão fora subjugado
pela corte, e o fidalgo era menos um guerreiro que demonstrava
sua virilidade do que um "cavalheiro sincero" (honnête homme) que
se orgulhava de seu trato social com as mulheres.
O gênio de Rousseau residiu em identificar a feminização das elites
masculinas como o fator central para explicar a corrupção da vida
política. Em 1761 e 1762, ele apresentou uma proposta mais
positiva, conquanto não menos perturbadora, para o papel da
mulher em uma sociedade francesa revitalizada. Em seu clássico
tratado sobre a educação, É Emílio, bem como em seu romance
romântico popular, Júlia, ou a nova Heloísa, mostrou o que supunha
ser uma idéia superior das relações de gênero. "Toda a educação
das mulheres deve ter os homens como referência", preconizava
em Emílio. "Agradar aos homens, ser úteis aos homens, fazerem-se
amadas e honradas por eles, educá-los quando jovens, zelar por
eles quando já crescidos, aconselhá-los, consolá-los, tornar suas
vidas agradáveis e doces - estes são os deveres das mulheres de
todos os tempos, e deveriam ser ensinados desde a infância."
Aquilo que a "dama" autora de Female hights vindicated identificara
como um velho preconceito, Rousseau transformava em uma
filosofia de vanguarda. Há anos os pesquisadores vêm se
mostrando perplexos com o fato de que muitos dos mais ardentes
admiradores de Rousseau tenham sido mulheres e feministas.5
Havia uma tendência a ler Rousseau como um polemista, cujo estilo
e objetivos gerais deveriam ser admirados, mas que se deixava
arrebatar em excesso pelos próprios argumentos.6 Esses leitores
podiam louvar a integridade de Rousseau, bem como sua descrição
utópica das relações de gênero, sem acreditar literalmente em suas
palavras. Em um mundo aristocrático que não havia ainda separado
completamente o trabalho da casa, nem a esfera pública da esfera
privada, as noções relativas a um ideal de vida doméstica feminina
podem ter parecido renovadoras e subversivas, e suas implicações
não foram percebidas como o são hoje. Não obstante, havia alguns
livros da Querelle des Femmes que desafiavam frontalmente
Rousseau. A enciclopédia de Aublet o condenava por "querer situar
as mulheres na classe dos animais domésticos". Em 1779, um livro
belga atacou a caracterização que Rousseau fez de Sophie, a
personagem feminina de Emílio, assegurando
que as mulheres que recebessem a mesma educação dos homens
poderiam alcançar grandes realizações.
De fato, as idéias de Rousseau sobre gênero são menos misóginas
do que fundamentalmente ambivalentes. seu temor do poder
feminino no Antigo Regime deriva de um reconhecimento da
autoridade das mulheres, bem como de sua influência e de sua
similaridade com os homens. "Em tudo que não diga respeito a
sexo, a mulher é homem", afirma Rousseau em uma passagem
famosa de Emílio. "Ela tem os mesmos órgãos, as mesmas
necessidades, as mesmas faculdades. A máquina é construída da
mesma maneira."
Não é por acaso que essa passagem, como tantas outras em seus
livros, soam como expressões extraídas da literatura da Querelle
des Femmes. Afinal, no início de sua carreira, provavelmente
durante a década de 1740, Rousseau começara a escrever um
ensaio sobre as mulheres, que imitava, de forma clara, obras como
a Galerie des femmes fortes, de Le Moyne, retratando "as mulheres
privadas de sua liberdade pela tirania dos homens". E considerava
condenável essa privação da liberdade e preconizava a participação
da mulher na vida pública: "Encontramos no outro sexo modelos tão
perfeitos [quanto os homens] em todos os tipos de virtudes cívicas
e morais". Se as mulheres tivessem sido tão ativas quanto os
homens na gestão dos governos, prosseguia Rousseau em sua
argumentação, Os impérios políticos teriam sido tanto mais
gloriosos.
