Recordo-me e sinto saudade da minha infância. Vivia em uma pequena cidade,
quase que um povoado naquela época. Todos se conheciam. Morávamos em casa de chão de terra batida. Na cozinha um fogão à lenha e um quintal enorme com vários pés de frutas. O poço de onde extraíamos a água para o consumo ficava bem no fundo do quintal. A água era salobra e para tirá-la era um sacrifício, pois usávamos sarilho manual e às vezes o peso do balde superava a minha força.Chegava até mesmo a soltar das mãos.Uma vez quase fui jogada para dentro do poço.Era uma vida sofrida,mas sem maldade,malícia ou qualquer coisa parecida.
Nossas brincadeiras eram saudáveis e tínhamos bastante criatividade, pois nada
vinha pronto. De vez em quando para a nossa felicidade, chegava um circo no povoado. Era aquela correria. Toda a criançada se virava como podia para conseguir algumas moedinhas para garantir a matinê do domingo. Vendia-se caco de vidros, ferro velho ou trabalhava-se nas roças que circundavam a cidade. Colhia-se algodão, tomate ou amendoim, dependendo da época, mas aos espetáculos não poderíamos deixar de assistir. Tamanha tristeza invadia a cidade quando o circo se despedia, chegávamos a chorar. Mas para superar a saudade, a
solução era montar um circo no fundo
do quintal, com palhaços, picadeiros, palha de arroz e ensaios. Todos se mobilizavam. Então chegava o dia da estréia e os espetáculos aconteciam às noites. Para iluminação usávamos lamparinas ás quais eram abastecidas a óleo diesel. Os ingressos eram cobrados em palitos de fósforos, pois o consumo era grande, pois às vezes o vento apagava as lamparinas. O triste era quando minha mãe se irritava com o entra e sai de molecada no quintal. Ela ficava furiosa e destruía o nosso circo, mas a nossa resistência era grande. Lutávamos com unhas e dentes para que ela nos deixasse sonhar. Ainda hoje a saudade permanece registrada na minha memória. Foi uma época em que as pessoas viviam com tão pouco, sem a televisão que felizmente era privilégio de uma pequena parcela da população, onde não tínhamos acesso a anúncios e propagandas, mas apenas uma bala ou um pirulito e as gargalhadas de um palhaço eram suficientes para fazer uma criança sonhar e ser feliz.
Autora: Joana Maria Vilela de Simoni (Professora).
Ilustração: Diego Carvalho Ferreira dos Santos – 6ºA.