Durante a década de 1740, Rousseau foi também o secretário
particular de madame Dupin, que então escrevia, ela mesma, um
extenso livro sobre as mulheres, no qual idealizava a tradição das
amazonas e de Joana d'Arc, no estilo polêmico de um típico tratado
da Querelle des Femmes. propósito deste livro é examinar a sua
origem, o seu caráter e os seus efeitos." Embora o livro jamais
tenha sido editado, centenas de paginas manuscritas sobreviveram
até nossos dias, muitas delas com a letra do "Hoje, continuamos a
ver no mundo", ditou madame Dupin para Rousseau, "uma
desigualdade opressiva entre homens e mulheres, que não parece
fundamentada na natureza ou em nenhuma outra verdade. O
próprio Rousseau. Conquanto não se possa dizer até que ponto ele
estava de acordo com a sua patroa, a existência desse livro
constitui, em si mesma, uma prova de que Rousseau, se achava
profundamente engajado nas polêmicas feministas do século XVIII.
Desse modo, há boas razões para conjeturar que o pensamento de
Rousseau acerca do gênero desenvolveu-se a partir de uma
posição inicial próxima da dos feministas da Querelle des Femmes.
Assim como seu relacionamento com os grandes filósofos do
Iluminismo, aos quais se juntou para mais tarde contrapor-se a eles
- basta pensar no seu turbulento incidente com Voltaire, por
exemplo -, sua filosofia de gênero pode ter seguido um caminho
semelhante.
Apoiando Rousseau, havia numerosos escritores menos famosos,
que parecem ter vivido trajetórias intelectuais semelhantes. Entre
aqueles representado, estava Pierre-Joseph Boudier de Villemart,
cujo Ami des femmes foi publicado em duas edições francesas
distintas (em 1759, e Le nouvel ami des femmes, em1779),
traduzido para o inglês e até mesmo publicado na América. Boudier
via a si mesmo como um escritor pró-mulher, na tradição de Poulain
de la Barre. Ele admirava as mulheres capazes de grandes
realizações, e sua edição de 1779 incluía uma lista, em ordem
alfabética, das trezentas mulheres francesas que mais contribuíram
para a vida pública.
Mas o feminismo de Boudier tinha limites. Embora as mulheres
houvessem realizado progressos, o fizeram à custa dos homens,
dizia ele. Boudier explicava que, entre as classes da elite na Idade
das Trevas, os sexos eram necessariamente segregados. Como as
guerras eram incessantes, e travadas por exércitos particulares de
aristocratas, era natural que os guerreiros caracterizavam a maior
parte da vida aristocrática masculina. Pouco a pouco, as qualidades
viris, como a força física, passaram a distinguir os homens das
mulheres. Esse rumo se alterou durante o Renascimento, quando o
Estado monárquico impôs sua autoridade sobre a sociedade feudal,
segundo Boudier, as guerras tomaram-se menos freqüentes e os
exércitos eram controlados pelo rei, passando a ser cada vez mais
formados por mercenários. Em suma, os homens da aristocracia
ainda lutavam nas guerras e estimavam os altos postos militares,
porém já não era a guerra que caracterizava a vida aristocrática
masculina.
Boudier argumentava que os homens da aristocracia preencheram
esse vazio assumindo como seus os interesses femininos. Os
salões, a conversação, a moda e os jogos caracterizavam, de forma
crescente, a vida aristocrática de ambos os sexos. "como a
brandura feminizava tudo", comentava Boudier, "o contraste
estabelecido pela natureza entre os dois sexos desapareceu.". Em
meados do século XVIII, já não havia dois gêneros contrastantes -
um masculino, um feminino -, mas dois gêneros femininos.
Portanto, os rousseaunianos como Boudier concordavam com os
feministas da Querelle des Femmes em que a sociedade européia
se havia tomado mais feminizada. Porém, ao contrário dos
feministas, que encaravam essa mudança como um caminho para o
refinamento e o aprimoramento da civilização, os rousseaunianos
acreditavam que a situação havia fugido ao controle e se tornara
indecente. Embora paradoxal, seu apoio à melhoria da posição
social da mulher era contrabalançado pelas preocupações acerca
da confusão entre os papéis de gênero.
De certo modo, os rousseaunianos diferiam dos feministas menos
na forma de ver as mulheres do que na maneira de ver os homens.
Eles se mostravam profundamente ambíguos quando se tratava de
determinar se a feminização dos homens da aristocracia era algo
bom ou ruim. Afinal, mesmo para Rousseau, o aspecto mais
perigoso das mulheres amazonas era o seu efeito feminizador
sobre os homens. Essa ambigüidade encontra sua mais perfeita
expressão nas Reflections upon polygamy [Reflexões sobre a
poligamia], de Patrick Delany, uma obra religiosa britânica,
sustentava que um excessivo intercurso social e sexual com as
mulheres resultava em uma moléstia, a "emasculação", cujo efeito
consistia em transformar literalmente os homens em mulheres, em
virtude do definhamento de sua genitália. Em essência, portanto,
era o temor da "emasculação", mais do que qualquer hostilidade
direta em relação às mulheres, que incitava os ardores de
Rousseau.
É impossível dizer com precisão como se cruzou esse campo de
batalha ideológico, visto que as idéias sobre gênero eram muito
fluidas e assistemáticas, pelo menos até a década de 1780.
Contudo, uma coisa podemos admitir : a mulher se apropriou de
muita coisa, tanto dos rousseaunianos quanto dos autores da
Querelle des Femmes. Rousseau responsabilizava as mulheres por
boa parte da corrupção da monarquia francesa - mas não todas as
mulheres. As idéias acerca das atividades funestas de Pompadour
podem ser lidas como uma espécie de sermão rousseauniano sobre
aquilo que acontece quando certo tipo de mulher - a saber, lasciva,
irreligiosa e autocrática - alcança o poder. Em vista da ascensão de
Catarina, a Grande, ao trono da Rússia, naquele período, esse tipo
de mulher parecia haver adquirido, aos olhos de muitos
observadores, um poder político sem precedentes na Europa.
Os autores da Querelle des Femmes em que essas mulheres
estavam longe de ser representativas do seu sexo. De fato, em um
mundo patriarcal que favorecia a ambição política e a imoralidade
sexual, mulheres do tipo de Pompadour e Catarina eram as únicas
que podiam ter êxito. Ao contrário dos rousseaunianos, os autores
da Querelle não concluíam, a partir de um reduzido número de
exemplos notórios, que todas as mulheres deveriam ser excluídas
da vida pública. Em vez disso, voltavam-se para um modelo
diferente de feminilidade, mas sim representado por mulheres de
tempos antigos, como Joana d'Arc. Tendiam a idealizar mulheres
castas, se não virgens, que, como a fidalga madame de Caylus
(1673-1729), rejeitavam o universo político da corte em favor do
mundo religioso do convento, mas, não obstante, mantinham sua
presença na esfera pública, redigindo tratados piedosos para outras
mulheres e ajudando a ampliar o papel dos conventos na sociedade
francesa. Essas mulheres não constituíam exemplos da vida
doméstica pregada por Rousseau, mas eram celebradas por sua
coragem, militância, patriotismo e determinação no propósito de
mudar a face da sua sociedade.
Assim, podemos encontrar as fontes da concepção de feminilidade
da época, tanto nos rousseaunianos quanto nos seus adversários.
No entanto, é bem mais difícil definir as origens das idéias a
respeito da masculinidade. Não existiu um único autor no século
XVIII que tenha tratado a feminização dos homens em termos
francamente positivos. os autores feministas da Querelle des
Femmes mantinham- se no máximo ambivalentes, ao passo que os
rousseaunianos imaginavam uma epidemia generalizada de
"emasculação". Se os atos dizem mais do que as palavras,
transformar-se voluntariamente em mulher constituía a suprema
celebração da feminização do homem. Entretanto, as ações não
dizem mais do que as palavras; na verdade, as palavras podem ter
uma vida muito mais duradoura.
A palavra das mulheres, durante muito tempo nas camadas
superiores da sociedade, passou primeiro pelo domínio da
conversação, ainda mais do que o espaço material, é a palavra e a
sua circulação que modelam a esfera pública. A idéia de que a
natureza das mulheres as destine ao silêncio e à obscuridade está
profundamente arraigada em nossas culturas. Restritas ao espaço
do privado, no melhor dos casos ao espaço dos salões mundanos,
as mulheres permanecem durante muito tempo excluídas da
palavra pública.
No século XVIII, os salões ganham um aspecto mais político. Pela
conversação, circula a informação e se elabora a crítica da
monarquia. As mulheres ocupam aí um lugar importante, não em
igualdade com os homens, que são os únicos a serem escritores e
filósofos, mas sim como donas de casa informadas, ouvintes
atentas e curiosas, que discutem sobre tudo. "Pela conversação se
cria um espaço de jogo que torna possíveis as réplicas entre vozes
femininas e masculinas, e que transforma o espírito em seu ponto
de concordância perfeito" (Marc Fumaroli )
Será que desde a antigüidade a mulher sempre foi submissa e
dedicada exclusivamente ao lar e somente agora ela está
"libertando-se?" Qual será a motivação básica que leva as mulheres
a trabalhar fora de casa "necessidade" de dinheiro ou de
realização? Que impulso as coloca na dualidade entre trabalho e
lar, muitas vezes gerando sentimentos de culpa e tomadas de
decisões maniqueístas frente a situações para as quais não foram
preparadas?

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As implicações são muitas. Esses elementos e fatos que constituem
a participação da mulher na esfera pública, por pequenos ou
insignificantes que pareçam, tem significado. As situações diárias, a
sensibilidade e o corporativismo feminino. A capacidade de sentir
todo um estigma, modifica sua postura profissional? Para uma
construção de identidade, seu esforço é dobrado, a inferioridade da
mulher não é biológica, nem psicológica: é social e econômica. E
produzida no seio da sociedade, fruto de processos de socialização
distintos.
De acordo com Hartmann (Apud Camacho, 1994:20), a parceria
entre patriarcado e capitalismo fica evidenciada na divisão sexual
do trabalho no interior da força de trabalho. Às mulheres são
destinadas as atividades pouco remuneradas (professoras,
secretárias, assistentes sociais, enfermeiras, faxineiras,
telefonistas). O salário diferenciado, gerado no interior do
patriarcado capitalista, termina por gerar, também, um papel
secundário para o trabalho das mulheres.
O conceito de gênero nos auxilia a avançar para além da visão
biológica do homem e da mulher, no sentido de analisar as relações
sociais entre os sexos, destacando o caráter histórico da lógica
patriarcal-capitalista que transformou as diferenças naturais em
desigualdades sociais.
Scott (1990:14) destaca 1.º gênero, como "elemento constitutivo de
relações sociais fundadas sobre diferenças percebidas entre
sexos", e, 2.º como "primeiro modo de dar significado às relações
de poder".
A desigualdade entre homens e mulheres é fruto da desigualdade
social que caracteriza a sociedade de classes. A opressão de
gênero e a opressão de classe são faces da mesma moeda " o
capitalismo patriarcal (Hartmann, apud Camacho, 1994:21).
A sociedade brasileira é marcada pela discriminação e opressão às
mulheres. Duas são as principais formas de opressão; a econômica
e a cultural. Senão vejamos:
Segundo dados da ONU, apresentados por Falcão (1996:11), as
mulheres brasileiras têm uma expectativa de vida superior à
dos homens (68,9 anos contra 64,1), praticamente empatam em
alfabetização de adultos e matrículas, mas perdem, longe, em
participação na renda.
Ainda de acordo com a mesma fonte, a riqueza brasileira se
distribui de forma a destinar 71,4% para os homens, sobrando
às mulheres os 28,6% restantes.
Segundo dados fornecidos pelo IPEA/1996, o desemprego no
Brasil atinge mais as mulheres (homens 6,1% e mulheres
8,9%).
Em relação à opressão cultural, há maior sutileza. Segundo Saffioti
(1989:25) "violência e ideologia são fenômenos complementares no
processo de dominação-exploração: o poder que é masculino,
ideologiza as situações de opressão para permanecer desfrutando
privilégios. A "naturalização" da desigualdade entre mulher e
homem é introjetada no individual e no coletivo, incorporando-se na
cultura do povo.
Neste sentido, a mesma autora aponta que a ideologia tem a
capacidade de legitimar a ordem social imposta pela classe
hegemônica, fazendo com que os subordinados aceitem como
natural a disciplina moral e laboral que satisfaz aos interesses dos
que detêm o poder.
Saffioti (1989:37) acrescenta que o processo ideológico dominante
determina profunda dicotomia entre homem e mulher. A mulher,
socializada para sujeitar-se aos caprichos masculinos, incorpora
muitos, senão todos, os valores patriarcais. Assim, a mulher,
fazendo sua a ideologia que a inferioriza e infelicita, veicula-se ao
socializar as novas gerações.
Isto não significa, destaca Saffioti, que a mulher seja a única
responsável pela transmissão da ideologia dominante. Também o
homem, através da ação e sobretudo da omissão, desempenha
este papel.
Vamos buscar em Muraro (1995:193) o reforço para esta idéia. Na
família patriarcal, desde que nasce, a criança vê o pai mandando e
a mãe obedecendo. Como as impressões dos primeiros anos de
vida nos marcam indelevelmente, a criança tende a "naturalizá-los",
ficando para sempre, no inconsciente de homens e mulheres, a
aceitação de uma sociedade autoritária, coercitiva, desigual e,
portanto, injusta.
Para Castro (1991:14), não é suficiente recorrer às discriminações
postas pela sociedade para explicar a fraca representação das
mulheres.
Enfim, com referência a participação da mulher na rede, no ano
2000, a estimativa de participação da mulher na Internet é de 48%
dos usuários, segundo o Stats (www.e.land.com/e-Stat pages/e-
stat-main.html)7 o que significa 52,4 milhões de internautas
acessando a rede. Esse dado reflete o aumento crescente que o
sexo feminino vem tendo como usuária deste tipo de tecnologia Há
dois anos, elas representavam 24% e hoje este número está em
39%. Em uma pesquisa feita nos Estados Unidos pela NetSmarh
( www.netsmart.research.com), coordenada pela psicóloga
Bernardet Tracy, chegou-se a conclusão que em 2005 a maioria
dos usuários do mundo digital será de mulheres.
Conforme a pesquisa, a mulher acessa a Internet buscando
informação. Nesse sentido, como um instrumento de trabalho e
estudo, aproveitando-a, também, para fazer compras sem sair de
casa. Os homens norte-americanos acessarão a Rede com a
finalidade de entretenimento. A prioridade da mulher em utilizar os
serviços tecnológicos como uma ferramenta de trabalho explica-se
pelo fato de, nos EUA , ela ser a responsável pelo controle da
economia doméstica em 70% dos lares. Por essa razão, estaria
mais interessada na difusão dos serviços on -line.
De acordo com as pesquisas da diretora da Unidade de Pesquisa
sobre Cultura Cibernética da Universidade de Warnick, Estados
Unidos, Sadie Plant, toda a maquinaria que compõe o computador
sempre foi operada por mulheres. Para a pesquisadora, os homens
têm organizado claramente a atividade tecnológica, mas agora, com
a mudança cultural que está ocorrendo, o papel por eles assumido
está diminuindo. Na sua concepção, ser o organizador não é,
atualmente, o fator mais importante. Sadie Plant diz acreditar que a
mulher vai utilizar a Rede, cada vez mais, na tentativa de buscar
informações especificas .
Para a doutora em Ciências pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro - UERJ, Heloísa Cardoso 9, o neo-feminismo dos anos 90
se diferencia do feminismo de outras décadas pelo fato de que a
mulher de hoje não aspira mais à igualdade com os homens. Ela diz
acreditar que a tecnologia foi um dos aspectos que facilitou esta
mudança de comportamento do sexo feminino. Para ela, o
crescimento da mulher na Rede pode ser explicado através da
psicologia junguiana por meio da figura do "animui" 10 mais
incentivado pelas características do mundo virtual.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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